Pesadelos do coração - Quando Perdoar é a Única Maneira de Prosseguir

Pesadelos do coração

Quando Perdoar é a Única Maneira de Prosseguir

Michelle Werder

Pesadelos do coração

Quando Perdoar é a Única Maneira de Prosseguir

São Paulo 2013

Copyright © 2013 by Editora Baraúna SE Ltda Fotografia da capa Renata Cabral Modelo Ana Cris Violato Projeto Gráfico Aline Benitez Revisão Priscila Loiola

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________ W517p Werder, Michelle Pesadelos do coração : quando perdoar é a única maneira de prosseguir / Michelle Werder. - São Paulo : Baraúna, 2013.

ISBN 978-85-7923-676-1 1. Romance brasileiro. I. Título.

13-0994.

CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3

15.02.13 19.02.13 042813 ________________________________________________________________

Impresso no Brasil Printed in Brazil DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br

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Quero agradecer, em primeiro lugar, a Deus, que, tenho certeza, dotou-me da capacidade de pensar e criar. Eu não seria nada sem Ele. Agradeço também ao meu marido, Wallace, que não mediu esforços para incentivar-me a escrever. Amo você!

Não posso esquecer de maneira alguma minha mãe, Míriam, que foi fantástica durante toda a minha vida. Suas dicas e sugestões foram muito bem recebidas e aceitas.

Com certeza, agradeço também ao meu pai, meu irmão e amigos. Cada um teve seu papel em diferentes momentos, o que jamais esquecerei.

Obrigada!

Prólogo

R

achel estava sentada em sua cama, abraçada aos seus joelhos, e com seus pensamentos voando para bem longe dali.

Ela ainda não acreditava na forma como tudo aquilo ocorrera e sentia vontade de chorar. Mas ela não podia chorar. Não podia deixar que tudo que havia acontecido nos últimos meses a afetasse dessa forma.

Ela sentia-se perdida. Estava sem rumo, e isso a perturbava. Ela precisava escolher. Todas as coisas estavam tendo seu fim ali, enquanto ela olhava ao seu redor. Tudo a sua volta indicava como sua vida havia mudado. Mas e os seus sentimentos? Seu coração ainda disparava ao vê-lo, e quando ele disse aquelas coisas durante o almoço, ela percebeu o que precisava fazer.

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Capítulo Um Desde que nascera, Rachel fora mimada e cuidada.

Até o dia em que perdera seu irmão mais novo num acidente de carro, ela era a garota mais feliz que qualquer um podia conhecer. Amava ler, pois gostava de embarcar nos mundos diferentes e desconhecidos de todos aqueles livros que ganhava de seus pais.

Porém, não sabia lidar com a perda. Não acreditava que a vida pudesse pregar uma peça que doesse tanto.

Perder seu irmão aos 18 anos havia feito com que Rachel se tornasse uma garota melancólica.

No entanto, ela não perdeu seu brilho. Não perdeu aquela postura de garota forte que todos viam. Ela era capaz de guardar toda a melancolia para si mesma, e prometeu que jamais deixaria alguém penetrar nessa parte do seu mundo.

Ainda assim, era injusto. Em todos aqueles livros, lia histórias que a vida criava, mas todos os finais eram 8

felizes. Por que com ela a vida tinha que inventar? Ela sabia que aquele era o mundo real. Não imaginava, nem em sonho, que perderia seu irmão tão cedo. Uma criança tão doce, um menino tão cheio de vida.

Mas o pior de todos os seus pesadelos se realizara.

Ela sentia tanta falta daquele baixinho! Várias vezes surpreendera-se pensando nele, mas a dor da perda fez com que Rachel decidisse não falar mais sobre o irmão. Ele viveria apenas em suas lembranças. Ela só esperava que jamais esquecesse seu rosto.

A vida tinha que seguir. Era isso o que todos diziam.

Mas será que eles sabiam o que estavam lhe pedindo? Afinal, por que continuar com a sua vida se a vida de John se acabara? Esses eram seus pensamentos, ao menos na maior parte do tempo após o acidente, mas a vida realmente continuou.

Oito anos se passaram desde então, e Rachel tinha aguentado firme. Era o que todos pensavam, principalmente seus pais. Ela era a gerente de uma empresa de contabilidade, e tudo indicava que só poderia crescer. Vivia na capital da maior metrópole da América Latina e realmente sabia lidar com a correria da vida em São Paulo.

Era até difícil de lembrar que havia nascido em uma cidadezinha no interior da Carolina do Norte, EUA, pois não conseguia mais imaginar como seria a vida fora da cidade grande.

Em contraste, porém, com essa vida, Rachel era uma mulher calma, segura e que demonstrava sua to-

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tal confiança em si mesma. Era independente e corria atrás do que queria, independentemente do que precisasse fazer. Morava em uma casa no bairro Jardins e vivia muito bem.

Sonhos? Após a morte de seu irmão, quase todos eles se foram. Rachel passou a se concentrar no que ela poderia fazer sozinha, pois não tinha mais vontade de depositar esperanças em pessoas que poderiam magoá-la.

Porém, um sonho não morreu. Ela até tentou livrar-se dele, mas ele se recusou a ir embora. Era como se tivesse vontade própria, e ela finalmente aprendeu a lidar com ele. Deixou-o de lado, se dedicou aos estudos e ao trabalho, e chegou onde chegou pensando nele apenas quando ele teimava em aparecer, e, agindo como se pudesse enganá-lo, guardou-o no mais distante dos seus pensamentos, duvidando que um dia fosse se realizar.

— Rach, você está sabendo dos boatos de hoje cedo? — perguntou Carol, sua colega de trabalho e confidente fora dali.

Rachel havia conhecido Carol logo que entrara na empresa. As duas começaram como secretárias e, cada uma do seu jeito, cresceram em suas áreas. Rachel era contadora e logo que terminou a faculdade subiu de cargo, até gerenciar o lugar. Carol era psicóloga e se especializou em RH e também se tornou chefe do setor. Elas se davam muito bem, e a única coisa que incomodava Rachel era quando Carol agia como psicóloga no meio de

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suas conversas. Carol era elétrica. Falava pelos cotovelos e era a pessoa mais transparente que Rachel conhecia.

— Não me contaram nada ainda, Carol — disse Rachel, enquanto levantava o olhar e focava sua amiga parada em pé, na porta de seu escritório. — É alguma coisa grave, ou só descobriram mais algum funcionário que está tendo um caso com a secretária?

Rachel sorriu, e Carol fez aquele olhar de reprovação misturado com graça que ela conhecia tão bem.

— Não tem nada a ver com um caso, Rach. Se bem que o Fred ta de papinho com a secretária do Raul há algum tempo. Será que sai alguma coisa dali?

As duas gargalharam juntas, e de repente Rachel parou.

— Por que será que o ser humano é assim? Quer viver fazendo besteira, então não casa! Não sou ninguém para julgar, mas pelo menos não engana o outro, não é?

— Rach, esquece isso — Carol falou enquanto desencostava da porta e entrava, se acomodando na cadeira em frente à mesa de Rachel. — Ouvi falar que o Júlio vai se aposentar.

Júlio Cardoso era o dono da empresa. Um ótimo patrão e um excelente homem. Priorizava a família e sempre foi justo em seu trabalho. Ainda era o presidente da CardosoContábil, e com ele se aposentando, quem ficaria no seu lugar? Júlio tinha três filhos. O mais velho, Fernando, era o único casado e pai de duas meninas. Era empresário e certamente herdaria a empresa do pai. Porém, ele estava na Europa, com o irmão mais novo, Kevin, para abrir uma filial em Roma. Estariam voltando? Mas ele não foi para lá com a intenção de ficar pelo menos dois anos? Será

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que algo deu errado? Os pensamentos de Rachel invadiam sua mente mais rápido do que ela conseguia controlar.

— Mas, Carol, o Fernando não volta tão cedo da Europa. Quem é que vai ficar como presidente dessa unidade?

— Ouvi por aí que será o Christian. Me parece que ele andou aprontando muito em Nova York e o pai o quer por perto. Parece que é um moleque, e o Júlio quer tentar colocá-lo na linha.

Rachel não conhecia Christian, mas já ouvira falar de sua fama. Era o oposto de alguém responsável, era grosso e mimado. O pai o mandara a Nova York para estudar, e quase sempre ouvia sobre os desastres que ele causava por lá. Será que dar a ele o cargo de presidente da empresa da família resolveria o problema? Rachel duvidava.

Carol continuou a tagarelar, como sempre fazia ao ouvir uma fofoca, e os pensamentos de Rachel começaram a voar. Será que tudo, afinal, não seria apenas isso, uma fofoca? Apesar de que... Será? Ela conhecia Júlio. Ele não faria uma coisa dessas de repente. Mas... quem sabe não era tão de repente assim. Ela sabia que ele não estava mais tão bem, pois sua saúde já não era mais a mesma, mas... largar a presidência? Ela não podia acreditar.

Rachel olhou para uma foto na parede. Seu escritório era o segundo cantinho mais aconchegante para ela naquela empresa. Ela adorava seu trabalho. E, principalmente, amava de verdade o seu chefe, como se ama um pai.

Quando ela entrou na faculdade, já conhecia a fama da CardosoContábil e disse para si mesma que trabalharia ali.

Júlio viu sua garra. Ele notou que ela era tudo o que uma garota de 18 anos deveria ser. Sabia que uma

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secretária com essa idade poderia se tornar um problema, mas ela não. Tinha alguma coisa nela que ele não sabia o que era, mas sabia que era muito bom. Ele a ensinou. Dedicou-se a ela da mesma forma que se dedicava aos seus filhos. Fez com que ela se tornasse a contadora mais eficiente daquela empresa. E agora iria embora. Não! Ele não pode ir! Era como se ela estivesse aprendendo a andar e seu pai a soltasse, esperando que ela caminhasse sozinha. Mas ele não podia soltá-la. Não ainda. Não nunca!

Seu telefone tocou. Carol parou de falar, e só aí, Rachel se deu conta de que ela ainda estava lá, sentada na sua frente, contando uma porção de coisas sobre... o que era mesmo? Ela não ouviu.

— Rach, o telefone. Não vai atender?

Rachel o tirou do gancho e o levou até seu ouvido.

Permaneceu olhando para o retrato na parede. Um retrato dela ao lado de Júlio, abraçados e sorrindo, em um dos aniversários dela, em que haviam feito uma festa na empresa.

— Alô? — ela permaneceu imóvel enquanto ouvia.

De repente, se levantou. — O.k., Júlio, estou subindo.

Carol já estava ao lado da porta e continuava a tagarelar sobre as fofocas e sobre as especulações de como seria esse Christian.

Rachel saiu, fechando a porta atrás de si, e caminhou até o elevador. Carol falou uma última coisa sobre querer saber de tudo depois e virou-se em direção à sua sala.

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Rachel subiu um andar e se viu parada em pé, em frente à porta da sala da presidência. Bateu. Ouviu lá de dentro uma voz mandando que entrasse.

— Bom dia, Rachel — Júlio estava sorrindo, e seus cabelos lisos e grisalhos pareciam desenhar histórias para contar.

— Bom dia, Júlio. Você queria conversar comigo, imagino que é algo importante — ela forçou um sorriso com o canto dos lábios e se sentou.

— É, Rachel, eu preciso falar com você, e é algo importante. Acredito que você já tenha ouvido comentários a respeito, mas, com você, eu queria falar pessoalmente.

Vou deixar a empresa. Acho que chegou a hora de eu me aquietar um pouco.

— Sei — disse Rachel, a voz fria.

— Estou trazendo meu filho Christian de volta de Nova York. Ele assumirá meu lugar. O que você acha?

— Não sei o que dizer, Júlio. Não conheço Christian. — Rachel parecia impenetrável. Demonstrava segurança como na primeira vez que Júlio a vira. Só que, agora, mais velha, mais madura.

— Eu sei que você não o conhece. E sei também das coisas que já ouviu sobre ele. Mas ele é um bom garoto — Júlio falava como se estivesse ainda vendo seu filhinho, esquecendo-se de que ele não era mais o “menino” de 22 anos que mandara para Nova York alguns anos atrás. — Christian merece uma oportunidade, e eu preciso dele agora. Minha saúde não é de ferro. Eu não tenho mais 20 anos.

Rachel olhou com carinho o rosto daquele homem.

Homem que era seu exemplo.

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— Eu sei, Júlio. Tenho medo de pensar nessa empresa sem você. É só isso. Mas quando Christian chega?

— Ele já está aqui. Não na empresa, mas chegou a São Paulo ontem. Essa semana vou deixá-lo a par de tudo aqui e de como as coisas têm funcionado todos esses anos. Talvez ele venha aqui no final dessa semana para reconhecer o território — Júlio fez uma pausa. Sorriu.

Olhou em volta, observando todas as suas coisas distribuídas de forma organizada em sua sala. Olhou para o porta-retrato em cima da mesa. A foto era a mesma do quadro na parede da sala de Rachel. Olhou para ela e sorriu com ternura. Seus olhos verdes e seu cabelo escuro faziam um contraste que qualquer um parava para admirar. Seu cabelo era comprido e cheio de cachos, e ele não pôde deixar de pensar que ela era a filha que ele tanto sonhou em ter, mas, ao invés disso, tinha tido apenas filhos homens. Ele os amava, mas sempre achou que teria a ternura de uma garotinha. Ela era essa garotinha. — Rach, você é a pessoa aqui que mais entende essa empresa, às vezes chego a pensar que você a compreende melhor que eu. Quero pedir sua ajuda. Viva essa empresa da mesma forma que viveu até hoje. Mostre para o Christian que ele precisa amar o que faz, da mesma forma que você ama.

Rachel voltou para sua sala e sentiu um frio na espinha. Era segunda-feira, e ela não esperava ter tido aquela conversa com Júlio tão cedo. Ela não esperava ter tido aquela conversa com Júlio nunca.

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