Revista Poder | 146

Page 1


COMING SOON

FRANCK MULLER BOUTIQUE Shopping Cidade Jardim

www.franckmuller.com


AETERNITAS MEGA ™ O relógio de pulso mais complexo do mundo com 1.483 componentes projetados para inspirar inúmeras emoções.



A vida de sua mãe, pai, irmãos vale mais que um happy hour descolado. Não se arrisque. E proteja sua família. TODO CUIDADO SALVA VIDAS. PRÉ-CADASTRO VACINAÇÃO:

www.vacinaja.sp.gov.br


39

22

28

COM QUE ROUPA?

A flexibilização do dress code já é uma realidade e ganha força com a volta do trabalho presencial 32

32

VISÃO ALÉM DO ALCANCE

A economista Lavinia Barros de Castro se firma como uma das principais vozes no debate sobre financiamento ao desenvolvimento do país 36

RESPIRO

A estrela de Aída dos Santos, primeira mulher brasileira a disputar uma final olímpica ESPECIAL SUSTENTABILIDADE

Aderir a um modo de produção em que nada se desperdiça e tudo se transforma é premissa da economia circular

SUMÁRIO 7 8 12

EDITORIAL COLUNA DA JOYCE A ELEGÂNCIA DA DISSONÂNCIA

Decano do STF, ministro Marco Aurélio Mello pendura a toga que vestiu durante 31 anos 18

O VÍRUS DA EXAUSTÃO

55

Liliane Rocha, CEO da Kairós, e a importância de gestão para a diversidade 56

EXPRESSO DO ORIENTE

61 62

64

OPINIÃO

Renato Janine Ribeiro, novo presidente da SBPC, critica o falso antagonismo entre economia e saúde

67

ARMANI JEANS + armani.com DOLCE & GABBANA + dolcegabbana.com EVOKE + evoke.com.br FRATELLI + fratellioutlet.com.br FUEL EYEWEAR + usefuel.com.br HUGO BOSS + hugoboss.com RICARDO ALMEIDA + ricardoalmeida.com.br VELMONT + velmont.com.br ZARA MAN + zara.com

NA REDE: /revista-poder-joyce-pascowitch

Bento Mineiro traduz paixão por queijos na Pardinho Artesanal

@revistapoder

UM CONVITE À PAUSA

/Poder.JoycePascowitch

@_PoderOnline

70

PODER VIAJA

COM VISTA PARA O MAR

Novidades do estaleiro holandês Oceanco para sonhar

OPINIÃO

O advogado Renato Ochman avalia empresariado na pandemia 68

AGENDA PODER

CONSUMO EM MATURAÇÃO

Descanso, detox e treino no Kurotel, um dos melhores spas da América Latina

A executiva Renata Campos incorpora metas e valores da centenária farmacêutica Takeda 27

ENSAIO

Carlinhos Brown fez da pandemia um período dos mais prolíficos

Teoria do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han explica a “sociedade do cansaço” 22

OPINIÃO

MARCO AURÉLIO MELLO POR CRISTIANO MARIZ

74 76 79 80

HIGH TECH CULTURA INC MULHERES QUE AMAMOS ÚLTIMA PÁGINA

FOTOS ROBERTO SETTON, ZÔ GUIMARÃES; GETTY IMAGES

39


......

Castelo

......

Sa i n t A n dr e w s

CASTLE

M O U N TA I N


JOYCE PASCOWITCH

DIRETORA-GERAL JOYCE PASCOWITCH joyce@glamurama.com

EDITORA-EXECUTIVA Carol Sganzerla carol@glamurama.com

EDITOR Dado Abreu

dado@glamurama.com

EDITORES CONTRIBUINTES Carla Julien Stagni carla@glamurama.com

Paulo Vieira

pauloviei@gmail.com

EDITORA DE ESTILO Ana Elisa Meyer

anaemeyer@glamurama.com

EDITORES DE ARTE David Nefussi

davidn@glamurama.com

Jefferson Gonçalves Leal

jeffersonleal@glamurama.com

FOTOGRAFIA Carla Uchôa Bernal

carlauchoa@glamurama.com

Claudia Fidelis (tratamento de imagem) PRODUÇÃO Meire Marino (gestora)

meiremarino@glamurama.com

Wildi Celia Melhem (produtora gráfica)

PUBLICIDADE MULTIPLATAFORMA GERENTES MULTIPLATAFORMA

Laura Santoro

laura.santoro@glamurama.com

Maria Luisa Kanadani

marialuisa@glamurama.com

Roberta Bozian

robertab@glamurama.com

publicidade@glamurama.com – tel. (11) 3087-0200 MARKETING Aline Belonha

aline@glamurama.com

Juliana Carvalho

juliana@glamurama.com

Tânia Belluci

tania@glamurama.com

assinaturas@glamurama.com – tel. (11) 3087-0250 ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS Carlos Melo (Diretor) carlosmelo@glamurama.com

Clayton Menezes

clayton@glamurama.com

Heberton Gonçalves

heberton@glamurama.com

Hércules Gomes

hercules@glamurama.com

Núbia Dias

nubia@glamurama.com

Renato Vaz

renato@glamurama.com

DISTRIBUIÇÃO EM TODO O BRASIL: RAC Mídia – (11) 98145-7822

contato@racmidia.com.br

celia@glamurama.com

CTP, IMPRESSÃO E ACABAMENTO: Gráfica e Editora PifferPrint Ltda.

REDES SOCIAIS Marcela Cartolano

REPRESENTANTES DE PUBLICIDADE Aracaju: Pedro Amarante - tel. (79) 99978-8962 Belo Horizonte: Norma Catão - tel. (31) 99604-2940 Fortaleza: Aurileide Veras - tel. (85) 99981-4764 Porto Alegre: Lucas Pontes - tel. (51) 99309-1626

Inácio Silva (revisão) Luciana Maria Sanches (checagem)

marcela@glamurama.com

Lincoln César (arte)

COLABORADORES Adriana Nazarian, Almir Jr., Cristiano Mariz, Denise Meira do Amaral, Fernanda Bottoni, Fernando Torres, Liliane Rocha, Luís Costa, Marcelo Gomes, Mari Tegon, Nina Rahe, Nivaldo Souza, Paulo Freitas, Renato Janine Ribeiro, Renato Ochman, Roberto Setton, Roncca, Sergio Leo, Zô Guimarães

GLAMURAMA EDITORA LTDA. Rua Cônego Eugênio Leite, 282, Jardim América, São Paulo, SP - CEP 05414-000. Tel. (11) 3087-0200 HUB DE CONTEÚDO A Editora Glamurama presta serviços de branded content para empresas, produzindo e publicando conteúdos customizados em todos os canais do Grupo, como a Revista J.P, Revista PODER, PODER Online e portal Glamurama, além das redes sociais.


PODER EDITORIAL

E

m um mundo meio maluco, meio enfezado, meio covídico, quem preserva o bom senso é rei. E apesar de ser um dos ministros mais divergentes da história recente do STF, Marco Aurélio Mello conseguiu essa proeza. O decano, que se retira da corte neste mês, por chegar à idade da aposentadoria compulsória, revela em entrevista exclusiva à repórter Mari Tegon, colaboradora da PODER, que serviu com “pureza de alma”. Nas fotos de Cristiano Mariz, ele parece mesmo estar com o espírito leve, ainda que não perca jamais a verve e a opinião aguda e corajosa. Para Marco Aurélio, que é contra o impeachment de Jair Bolsonaro, Lula deveria sair de cena, por “já ter prestado serviços à pátria”. Saber se posicionar às vezes requer mais silêncio do que fala, e a jovem presidente da operação brasileira da Takeda, Renata Campos, 44 anos, há quatro nesse cargo, certamente domina a lição. Self-made woman, ela ascendeu na multinacional farmacêutica japonesa, uma das dez maiores do mundo, com faturamento global de US$ 30,3 bi, com mérito, aproveitando oportunidades e chefiando operações na Turquia e na América do Sul. Renata diz que o fato de ser mulher jamais significou dificuldades em sua carreira corporativa, mas sempre quis dar seu “a mais”. Ponto para ela. A economista Lavinia Barros de Castro é outra mulher de destaque. Professora do Ibmec, estudiosa dos movimentos da economia brasileira – e a economia brasileira, mais do que o próprio Brasil, não é para iniciantes –, não cerra fileiras com os arautos do ajuste fiscal, que para Lavinia pode ser uma pedra na recuperação da atividade econômica. O presidente Joe Biden explica. Produzir é um imperativo, mas isso tem seus custos, como esclarece o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, que considera o mundo de hoje como o da “sociedade do cansaço”. Bom que há lugares para parar um pouco e se reciclar, como o spa Kurotel, considerado um dos melhores destinos wellness da América Latina, que PODER foi visitar. E se tiver que voltar ao escritório – sim, ele ainda existe –, saiba qual será o novo dress code do trabalho presencial. Ainda nesta caprichada edição, um especial sobre sustentabilidade e o futuro circular, o filósofo Renato Janine Ribeiro, novo presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a incrível fotógrafa Claudia Andujar, muito ativa aos 90 anos, o arquiteto e designer Jean Gillon e o rompe barreiras Carlinhos Brown, talvez a síntese divergente de tudo o que veio antes aqui. Boa leitura e axé!

R E V I S TAP O D ER . C O M . B R


EDIÇÃO ESGOTADA

Partidos e parlamentares de diversas correntes ideológicas, além de movimentos sociais, entidades e pessoas físicas já protocolaram uma centena de pedidos de impeachment contra o presidente Bolsonaro. Contudo, nenhum deles deve ir para frente sem antes passar por Alagoas. E pela briga entre dois figurões locais. RENAN CALHEIROS (MDB), relator da CPI da Covid no Senado, e ARTHUR LIRA (PP), presidente da Câmara dos Deputados, estão em lados opostos na disputa pelo governo do estado que deverá opor em 2022 os clãs dos alagoanos com maior visibilidade no Congresso Nacional. Com isso, é pouco provável que Lira desengavete um dos pedidos, o que seria uma vitória para Renan. Vale lembrar que os Calheiros e os Lira já estiveram juntos na base dos governos Lula, Dilma Rousseff e Michel Temer. Em 2010, Renan e Benedito de Lira, pai do presidente da Câmara e prefeito de Barra de São Miguel, foram eleitos numa dobradinha para o Senado.

TROCA DE GUARDA

Uma das casas mais míticas e tradicionais do Jardim Europa, bairro mais caro de São Paulo, acaba de mudar de mãos. Parte do espólio de VALENTIM DOS SANTOS DINIZ, fundador do Grupo Pão de Açúcar, foi vendida para o empresário João Alves de Queiroz Filho, conhecido como Júnior, fundador da Hypermarcas, agora Hypera Pharma.

8 PODER JOYCE PASCOWITCH

MEIO A MEIO

As últimas pesquisas eleitorais qualitativas, mais relevantes do que as quantitativas por apresentarem projeções, têm demonstrado, sem exceção, o anseio popular por uma candidatura de centro, a tal “terceira via”, e que seu representante não fosse envolvido em corrupção, não tivesse larga trajetória política (o que excluiria Ciro Gomes do páreo), mas demonstrasse experiência. Os predicados animaram dois nomes: JOÃO DORIA, ainda que esteja em baixa nas pesquisas quantitativas, e LUIZ HENRIQUE MANDETTA, marcado por sua gestão à frente do Ministério da Saúde. O momento é oportuno para os postulantes.

FOTOS GETTY IMAGES; EDILSON RODRIGUES/AGÊNCIA SENADO; LUIS MACEDO/CÂMARA DOS DEPUTADOS; FERNANDO MORAES/FOLHAPRESS; MAURÍCIO NAHAS; VICENTE DE MELLO/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

ALAGADOS

Enquanto o mundo dos negócios segue fora da ordem geral, a artista plástica ADRIANA VAREJÃO não tem do que reclamar. Sua exposição individual Talavera, na Gagosian de Nova York, que incluía pinturas e esculturas inspiradas em uma tradição da cerâmica mexicana, teve todas as obras vendidas. Não sobrou nada.


SEGUNDA VIA

E n q u a n to s e d i s c u te a e ve n t u a l i d a d e d e u m a te rce i ra v i a d i a n te d a p o l a r i z a ç ã o B o l s o n a ro - L u l a , p a r te d o s m ov i m e n to s d e d i re i t a i n s a t i s f e i to s co m a a t u a ç ã o – e a a v a l i a ç ã o n a s p e s q u i s a s – d o p re s i d e n te j á f a l a e m s e g u n d a v i a . O u s e j a : a l a v a n c a r u m s e g u n d o n o m e , m e n o s i d e o l ó g i c o, p a r a e n f re n t a r o re p re s e n t a n te e s q u e rd i s t a – p o s s i ve l m e n te o e x- p re s i d e n te L u l a . A s a r t i c u l a ç õ e s , a i n d a i n i c i a i s , e n vo l ve m e m p re s á r i o s , m i l i t a re s e a l g u n s p o u c o s p o l í t i c o s c o m m a n d a t o. A s r e c e n t e s e s t o c a d a s d o v i c e p re si d e nte HAMILTON MOURÃO n o g ove r n o d o q ual f az par te se riam o s p r i m e i r o s i n d í c i o s d e a p o i o a o p r o j e t o.

SALDÃO

DISTANCIAMENTO SOCIAL

O caso Covaxin e a denúncia sobre um suposto esquema em torno da compra bilionária da vacina indiana pelo Ministério da Saúde esticaram um pouco mais a corda entre governo e Forças Armadas. Sobretudo nos comandos da Aeronáutica e da Marinha. O silêncio e a distância que têm mantido indicam não apoio a BOLSONARO, o que não se pode dizer do Exército, que segue próximo ao capitão reformado mesmo com o nome de um dos seus generais da ativa, EDUARDO PAZUELLO, envolvido na confusão.

ROTEIRO DE VIAGEM

Um dos mais tradicionais restaurantes franceses, o emblemático La Tour d’Argent, nas margens do Sena e famoso pelo pato “ao sangue” numerado, vai realizar em setembro uma venda especial dos melhores vinhos de sua gigantesca cave com mais de 400 mil garrafas – uma das maiores coleções de vinho em restaurantes do mundo, para se ter uma ideia a adega foi avaliada em aproximadamente 25 milhões de euros. O espaço é gerenciado pelo sommelier inglês David Ridgway, que trabalha há mais de 30 anos no local. Fundado em 1582, o La Tour d’Argent era frequentado por Victor Hugo, Richelieu, Napoleão, monarcas e presidentes.

Desvio de rota a cada vez que os bilionários do grupo 3G Capital – Jorge Paulo Lemann, CARLOS ALBERTO SICUPIRA e Marcel Telles – desembarcam no Brasil. O motivo é que os empresários, com residência no exterior, têm evitado transitar pelas grandes cidades. Beto Sicupira, por exemplo, quando chega da Suíça vai direto para a casa que mantém no luxuoso condomínio de Laranjeiras, próximo de Paraty.

INCÔMODO

O arquiteto francês Jean Nouvel, responsável pelo projeto do complexo hoteleiro e residencial Cidade Matarazzo, tenta, tenta, mas não entende: em conversas com proprietários dos apartamentos ele questiona a presença do quarto de serviço – uma idiossincrasia da arquitetura brasileira rara em outras partes do mundo. A Torre Rosewood, na região da avenida Paulista, contará com 151 quartos de hóspede e 122 suítes residenciais com metragem que varia entre 109 e 600 m2.

PODER JOYCE PASCOWITCH 9


O melhor dos bens é o que não se possui MACHADO DE ASSIS

3 PERGUNTAS PARA... GIOVANNI GUIDO CERRI, CERRI, presidente dos Conselhos dos Institutos de Radiologia e de Inovação do Hospital das Clínicas da FMUSP DE QUE FORMA A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA TEM AJUDADO NO

Houve uma grande aceleração do uso da tecnologia e a saúde digital é um bom exemplo dessa mudança, por meio de teleconsultas, que passaram a fazer parte do atendimento usual, e do monitoramento a distância de pacientes, em especial os crônicos. A telecapacitação também avançou. O projeto Tele-UTI permitiu ao HC capacitar profissionais das UTIs do Estado de São Paulo, em um programa piloto que agora irá se expandir nacionalmente. O que se verificou é que a chance de mortalidade em uma UTI menos capacitada era 3,5 vezes maior e essa capacitação é importante para reduzir tal desigualdade. No futuro, a tecnologia 5G irá permitir que se possam fazer telecirurgias por meio da robótica sem a necessidade de um cirurgião no local. A ideia também é que cada paciente receba um tratamento específico – a medicina personalizada será o grande avanço do futuro do setor.

COMBATE À COVID-19?

PEGA LEVE

Na nossa experiência no HCFMUSP tivemos importantes contribuições: uma plataforma de inteligência artificial que identifica os casos suspeitos na tomografia computadorizada, estimando a extensão de comprometimento da doença; a plataforma Radvid 19, que conectou mais de 60 hospitais no Brasil; a utilização de robôs para auxiliar na limpeza hospitalar evitando a exposição dos profissionais de saúde. Agora, o Plano Nacional Saúde Digital do HCFMUSP, em colaboração com o governo britânico, visa construir um projeto que seja sustentável e replicável nacionalmente, e que inclua a teleconsulta, o monitoramento de pacientes a distância, o suporte com especialistas a lugares remotos, entre outras iniciativas. Queremos que pelo menos 1/3 das consultas do HC sejam feitas a distância.

QUAL A IMPORTÂNCIA DA MEDICINA ESTAR PRÓXIMA DE OUTRAS ÁREAS?

A inovação em saúde funciona muito pela associação de médicos com engenheiros: um tem a ideia, o outro a executa; um sente a necessidade, o outro encontra a solução. O nosso laboratório de inteligência artificial é composto por médicos, um economista que trabalha na estruturação dos projetos, uma fisioterapeuta que se concentra na análise de dados, e quatro engenheiros. É uma equipe multidisciplinar porque precisa de muita análise, construção de algoritmos, conhecimento matemático e a visão prática do médico para saber quais dados são relevantes e precisam ser buscados.

Jornadas excessivas de trabalho estão matando milhares de pessoas por ano, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde) e a OIT (Organização Internacional do Trabalho). O primeiro estudo global ,que avaliou a relação entre doenças cardíacas com a duração das jornadas de trabalho revelou que 745 mil pessoas morreram entre 2000 e 2016 de derrame e outras patologias relacionadas a longas horas de labuta. Sorte do dia: o Brasil está entre os países menos afetados pelas jornadas excessivas – 4% da população está exposta ao excesso de trabalho (55 horas ou mais por semana).

10 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTOS GETTY IMAGES; REPRODUÇÃO; CLEBER DE PAULA/DIVULGAÇÃO

O QUE PODEMOS ESPERAR DO FUTURO DA MEDICINA?


FOTOS GETTY IMAGES; DIVULGAÇÃO

EM JULHO, A MULHER E O HOMEM DE PODER VÃO... ESCUTAR Dare to Lead, o podcast mais recente de Brené Brown, a professora e pesquisadora do comportamento humano, autora de quatro best-sellers e responsável por um dos TEDs mais assistidos no mundo. Disponível no Spotify, o programa estreou em primeiro lugar nos Estados Unidos e está se tornando um manual de construção de coragem para líderes em todos os níveis

CONFERIR a exposição Arte + Moda + Política, na galeria Mario Cohen, em São Paulo, da dupla MAR+VIN, na qual os fotógrafos investigam a formação do povo brasileiro. Até o dia 28 VER o show AmarElo, de Emicida, lançado agora na íntegra na Netflix. O concerto no Theatro Municipal de São Paulo deu origem ao documentário que estourou no ano passado VISITAR o marketplace Feira

CONHECER o

Greenroom, concorrente do Clubhouse lançado pelo Spotify com salas de áudio ao vivo. Disponível gratuitamente para iPhones e celulares Android BAIXAR o

Letterboxd, app para cinéfilos que funciona como uma rede social na qual é possível catalogar e organizar sua lista de filmes e interagir com outros usuários amantes da sétima arte ENCOMENDAR uma tábua para frios ou queijos do artesão Valdir Zanirato feitas em madeira brasileira certificada, de reuso, e com um trabalho minucioso de marchetaria DOAR sangue. Com a pandemia, os

estoques de hemocentros pelo país, como a Fundação Pró-Sangue, estão em estado crítico. Podem doar pessoas que têm entre 16 e 69 anos, pesam mais de 50 quilos e estão em boas condições de saúde. Vale ressaltar que uma única doação ajuda a salvar a vida de quatro pessoas

ACOMPANHAR a programação do

Sabor & Arte, novo canal de TV por assinatura com conteúdo 100% dedicado à gastronomia. A curadoria da grade é do jornalista Josimar Melo

Preta: o maior evento de cultura e empreendedorismo negro da América Latina lançou seu e-commerce com produtos e serviços desenvolvidos por negros, indígenas, LGBTQIA+ e quilombolas que tiveram seus negócios acelerados pela PretaHub

SONHAR com uma das poucas residências projetadas por Oscar Niemeyer: com 1.800 m2 de terreno e 670 m2 de área construída, a casa no Alto de Pinheiros, bairro nobre de São Paulo, está à venda por R$ 15 milhões. O projeto foi um presente de Niemeyer ao amigo e engenheiro Milton José Mitidieri na década de 1960 PLANEJAR o cronograma olímpico para aguentar o fuso de 12 horas dos Jogos de Tóquio. As finais dos principais esportes, além da cerimônia de abertura, irão transcorrer durante as madrugadas e manhãs brasileiras a partir do dia 23

DESEJAR uma das peças da Prasi, marca de alta joalheria da dupla Mariana Prates e Helena Sicupira, que são confeccionadas no Brasil e na Itália seguindo técnicas artesanais clássicas MERGULHAR

no universo do homem mais rico do mundo, Jeff Bezos, lendo Amazon Sem Limites, de Brad Stone, lançado pela Intrínseca

LER Correntes (Todavia), livro de Olga

Tokarczuk, ganhadora do Nobel de Literatura em 2019, no qual a autora discorre sobre os nossos conflitos com o tempo, das figuras de cera dos museus de anatomia aos mapas e planos de fuga

com reportagem de dado abreu, nina rahe e paulo vieira PODER JOYCE PASCOWITCH 11


EQUILÍBRIO

A ELEGÂNCIA DISSONÂNCIA DA

Após 31 anos no Supremo Tribunal Federal, o juiz decano Marco Aurélio Mello se despede da corte em razão do que chama de “aposentadoria expulsória”. Conhecido como ministro do voto vencido, por ser o magistrado com maior número de decisões divergentes, ele se diz realizado por sua atuação na última trincheira da cidadania por mari tegon

12 PODER JOYCE PASCOWITCH

fotos cristiano mariz


PODER JOYCE PASCOWITCH 13


M

inistro indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello, de quem é primo, o decano Marco Aurélio Mello pendura este mês a toga que vestiu nos últimos 31 anos. Em três décadas, o juiz carioca foi uma voz dissonante – ganhou o apelido de “voto vencido” por ser o magistrado com maior número de votos divergentes dos colegas – na corte e autor de decisões famosas e polêmicas. Durante o período em que esteve no Supremo, foi presidente da casa entre 2001 e 2003, criou a TV Justiça, que mudou a forma de trabalho da corte, comandou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por três mandatos e viu sete presidentes da República subirem a rampa do Planalto. Em entrevista exclusiva a PODER, Mello brinca que está se retirando do STF devido à “aposentadoria expulsória” pelos 75 anos completados este mês, data limite para que exerça o cargo, em alusão ao seu apego profissional e afetivo à cadeira. O magistrado fala sobre o futuro fora do Supremo, avalia a Lava Jato, critica a suspeição de Sergio Moro, diz que Lula deveria sair de cena e desistir de se candidatar novamente à Presidência e desaprova a banalização do processo de impeachment no Brasil, entre outros temas em pauta. PODER: QUAL O SEU LEGADO E A SUA MELHOR LEMBRANÇA EM MAIS DE 30 ANOS NO SUPREMO? MARCO AURÉLIO MELLO: Todo o período foi muito gratifi-

cante. Busquei servir com espontaneidade, com pureza da alma, e enfrentando os conflitos de interesse segundo o meu convencimento, a minha técnica e a minha formação humanística. Em termos de legado, dizem que foi a TV Justiça. Eu valorizo muito a comunicação e o projeto da TV saiu do meu gabinete. E depois, por sorte, substituindo o presidente Fernando Henrique Cardoso na Presidência, acabei sancionando a lei [que criou a TV Justiça]. Foi algo muito bom em termos de transparência, de publicidade, aproximando o Judiciário dos cidadãos e os cidadãos do Judiciário. Esse tento realmente tinha que dar certo e deu. Algo que torna o STF e o Judiciário mais transparentes.

PODER: A TRANSMISSÃO AO VIVO DA TV JUSTIÇA INFLUENCIOU ALGUM VOTO OU DECISÃO DO TRIBUNAL? MAM: O que normalmente ocorre é uma atuação equi-

distante. Pouco importante estar sendo transmitida a sessão ou não. Agora é claro que a TV Justiça implica um controle externo do Judiciário. Isso porque os contribuintes podem acompanhar o dia a dia do Judiciário e cobrar, se for o caso, correção de rumos, o que é positivo em termos de democracia.

14 PODER JOYCE PASCOWITCH

PODER: O SENHOR PARECE TER SE HABITUADO ÀS SESSÕES VIRTUAIS APÓS ESTRANHÁ-LAS NO INÍCIO. COMO DEVERÁ SER DAQUI PARA FRENTE? MAM: Vamos a uma explicação: quando nós estávamos nos

reunindo fisicamente na turma ou no plenário eu sempre sustentei que o olho no olho é importantíssimo. Que a troca de ideias entre os componentes do colegiado resulta em uma solução mais adequada para o conflito. Agora veio a pandemia. E com ela o lado positivo, já que eu pude praticamente esvaziar o meu gabinete [de processos]. Cheguei a ter no plenário, quando as sessões eram físicas, cerca de 150 processos liberados aguardando na fila. Julguei na sessão virtual. Agora temos essa dualidade entre a sessão virtual, em que não há a troca de ideias, e a sessão por videoconferência, em que nós estamos em uma sala virtual, trocando ideias e podemos discutir os casos. A virtual é mais célere, já que há um período dentro do qual um integrante do tribunal pode se manifestar. E a sessão por videoconferência pressupõe a inserção do processo em pauta a cargo do presidente. Mas vamos ver até onde vai essa pandemia. O tribunal já pensa em retomar as sessões físicas a partir de setembro. Eu até disse ao presidente [Luiz] Fux, me convoque que estarei presente (risos).

PODER: AS SESSÕES VIRTUAIS E POR VIDEOCONFERÊNCIA O AJUDAM A SE DESLIGAR DO STF COM UMA DESPEDIDA MENOS ABRUPTA, MENOS SOFRIDA? MAM: Nunca tivemos tempo para uma convivência fora do

colegiado ante a carga de processos. Eu, desde o início, em 1978, quando integrei o TRT (Tribunal Regional do Trabalho) do Rio de Janeiro, sempre trabalhei em casa. Sempre fui um juiz de trazer processos para casa, ao contrário do que ocorre com a maioria, que separa as atuações. Como eu sou casado com uma mulher que também é juíza, desembargadora do Tribunal de Justiça, a Sandra De Santis, ela não me cobra tempo, nem reclama. E nós dois tocamos a nossa vida profissional.

PODER: QUAL A SUA AVALIAÇÃO SOBRE O RESULTADO DA OPERAÇÃO LAVA JATO E DA SUSPEIÇÃO DE SERGIO MORO? MAM: Logo que surgiu a Lava Jato um senador da República,

que não vou mencionar o nome, disse que precisavam enterrar a operação. E parece que, de fato, ela foi enterrada com as últimas decisões do Supremo. O que, sob o meu olhar, é muito ruim, porque, quando em uma operação dessas há desvios quanto ao procedimento, se tem recurso contra esses desvios. Se fizermos um levantamento veremos que a Lava Jato tem muito mais aspectos positivos do que negativos. Quanto à problemática do juiz Sergio Moro, eu ainda não compreendo como alguém que foi tido pela sociedade brasileira como um verdadeiro herói, porque colocou muito


Essa história de apoiar impeachment de presidente é muito ruim. Tem que ser reservado o afastamento a situações excepcionalíssimas”

poderoso na cadeia, de repente é execrado. Algo aí no sistema não fecha. E, para mim, ele continua merecedor da confiança dos brasileiros. PODER: COMO EXPLICAR À POPULAÇÃO QUE O EXPRESIDENTE LULA PASSOU ILEGALMENTE 580 DIAS NA CADEIA? CASOS COMO ESSE TIRAM A CREDIBILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO? MAM: Essas idas e vindas, tal dito pelo não dito, são pés-

simas. E acabou o Supremo ressuscitando politicamente o ex-presidente da República Luiz Inácio da Silva. Eu fui voto vencido, mas a maioria decidiu, paciência. Agora aguardemos 2022 para ver se ele vai se apresentar candidato à Presidência ou não. Ele cumpriu dois mandatos diretamente e cumpriu um mandato e meio indiretamente quando esteve na cadeira maior do país a presidente Dilma, período em que ele, evidentemente, estava, mesmo que não formalmente, como grande conselheiro dela. Eu penso que o ex-presidente já prestou serviços à pátria e que é hora de nós termos a abertura de oportunidades para outros candidatos.

PODER: A DEMOCRACIA ESTÁ MAIS CONSOLIDADA HOJE OU QUANDO O SENHOR ASSUMIU COMO MINISTRO? MAM: Hoje ela está, sem dúvida alguma, mais consoli-

dada. Ante os incidentes que nós tivemos até aqui e suplantamos. Isso robustece a democracia. Não há campo para saudosismo, para retrocesso. Nós estamos avançando e aperfeiçoando a cada passo o Estado Democrático de Direito.

PODER: TEMOS ACOMPANHADO A CPI DA COVID NO SENADO E O AUMENTO DOS PEDIDOS DE IMPEACHMENT DE BOLSONARO. O PRESIDENTE DEVE SER IMPICHADO? MAM: O presidente foi eleito com 57,7 milhões de vo-

tos, foi escolhido pela maioria dos eleitores. Tem um diploma que assegura um mandato de quatro anos. Essa história de apoiar impeachment de presidentes da República é muito ruim. Tem que ser reservado o afastamento a situações excepcionalíssimas. As instituições estão funcionando, o presidente tem um perfil de atuar, precisamos admitir esse perfil. Contudo, é claro que, se demonstrado um desvio de conduta, que haja a glosa do PODER JOYCE PASCOWITCH 15


Lembranças fotográficas no gabinete em Brasília sob os olhos da Justiça: em 2001, em visita oficial ao papa João Paulo 2º, no Vaticano; e a saudação de Fernando Henrique Cardoso em uma das vezes em que o magistrado exerceu o cargo de presidente da República, em 2002

desvio de conduta no campo do próprio Legislativo, com um processo de impedimento, ou no Supremo com um processo crime por crime comum. Vamos aguardar, e não presumir o excepcional. E verificar o lado bom da governança nos dias de hoje e que o presidente da República seja feliz nesse ano e meio que tem pela frente. PODER: A DISCUSSÃO DO VOTO IMPRESSO É OPORTUNA? MAM: Quando nós tínhamos o processo de votação por cédu-

las, as impugnações eram reiteradas. E várias foram julgadas procedentes. Em 1996 eu presidi as primeiras eleições informatizadas. De lá para cá, não tivemos uma impugnação que colocasse em dúvida a segurança da urna eletrônica, que é o sistema que mais preserva aquilo que deve ser preservado: a vontade do eleitor. Não cabe agora ficar, como costumo dizer no jargão carioca, “vendo chifre em cabeça de cavalo”. Supondo o excepcional, o interessante é a ironia: o presidente da República, que critica a urna eletrônica, foi eleito mediante esse sistema. Só que agora ele diz que houve fraude, senão teria sido eleito no primeiro turno. Como não é a presunção...

PODER: TEMOS CADA VEZ MAIS A PARTICIPAÇÃO DE MILITARES NO GOVERNO, INCLUSIVE DE INTEGRANTES DA ATIVA LIDERANDO MINISTÉRIOS. COMO O SENHOR VÊ ISSO? MAM: Sob a minha ótica, pela proporcionalidade e pela con-

veniência, o militar da ativa só pode estar no comando das Forças e no Ministério da Defesa. Agora, nos demais ministérios, um militar da ativa, general, como auxiliar do presidente da República, sob o meu modo de ver, é inconcebível. E nós temos muitos civis capazes de auxiliar o presidente.

16 PODER JOYCE PASCOWITCH

PODER: A QUE O SENHOR ATRIBUI OS ATAQUES DO PRESIDENTE BOLSONARO E INTEGRANTES DO SEU GOVERNO AO STF? MAM: O abandono ao entendimento entre os poderes. Os

poderes da República são harmônicos e independentes. Devem atuar cada qual em sua área prevista na Constituição Federal. Aí se aguarda a indispensável urbanidade. Eu só posso atribuir as críticas ao Supremo a arroubos de retórica. A algo que é dito sem consistência, sem demonstrarse a procedência de alguma imputação. O que não é bom, porque o exemplo vem de cima. E, quando o presidente da República critica a última trincheira da cidadania, que é o Supremo, ele sinaliza à população, que não acompanha o dia a dia do STF, algo ruim, algo nefasto. Não se avança culturalmente assim. Que o presidente da República passe a nos dar um bom exemplo.

PODER: O PRESIDENTE BOLSONARO DISSE QUE NOMEARIA ALGUÉM “TERRIVELMENTE EVANGÉLICO” PARA SUBSTITUÍ-LO NO STF, POSTO QUE DEVERÁ SER DO ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO ANDRÉ MENDONÇA. TEME QUE A CORTE SEJA TOMADA POR IDEOLOGIAS? MAM: Não temo. A Corte é um colegiado e o colegiado

é um somatório de forças distintas, nos completamos mutualmente. Assumida a cadeira, o que tem ocorrido é que o ocupante atue com independência absoluta. E quais são os requisitos constitucionais para se ter a indicação pelo presidente da República para ocupar uma cadeira no Supremo: elibada conduta e domínio do Direito. A religião não compõe uma exigência da lei das leis que a todos indistintamente submete. Eu, por exemplo, sou católico


Eu só posso atribuir as críticas ao Supremo a arroubos de retórica. A algo que é dito sem consistência, sem demonstrar-se a procedência de imputação” por batismo e poderá vir a me substituir um evangélico ou alguém que professe outra religião, isso é normal. Que o presidente da República seja muito feliz na escolha e que esse ato complexo se complete com a sabatina no Senado e a aprovação, se for o caso, ou a rejeição do candidato. Isso é o que nós esperamos, que as instituições funcionem segundo o figurino legal e constitucional. PODER: O QUE ESTE NOVO MINISTRO DEVE FAZER PARA AJUDAR O BRASIL NESTE MOMENTO? MAM: Perceber a envergadura da cadeira. Perceber que

depois que o Supremo bate o martelo não se tem a quem recorrer. Que o voto dele mesmo sendo uno se soma a outros e acaba formando a maioria. E atuar com desassombro e com a pureza da alma. Atuar objetivando servir, não desservir à sociedade.

PODER: O QUE SERÁ DA SUA VIDA FORA DO SUPREMO? MAM: Eu ficarei em Brasília porque vim para cá em 1981,

deixando a Cidade Maravilhosa, onde tenho duas filhas, tenho irmãos, tenho parentes. E conto também com uma base lá no Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca. O meu domicílio que é residência com ânimo definitivo será mesmo em Brasília, porque eu moro a dez minutos do tribunal, em uma chácara, em contato com a natureza. Permanecerei aqui. Me sinto um homem super-realizado porque servi aos meus semelhantes. E servi evidentemente dentro de minhas forças. O que pretendo fazer: eu diria nada. Hoje presido um instituto em Brasília que é o Instituto UniCeub de cidadania, vou incrementá-lo me dedicando à área em si acadêmica. E se acionado para emitir o meu parecer, neste ou naquele caso, emitirei. Mas não vou digladiar em uma concorrência desleal ante o cargo até aqui ocupado, mais de 42 anos como julgador em colegiado. Não vou digladiar com advogados na disputa de clientes. Eu sou um homem realizado intelectualmente e no campo econômico-financeiro.

PODER: ACEITARIA COMPOR ALGUM EXECUTIVO? MAM: Não. Eu já servi, inclusive a dois senhores

que são o Supremo e o TSE, e não pretendo cargo público mesmo em comissão. Muito menos para ser auxiliar de alguém. Eu preservo muito a cadeira que ocupo, que para mim é a cadeira mais importante da República, mais importante do que a de presidente da República.

PODER: O SENHOR NUNCA PENSOU EM SE CANDIDATAR À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA? MAM: Não. Deixo ao primo [Fernando Collor] que abraçou

a política, hoje é senador, já foi presidente da República. Nunca pensei realmente em abraçar nada na política. A minha política sempre foi institucional considerado o Supremo. E vou repetir: sou um homem, com 75 anos, super-realizado. Eu tenho que agradecer as oportunidades que tive, como agradeci na despedida em sessão do colegiado. E passo agora a honrar essas indicações do passado. n PODER JOYCE PASCOWITCH 17



COLETIVO

O VÍRUS DA

EXAUSTÃO A pandemia da Covid-19 mostrou os limites da produtividade e da sensação de que nós podemos (e devemos) trabalhar cada vez mais, o que acabou configurando o modo de vida que o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han definiu como “sociedade do cansaço”. Sair dessa dinâmica não é simples e envolve, acima de tudo, senso de comunidade

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

O

POR NINA RAHE

cansaço é um dos principais sintomas da nossa sociedade. A afirmação, que causa uma identificação rápida em quase todos nós que acostumamos a viver sob uma cobrança alta de desempenho, acompanhados também de uma sensação constante de esgotamento, é do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han. O sintoma a que o autor se refere, como bem sabemos, não é aquele de quem jogou uma partida de futebol, correu uma maratona ou dançou uma noite inteira sem parar, mas, como ele define em artigo publicado em março deste ano, “um cansaço fundamental, que acompanha de forma permanente e em toda a parte a nossa vida como se fosse a nossa própria sombra”. Uma sensação, conforme Byung-Chul Han explica, que se intensificou muito durante a pandemia, momento em que passamos a nos sentir ainda mais esgotados do que de costume. PODER JOYCE PASCOWITCH 19


Quando publicou Sociedade do Cansaço, em 2010, o filósofo não previa a acentuação desse sintoma em decorrência da Covid-19, mas diagnosticou como ninguém os parâmetros de uma época na qual doenças como depressão, transtorno de déficit de atenção e síndrome de burnout aparecem associadas a um excesso de positividade dentro de uma sociedade permissiva e pacificada, que é regida pelo desempenho e na qual nada é impossível. “O poder ilimitado é o verbo modal positivo da sociedade de desempenho. O plural coletivo da afirmação ‘Yes, We Can’ [‘Sim, Nós Podemos’] expressa precisamente o caráter de positividade da sociedade de desempenho. No lugar da proibição, mandamento ou lei, entram projeto, iniciativa e motivação”, define Byung-Chul Han. Se com o desenvolvimento de novas tecnologias e a

de tempo livre também ameaçou aparecer no início do isolamento social, quando achamos que teríamos que buscar atividades para nos ocupar durante o período em casa, o que vimos, de novo, foram as horas de ócio rareando cada vez mais. “Não se tratou de uma situação de tédio senão de cansaço. As pessoas ficaram mais estressadas e, para aquelas que puderam fazer home office, não havia mais separação entre o trabalho e descanso”, justifica Perez. “Nós passamos de uma sociedade repressiva para uma sociedade do poder, e aí entra, obviamente, esse discurso neoliberal no qual o sujeito é o empresário de si e as pessoas são potenciais clientes ou concorrentes”, resume. Na sua Sociedade do Cansaço, ainda que Byung-Chul Han reconheça que a fadiga vem da pressão e explo-

‘‘É cansativo contemplar a própria cara na tela, estamos o tempo todo diante de nossa própria imagem [...]. A comunicação digital é bastante unilateral, não se transmite com o corpo ou através de olhares [...]” entrada da automação nos processos industriais, como lembra Daniel Omar Perez, professor de filosofia na Unicamp, a discussão estava em torno de como os indivíduos utilizariam seu tempo livre, uma vez que se imaginava que a produtividade deslancharia sem a necessidade de aumento do trabalho, o que vimos na contemporaneidade é a formação de uma sociedade na qual o ócio é praticamente inexistente. “A ideia era a de que o mundo seria diferente, mas todos teriam seu lugar, e o que aconteceu não foi bem isso. A utopia de uma sociedade tecnologizada com tempo livre deu lugar a uma sociedade com grande concentração de capital e grandes bolsões de pobreza e, no meio disso, um sujeito que pensa que pode produzir cada vez mais”, explica Perez. “Até a universidade se tornou um lugar de produtividade, onde sou avaliado não só de forma qualitativa, mas também quantitativa, pelos artigos que publico, número de pesquisas que oriento.” Assim, se essa mesma expectativa de possibilidade

20 PODER JOYCE PASCOWITCH

ração externas, o filósofo argumenta que agora somos nós mesmos que nos exploramos “voluntária e apaixonadamente” e nos tornamos, ao mesmo tempo, senhor e escravo, alimentando a falsa ideia de que temos alguma liberdade e estamos nos realizando. E nesse caminho sem volta por meio do qual precisamos render ininterruptamente, o chamado home office (mais office do que home) parece proporcionar tempo extra para explorarmos a nós mesmos – não definimos fim do expediente, somos solicitados em reuniões a qualquer momento e perdemos a noção de fins de semana e feriados. E essa exaustão pela falta de limites vinculada à crescente demanda se intensifica ainda pela ausência das redes de apoio e o aumento da hiperexposição a luzes e telas. Na opinião de Byung-Chul Han, “também nos esgotamos com as lives permanentes, que nos transformam em videozumbis” e nos obriga a nos olharmos o tempo todo no espelho. “É cansativo contemplar a própria

FOTOS DIVULGAÇÃO

Byung-Chul Han


cara na tela, estamos o tempo todo diante de nossa própria cara [...]. A comunicação digital é uma comunicação bastante unilateral, que não se transmite com o corpo ou através de olhares e que, portanto, é bastante limitada”, escreveu o filósofo em março deste ano. No artigo “Nonverbal Overload: a theoretical argument for the causes of zoom fatigue”, Jeremy Bailenson, diretor do Stanford Virtual Human Interaction Lab (VHIL), aponta, inclusive, que reuniões por videoconferências são mais cansativas não só pelo “efeito espelho”, como pela necessidade de olhar para a tela à curta distância, pela mobilidade reduzida e pela comunicação não verbal excessiva. Para Rodrigo Bressan, psiquiatra e professor da Unifesp e do King’s College London, quando a gente aumenta a conectividade, eleva a eficiência, mas não diminui necessariamente a carga. A hiperconexão, também, não nos afeta somente do ponto de vista cognitivo, mas influi na construção de imagem e identidade. “As mídias sociais revelam quem você é, são milhões de códigos que você precisa dominar para se colocar nesse cenário e avaliar como está sendo visto. E se me perguntarem se isso é um estresse adicional para o ser humano, não tenho a menor dúvida que sim”, diz Bressan. Há ainda questões de gênero no efeito de exaustão. O estudo Estatísticas de Gênero - indicadores sociais das mulheres no Brasil, divulgado pelo IBGE, por exemplo, aponta que, em 2016, as mulheres se dedicaram aos cuidados de pessoas e afazeres domésticos cerca de 73% a mais do que os homens (18,1 horas semanais contra 10,5 horas). “As mulheres são sobrecarregadas com um trabalho que é invisibilizado e para o qual nós não temos remuneração. O trabalho do cuidar é principalmente feminino e não só cansa fisicamente, mas mentalmente. São horas e horas que poderíamos estar descansando e nos dedicando a atividades que nos deem prazer”, afirma Jeane Tavares, psicóloga e professora do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. “A sociedade do cansaço é antes de tudo uma sociedade violenta, que fala de um massacre do ser humano e de uma vida que não vale a pena viver porque é muito reduzida em termos de riqueza, uma riqueza que vai muito além do dinheiro.” Realizada durante a pandemia, uma pesquisa do Centro de Inovação da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (FGV-Eaesp) mostrou que

Byung-Chul Han é professor de filosofia e estudos culturais da Universidade de Berlim

56% entre 464 entrevistados encontraram dificuldade em conciliar as atividades profissionais e pessoais no home office. O levantamento também apontou que houve aumento da carga de trabalho para 45,8% dos entrevistados, que 34% consideraram difícil manter a motivação e 36% apresentaram dificuldade para continuar com a mesma produtividade. Mas a crise evidenciada por conta da Covid-19, segundo Byung-Chul Han, também é uma crise no sentido etimológico de krisis, que significa ponto de inflexão, uma vez que a situação atual funciona como um chamado urgente à mudança do nosso modo de vida. “Muitos discursos de autoajuda, que colocavam o acento no esforço e na ideia de que ‘se você quiser, você pode’, eram populares especialmente antes da pandemia, mas agora parece que esse pensamento mostrou seu limite”, aponta Perez. E Jeane Tavares complementa: “É muito evidente para nós da saúde pública que a saúde da população é uma questão social e não apenas física, é uma questão de ter uma sociedade equilibrada e nós só vamos conseguir ter uma sociedade na qual a gente consiga descansar e ter qualidade de vida quando não houver uma distância tão grande entre um grupo social e outro”. n PODER JOYCE PASCOWITCH 21


GESTÃO

EXPRESSO

DO ORIENTE Com faturamento global de US$ 30,3 bi, a Takeda replica no Brasil a ambição de ser uma das maiores farmacêuticas do mundo. E a jovem presidente Renata Campos, que lidera a operação por aqui, incorpora as metas – e os valores – da centenária empresa japonesa POR PAULO VIEIRA

A

executiva Renata Campos, 44 anos completados neste mês, há quatro presidente da operação brasileira da Takeda, uma das dez maiores empresas farmacêuticas do mundo, com faturamento global de US$ 30,3 bi, é, como na velha canção, apenas uma garota latino-americana, sem parentes importantes e vinda do interior. E, mesmo assim, ela é responsável por uma operação bastante relevante, que fatura perto de R$ 2 bi anuais, tendo estado antes à frente do mercado sul-americano (sem o Brasil) e da operação turca da Takeda. Para quem imagina que uma cadeira dessas só é destinada a filhos de famílias afluentes cultivados em academias de grife, Renata é a mais rematada exceção. Afável, sem qualquer afetação, ela é, pode-se afirmar, o triunfo da pessoa comum – ou, quem sabe, o triunfo do mérito. Filha de um contador e de uma professora, ambos já falecidos, Renata nasceu em Assis, no oeste paulista, a 440 quilômetros de São Paulo, e se mudou para a capital quando passou na faculdade de farmácia e bioquímica da USP. Foi no mesmo ano que seu pai morreu, prematuramente, aos 48, por complicações de leucemia. O interesse pelas “biológicas” vinha de criança, com os jogos de laboratório de química, e, na transição para a vida adulta, pela proximidade com uma prima que foi estudar farmácia na Unesp. Apesar de fazer iniciação científica – em toxicidade de alimentos – e de ter uma carreira acadêmica bastante segmentada, um estágio de ano e meio na área comercial da Sintofarma, empresa brasileira depois ad-

22 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTOS ROBERTO SETTON

quirida pela belga Solvay, indicou para Renata um caminho distinto de grande parte de seus colegas, que preferiram seguir nos laboratórios, envolvidos até o pescoço com pesquisa científica. A executiva entrou em área de treinamento de força de vendas, fazendo manuais em que traduzia para o marquetês, digamos, o conhecimento que tinha sobre moléculas, reações bioquímicas e antígenos – informações que eram divulgadas por representantes e consultores em visita a médicos, para que estes conhecessem e aviassem os produtos da Sintofarma. “Eu ter me apaixonado pela área comercial foi uma coisa bem diferente para a época, que era de grande expansão da pesquisa clínica do Brasil”, disse em entrevista a PO-


PODER JOYCE PASCOWITCH 23


DER no muito iluminado 11º andar de uma novíssima torre comercial da zona sul de São Paulo em que a companhia recentemente se instalou. Renata está na Takeda desde 2005, considerando o tempo na Nycomed, do famoso medicamento Dramin, laboratório que seria adquirido pela companhia japonesa. Ela diz que ser mulher, solteira (hoje é casada), muito jovem e brasileira jamais foi um problema em sua carreira, algo que parece não ser regra no mundo corporativo. “Tive a felicidade de ter líderes que sempre investiram no meu suporte e no meu desenvolvimento, além de uma exposição internacional”, diz. A executiva afirma que, se não precisou trabalhar mais apenas por ser mulher, ela sempre deu o que chama de “meu a mais”. Chefiou dois mercados antes de voltar ao Brasil, a Turquia e a Argentina – onde também era responsável por outros quatro países do continente em que “até o espanhol era diferente”. Na Turquia, para onde foi com 36 anos, reputa ter vivido o momento mais desafiador de sua carreira, não apenas pelas diferenças das práticas daquele mercado – em que os remédios são reembolsados pelo governo ao consumidor –, mas pela dificuldade de comunicação. Ela não conseguiu ter fluência em turco e poucos ali falavam inglês. “Acho que comunicar e convencer pessoas são alguns pontos fortes meus, e da noite para o dia perdi essas habilidades. Dependi de uma terceira pessoa para que essa comunicação começasse a fluir.” Tanto na Turquia como na Argentina, onde esteve no último ano do mandato presidencial de Cristina Kirchner, e mesmo agora no Brasil, Renata comandou e comanda a Takeda em meio a gestões de líderes populistas, alguns francamente autocratas, que simpatizam com ideias de um Estado forte e interventor na economia. Mesmo assim, ela acha que o foco da Takeda no paciente, mesmo quando questões institucionais se alevantam, mantém a empresa no bom caminho, independente das granadas jogadas pelos políticos. A Takeda foi fundada ainda no século 18, em Osaka, mas é difícil imaginar que os princípios que orientavam o pioneiro Chobei Takeda, que começou a saga da empresa vendendo ervas medicinais, valham para os dias de hoje. Grande parte do que é a cara da farmacêutica no século 21 se deve a um processo contínuo de aquisições globais, como a da irlandesa Shire, em 2019, que significou o apreciável desembolso de US$ 62 bi. Desde o começo da década de 2010, a empresa estabeleceu como meta se posicionar entre as dez maiores farmacêuticas do mundo, e isso exige ir ao mercado, seja para comprar, como no caso da Shire, como também para vender: aqui no Brasil, a Takeda se desfez de um portfólio de marcas conhecidas, todas OTC (medicamentos sem necessidade de receita médica), como Dramin e Neosaldina, adquirido por U$ 825 mi pela Hypera Pharma, que celebrou efusivamente o acordo.

“A cultura da Takeda retém. É um sistema que engaja e se retroalimenta, e é a razão do alto índice de promoção interna

24 PODER JOYCE PASCOWITCH

Retirar-se de um setor rentável e tradicional inclusive na história da Takeda, como o OTC, parece um contrassenso, mas a empresa decidiu apostar em produtos de preço final alto e que exigem grande investimento em pesquisa e desenvolvimento – a divisão “P&D” tem, com efeito, orçamento gordo, de 15% do faturamento da companhia. São terapias oncológicas, doenças raras, gastroenterologia e neurociência. Com a Shire, hematologia e produtos derivados do plasma sanguíneo entraram fortemente no escopo, e há ainda o desenvolvimento de vacinas. No caso da vacina mais pop do século, contra a Covid-19, a Takeda não virou player, preferindo fazer alianças com a Moderna e a Covavax para fabricá-la no Japão. Se não é protagonista na corrida das vacinas desse novo mundo pandêmico, o mesmo não se pode


A fábrica e o laboratório da Takeda em Jaguariúna (SP), inaugurada nos anos 2000

dizer em relação ao imunizante contra a dengue. Enfermidade que ano sim, outro também, mata milhares de brasileiros e abala o sistema de saúde daqui, ela pode estar no caminho de ter seus danos minimizados. Desenvolvida pela Takeda, a vacina TAK-003 atua contra os quatro sorotipos da doença, é elegível para quem teve ou não a doença e desde abril está sob escrutínio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Pode vir a ser comercializada já em 2022. Os estudos clínicos foram realizados também com a população brasileira, e os resultados apresentados mostram eficácia geral acima de 80% e redução de hospitalizações em 89,2%. A cobertura contra a dengue hemorrágica é também dessa mesma proporção e a cobertura vacinal pode se alongar por três anos.

FOTOS RICARDO MATUSUKAVA/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

MAIS ACESSO

A Takeda fala muito em acesso de seus medicamentos aos pacientes, mas isso passa por políticas de preço nem sempre alinhadas com os humores dos investidores. Num ranking do tema, o Access to Medicine Index, a empresa vem em sexto, atrás da GSK, Novartis, J&J, Pfizer e Sanofi, mas lidera em governança – o que indica uma estratégia efetiva para o cumprimento desse objetivo. O Index recomenda expandir a segmentação de preços para mais mercados. O caminho para isso pode passar, paradoxalmente, por mais concentração e aquisições. No fim de 2020, o CEO da Takeda, Christophe Weber, anunciou que o objetivo da empresa é chegar a um faturamento global em 2030 de cerca de US$ 46 bi, 60% acima do patamar atual. Foi o primeiro anúncio de metas de longo prazo após a aquisição da Shire, negócio mastodôntico, de US$ 62 bi. O mercado pareceu não se entusiasmar com a declaração, e as ações declinaram 2% ao longo do quadrimestre seguinte. O endividamento da corporação é crítico e impacta o ânimo dos investidores. A venda de produtos fora do “core”, como aconteceu no Brasil com a Hypera, é uma das estratégias para amortizá-lo – o montante desejado é de US$ 10 bi. O problema é que, durante muitas décadas, o core era exatamente os medicamentos OTC de que a Takeda procura se desfazer hoje – no Japão, a linha de vitaminas Alinamin, por exemplo.

VALORES Ainda que a empresa venha se metamorfoseando com a sucessão de negócios e fatos relevantes, a Takeda faz fé numa cultura corporativa criada lá nos primórdios, chamada internamente de “takedaísmo”, cujos valores parecem estranhos a quem tem fome de participação de mercado: integridade, justiça, perseverança e honestidade. Em caracteres japoneses, isso parece um tanto mais persuasivo, e Renata chega a falar desses valores com alguma emoção. A missão expressa é “promover uma saúde melhor e um futuro mais brilhante para pessoas em todo o mundo por meio da liderança em inovação de medicamentos”. Num prodígio da história, dá para imaginar que o velho Chobei Takeda, o fundador, anteviu em dois séculos a economia do stakeholder. No front doméstico, a empresa busca standards que, de fato, parecem coincidir com os valores inscritos nos ideogramas. A diversidade é estimulada e, segundo a executiva, foram “acelerados” os comitês de inclusão e diversiPODER JOYCE PASCOWITCH 25


dade, que ali se multiplicam em racial, LGBTQIA+, de idade (etário), gênero e PCD (pessoas com deficiência). Ela cita alguns benefícios para os colaboradores, como folgas nos aniversários dos filhos, para todos eles, mesmo que sejam afilhados. Casais homoafetivos desfrutam também do benefício, como era de se esperar. Recrutamento diverso está na moda, mas Renata acredita que isso é só o começo, o passo que também deve ser dado deve assegurar condições de desenvolvimento de carreira. “Há aqui cursos de inglês de dois anos para os colaboradores, mas já é preciso rever a duração para quem tem formação muito básica. Esses terão cinco anos”, diz. Ela informa que a taxa de turnover da Takeda que lidera é mais baixa que a média do mercado e que 70% das posições são preenchidas por gente formada lá dentro. “A cultura muito sólida da Takeda retém o colaborador. É um sistema que engaja e se retroalimenta, e isso é a razão do nosso alto índice de promoção interna.” A companhia tem sido reconhecida com prêmios como o do Great Place to Work (GPTW), em que figura por sete anos consecutivos. Em 2020, destacou-se também como a única farmacêutica entre as dez empresas do setor de saúde na certificação de “gestão saudável”, além de menções em rankings específicos de diversidade, como o GPTW Pessoas com Deficiência 2020 e o GPTW LGBTQI+ 2021. Não se sabe ao certo quanto uma empresa pode perder, ou melhor, deixar de ganhar, ao não criar um ambiente e uma cultura capazes de engajar sua comunidade. O jornalista e escritor Alexandre Teixeira, especialista no assunto, já citou a

26 PODER JOYCE PASCOWITCH

“Acho que comunicar e convencer são pontos fortes meus. Na Turquia, dependi de uma terceira pessoa para a comunicação fluir

cifra de US$ 300 bi anuais para o conjunto de empresas americanas em seu livro Felicidade S.A. Seja como for, a Takeda, no mundo, e Renata, no Brasil, têm pela frente um desafio dificílimo, que parece exigir mais satori – a iluminação, segundo a filosofia zen-budista – do que propriamente planejamento estratégico: encontrar o equilíbrio entre a ambição gigantesca e a manutenção dos valores que até aqui têm significado um ambiente saudável, inclusivo e diverso n


OPINIÃO

O PROGRESSO DA CIÊNCIA

IMPORTA E MUITO POR RENATO JANINE RIBEIRO

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

A

Covid-19 – que já matou quase 4 milhões de pessoas no mundo todo – está entre as doenças mais fatais da história num curto espaço de tempo. Podemos compará-la à varíola, a única moléstia até hoje erradicada completamente por uma vacina, mas que custou centenas de milhões de vidas só no século 20; ou à Peste Negra, que, por volta de 1350, matou entre um terço e metade das pessoas nas regiões da Eurásia que assolou; ou, mais perto de nós, à gripe espanhola, que terá matado de 50 a 100 milhões de pessoas, naquela época entre 3% e 5% da população mundial. Contudo, embora 4 milhões de vidas sejam um número enorme (das quais 13% no Brasil, ainda que nossa população seja apenas 2,8% da mundial), se a proporção de mortos na atual pandemia fosse a mesma da gripe espanhola, teríamos a lamentar algo como 230 a 380 milhões de mortos neste ano e meio de pandemia. Ou seja, temos um número bem superior a 200 milhões, e talvez a 300 milhões, de vidas salvas, graças a quê? Graças aos avanços na saúde, principalmente pública e apoiada na ciência. Ciência salva vidas. É isso o que mostra a importância crucial, sobretudo neste momento, de uma associação como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a prestigiosa SBPC, para a qual fui eleito

presidente a contar do fim de julho. Muitas pessoas a conhecem devido a suas reuniões científicas anuais. Uma delas, a de 1977, proibida pela ditadura civil-militar, acabou se realizando na PUC de São Paulo, com o decidido apoio do cardeal Arns, e foi memorável na luta pela democracia. E lembremos: quando acabou a ditadura, como observo em meu livro A Boa Política (Companhia das Letras), quase 86% dos municípios brasileiros tinham um IDHM (seu índice de desenvolvimento humano) muito ruim. Em 2010, essa era a condição de apenas 0,57% dos municípios. Democracia melhora vidas. Democracia e ciência, além de educação de base e cultura, fazem bem às pessoas. Também é preciso

so antagonismo entre economia e saúde, ou a ideia de que nosso desenvolvimento econômico depende de mão de obra barata sem qualificação, somada a chaminés poluentes. Essa ideia de economia, que a ditadura de 1964 defendia, está ultrapassada. Nossa biodiversidade e nossa humanodiversidade (irmãs de nosso possível soft power) constituem trunfos de primeira para um desenvolvimento econômico de novo modelo, mais aparentado com o que está sendo construído no mundo desenvolvido. Com razão, diz o hino que nossas matas têm “mais vida”: elas têm riquezas químicas e biológicas ainda igno-

disseminar os benefícios da ciência para a sociedade. É por isso que, agora, temos de lutar pela recomposição dos orçamentos, duramente abatidos, da educação, da ciência, da saúde, do meio ambiente. Não por acaso, são áreas maltratadas pelo atual governo. Mais do que isso: não cabe o fal-

radas. E a diversidade de culturas no Brasil, incluindo os povos originários, pode iluminar de formas novas a riqueza da humanidade. Isso tudo vale ouro. n Renato Janine Ribeiro é presidente eleito da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), professor de filosofia política e ética da USP e ex-ministro da Educação

PODER JOYCE PASCOWITCH 27


CABIDE

COMQUE ROUPA? A flexibilização do dress code no escritório já é uma realidade e promete ganhar força com a volta do trabalho presencial pós-pandemia

D

POR CARL A JULIEN STAGNI

ois mil e vinte foi o ano em que o mundo parou. Um novo vírus, totalmente desconhecido, deixou tudo de ponta cabeça. De repente, a ordem era não sair de casa e a situação se prolongou, mas, graças à tecnologia, foi possível trabalhar, fazer reuniões e fechar negócios no aconchego do lar, usando aquele moletom desgastado, bermuda e chinelo. Sem ter para onde ir e com mesas de jantar, sofás ou camas transformadas em estações de trabalho, de que adiantava usar trajes formais? Conforto se tornou a palavra-chave do home office. Com o advento da vacina, empresas do mundo todo começaram a planejar estratégias de retorno ao trabalho. Quantos dias por semana a equipe deveria ir ao escritório, regras de máscara e distanciamento, higienização do ambiente... e uma nova preocupação: é preciso atualizar o código de vestimenta? Não é de hoje que a “moda” adequa-

28 PODER JOYCE PASCOWITCH


ILUSTRAÇÕES GETTY IMAGES; FREEPIK

da ao local de trabalho está evoluindo a partir do momento em que o uso de terno e gravata, antes uma exigência corporativa, foi substituído por roupas menos formais. A chegada das gigantes da internet, como Google, Facebook, Microsoft, trouxe diretamente do Vale do Silício um estilo mais easy going, orientado para resultados, sem dar tanta importância à aparência de seus funcionários, desde que prazos fossem cumpridos e uma alta performance alcançada. Embora muitos concordem que bermuda e moletom podem não ser a melhor expressão de um bom profissional, o relaxamento dos códigos de vestimenta tem sido amplamente considerado nos últimos anos. E ganhou uma força extra no período de isolamento. Como lidar com isso? “Não tem como esquecer que o dress code no trabalho deve ser usado de modo estratégico. No auge da pandemia, quando todos ficamos em home office, o conforto passou a ser a tônica, afinal, tudo acontecia virtualmente, com o mínimo de contato físico”, diz Bia Kawasaki, consultora de imagem corporativa. Segundo ela, após essa longa temporada, a tendência é que esse conforto seja estendido aos escritórios, que já fazem um movimento de reabertura. “Este será um grande desafio para as empresas. Simplesmente liberar tudo pode se tornar um problema, porque é complicado ficar à mercê do bom senso dos funcionários. Especialmente aqueles que estão na linha de frente e que representam os vaPODER JOYCE PASCOWITCH 29


lores e propósitos da corporação. Por essas e outras, nunca a comunicação foi tão importante. Um dress code híbrido pode funcionar muito bem desde que todos entendam até onde podem ir. Cabe à empresa explicar e estipular limites claros”, explica a consultora. Alguns locais de trabalho estão estudando como fazer essa transição de volta para o modelo de escritório. O ano passado obrigou a todos repensarem a forma como interagem profissionalmente, seja com colegas, funcionários ou clientes. De repente, não houve mais reuniões presenciais, almoços de negócios, happy hours ou conferências – tudo se tornou virtual. Embora muitos desses ajustes tenham sido difíceis, algumas coisas mudaram para melhor. A relação das pessoas com as roupas não é mais a mesma, e o conforto e a

conveniência se tornaram prioridades. Não há um bom motivo para ficar o dia todo sofrendo com um terno desconfortável ou um salto alto demais. “Nunca mais vamos fugir do conforto. O desafio é mostrar que é possível adaptar o dress code. A indústria da moda se preparou para isso apostando em tecnologia têxtil, modelagens diferenciadas, moletons e peças athleisure [roupas esportivas adaptadas ao dia a dia] tratadas como alfaiataria. Esse vai ser o caminho. Tem que haver uma coerência entre a estética, a ética e a verdade. Sucesso não tem cara de pijama”, decreta a consultora, que já prestou serviço para Bradesco, EMS, Brasil Telecom, Magazine Luiza, entre outras grandes empresas. Jeff Galak, professor associado de marketing da Tepper School of Busi-

ness da Carnegie Mellon University, em entrevista recente disse que há dois cenários prováveis: no primeiro, algumas empresas manterão a tendência da roupa casual e um novo normal vai nascer. No segundo, pode haver um forte desejo de retornar ao “normal” pré-pandêmico. Por mais que calças de moletom e camisetas possam ser maravilhosas quando se trabalha em casa, voltar a um traje de trabalho pode ser um lembrete psicológico de que estamos superando o caos em que o planeta esteve submerso. “O que provavelmente acontecerá é que as empresas irão divergir a esse respeito e isso provará ser outro diferencial entre elas. Alguns ansiarão por um retorno ao mundo como era e outros forjarão uma nova realidade.” Há quem acredite que um código de vestimenta mais casual, pelo menos

O NOVO DRESS CODE Regata é permitida, mas evite as alcinhas Decote ideal fica na altura da axila

Camisa permanece. Ela pode ser de manga comprida, usada por dentro da calça. Em dias quentes, as mangas podem ser dobradas

Cuidado com o comprimento da saia. No máximo, quatro dedos acima do joelho. Saias midi, soltas, são chiques e confortáveis

Sapatos tipo oxford, sapatilhas e sandálias mais fechadas são ótimas pedidas. Aposte também nos saltos ergonômicos

30 PODER JOYCE PASCOWITCH

A calça de alfaiataria em moletom substitui muito bem a convencional calça social, assim como um jeans escuro Sapato tipo bucks (com cadarço) e “botinhas” são boas opções. Tênis estão conquistando seu espaço, mas ainda não são unanimidade. Para quem quer ousar um pouco, vale apostar nos sapatos sem meia com calças mais ajustadas que deixam parte da canela à mostra

ILUSTRAÇÕES GETTY IMAGES; FOTOS GETTY IMAGES

A camisa pode ser substituída por blusas de tricô ou outro tecido de boa qualidade. Uma alfaiataria de moletom e casaquinhos de tricô ocupam o lugar do blazer

Suéteres de lã e jaquetas podem substituir o blazer


interna”. Segundo Winandy, a intenção era que todos se sentissem à vontade para se vestir como quiserem – sem julgamentos. Então foi crucial ter a liderança mostrando que ela mesma estava se vestindo de forma mais descontraída. “Fizemos uma campanha para evitar piadinhas ou ações que pudessem levar ao constrangimento, pedimos para os ‘embaixadores’ se vestirem com roupas inusitadas, publicamos fotos de ‘look do dia’ na internet.” Quais os benefícios dessa mudança? “Vemos resultados positivos em diversas dimensões: colaboradores mais felizes e engajados, redução da percepção de hierarquia, diminuição de barreira enem um primeiro momento, pode ser importante para que os funcionários, que chegam depois de meses de home office, sejam capazes de “respirar um pouco” e a transição para o trabalho presencial possa ser mais tranquila. Se a empresa optar por uma flexibilização do dress code, é fundamental que seja feita uma comunicação clara com os colaboradores sobre como devem se vestir no ambiente de trabalho. Acreditar que todos têm o mesmo entendimento do que é adequado ou não pode gerar saias justas. Cabe à companhia expor que limites não devem ser cruzados. Nesse caso, vale usar e abusar dos canais de comunicação internos para falar de boas práticas ao se vestir e o que não será aceito.

SEM RIGIDEZ

Antes mesmo do surgimento da Covid-19, o Itaú já havia decidido deixar de lado as regras antiquadas e criou a campanha Vou Como Sou. Os 86  mil colaboradores do banco, incluindo a turma das agências, foram liberados de formalidades. Outro banco que também adotou um novo estilo recentemente foi o BMG. “Oficializamos o novo dress code no início de 2020, antes da

pandemia, porém já estávamos ‘plantando a ideia’ e promovendo flexibilizações desde 2019”, explica Alexandre Winandy, diretor de digital e marketing do BMG. “O motivo é que estamos em um processo de transformação muito acelerado e optamos por trabalhar os fundamentos antes de sairmos comunicando. Então, iniciamos essa mudança no dress code incentivando nossos executivos a aparecerem de camiseta, bermuda, chinelo, até formalizarmos uma nova política no começo de 2020 com um grande boom de comunicação

tre áreas, maior ousadia nas ações do dia a dia. Fazendo um balanço, conseguimos listar apenas pontos positivos”, comemora o diretor de marketing do BMG, deixando claro que o banco optou pelo “no dress code”: “Tem apenas uma regra... se você for com camiseta de time de futebol, não pode ter evidente o logo da concorrência. Tirando isso, pode tudo: camisetas de clube sem patrocínio, gorro, chinelo... Não fazemos nenhum tipo de ‘curadoria’”, finaliza. n PODER JOYCE PASCOWITCH 31


MATRIZ

VISÃO ALÉM

DO ALCANCE Uma das principais vozes no debate sobre financiamento ao desenvolvimento brasileiro, a economista e professora Lavinia Barros de Castro alerta: sem uma agenda estabelecida de longo prazo, as preocupações imediatas, como o ajuste das contas públicas, podem abortar a recuperação da economia e o avanço social POR SERGIO LEO

D

FOTOS ZÔ GUIMARÃES

outora em economia e em ciências sociais pela Universidade da Califórnia, em Berkeley, e uma das principais vozes no debate sobre financiamento ao desenvolvimento no país, Lavinia Barros de Castro alerta para um assunto urgente no Brasil: como sair da crise econômica e de saúde de maneira sustentável? É possível planejar com tanta incerteza na economia e na política? Sem uma agenda de longo prazo, as preocupações de curto prazo, como o ajuste das contas públicas, podem abortar os movimentos de recuperação econômica que começam a aparecer nos indicadores, avisa ela. Professora no Ibmec no Rio de Janeiro especializada em história econômica e programas de financiamento ao desenvolvimento, Lavinia compartilhou sua experiência com a PODER por Zoom, da casa onde mora e mantém, em sua ampla biblioteca, obras herdadas do pai, um dos grandes nomes da economia brasileira, Antônio Barros de Castro (ex-presidente do BNDES). Ela recomenda: “Precisamos saber onde colocar nossas fichas”. E conta como fazer isso nesta entrevista exclusiva.

32 PODER JOYCE PASCOWITCH

PODER: COMO É POSSÍVEL FALAR EM PLANEJAMENTO NESTE MOMENTO COM TANTAS MUDANÇAS? LAVINIA BARROS DE CASTRO: Com Juscelino

Kubitschek, nos “50 anos em 5”, as propostas vinham redondas aos grupos executivos, com questões técnicas, soluções legal e financeira, e instrumentos macroeconômicos para impulsionar cada setor. Essa visão de como destravar as questões, inclusive fazer a solução legislativa, para passar no Congresso, foi talvez o grande motivo do sucesso. Mas em um contexto muito diferente do atual; havia hipertrofia do Executivo e foram criados órgãos que impulsionaram isso. O II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), no governo Geisel, também foi muito diferente: governo militar, sem consulta à população. Hoje, há uma complexidade institucional para estabelecer novos planos.

PODER: HOJE, INCLUSIVE, O JUDICIÁRIO INTERFERE... LBC: Exatamente. Por outro lado, a relação do

Estado com a sociedade mudou. É uma sociedade em rede, que questiona. A capacidade de governança, de o Estado conseguir implementar


PODER JOYCE PASCOWITCH 33


políticas é diferente. O mundo antes da Covid-19, porém, já caminhava para políticas industriais que requerem planejamento. Não tem como fugir: as grandes agendas atuais são tecnológicas ou climáticas, e elas, por definição, são de longo prazo. A agenda da descarbonização tem metas para 2050, não tem como não planejar. A crise está sendo uma “parteira”: precipita a discussão sobre crescimento da desigualdade, a questão climática, a política industrial... PODER: HÁ UM DEBATE SOBRE SE O BRASIL DEVE FOCAR EM SETORES ONDE É MAIS COMPETITIVO, COMO O AGRONEGÓCIO, E IMPORTAR A TECNOLOGIA QUE NÃO PRODUZ. O QUE PENSA SOBRE ISSO? LBC: A pandemia, nisso, também trouxe elementos

novos ao debate. Lá fora já se discutia a manufatura avançada, a indústria 4.0, o made in China... uma revalorização da indústria. Aqui, no primeiro trimestre de 2021 o peso da agropecuária e da indústria extrativa no PIB ultrapassou o da indústria de transformação. A última vez em que isso aconteceu

34 PODER JOYCE PASCOWITCH

foi no fim dos anos 1950. Esse dado é muito chocante. Nas exportações, a indústria já havia regredido, revertendo a diversificação que tínhamos. Agora estamos falando da própria estrutura industrial, uma queda que começa em 2008. PODER: O QUE SERIA UMA POLÍTICA INDUSTRIAL NOS DIAS DE HOJE? LBC: O mundo já estava se reposicionando, o FMI

chegou a lançar um paper sobre “a volta daquele que não pode ser nomeado”, que é a política industrial. A pandemia trouxe novas questões: investir em algumas tecnologias, que chamamos habilitadoras, que perpassam vários setores, como biotecnologia, ótica e eletrônica; usar compras governamentais para impulsionar isso; e buscar essas novas tecnologias. Ao mesmo tempo há a questão da colaboração, dos bens públicos globais, como surgiu na produção da vacina. Passa a haver incentivos muito maiores para plataformas colaborativas de inovação, que já estavam ocorrendo.


“Precisamos de um grande plano de infraestrutura, sustentável, resiliente. Política industrial tem de deixar de ser uma expressão que não pode ser mencionada” PODER: E O QUE SERIA UMA POLÍTICA INDUSTRIAL PARA O BRASIL? LBC: Há um texto muito interessante de cinco autores

do BNDES [Uma visão de política industrial para o Brasil, resultados a partir de uma matriz tecnológica, de Thiago Miguez, Gabriel Daudt, Bruno Plattek, Luiz Daniel Willcox e Sergio Schmitt] sobre o que seria uma política industrial para o Brasil, em que partem da identificação das “tecnologias-base”, com maior poder de multiplicação no país. Seria uma política centrada nessa ideia de tecnologias habilitadoras, partindo de nossa base industrial. E se perguntam o que temos de destravar, em questões regulatórias, de financiamento, de infraestrutura, de tecnologia de informação.

PODER: TEM SIDO ANUNCIADO UM ESFORÇO DE INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA, COM PRIVATIZAÇÕES, NOVOS MARCOS REGULATÓRIOS. LBC: Existe um ciclo de [investimentos em] infraestrutura

vindo, só que, pelas perspectivas, não alcançará os 4,5% do PIB que precisamos. Não existe desenvolvimento com esse gap que temos em infraestrutura, senão vai matar a política industrial ainda no ovo. Tem duas dimensões: a econômica, porque a infraestrutura é fundamental para produtividade e competitividade; e a social, que é saúde, educação, segurança. As pessoas que mais sofreram com a pandemia são as mais vulneráveis e pobres, a recuperação tem de se dar em novas

bases e tem crescido o consenso internacional sobre necessidade de crescimento com inclusão. PODER: OS ESTADOS UNIDOS LANÇARAM SUA PRÓPRIA AGENDA, QUE IMPLICA EM VULTOSOS INVESTIMENTOS PÚBLICOS. NO BRASIL, AS RESTRIÇÕES FISCAIS NOS IMPEDEM DE SEGUIR O MESMO CAMINHO? LBC: A questão é que, se não continuarmos crescendo,

as restrições fiscais não serão superadas. Não adianta fazer uma série de restrições fiscais que desabilitam o crescimento. O que há no plano do presidente Joe Biden que é interessante é essa pegada da infraestrutura e as tecnologias habilitadoras: precisamos saber onde colocar nossas fichas. E tem a pegada social, de que não podemos prescindir no Brasil, nesse momento em que se agravaram questões de desigualdade e pobreza. Precisamos de uma agenda de retomada de emprego e renda no Brasil. É a maior questão.

PODER: A INFLAÇÃO NÃO VAI SER UM OBSTÁCULO ÀS MEDIDAS DE CRESCIMENTO? LBC: Temos de distinguir entre inflação e mudança

de preços relativos. Com um choque de commodities ou uma desvalorização cambial muito forte geram picos inflacionários, mas a alta só se retroalimenta se há alta indexação de preços, que não temos mais, ou excesso de demanda, que absolutamente não é o caso. Com inflação de custos, o instrumento a usar não é travar a economia. Se houver um overshooting no ataque à inflação, podemos abortar a retomada do crescimento econômico.

PODER: QUAL SERIA A PRIORIDADE HOJE? LBC: Três problemas precisam ser atacados

simultaneamente. Precisamos de um grande plano de infraestrutura, sustentável, resiliente. E política industrial tem de deixar de ser uma expressão que não pode ser mencionada, como diz o FMI. É identificar quais tecnologias podemos impulsionar, que são multiplicadoras. Não vamos escolher um setor, mas uma tecnologia que vai se ramificar para vários outros setores. Temos de perguntar o que está travando, e atacar esses pontos.

PODER: E O TERCEIRO PROBLEMA? LBC: Temos de enfrentar as questões

de desigualdade. O Brasil é desigual em todas as dimensões: na renda, no gênero, na raça. Só que o mundo mudou. E, infelizmente, a pandemia agravou essas desigualdades. n PODER JOYCE PASCOWITCH 35



RESPIRO

A PRIMEIRA DA TURMA

FOTO ARQUIVO NACIONAL

Assim que a carioca AÍDA DOS SANTOS soube que participaria da última eliminatória para as Olimpíadas de Tóquio, em 1964, sua mãe não a liberou até que antes fizesse as “coisas da casa”: carregar balde d’água, lavar roupa e encerar o chão. Por isso, quando chegou ao Maracanã, estava tão cansada que sua ideia “era só dar uma satisfação”. Após a insistência do técnico, decidiu participar da prova e atingiu, em um salto de 1,65 m, o índice necessário para seguir viagem. Em uma época em que os esportes individuais estavam ligados à Confederação Brasileira, Aída aterrissou no Japão junto com a delegação masculina de vôlei, mas aos poucos se viu sem técnico, sem uniforme e nem mesmo sapato de prego para competir. Treinando sozinha, foi a primeira mulher brasileira a disputar uma final olímpica e, mesmo com o pé torcido, marcou 1,74 m no salto garantindo o quarto lugar e o melhor resultado para uma atleta do país nos Jogos durante 32 anos. “Sou uma pessoa comum”, ela disse em entrevista no ano passado, enganando só mesmo quem não conhece sua história.


BELEZA QUE DÁ LUCRO PODER

Marcelo Mourão apostou na Alma Prime para sua rede MyBeleza

T

ratamentos estéticos não invasivos se tornaram uma tendência no mercado da beleza e nos últimos anos apresentaram enorme evolução. Neste sentido, a LBT LASERS, uma das mais conceituadas distribuidoras de equipamentos médicos-estéticos, foi protagonista ao trazer para o Brasil uma multiplataforma ultra-avançada que oferece procedimentos não cirúrgicos com resultados excepcionais para gordura localizada, flacidez e contorno corporal. Desenvolvido pela companhia israelense Alma Lasers, referência mundial no setor, o Alma Prime combina as últimas inovações

em ultrassom e radiofrequência (RF) para fornecer tratamentos eficazes e altamente personalizados com efeitos naturais de longa duração. Com a lipo ressonância seletiva e a exclusiva tecnologia de ultrassom vetorial UltraSpeed, o Alma Prime se tornou conhecido como “lipo sem marcas”. O tratamento consiste na emissão de ondas sonares vetoriais responsáveis por realizar uma lipólise não invasiva. Além de agir na gordura localizada e remodelar o contorno do corpo, o calor intenso gerado diminui a flacidez estimulando a produção de novas fibras de colágeno. Além do ultrassom vetorial, a plata-

forma oferece o sistema de radiofrequência robótica Accentuate, totalmente focado em tratar a flacidez da pele, e outras tecnologias para cuidados faciais como a ponteira Colibri (RF Plasma), uma solução potente para realizar o lifting não cirúrgico das pálpebras e tratar linhas, rugas, xantelasmas, entre outros problemas dermatológicos. Nas unidades da clínica MyBeleza, em Belo Horizonte, o Alma Prime causou uma verdadeira revolução. Para pacientes, que buscam por tratamentos rápidos, não cirúrgicos e sem downtime, e para o empresário Marcelo Mourão, dono da rede que viu o seu faturamento mensal aumentar em mais de R$ 60 mil com a compra do equipamento. “Foi um investimento seguro e que além de trazer inovação para a clínica, em um mercado tão competitivo, trouxe um retorno de forma rápida”, conta Mourão. “É econômico para o meu negócio e entrega excelentes resultados para as minhas pacientes, essa é a combinação que explica o seu sucesso no mercado.” A diretora da LBT Lasers, Odete Manor, reforça as vantagens e o ótimo custo-benefício do Alma Prime. “Como empresa, nossa missão é contribuir para que os negócios dos nossos clientes sejam bem-sucedidos e, portanto, alta tecnologia é imprescindível. O Alma Prime é um produto único e de alta performance para as questões estéticas. Ele não possui consumíveis, o que é um excelente benefício para as clínicas, além de ser o queridinho das celebridades não somente no Brasil, como lá fora. Isso é um grande trunfo para quem investe, pois sabe que realmente vai alcançar resultados excepcionais. ” + LBTLASERS.COM.BR

FOTO DIVULGAÇÃO

INDICA


ESPECIAL

SUSTENTABILIDADE Há algum tempo a economia circular vem ganhando espaço e com a pandemia ficou ainda mais evidente a necessidade de tornar cíclico o uso dos recursos naturais. Uma vantagem não apenas para o meio ambiente, mas também para as empresas


ESPECIAL

UNIVERSO CIRCULAR

Um modo de produção em que nada se desperdiça e tudo se transforma. A economia circular parte da premissa de que é necessário reduzir, reutilizar, recuperar e reciclar materiais e energia. Além do impacto ambiental e social, o modelo é capaz de incrementar US$ 17 bilhões na economia brasileira até 2030 POR NIVALDO SOUZA

40 PODER JOYCE PASCOWITCH


ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES; FOTO DIVULGAÇÃO

O

que a crise hídrica – que pode levar o brasileiro a reviver o “apagão” energético do início do século –, a última reunião de cúpula do G7, o pacote trilionário de recuperação do governo Joe Biden e a propagação de marketplaces com produtos usados têm em comum? São as faces de um losango chamado economia circular, conceito que vem ganhando destaque no debate econômico por se opor ao modelo de desenvolvimento linear, baseado no processo de extração de matérias-primas, transformação delas em produtos, consumo e descarte. A “circularidade” visa reduzir o impacto do homem na natureza em busca da sustentabilidade. Propõe otimizar o percurso produtivo a partir da reutilização de insumos reciclados e o menor uso de recursos naturais. É uma aposta na mudança da maneira como o mundo se desenvolveu desde que o homem decidiu queimar carvão para alimentar máquinas no início da Revolução Industrial. “A economia circular é um conceito sistêmico que considera que vivemos em um planeta com recursos finitos e a lógica linear não faz mais sentido na medida em que a produção, o consumo e o desenvolvimento evoluíram a um patamar que se tornou insustentável”, explica Juliana Picoli, especialista em ciclo de vida de produtos e pesquisadora do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV. Os ambientalistas criaram uma metodologia para medir quanto utilizamos da natureza em relação à sua capacidade de recuperação, o Dia da Sobrecarga da Terra (Earth

Overshoot Day). Em 2020, a sobrecarga ocorreu em 22 de agosto. Ou seja, o modelo econômico atual utilizou, em apenas oito meses, todos os recursos naturais necessários para manter o padrão corrente de consumo da humanidade por um ano. “Esse dia costumava ficar mais próximo de dezembro. Hoje, começamos os anos no vermelho”, observa Juliana.

CONSUMIDOR CONSCIENTE

O desgaste do planeta desperta cada vez mais atenção entre os consumidores e força as empresas a mudarem. Pesquisa recente da consultoria McKinsey indicou que 85% dos brasileiros se sentem melhor comprando produtos sustentáveis. A preocupação do consumidor pode levar a mudanças capazes de fazer a lógica incrementar US$ 17 bilhões na economia brasileira até 2030, segundo estimativa do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).

Mas, se de um lado a circularidade possibilita ganhos econômicos, no sentido inverso, se nada for feito para mitigar as mudanças climáticas, todos iremos perder. Foi essa a conclusão do G7, bloco formado pelas sete maiores economias do globo (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido), após reportar que seu Produto Interno Bruto (PIB) perde 8,5% ao ano por causa de crises climáticas cada vez mais recorrentes. Não à toa, os líderes do G7, reunidos em junho na Inglaterra, calcularam ser necessário aportar em média US$ 1 trilhão por ano no pós-pandemia para promover uma retomada econômica mais sustentável no sentido de diminuir o aquecimento global. O primeiro passo foi o anúncio coletivo de suspensão de subsídios públicos para geração térmica de energia com a queima de carvão até dezembro. Em paralelo, os EUA deram um passo firme em direção à econo-

Otimizar o percurso produtivo a partir da reutilização de insumos reciclados é a base da economia circular

PODER JOYCE PASCOWITCH 41


DESAPEGO NA MODA

A fotógrafa Fernanda Duarte, de 33 anos, deu à luz Nicolas há 3 meses. Mãe de uma menina de 10 anos, ela sabia que criança cresce na velocidade em que roupas e objetos, como carrinho e cadeira de segurança, ficam obsoletos. Por isso, optou por adquirir parte do enxoval em sites de desapego. Não foi a primeira vez que Fernanda decidiu reaproveitar algo em bom estado para continuar sendo usado. No ano passado, ela comprou fogão e geladeira do mesmo modo. “Procurando bem, fazendo uma peneira nesses sites, você encontra coisas boas que as pessoas estão trocando. Encontrei muita coisa boa pela metade do preço, pelo menos”, conta. Até pouco tempo, o hábito da fotógrafa recebia uma alcunha depreciativa: “comprar de segunda mão”. Agora, rebatizado na era tecnológica, o ato de “desapegar” está na moda. Nada é mais pujante para a economia circular do que o desapego. Os consumidores de produtos de luxo também aderiram. Isso fez o Iguatemi 365, marketplace da rede de shopping centers, firmar uma parceria com o brechó virtual de luxo Etiqueta Única. O dinheiro obtido com as vendas, por quem decidiu passar adiante uma peça que não usa mais, gera um desconto de 10% na compra de um produto novo no marketplace. O gerente-geral de Iguatemi 365, Fernando Crizol, diz que a parceria objetiva levar os clientes a um movimento consciente de consumo. Os próximos passos do projeto podem incluir entregas com uso de carros elétricos e descarte de embalagens, que hoje são de plástico biodegradável. “Tem muita coisa que a gente ainda quer fazer”, afirma.

42 PODER JOYCE PASCOWITCH

MUDANÇAS À VISTA

A pandemia acelerou tendências transformadoras nas empresas, segundo relatório da consultoria PwC. O remodelamento de modelos de negócios entrou definitivamente na agenda empresarial. O capital debate como reduzir o uso e a perda de recursos, como ampliar fontes renováveis de energia e como fazer os produtos circularem por mais tempo entre os consumidores. “As empresas começam a notar que essa mudança faz sentido no aspecto transformacional, de negócio e financeiro, porque, no momento em que se consegue trazer outros fornecedores para a cadeia de produção, com todos engajados em economizar e compartilhar recursos, cria-se um ecossistema onde não tem desperdício. Se não tem desperdício, não tem custo. Isso torna a empresa mais eficiente”, avalia o sócio da PwC Brasil Ronaldo Valiño. Existe, contudo, um caminho a ser percorrido no Brasil. Somente 30% do setor industrial havia ouvido falar de economia circular até 2019, conforme estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). A pesquisa então estimulou os industriais a dizerem se praticavam atividades como reciclagem de materiais, substituição de serviços presenciais por digitais, aumento da vida útil de produtos por meio de ecodesign e manutenção, entre outros. Constatou-se que 76,5% das empresas do setor de transformação realizavam essas ações típicas da economia circular. O caminho da universalização da circularidade, portanto, parece não ser muito longo. “Fica claro que as empresas já adotam práticas relacionadas à economia circular, porém não conseguem associá-las ao tema”, observou o relatório da CNI.

‘‘Se não tem desperdício, não tem custo. Isso torna a empresa mais eficiente” Ronaldo Valiño, sócio da PwC Brasil

CIRCULARTECH E MINERAÇÃO URBANA

O que você faria se precisasse descartar uma televisão, smartphone, notebook, máquina de lavar ou geladeira? O ideal é destinar a recicladoras especializadas ou lojas com programas de reciclagem de eletrônicos. Mas a maioria das pessoas joga no lixo comum. Cada brasileiro gera em média 10,2 quilos de lixo eletrônico por ano. Menos de 1% do resíduo é reciclado no país. Nas contas da Organização das Nações Unidas (ONU), o mundo gerou 53,6 milhões de toneladas de resíduos eletrônicos em 2019 e só reaproveitou 17,4%. Esse lixo é uma verdadeira mina de ouro... além de outros metais: cobre, prata, zinco, estanho. Todos de alto valor no mercado e elevado poder de poluição. Ao processo de recuperação dos microgramas de cada metal presente em eletrônicos dá-se o nome de “mineração urbana”. Há empresas especializadas nesse garimpo. Nenhuma instalada no Brasil. O país exporta sucata para mercados onde tais

FOTOS ANDRÉ TELLES/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

mia circular ao lançar um pacote de US$ 8,2 trilhões em investimentos até 2031, tendo entre seus motores a circularidade. O pacote de Biden pretende, por exemplo, acelerar a presença de veículos elétricos nas ruas americanas, diversificar a matriz energética para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e estimular uma industrialização alinhada à meta do Acordo de Paris, cujo objetivo central é limitar a elevação da temperatura a 1,5 grau em relação à Era Pré-Industrial.


mineradoras operam – caso da Bélgica, Canadá e China. Alcir Pereira é gerente comercial da Reciclo Inteligência Ambiental, especializada em eletroeletrônicos. Ele conta que a empresa, criada há 17 anos, processa entre 800 e mil toneladas por mês. Até 2017, a companhia recolhia equipamentos e exportava como sucata para países com mineradoras urbanas. Mas há quatro anos as coisas mudaram: a Reciclo Inteligência Ambiental decidiu recuperar notebooks e outros equipamentos em condição de serem revendidos. O recondicionamento e a revenda respondem atualmente por cerca de 50% do faturamento da empresa, superando a comercialização de sucata (30%) e a prestação de serviços (20%). “A gente viu que o mercado

seguia para esse modelo e entendeu que se conseguisse estender a vida útil dos equipamentos contribuiríamos mais para o meio ambiente”, afirma Pereira. O movimento de circularidade foi provocado pelo Plano Nacional de Resíduos Sólidos, ao determinar que fabricantes de eletroeletrônicos devem criar mecanismos de logística reversa. Este é o primeiro ano no qual o setor deve reciclar ao menos 1% de tudo o que vende. Estima-se que 21 mil toneladas devam ser recicladas em 2021. A meta subirá gradualmente até atingir 17% dos eletrônicos comercializados anualmente em 2030, totalizando cerca de 364 mil toneladas. O empresário Fernando Perfeito viu aí a oportunidade de criar uma circulartech – startup de tecnologia

limpa. Ele lançou a Circular Brain em 2019 como plataforma virtual de gestão de resíduos, que auxiliou a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) a formular a regra de reciclagem. A empresa já montou uma rede de 12 recicladores como a Reciclo no país. A meta é chegar a 22 estados ainda este ano. Perfeito acredita que será possível comercializar “créditos de reciclagem” para empresas que precisam cumprir a lei. A Circular Brain desenvolveu com o governo federal uma metodologia para certificar todo processo, garantindo à indústria de eletroeletrônicos os comprovan-

ECONOMIA CIRCULAR PRODUÇÃO

ECONOMIA LINEAR EXTRAÇÃO

PRODUÇÃO

CONSUMO

DESCARTE

Vs.

‘‘Se a gente conseguisse estender a vida útil dos equipamentos contribuiríamos mais para o meio ambiente” Alcir Pereira, gerente comercial da Reciclo Inteligência Ambiental

CONSUMO

RECICLAGEM

COLETA

tes legais. “O crédito de reciclagem funciona de maneira similar ao crédito de carbono, permitindo a uma empresa compensar o seu compromisso ambiental. A diferença é que o crédito de carbono é voluntário, não existe obrigatoriedade legal. Já a logística reversa de eletrônicos é obrigatória. As empresas precisam reciclar parte de tudo que a gente liga na tomada. O crédito comprova com tecnologia de rastreabilidade que todas as frações do produto foram corretamente processadas”, explica ele. n PODER JOYCE PASCOWITCH 43


Complexo Eólico Tucano, projeto da Unipar em joint venture com a AES Brasil, começa a ser construído na Bahia e pretende ampliar competitividade com acesso à energia de fontes renováveis Foi dada a largada nas obras do Complexo Eólico Tucano na Bahia, projeto que integra a UNIPAR, líder na produção de cloro, soda e PVC na América do Sul, e a AES Brasil, uma das principais geradoras de energia renovável. A joint venture tem foco na geração de energia eólica, reforçando a estratégia da indústria química na busca de soluções energéticas sustentáveis para o seu negócio. A parceria envolve a construção de um complexo com capacidade instalada de 155 MW médios, equivalentes a 78 MW médios de energia

assegurada a P50, nos municípios baianos de Tucano, Biritinga e Araci. Além de oportunidade de investimento em fontes de energia limpa, este projeto representa o primeiro movimento efetivo da empresa para integração de suas operações com o elo anterior da sua cadeia produtiva, conferindo maior competitividade e sustentabilidade ao seu negócio. Atualmente, energia elétrica é um dos insumos de maior peso dentro do processo produtivo de soda e cloro, utilizados em inúmeros segmentos da atividade econômica no país. “Consi-

deramos este investimento estratégico, na medida em que ampliará nossa condição futura de competitividade, em um mercado marcado por competição local e global que demanda a busca contínua por eficiência. Queremos fortalecer nossas práticas produtivas aliadas à visão de sustentabilidade ponta a ponta”, explica o CEO da Unipar, Mauricio Russomanno. Coordenado pela AES Brasil, o Complexo Eólico Tucano conta com a nova plataforma Siemens Gamesa 5.X, com aerogeradores de 115 metros de altura, com potência de até 6,2 MW,

FOTOS AGÊNCIA UNSPLASH/RAWFILM; AGÊNCIA UNSPLASH/AMERICAN PUBLIC POWER ASSOCIATION; UNIPAR/DIVULGAÇÃO

A SOLUÇÃO VEM DOS ARES


PODER INDICA

Mauricio Russomanno, CEO da Unipar

e rotor de 170 metros de diâmetro, a maior máquina “on shore” do Brasil, adequada às condições de vento local. “Fomos pioneiros como grande consumidor do mercado livre de energia. Agora, seguimos firmes para fazer história, mais uma vez, tendo neste projeto de grande envergadura a nossa conexão com o futuro inexorável de nossa indústria, alicerçado pelo compromisso de geração de valor ao negócio e da atuação sustentável”, afirma Russomanno. Clarissa Sadock, CEO da AES Brasil, comemora: “O início das obras do Complexo Tucano é um passo importante da nossa estratégia de crescer em ativos eólicos. Nada melhor do que começar esse investimento tão relevante com uma parceria com

a Unipar, um cliente estratégico da companhia. Estamos nos tornando sócios em função de um produto inovador no mercado”. A obra cumpre o cronograma estimado de construção com conclusão prevista para o segundo semestre de 2022, contempla a fase da joint venture, com controle compartilhado com a Unipar, e a fase 2 do acordo de compra e venda de energia com a Anglo American, que juntas totalizam 322,4 MW de capacidade instalada – a Unipar firmou contrato de consumo de 60 MW médios com a JV, por um período de 20 anos, com o início da sua vigência previsto para 2023; a parcela de energia remanescente produzida será comercializada pela JV no mercado livre.


ESPECIAL

E AGORA,

FOTO GETTY IMAGES

O RIO

46 PODER JOYCE PASCOWITCH


Tratado por João Doria como um de seu três principais projetos à frente do Estado de São Paulo, a despoluição do Pinheiros avança para trazer paulistanos e turistas às suas margens POR PAULO VIEIRA

A

vistar peixes num rio não deveria surpreender muita gente, a menos que esse rio fique numa cidade como São Paulo, que década após década vem tratando seus grandes corpos hídricos unicamente como estorvo para o tráfego de automóveis, especialmente em épocas de chuvas e inundações. Mas o filminho feito por um funcionário público que estava às margens do rio Pinheiros surpreendeu, viralizou nas redes sociais e, por fim, alegrou imensamente o governador paulista, João Doria, que pretende fazer da despoluição desse rio um de seus três principais legados de governo, como disse em entrevista recente a Joyce Pascowitch, publisher de PODER. O estado está a investir cerca de R$ 4 bi no projeto Novo Rio Pinheiros, grande parte disso em redes coletoras de esgoto doméstico. Outro aspecto importante é o aproveitamento das margens do rio, que hoje já são frequentadas principalmente por ciclistas. Doria quer estabelecer até 2022 um parque linear na margem oeste do Pinheiros, além de tornar a antiga usina da Traição, na valorizadíssima região da Vila Olímpia, em atrativo turístico.

PODER JOYCE PASCOWITCH 47


de Infraestrutura e Meio Ambiente, Marcos Penido, disse a PODER que não se “espera que alguém vá nadar ou consumir água do rio”, mas que o aproveitamento de suas margens e a navegação são grandes objetivos. A despoluição do Pinheiros já foi anunciada – e tentada – por diversos outros governadores, sem sucesso. Além do monótono trabalho de recolher materiais volumosos da superfície, chegou-se a implantar, durante o governo Alckmin, por exemplo, um sistema pouco eficaz de flotação e agregamento de lixo. Para Penido, a diferença em A ciclovia do Pinheiros, que trouxe ciclistas para perto do rio, antes só visitado por capivaras; na pág. seguinte, o Tâmisa, em Londres, hoje bem mais vivo do que há 40 anos

Para despoluir o Pinheiros é preciso também cuidar da miríade de afluentes que desaguam nele. O Tietê, o grande rio paulista, não é o maior problema. Apesar de poluído na região metropolitana, ele recebe as águas do Pinheiros, influenciando-o mais significativamente em épocas de cheias. Eliminar o mau cheiro e a turbidez do Pinheiros é fundamental para trazer a população de São Paulo para mais perto dele, o que, no fim, deverá gerar um círculo virtuoso no cuidado com o rio. Para isso, é fundamental eliminar o lançamento de esgoto nas suas

48 PODER JOYCE PASCOWITCH

águas – ou nas águas dos afluentes. O estado, por intermédio da Sabesp, realizou ligações de esgoto em 302 mil residências e fala em chegar a mais de 500 mil até 2022. Em córregos que passam por comunidades em que ofertar a rede coletora é pouco viável, há o plano de edificar cinco pequenas usinas de tratamento. Além disso, segue o trabalho de Sísifo que o paulistano se acostumou a ver – e a pagar –, de retirada de entulho, especialmente garrafas pet, mas até pneus e bicicletas, de dentro do rio. Responsável pelo projeto, o secretário estadual

E O TIETÊ?

A situação deplorável do rio Tietê nos anos 1990, o principal rio paulista, navegado pelos bandeirantes que, atrás de índios e ouro, chegaram a Goiás e Minas no processo que levou à interiorização do país, resultou no engajamento da sociedade civil, que exigiu sua despoluição. Um abaixo-assinado, capitaneado pela fundação SOS Mata Atlântica e pela rádio Eldorado, chegou a 1,2 milhão de assinaturas e colocou pressão sobre o então governador paulista Luiz Antônio Fleury. Desde então, cerca de US$ 30 bi foram gastos em sua despoluição (junto com a do Pinheiros) em ações como rebaixamento da calha, mas poucos resultados foram obtidos. Gustavo Veronesi, coordenador do projeto Observando os Rios, da SOS Mata Atlântica, elogia o programa Novo Rio Pinheiros, mas teme certa “perda de foco” no Tietê. Ele também julga ser importante que o projeto contemple questões habitacionais, diretamente relacionadas ao despejo de esgoto no Pinheiros. O estado calcula que 3 milhões de pessoas vivam ou trabalhem à margem do rio e dos córregos de sua bacia. Entre elas, de moradores da favela de Paraisópolis a ocupantes dos edifícios luxuosos do Brooklin. Há também as capivaras, que se adaptaram bem ao Pinheiros hardcore, poluído, e vivem em bandos há anos às margens do rio. Um grupo grande desses roedores chegou também à raia de remo da USP, cujas águas são limpas, e ali proliferou. Virou atração turística.


‘‘Nos programas de despoluição anteriores, atacava-se a consequência. Agora ataca-se a causa”

FOTOS GETTY IMAGES; DIVULGAÇÃO

Marcos Penido, secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo

favor do projeto que lidera é que antes “atacava-se a consequência, agora ataca-se a causa” – o lançamento de esgoto no Pinheiros e em sua bacia. O secretário ainda ressalta que o investimento feito em outras gestões, em rede coletora, por exemplo, levando águas à estação de tratamento de Barueri – será aproveitado. Finalmente, ele não vê no Novo Rio Pinheiros óbice para o programa de despoluição do Tietê, antiga reclamação da sociedade civil que é, de alguma forma, a gênese de tudo isso. O acordo firmado entre a prefeitura de Guarulhos e a companhia de saneamento paulista Sabesp em 2018, ainda no governo Márcio França (PSB), trouxe algum alento ao Tietê, pois apenas 10% do esgoto dessa que é a segunda cidade do estado era tratado.

TÂMISA, O MODELO Em cidades de diversos países desenvolvidos, rios são polos de lazer, atrativos turísticos e, em geral, motivo de orgulho para seus moradores. Mas nem sempre foi assim, e a despoluição do Tâmisa, que corta Londres, por exemplo, hoje navegável, cheio de bares e áreas verdes às suas margens, transformou um rio que era considerada morto – ou seja, que não continha oxigênio – no começo dos anos 1960 em lar de 125 espécies de peixes hoje em dia. A preocupação agora é com o acúmulo de partículas minúsculas de plástico nas águas. Ainda mais redentora foi a limpeza do rio Han, que atravessa Seul, a capital da Coreia do Sul, hoje tomado por parques, fontes, piscinas (artificiais) e ba-

teaux-mouches. O projeto de US$ 0,5 bi foi deslanchado nos anos 1980 para preparar a cidade para a Olimpíada de 1988. O Pinheiros vem sendo devolvido à população com bastante vagar. Como sua várzea – assim como a do Tietê – foi entregue pelos planejadores aos carros, que têm ali um contínuo de vias expressas, ele sempre foi interditado à população. Os ciclistas foram os primeiros a voltar, com a inauguração, em 2010, de uma ciclovia paralela ao rio e à linha 9 do trem metropolitano, que também corre ali. Com recursos privados, a via foi incrementada nos dois últimos anos, recebendo iluminação e alguns cafés, além de um inédito conjunto de chuveiros. Eventos também passaram a ser realizados aos fins de semana. Em 2020, a antiga usina da Traição, responsável por reverter o curso do Pinheiros para abastecer a usina Henry Borden, em Cubatão, foi concedida à iniciativa privada para que ali seja implantado um centro comercial e de lazer, com restaurantes, mirante e museu. Doria gosta de pensar a Traição como seu pequeno Puerto Madero, a região revitalizada de Buenos Aires às margens do Prata que se tornou um bairro turístico e bastante gentrificado da capital portenha, hoje sightseeing obrigatório dos turistas estrangeiros em visita à Argentina. n PODER JOYCE PASCOWITCH 49


ECONOMIA CIRCULAR PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A JBS implementou a produção de biodiesel a partir de resíduos de sua cadeia de produção de proteína e hoje produz anualmente mais de 265 milhões de litros do combustível

C

om os recursos naturais beirando o esgotamento e aterros sanitários lotados, a economia circular tem ganhado protagonismo crescente como alternativa ao velho modelo de economia linear, ou seja, de produção e descarte. A solução é optar por um sistema regenerativo e circular, com uso de energias renováveis, reutilização de insumos e extração sustentável de matéria-prima. Investindo globalmente cerca de R$ 2 bilhões por ano em sustentabilidade, a JBS, segunda maior indústria de alimentos do mundo e líder no setor de proteína, reúne uma série de iniciativas para se adequar aos novos protocolos de um mundo cada vez mais engajado na temática ambiental e preocupado com as consequências do aquecimento global. Tendo a economia circular como

50 PODER JOYCE PASCOWITCH

premissa, a companhia reaproveitou, só em 2019, metade de seus resíduos, ou seja, mais de 1 milhão de toneladas. “Na economia circular não existe resíduo, tudo vira matéria-prima. O que antes iria para o lixo, agregamos valor e convertemos em um novo produto. Do berço ao berço”, explica Susana Carvalho, diretora executiva da JBS Ambiental e JBS Fertilizantes. Entre as iniciativas do grupo está a criação do piso verde, que apresenta a mesma resistência de um piso de concreto, feito a partir do reaproveitamento de aparas de embalagens plásticas multicamadas utilizadas em produtos in natura, que são de difícil reciclagem. O piso é destinado à construção civil e vem sendo empregado na pavimentação de instalações da própria JBS. O primeiro lote do piso verde foi aplicado na unidade matriz

da JBS Ambiental, em Lins, no interior de São Paulo, em uma área de 2,2 mil m² – o que equivale a mais de cinco toneladas de material plástico que deixaram de ser destinadas a aterros. Ainda no universo da economia circular, a JBS implementou a produção de biodiesel a partir de gordura proveniente da cadeia de produção de proteína, e também de óleo de fritura recuperado em residências, escolas, igrejas e estabelecimentos comerciais em mais de 40 municípios, que já ajudaram a dar destinação ambientalmente correta a cerca de 13 milhões de litros de óleo de fritura recuperado. Levando-se em consideração que cada litro de óleo pode poluir até 20 mil litros de água potável, o volume coletado pela JBS já contribuiu para evitar a contaminação de mais de 270 bilhões de litros de água.

FOTO DIVULGAÇÃO FOTOS PAULO VITALE/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

Como a JBS investiu em novas tecnologias para dar utilidade a materiais que seriam descartados. Interesse por economia circular cresceu na pandemia


Susana Carvalho, diretora executiva da JBS Ambiental e JBS Fertilizantes

A JBS desenvolveu piso verde a partir do reaproveitamento de aparas de embalagens plásticas multicamadas utilizadas em produtos in natura. Seu destino é a construção civil e vem sendo usado na pavimentação de unidades da própria JBS

A JBS está construindo uma fábrica de fertilizantes orgânicos em Guaiçara, também no interior paulista, e será a primeira empresa de alimentos no Brasil a utilizar resíduos orgânicos gerados em suas fábricas para produção de fertilizantes. “Com a pandemia, os projetos de economia circular cresceram em uma velocidade gigantesca, tanto globalmente quanto no Brasil. É uma volta ao pensamento de como a natureza sempre nos ensinou, que tudo pode ser reaproveitado”, diz Guilherme Brammer, CEO e fundador da Boomera, empresa que oferece soluções de economia circular para o mercado. Segundo ele, passar mais tempo dentro de casa nos fez encarar o próprio volume de lixo gerado, nos fazendo refletir sobre o atual modo de vida e de consumo. Brammer acredita que os grandes investidores e acionistas estão cada vez mais preocupados em colocar seu dinheiro em empresas com propósito e impactos positivos para a sociedade. “As empresas estão percebendo que é possível ter lucro e produtos excelentes, pensando de uma forma mais sustentável.” Pensamento cada vez mais presente na JBS. O braço ambiental da companhia também gerenciou cerca de 24 mil toneladas de resíduos sólidos e produziu mais de 2 mil toneladas de produtos plásticos reciclados, como sacos de lixo, capas protetoras de paletes, bandejas e filmes termoencolhíveis. A JBS ainda assumiu o compromisso global de se tornar Net Zero até 2040, ou seja, de zerar o balanço de suas emissões de gases causadores do efeito estufa. A meta inclui as operações globais da empresa, assim como a sua diversificada cadeia de valor, que engloba produtores agrícolas e demais fornecedores, além de clientes, em seus esforços para chegar a emissões líquidas iguais a zero. “Como uma empresa líder temos a responsabilidade não só de produzir alimentos de qualidade para a sociedade, mas também produzir de maneira sustentável, com menor impacto possível para o clima e o meio ambiente e, consequentemente, para a sociedade. É o nosso grande compromisso com os nossos consumidores”, destaca Susana Carvalho. PODER JOYCE PASCOWITCH 51


ESPECIAL

RESPIRO DA

Projeto da ASF Brazil, a Amazon Sustainable Forestry, gera renda local com manejo sustentável de madeira no Acre e refloresta a Amazônia POR DENISE MEIRA DO AMARAL FOTO FERNANDO TORRES

52 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTOS GETTY IMAGES; FERNANDO TORRES

FLORESTA


A

os 65 anos, Flávio de Meira Penna gera curiosidade ao falar sobre seu projeto que prevê o reflorestamento para daqui a duas décadas. Como sua mãe viveu até os 101 anos, e o pai, até os 100, ele aposta na herança da longevidade e brinca não planejar partir tão cedo: “Não estou plantando para colher somente daqui a 20 anos, mas para o segundo ciclo da madeira, daqui a 40 anos”, programa o sócio-proprietário e fundador da ASF Brazil, a Amazon Sustainable Forestry. Filho de pai escritor e diplomata, José Osvaldo de Meira Penna, Flávio nasceu em Nova York, morou na Suíça, na Nigéria, em Israel e na Noruega, até se fixar no Rio de Janeiro, onde estudou administração de empresas na FGV, e, posteriormente, fez um MBA em Harvard. Foi no sítio da família em Petrópolis, na Serra Fluminense, que sua paixão pela natureza aflorou. Ainda sem energia elétrica e com uma tri-

lha de 1 quilômetro para se chegar até a casa, Flávio relembra com nostalgia os banhos de rio e as andanças pelo mato. Após engajar-se em diversas instituições como The Nature Conservancy, MacArthur Foundation e Conservation International, atuando na área de captação de recursos, e trabalhar como consultor administrativo para empresas, Flávio resolveu apostar no seu grande projeto de vida. Em 2016, criou a ASF Brazil depois de percorrer o norte do país e se deparar com cenas de devastação ambiental e notar que a comunidade local não era incentivada economicamente a preservar a floresta. “Hoje a conservação da Amazônia é uma preocupação não só nossa, mas do mundo. E como se preserva a floresta? Não adianta deixá-la intocada, porque vai aparecer grileiro e madeireiro ilegal. É preciso engajar as comunidades ao redor no manejo sustentável, prevenindo ainda o desmatamento”, explica Flávio. Segundo ele, um bom exemplo

é o Projeto Tamar, em que a maioria dos funcionários eram os próprios expescadores das tartarugas, que tiveram sua renda revertida para a preservação das espécies e também com o turismo. Segundo o relatório “Florestas: no centro de uma recuperação verde da pandemia Covid-19”, da ONU, o manejo florestal sustentável, ou seja, explorar de forma controlada a floresta com o mínimo impacto ambiental possível, é um meio eficaz para tirar milhões da pobreza e construir economias e sociedades resilientes que podem resistir a pandemias, mudanças climáticas e outros desafios globais. “Com uma atividade economicamente viável, você transforma o predador em protetor. Infelizmente, a atividade econômica do momento – e que acaba com a floresta – é o gado. Mas se mostrarmos que é possível preservar gerando receita de forma sustentável, como o manejo de madeira certificada, turismo, ou extração de produtos locais como a castanha, por exemplo,

Flávio de Meira Penna, sócio-proprietário e fundador da ASF Brazil, a Amazon Sustainable Forestry

PODER JOYCE PASCOWITCH 53


54 PODER JOYCE PASCOWITCH

‘‘Com uma atividade economicamente viável, você transforma o predador em protetor” Flávio de Meira Penna, sócio-proprietário e fundador da ASF Brazil

bricas de madeira na Ásia, a ASF Brazil viu a procura pelo material aumentar exponencialmente. A empresa conta com mais de 400 funcionários, o que a torna um dos principais empregadores privados do Acre. Tanto no manejo das florestas quanto nas áreas de produção, as equipes são altamente engajadas, e não apenas pela questão econômica, mas também pelo propósito do projeto. À medida que expandir as operações para regiões mais remotas da Amazônia, a ASF Brazil espera impactar a vida de 20 mil pessoas.

INVESTIDORES

Em um primeiro momento, o perfil do investidor buscado pela companhia são as family offices, preocupadas em capitalizar negócios que adotem prá-

ticas ambientais, sociais e de governança, além de fundos e investidores institucionais que considerem aplicar recursos em projetos com retorno de médio a longo prazo. A Solstic Advisors, butique especializada em fusões e aquisições (M&A) e captação de recursos, é a assessoria financeira responsável por atrair potenciais investidores, em acordo firmado recentemente. “Em vez de fazer uma simples doação para a Amazônia, o investidor que entrar com a gente irá preservar a floresta e ainda obter retorno financeiro de um investimento como qualquer outro. Essa junção de elementos, somados ao fato de termos a melhor madeira natural do mundo, torna o nosso negócio particularmente atraente”, acredita o fundador da ASF Brazil, que dobra de tamanho a cada ano. n

FOTOS GETTY IMAGES

você não precisa mais do boi”, acredita. A partir da premissa de retirar da floresta somente o que ela pode regenerar, a ASF Brazil atua no mercado extraindo cerca de 15 m³ de madeira por hectare de suas terras – a lei permite hoje até 30 m³ por hectare. O plano de manejo da companhia prevê o inventário de todas as árvores, individualmente numeradas e, catalogadas e com a sua localização de GPS, em uma área florestal de mais de 40 mil hectares na região de Rio Branco e Xapuri, no Acre. “Isso significa tirar uma árvore aqui, e outra acolá, mas não sem antes passar pela aprovação das autoridades ambientais, que vão verificar se aquela espécie pode ser cortada naquela região ou não”, explica Flávio. Ele ainda relembra que o tão aclamado blockchain já é realidade no manejo sustentável, uma vez que toda a cadeia do produto pode ser facilmente rastreada de forma digital desde o início do processo. Com 80% das propriedades da ASF Brazil dedicadas à colheita sustentável e 20% em ações de reflorestamento de espécies exóticas de alto valor de mercado, Flávio conta que o investimento é altamente atrativo para ativos a longo prazo: “Se plantarmos um hectare de Teca, por exemplo, com cerca de US$ 2 mil o hectare, daqui a 20 anos essa madeira vai valer em torno de US$ 60 mil a US$ 80 mil. E durante esses 20 anos o investidor pode ainda gerar receita com o processamento da madeira, produzindo caixa imediatamente”. A companhia processa madeira de lei para a produção de pisos, deques e portas, além de compensados de madeira branca. Os produtos seguem majoritariamente para os mercados europeu, asiático e americano, já que, segundo Flávio, são os mais preocupados com o uso de madeira legal e certificada. “São muito rigorosos e para nós isso é ótimo porque gera pressão nos madeireiros ilegais. Essas marcas não querem seus nomes envolvidos em manchetes sobre a destruição da Amazônia.” Com a pandemia e o fechamento de várias fá-


OPINIÃO

POR QUE FALAR EM

GESTÃO PARA

A DIVERSIDADE? POR LILIANE ROCHA

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

E

m 2014, quando comecei a reforçar o uso do conceito de gestão para a diversidade, enfrentei dois problemas. O primeiro foi o empresariado que se perguntava por que eu estava trazendo para competências empresariais o atributo da diversidade. Já havia visto algumas empresas utilizando o termo de gestão para a diversidade desde 2005, mas ele não era preponderante nas tratativas sobre diversidade empresarial e, no meu entendimento, realmente precisava se tornar. O segundo veio de algumas lideranças de movimentos sociais, para as quais talvez eu parecesse um pouco desalmada ou hipertécnica ao – dentro de uma temática tão humana – falar de números, resultados, projeções. Como ser tão técnica em um tema que por vezes envolve tantas dores, violência e violação de direitos? Foram tempos desafiadores, eu estava tentando unir um assunto, que para muitos é tão passional, com técnicas de gestão empresarial de ponta para garantir resultados mensuráveis. Um dos principais objetivos era levar líderes empresariais, que não estivessem confortáveis com o tema, a visualizar a importância de atuar na área. E também fazer com que líderes, que já atuavam em diversidade, mas com resultados inexpressivos, pudessem consolidar sua atuação, gerando mudança, o que na prática gera transformação na sociedade e contribui

para o impacto positivo almejado por todos, incluindo organizações sociais, sociedade civil organizada e afins. Basicamente, diversidade sem gestão é uma boa intenção que dificilmente será colocada em prática. Ter gestão significa contar com toda a estrutura e objetividade que qualquer outra área interna dentro de uma grande empresa tem. Com um orçamento anual, robusto e condizente com os desafios e transformações que se almeja dessa área. Por mais que a atuação seja transversal em toda a empresa, é preciso contar com um(a) executivo(a) que tenha legitimidade e poder dentro da estrutura para levar adiante a agenda da diversidade. Ter um bom diagnóstico interno que possibilite que a empresa saia do “achismo” e tenha conhecimento real de seu estágio atual de maturidade em diversidade, tendo em vista seus próprios dados, mas também que possam ser comparados com o de outras empresas e indicadores de mercado. Construir indicadores e metas de curto, médio e longo prazos, considerando que alguns desafios devem ser resolvidos imediatamente, outros irão demorar algum tempo e outros são de fato visão de futuro. E nesse caso, assim como em qualquer outra área da empresa, será possível saber se, para além da percepção e do discurso, estão realmente ocorrendo avanços quando falamos

da contratação, retenção e desenvolvimento de profissionais diversos em todos os níveis da organização. E poderemos ainda assegurar a movimentação do ecossistema da empresa, como identificar se a mesma está articulando em prol da diversidade em seus relacionamentos com poder público, organizações sociais, clientes, acionistas e afins, marcando seu posicionamento inclusivo. Nestes últimos anos, tenho ficado feliz ao ver que cada vez mais o empresariado e especialistas têm compreendido a importância de utilizar as palavras gestão para a diversidade, como forma de mostrar que esse tema está no cerne dos negócios, na visão de longo prazo e perenidade da empresa e, principalmente, em uma forma inclusiva de construir organizações. n Liliane Rocha é CEO e fundadora da Gestão Kairós e autora de Como Ser Um Líder Inclusivo. Foi eleita por três anos consecutivos como uma das 101 lideranças globais de diversidade pelo World HRD Congress

PODER JOYCE PASCOWITCH 55


ENSAIO

DA BAHIA PARA O MUNDO

Primeiro músico brasileiro a receber o título de embaixador ibero-americano para a Cultura e vencedor de dois prêmios Grammy, o multiartista Carlinhos Brown atravessou a fronteira das lives na pandemia em um dos períodos mais prolíficos de sua carreira por dado abreu fotos roncca styling: almir jr. & marcelo gomes

Terno Dolce & Gabbana, camisa Zara Man, gravata borboleta Hugo Boss, joias e touca acervo pessoal



R

econhecidamente um dos nomes mais inovadores da música brasileira, Carlinhos Brown não padeceu na pandemia de qualquer tipo de bloqueio criativo, mal invisível que tem afetado dez em cada dez profissionais seja qual for a área. Neste ano e meio o compositor e cantor soteropolitano lançou três discos – dois da trilogia revisionista Umbalista e o segundo volume do projeto infantil Paxuá e Paramim –, intensificou a sua experiência no universo das artes plásticas, produziu a trilha sonora do novo espetáculo da companhia da coreógrafa Deborah Colker e dividiu segredos valiosos em um curso on-line de percussão para iniciantes. Teve mais. Inspirado pelos acontecimentos cotidianos ele compôs singles lembrando as vítimas da Itália, o assassinato de George Floyd, a Irmã Dulce e a vencedora do BBB – “Juliette, Mon Amour”. “Estar em casa trouxe algo de extrema generosidade. Poder ficar com os meus familiares, desfrutar momentos que os dias comuns não permitem por estar sempre viajando. Isso me reestruturou a partir do lugar que eu estava. Senti a necessidade de falar com o mundo a partir da minha casa, da Bahia. A partir da música e da arte”, explica Brown. Dar vazão a essa fertilidade se deve um bocado a uma conquista prestes a completar duas décadas. Em 2002, após alguns anos sob contrato com as gravadoras internacionais, o artista fundou a Candyall Music, sua própria editora e selo, com o intuito de lançar as canções podadas e tidas como pouco comerciais para os executivos das majors. Hoje ele é dono de 80% de sua obra, um privilégio na indústria fonográfica que sequer João Gilberto pôde ter – o pai da bossa nova morreu sem a resolução da disputa judicial que travou por décadas pela propriedade de seus discos. “O patrono da Candyall foi Tim Maia. Ele me ensinou a ser independente quando eu já estava duvidando do alcance da minha música”, lembra o compositor de mais de 100 hits e ganhador de dois prêmios Grammy. No mais recente projeto, Umbalista, Brown revisitou seu cancioneiro autoral em registros ao vivo e passeou por composições que ficaram conhecidas nas vozes de outros artistas, como “Maria de Verdade”, gravada por Marisa Monte, e “Já Sei Namorar”, que ganhou o planeta com os Tribalistas. “É um projeto que me encanta muito, reúne canções de grande importância e que marcaram a minha vida.” O álbum foi lançado no ano passado e teve sequência em 2021 com Umbalista Verão e outra penca de sucessos, estes mais solares, incluindo “Meia-lua Inteira” que o projetou nacionalmente em 1989 depois de ser interpretada por Caetano Veloso no álbum Estrangeiro. Nascido no Candeal Pequeno de Brotas, um quilombo de resistência africana cravado no coração de Salvador, Carlinhos Brown também se dedicou nestes tempos tristes aos trabalhos sociais – possivelmente a sua faceta mais bem-sucedida. Assim ele ajudou à sua comunidade com doações de toneladas de alimentos. “Nós podemos combater a fome que atravessa várias pandemias e é silenciosa em vários países. Este momento mostra a cara disso”, acredita, otimista sobre o presente-futuro da humanidade. “Agora, esse é o desafio que enfrentamos e é nele que podemos nos posicionar e isolar tudo o que não interessa mais ao mundo: ganância, a falta de respeito com o próximo, o preconceito e a intolerância.” n


“Senti a necessidade de falar com o mundo a partir da minha casa, da Bahia”

Blazer e tricô Velmond, calça Armani Jeans, óculos Evoke, joias e touca acervo pessoal. Na pág. anterior, terno Dolce & Gabbana, calça Ricardo Almeida, camisa Zara Man, gravata borboleta Hugo Boss, sapato Fratelli, joias e touca acervo pessoal


Paletó Velmond, camisa Ricardo Almeida, óculos Fuel Eyewear, joias e colar acervo pessoal Make: Rick Brandão Cabelo: Jam Alves Dreadmaker Arte: David Nefussi Produção executiva: Ana Elisa Meyer e Jandyra Fernandes Assistente de fotografia: Guta Virtuoso


CONSUMO POR ANA ELISA MEYER

JULIETTE GRÉCO E MILES DAVIS

FOTOS REPRODUÇÃO; DIVULGAÇÃO

O trompetista Miles Davis tinha 22 anos quando viajou a Paris, na primavera de 1949, para uma série de apresentações na cidade. Estrela em ascensão na América, Miles foi tratado como rei na Cidade Luz. Uma noite, em um café em Saint-Germain-des-Prés, onde dividia a mesa com Jean-Paul Sartre e Pablo Picasso, conheceu a já famosa atriz e cantora Juliette Gréco (1927-2020), então com 21 anos. Se apaixonaram e viveram uma história de amor durante as semanas que o músico passou na capital francesa. O relacionamento, porém, não foi adiante, pois Miles sabia que a vida do casal seria impossível nos Estados Unidos daquela época, já que não era aceitável um negro e uma branca caminharem de mãos dadas no meio da rua, como acontecia em Paris. Os dois seguiram amigos e se encontrando até a morte de Miles Davis, em 1991.

ÓCULOS Salvatore Ferragamo na Marchon Eyewear R$ 2.240 @marchonbrasil ANEL Antonio Bernardo R$ 2.970 antoniobernardo.com.br

TERNO Zegna preço sob consulta zegna.com

BOLSA YSL preço sob consulta ysl.com

LUMINÁRIA Cris Bertolucci Estúdio R$ 13.238 cristianabertolucci.com.br

SANDÁLIA Bottega Veneta R$ 3.850 bottegaveneta.com POLTRONA Ále Alvarenga R$ 6.100 alealvarenga.com PODER JOYCE PASCOWITCH 61


ESPELHO

Na queijaria de Pardinho, os fato que queijos e vinhos Com a Pardinho queijos descansam numa cave franceses estão entre os meArtesanal, o empresário subterrânea climatizada. “Não lhores do mundo. A produção existem precedentes de queijaquase artesanal e natural, que preBento Mineiro investe rias que trabalhem com leite cru serva as características das regiões em queijos e vinhos de em cave com SIF”, ressalta Benonde são concebidos, é colocada em alta conta entre os connaisseurs. qualidade internacional e to, destacando o rigor no processo produtivo, que é assegurado Bento Mineiro e sua família se enfoca em novo mercado pelo Ministério da Agricultura. quadram nessa categoria. Habitués Atualmente, a excelência da das terras e gastronomia francesas, Pardinho Artesanal é representadecidiram encurtar esse caminho e POR CARLA JULIEN STAGNI da por quatro tipos de queijos. O trazer para o Brasil a expertise do outro lado do Atlântico. Para contar essa história, Cuesta, primogênito e carro-chefe da marca, denominado pela formação geológica onde fica a fazenvoltamos quase dez anos no tempo. Foi em 2013 que Bento, na época com pouco mais da, é 100% zebu gir. A base é o francês tomme de sade 23 anos, resolveu se dedicar aos laticínios. Filho voie, só que adaptado. O período de maturação pode de tradicional família ligada ao agronegócio – seu levar oito meses. “Já a base tecnológica do Cuesta pai, Jovelino Mineiro, é um dos grandes pecuaris- resultou no Cuestazul, no Cuestinha - com leite de tas do país –, mesmo muito jovem já atuava na área. cruzadas de jersey com gir, menos maturado -, e, por “Nasci em São Paulo, mas morei até os 15 anos na último, no Mandala, de massa cozida, da família do nossa fazenda em Pardinho [interior paulista]. Sou Comté, do Emmental, com 12 meses de maturação”, filho único de pais mais velhos, sempre andei com explica ele. eles pra cima e pra baixo. A fazenda se confunde com a minha vida. Me formei em ciências sociais na NOVA ONDA PUC e, na época em que estava na faculdade, passaCom esse trabalho artesanal, Bento mira em um va as férias trabalhando na fazenda”, lembra Bento, nicho de mercado que vem ganhando corpo nos úlhoje com 31 anos e à frente da Pardinho Artesanal, timos anos no Brasil: dos pequenos produtores que responsável por alguns dos queijos mais concorridos focam na excelência e qualidade. Desde o início da e premiados do momento. Pardinho Artesanal, as viagens à França são constanO segredo da Pardinho na confecção de um quei- tes para trocar figurinhas com produtores locais. “É jo que faz frente a seus parentes europeus está no importante conhecer a filosofia de cada um e como leite. “O projeto começa com a valorização do leite isso impacta o consumidor”, explica. “Estamos em de zebu gir. Produtos de leite cru tendem a ser mais um momento de descoberta de produtos de qualidacomplexos do que os industrializados. Como na in- de feitos no Brasil, com história, origem, uma cadeia dústria o leite é pasteurizado, é difícil reproduzir em produtiva confiável, e ainda nem sabemos o tamaescala industrial. Depois de muita insistência e ino- nho desse mercado supervalorizado. Também tem a vação, conseguimos certificar nosso processo com o questão da sustentabilidade, de consumir o que esSIF (Serviço de Inspeção Federal)”, comemora. tá mais perto de sua casa evitando grandes deslo-

62 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTOS PAULO FREITAS; THOMAS BACCARO/DIVULGAÇÃO; STUDIO SC/DIVULGAÇÃO

É

EM MATURAÇÃO


“Estamos em um momento de descoberta de produtos de qualidade feitos no Brasil, com história, origem, cadeia produtiva”

De cima a baixo, o queijo Mandala, que tem 12 meses de maturação; processo de produção, e, da esq. para a dir., Cuesta, o carro-chefe da marca, Cuestazul e Mandala

camentos. Quando o produto é bom, feito de forma viva, ele precisa estar próximo de nós, o frescor é importante. Acredito que esse universo vai crescer muito. Por isso começamos um novo projeto, o Empório Artesanal, com o objetivo de dar estrutura para pequenos produtores parceiros.” E como uma coisa leva à outra, a Pardinho Artesanal está dando os primeiros passos na produção de vinho natural, também inspirado no que se consome na França. Segundo

Bento, esse vinho tem efeito vivo, regional, e é a expressão original do terroir: “Produzimos duas safras até agora em parceria com produtores franceses. Tudo terceirizado, vinhas, vinícolas, e produção nossa. O Pardinho de Beber é um vinho de fermentação natural, com menos intervenção possível. Deixamos a natureza fazer o serviço. Produzimos um chardonnay e cabernet franc muito mais leves, digestivos, com muita presença da fruta”, finaliza o produtor, que já tem uma terceira safra em vista. n PODER JOYCE PASCOWITCH 63


RESTART

Em tempos difíceis, ouvir o corpo e a mente é mais do que necessário – e, no premiado spa Kurotel, isso é possível. Destino que une descanso, detox e treino em Gramado (RS), inova cardápio de terapias com cápsula de flutuação e tratamentos pós-Covid por carol sganzerla

O

som do piano que vem da sala oposta ao restaurante é um bálsamo para os sentidos e o programa ideal para encerrar um dia cheio de atividades. No dedilhar das teclas está Lorenzo Rambo, músico de 16 anos que faz todos os hóspedes se acomodarem para acompanhar, emocionados, suas reproduções de Chopin. O calor das notas somado ao chá servido após o jantar consegue afastar o frio de 4 graus que marca nos termômetros de Gramado naquela sexta-feira de junho. Mas, verdade seja dita: é impossível sentir o outono gelado nas dependências do Kurotel, e não só pelos pisos aque-

64 PODER JOYCE PASCOWITCH

cidos; a programação intensa não deixa o corpo esfriar. O casaco, no entanto, se faz necessário na primeira atividade da manhã, as caminhadas de uma hora que acontecem nas ruas de Gramado – famosa pelo fondue e chocolates artesanais – e em volta do Lago Negro, cartão-postal da cidade. De volta ao hotel e devidamente aquecidos, o programa seguinte pode depender do plano escolhido previamente: relaxamento, detox mind, emagrecimento, melhora da imunidade e o tratamento pós-Covid, que inclui fisioterapia respiratória e olfativa e terapia cognitiva. Seja qual for, inclua as aulas de dinâmica corporal na rotina e, acredite, você será uma pessoa mais feliz. Depois de 45 minutos dançando conforme a música, impossível não sair mais leve do que entrou. O cardápio de exercícios ainda inclui circuitos funcionais de alta intensidade, treinos de musculação, aulas de alongamento, ioga e uma academia à disposição. Movimentar o corpo é só um dos fundamentos da metodologia seguida pelo spa desde sua fundação, há quase 40 anos. “Um dos métodos utilizados é o alemão Kneipp, baseado em cinco pilares: alimentação, movimento, fitoterapia, hidroterapia e gerenciamento das emoções”, explica Mariela Silveira, mé-

FOTOS GETTY IMAGES; CAROL SGANZERLA; DIVULGAÇÃO

UM CONVITE À PAUSA


Aulas de ioga fazem parte da programação; temperos frescos e orgânicos vão da horta para os pratos; as massagens são um dos pontos fortes do spa; vista aérea do Lago Negro, cartão-postal de Gramado, um dos locais onde acontecem as caminhadas pela manhã; e detalhe do jardim

dica diretora do Kurotel. Filha dos fundadores, Luís Carlos e Neusa Silveira, ela conta que desde o início o spa trabalha com o conceito de prevenção aliado à tecnologia. As terapias na água são um dos pontos fortes do local, então, prepare-se para mergulhos profundos. O destaque fica para a Unterwassermassage, banheira alemã com sistema de jatos simultâneos e borbulhantes que tocam cada pedacinho do corpo a fim de relaxálo. Quinze minutos marinando na “panela de pressão” aromatizada com a essência que escolher – alecrim, lavanda ou laranja – são suficientes para sair dali anestesiado. No Circuito das Águas, uma sequência de banhos relaxantes, jatos fortes desatam os nós da coluna, o choque térmico ao sair da banheira quente e receber uma chuva de gelo dá um shot de vitalidade e a ducha de espuma de uva lava a alma. Sem falar na cápsula de flutuação, novidade do Kurotel para o tratamento do estresse e ansiedade. Após 40 minutos boiando na água com Sal de Epsom e sob os efeitos da cro-

PODER JOYCE PASCOWITCH 65


Em sentido horário, a partir da foto à esq.: cápsula de flutuação; produtos da Kur Cosméticos, feitos com ingredientes orgânicos; salmão com crosta de gergelim, um dos pratos do menu; e o carrinho de temperos, atração à parte do restaurante

moterapia, a única sensação possível é a de desligamento total. Com mente e corpo suspensos, seguir para o quarto depois de tanto relaxamento – ainda tem as massagens no pacote – é a pedida. Nada melhor do que se dar ao luxo de ficar algumas horas sem fazer nada, tarefa difícil em tempos de hiperconectividade, aproveitando as instalações superconfortáveis da suíte contemporânea de 54 m2, cama king size e isolamento acústico. A vontade de ficar em modo offline só é interrompida pelo chamado do restaurante – compromisso inadiável. Os pratos caprichosamente preparados, como o frango ao curry servido no abacaxi e o risoto ao funghi com cuscuz marroquino e cogumelos, acompanham entrada e sobremesa, e as receitas podem ser personalizadas ao sabor do cliente. O Kurotel não segue uma filosofia restritiva e nada é imposto; a única obrigação é estar aberto às mudanças que inevitavelmente vão acontecer – e serão para a vida. n

*A jornalista viajou a convite do Kurotel - Centro Contemporâneo de Saúde e Bem-Estar

66 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTOS CAROL SGANZERLA; DIVULGAÇÃO

À esq., piscina aquecida, que faz parte do Circuito das Águas. À dir., na parte externa, pedras na água gelada, que ajudam a ativar a circulação ao caminhar nelas


OPINIÃO

DEBAIXO

DESSE

ANGU TEM TORRESMO POR RENATO OCHMAN

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

O

Brasil não é para amadores. Desde quando Pero Vaz de Caminha escreveu ao rei de Portugal que o melhor fruto que aqui se podia produzir, na visão dele, era salvar a gente que aqui vivia, temos altos e baixos. Alguns inevitáveis a uma jovem nação, outros obras de escolhas equivocadas e falta de investimento prioritário em educação. Mas fomos miscigenando e abertos a tantos que chegaram, postergando soluções, tentando camuflar conflitos, sem deixar de mostrar ao mundo um jeito próprio. Sempre procuro olhar para a metade cheia do copo. Millôr Fernandes, mais irônico, dizia que “o otimista não sabe o que o espera”, posso não saber, mas sigo acreditando e me incluo no grupo daqueles que creem no ditado que “Deus ajuda a quem cedo madruga”. E desse grupo, dos otimistas batalhadores, fazem parte empresários que criaram uma certa casca que ajudou a superar tantos sobressaltos, verdadeiros malabaristas. Se a pandemia foi atroz para os negócios, foi mais para as pessoas e famílias, vidas foram perdidas e isso é irreparável. É importante lembrar outro dito popular: “Um olho no peixe, outro no gato”. Com muita tenacidade, disposição, ação e também um pouco de sorte, alguns empresários souberam se equilibrar, proteger suas empresas e passar com o menor

impacto possível por esse período cruel e se viram diante de oportunidades de crescer via aquisições. A ONU apresentou o novo ranking de atração de investimento. Éramos o sexto país em 2019, caímos para a 11ª posição e fomos ultrapassados pelo México na liderança da América Latina. Entraram no Brasil quase US$25bilhõeseminvestimentos,contra US$ 65 bilhões um ano antes – claro que a pandemia prejudicou a todos, nós sofremos mais. O mundo das fusões e aquisições movimentou, em 2020, US$ 2,8 trilhões, número próximo ao de 2017 (US$ 2,9 trilhões), mas inferior a 2018 (US$ 3,4 trilhões) e 2019 (US$ 3,3 trilhões). Novos investimentos transformam, impulsionam e fazem falta, mas é importantíssimo ressaltar que o empresário nacional, que vem

Entre bons números, tivemos no primeiro trimestre de 2021, segundo levantamento da PwC, 333 transações, ante 222 do ano passado. De 2015 a 2019, a média do período foi de 163. Você pode pensar que o número do primeiro trimestre tende a ser menor. Verdade, mas reforçando a metade do copo cheio, em 2020, ainda que sob impacto inesperado da pandemia, foi batido o recorde de transações: 1.038. E quem consulta o gráfico da PwC descobre que os empresários nacionais respondem por nada menos do que 80% dos negócios – das 333 transações, 252 foram feitas por capital nacional e 62 por estrangeiros. Os setores mais agitados foram TI, serviços auxiliares, serviços públicos, financeiro e educação. Se o cenário não tem favorecido um olhar positivo estrangeiro, o brasileiro comprome-

sabendo aproveitar oportunidades, opera em real e aceita as oscilações da nossa moeda, conhece bem o mercado e tinha aquele concorrente mapeado e pôde partir para uma negociação até mesmo favorável. Claro que muitas lições de casa foram necessárias e a incorporação é sempre o desafio de maximizar as operações.

tido com o longo prazo do país não titubeou, deu passos ousados para sonhar com outros, seja IPO, seja aquisições aqui ou no estrangeiro, com pururuca na celebração. n Renato Ochman é advogado, mestre em Direito Societário e autor dos livros Vivendo a Negociação (ed. Saraiva) e Código da Negociação (Quartier Latin)

PODER JOYCE PASCOWITCH 67


PODER VIAJA POR ADRIANA NAZARIAN

OÁSIS

Fica em Israel, mais precisamente no meio do Deserto de Negev, a nova empreitada do Six Senses. Previsto para abrir em agosto, o hotel é uma atração por si só, mas é possível se aventurar em hikings, passeios de camelo, safáris nas dunas, degustações de vinhos e visitas aos vilarejos da região. Como de costume nos endereços do grupo, o spa ganha destaque: tem sauna, sala de vapor, estúdio de ioga e piscinas – interna e ao ar livre +SIXSENSES.COM

Duas novidades hoteleiras na Europa que estão no nosso radar. O Soho House abre este verão em Roma, no bairro de San Lorenzo. Com quartos e apartamentos para membros do seu clube privativo, o local terá cinema, spa e um rooftop com vista panorâmica da cidade. Em Londres, é o NoMad que tem roubado a cena entre os entusiastas do assunto. A novidade ocupa um edifício histórico em Covent Garden e tem a mesma pompa Roma Londres do endereço nova-iorquino. O restaurante, que fica em um átrio com teto de vidro, promete entrar para a lista de favoritos dos locais. +SOHOHOUSE.COM +THENOMADHOTEL.COM

68 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTOS DIVULGAÇÃO

BONS SONHOS


CARTÃO DE EMBARQUE

Boa notícia aos viajantes: o Four Seasons anunciou dois novos roteiros em seu jato privado para 2022. O primeiro deles percorre oito países entre 3 e 26 de maio do próximo ano. Entre as experiências, que tal meditar no pôr do sol de Seychelles com orientação de um especialista, desbravar os segredos de Marrakesh e caminhar ao lado dos gorilas de Ruanda? A outra rota vai de New Orleans – a rede acaba de inaugurar um hotel no destino – até Bahamas entre novembro e dezembro. No caminho, espere por uma Marrakesh viagem de trem até Machu Picchu, aventuras na Antártida e um concerto exclusivo em Bogotá. As viagens acontecem a bordo de um Airbus A321neo-LR todo customizado e inclui concierge, chef executivo e médico durante toda a jornada. +FOURSEASONS.COM

VIDA SELVAGEM

Seychelles

Machu Picchu

O Quênia está aberto para os viajantes brasileiros e é uma ótima pedida para quem busca uma experiência de isolamento total na natureza. Por lá, nossa dica é o Mahali Mzuri, espécie de glamping de luxo com apenas 12 barracas em uma reserva privada no Maasai Mara. Depois de safáris emocionantes, nada como mergulhar na piscina infinita ou tomar um drinque ao lado da lareira, apreciando a imensidão do local. Detalhe importante: a propriedade faz parte do portfólio hoteleiro de Richard Branson, fundador do grupo Virgin, mestre na arte de receber.

Bogotá

+VIRGINLIMITEDEDITION.COM

INVERNO NO CASTELO

Pensando neste momento onde as pessoas buscam um refúgio seguro para passar uma temporada de férias, fins de semana e feriados, ou até mesmo o hotel office, o CASTELO SAINT ANDREWS , em Gramado (RS), formatou ótimas experiências até o fim do ano para que todos os interessados possam se programar e curtir uma viagem dos sonhos em qualquer época do ano e de acordo com a preferência de cada um. Há programas imperdíveis em cidades vizinhas, como Bento Gonçalves com seus roteiros de uva e vinho, além de alta gastronomia na agenda que em agosto inclui a 49ª edição do Festival de Cinema de Gramado. +SAINTANDREWS.COM.BR

PODER JOYCE PASCOWITCH 69


MOTOR

COM VISTA PARA O MAR

Viagens internacionais restritas por causa da pandemia e a necessidade de distanciamento social fizeram estourar as vendas de embarcações de luxo. No mês que marca o início do verão no Hemisfério Norte, selecionamos novidades do estaleiro holandês Oceanco, conhecido por construir alguns dos maiores e mais famosos iates do mundo. Sonhar não custa nada

FOTOS DIVULGAÇÃO

POR DADO ABREU


ALFA NERO 82 m (269 pés)

A piscina infinita no convés de popa do Alfa Nero é um ícone naval. Isso porque foi o primeiro superiate a ter este tipo de luxo. O projeto, do renomado duo italiano Nuvolari Lenard, foi pensado para aproximar ao máximo a tripulação do oceano mesmo estando a bordo de uma embarcação gigantesca. No deque, laterais abertas reforçam a sensação de espaço enquanto um amplo bar oferece ainda mais conforto. Cereja do bolo: o piso da piscina pode ser elevado hidraulicamente com o toque de um botão, transformando o local em heliponto ou um lugar ideal para festas. PODER JOYCE PASCOWITCH 71


KAOS 110 m (361 pés) A elegante piscina do Kaos – anteriormente conhecido como Jubilee – corresponde às credenciais de estilo de seu exterior projetado pelo estúdio Lobanov Design. A piscina é tão extensa que não seria estranho pensar que ao mergulhar você foi transportado para uma raia olímpica em terra firme. Ela toma a maior parte do convés principal, é rodeada por sofás confortáveis e possui um aquário embutido. Quer mais? A bordo, suas grandes salas e espaços comuns acomodam até 30 convidados vip, em 15 cabines. O Kaos é a prova de que maior realmente significa melhor. SUNRAYS 85,5 m (281 pés)

FOTOS DIVULGAÇÃO

São quatro opções de banho a bordo do Sunrays, incluindo três jacuzzis nos conveses superiores e uma grande piscina no convés principal que possui uma área profunda para mergulho, além de um banco molhado ideal para saborear um cocktail refrescante. Projetado para aqueles que amam diversão, este superiate tem outros luxos como boate, box de golfe, academia, spa, salão de beleza e piano bar.

72 PODER JOYCE PASCOWITCH


DAR 90 m (295 pés)

As cascatas estão aparecendo cada vez mais nos superiates como uma forma atraente de conectar visualmente dois deques e, ao mesmo tempo, refletir o ambiente aquático a bordo. No DAR, uma cachoeira dá todo charme à piscina do convés superior – elevada para mais segurança com crianças a bordo. O espaço amplo também oferece um conjunto de sofás e espreguiçadeiras para que a tripulação possa contemplar a paisagem depois de se refrescar.

BARBARA 88,5 m (290 pés) O Barbara possui um solário para atividades de bem-estar e relaxamento, incluindo academia de ginástica equipada com a mais alta tecnologia e preparada para todo tipo de treino antes de você se entregar ao merecido descanso. A banheira de hidromassagem para dez pessoas localizada na frente do deque superior é o local perfeito para aproveitar o sol enquanto a tripulação aprecia a paisagem. O deque inferior possui salão de beleza, sala de massagem e um cinema do tamanho que um superiate desse nível merece. PODER JOYCE PASCOWITCH 73


HIGH-TECH POR FERNANDA BOTTONI

ORGANIZANDO O HOME OFFICE

PREÇO: SOB CONSULTA LENOVO.COM

CALENDÁRIO ELETRÔNICO

Você pode minimizar as distrações enquanto trabalha em casa de um jeito bem moderninho com este calendário Joan Home. O dispositivo eletrônico pode ser colocado na porta do escritório ou perto da sua mesa. Ele importa as informações da agenda e automaticamente exibe sua indisponibilidade quando você está em reunião ou qualquer outro meeting. PREÇO: R$ 1.250 GETJOAN.COM

74 PODER JOYCE PASCOWITCH

O que adianta tanta modernidade se suas mãos continuam geladas durante o trabalho no computador? A Zippo pensou nisso e desenvolveu este aquecedor de mãos com bateria recarregável capaz de promover calor de seis a nove horas. Você pode ajustar os níveis de aquecimento até 50 graus. Quer mais? O próprio aquecedor de mão atua como um carregador USB para celulares, tablets etc. E, se precisar sair, pode levar o aquecedor com você – ele pesa 150 gramas. PREÇO: R$ 392 ZIPPO.COM

FOTOS DIVULGAÇÃO

MAIS FOCO

Estes óculos inteligentes ThinkReality A3, da Lenovo, apresentados na última Consumer Electronics Show (CES), foram desenvolvidos especificamente para o trabalho remoto. Com eles é possível visualizar até cinco monitores virtuais personalizados (inclusive em 3D) e fluxos de trabalho assistidos por Realidade Aumentada (RA). Oferece treinamentos imersivos e é compatível com aplicações do Windows.

MÃOS QUENTES

* PREÇOS PESQUISADOS EM JUNHO, SUJEITOS A ALTERAÇÕES .

Confira esta seleção de itens para aumentar sua produtividade no trabalho em casa e deixar o ambiente mais divertido e confortável


CÁPSULA DE MEDITAÇÃO

Sabe quando a gente tem vontade de desaparecer, mas não pode (ou não quer) sair de casa? Esta cápsula futurista OpenSeed permite que você encontre o silêncio necessário para uma boa meditação independentemente da confusão do ambiente externo. O aparelho ultrassofisticado combina sons, programas de meditação, luzes, óleos essenciais e uma tela sensível ao toque para ajudar você a acalmar a mente e resgatar criatividade e foco no que importa. PREÇO: SOB CONSULTA OPENSEED.CO

PERSONAL STUDIO

Chega de passar apuros nas videoconferências. O Poly Studio P15 chegou para resolver todos os nossos problemas. Em formato de barra, ele fica sobre seu monitor e fornece um enquadramento automático da câmera para focalizar instantaneamente seu rosto, mesmo que você esteja andando pelo ambiente. Para tanto, o aparelho tem resolução 4K UHD 2160p, campo de visão de 90 graus e um zoom eletrônico de 4x. Também possui vários microfones e tecnologia de bloqueio de ruídos que atenuam o som de fundo da casa – barulheira das crianças incluída. Com conexão USB-C Plug&Play, é só plugar e começar a usar. PREÇO: R$ 3.800 POLY.COM

MONITOR 2 EM 1

POSTURA IDEAL

A união da expertise em tecnologia e design da Logitech G, combinada aos 100 anos de excelência ergonômica da Herman Miller, produziu uma nova linha de móveis e acessórios para gamers que serve também para evoluir o home office. Incluindo a Embody Gaming Chair, a primeira cadeira verdadeiramente ergonômica do setor de games, que possui espuma de resfriamento com partículas com infusão de cobre que reduzem o calor causado pela permanência em almofadas grossas e distribui o peso uniformemente, além de mesas ajustáveis que incentivam o movimento regular e permitem alternar entre diferentes posturas. PREÇO: R$ 11.175 (CADEIRA) / R$ 11.990 (MESA) HERMANMILLER.COM

Quem trabalha em casa também precisa de um monitor poderoso. Como este de 32 polegadas da Samsung. Com resolução 4K, o M7 produz uma experiência completa de PC – sem a necessidade de um computador – e facilita a vida de usuários do Galaxy Note. Com ele você pode usar aplicativos de videoconferências e navegadores por meio do smartphone e, para ter mais conforto, pode também conectar um teclado inteligente para trabalhar. O aparelho vem equipado com pacote Office 365 e outros tantos aplicativos de streaming, como Netflix e Amazon Prime Video, para ser usado como Smart TV e garantir sua diversão nas horas de lazer. Vem com o sistema operacional Tizen, o mesmo das televisões inteligentes da Samsung. PREÇO: R$ 2.200 SAMSUNG.COM

PODER JOYCE PASCOWITCH 75


CULTURA INC. POR LUÍS COSTA

O OUTRO SOMOS NÓS

Aos 90 anos, a fotógrafa Claudia Andujar tem sua carreira de luta pelo reconhecimento dos direitos do povo ianomâmi celebrada em exposições no Brasil e no exterior

C

laudia Andujar compreende a fotografia como um processo de mão dupla – nunca é apenas uma captura unilateral, mas uma relação de troca e cumplicidade. Quando a fotógrafa chegou pela primeira vez a uma aldeia ianomâmi, em 1971, os indígenas a chamavam de “estrangeira”. Décadas depois, hoje ela é a “napa” – a mãe. O longo tempo de maturação da convivência permitiu a Claudia – que nasceu na Suíça em 1931 – a tentativa de uma relação de mútuo entendimento com o povo de caçadores-agricultores da floresta tropical do norte da Amazônia, cujo contato com o Brasil não indígena é relativamente recente. “Meu trabalho de fotografia essencialmente foi feito para pegar a maneira que os ianomâmis veem o mundo”, diz a artista. Com 90 anos récem-completados

76 PODER JOYCE PASCOWITCH

em 12 de junho, Claudia tem agora sua carreira – e seu legado de luta pelo reconhecimento dos direitos dos povos da floresta – celebrada em homenagens e exposições. Na Galeria Vermelho, duas séries de fotografias ficam em cartaz até o fim de julho. Sonho, na qual sobreposições imprimem um tom onírico às imagens, foi concluída em 2002, dez anos após a demarcação que garantiu a posse da terra aos povos originários da floresta, hoje em risco com o avanço da mineração e do garimpo. “Fiz todo o meu trabalho e luta pelos ianomâmis”, afirma. “Conseguimos a demarcação da terra com o desejo que sejam uma população que vai ser respeitada e que eles vão continuar a viver da maneira como pensam.” A outra série é Genocídio do Ianomâmi: Morte do Brasil, exposta pela primeira vez em 1989, no Masp. Fo-


PODER É

Nesta pág., Claudia Andujar na década de 1970, hoje, e imagem da série Sonho Sonho.. Ao lado, fotos de Genocídio do Yanomami: Morte do Brasil

MILHAZES NO MASP Até 1º de agosto, o Masp exibe Gabinete Beatriz Milhazes, mostra composta por 17 pinturas de pequeno formato da artista carioca. A curadoria é de Adriano Pedrosa, diretor artístico do museu, e Amanda Carneiro, curadora assistente. São peças criadas entre 1989 e 2020, percorrendo quase toda a carreira de Beatriz. O ano de 1989 é um ponto de inflexão na obra da artista, pois foi quando ela desenvolveu a técnica que denominou de “monotransfer”, em que pinta sobre uma folha de plástico transparente e depois decalca ou transfere o elemento pintado e seco para a tela.

FOTOS GABRIEL ZIMBARDI/DIVULGAÇÃO; CARLO ZACQUINI/DIVULGAÇÃO; ANA CAROLINA FERNANDES/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

ARY POR ELIZETH Ary Amoroso, originalmente gravado por Elizeth Cardoso em 1989, chega pela primeira vez às plataformas digitais, agora pelo selo Biscoito Fino. São nove canções do mestre Ary Barroso cantadas por sua intérprete favorita. O repertório reúne clássicos como “Folhas Mortas”, “Na Batucada da Vida” e “No Rancho Fundo”.

tos de Claudia estão hoje em mostras individuais em Miami (Institute of Contemporary Art) e em Londres (Barbican Centre). Produzido pela TV Cultura, um documentário também compilou 50 anos do acervo da emissora, ainda em fita cassete, para recuperar imagens, reportagens e programas gravados com Claudia. Para a artista, o Brasil por vezes ainda teima em não reconhecer os indígenas na sua integralidade humana. “É um povo diferente, que entende e tem uma visão do mundo diferente da de outros povos”, diz. “Mas todos esses povos diferentes têm uma coisa em comum: são seres humanos.” n

NOVELA DE UM LUTO A escritora Noemi Jaffe conta, em relato íntimo, os primeiros dias após a perda da mãe, uma sobrevivente do Holocausto, aos 93 anos, em fevereiro de 2020. Lili é uma história sobre a sensação de ausência, de perda, mas também de uma presença que não se extingue com a morte. Doutora em literatura brasileira pela USP, Noemi é crítica literária e professora de cursos de escrita criativa.

MUITAS EM UMA SÓ Da sala de casa, Ana Beatriz Nogueira volta a encenar o monólogo Tudo Que Eu Queria Te Dizer, baseado no best-seller de Martha Medeiros lançado em 2008. A atriz, que completa 35 anos de carreira em 2021, interpreta a leitura das cartas de personagens que falam de alegrias e desilusões, em um estilo despojado e provocativo. A peça será transmitida no YouTube, até 31 de julho, sempre aos fins de semanas e nas segundas-feiras. Ingressos em sympala.com.br

PODER JOYCE PASCOWITCH 77


EXPOSIÇÃO

CASA DE ARTE Com móveis, esculturas e tapeçarias, mostra no Museu da Casa Brasileira apresenta a obra do arquiteto e designer Jean Gillon, criador de peças icônicas do mobiliário brasileiro

A

78 PODER JOYCE PASCOWITCH

tar e um bufete. Os visitantes encontram ainda uma vitrine com dezenas de documentos de época originais, como fotografias e catálogos de produtos da sua fábrica de móveis, a WoodArt. Há também esculturas, peças de tapeçaria e cerâmica, projetos de cenografia, pranchas de desenhos técnicos e perspectivas com detalhes das poltronas Jangada e Saci e dos móveis da linha Módulo. Entre as peças, algumas tornaram-se ícones. A mais famosa delas é, sem dúvida, a Jangada, com redes artesanais sustentando o almofadão de couro, uma referência à jangada de tábua típica do litoral norte e nordeste brasileiro. A poltrona de jacarandá foi desenhada em 1968, após diversas viagens do arquiteto à costa da Bahia em meio às embarcações pesqueiras. Em leilões, uma poltrona original pode chegar a R$ 30 mil. Para Latorraca, no design brasileiro, os elementos locais e do estrangeiro se conjugam para formar

Acima, ambiente e detalhes da mostra Jean Gillon: Artista-Designer, e, ao lado, lado, retrato do arquiteto

uma perspectiva singular. “Há, no caso de Gillon, além das raízes originárias de sua formação europeia, a introdução de elementos construtivos, técnicos e formais associados ao contexto brasileiro”, conta. “A apresentação da sua obra registra o legado do design de uma época, marcada pelo sucesso das exportações do móvel brasileiro, caracterizado pelo uso do couro e de madeiras nobres como o jacarandá”, diz Latorraca. A exposição fica aberta de terça a domingo, das 10h às 18h. n

FOTOS ALISSON RICARDO/DIVULGAÇÃO; REPRODUÇÃO

casa como uma galeria de arte. Nos móveis de Jean Gillon (1919-2007) estão referências ao cânone do design e a traços singulares da paisagem brasileira. O Museu da Casa Brasileira (MCB) exibe, até o dia 12 de dezembro, a mostra Jean Gillon: Artista-Designer, uma parceria com a galeria Passado Composto Século XX, que guarda a maior parte do acervo do artista. Nascido na Romênia em 1919, Gillon mudou-se para o Brasil em 1956 e já com um portfólio robusto passou a criar mobílias baseadas, principalmente, no jacarandá, além de tapeçarias e esculturas. Como arquiteto, trabalhou sobretudo com o setor hoteleiro de luxo, além de projetar lojas e residências. Diretor-técnico do MCB, Giancarlo Latorraca explica que a parceria com a galeria começou em 2016, quando houve a doação de uma poltrona Jangada, a mais icônica das peças do designer. “A oportunidade de apresentar a obra do artista-designer Jean Gillon cumpre com a missão de compor o múltiplo mosaico do design brasileiro, para além dos ícones mais consagrados pela historiografia do design”, afirma Latorraca. A mostra apresenta 27 peças de mobiliário entre poltronas, banquetas, cadeiras, uma mesa de jan-


MULHERES QUE AMAMOS

FOTO GETTY IMAGES

MARIA CALLAS

Filha de imigrantes gregos, Maria Callas nasceu em 1923, em Nova York, mas se formou no Conservatório de Atenas, onde iniciou sua trajetória como uma das maiores divas do canto lírico. Soprano absoluto de técnica impecável, ganhou fama com suas interpretações densas, espelho de uma vida turbulenta. Callas foi casada com o empresário G. B. Meneghini, de quem se separou para viver uma paixão com Aristóteles Onassis. Ao engravidar e perder o filho recém-nascido, caiu em depressão. A conturbada união com o milionário grego chegou ao fim após nove anos quando ele se casou com Jacqueline Kennedy. Callas se mudou para Paris e, em 1977, aos 53, foi encontrada morta, vítima de infarto causado por doença degenerativa que, entre outras coisas, ceifou sua voz. PODER JOYCE PASCOWITCH 79


Houve gente que o parabenizou pela coragem. Outros viram cálculo eleitoral. Alguns acharam as duas coisas. O fato de o governador gaúcho, EDUARDO LEITE (PSDB), ter assumido publicamente sua homossexualidade não deveria ser notícia, mas ainda não chegamos nesse estágio civilizacional – e seu gesto certamente contribui para um dia o atingirmos. Há enormes paradoxos envolvidos. Ao mesmo tempo que tira um fardo das costas e se livra das insinuações sórdidas e ginasiais, algumas delas vindas do próprio presidente da República, Leite se destaca por seu sacrifício e desprendimento, ainda que deva ter muito mais ganhos do que perdas. Nos velhos tempos, dizia-se que o gay tinha de ser muito macho para se assumir, e Leite finalmente o fez. Mas isso deve ser coisa do passado até mesmo no Rio Grande do Sul. O problema é que sua adesão a Jair Bolsonaro em 2018, candidato que já manifestava em declarações antes das eleições misoginia e homofobia, não foi ignorada. Muitos viram na atitude do governador uma espécie de pinkwashing, à maneira, digamos, de uma Lojas Renner quando decide fazer camisetas para a comunidade LGBTQIA+ no Mês do Orgulho Gay. Seja como for, Leite colheu frutos. Numa pesquisa qualitativa feita pelo PSDB, ele ganhou mais 100 mil seguidores nas redes sociais e gerou dez vezes mais engajamento do que as postagens de João Doria, seu principal concorrente nas prévias presidenciais do partido, em novembro. Doria, aliás, foi rápido no Twitter e garantiu o posto de primeiro político a parabenizar Leite logo que o assunto chegou às redes.

80 PODER JOYCE PASCOWITCH

FOTO GUSTAVO MANSUR/PALÁCIO PIRATINI

SOCIEDADE


Lives

FOTOS MAURÍCIO NAHAS; DIVULGAÇÃO INSTITUTO IGARAPÉ; BOB WOLFENSON; ROBERTO SETTON; GETTY IMAGES; REPRODUÇÃO; DIVULGAÇÃO

Joyce entrevista

Os personagens mais relevantes conversam sobre os temas mais necessários nas lives com Joyce Pascowitch no Instagram da @revistapoder

João Doria, governador de SP

Ilona Szabó, cientista política

Luiza Helena Trajano, empresária

Ester Sabino, médica e pesquisadora

Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente

Fernando Collor de Mello, senador e ex-presidente

Michel Temer, ex-presidente

revistapoder.com.br /revista-poder-joyce-pascowitch

@revistapoder

@_PoderOnline

/Poder.JoycePascowitch



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.