este valor, descontados os impostos, ĂŠ 100% revertido para o
* 8 jun/jul 2009
trabalhar
24
25
para viver melhor
A arte de fazer amigos Conhecer gente nova – e saber manter esses contatos – é criar oportunidades de crescimento pessoal. No trabalho, pode ser o caminho para um novo emprego ou para o negócio que você sempre sonhou abrir texto N i n a W e i n g r i l l ilustração E s t ú d i o M o p a
Larissa Ribeiro, de 25 anos, conseguiu seu primeiro emprego enquanto cursava arquitetura, em São Paulo. Sua tia, diretora de uma agência de publicidade, a convidou para trabalhar como assistente de arte. Diploma na mão, Larissa decidiu mudar de ares. Indicada por uma amiga, foi contratada por um escritório de arquitetura. Pouco tempo depois, teve certeza de que essa não era sua praia. Em uma semana, estava trabalhando para uma ex-professora, agora como designer. Parece que Larissa teve sorte, não é? Pode até ser, mas ela não conseguiria nada disso se não fosse boa na arte de cultivar contatos.
Prática social Criar uma rede de relacionamentos – o tal networking – faz bem em todos os sentidos. Conhecer gente nova e manter esses vínculos nos alimenta de informações e pontos de vista, exercita nossa tolerância e criatividade e abre inúmeras oportunidades de desenvolvimento pessoal. Na carreira, os benefícios são evidentes. Ainda mais no atual mercado de trabalho, mar-
cado pelo dinamismo. “Antigamente, as pessoas passavam a vida toda na mesma empresa. Hoje, a mobilidade é valorizada. É ela que possibilita a troca de conhecimento. E é com essa interação que as portas se abrem”, afirma Renata Di Rizo, consultora em recursos humanos. Os números confirmam a tese: cerca de 70% das vagas são preenchidas por indicação de funcionários, segundo a consultoria de recursos humanos DBM. Diversos estudos também comprovam a importância de manter uma boa rede de contatos. No livro Inteligência Emocional, o psicólogo Daniel Goleman afirma que a prática da sociabilidade é fundamental para atingir o sucesso. E só se faz isso convivendo, expondo-se a culturas e hábitos diferentes. Essas experiências criam novas conexões no cérebro, tornando-o mais versátil e eficiente. É como conhecer dois ou três caminhos para ir a um mesmo lugar da cidade – você acaba chegando mais rápido.
Manter e comprometer-se Pablo Martin, de 35 anos, também de São Paulo, conhece esses benefícios na prática. “Tenho amigos que conheci aos 2 anos”, exagera. O que conta é que ele faz questão de não deixar o tempo esmaecer as amizades. “Organizo encontros
mensais com o pessoal do colégio, por exemplo.” Essa habilidade é fundamental na área em que Pablo atua: ele é diretor comercial de uma editora. Para angariar e manter novos parceiros, precisa estar constantemente criando e alimentando relações. “Sempre surgem oportunidades quando conhecemos alguém”, afirma. Pablo é tão bom nisso que até seus amigos se beneficiam: “Apresentei um colega de faculdade a um vizinho, porque os dois queriam montar um negócio. Hoje, eles têm um bar, e devem abrir outro”, orgulha-se. O risco do networking é passar a enxergar as pessoas apenas como oportunidade de crescimento profissional. Se esse é o único interesse do relacionamento, dificilmente ele se sustentará. “Quando instrumentalizamos demais as relações, tudo vira negócio, e aí deixamos questões afetivas de lado”, afirma Jacob Carlos Lima, professor do departamento de sociologia da Universidade Federal de São Carlos. Para que um relacionamento renda bons frutos – seja ele ligado ao trabalho, seja ligado a qualquer outra esfera da vida – é preciso haver comprometimento genuíno de ambos os lados. “A reciprocidade depende da estreiteza dos laços”, completa o especialista.
Tecendo a rede
Confira ideias para criar e manter contatos profissionais
• Faça da internet sua aliada. Cadastre-se
em redes sociais voltadas para o universo profissional, como o LinkedIn, o Via6 e o
Ecademy. Se conhecer possíveis parceiros, não hesite em marcar um café.
• Frequente eventos como palestras,
lançamentos de livros, congressos e até mesmo happy hours. Pratique esportes em grupo. São ótimas oportunidades
para dar início a novos relacionamentos.
• Matricule-se em cursos que você nunca pensou em fazer. É engenheiro? Faça
culinária. É médico? Aprenda fotografia. Você vai exercitar sua flexibilidade ao
conhecer pessoas com perfis diferentes.
• Marque encontros com amigos que você não vê há tempos.
• Seja você mesmo. Fingir ter afinidade com alguém pode ser um tiro no pé.
Sua rede de contatos deve ser formada por pessoas em quem você confia – e que confiem em você.
trabalhar
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para viver melhor
A arte de fazer amigos Conhecer gente nova – e saber manter esses contatos – é criar oportunidades de crescimento pessoal. No trabalho, pode ser o caminho para um novo emprego ou para o negócio que você sempre sonhou abrir texto N i n a W e i n g r i l l ilustração E s t ú d i o M o p a
Larissa Ribeiro, de 25 anos, conseguiu seu primeiro emprego enquanto cursava arquitetura, em São Paulo. Sua tia, diretora de uma agência de publicidade, a convidou para trabalhar como assistente de arte. Diploma na mão, Larissa decidiu mudar de ares. Indicada por uma amiga, foi contratada por um escritório de arquitetura. Pouco tempo depois, teve certeza de que essa não era sua praia. Em uma semana, estava trabalhando para uma ex-professora, agora como designer. Parece que Larissa teve sorte, não é? Pode até ser, mas ela não conseguiria nada disso se não fosse boa na arte de cultivar contatos.
Prática social Criar uma rede de relacionamentos – o tal networking – faz bem em todos os sentidos. Conhecer gente nova e manter esses vínculos nos alimenta de informações e pontos de vista, exercita nossa tolerância e criatividade e abre inúmeras oportunidades de desenvolvimento pessoal. Na carreira, os benefícios são evidentes. Ainda mais no atual mercado de trabalho, mar-
cado pelo dinamismo. “Antigamente, as pessoas passavam a vida toda na mesma empresa. Hoje, a mobilidade é valorizada. É ela que possibilita a troca de conhecimento. E é com essa interação que as portas se abrem”, afirma Renata Di Rizo, consultora em recursos humanos. Os números confirmam a tese: cerca de 70% das vagas são preenchidas por indicação de funcionários, segundo a consultoria de recursos humanos DBM. Diversos estudos também comprovam a importância de manter uma boa rede de contatos. No livro Inteligência Emocional, o psicólogo Daniel Goleman afirma que a prática da sociabilidade é fundamental para atingir o sucesso. E só se faz isso convivendo, expondo-se a culturas e hábitos diferentes. Essas experiências criam novas conexões no cérebro, tornando-o mais versátil e eficiente. É como conhecer dois ou três caminhos para ir a um mesmo lugar da cidade – você acaba chegando mais rápido.
Manter e comprometer-se Pablo Martin, de 35 anos, também de São Paulo, conhece esses benefícios na prática. “Tenho amigos que conheci aos 2 anos”, exagera. O que conta é que ele faz questão de não deixar o tempo esmaecer as amizades. “Organizo encontros
mensais com o pessoal do colégio, por exemplo.” Essa habilidade é fundamental na área em que Pablo atua: ele é diretor comercial de uma editora. Para angariar e manter novos parceiros, precisa estar constantemente criando e alimentando relações. “Sempre surgem oportunidades quando conhecemos alguém”, afirma. Pablo é tão bom nisso que até seus amigos se beneficiam: “Apresentei um colega de faculdade a um vizinho, porque os dois queriam montar um negócio. Hoje, eles têm um bar, e devem abrir outro”, orgulha-se. O risco do networking é passar a enxergar as pessoas apenas como oportunidade de crescimento profissional. Se esse é o único interesse do relacionamento, dificilmente ele se sustentará. “Quando instrumentalizamos demais as relações, tudo vira negócio, e aí deixamos questões afetivas de lado”, afirma Jacob Carlos Lima, professor do departamento de sociologia da Universidade Federal de São Carlos. Para que um relacionamento renda bons frutos – seja ele ligado ao trabalho, seja ligado a qualquer outra esfera da vida – é preciso haver comprometimento genuíno de ambos os lados. “A reciprocidade depende da estreiteza dos laços”, completa o especialista.
Tecendo a rede
Confira ideias para criar e manter contatos profissionais
• Faça da internet sua aliada. Cadastre-se
em redes sociais voltadas para o universo profissional, como o LinkedIn, o Via6 e o
Ecademy. Se conhecer possíveis parceiros, não hesite em marcar um café.
• Frequente eventos como palestras,
lançamentos de livros, congressos e até mesmo happy hours. Pratique esportes em grupo. São ótimas oportunidades
para dar início a novos relacionamentos.
• Matricule-se em cursos que você nunca pensou em fazer. É engenheiro? Faça
culinária. É médico? Aprenda fotografia. Você vai exercitar sua flexibilidade ao
conhecer pessoas com perfis diferentes.
• Marque encontros com amigos que você não vê há tempos.
• Seja você mesmo. Fingir ter afinidade com alguém pode ser um tiro no pé.
Sua rede de contatos deve ser formada por pessoas em quem você confia – e que confiem em você.
amar
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as relações que importam grávida aos 15 anos, jaqueline achou que a vida seria monótona. Foi aí, sim, QUE começou a melhor aventura
Não foi como planejei Deu tudo errado? Que bom. Um balde de água fria não tem de ser sinônimo de frustração. Aprender com a adversidade e se deixar ser surpreendido pelo acaso pode levar a lugares muito mais interessantes texto C a m i l a G o n ç a l v e s , R o b e r t a F a r i a , S i m o n e C u n h a e Ta l i t a X a v i e r
fotos R o d r i g o B r a g a
Nossa vida é feita de planos. De grandes e pequenos, sérios e sonhadores, cotidianos e distantes. Planejar é um hábito inerente ao ser humano, fruto da imaginação e do gosto pela sensação de estabilidade. Planejamos o que vamos fazer para o jantar, que roupa vestir amanhã, onde será nossa casa, em que lugar passaremos as férias, quantos filhos teremos, como será nossa festa de aniversário. Muitas vezes, os planos funcionam. Outras tantas, dão estrondosamente errado. Frustrante? Pode ser. Mas também pode significar um novo caminho, ainda melhor do que aquele que havíamos calculado. Erros, enganos e furadas, acredite, têm o poder de nos levar também a descobertas, surpresas e aprendizados. Ou você nunca se pegou dizendo: “Ainda bem que foi assim”, depois de um problema? Conheça histórias inspiradoras de planos que foram por água abaixo. É provável que depois você se pegue torcendo por um imprevisto que mude tudo para melhor.
um restaurante chique. Parecia moleza e, quem sabe, uma chance de mudar minha sorte. Me enganei quanto ao trabalho. Tinha de ficar das 7h às 16h na porta, sem sentar nem tomar água, usando uma roupa dourada ridícula. Foram cinco meses de sofrimento... que me inspiraram a criar a peça Meu Ouvido Não É Penico. Nela, faço a Joceleyne, uma hostess que vive o que eu penei. O teatro lotou na estreia.”
Efeito borboleta
“Estava casada havia sete anos e, apesar de todas as tentativas, os médicos diziam que não tinha nada no sistema solar que pudesse me fazer engravidar. Meu sofrimento convenceu meu marido, que era contra, a adotar. O dia em que o Ricardo chegou, há 32 anos, foi o mais feliz da mi nha vida. Seis meses depois, não sei como, engravidei do Ronaldo. Só faltava uma menina, e resolvemos adotar. No dia em que soube que a garotinha que me fora prometida não seria minha, passei mal. Estava grávida. E nasceu a minha Roberta.”
“Era setembro de 2006, fim de semana de eleições, e eu iria de Manaus, onde vivia, até Brasília visitar minha namorada. No caminho para o aeroporto, notei que havia esquecido o título de eleitor. Voltei para pegá-lo e perdi o voo. Além da raiva, veio na cabeça o meu pai, que trabalhou 20 anos em empresas aéreas, dizendo ‘Não falei pra chegar mais cedo?’. Peguei outro avião e pousei a tempo do jantar. Pouco depois, o telefone começou a tocar. As pessoas queriam saber se eu estava bem: o avião em que eu deveria ter embarcado tinha desaparecido. Quando os destroços do voo da Gol apareceram na TV sem nenhum sobrevivente, senti um frio na barriga. Algo me disse: ‘Faça a sua vida valer a pena daqui pra frente.’” Carlos Gurgel, 29 anos, Lisboa, Portugal
Era outro
“Era nosso aniversário de dois anos de namoro. Para comemorar, tive a brilhante ideia de montar um jantar árabe. Fiz quibes, me vesti de odalisca e fui ao apartamento do Guilherme montar o cenário, enquanto ele jogava futebol. Quando entrei... Um clássico: ele estava no sofá com outra. Fiz um escândalo, arremessei os quibes neles e fugi. Dias depois, o Alexandre, irmão caçula dele, foi em casa. Disse que a família estava furiosa com o traidor, e que ele queria continuar meu amigo. Nas semanas seguintes, o Alê seguiu me visitando. Nos apaixonamos. O ex é agora oficialmente meu cunhado, e ainda rimos dele nos almoços de domingo.” Letícia Nunes, 31 anos, Rio de Janeiro (RJ)
Melhor acompanhada
“Costumava dizer que não teria filhos. Imaginava uma vida independente, cheia de mudanças, sem parar nunca, experimentando sempre. Aos 15 anos, o plano ruiu – e eu ganhei a maior aventura de todas. A Jade nasceu 21 dias antes do vestibular e mamou em cima das apostilas. Passou comigo pela faculdade, pelas viagens, pelas mudanças de cidade atrás de trabalho. Sobrevivi, crescemos, e juntas ainda desbravaremos muitos mundos.” Jaqueline Li, 26 anos, São Paulo (SP)
Segunda chance
“Em 1993, minha turma de engenharia completou 20 anos, e havia uma festa. Eu não queria ver ninguém: recém-separado, chegara aos 40 sem filhos nem emprego fixo, morando com meus pais. Mas precisava fazer contatos. Fui e fiquei de canto. Até que a Maria Eugênia, a única garota da turma, veio conversar. Linda e inatingível como sempre, achei que iria enumerar seus feitos. Não: ela disse que o tempo a assustava. Era o que eu sentia. A conversa durou horas e continua até hoje. Pela paixão, retomei a vida: passei num concurso, nos casamos, virei pai. No encontro de 40 anos da turma, espero que ela continue a me entender – e que se orgulhe do homem que me tornei por sua causa.” Antônio Stumpf, 60 anos, São Leopoldo (RS)
Inspiração aguda
“Há um ano, minha carreira de atriz estava empacada e recebi um convite para ser hostess – aquela pessoa que fica na entrada barrando quem está malvestido – de
Alessandra Cifali, 30 anos, Rio de Janeiro (RJ)
Melhor que a encomenda
Maura Silva Pires, 60 anos, Praia Grande (SP)
Na melhor companhia
“Ia ser a viagem da nossa vida. Eu, com 21 anos, mais quatro amigas durante quinze dias pelo Nordeste. Mas na primeira semana choveu, e as meninas resolveram voltar. Eu acabara de me formar, estava sem trabalho e não tinha pressa. Mesmo sozinha, apostei. O sol reapareceu enquanto eu ia de Porto Seguro a Jericoacoara, de carona e ônibus. Conheci várias turmas, fiquei em albergues e a viagem durou dois meses. Aprendi a me virar e descobri que sou uma ótima companhia. Para mim mesma.” Vanessa Biajoti, 37 anos, São Paulo (SP)
Obrigada pelo cano
“Combinei com minha amiga um encontro duplo: ela iria com o namorado e eu, com o Roberto, um cara de quem eu gostava. Na hora H, meu par furou. Em seu lugar, apareceu o Marcos. Odiei. Não bastasse a decepção, ainda vinha esse desconhecido se meter. Apesar da minha antipatia, ele insistiu. Dias depois, foi me
amar
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as relações que importam grávida aos 15 anos, jaqueline achou que a vida seria monótona. Foi aí, sim, QUE começou a melhor aventura
Não foi como planejei Deu tudo errado? Que bom. Um balde de água fria não tem de ser sinônimo de frustração. Aprender com a adversidade e se deixar ser surpreendido pelo acaso pode levar a lugares muito mais interessantes texto C a m i l a G o n ç a l v e s , R o b e r t a F a r i a , S i m o n e C u n h a e Ta l i t a X a v i e r
fotos R o d r i g o B r a g a
Nossa vida é feita de planos. De grandes e pequenos, sérios e sonhadores, cotidianos e distantes. Planejar é um hábito inerente ao ser humano, fruto da imaginação e do gosto pela sensação de estabilidade. Planejamos o que vamos fazer para o jantar, que roupa vestir amanhã, onde será nossa casa, em que lugar passaremos as férias, quantos filhos teremos, como será nossa festa de aniversário. Muitas vezes, os planos funcionam. Outras tantas, dão estrondosamente errado. Frustrante? Pode ser. Mas também pode significar um novo caminho, ainda melhor do que aquele que havíamos calculado. Erros, enganos e furadas, acredite, têm o poder de nos levar também a descobertas, surpresas e aprendizados. Ou você nunca se pegou dizendo: “Ainda bem que foi assim”, depois de um problema? Conheça histórias inspiradoras de planos que foram por água abaixo. É provável que depois você se pegue torcendo por um imprevisto que mude tudo para melhor.
um restaurante chique. Parecia moleza e, quem sabe, uma chance de mudar minha sorte. Me enganei quanto ao trabalho. Tinha de ficar das 7h às 16h na porta, sem sentar nem tomar água, usando uma roupa dourada ridícula. Foram cinco meses de sofrimento... que me inspiraram a criar a peça Meu Ouvido Não É Penico. Nela, faço a Joceleyne, uma hostess que vive o que eu penei. O teatro lotou na estreia.”
Efeito borboleta
“Estava casada havia sete anos e, apesar de todas as tentativas, os médicos diziam que não tinha nada no sistema solar que pudesse me fazer engravidar. Meu sofrimento convenceu meu marido, que era contra, a adotar. O dia em que o Ricardo chegou, há 32 anos, foi o mais feliz da mi nha vida. Seis meses depois, não sei como, engravidei do Ronaldo. Só faltava uma menina, e resolvemos adotar. No dia em que soube que a garotinha que me fora prometida não seria minha, passei mal. Estava grávida. E nasceu a minha Roberta.”
“Era setembro de 2006, fim de semana de eleições, e eu iria de Manaus, onde vivia, até Brasília visitar minha namorada. No caminho para o aeroporto, notei que havia esquecido o título de eleitor. Voltei para pegá-lo e perdi o voo. Além da raiva, veio na cabeça o meu pai, que trabalhou 20 anos em empresas aéreas, dizendo ‘Não falei pra chegar mais cedo?’. Peguei outro avião e pousei a tempo do jantar. Pouco depois, o telefone começou a tocar. As pessoas queriam saber se eu estava bem: o avião em que eu deveria ter embarcado tinha desaparecido. Quando os destroços do voo da Gol apareceram na TV sem nenhum sobrevivente, senti um frio na barriga. Algo me disse: ‘Faça a sua vida valer a pena daqui pra frente.’” Carlos Gurgel, 29 anos, Lisboa, Portugal
Era outro
“Era nosso aniversário de dois anos de namoro. Para comemorar, tive a brilhante ideia de montar um jantar árabe. Fiz quibes, me vesti de odalisca e fui ao apartamento do Guilherme montar o cenário, enquanto ele jogava futebol. Quando entrei... Um clássico: ele estava no sofá com outra. Fiz um escândalo, arremessei os quibes neles e fugi. Dias depois, o Alexandre, irmão caçula dele, foi em casa. Disse que a família estava furiosa com o traidor, e que ele queria continuar meu amigo. Nas semanas seguintes, o Alê seguiu me visitando. Nos apaixonamos. O ex é agora oficialmente meu cunhado, e ainda rimos dele nos almoços de domingo.” Letícia Nunes, 31 anos, Rio de Janeiro (RJ)
Melhor acompanhada
“Costumava dizer que não teria filhos. Imaginava uma vida independente, cheia de mudanças, sem parar nunca, experimentando sempre. Aos 15 anos, o plano ruiu – e eu ganhei a maior aventura de todas. A Jade nasceu 21 dias antes do vestibular e mamou em cima das apostilas. Passou comigo pela faculdade, pelas viagens, pelas mudanças de cidade atrás de trabalho. Sobrevivi, crescemos, e juntas ainda desbravaremos muitos mundos.” Jaqueline Li, 26 anos, São Paulo (SP)
Segunda chance
“Em 1993, minha turma de engenharia completou 20 anos, e havia uma festa. Eu não queria ver ninguém: recém-separado, chegara aos 40 sem filhos nem emprego fixo, morando com meus pais. Mas precisava fazer contatos. Fui e fiquei de canto. Até que a Maria Eugênia, a única garota da turma, veio conversar. Linda e inatingível como sempre, achei que iria enumerar seus feitos. Não: ela disse que o tempo a assustava. Era o que eu sentia. A conversa durou horas e continua até hoje. Pela paixão, retomei a vida: passei num concurso, nos casamos, virei pai. No encontro de 40 anos da turma, espero que ela continue a me entender – e que se orgulhe do homem que me tornei por sua causa.” Antônio Stumpf, 60 anos, São Leopoldo (RS)
Inspiração aguda
“Há um ano, minha carreira de atriz estava empacada e recebi um convite para ser hostess – aquela pessoa que fica na entrada barrando quem está malvestido – de
Alessandra Cifali, 30 anos, Rio de Janeiro (RJ)
Melhor que a encomenda
Maura Silva Pires, 60 anos, Praia Grande (SP)
Na melhor companhia
“Ia ser a viagem da nossa vida. Eu, com 21 anos, mais quatro amigas durante quinze dias pelo Nordeste. Mas na primeira semana choveu, e as meninas resolveram voltar. Eu acabara de me formar, estava sem trabalho e não tinha pressa. Mesmo sozinha, apostei. O sol reapareceu enquanto eu ia de Porto Seguro a Jericoacoara, de carona e ônibus. Conheci várias turmas, fiquei em albergues e a viagem durou dois meses. Aprendi a me virar e descobri que sou uma ótima companhia. Para mim mesma.” Vanessa Biajoti, 37 anos, São Paulo (SP)
Obrigada pelo cano
“Combinei com minha amiga um encontro duplo: ela iria com o namorado e eu, com o Roberto, um cara de quem eu gostava. Na hora H, meu par furou. Em seu lugar, apareceu o Marcos. Odiei. Não bastasse a decepção, ainda vinha esse desconhecido se meter. Apesar da minha antipatia, ele insistiu. Dias depois, foi me
comer
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sabores que confortam
Semente da
terra
texto N i n a W e i n g r i l l
fotos L u i s H e n r i q u e M e n d e s produção de culinária e objetos Beth Freidenson assistente de culinária Cleusa Bonfim assistente de produção Claudia Maykot
Doce ou salgado, torrado, moído ou em pasta, para comer com as mãos ou fazer bonito no prato. Quem vê as sementinhas miúdas na casca não adivinha como é grande a versatilidade (e a gostosura) do amendoim
Todo junho é assim. As preparações começam na escola, nas pequenas comunidades, nos bairros mais aconchegantes das grandes cidades, que acendem as fogueiras tão logo o ar se torna invernal. Pedaços de papel de seda são dobrados, dá-se um picote no meio, junta-se barbante, cola, pendura-se, e a rua fica colorida como nunca. Ouvem-se violões, sanfonas, triângulos, e logo começam as danças. De uma mesa montada por todos, vêm os cheiros e sabores que completam a festa. E um ingrediente não pode faltar: o amendoim. Nascido aqui mesmo, na América do Sul, o amendoim era tão valorizado pelos nativos que eles não o dispensavam nem depois da morte. Em túmulos incas, a semente costumava ser enterrada com outras riquezas, como ouro e pedras preciosas. “Os indígenas consumiam o amendoim cru ou torrado”, conta o engenheiro de alimentos Masaharu Nagato. O alimento garantia o vigor necessário para a vida na selva. “Por ter alto teor de lipídios e proteína – desta última são 30 gramas a cada 200 gramas de amendoim –, a semente é pura fonte de energia”, afirma Silvia Nogueira, coordenadora do curso de nutrição do Senac Santo Amaro, em São Paulo. Bobos que não eram, os colonizadores trataram de levar o amendoim para a Europa, onde a semente – apesar de não ser uma noz, mas, sim, uma leguminosa, parente da ervilha – substituiu amêndoas e avelãs em doces pomposos. No Brasil, tornou-se ingrediente típico da culinária caipira, sempre batendo cartão nos tachos que comemoram os santos de junho. No resto do ano, vai ao forno para virar também petisco salgado e acompanhar jogos de futebol, matinês de cinema e bares no fim de tarde. Duas receitas bem fáceis e gostosas provam toda essa versatilidade. Experimente!
Amendoim torrado com mel
Torta de paçoca e chocolate
que belisquem à vontade. O amendoim
festa junina. Enquanto a massa abusa
Chame os amigos em volta da mesa e deixe torrado, seja acompanhado de sal, açúcar, chocolate ou o que você inventar, logo se torna o favorito da turma
Ela vai dar um quê de requinte à sua
do amendoim, o recheio traz a elegância da avelã e do conhaque, suavizados pelo chocolate e pelo mel
ingredientes
ingredientes da massa
• 500 g de amendoim torrado e descascado
• 32 paçocas de rolha (2 pacotes de 350 g)
• 2 colheres (sopa) de manteiga derretida • 2 colheres (sopa) de mel • 1 pitada de sal
• 3 colheres (sopa) de leite Modo de preparo
• 1 pitada de açúcar
Amasse as paçocas (reserve duas para
Modo de preparo
mistura, forre o fundo e as laterais de
Em uma tigela, misture a manteiga e o mel. Junte o amendoim. Mexa até que todos os
grãos estejam cobertos. Espalhe-os em uma forma, salpique com sal e torre-os por cerca
o recheio) e adicione o leite. Com essa
uma forma de aro removível de 20 cm de
diâmetro. Leve por cinco minutos ao forno médio preaquecido (180 °C). Reserve.
de 20 minutos em forno baixo (100 ºC). Abra
Ingredientes do recheio
quando. Verifique o sal e, se quiser destacar
- 150 g de chocolate meio amargo
o forno e revolva os amendoins de vez em
- 150 g de chocolate ao leite
o gosto do mel, salpique também com
- 1 xícara (chá) de creme de leite
açúcar. Deixe esfriar e guarde em um pote bem fechado.
Veja abaixo outras variações do tema,
para preparar com a mesma quantidade de amendoim e da mesma maneira: primeiro,
misturando os temperos com as sementes,
depois torrando em forno baixo, revolvendo sempre para não grudar.
- 1 colher (sopa) de Karo ou mel
- 1 pote de creme de avelãs tipo Nutella - 1 colher (sopa) de conhaque
- 1 colher (sopa) de gelatina incolor - 3 colheres (sopa) de água
- 2 paçocas de rolha esfareladas (aquelas já reservadas) Modo de preparo
• Amendoim agridoce: 2 colheres (sopa)
Coloque os chocolates picados e o creme
derretida + 1 colher (chá) de mostarda em
maria. Depois de derretidos e misturados,
de mel + 2 colheres (sopa) de manteiga
pó + 1 pitada de sal + 1 pitada de açúcar • Amendoim oriental: 2 colheres (sopa)
de mel + 2 colheres (sopa) de manteiga derretida + 1 colher (chá) de curry + 1 pitada de sal + 1 pitada de açúcar
• Amendoim picante: 4 colheres (sopa) de manteiga derretida + 1 colher (chá) de páprica picante + 1 pitada de sal
• Amendoim de chocolate: 4 colheres
(sopa) de leite condensado + 4 colheres (sopa) de achocolatado em pó
de leite em um refratário e leve ao banhoadicione o creme de avelãs e mexa bem.
Acrescente o Karo ou mel, o conhaque e as paçocas esfareladas e misture. Hidrate a
gelatina em três colheres de sopa de água por alguns minutos e leve ao fogo, em
banho-maria, para dissolver. Adicione aos
poucos a gelatina à mistura de chocolate. Coloque o recheio sobre a base da torta e
leve à geladeira até que esteja firme. Decore com paçocas esfareladas ou amendoim. Retire da geladeira só na hora de servir.
comer
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sabores que confortam
Semente da
terra
texto N i n a W e i n g r i l l
fotos L u i s H e n r i q u e M e n d e s produção de culinária e objetos Beth Freidenson assistente de culinária Cleusa Bonfim assistente de produção Claudia Maykot
Doce ou salgado, torrado, moído ou em pasta, para comer com as mãos ou fazer bonito no prato. Quem vê as sementinhas miúdas na casca não adivinha como é grande a versatilidade (e a gostosura) do amendoim
Todo junho é assim. As preparações começam na escola, nas pequenas comunidades, nos bairros mais aconchegantes das grandes cidades, que acendem as fogueiras tão logo o ar se torna invernal. Pedaços de papel de seda são dobrados, dá-se um picote no meio, junta-se barbante, cola, pendura-se, e a rua fica colorida como nunca. Ouvem-se violões, sanfonas, triângulos, e logo começam as danças. De uma mesa montada por todos, vêm os cheiros e sabores que completam a festa. E um ingrediente não pode faltar: o amendoim. Nascido aqui mesmo, na América do Sul, o amendoim era tão valorizado pelos nativos que eles não o dispensavam nem depois da morte. Em túmulos incas, a semente costumava ser enterrada com outras riquezas, como ouro e pedras preciosas. “Os indígenas consumiam o amendoim cru ou torrado”, conta o engenheiro de alimentos Masaharu Nagato. O alimento garantia o vigor necessário para a vida na selva. “Por ter alto teor de lipídios e proteína – desta última são 30 gramas a cada 200 gramas de amendoim –, a semente é pura fonte de energia”, afirma Silvia Nogueira, coordenadora do curso de nutrição do Senac Santo Amaro, em São Paulo. Bobos que não eram, os colonizadores trataram de levar o amendoim para a Europa, onde a semente – apesar de não ser uma noz, mas, sim, uma leguminosa, parente da ervilha – substituiu amêndoas e avelãs em doces pomposos. No Brasil, tornou-se ingrediente típico da culinária caipira, sempre batendo cartão nos tachos que comemoram os santos de junho. No resto do ano, vai ao forno para virar também petisco salgado e acompanhar jogos de futebol, matinês de cinema e bares no fim de tarde. Duas receitas bem fáceis e gostosas provam toda essa versatilidade. Experimente!
Amendoim torrado com mel
Torta de paçoca e chocolate
que belisquem à vontade. O amendoim
festa junina. Enquanto a massa abusa
Chame os amigos em volta da mesa e deixe torrado, seja acompanhado de sal, açúcar, chocolate ou o que você inventar, logo se torna o favorito da turma
Ela vai dar um quê de requinte à sua
do amendoim, o recheio traz a elegância da avelã e do conhaque, suavizados pelo chocolate e pelo mel
ingredientes
ingredientes da massa
• 500 g de amendoim torrado e descascado
• 32 paçocas de rolha (2 pacotes de 350 g)
• 2 colheres (sopa) de manteiga derretida • 2 colheres (sopa) de mel • 1 pitada de sal
• 3 colheres (sopa) de leite Modo de preparo
• 1 pitada de açúcar
Amasse as paçocas (reserve duas para
Modo de preparo
mistura, forre o fundo e as laterais de
Em uma tigela, misture a manteiga e o mel. Junte o amendoim. Mexa até que todos os
grãos estejam cobertos. Espalhe-os em uma forma, salpique com sal e torre-os por cerca
o recheio) e adicione o leite. Com essa
uma forma de aro removível de 20 cm de
diâmetro. Leve por cinco minutos ao forno médio preaquecido (180 °C). Reserve.
de 20 minutos em forno baixo (100 ºC). Abra
Ingredientes do recheio
quando. Verifique o sal e, se quiser destacar
- 150 g de chocolate meio amargo
o forno e revolva os amendoins de vez em
- 150 g de chocolate ao leite
o gosto do mel, salpique também com
- 1 xícara (chá) de creme de leite
açúcar. Deixe esfriar e guarde em um pote bem fechado.
Veja abaixo outras variações do tema,
para preparar com a mesma quantidade de amendoim e da mesma maneira: primeiro,
misturando os temperos com as sementes,
depois torrando em forno baixo, revolvendo sempre para não grudar.
- 1 colher (sopa) de Karo ou mel
- 1 pote de creme de avelãs tipo Nutella - 1 colher (sopa) de conhaque
- 1 colher (sopa) de gelatina incolor - 3 colheres (sopa) de água
- 2 paçocas de rolha esfareladas (aquelas já reservadas) Modo de preparo
• Amendoim agridoce: 2 colheres (sopa)
Coloque os chocolates picados e o creme
derretida + 1 colher (chá) de mostarda em
maria. Depois de derretidos e misturados,
de mel + 2 colheres (sopa) de manteiga
pó + 1 pitada de sal + 1 pitada de açúcar • Amendoim oriental: 2 colheres (sopa)
de mel + 2 colheres (sopa) de manteiga derretida + 1 colher (chá) de curry + 1 pitada de sal + 1 pitada de açúcar
• Amendoim picante: 4 colheres (sopa) de manteiga derretida + 1 colher (chá) de páprica picante + 1 pitada de sal
• Amendoim de chocolate: 4 colheres
(sopa) de leite condensado + 4 colheres (sopa) de achocolatado em pó
de leite em um refratário e leve ao banhoadicione o creme de avelãs e mexa bem.
Acrescente o Karo ou mel, o conhaque e as paçocas esfareladas e misture. Hidrate a
gelatina em três colheres de sopa de água por alguns minutos e leve ao fogo, em
banho-maria, para dissolver. Adicione aos
poucos a gelatina à mistura de chocolate. Coloque o recheio sobre a base da torta e
leve à geladeira até que esteja firme. Decore com paçocas esfareladas ou amendoim. Retire da geladeira só na hora de servir.
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as delícias do exercício
Roda
viva
Não existe movimento mais fácil de executar. Mesmo se você se esforçar ao máximo para permanecer parado, ainda estará girando. É algo primordial. Desde que o mundo é mundo, ele gira, levando consigo tudo o que está na superfície, incluindo você. Graças à rotação da Terra em torno do próprio eixo e ao redor do Sol, temos dias, noites, estações e, assim, as condições ideais para a existência da vida. Talvez inspirado pelo giro dos astros no céu, o homem concebeu uma de suas mais antigas e revolucionárias invenções: a roda. E desde então temos usado e abusado desse princípio, sem o qual não existiriam parafusos, relógios, torneiras, máquinas de lavar, vitrolas, ventiladores, bambolês, automóveis, batedeiras, carrinhos de feira nem uma infinidade de outras coisas que facilitam e divertem nossos dias. Mas para sentir o barato do giro não é preciso nenhum acessório. Basta rodar, como um pião. O desafio é não sair do eixo. Especialista no assunto, Maria Cristina Guazzelli, baiana da escola de samba Águia de Ouro, campeã do último Carnaval paulista, dá a dica: “Fechar os olhos e apoiar-se num pé só pode ser um bom treino”. Mas o desequilíbrio é parte da graça. Girar implica perder momentaneamente o ponto de referência, entregar-se a um movimento que envolve todas as partes do nosso corpo e que, mesmo após ter sido executado, parece continuar em nossa cabeça. Conversamos com três pessoas que adoram essa sensação. Confira como gira o mundo delas.
Revoluções no vazio Para um leigo, ficar na pontinha de uma estrutura que se ergue a 10 metros do chão – mesmo que lá embaixo haja uma piscina – pode
Quando você encontrar o mundo meio estático, abra os braços e gire o corpo em volta de si mesmo. Uma, duas, três vezes. Pare, deite-se no chão e observe o céu. Sentiu tudo rodando? Agora você está em plena sincronia com o universo
ser aflitivo. Para Fernando Ribeiro, é apenas um detalhe do esporte
que ele pratica há 54 anos: o salto ornamental. A paixão por executar
rodopios nos poucos segundos que separam o trampolim da água foi despertada na adolescência, no clube que frequentava, antes de se
mudar do Rio de Janeiro para São Paulo. Seu talento foi reconhecido pelos atletas mais experientes, e ele começou a treinar a sério.
A certa altura, o pai pressionou: “Vai ficar saltando ou vai trabalhar?”, e Fernando se desdobrou entre faculdade, emprego e piscina. Formado engenheiro, ele se orgulha da invejável carreira
paralela: participou de duas Olimpíadas e de três Panamericanos, ganhou campeonatos regionais, nacionais e sul-americanos.
Incontáveis vezes, ele teve a sensação de girar no vazio, totalmente
livre e, ao mesmo tempo, absolutamente concentrado na tentativa da manobra impecável. “Durante a rotação, sinto que há forças
me puxando. Mas consigo prever o momento certo de me esticar. Quando o corpo toca a água, sabemos se o salto foi ou não um
texto C h i c o S p a g n o l o e N i n a We i n g r i l l
© Renato Pizzutto
movimentar
sucesso: quanto menos espirrar, maior a nota”, explica. Aos 71 anos,
Fernando segue praticando, na piscina com trampolim construída no quintal de casa. E competindo. “Hoje tenho medo de executar alguns
saltos, mas faço o melhor que posso”, conta, apressado para embarcar para os Estados Unidos, rumo a mais um campeonato.
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as delícias do exercício
Roda
viva
Não existe movimento mais fácil de executar. Mesmo se você se esforçar ao máximo para permanecer parado, ainda estará girando. É algo primordial. Desde que o mundo é mundo, ele gira, levando consigo tudo o que está na superfície, incluindo você. Graças à rotação da Terra em torno do próprio eixo e ao redor do Sol, temos dias, noites, estações e, assim, as condições ideais para a existência da vida. Talvez inspirado pelo giro dos astros no céu, o homem concebeu uma de suas mais antigas e revolucionárias invenções: a roda. E desde então temos usado e abusado desse princípio, sem o qual não existiriam parafusos, relógios, torneiras, máquinas de lavar, vitrolas, ventiladores, bambolês, automóveis, batedeiras, carrinhos de feira nem uma infinidade de outras coisas que facilitam e divertem nossos dias. Mas para sentir o barato do giro não é preciso nenhum acessório. Basta rodar, como um pião. O desafio é não sair do eixo. Especialista no assunto, Maria Cristina Guazzelli, baiana da escola de samba Águia de Ouro, campeã do último Carnaval paulista, dá a dica: “Fechar os olhos e apoiar-se num pé só pode ser um bom treino”. Mas o desequilíbrio é parte da graça. Girar implica perder momentaneamente o ponto de referência, entregar-se a um movimento que envolve todas as partes do nosso corpo e que, mesmo após ter sido executado, parece continuar em nossa cabeça. Conversamos com três pessoas que adoram essa sensação. Confira como gira o mundo delas.
Revoluções no vazio Para um leigo, ficar na pontinha de uma estrutura que se ergue a 10 metros do chão – mesmo que lá embaixo haja uma piscina – pode
Quando você encontrar o mundo meio estático, abra os braços e gire o corpo em volta de si mesmo. Uma, duas, três vezes. Pare, deite-se no chão e observe o céu. Sentiu tudo rodando? Agora você está em plena sincronia com o universo
ser aflitivo. Para Fernando Ribeiro, é apenas um detalhe do esporte
que ele pratica há 54 anos: o salto ornamental. A paixão por executar
rodopios nos poucos segundos que separam o trampolim da água foi despertada na adolescência, no clube que frequentava, antes de se
mudar do Rio de Janeiro para São Paulo. Seu talento foi reconhecido pelos atletas mais experientes, e ele começou a treinar a sério.
A certa altura, o pai pressionou: “Vai ficar saltando ou vai trabalhar?”, e Fernando se desdobrou entre faculdade, emprego e piscina. Formado engenheiro, ele se orgulha da invejável carreira
paralela: participou de duas Olimpíadas e de três Panamericanos, ganhou campeonatos regionais, nacionais e sul-americanos.
Incontáveis vezes, ele teve a sensação de girar no vazio, totalmente
livre e, ao mesmo tempo, absolutamente concentrado na tentativa da manobra impecável. “Durante a rotação, sinto que há forças
me puxando. Mas consigo prever o momento certo de me esticar. Quando o corpo toca a água, sabemos se o salto foi ou não um
texto C h i c o S p a g n o l o e N i n a We i n g r i l l
© Renato Pizzutto
movimentar
sucesso: quanto menos espirrar, maior a nota”, explica. Aos 71 anos,
Fernando segue praticando, na piscina com trampolim construída no quintal de casa. E competindo. “Hoje tenho medo de executar alguns
saltos, mas faço o melhor que posso”, conta, apressado para embarcar para os Estados Unidos, rumo a mais um campeonato.
este valor, descontados os impostos, ĂŠ 100% revertido para o
* 8 jun/jul 2009