PERFIL
BELKIS AYÓN O ETERNO RETORNO DE SIKÁN
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Ao se aproximar do universo mítico e misógino da Sociedade Secreta Abakuá, e representá-lo em sua obra, a artista Belkis Ayón afirmou seu compromisso com a reivindicação da mulher dentro da sociedade cubana ORLANDO HERNÁNDEZ
TALVEZ BELKIS AYÓN ESTIVESSE NOS FALANDO O TEMPO TODO DA MORTE, DO SACRIFÍCIO, DA TRAIÇÃO, DA CULPA, DO CASTIGO, MEDITANDO SOBRE AS NOÇÕES APARENTEMENTE GERAIS, ABSTRATAS, MAS QUE SE ENCONTRAM FORTEMENTE LIGADAS À EXISTÊNCIA HUMANA, AO DRAMA INDIVIDUAL HUMANO, e não
simplesmente narrando e descrevendo com curiosidade etnográfica (e, naturalmente, com intenção estética) as histórias sagradas, os episódios rituais e os personagens míticos da Sociedade Secreta Abakuá. No entanto, o mais provável é que estivesse fazendo as duas coisas, quer dizer, recriando o mistério e a beleza dessa comunidade fraterno-religiosa afro-cubana para compreender melhor a natureza intrínseca desses conceitos gerais e, assim, poder criar seu próprio mistério, ou seja, expressar em suas obras – ou ocultar por trás delas – seus medos, sua incerteza, sua inquietação. Agora sabemos que Belkis foi deixando cair migalhas ao longo de sua curta carreira, caso quiséssemos seguir o rastro de seus sonhos, seus desejos e, também, de seus pesadelos, de suas impaciências, de sua desesperança. Entretanto, devemos reconhecer com dor que não encontramos (ou não encontramos a tempo) todas as migalhas. Pelo menos, não aquelas que pudessem ter evitado ou retardado que chegasse tão abruptamente ao fim do caminho. SELECT.ART.BR
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