Dez Palavras - o essencial da Fé Cristã

Page 1


Luís M. Figueiredo Rodrigues

SALESIANOS EDITORA

Ficha Técnica:

Dez palavras. O essencial da fé cristã

© 2025 Luís M. Figueiredo Rodrigues

Copyright desta edição:

© 2025 Salesianos Editora

Rua Duque de Palmela, 11 4000-373 Porto | Tel: 225 365 750 geral@editora.salesianos.pt www.editora.salesianos.pt

Capa: Paulo Santos / Claudine Pinheiro Imagem de Capa: Dreamstime.com

Paginação: João Cerqueira

1ª edição: Fevereiro 2025

ISBN: 978-989-9134-49-2

Depósito Legal.: 543512/25

Impressão e acabamento: Imedisa Artes Gráficas

Reservados todos os direitos. Nos termos do Código do Direito de Autor, é expressamente proibida a reprodução total ou parcial desta obra por qualquer meio, incluindo a fotocópia e o tratamento informático, sem a autorização expressa dos titulares dos direitos.

10 Palavras da fé

Introdução

Palavras há muitas! Palavras, leva-as o vento.

Mas há palavras… diferentes.

Mais intensas.

Mais capazes de levar o nosso mundo interior ao coração do outro.

Quando relemos a Bíblia, história do diálogo entre Deus e a humanidade, descobrimos algumas palavras realmente importantes.

São palavras que dão forma à versão melhor de nós mesmos.

São palavras que exprimem magnificamente a fé, a relação confiada e feliz a que Deus nos chama.

Não são palavras mágicas.

Valem na medida em que são verdadeiras.

Valem porque nos fazem crescer.

Como pessoas. Como crentes. Como buscadores de uma vida mais feliz.

PAI

Quando dizemos « Pai » , num contexto cristão, estamos a entrar dentro de um ‘espaço’ muito rico e profundo. Já desde as origens da Revelação percebemos que Deus possui uma profunda vontade de libertar o povo que escolheu e chamou à existência.

Deus é um amigo que estabelece com o povo um pacto de amizade, que o protege no caminho e que suscita uma resposta de confiança e cumprimento da Lei; é ainda um Deus que convoca o povo e o põe a peregrinar para o futuro, para a Promessa, para o reino da vida autêntica.

ANTIGO TESTAMENTO

No Antigo Testamento, Deus não é chamado e conhecido como « Pai » . Mas é um Deus que cria, que liberta e oferece uma lei que dá e possibilita a vida.

As passagens veterotestamentárias que aludem a Deus como Pai são essencialmente as seguintes:

• em contexto profético , de eleição divina e de resposta humana, Jeremias fala dos filhos de Israel que se negaram a chamar Deus “seu Pai”, não quiseram obedecer à sua vontade e perderam-se (Cf. Jr 3,19). Também o canto de Moisés interpretou a queda e os pecados de Israel como o abandonarem o Deus Pai (Cf. Dt 32, 6)

• em contexto da piedade judaica , embora com influência já do mundo helénico, há já um grupo de textos que apresentam Deus como Pai dos crentes, considerado no sentido individual. No livro de Ben Sirá, Deus é invocado como “Senhor, Pai e soberano da minha Vida” (23, 1.4) e em Sabedoria 14,3 alude-se à sabedoria de “Deus Pai”.

Deus não é Pai porque gera de forma física, mas porque chamou os filhos de Israel para serem um povo de homens livres. É Pai porque ama e porque escolhe um povo e o guia segundo o caminho da Lei,

conduzindo-o a uma terra de liberdade. Desta forma, quase sem usar a palavra ‘pai’, os hebreus começaram a realizar a grande revolução religiosa do símbolo paterno.

NOVO TESTAMENTO

No Novo Testamento, principalmente nos Evangelhos, podemos descobrir os traços principais da paternidade de Deus, de um Deus que só se descobre à medida que se nasce de novo, acolhendo o Reino de Deus entre nós:

• Deus é Pai, dá a vida numa atitude de graça . Por isso, a descoberta da paternidade divina acontece na medida que se aceita nascer de novo, fazer a experiência de um novo nascimento, deixando-se amar por Deus em atitude de acolhimento gratuito. Por isso, Jesus definiu os crentes como ‘crianças’ (Cf. Mc 9, 33-35).

• Deus é Pai, perdoa os homens. Porque Deus ama de modo gratuito, permite o renasci -

mento daqueles que já estavam mortos no mundo e para os donos do mundo: coxos, aleijados, cegos, pecadores, prostitutas… agora todos, não apenas alguns, são herdeiros da herança divina: serem filhos de Deus. Quando o pai recebe o filho mais novo, oferece-lhe um novo nascimento, o filho mais velho percebe que tem de mudar de vida e percebe que a ‘paternidade’ não está no cumprimento cego da lei, mas sim no amar e deixar-se amar (Cf. Lc 15, 28-32).

• Deus é Pai, em diálogo constante com os homens. Deus está em profunda intimidade com os homens, numa intensa proximidade. Deus não está fora da humanidade, nem dentro dela, confundindo-se.

Deus é companheiro de caminho que nos permite viver da vida divina, oferecendo-se em gestos de gratuidade e proximidade (Cf. Lc 24, 13-23). O Mistério de Cristo, a possibilidade de participar nesse Mistério, per -

mite compreender que o Filho permite-nos conhecer e venerar o Pai.

A PÁSCOA

Aqui chegamos ao centro do Mistério cristão: a experiência pascal. Deus revela-Se plenamente como Pai ao ressuscitar da morte o Filho Jesus Cristo. Só assim O conhecemos na sua totalidade: Deus é Pai como amor fundador e final, que ressuscitará a humanidade da morte, porque já ressuscitou o seu Filho Jesus, primogénito de toda a humanidade.

Deus revela-Se como Pai ao expressar a profundidade da sua paternidade na nossa natureza humana, fazendo com que o seu Filho encarnasse – nascesse e morresse entre os homens –, para introduzir todas as pessoas no Mistério da vida eterna: a comunhão de amor da Santíssima Trindade.

A este propósito diz o Catecismo da Igreja Católica: “Deus é o Pai todo-poderoso. A sua paternidade e o seu poder esclarecem-se mutuamente. Com efeito, Ele mostra a sua omnipotência paterna pelo modo

10 Palavras da fé

como cuida das nossas necessidades; pela adopção filial que nos concede; (…) mostra o seu poder no mais alto grau, perdoando livremente os pecados”( CIC 270).

EIS-ME

Na vocação de Samuel, são centrais as palavras “Eis-me aqui”:

“Eli, chamou-o e disse: « Samuel, meu filho! » E ele respondeu: « Eis-me aqui. »

Perguntou-lhe Eli: « Que te disse o Senhor? Não me ocultes nada. O Senhor te castigue severamente, se me encobrires alguma coisa de quanto Ele te disse. » Então Samuel contou-lhe tudo sem nada ocultar. Eli exclamou: « O Senhor fará o que bem lhe parecer. » Samuel ia crescendo, o Senhor estava com ele e cumpria à letra todas as suas predições.

Todo o Israel, desde Dan até Bercheba, reconheceu que Samuel era um profeta do Senhor. O Senhor continuou a manifestar-se em Silo. Era ali que o Senhor

Palavras da fé

aparecia a Samuel, revelando-lhe a sua palavra” (1 Sm 3, 16-ss).

Samuel entra, numa dinâmica de permanente conversão ao Senhor, procurando conhecê-lO, seguí-lO e cumprir a sua vontade. O seguimento de Deus é expressão da vontade de realizar a conversão permanente.

EIS-ME AQUI, PARA TE SEGUIR

Optar por seguir ou não o Senhor é uma escolha que estrutura radicalmente a vida de cada pessoa e das comunidades, e que é posta à prova diariamente, nomeadamente quando há mudanças importantes na vida.

O seguimento de Deus tem o seu expoente máximo em Jesus Cristo – verdadeiro Deus e verdadeiro Homem –, o único que cumpriu a vontade do Pai na totalidade. É Jesus Cristo – ontem, hoje e sempre – que intervém nas comunidades reunidas em seu nome, nos crentes que se decidem a seguir o projecto de Deus. Ele mostra que essa acção é res -

Eis-me aqui

posta à fidelidade de Deus e convite para prosseguir em comunhão de fé e de amor a vida inspirada pelo Espírito Santo e actualizada na Igreja, de geração em geração. Esta dinâmica histórica postula que cada cristão ‘viva’ a história de Deus e reconstrua na sua vida a vida divina, procurando discernir os melhores caminhos para O seguir, num esforço permanente de superar arbitrariedades e reduções.

A resposta a Deus não só gera um estilo de vida, como ela mesma já é um estilo de vida fiel a Deus, diariamente assumida e discernida em comunhão com a comunidade dos crentes, num espírito de missão, em abertura ao futuro e comunhão com o Eterno.

EIS-ME AQUI, PARA SER IGREJA

Para seguir Deus e o seu projecto é indispensável viver em comunhão e sintonia com a Igreja. A inspiração que leva a uma tomada de posição, a orientar-se para Deus, a discernir como se comprometer na construção do Reino, é uma inspiração que vai amadurecendo mediante um diálogo longo e profundo

na fé, na escuta humilde e atenta da Palavra de Deus, celebrada na liturgia. Mas é também uma inspiração interpretada no discernimento arriscado do dia-a-dia, numa leitura dos sinais dos tempos, que leva ao compromisso solidário com os homens e comunidades de boa vontade.

Ser Igreja, seguir Jesus Cristo, responder ao apelo de Deus, dizendo “Eis-me aqui” é, sobretudo, optar pela vida, pelo amor, crescer na fidelidade e comprometer-se no serviço ao Reino de Deus, solidarizando-se na justiça e na amizade. Ora, esta acção nunca está acabada e o modo de seguir Deus nunca está totalmente perfeito. Exige um esforço contínuo de discernir e aperfeiçoar o que é ser discípulo de Cristo.

EIS-ME AQUI, PARA SER COM CRISTO

Ao optar por ser discípulo de Cristo, mostrando a disponibilidade para O seguir, verifica-se que nesta aventura não há lugar para o anonimato e para a rotina. Deus chama cada pessoa pelo seu nome, e

Eis-me aqui

imprime-lhe uma dinâmica de vida que não se compadece com rotinas.

O ser discípulo de Cristo coloca cada crente sob a lei de Cristo, isto é, sobre a lei da cruz, que é a lei do amor. Por esta dinâmica interna do amor, Jesus Cristo faz de cada discípulo uma pessoa de comunhão. E é esta comunhão com a Trindade que revela a cada pessoa aquilo que ela é e o que pode ser, mostra-lhe as suas limitações e as suas potencialidades. Unido a Cristo, o crente explode em possibilidades de ser como Cristo, Aquele que foi totalmente fiel ao Pai.

Chega-se ao umbral do inefável, onde a experiência de relação e comunhão com Deus cresce à medida que esta entrega se intensifica em obras, em mística e em relação filial com Deus, por Jesus Cristo.

Aí a meta será dizer como São Paulo:

“Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. E a vida que agora tenho na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl 2, 20).

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.