Revista Sorria #12

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este valor, descontados os impostos, ĂŠ 100% revertido para o

* 12 fev/mar 2010


descobrir

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o melhor do dia a dia

Não acredito em

impossível texto R o b e r t a F a r i a

foto E l e n a K a l i s

Um dia, a ideia apareceu, e pronto: virou verdade. De repente, eu soube que, se cavasse um buraco bem fundo na areia do parquinho, iria encontrar água. Não essa de poça: água azul-clarinha, transparente, como de piscina, cheia de flores e peixes coloridos. Então, mergulharia no buraco. Nadando entre os cavalos-marinhos, chegaria ao lago. Lá, o arco-íris no céu nunca sumia, a água da cachoeira caía sem machucar, podia ir na roda-gigante e comer cachorro-quente da barraquinha até se cansar. Mais ninguém morava ali: só os unicórnios. Tinha certeza absoluta e irredutível de que esse lugar era real. Podia descrevê-lo em detalhes, sentir seus cheiros, cores, sons. Em todos os recreios dos meus seis anos, me punha a cavar, e só parei no dia em que cimentaram o terreno. Sinto falta de verdades inquestionáveis assim. De tanto nos dizerem que não dá, não pode, não existe, desaprendemos a imaginar o impossível. Passamos a duvidar dos sonhos, cheios de preocupações práticas e autocensuras. Mas, quando não tem ninguém olhando, confesso: eu fujo. E, em vez de pensar na lista de pendências do dia seguinte, imagino a casa na árvore que construiria numa ilha deserta. Ou como seria respirar debaixo d’água, viajar no tempo, ter quatro braços, ler pensamentos. De outras, me vejo aventureira, e planejo como escapar de índios canibais, atravessar um labirinto, sobreviver ao deserto. Há dias em que me coloco em outras vidas – como seria se eu fosse indiana, detetive ou tocasse sanfona? Como as crianças sabem (essa sabedoria que nos podam enquanto crescemos), imaginar é o maior dos superpoderes. Se não dá vida aos sonhos, ao menos nos deixa mais perto das vidas que sonhamos ter. E faz tudo ser possível outra vez.


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cuidar

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nosso mundo, nossa vida

Reconhecimento de território Toda cidade é um universo a ser explorado. E conhecer bem o lugar em que vivemos é o primeiro passo para deixá-lo do jeito que sempre sonhamos texto

Dilson Branco e N i n a We i n g r i l l ilustração C y n t h i a G y u r u

Pense rápido: qual é a capital da França? Muito bem. Se você tem na ponta da língua essa resposta sobre um país localizado a um oceano de distância da sua casa, as próximas questões vão ser ainda mais fáceis: que flor é aquela plantada na janela da casa da sua vizinha, em frente à qual você passa todos os dias? De qual manancial vem a água que escorre pela sua torneira? Qual é o nome do rapaz que trabalha no estacionamento onde diariamente você para seu carro? É curioso perceber como desconhecemos informações tão triviais sobre nosso dia a dia. Podem parecer questões banais, mas saber ou não respondê-las revela algo muito importante: a relação que mantemos com o lugar em que vivemos. É como um relacionamento entre duas pessoas: quanto mais elas se conhecem, mais próximas são entre si, mais cuidam uma da outra, e mais frutífera essa amizade se torna para ambas. Cada novo conhecimento que adquirimos sobre nosso bairro ou nossa cidade faz com que esses espaços se tornem


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um pouco mais nossos. E, só nos sentindo donos, vamos nos empenhar em cuidar deles. É dessa forma que construímos um lugar melhor para viver, como mostram as histórias a seguir.

RG vegetal Há pouco mais de uma década, a empresária Rosely Brancaglione, de 47 anos, mudou-se para um apartamento no bairro Vila Madalena, em São Paulo. Um dos motivos que a fizeram se apaixonar pelo novo lar foi a bela praça localizada bem na frente do prédio. “Passei a caminhar no meio daquele verde todas as manhãs”, conta. Rosely foi ficando cada vez mais íntima do lugar. Mas um dia percebeu que simplesmente desconhecia o nome de quem diariamente lhe fazia companhia por ali: as árvores. Poderia ter sido uma divagação qualquer, logo esquecida, mas ela levou a questão adiante. E a transformou num projeto bastante original, que mudaria a cara do bairro.

Para encontrar as informações de que precisava, a empresária buscou ajuda especializada: foi ao Departamento de Botânica da USP. “Cheguei lá com a cara e a coragem”, lembra. O professor que poderia ajudá-la estava de férias na época, mas ela não desistiu. Voltou dias depois, sentou-se à sua frente e lhe contou seu plano: identificar as espécies das árvores do bairro plantadas em locais públicos e pendurar uma pequena placa em cada uma com seu nome científico e popular. O professor José Rubens Pirani logo topou a empreitada, convidando seus alunos a participar. Passados seis meses, o trabalho estava concluído. Com a autorização da prefeitura, as placas foram penduradas, em setembro de 2005. “Criamos uma sala de aula ao ar livre, com mais de 600 árvores catalogadas e mais de 100 espécies diferentes”, conta Rosely, orgulhosa. O desejo de saciar a própria curiosidade estava rea-

lizado. Havia também a sensação de dever cumprido, de estar fazendo algo positivo em benefício do próprio bairro. O que talvez Rosely não esperasse era a capacidade de sua ideia contagiar os vizinhos, fazendo com que eles também mudassem de atitude em relação ao espaço público. “Depois da inauguração das placas, observei que as pessoas cuidavam mais da praça, não jogavam lixo no chão, vigiavam o local. Eu mesma fiquei mais consciente em relação a isso”, diz. O antropólogo Johan Pottier, da Universidade de Londres, ajuda a entender o que aconteceu: “Nesse caso, ter sistematizado e organizado o conhecimento deu às pessoas mais acesso à cultura disponível, fez com que se aproximassem do seu bairro. Um primeiro passo para começar a gostar dele”. Ou seja: pesquisar e compartilhar informações sobre o lugar em que se vive torna a comunidade mais consciente e comprometida.


crescer

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valores que mudam a vida

texto J e a n n e C a l l e g a r i

© Daryan Dornelles/Fotonauta

ilustração L u p e

acaso é... viver um reencontro que nos faça voltar a acreditar no amor, como aconteceu com paloma


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O mundo não está sob nosso controle. Ao virarmos a próxima esquina, nossos planos podem ir por água abaixo, a maior certeza pode se abalar, ou até mesmo a resposta que tanto procurávamos pode estar nos esperando. Eis a beleza do aleatório em nossa vida

A ideia era se jogar nos braços do desconhecido. Afinal, no inverno do ano passado, seria a primeira vez que a relações-públicas Paloma Heringer, de 27 anos, do Rio de Janeiro, faria uma viagem do tipo mochilão sozinha. Ela estaria a milhares de quilômetros de casa, na Patagônia argentina. Conheceria gente nova e experimentaria uma série de sensações diversas às da sua rotina, como em toda boa viagem. Ela estava preparada para situações inesperadas. Mas não imaginava que elas transformariam a forma como ela enxergava o amor. Na cidade de El Calafate, Paloma fez amizade com um grupo de viajantes. Entre eles, o australiano Ryan, hospedado na casa ao lado. Quando ela cismou em fazer uma trilha num parque coberto de neve e sem guia, num vilarejo vizinho, Ryan foi o único que topou ir junto. Em meio às brincadeiras com bolinhas de neve, se beijaram... e se apaixonaram. Voltaram para El Calafate, seguiram viagem juntos para Bariloche, mas, depois disso, cada um tomaria um rumo diferente. Ela iria para Buenos Aires, onde após uma semana pegaria o avião de volta ao Brasil. Ele seguiria para Mendoza, continuando sua viagem pela América Latina. Assim foi. Os dois se despediram na rodoviária, trocaram e-mails, mas, apesar da paixão, Paloma não imaginava que o veria de novo. Dias depois, Ryan lhe escreveu. Disse que precisava encontrá-la de qualquer jeito. Ela voltaria para o Brasil no domingo. Combinaram que ele chegaria a Buenos Aires no sábado, às 23 horas, e que telefonaria para a casa em que ela estava hospedada. Mas Ryan não ligou. Triste, Paloma entendeu que ele havia desistido. Ela remarcara a passagem de volta ao Rio para quartafeira, mas Ryan não sabia disso. Como nenhum dos dois tinha celular, não conseguiram se falar. Era o fim.

O plano para domingo era fazer um romântico passeio de trem até uma cidade vizinha. Dadas as novas circunstâncias, Paloma trocou de ideia: com uma amiga brasileira que também estava em Buenos Aires, ela iria até uma feira de antiguidades. No metrô, Paloma novamente refez os planos: decidiu voltar para casa e tomar um banho. Quando ia trocar de linha, viu que o metrô que deveriam tomar já estava quase partindo. Sabendo que o próximo demoraria a passar, não teve dúvidas: arrastou a amiga – que havia pouco tempo tinha quebrado a perna –, para conseguir entrar a tempo. Passaram pela porta segundos antes de ela fechar. Dentro do vagão estava Ryan. “Eu não consegui acreditar naquilo. Quais eram as chances de a gente se encontrar? Nos abraçamos sem falar nada”, lembra Paloma. Então Ryan contou sua parte da história. O ônibus que ele pegara havia quebrado no meio do caminho, fazendo com que ele desembarcasse em Buenos Aires apenas no domingo de manhã. Ao chegar, ele ligou para o amigo que estava hospedando Paloma, mas, por causa do idioma, os dois não conseguiram se entender direito, e Ryan concluiu que ela, conforme o planejado, já estaria voltando ao Brasil. Desolado, tomou o metrô para seguir sua viagem sozinho. E aí o inesperado encontro aconteceu. Nos três dias seguintes, os últimos da viagem de Paloma, ela viveu o que chama de um “amor de inverno”. Passageiro, mas capaz de causar uma grande transformação: “Eu tinha terminado um relacionamento havia poucos meses, estava me sentindo fria, descrente do amor. Acho que toda essa conspiração do destino para eu viver essa história foi algo que aconteceu para me fazer voltar a ter fé no impossível”.


comer

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sabores que confortam

Brincadeira refrescante Prepare a mistura que lhe parecer mais saborosa. Congele no molde mais divertido e pronto! Picolés caseiros são a receita mais simples, versátil e divertida para o verão

texto C h i c o S p a g n o l o e Dilson Branco foto S h e i l a O l i v e i r a / E m p ó r i o Fo t o g r á f i c o produção culinária Á u r e a S o a r e s produção de

objetos M á r c i a A s n i s


Assistente de fotografia: Clara Oh

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“Fom, fom”, faz a buzina do sorveteiro, e não há jogo de bola, castelinho de areia ou banho de mar que não possam ser interrompidos. A criançada, que sabe o que é bom, cerca o carrinho e não sossega até sair com o picolé na mão, lambuzando o dedo e refrescando a alma. O pai, esperto, dá dinheiro para comprar um a mais, saboreia o seu sem sair de baixo do guarda-sol e lembra-se de que, na sua infância, já cumpria esse mesmo ritual de verão. Unir o sabor doce ao gelado é uma ideia tão óbvia que só podia mesmo vir de muito tempo atrás. Os primeiros a criar uma sobremesa desse tipo teriam sido os antigos chineses, segundo relatos medievais do explorador Marco Polo. Porém, há quem diga que o tresloucado imperador romano Nero, no século I, já ordenava a seus criados que buscassem neve no topo das montanhas para misturá-la a frutas. Seja qual for a verdadeira história, nenhuma dessas epopeias redundou na invenção do picolé tal como o conhecemos. Sua genial simplicidade surgiria somente em 1922, como resultado de uma experiência infantil. Para brincar com a noite fria que fazia em São Francisco, nos Estados Unidos, o garoto Frank Epperson, de 11 anos, resolveu preparar um refresco em pó e deixá-lo na varanda. Dentro do copo, esqueceu o pedaço de madeira usado para agitar a mistura. Quando acordou, puxou o palito e viu que o suco estava congelado. Surpreendeu-se – e deliciou-se – com a invenção. Se a experimentação é a origem do picolé, que tal convidar os pequenos para ir à cozinha e produzir os próprios gelados? Selecionamos algumas receitas para te inspirar. Mas a graça é aproveitar-se da simplicidade da fórmula (basicamente, suco congelado!) e fazer o que a imaginação mandar. Refresque-se e divirta-se!

de fruta ingredientes • 2 copos de sua fruta favorita, sem casca nem sementes, cortada em pedaços

(manga, abacaxi ou morango são algumas sugestões) • suco natural de limão ou laranja, a gosto • açúcar, a gosto Modo de preparo No liquidificador, triture a fruta. Adicione o suco, se necessário, para tornar a mistura

Modo de preparo Bata tudo no liquidificador. Despeje nas

formas e leve ao freezer. Após meia hora,

acrescente os palitos. Sirva no dia seguinte.

de ameixa com iogurte ingredientes • 250 g de ameixas frescas, sem caroço,

cortadas em pedaços • 1 colher (sopa) de suco de limão • 500 g de iogurte de baunilha

mais líquida. Acrescente o açúcar. Despeje

Modo de preparo

meia hora, quando os doces já estiverem

passe-as por uma peneira para retirar a

nos moldes e leve ao freezer. Após cerca de

Triture as ameixas no liquidificador. Depois,

mais sólidos, acrescente os palitos. Os picolés

casca. Misture meia colher do suco de limão.

estarão prontos no dia seguinte. Retire da

geladeira cinco minutos antes de servir, para que eles saiam mais facilmente dos moldes. dicas • Para picolés mais cremosos, troque o açúcar por xarope de açúcar: misture partes iguais

Reserve. No liquidificador, misture o iogurte

ao restante do suco. Em cada forma, coloque um pouco da fruta triturada e do iogurte,

misturando grosseiramente com uma faca. Leve ao freezer. Após meia hora, acrescente os palitos. Sirva no dia seguinte.

de açúcar e água e ferva em fogo médio-alto.

dica

para um recipiente e mergulhe-o em outra

vermelhas, como amora ou framboesa.

Cozinhe até dissolver totalmente. Transfira vasilha com cubos de gelo misturados a

água, para interromper o cozimento. Mexa

• Você também pode usar outras frutas

de chocolate

até que esfrie por completo.

ingredientes

• Faça picolés em camadas, usando frutas

(chá) de leite • 1 colher (chá) de essência de

de diferentes cores: acrescente a primeira

mistura no molde, aguarde congelar, adicione a segunda, e assim sucessivamente.

• Misture várias frutas para obter novos

sabores. Kiwi com morango e laranja com

• 1 lata de leite condensado • 1 xícara e meia baunilha • 4 colheres (sopa) de chocolate em pó • 1 colher e meia (sobremesa) de amido de milho dissolvido em meia xícara (chá) de leite • chocolate hidrogenado (para a cobertura) • chocolate granulado

acerola são algumas sugestões.

Modo de preparo

• Não é preciso comprar formas para os

baunilha e leve ao fogo baixo. Quando ferver,

picolés. Copos e embalagens de iogurte, por exemplo, podem render incríveis formatos.

de coco ingredientes • 1 lata de leite condensado • 1 lata de creme de leite • 4 xícaras (chá) de leite integral

• 100 g de coco ralado • 1 frasco pequeno de leite de coco

Misture o leite condensado, o leite e a

adicione o chocolate em pó e o amido de

milho. Mexa até engrossar. Após esfriar, bata com um batedor de arame até amolecer.

Despeje a mistura nas formas. Após meia

hora, acrescente os palitos. No dia seguinte, banhe os picolés no chocolate hidrogenado derretido e passe-os no granulado.

O rendimento depende do tipo de forma utilizado


este valor, descontados os impostos, ĂŠ 100% revertido para o

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