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Carvalhedo, Rodrigo Gemeologia : o dilema / Rodrigo Carvalhedo. - São Paulo : Baraúna, 2011. Índice ISBN 978-85-7923-341-8 1. Ficção brasileira. I. Título. 11-4328.
CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3
13.07.11 19.07.11
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Dedicatória
Para Bia, que está ao meu lado me puxando da escuridão sempre que eu fraquejo, para que eu nunca desista dos meus sonhos (sempre estarei aqui para lhe puxar também). E para Débora, que, mesmo com sua agenda cheia, com carinho, amor, atenção e sua pressão alta, acompanhou o desenvolver da Gemeologia.
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Não te rias de mim, meu anjo lindo! Por ti — as noites passei chorando, Por ti — nos sonhos morrerei sorrindo! Álvares de Azevedo
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Prólogo
O
aposento se iluminava somente com a ajuda de um abajur pequeno, e que não conseguia clarear nem metade do escritório. Sentada, estava uma mulher loura cheia de olheiras ao telefone. — Sim, está tudo confirmado, materiais para a segurança e para a interatividade, informações, tudo perfeito. — ela afirmava com entusiasmo, embora seu rosto expressasse cansaço. Ela olhou para o relógio, onze e quarenta e dois, quase meia noite e ainda trabalhando. Ela ouvia a voz do outro lado da linha atenciosamente, anotando uma coisa aqui, outra ali. — Tudo bem, obrigada. Tenho certeza que eles adorarão. — ela disse forçando um sorriso — Boa-noite, tchau — com isso, ela jogou o telefone no gancho — Enfim! Descanso — ela conseguiu falar. — Nada disso! — disse uma voz rouca que vinha de um canto da sala — Eu disse que você tinha que pegar minha comida! Você sabe que não posso entrar na cozinha.
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Ela se virou para a escuridão fingindo ver algo. Sem dizer nada, levantou-se silenciosamente e deslizou até a porta, a abriu e saiu para o corredor. Luzes fluorescentes e barulhentas caracterizavam o corredor, cantos sujos e paredes descascando concluíam o ar macabro. A moça podia ouvir os passos apressados daquele que a acompanhava. — Agradeço que venha comigo, senhora! — ela o olhou. Uma criatura com um metro de altura, pele esverdeada, olhos saltados e cabelos escuros e secos, tinha uma aparência de sofrimento e infelicidade. Parecia que tais sentimentos eram refletidos no ambiente, como se o contaminassem. — Não há de quê — ela disse rispidamente, mostrando superioridade, sem demonstrar a compaixão que sentia internamente. Andaram por alguns corredores até chegarem em frente a uma porta branca e limpa, por isso diferente de todas as outras. Ela passou pela porta, só ela. A criatura ficou lá atrás, observando-a. — Pegue, e não me perturbe mais! Preciso trabalhar! — a mulher disse ao sair da cozinha com um prato de cogumelos para a criatura. — Você disse que ia descansar, mentirosa! — ele cuspiu as palavras e seguiu na direção oposta a ela — Eu que vou trabalhar. De volta a sua sala, trancou a porta, e ligou a luz. O aposento agora estava todo iluminado, deixando visíveis muitos móveis com pastas e documentos. ela se dirigiu até um que estava no canto da sala, abriu uma das gavetas e puxou de lá de dentro um livro antigo. — Não entendo por que tenho que fazer isso — resmungou para si mesma. Ela abriu o livro empoeirado, devia ter por volta de trinta anos. Colocou em cima da mesa e se sentou, viu informações e fotos daquele cliente — Está na hora — logo em seguida leu: 10
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Experimento 1
Os experimentos feitos em laboratórios com B, apontaram uma possível miopia. Para efeitos positivos de A, B foi submetido a testes até se achar uma situação envolvendo armas de fogo e o desvio da mesma para a solução de tal problema. O aperfeiçoamento deste fator é essencial, logo mesmo na ausência deste problema em A, este teste será realizado. Instrumentos: Arma de fogo. Local: Ambiente escuro. Fatores: Iluminação causando visão do objeto da resolução (A), falta de tal iluminação (B). Emergência: Paramédicos por perto e ambulância pronta para agir (A), ambulância profissional (B). Resultado: A: --B: Ferimentos com fraturas na mandíbula, hemorragias, porém todos resolvidos com a ajuda da ambulância profissional. 11
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Capítulo 1
S
aul acabava seu dever de casa deitado na cama e ouvindo música, distraído pelo fato de finalmente estar falando com a menina dos seus sonhos na escola, por causa de uma excursão que ele disse que a acompanharia. Estava somente esperando que sua mãe entrasse em casa para que ele pudesse pedir que o deixasse ir a tal excursão. Levantou um pouco o rosto para ver sua mãe, sentada no balanço preso no galho do carvalho do quintal da casa, fumando e chorando como ela fazia quase todas as tardes. Ela fazia isso desde que Saul podia se lembrar, por isso estava acostumado, embora fosse uma cena muito triste. Ele queria poder fazer algo, mas nada sobre a tristeza crônica de sua mãe nunca lhe fora revelado, então ele se sentia um inútil em relação a isso. Para tirar o olhar do quintal, virou-se para o seu quarto, observando o computador obsoleto, o banheiro pequeno, as estantes de madeira envelhecida, o criado-mudo com o abajur simples ali, as paredes de um amarelo desbotado. Não era uma 13
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visão tão bonita, mas ele sabia que não deveria reclamar, pois havia gente com muito menos. Seu quarto ficava no segundo andar e tinha uma parte do teto de vidro, o que lhe permitia uma visão bonita à noite. Saul soltou o lápis e deitou na cama, olhando para cima. As luzes do sol se pondo estavam bonitas, românticas, ele diria, mas essa não seria exatamente uma palavra viável no ambiente de sua casa. As luzes iam gradativamente desaparecendo, quando ele ouviu o barulho familiar da corda do balanço sendo puxada, ele se virou para a janela redonda ao lado de sua cama para poder ver sua mãe se levantando. Seu rosto se iluminou: — Finalmente! — exclamou enquanto se levantava de um salto e pegava o papel da autorização da excursão. Tropeçou em seu tênis ao sair do quarto, fazendo barulho ao pisar no corredor. Desceu as escadas rapidamente e encontrou sua mãe na cozinha acabando de preparar o jantar, que não parecia muito bom. Ela se virou silenciosamente enquanto ele entrava na cozinha. Seu rosto era marcado pela velhice agindo junto com a tristeza, olheiras fundas provenientes de noites chorando, rugas por todo o rosto e pés-de-galinha. Ela não estava em condições boas, e Saul ficava triste com isso. — Mamãe — ele fingiu se animar ao vê-la —, queria saber algo: se eu podia ir a uma excursão para o Laboratório de... — Sim, pode. — ela o interrompeu com um tom impaciente — Me dê o papel — Saul o entregou e ela assinou rapidamente com uma caneta que estava próxima, devolveu-lhe. — Obrigado — ele agradeceu calmamente, e subiu as escadas. 14
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Quando chegou ao seu quarto, a felicidade estampava-se no rosto, não podia se conter. Decidiu ir contar para seu melhor amigo — Mateus. Foi até o banheiro e parou na frente do espelho e se olhou por um tempo. Estatura média, corpo de porte médio, olhos bem escuros — os herdara do pai, aliás, muito ele herdara dele —, cabelos negros com trechos um pouco claros, e um sorriso no rosto pelo acontecimento da manhã. Arrumou o cabelo, deixando-o ainda mais bagunçado, assim como ele gostava. Desceu as escadas novamente e enquanto passava pela cozinha, gritou: — Estou indo na casa do Mateus, mamãe! Ela nem respondeu, mas ele sabia que poderia ir. Saiu correndo da casa virando para a direita na rua, chegou à avenida, que estava movimentada pelo horário de saída do trabalho, e atravessou a pista. Continuou seu caminho virando para a direita. Ele observava as pessoas enfurecidas dentro de carros, aquela movimentação nas ruas, pessoas correndo apressadamente, mendigos pedindo dinheiro. Mas ele não ligava para nada ali, não via o tempo passar, estava em torpor de felicidade. Virou depois de dois quarteirões para a esquerda, vendo um supermercado iluminado e lotado. Atravessou pela faixa de pedestre que havia na frente do supermercado e continuou seu caminho, cortando a multidão que saia e entrava da loja. Chegou então na rua de seu amigo e continuou andando, passando por becos sem iluminação até ver a casa de Mateus. Ela era pequena, mas muito organizada, jardim bonito e bem cuidado, janelas limpas, portas recém-compradas. Tocou a campainha que ficava ao lado da porta. 15