Revista Sorria #51

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no trabalho

razões para

♥ fotografias de família ♥ panquecas deliciosas ♥ ginástica com alegria

cozinhar

mais em casa

chegou a

e muitos outros

primavera!

prazeres

da vida

Mudar #51

set/out

2016

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droga raia

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de

ideia

Estarmos abertos a remodelar as próprias opiniões nos faz evoluir. inspire-se em pessoas que repensaram suas certezas


PRAZERES SIMPLES

Reveladora

armadilha texto dilson branco

© Foto: Getty / Azem Ramadani

A

luz está por aí, sendo rebatida e absorvida por todas as superfícies. Vem do sol, ricocheteia no chão, esbarra numa pessoa que passa, resvala nos móveis, choca-se com as plantas e segue assim até perder-se no infinito. Às vezes, porém, ela cai numa arapuca: um delicado pedaço de vidro cruza seu caminho, conduzindo-a a uma película plástica – ou um sensor eletrônico – em que vai ser transformada em imagem. Assim, a intensidade e a cor desse raio, e tudo o que ele pode significar, ficam congeladas no tempo. Fotografar é um desses atos mágicos com os quais a gente se acostuma. Isso vale para qualquer tipo de clique, até mesmo para a mais burocrática das 3x4. Vale também para as fotos boas de guardar, que tiramos em momentos planejados para ser especiais, como os aniversários. Mas poesia mesmo há nas fotos boas de tirar. Essas são as que a gente faz quando, de repente, percebe como é bonita aquela árvore no trajeto para o trabalho. Como as ranhuras do tronco formam contrastes curiosos. Como as folhas ganham uma cor bonita contra a luz. Como até mesmo os bagunçados fios dos postes formam uma moldura interessante. Aí a gente tira o celular do bolso, dá um passo pra trás, experimenta o zoom, agacha, gira a tela, até encontrar o enquadramento que mais agrada. Então, brincando de artista, a gente aperta o botão, contemplando nossa obra-prima. Nem precisa mostrar a ninguém. Há um prazer em si no ato de clicar. Que o diga Vivian Maier: essa babá de Chicago, nos Estados Unidos, que viveu entre 1926 e 2009, tinha como hobby fotografar pessoas nas ruas. E nunca divulgou suas criações. Os negativos foram descobertos por acaso, abandonados em uma caixa vendida num leilão, e exibidos ao mundo só após sua morte. Os retratos são maravilhosos (veja em www.vivianmaier.com) – e, para Vivian, a satisfação de registrá-los bastava. Fotografar revela muito mais do que uma imagem. Nenhum outro ato nos permite perceber tão bem como cada instante é único. Além disso, a arte de capturar o que se vê funciona como um espelho. Afinal, produzir uma foto é uma sequência de escolhas: um lugar, um horário, um ângulo, um recorte, um foco... Quando a gente abre a arapuca do raio de luz, quem está lá dentro somos nós mesmos.

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PRAZERES SIMPLES

tá na mesa

rolê da

alegria

A receita é tão fácil que pode ser preparada para um almoço durante a semana. Mas também é elegante o suficiente para um jantar especial.

Uma massa macia, delicada e dourada, recheada de imaginação: viva a panqueca! texto Dilson Branco

© Foto: Elisa Correa; produção culinária e de objetos: Estúdio Fuê / Janaina Resende

U

ns dias antes de eu sair de casa, quando fui morar sozinho em outro estado para fazer faculdade, minha tia me entregou uma folha de caderno escrita à mão. Já meio amarelada e com marcas de respingos, essa página está comigo até hoje. “Massa básica para panquecas”, diz lá em cima. E seguem explicações bem detalhadas de como preparar o prato, sob medida para o mais leigo dos cozinheiros de primeira viagem. Não foi à toa que ela escolheu especificamente essa receita para me presentear. Era uma refeição que ela costumava fazer quando ia lá em casa, e que sabia que eu adorava – tanto pelo sabor quanto pela mágica do preparo, que envolvia aqueles voos acrobáticos da massa, saltando para cair de costas na frigideira, bronzeando-se dos dois lados. E algum tempo depois eu percebi que não se tratava apenas de uma dica culinária: era uma forma de eu levar um pouco do conforto de casa para os novos horizontes que eu estava prestes a desbravar. Desde então, segui os passos indicados naquele papel muitas vezes. Após as primeiras tentativas bem-sucedidas, eu me aventurei em variações. Testei recheios e molhos diferentes e até ousei desrespeitar o cânone da massa – troquei os ovos e o leite por inhame ralado e fiquei todo bobo ao ver que deu certo. Por ser assim, simples e versátil, a panqueca é consumida desde a Antiguidade. Os gregos e romanos gostavam de saboreá-la coberta por mel. Mas o nome que usamos vem do inglês: pancake – literalmente, bolo de panela. Os britânicos, no século 16 (no período elisabetano, uma das eras douradas da história deles), refestelavam-se com esses discos de massa na semana que antecedia o jejum da Quaresma. E o costume não se perdeu: hoje, em alguns países, a véspera da Quarta-Feira de Cinzas é chamada de Dia da Panqueca. Independentemente da história e das minhas memórias afetivas, panqueca é um prato muito divertido de ser feito, atende a todos os gostos e rende sorrisos de satisfação. Confira a receita e delicie-se! 22 revista Sorria

Na nossa receita, cobrimos as panquecas com molho branco. Mas, se preferir, você também pode usar molho vermelho.


PANQUECA DE

RICOTA E ESPINAFRE PARA A MASSA: • 1 + ½ xícara (de chá) de leite • 1 xícara (de chá) de farinha de trigo • 2 ovos • 1 colher (de chá) de sal • manteiga para untar

1 2

Bata no liquidificador o leite, a farinha, os ovos e o sal. Deixe a massa descansar por pelo menos 20 minutos. Com a massa descansada, aqueça uma frigideira antiaderente untada com manteiga. Coloque uma concha da massa na frigideira, fazendo movimentos circulares para distribui-la por toda a superfície. Cozinhe em fogo baixo até aparecerem bolhas na massa. Com a ajuda de uma espátula, vire e doure do outro lado. Repita até terminar a massa – a receita rende de 10 a 12 panquecas.

3

Recheie as panquecas e arrume-as em um refratário. Cubra-as com o molho da sua preferência e queijo ralado e leve para gratinar no forno. Finalize com manjericão, nozes picadas e mais queijo na hora de servir.

PARA o recheio: • 500 g de ricota fresca • 1 maço de espinafre fresco • 1/4 de xícara (de chá) de uvas-passas brancas • 1/4 de xícara (de chá) de vinho branco • 1 dente de alho • 1 colher (de sopa) de azeite • sal e pimenta-do-reino moída na hora a gosto

1 2 3

Numa tigela, misture as uvas-passas com o vinho branco para hidratar. Reserve. Descasque e pique o alho. Reserve. Em outra tigela, amasse a ricota fresca e tempere com sal e pimenta.

A massa da panqueca é universal. Serve para qualquer recheio salgado e até para doces. Então, libere a criatividade e invente novas opções.

Aqueça uma frigideira em fogo médio, coloque as folhas de espinafre e mexa até ficarem macias. Tire do fogo e esprema as folhas em uma peneira para tirar o excesso de água.

4

Agora em fogo baixo, doure o alho picado com um fio de azeite. Junte as passas e o vinho. Quando o líquido secar, desligue o fogo e junte as folhas de espinafre. Tempere com sal e pimenta e misture o refogado à ricota amassada na tigela.

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valores essenciais

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É importante que todo cidadão tenha opiniões e se posicione em relação às questões de afetam a felicidade das pessoas. Mas é igualmente desejável que estejamos sempre abertos a ouvir os argumentos dos que discordam das nossas posições e ter a nobreza de mudar de opinião, caso a argumentação faça sentido reportagem Helaine Martins ilustração O SILVA

ão adianta: para ter opiniões, é preciso fazer escolhas. Independentemente do tema em discussão, sempre temos que decidir quais argumentos nos parecem fazer mais sentido para, a partir deles, formularmos uma opinião. Mas é aqui que chegamos ao coração desta reportagem: quando se trata de opinião, nenhuma escolha pode ser definitiva. Porque basta estarmos abertos ao conhecimento para que, de repente, surja um novo argumento capaz de desconstruir tudo o que pensávamos até então. Todos sabem disso, tanto que, quando crianças, executamos a dinâmica da troca de opiniões sem nenhum sofrimento. Mas entre os adultos isso não é tão simples. Amarrados a uma série de convenções sociais, preferimos assumir a máscara de durões, o que contempla ter a cabeça dura como uma rocha e muita disposição para não abrir mão de posições preestabelecidas. E a verdade é que opiniões definitivas só existem para dois tipos de pessoas: aquelas que preferem a ignorância à informação ou as que gostam de se enganar, fingindo estar blindadas a argumentos que desconstroem seus pontos de vista. Segundo a psicóloga Regina Wielenska, membro da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC), essa resistência é tão comum porque somos fortemente controlados por um fenômeno que ela chama de viés da confirmação. Ou seja: “As pessoas preferem ouvir o que já sabem e se sentem desconfortáveis quando você conta uma

novidade porque não é o que elas esperam. É como se passássemos a ver o mundo por um filtro que nos mostra que estamos sempre certos”, diz a especialista. E isso explica muitas das coisas mais odiosas que brotam da vida em sociedade, como a intolerância à diversidade e a proliferação de preconceitos. Por que, afinal, devemos respeitar o diferente se já temos os iguais? Por que discordar de uma opinião preconceituosa se desde sempre é o que se ouve na fila do banco, no almoço de domingo e na roda de chope? A troca de informações entre pessoas diferentes não precisa necessariamente terminar em concordância de ambos os lados – debater com respeito e interesse pela opinião alheia é o que nos leva a construir visões de mundo mais ricas. Quando isso acontece, conceitos antagônicos como bom e ruim ou certo e errado se tornam inadequados e desmancham-se no ar. Em geral, as pessoas só costumam se abrir à possibilidade de mudança quando submetidas a pressões e privações. Mas, ainda assim, é admirável quando alguém aceita repensar seus cânones mais arraigados, mesmo que impulsionado por uma força alheia à sua consciência. Nas próximas páginas você conhece quatro histórias de pessoas que, com ou sem um fato novo a pressioná-las, tiveram a humildade de abrir mão das suas certezas e aceitaram novas ideias. Tire suas conclusões, mas a impressão que ficou para nós é que elas não se arrependem das mudanças que fizeram.

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valores essenciais 1

P

“Para resolvermos a questão racial, precisamos fazer algumas concessões.” WILLIAM DOUGLAS, 49 ANOS, DE NITERÓI (RJ), MUDOU DE IDEIA SOBRE AS COTAS RACIAIS NA EDUCAÇÃO

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or muitos anos, o juiz carioca William Douglas foi um ferrenho opositor das cotas para negros nas universidades. Acreditava que o mais justo era a cota social, que reserva vagas para estudantes de baixa renda, que, em geral, não tiveram acesso a um ensino de qualidade. Especialista em concursos públicos, havia acabado de lançar um livro sobre o tema, quando, em 1999, foi convidado a ministrar palestras no Educafro, um cursinho pré-vestibular voltado principalmente para estudantes negros. Embora não concordasse com a proposta de recorte racial da instituição, aceitou o convite. Logo, tornou-se professor voluntário e, aos poucos, conforme conhecia melhor a história dos seus alunos, inseria novos elementos na sua visão.

O retrato da exclusão racial foi ganhando contornos mais precisos e desmontou sua tese de que a questão econômica sobrepunha o peso da cor da pele. “Ser pobre é um obstáculo, mas ser pobre e negro é duas vezes mais difícil. Não é justo que lá na frente, depois de anos de desigualdade, todos sejam exigidos da mesma forma”, observa. E, após nove anos lecionando para meninos e meninas da Educafro, William hoje milita em favor das cotas raciais no ensino superior, acreditando que só ações afirmativas desse tipo são capazes de reverter o cenário de ausência de oportunidades para os cidadãos de pele negra. “Temos que alterar a cor das universidades, das escolas. Essa é uma caminhada longa e difícil, mas necessária.”


2

© Fotos: 1 Anna Fischer, 2 Marcus Steinmeyer; still: Glaucio Dettmar

M

“Acredito que o amor sempre vence.” MÉRCIA FALCINI, 49 ANOS, DE SALTO (SP), APRENDEU A RESPEITAR A orientação SEXUAL DO FILHO

ércia se achava uma pessoa pluralista, muito bem resolvida em relação à questão da homossexualidade: repudiava brincadeiras preconceituosas e repreendia qualquer comentário que soasse ofensivo. Até que, inesperadamente, o filho Gabriel assumiu-se gay, aos 15 anos, e ela entrou em parafuso. “Eu não estava preparada para lidar com o que parecia só acontecer na vida dos outros”, revela. Desnorteada, sentia um misto de culpa, impotência e vergonha. Afinal, seu plano de família perfeita não contemplava um filho gay. Nem se falava sobre o assunto dentro de casa. E Gabriel, um menino exemplar – obediente, amoroso, excelente aluno –, de repente, tornou-se um problema. O primeiro impulso de Mércia após o choque foi tentar reverter a situação:

levou o filho a um psicólogo e obrigou-o a tentar namorar uma menina, na esperança de estimulá-lo a mudar de ideia. Até que, após dois anos de frustrações, percebeu que não era Gabriel que precisava mudar. O amor pelo filho fez Mércia botar o orgulho de lado e procurar ajuda para reverter seus conceitos. Foi assim que encontrou o Grupo para Pais de Homossexuais (GPH). Lá, descobriu que não estava sozinha e deu início a um longo e difícil processo de desconstrução. “Estar entre iguais me fortaleceu. Graças aos encontros, amo meu filho do jeito que ele é.” Hoje, Mércia atua no GPH como facilitadora, acolhendo pais e mães que estão passando pelo que ela passou lá trás. Sua maior lição é que a única regra para ter uma família perfeita é não faltar amor. SET/OUT 2016 29


valores essenciais

MANUAL DA OPINIÃO

Como se livrar de ideias prontas e modelar as próprias?

© Still: Glaucio Dettmar

1

Questione-se

2

Nunca é tarde para amolecer a cabeça dura e se desfazer de certezas absolutas. Com o botão do respeito ligado, informe-se e estimule o debate

Fundamente-se

O ideal é manter o radar ligado

Não se desespere se perceber que

permanentemente e questionar

você não tem conhecimento suficiente

suas opiniões conforme os assuntos

para opinar sobre alguns assuntos

cruzam a sua vida, seja em uma

encontrados no jornal. Na verdade,

conversa, seja em um momento

uma das lições desse exercício é notar

solitário. Mas, para se exercitar,

que às vezes assumimos opiniões sem

você pode abrir o jornal do dia e listar

conhecer o assunto bem o suficiente.

os assuntos de maior relevância social

A saída, claro, é buscar as informações

ali tratados. Aí, percorra um por um

de que você sentiu falta. Anote os dados

pensando: “Tenho uma opinião sobre

numéricos e termos técnicos que não

isso? Qual é? Como eu cheguei até ela?”

fazem parte do seu vocabulário.

32 revista Sorria


3

Argumente

4

Ensaie o debate

5

Mude de perspectiva

Com a apuração de dados em mãos,

É muito comum cairmos na chamada

Debatendo consigo mesmo, você terá

tente formular argumentos. Para

"ilusão da profundidade de explicação".

a oportunidade de se colocar no outro

isso, você precisa exercer seu senso

Ou seja, acharmos que temos argumentos

lado, daquele que discorda da sua

crítico, cruzando dados apurados,

mais profundos e embasados do que de

opinião. A variação de perspectiva

não simplesmente repetindo argumentos

fato temos. E só nos damos conta disso

permite não só preparar-se melhor

que você pescou no jornal. Nesse

quando precisamos debater com alguém.

para defender seus pontos, mas,

momento, é importante se esforçar para

Então, para antecipar essa descoberta,

sobretudo, abrir espaço para dúvidas

ser o mais racional possível, evitando

teste seus argumentos debatendo

e contradições. Você notará, no

ceder a posicionamentos motivados

com você mesmo. Assim, suas falhas

final das contas, que, em questões

por grupos políticos ou religiosos,

aparecerão e você poderá voltar à fase de

polêmicas, é difícil assumir posições

que, em geral, são orientados não só

fundamentação, buscando informações

definitivas. Por isso, é tão importante

por dados, mas por doutrinas morais.

específicas para tapar seus buracos.

estar aberto a ouvir o outro lado.

6

Conheça outros contextos

7

Esteja pronto para mudar

8

Valorize a dúvida

Pronto! Você já está apto a compartilhar

Agora que você já tem opiniões

Lembre-se sempre: você não precisa

suas opiniões e debatê-las de verdade,

embasadas e devidamente testadas com

ter opiniões sobre tudo! Mas dúvidas,

trocando ideias com outras pessoas.

pessoas de verdade, basta defendê-las

quanto mais, melhor. São elas que nos

Tratando o outro com o respeito,

quando alguém discordar, certo?! Nada

tiram do lugar-comum e da zona de

você estará fazendo um exercício de

disso! Defender seus pontos de vista é

conforto. Então, não se acanhe de voltar

cidadania. Afinal, o debate respeitoso

importante, sem dúvida, mas considere

à idade dos “porquês”. A perspectiva

é o melhor caminho para qualquer grupo

sempre que eles podem mudar. Afinal

típica da infância muitas vezes é o que

de pessoas encontrar soluções para

de contas, o mundo segue girando, e

falta aos cabeças-duras que assumem

o bem-estar coletivo. No debate,

coisas novas acontecem a cada minuto.

certezas sem questioná-las. Não por

esforce-se para pensar na sua opinião

Um simples fato pode mudar tudo, e,

acaso, crianças são muito menos

inserida no contexto do outro.

aí, você tem que mudar também.

preconceituosas do que adultos.

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