Contos e cronicas 15p

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Contos e crônicas para você



Noelia de Mello Vieira

Contos e crônicas para você

São Paulo 2013


Copyright © 2013 by Editora Baraúna SE Ltda. Capa Monica Rodriguês Revisão Vanise Macedo Diagramação Isaac Tiago CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________ V713c Vieira, Noélia de Mello Contos e crônicas para você/ Noélia de Mello Vieira. - 1. ed. - São Paulo, SP: Baraúna, 2013. ISBN 978-85-7923-900-7 1. Crônica brasileira. 2. Conto brasileiro. I. Título. 13-06718 CDD: 869.98 CDU: 821.134.3(81)-8 ________________________________________________________________ 31/10/2013 01/11/2013 ________________________________________________________________

Impresso no Brasil Printed in Brazil DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br

Rua da Glória, 246 – 3º andar CEP 01510-000 – Liberdade – São Paulo - SP Tel.: 11 3167.4261 www.editorabarauna.com.br


Apresentação Apresento aos que não a conheceram, NOÉLIADE MELLO VIEIRA, autora da presente obra literária. Nascida em 29 de setembro de 1939, na cidade de Itapetininga – SP, vindo a falecer em 25 de junho de 2009 em São José do Rio Preto – SP. Cidade onde viveu a maior parte de sua existência. Formou-se professora pelo Colégio Santo André (curso normal) em 1962. Concluiu curso superior na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FAFI). Licenciada em letras anglo-germânicas. Seu aperfeiçoamento profissional aconteceu em 1969 – Curso de Pós-Graduação em Educação. Em 1984/85, créditos de Doutoramento ambos na Universidade de São Paulo (USP). Em 1979, curso de Pós-Graduação em Educação na Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), Mestre em Educação. Lecionou 12 anos Inglês de 1º e 2º graus. E Prática de Ensino de Língua Estrangeira na então Faculdade de Filosofia Ciências e Letras (FAFI), que passou a se chamar Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas(antigo IBILCE), hoje UNESP, optando pelo ensino universitário desde 1976.


Escrever sempre foi uma atividade prazerosa. Publicou quatro livros em diversas épocas: “Dolly” em 1987 – “A Arca de Noélia” em 1991 – “Crônicas Avulsas” em 1996 – “Revivendo nossas Histórias” em 2006. Antes de ocorrer seu falecimento, tinha os dois últimos trabalhos literários em originais inéditos - “Agenda Poética” publicado “in memoriam” em 2011 pela Editora Baraúna SE Ltda. E agora a presente intitulada “Contos e Crônicas para você”, encerrando-se assim a coleção de obras publicadas da Autora. Paulo Henrique Massari Apresentador da Autora.


Sumário Apresentação . . . . . . . . . . . . . .

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Contos O aviso. . . . . . . . . . . . . . . . . A mansão. . . . . . . . . . . . . . . . Ledo engano. . . . . . . . . . . . . . O estuprador. . . . . . . . . . . . . . . O trem que passa... . . . . . . . . . . . . Que susto. . . . . . . . . . . . . . . . As mangueiras . . . . . . . . . . . . . . Sobrenome: pererê. . . . . . . . . . . . Tapete mágico. . . . . . . . . . . . . . Um lugar ideal . . . . . . . . . . . . . .

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Crônicas Cumplicidade vital. . . . . . . . . Coisas não favoritas. . . . . . . . Convite de casamento . . . . . . . Em busca da comunicação perdida . . Footing. . . . . . . . . . . . . Haja paciência . . . . . . . . . . Incursão na noite. . . . . . . . . Erudição. . . . . . . . . . . .

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Lua passageira . . . . . . . . Os emigrantes. . . . . . . . . O Filósofo. . . . . . . . . . O milho de ouro . . . . . . . O vendedor de churros. . . . . O último dos românticos . . . . Todo brasileiro é baiano também .

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Contos



O aviso Deitou-se. Dormiu. Quando acordou, percebeu estranha movimentação no quarto. Um entra e sai de pessoas conhecidas. Quis levantar-se. Mas algo pesado como uma trave a mantinha imóvel na cama. Quis falar. Mas apenas conseguiu tartamudear alguns sons ininteligíveis. Quis beliscar-se. Mas a sensação de dor não mais poderia ser sentida. Sim. Tinha morrido. Passado desta para melhor. Batido as botas. Esticado as canelas. Resolveu tirar proveito da situação. Descobrir muitas coisas que viva não havia desvendado. Seus olhos começaram a caminhar mentalmente da direita para a esquerda. Da esquerda para a direita. Viu quando abriram seu guarda–roupa para a escolha do último traje. Sentiu quando a despiram, deixando suas partes íntimas à mostra. Sem o menor respeito. Não lhe colocaram calcinha e sutiã. Ouviu que isso era desperdício. Dá dó vestir uma lingerie novinha em folha em uma defunta, falou alguém. E as conversas? Pareciam urubus em cima de carniça. Nem morta já esfolada, resmungou ela. Era um abrir e fechar sem fim de gavetas e caixas. 11


Comparou a cena patética com os saques que vinham acontecendo em vários pontos do país. Sentiu um calafrio mortal no sentido exato da palavra. Que destino terão os meus bens? As minhas economias? Ocorreu-lhe que seu testamento ficara apenas na intenção de fazê-lo. Sei que não vou mais precisar de coisas terrenas. Mas sou humana: ou melhor, era. Agora virei presunto. A falecida. Que Deus a tenha! Ficou pronta. Levaram-na para o cemitério. Outro calafrio. Onde serei enterrada? Em tempo algum me preocupei com esse detalhe. Detalhe? Até parece! De dentro do caixão, percebeu que o veículo funerário dirigia-se para bem longe. Talvez para o mais novo campo-santo da cidade. Várias vezes velara parentes e amigos nas salas confortáveis, mas despersonalizadas, destinadas a velórios. Novo calafrio. Sabia até que receitas de bolo são trocadas nessas ocasiões. Falam da vida dos outros. Contam piadas. O que menos se faz é rezar por quem, no momento, mais precisa de orações. De vez em quando, algumas lágrimas – ora de jacaré, ora de crocodilo – são vertidas. Acompanhadas de soluços e expressões originalíssimas,“Coitadinha!

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Tão nova! Tão cheia de vida! Vai fazer falta!” Não era isso que gostaria de ouvir. Queria saber o que realmente pensavam a seu respeito. Sem fingimentos. Sem interesses escusos. Ficou ali imóvel. De saco cheio. Aguentando aquele incômodo decúbito dorsal. Conseguiu distrair-se um pouco, observando insetos inocentes, rodeando as flores artificiais de seu esquife requintado. Pressentiu que a hora H se aproximava. Alguém (deveria ser o padre) começou a proferir palavras que pareciam senha para o acesso ao andar que o defunto – ela – ia ser encaminhado. Viu a tampa baixar sobre os seus restos mortais. Olhares piedosos arriscavam uma última espiadela. Sentiu o suor escorrer-lhe sobre a face lívida. Suor? S-u-o-r? Gritou o mais que pôde. Acordou com batidas fortes na porta de seu quarto. Tirou bruscamente as cobertas que a sufocavam. “Ufa!!! Que bom! Foi apenas um sonho! Quero dizer um pesadelo.” Tomou isso como um aviso. A partir desse dia, ela começou a preparar-se, espiritual e materialmente, para a inevitável e última ocorrência da vida.

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A mansão Morar na capital.Sonho maior dela. Não que a vida lhe fosse ruim. Tinha de tudo. Boa aparência. Apesar das roupas simples. Boa casa, apesar de alugada. Boa vizinhança, apesar de pobre. Vinha de uma família honesta, batalhadora, mas de parcos recursos. Professora de 1º grau precisava de outro meio para completar a renda familiar. A habilidade na confecção de miniaturas de madeira passou de hobby a ajuda bem-vinda. E, em uma feira de artesanato, apresentando seus delicados e originais trabalhos, sua vida mudou. Ela pareceu especial. Era muito especial. A princípio, nos intervalos entre uma e outra seleção musical, ia até sua barraca para admirar os artesanatos expostos. Depois, em feiras seguintes, para observar a artesã. Isso, ela soube mais tarde. Também professor. Só de música. Melhor, de violão. Na verdade, músico e compositor. Tocava em pequenos eventos de fins de semana. Namoro. Noivado relâmpago. Daí para o casamento, um pulo. Não tão jovens, precisavam recuperar o tempo perdido.

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A vida em comum – o que para muitos se torna uma rotina inodora e insípida – para eles significava uma enigmática caixinha de surpresas, um kinderovo no falar da geração atual. Os parentes dele, até então, ela só conhecia pelo relato que ele fazia: avós, pais e tios falecidos; um único irmão, domicílio incerto e não sabido; primos e filhos de primos, espalhados pelo mundo afora. A herança fora distribuída. Os imóveis transformados em dinheiro. E como dinheiro é água se escoando pelos vãos dos dedos... só restou a velha mansão abandonada. Ninguém quis saber dela. Certa ocasião, ambos conseguiram se apresentar em uma grande feira de artesanato na capital. Ela ia mostrar seu mundo miniaturizado. Ele, sua arte instrumental e vocal. Mochila nas costas. Carro Velho. Pé na tábua. Arranjaram um alojamento barato. Tipo albergue estudantil. Vendas boas. Shows concorridos. Nem tempo tinham de se verem. Só tarde da noite, quando caíam na cama. Para dormir, é claro! O cansaço era maior do que o desejo de sexo. Isso eles gostavam de fazer, sossegados, em casa. Encerramento da Feira. Pessoas se acotovelando para garantirem um lugar. A fama de um desconhecido violonista e cantor era o motivo dessa disputa de espaço.

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