Sorria #66

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#66

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2019

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SER SOLIDÁRIO FAZ PARTE DA GENTE. QUEM CULTIVA O HÁBITO DE FAZER O BEM TRANSFORMA O MUNDO E VIVE MAIS FELIZ


© Foto: Eclipse_Images/iStock

PRAZERES SIMPLES

14 REVISTA SORRIA


Vamos celebrar! texto MARINA BESSA

S

empre fui diferentona. Pelo menos na minha família e entre minhas amigas da escola. Não tive formatura do ensino fundamental. Não quis fazer festa de 15 anos. Não participei da formatura do ensino médio. Entrei na faculdade, mas sem grandes alardes. E aí deixei de ser diferentona. Passei a fazer parte de uma turma de gente igual a mim: mais questionadora, meio rebelde, com panca de intelectualizada – por que não dizer, blasé. Ninguém queria comemorar nada. Ninguém imaginava se casar, ninguém iria batizar os filhos e ninguém pretendia fazer uma festa de formatura. Mas nada, gente? Nadinha? Veja, somos um grupo de amigos. Somos um grupo de pessoas que conseguiu algo muito significativo. Somos um grupo que está concluindo um período importante da vida: vamos terminar a faculdade. Seremos oficialmente responsáveis pela nossa independência financeira. Espera-se que a gente, agora, desgrude de vez da barra da saia dos pais, arranje um emprego, vista uma roupa mais séria. Acabou a transição. É o fim de um período que não vai voltar. É o início de uma outra fase. O começo de um ciclo a se construir do zero. Não vamos celebrar? E, então, voltei a ser a diferentona. Passei a ser a que defendia, dentro desse grupo menos entusiasmado e mais crítico, a importância de alguns rituais – ou ritos de passagem, como se diz na sociologia. Porque, deixando o lado blasé de lado e lembrando o que a minha mãe sempre dizia, celebrar é preciso. Os rituais marcam etapas. Comemorar esses momentos cruciais é definir para a sociedade, e para nós mesmos, nosso lugar, nossas responsabilidades. Enquanto matamos uma vida e fazemos nascer outra, vamos construindo, de forma simbólica, a nossa existência. Nascimento, entrada na vida adulta, casamento, morte – esses acontecimentos fundamentais em todas as culturas têm de ser representados, sentidos, vivenciados. Nos afirmam como parte de um grupo, nos asseguram como indivíduos. Não tive festa de formatura, mas me casei. E festejamos em grande estilo. Para reunir os amigos, para rever a família, para nos despedirmos de uma fase e receber, cheios de boas energias, o que construiríamos a partir dali. Para brindar e tirar as fotos que nos enchem de recordações e que permanecerão para contar a nossa história. Para colecionar momentos compartilhados, que serão lembrados por todos para sempre. Porque a vida é a que a gente vive, sem dúvida. Mas é também essa coleção de marcos, que nos estruturam, nos energizam e enchem nossa bagagem de memórias especiais. MAR/ABR 2019 15


PRAZERES SIMPLES

TÁ NA MESA

Clima de

festa

Trufas são doces delicados que têm tudo a ver com datas especiais. Perfeitos para celebrar os 11 anos da Sorria! texto MARINA BESSA

© Foto: Sheila Oliveira / Empório Fotográfico. Produção culinária: Paula Belleza. Produção de objetos: Marcia Asnis

H

á coisas na vida difíceis de recusar. Trufa de chocolate é uma delas. Eu me lembro da primeira vez em que comi uma trufa. Sempre adorei chocolate, então era óbvio que gostaria daqueles bombons parecidos com brigadeiro. Que brigadeiro que nada. Aqueles doces eram diferentes. Mais cremosos, derretiam na boca. Menos doces – o cacau em pó deixava um amargor agradável na boca. Mais adultos: senti um toque de rum. Muito mais delicados. Trufa virou, para mim, sinônimo de bombom sofisticado. Certamente sua confecção guardava um segredo – confeitaria para poucos. Por isso, eram tão raras (assim como as trufas negras, que deram origem ao seu nome). Até que um dia uma amiga trouxe trufas para uma confraternização de fim de ano. “Você que fez?”. E ela me explicou o passo a passo. É mais trabalhoso que fazer brigadeiro. Mas não é nada difícil. Como todas as coisas boas, demanda um pouco de paciência – o tempo (nesse caso, na geladeira) é essencial para que as bolinhas ganhem textura e sabor. O segredo está na simplicidade da ganache: uma massa aveludada feita com creme de leite e chocolate. Contam por aí que a ganache foi inventada por acaso: um aprendiz de cozinha, francês e desatento, teria derrubado creme de leite em cima da panela de chocolate, em vez de jogá-lo sobre a tigela de ovos com açúcar. Queria fazer um creme de confeiteiro, fez um creme de chocolate. A história não é comprovada, mas é fato que a trufa se popularizou pelo mundo, e foi sendo incrementada. Ganhou cobertura de chocolate e muitos twists no recheio: pode levar castanhas moídas, frutas cítricas, conhaque, gotas de licor. Anotei a receita e guardei para os momentos de festa. Porque trufa é para oferecer, para saborear em ocasiões especiais. Como a que celebramos nesta edição, em que a Sorria faz 11 anos. Comemore – e saboreie – sem moderação! 24 REVISTA SORRIA

INGREDIENTES:

TRUFAS DE CHOCOLATE rende cerca de 20 unidades

• 1 xícara (de chá) de creme de leite fresco • 3 xícaras (de chá) de chocolate meio amargo picado • 100 g de manteiga sem sal gelada • 4 xícaras (de chá) de chocolate meio amargo picado para a cobertura


VESTIDA DE FESTA Decore as trufas com confeitos ou cacau em pó antes de levá-las pela última vez à geladeira. Com acabamento caprichado, elas impressionam ainda mais!

TRUFA DE QUÊ? Se quiser fazer trufas de café, substitua o creme de leite por café bem forte. E, trocando o chocolate meio amargo por chocolate branco, você terá trufas brancas!

DE MARACUJÁ! Troque o creme de leite por suco de maracujá e use chocolate branco. Para a cobertura ficar amarela, misture meia colherinha de corante (para chocolate) dessa cor.

MODO DE PREPARO: Ponha o creme de leite em uma panelinha, leve ao fogo e deixe esquentar até ferver. Enquanto isso, derreta o chocolate em banho-maria.

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Transfira o creme de leite para a tigela do chocolate, misture bem e acrescente a manteiga gelada cortada

em cubinhos. Bata a massa com o batedor de arame até que ela fique completamente homogênea. Passe-a para uma tigela, tampe com um filme plástico e leve à geladeira por 2 horas.

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Forre uma assadeira com papel-manteiga. Retire a massa da geladeira. Com uma

colher, tire porções mais ou menos do tamanho de uma trufa e repouse-as na assadeira. Leve para gelar por mais 2 horas.

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Derreta o chocolate para a cobertura em banho-maria. Retire as porções de massa que estavam na geladeira e, com as mãos, molde as bolinhas. Então, mergulhe uma a uma na

cobertura. Retire com um garfo, deixe escorrer o excesso da calda de chocolate e descanse a trufa no papelmanteiga. Repita o processo com os outros bombons e leve-os para a geladeira, para que a cobertura endureça.

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Retire as trufas da geladeira e sirva-as ainda geladas. MAR/ABR 2019 25


VALORES ESSENCIAIS

reportagem HELAINE MARTINS ilustração GIOVANI FLORES

Sem olhar a quem GASTAR UM TANTO DO TEMPO E DA ENERGIA PARA AJUDAR UM DESCONHECIDO É PARTE DA ROTINA DE MUITA GENTE – QUE, ASSIM, FAZ DO MUNDO UM LUGAR MELHOR

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evanta a mão quem nunca ajudou uma pessoa que estava em apuros. Alguém que havia se acidentado; uma criança perdida; uma senhora com sacolas pesadas; um homem com dificuldade para atravessar a rua. Todos nós, em algum momento da vida, fomos tomados, mesmo que sem nos darmos conta, por um ímpeto de ajudar o outro. Embora vivamos em uma sociedade narcisista, que muitas vezes valoriza mais as conquistas pessoais que a busca pelo bem coletivo, a ciência é categórica: ser solidário é uma característica notável e inata de nossa espécie. Eu, você, sua família, o vizinho, a colega de trabalho. Somos todos seres sociáveis e nos constituímos na relação com o outro. Foi contando com a solidariedade que

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os nossos primeiros ancestrais, que viviam em pequenos grupos de caçadores-coletores, conseguiram sobreviver. Alguém que não era bem-sucedido na tarefa de encontrar comida tinha o amparo de outras pessoas que compartilhavam a delas. Os filhos eram criados pela comunidade. Os mais fortes protegiam os mais fracos. E, de certa forma, isso continua até hoje – milhares de anos de evolução depois. “Ser solidário faz parte da gente, é um modo humano de ser”, diz Julio Lancellotti, pedagogo e padre que se dedica, há mais de 30 anos, à assistência à população em situação de rua. “Não existe outra forma de viver a não ser em sociedade. É por isso que somos tão responsáveis por nós mesmos quanto por quem divide o mundo conosco. Não importa qual a sua condição”, diz.


A solidariedade está baseada em sentimentos como respeito e empatia. Mas não é só isso. Há nesse conceito um componente que vai além do sentir empático, que é o da ação. Uma pessoa solidária não se restringe a sofrer junto, mas conforta, propõe ajuda – ainda que por diferentes razões. Há quem ajude por questões relacionadas à ética ou à moral, há quem o faça por crenças e ideais, outros são movidos por um sentimento de justiça. Seja qual for o motivo, atos de solidariedade partem sempre de uma mesma vontade natural do ser humano de simplesmente fazer o bem sem olhar a quem. E essa maneira de viver se reflete em uma sociedade melhor. Um estudo da Universidade de Lubeck, na Alemanha, publicado na revista científica Nature em 2017,

revela que o cérebro libera endorfina, uma substância que provoca a sensação de prazer e felicidade, após tomarmos uma atitude solidária. Ajudar o outro também beneficia o coração e o sistema imunológico e aumenta a expectativa de vida. E o bem que fazemos ainda se torna um legado: quem recebe um ato de bondade tende a passá-lo adiante, sendo mais solidário com os outros. Nas próximas páginas, você vai conhecer quatro histórias de pessoas que fazem parte dessa corrente, porque se sensibilizaram, acolheram, doaram-se ou mesmo arriscaram tudo para salvar quem nunca haviam visto na vida. Gente que se preocupa com gente. Que defende a construção de um mundo onde todos possam encontrar o seu lugar. Que não deixa a roda da solidariedade parar de girar. MAR/ABR 2019 29


DÁ PRA MUDAR?

SAI DA

TOCA!

PASSAR MAIS TEMPO AO AR LIVRE TRAZ SAÚDE, ALEGRIA, BEM-ESTAR. MAS, ENTÃO, POR QUE ESTAMOS CADA VEZ MAIS ENTOCADOS? NOSSA REPÓRTER FICOU UM MÊS REPENSANDO SUAS ATIVIDADES E CONSEGUIU MUDAR A ROTINA. VEM JUNTO? reportagem ROMY AIKAWA ilustração MALENA FLORES

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eus pais sempre moraram em casa, então cresci fazendo atividades no quintal, ao ar livre. Brincar de esguicho, ajudar na jardinagem, plantar hortaliças, comer fruta no pé, ficar olhando as estrelas, esticar a roupa no varal, espiar ninhos de passarinhos, tomar banho de chuva são coisas que ocuparam boa parte dos meus dias até a vida ficar mais séria. Depois que eu entrei na faculdade e me mudei para São Paulo, o bronzeado saudável da minha pele foi, aos poucos, adquirindo a tonalidade “branco-escritório”, que é o mais fiel retrato de quanto o meu contato com o mundo lá fora se modificou. 36 REVISTA SORRIA


Eu nunca fiquei tanto dentro de casa. Analisando os motivos, vi que isso aconteceu, principalmente, por causa das comodidades da vida moderna, por evitar encarar o trânsito e a poluição, por medo da violência e por, até então, desconhecer o tamanho do problema que é passar tempo demais em ambientes fechados. Eu imaginava que vinha extrapolando o limite do saudável, inclusive porque o meu check-up anual indicou falta de vitamina D. Mas só percebi a real necessidade de mudar após aceitar a proposta da Sorria de fazer mais atividades ao ar livre. Tive que enfrentar algumas dificuldades. A primeira foi encaixar essas atividades na correria do meu dia a dia de dona de casa, mãe e profissional. Numa manhã em que saí de carro para fazer a compra semanal de frutas, verduras e legumes no hortifruti, consegui identificar uma brecha: na semana seguinte, iria a pé à feira livre próxima à minha casa. Procurei programar o cardápio para não precisar carregar muito peso no percurso e, apesar de pegar um pouco de chuva, achei que a troca não tomou tanto o meu tempo e que os benefícios valeram a pena. Fiz um pouco de exercício, tomei um solzinho, mas o que realmente curti foi ouvir os feirantes chamando a freguesia e brincando com o poder dos

nutrientes de seus produtos, ver as pessoas negociando na hora da xepa, papeando sobre os pratos que iam preparar, deliciando-se com os colegas de trabalho no “dia do pastel”, interagindo. Senti que voltei mais leve e relaxada para casa. Aproveitei que já tinha uma conversa marcada com Mariana Veras, pesquisadora científica do Estado de São Paulo e chefe do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da USP, para identificar uma possível relação. “Atividades ao ar livre costumam promover a interação social, que é muito importante para a saúde mental”, explica. “A ansiedade, por exemplo, é cerca de 30% maior nas cidades grandes porque, além de mais expostas a fatores que causam medo e estresse, as pessoas interagem menos. E nem estou falando de conversar: falo de ver gente, observar o que os outros fazem, como reagem. Isso ajuda a enxergar as coisas por diferentes ângulos, mudar o foco de atenção e se sentir melhor.” Mariana destaca que os crescentes índices de doenças como depressão, diabetes, obesidade e hipertensão são reflexo direto do fato de vivermos cada vez mais enclausurados e sedentários. Esse é um dos motivos pelos quais ela incentiva todo tipo de iniciativa que troca o carro por deslocamentos a pé: “Os benefícios são individuais e coletivos. Só para citar um deles, podemos falar do risco de obesidade, que cai 4,8% a cada quilômetro caminhado no dia e cresce 6% a cada hora passada dentro do carro. Deixar o veículo na garagem ainda contribui para reduzir a emissão de poluentes e a poluição sonora, o que eleva a qualidade de vida de toda a comunidade”, diz. É verdade que se expor à poluição das ruas também tem seus males, mas, segundo a pesquisadora, ficar parado em casa é ainda pior. Foi o que me convenceu a fazer a segunda troca: caminhar na rua, em vez de na esteira da sala de ginástica do prédio. Eu estava usando a esteira porque ainda não havia conseguido organizar minha agenda, então aproveitava os momentos que apareciam, sem me preocupar com sol, vento, chuva ou com o fato de

FORA É MELHOR QUE DENTRO CAMINHAR 15 MINUTOS POR PARQUES E FLORESTAS PODE REDUZIR EM 16% A TAXA DE CORTISOL (HORMÔNIO DO ESTRESSE), 2% A PRESSÃO ARTERIAL E 4% A FREQUÊNCIA CARDÍACA.1 REALIZAR ATIVIDADES AO AR LIVRE TORNA AS PESSOAS MENOS PROPENSAS A DESENVOLVER MIOPIA.2 A CHANCE DE PERSISTIR NA CAMINHADA É 23% MAIOR QUANDO SE ESTÁ AO AR LIVRE DO QUE NA ESTEIRA.3 CAMINHADAS CURTAS SÃO CAPAZES DE PROVOCAR MELHORAS SIGNIFICATIVAS EM CRIANÇAS COM DISTÚRBIOS DE ATENÇÃO.4 UM FIM DE SEMANA NO CAMPO É SUFICIENTE PARA REDEFINIR O RELÓGIO BIOLÓGICO E AJUDAR PESSOAS COM PROBLEMAS PARA DORMIR A PEGAR NO SONO MAIS RÁPIDO.5 Fontes: 1) NCBI - National Center for Biotechnology Information (EUA); 2) National Health Service (Reino Unido); 3) Biology Letters (Reino Unido); 4) Journal of Attention Disorders (EUA); 5) Current Biology (EUA)

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