Quando o
Homem ama
Silvio Cesar Fogaรงa
Quando o
Homem ama
Sรฃo Paulo 2012
Copyright © 2012 by Editora Baraúna SE Ltda Capa e Projeto Gráfico Aline Benitez Revisão Bianca Brione Diagramação Monica Rodrigues
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________
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Fogaça, Silvio Cesar Quando o homem ama/ Silvio Cesar Fogaça. - São Paulo: Baraúna, 2012. Índice ISBN 978-85-7923-549-8 1. Romance brasileiro. I. Título. 12-2379.
CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3
16.04.12 20.04.12
034731
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Prefácio Na obra Quando o homem ama o autor retrata em forma de romance a base da vida que é o amor a transformação e o perdão. Essa tríade, num conjunto existencial mostra a dificuldade para o homem num simples caminhar nas trilhas do sentimento. Os caminhos da vida levam o homem a desvendar as cortinas do tempo. Rasgar as vestes que envolvem a cegueira quando este persegue seu objetivo. Embriagado pela cegueira, nada vê, nada ouve, nada sente. O amor não se resume ao ato sexual, mas a um sentimento de respeito, de carinho de cumplicidade. O leitor ao mergulhar nas entrelinhas observará o poder do amor quando o homem ama. Estão explícitas as transformações que harmoniza o pensamento, desejos com atitudes de conquista num misto de confiança, fé e coragem. O poder do perdão que afasta a mágoa, o ressentimento e transforma o ódio em bem estar físico e emocional. O relato da história transborda a taça da vida num envolvente romance, com encalços positivos e negativos onde relata que para transbordar de amor é preciso amar e é preciso ter amor para poder partilhar. Para ser feliz é 5
preciso analisar os limites. “... já me perdi nos braços da ilusão e o amor me tragou, sem que houvesse caminho de retorno”. Para ser feliz é preciso conhecer-se para depois conhecer o outro. Todas as dificuldades vividas pelos personagens possuem caráter reflexivo, pois tanto o amor ou desamor se transformam nas etapas da vida. Nada é para sempre. É possível criar e recriar constantemente. Rever os resultados obtidos de suas decisões e traçar novas metas. Recriar significa estar aberto a novos planos e ideais. É preciso compreender cada etapa, pois somente dessa forma é possível conduzir ao sucesso tendo uma relação feliz com o mundo físico, espiritual e humano. Ouça a voz do coração para caminhar nas íngremes da existência. Nada é mais triste do que um sonho esmagado, orgulho ferido e futuro incerto. Exista para bailar com a música da vida. Toda melodia tem seus passos e no descompasso da dança invente formas de rodopiar com a música da vida. Reflita sobre a história Quando o homem ama e encontrará os caminhos para a felicidade.
Marli Comunello
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Eram oito horas da manhã. Raul estava no bar, aonde ia de costume, a sentir o severo frio que fazia. Não, não havia lugar mais propício para ele estar naquele dia, um dia denominado tenebroso. Suas mãos sem luvas agarravam firmemente um copo de conhaque, seus olhos contemplavam a vidraça que o separava do vento cortante que, incessante, soprava do lado de fora. Tudo parecia harmonioso, as folhas que balançavam com o vento, secas e esturricadas, entre um detalhe e outro, mais um trago de conhaque. Nada dizia, sua aparência não era das melhores, seu único companheiro era o copo, seu único movimento era ao virar a garrafa até o copo e este até a boca. O silêncio reinava, nada além do rodo de José limpando o chão. José, por ser um velho conhecido de Raul, conhecia-o o suficiente para saber que não queria dizer nada, mesmo assim, ainda tentava... — O que você acha do campeonato brasileiro este ano, Raul? Seu time está indo bem até agora... — Não sei, Zé, mas... — calou-se. — Mas? — Incitou José. — Deixa pra lá. — José logo percebeu que o caso era pior do que parecia, pois quando Raul chegava a ponto de não comentar futebol é que algo o molestava realmen-
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te. O relógio já marcava nove horas, Raul permanecia inerte, sua garrafa já estava pela metade. Naquele momento dois sujeitos entraram no bar, passaram por José apenas cumprimentando indo direto onde estava Raul. — Raul? — Perguntou um deles. — Sim... O que vocês desejam? — Somos conhecidos do Augusto, na verdade, clientes. Pelo que vejo você está com a vida ganha, em plena segunda-feira curtindo uma bebidinha. É a vida que pedi a Deus. — Raul atingiu o homem com um soco no nariz jogando-o de costas a algumas cadeiras. Seu companheiro apressou-se em socorrê-lo ajudando a colocá-lo em pé. — Você está louco, cara, eu lhe disse algo que fosse uma ofensa? Vamos embora Mauro, este cara é doido varrido. — No mesmo instante Augusto entrou no bar e foi onde os três estavam. — E aí, rapazes, vejo que já se conhecem. — Como vai Raul? — Sim, nos conhecemos e isso já é motivo suficiente para irmos embora. — Espere aí, Marcos, vamos conversar lá fora. Augusto saiu com os dois enquanto Raul permanecia no mesmo lugar, apenas olhando os dois estranhos a sair do bar. — Então foi isso que aconteceu Augusto, o cara é um animal, me recuso a tratar de qualquer coisa com ele. De mais a mais, nós estávamos em dois lá poderíamos fazer mais a ele do que um simples soco— disse enquanto segurava um lenço no nariz. — Mas você disse isso a ele? Foi um humor usado
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em péssima hora, o cara está lá se embriagando por que acaba de falir. Marcos arregalou os olhos e disse: — Foi por isso que ele me bateu? Pelo menos o motivo é justo, foi mesmo um azar brincar em hora tão imprópria. — Sim, vamos voltar e fechar o negócio, afinal, as condições valem até mais que um soco. Como se nada tivesse acontecido os três voltaram ao interior do bar. Raul ainda estava no mesmo lugar, seu rosto continuava a transmitir a inegável tragédia. Em um gesto simples e vagaroso Marcos estendeu a mão a Raul. — Desculpe pelo ocorrido, Raul, às vezes sou cômico em horas impróprias, sinto por tudo. Raul olhou para aquele homem desconhecido em sua frente, mantendo-se alguns segundos em silêncio. Augusto por sua vez mostrava-se apreensivo, nada de anormal para um corretor de imóveis que precisa de um acordo entre duas pessoas para que possa receber a comissão da venda. — Está bem, vamos conversar então. — disse Raul. — Que maravilha, pessoal, vamos ver a casa. Para Augusto, a venda do imóvel era muito importante, pois aquela era sua maior e mais difícil negociação. Apesar da experiência de Augusto em vendas de imóveis, não foi fácil achar uma pessoa interessada em uma casa que tem como visão de sua sacada um cemitério. Foi uma tarefa árdua e não podia ser desperdiçada, pois iria pôr por terra seis meses de ininterrupta procura. Parecia loucura, mas Marcos estava ali justamente pelo fato do cemitério. Mesmo intrigado Augusto mostrava muita excitação, pois além de ser um grande negócio também
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poria fim às muitas chacotas que constantemente sofria, após estar incumbido de vender a estranha propriedade. Depois de percorrer de carro, uma distância de 70 km, chegaram a um local sombrio e afastado da cidade... — Bom, o lugar é este, pessoal. — disse Augusto. — É meio estranho, mas com certeza é o melhor lugar da cidade e região, isso em razão do conforto que a propriedade proporciona, é claro... — Explique as dimensões do local, Augusto. — Solicitou Marcos. — Bem, a casa é bastante espaçosa, tem quinze quartos sendo sete suítes. É uma monstruosidade pra ninguém botar defeito. Entrando na casa, Marcos apreciava o ambiente, todos se dirigiram até uma sacada para verem a propriedade do lado de fora. Não havia harmonia alguma, pois a vista do cemitério era totalmente oposta da paisagem do quintal. A imagem do cemitério transmitia a visão da morte, já o quintal era um ambiente alegre com flores coloridas e serafins adornando o chafariz e a piscina. — Raul, eu preciso que me responda uma coisa... — disse Marcos intrigado. — O quê? — Respondeu Raul. — O que levou você, com sua personalidade decorativa angelical, a construir esta casa aqui, ao lado deste cemitério, longe da cidade? Raul simplesmente sorriu e se aproximou da sacada junto a eles... — O fato desta atitude foi justamente minha personalidade angelical.
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— Como assim? — Indagou Marcos. — É pura reflexão, a propriedade sempre me trouxe conforto e sua bela paisagem composta pelo cemitério me faz meditar em coisas boas. — Não entendo, Raul, que pensamentos bons poderiam fluir em uma mente que contempla um cemitério? — A explicação toda está nas palavras de um sábio da antiguidade, “é melhor estar na casa do luto que na casa da alegria”, é uma verdade.— Mauro interrompeu a conversa chamando à atenção de Marcos para os serafins que estavam no pátio. — O ambiente nos agrada, Marcos, basta trocar aqueles anjos por gárgulas e coisas parecidas. — Naquele momento Augusto também expôs sua curiosidade... — Mas por que vocês querem esta casa afinal? A explicação de Raul até que é aceitável, já vocês querem tirar o que há de normal tornando o ambiente ainda mais sinistro do que já é? Marcos e Mauro riram muito. Era inevitável, principalmente a eles que eram visivelmente bem-humorados. — Parece piada, Augusto, o fato é que queremos esta casa para fazer algumas filmagens e depois queremos investir em encontros góticos, o mundo está cheio de magnatas que se autodenominam excêntricos dispostos a pagar um alto preço pela exclusividade. — disse Marcos. — Exato, pagando bem, que mal tem? — Completou Mauro. — Então o caso é puramente financeiro? — É! — Confirmou Marcos.
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— Que bom, por um momento eu pensei que o fato fosse mais sinistro. — Então, o valor é aquele mesmo? — Perguntou Mauro. — Sim, Mauro, o valor é o que foi combinado. — Isso é muito bom, vamos até a cidade para fecharmos o negócio. — disse Mauro. Imediatamente rumaram para cidade. Augusto por sua vez estava muito animado. A venda do imóvel não só lhe renderia uma ótima porcentagem como também poria fim a seu apelido de “corretor do além”. Raul, no entanto, estava com o aspecto cada vez mais decaído, era visível que a venda da casa lhe abatia ainda mais. Com exceção de Raul, todos conversavam muito no caminho de volta, Marcos se sentia bem com a compra e não conseguia ficar quieto nem por um instante. Chegando a cidade foram direto ao cartório, onde os papéis já estavam preparados. — Bem, rapazes, agora, é só assinar os documentos. — Disse Augusto sem conseguir disfarçar sua euforia. — Sim, inclusive o dinheiro já está aqui. — Confirmou Marcos. — Mas você trouxe o dinheiro com você? — Perguntou Augusto. — Sim, está no carro. — Respondeu Marcos. — Você tem ideia do risco que corremos trazendo esta dinheirama no carro? — Claro, mas eu quis evitar o trabalho de ter de buscá-lo na capital, então trouxe comigo, afinal, aqui no interior não há casa de câmbio.
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— É muita coragem. — Disse Augusto. — Sim, mas quem iria dizer que temos dinheiro, ainda mais andando neste carro velho? Deixe isso pra lá, vamos assinar os papéis logo que estou com pressa. Ambos entraram no cartório, os papéis foram assinados. A propriedade finalmente foi vendida pelo valor de quinhentos mil dólares. — Bom, aqui está o dinheiro Raul, ao menos com esta quantia você pode resolver alguns problemas. — Talvez. — Respondeu Raul. — É que Raul está vendendo a casa para poder saldar dívidas de seu antigo negócio. — Adiantou-se Augusto. — Oh, sim... Mas então o negócio foi pior do que imaginava. — Comentou Marcos. — Tive problemas com uma pessoa, que julgava, de absoluta confiança e sofri uma decepção que fulminou minha empresa. — Explicou Raul. — Meu Deus... E qual foi o tamanho do rombo. — Perguntou Mauro. — Foi de exatamente quatrocentos e quarenta e cinco mil dólares. — Isso é um absurdo, mas e agora, o que pensa em fazer? — Nada, pagarei minha dívida e irei embora deste lugar. — Bem, de qualquer forma lhe desejo felicidades e boa sorte. Até mais, Raul! Foi um prazer negociar com você. — Até... Mauro e Augusto entraram no carro e se foram. Raul no mesmo instante se apressou em ir até a cidade vizinha saldar suas dívidas. Enquanto Marcos ia embora contente
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por ter pagado quinhentos mil em uma casa que no mínimo valeria o dobro. Raul pensava na maneira mais viável de pagar suas dívidas sem que viesse a ficar sem dinheiro ao menos até ter tempo de se arranjar de alguma forma. Ao falar com cada pessoa a qual devia, passou todo o mês somente a negociar, mas poucos lhe deram algum tipo de desconto. Quando terminou de pagar a todos só lhe restava setenta mil reais, um pouco mais do que ele havia previsto. Raul se sentia desnorteado. Considerava a região imprópria para morar. Decidiu tomar rumo ignorado, qualquer lugar que não lhe trouxesse lembranças de sua antiga vida. Ao quitar a última dívida, Raul, no mesmo instante, procurou saber qual seria sua nova moradia. A princípio nada lhe parecia satisfatório. As cidades grandes não lhe despertavam o interesse, as pequenas, por sua vez, exigiam que se conhecesse melhor o seu potencial econômico para não correr o risco de ir parar em uma cidade fantasma sem movimento financeiro suficiente para se viver. Assim Raul se via em um dilema. Não bastassem todos os problemas que o assombrava ainda tinha de se preocupar para onde ir. No entanto, nada importava ou deixava de importar para Raul. O momento era amargo às lembranças más, que diferença faria ir aqui ou ali? Tudo seria praticamente igual... Caminhava em seus passos de pesar, pensando ao mesmo tempo em que, tudo que mais queria era não pensar, ao mesmo tempo em que queria esquecer-se da própria existência por um instante. Precisava de uma ideia, então foi até uma banca de jornal e comprou uma revista turística a qual lhe chamou atenção.
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— Talvez isso ajude a tomar alguma decisão. — Disse consigo enquanto caminhava em meio ao vento cortante à procura de abrigo. Como de costume, Raul procurou um bar bem fechado e discreto no qual poderia tomar sua bebida favorita, conhaque... Ao entrar em um bar Raul colocou-se a folhear sua revista ao sabor de seu conhaque, na verdade não lia nada, apenas tentava se distrair. Não conseguia firmar sua atenção nem por um minuto, pois apesar de sua indisposição outro fato colaborava... Uma bela mulher que se encontrava no estabelecimento trocava olhares com ele. Seu presente não lhe dava este luxo, mas um homem nunca e em hipótese alguma deixaria de notar tal ocorrência, mesmo na situação que se encontrava. A bela mulher estava sendo distrativa o bastante para que Raul permitisse que tal fato o confortasse juntamente como efeito do álcool. Após vários dias de tensão finalmente conseguiu relaxar, pensar de maneira mais objetiva, como de costume. — Mas olhe para você. És um vencedor. Chegou onde queria, não houve fracasso, apenas confiança excessiva. — Pensava consigo com um riso para a mulher que lhe agradava a vista. Era sempre da mesma forma, bastava um bom lugar e um bom conhaque para que Raul tivesse condições de pensar no que fazer. Embora suas condições emocionais não lhe permitissem nada de muito eufórico, até a bela mulher ajudou naquele momento. Raul estava mais disposto a tomar alguma decisão, seja esta qual fosse... — Raul, Raul... Não está tudo perdido, você sabe exatamente o que fazer. — Dizia a si, no intuito de se animar.
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