So não dá para deixar de ler

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Créditos: Edição, coordenação e organização: Juliana Maringoni Agradecimento: Oficinas Culturais do Estado de São Paulo, Oficina Cultural Hilda Hilst, Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo,Organização Social de Cultura Poiesis

Este livro foi produzido durante Oficina de Crônicas realizada pela Oficina Cultural Hilda Hilst – Campinas/SP em maio e junho de 2013, ministrada pela jornalista Juliana Maringoni Copyright – Todos os direitos reservados



Apresentação......................................................6 Minha mãe o Facebook e outras histórias Por Daniela Casabona.......................................4

Lady e Nino e outras histórias Por Eliana Maestrelli.......................................32

O pedreiro lá de casa e outras histórias Por Filastor Brega............................................45

A traíra e outras histórias Por Juliana Valbert..........................................65

Chuva de verão e outras histórias Por Silvia Faggiani............................................73

Parcerias............................................................84


Prezado leitor, O cotidiano está repleto de pequenos grandes detalhes que dão sentido a rotina do dia-a-dia de forma a torna-la mais leve, engraçada e até mesmo emocionante. Foram estes detalhes que os escritores Daniela Casabona, Eliana Mastrelli, Filastor Brega Jane Leal, Juliana Valbert, Silvia Faggiani conseguiram captar por meio de um apurado olhar sobre a realidade, transformando-a por vezes em histórias de ficção não menos reais e apaixonantes. Boa leitura! Juliana Maringoni, organizadora

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Minha mãe e o Facebook e outras histórias Por Daniela Casabona Profissional da área de Comércio Exterior, está afastada da carreira para se dedicar a projetos pessoais. Seus blogs são Ayahuasca Rainha da Floresta e Manifesto dos Seres da Luz.

Dedico estas divertidas crônicas ao meu amado marido Thiago Mikawa Velludo e a minha mãe Beth Casabona que, assim como eu, adora ficar no Facebook!

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Abandono de carreira

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Depois de ler um livro perturbador sobre mulheres que resolveram abandonar suas promissoras carreiras para se dedicarem à maternidade e atividades mais prazerosas resolvi encarar este desafio em busca de uma maternidade tardia. Estava exausta. Parecia que há meses eu não dormia direito. Mesmo assim, ira enfrentar mais um dia de trabalho, sem saber ao certo como ele acabaria. Foi então que meu marido me encostou-se à parede perguntando: - Afinal o que é mais importante para você nesse momento? Sua carreira ou nosso filho? Havia chegado o momento. As dúvidas se dissiparam. Chegamos juntos no escritório e anunciamos meu desligamento da empresa. Todos ficaram confusos com a notícia. Entreguei minha carteira profissional e minha carta de demissão e me despedi de uma carreira de 15 anos. A ideia de ficar sozinha em casa era apavorante para mim. Quando enfrentei a 6


mesma situação no passado parecia que estava vivendo um pesadelo. Agora tudo seria diferente porque desta vez, era a minha escolha voltar para esta condição. Demorou algum tempo para eu me sentir á vontade em meu próprio lar e aos poucos fui abrandando meus sentimentos. Cheguei a preparar uma grande planilha de metas e afazeres, como se eu ainda estivesse dentro do escritório. De repente, uma canção romântica começou a tocar em casa misteriosamente. Tomei um susto e procurei a origem do som pela casa. Para minha surpresa meu marido, estava acessando o seu computador pessoal do serviço dele e colocou esta música eu me lembrar que não estava sozinha. Aos poucos fui relaxando. Pela primeira vez na minha vida eu estava me dando de presente um tempo para me encontrar, para ser eu mesma. E a tão temida solidão foi se transformando em liberdade. 7


Sim agora eu me tornaria senhora absoluta do meu tempo. Que privilégio! Assim foi o início de uma grande aventura pessoal rumo nas descobertas de valores já esquecidos pela mulher moderna. Passei a me dedicar a mil coisas diferentes depois que me desliguei da carreira e, apesar de não ter engravidado ainda, estou colhendo os doces frutos da liberdade.

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A polĂŞmica do aborto

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Outro dia li mais uma reportagem polêmica sobre a legalização do aborto e, sem maiores pretensões, eu comentei o tema com uma amiga de longa data. Ana Rita era uma mulher que tinha conquistado a minha admiração ao longo dos anos. Dona de uma carreira exemplar, se formou em uma excelente universidade, fez pós-graduação e MBA no exterior. Usava roupas caras, desfilava com seu corpão, sempre bem acompanhada com homens interessantes, quase nunca perdia tempo com futilidades e sua vida parecia com as daquelas mulheres bem sucedidas dos filmes. Como minhas impressões sobre o tema não foram preconceituosas, muito pelo contrário, eu mesma tentava me colocar na pela destas mulheres que devem ter sofrido horrores ao tomar tamanha decisão num momento de desesperador e solitário de suas vidas. Ana Rita então se sentiu a vontade para se abrir: - Quando bem jovem aconteceu uma gravidez inesperada em minha vida. Tinha 10


iniciado minha carreira e acabado de ganhar uma bolsa de estudos na faculdade dos meus sonhos. Por ser filha de pais humildes, eu ajudava no sustento da família e mal sobrava dinheiro para me alimentar. Com medo de perder a oportunidade única de estudos que a vida havia me oferecido e de levar a miséria à família com mais uma boca para alimentar. Chorando continuou: - Optei pelo aborto, sem que ninguém jamais soubesse de minha história. Meus olhos também se encheram de lágrimas e ela continuou: - Algo em mim também morreu naquele dia e, para sobreviver, resolvi me perdoar entendendo a minha questão. Resolvi acreditar que o nascimento daquela criança significaria o aborto de minha vida, pois jamais teria condições de recriar as mesmas oportunidades.

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Lembrei daquelas fotos de feministas carregando as faixas nos protestos com os dizerem: Meu corpo, minha escolha. Das histórias monstruosas dos bebês chineses jogadas pela rua, por terem nascido meninas. Em contrapartida pensei na nossa sociedade abortando a vida a todo o momento. Tudo o que não se enquadra é abortado, sem culpa. Meu coração se comoveu com a história desta mulher que carregava por tantos anos tamanha dor em sua alma. Pensar que há poucas décadas, mães meninas nos geraram e para elas bastava ser simplesmente mulher. Dei um abraço, um abraço de perdão e misericórdia, palavras nesta hora, seriam apenas julgamentos. É muito complicado se posicionar diante desta questão do direito ao aborto, ainda mais com os novos projetos do governo e a onda de protesto que vem assolando o país.

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A executiva e a dona de casa

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Alguns meses atrás eu fui almoçar com uma amiga que estava ansiosa para saber como afinal era a minha nova vida de dona de casa. Ela me conheceu no escritório, me via correr com muita pompa para todos os lados, submersa em assuntos importantes. Admirava minha postura, minha aparência e a posição que eu ocupava na empresa. Tudo para ela parecia um sonho até que um belo dia eu a peguei de surpresa. Estava abandonando a carreira para me tornar uma singela dona de casa. Passado o susto, lá fomos almoçar. Ela apareceu apressada, muito bem arrumada, cansada de viajar a trabalho e das exigências do seu chefe. Eu chego devagar, vestindo uma saia indiana antiga, chinelos e brinco de penas. - Como você está amiga? Estou preocupada com sua situação? Sei que não é fácil estar desempregada e já sofri muito isto na pele. Como está o mercado? Tem mandando muitos currículos? 14


- Que nada, não estou nem um pouco interessada em voltar para o mercado agora. Quero continuar com meus projetos pessoais. Passo intermináveis horas escrevendo em frente ao computador. Conheci muitos amigos nas manhãs de meditação no bosque e na oficina de literatura. Tenho me aventurado na cozinha. Apronto mil atrapalhadas na academia. Meu marido está super feliz. - Eu já não para um minuto. Quase morri por uma complicação de saúde. Por sorte não estava viajando naquela semana. Senão seria internada às pressas em um hospital qualquer de uma cidade estranha. Ficamos horas conversando sobre os infinitos papeis da mulher na sociedade e sobre a falta de tempo de simplesmente ser. Ela desabafou mais uma vez: - Não tenho mais tempo para meu marido. Mal chego à minha casa e já era hora de viajar novamente. Estou cansada de passar noites 15


solitárias em quartos de hotéis. Tenho questionado minha carreira ultimamente. Hoje Denise acompanha de perto a evolução de minha vida e parece vibrar com cada novidade. Aprecia o jeito leve com que eu conduzo as coisas, submersa em assuntos filosóficos, meditando com roupas despojadas. Passado algumas semanas fomos almoçar novamente e sua aparência também havia mudado. Estava mais leve, mais realizada. - Dani, estou muito feliz. Tive uma boa conversa com meu chefe e chegamos a um acordo. Vou ficar menos tempo viajando! Meu casamento melhorou porque agora posso curtir meu marido. Ao nos despedirmos, sussurrou um segredo em meu ouvido:

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- No ano que vem ela largarei o escritório para ficar em casa e tentar uma maternidade tranquila. Por muitos anos as mulheres de minha geração mergulharam em suas carreiras, agora era hora é voltar ao lar e lutar por suas vidas pessoais.

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Distantes da civilização

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Estávamos a caminho da ilha quando a conexão com a internet caiu. Desde momento em diante iríamos viver quatro dias distantes da civilização. A paisagem se transformou por completo. Ainda no caminho conhecemos o Sr. Romeo que nos contou um pouco da história daquelas pessoas que viveram em comunhão com a natureza: - Aqui na ilha do Cardoso é proibido novas construções, nela apenas algumas famílias possuem permissão para morar então tudo o que encontramos são casas transformadas nas poucas pousadas no local. Não existe carro também, todo o caminho é coberto por um charmoso gramado que nos leva a todos os lugares. Os pontos de parada são as lindas paisagens, nada de semáforo. - Então a parda obrigatória é para se viver Romeu? - Isto mesmo, aqui tudo é como nos velhos tempos. Não há eletricidade, dependemos de 19


geradores. Não existe geladeira, são raras as tomadas, os chuveiros são elétricos e quando chega meia noite, tudo se apaga por completo. Vocês devem utilizar o acessório obrigatório para transitar pela noite. As lanternas são comuns aqui. - Aqui não temos escolas, as crianças viajam de barco para estudar. Muitos se vão quando crescem atrás do mercado do trabalho, mas quem ama a ilha, fica aqui mesmo, trabalhando com o turismo, como guia ou como ambientalista. Assim aconteceu comigo. Ele foi o nosso companheiro de viagem e pudemos perceber muitas outras coisas. A praia não tinha barracas, nem ambulantes, nem sinal de vida. Eram mais de 20 quilômetros de mar aberto e de um visual de tirar o fôlego. Caminhando por ela fomos surpreendidos pela poluição! Foi revoltante ver o lixo vindo de outros países compondo aquela paisagem. Tinha garrafas pet da Alemanha, da China, remédios da Japão. Uma loucura. Os moradores são responsáveis 20


pela limpeza da ilha e muitos peixes e aves morrem ao comer este lixo. Fora isso, ficamos encantados. Sabe quando você vai para um lugar distante para refletir sobre a sua vida? Que nada! Viagem boa é aquela em que você se esquece até de como era sua vida antes dela. Mergulhamos naquele universo exuberante e como se tivéssemos nascido ali, não nos importava mais estar distantes de todas as facilidades do mundo moderno. O que a gente queria mesmo era permanecer ali pra sempre. Nossa rotina foi acordar cedo, tomar um belo café da manhã. Ir para a praia, conhecer as cachoeiras, andar de barco para todos os lados, conhecer novos povoados e lugares. Ver os golfinhos, os botos. Quando chegava à tardinha todo mundo pegava as cangas e ia para um grande gramado. Aí eram crianças correndo, embarcações chegando, música rolando, o som dos tambores, pessoas dançando. Um momento mágico.

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Durante a noite a gente se arrumava e ia para os bares da ilha, escutar um som legal, ver gente bonita, descolada, dançar um forrozinho e admirar a lua. Se me desse vontade, todo mundo ia para a praia, para ver o sol amanhecer. Pensei que eu iria ficar doida sem internet, carro e telefone, mas no fundo eu adorei, não fez nenhuma falta. Precisamos de muito pouco para ser feliz e a mãe natureza já nos ofereceu um tudo o que precisamos. Pobre de nós, cercados pela civilização.

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Minha m達e e o Facebook

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Quando eu e meu marido demos um computador de presente à minha mãe tentamos ensinar o básico para ela abrindo várias contas. Com o passar dos dias ela esqueceu-se de tudo, mas do Facebook se lembra todos os dias. Antes eu acordava com sua ligação logo cedo, agora ela tem outra tática. Espera eu estar on line para falar comigo. Mal eu ligo meu computar e já tem um recadinho dela: “Acorda Dani”. Fico espantada com a rapidez que aprendeu as coisas e muitas vezes me surpreendo com a sua inocência. Então dou uns toques: “Mãe, não fica compartilhando a foto pessoal dos álbuns dos outros” E ela me responde “Ah, mas a festa dela tava tão bonita que eu queria mostrar para outra amiga”. Um dia um amigo mal compartilhou um texto meu e ela correndo postou: “Te amo” na página dele. Não sabia nem que eles haviam se tornado amigos em comum, como ela não saberia apagar este comentário, 24


acessei sua conta para antes que fosse tarde sem que ninguém percebesse... Tenho alguns amigos espalhados pelo mundo que acharam graça de ver minha mãe no face, então começaram adicioná-la. Lá vai ela compartilhando um monte de coisas em inglês que nem sabe o que é, e ainda vai mais longe, compartilha as coisas em árabe que nem eu sei do que se trata. E lá vou eu ensiná-la: “Mãe, você não pode ir compartilhando as coisas sem saber do que se trata”. Responde-me prontamente: “Mas eu achei a imagem tão bonita...” Logo aparece desesperada: “Fulano mandou um recado em inglês. Como devo responder?” Se deixar eu fico como sua tradutora oficial. Com o passar do tempo perdeu a paciência com aqueles que ficam a chamando sempre para teclar e reclamou: “Nem posso entrar no Facebook e este cara já esta me chamando pra conversar”. Lá vou eu ensinar o truque de ficar on line apenas para as pessoas certas. 25


Agora não posso mais entrar na página dela para salvá-la porque insistiu em mudar sua senha para eu não ter acesso em sua conta. Descobri que anda com umas conversas muito pessoais com um pretendente do baile. Então quando dá algum problema, tenho que me deslocar até a casa dela para ajudá-la. Aí de mim se eu não for. Assim vai seguindo a minha mãe no Facebook, me acordando com dezenas de notificações de tudo o que ela gostou da minha página, compartilhando todas as minhas fotos com o comentário: “Te amo filha”. Reclamando que perdeu a novela para ir ao baile, narrando o jogo de futebol, brigando comigo porque eu não curti alguma postagem dela e porque eu deixei com que todos soubessem o ano que ela nasceu. Passando poemas escritos em folha de caderno para eu digitar porque ela não sabe como fazer. De umas semanas pra cá ela andou sumida. Eu fiquei preocupada. Será que estava triste? No almoço de domingo, perguntei: “Mãe, 26


porque você não está entrando no face?” Ela desabafou comigo: “Dani, todo mundo está me perguntando isso. Nem o Shofique (amigo árabe) que curtia todas as minhas coisas não está curtindo mais nada. Gente eu estou curtindo! Estou compartilhando! Não me abandonem. Estou aqui.” Vi que os amigos não abandonaram minha mamãe, ela apenas tinha alterado sua privacidade por engano. Este seu desabafo me fez enxergar como aquele Facebook estava sendo importante em sua vida. Como ela encontrara uma fonte de distração e carinho. Era emocionante ver minha mãe, vencendo as barreiras da falta de estudo e de vivência no universo on-line para poder se comunicar com o outro e passar sua mensagem ao mundo.

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A academia

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É a segunda vez que eu estou treinando na academia próxima a minha casa. Por sorte minha é a melhor academia do mundo. Longe das pretensões de ter um corpo esculpido, ou uma juventude eternizada este lugar acabou tendo um papel super importante na atual fase da minha vida. O ambiente é de simplicidade, com uma sala modesta de musculação de paredes azuis, conversas paralelas, idosos sendo paparicados, adolescentes paquerando, instrutores motivando o pessoal e sussurros de súplicas. Eu mesma vivo reclamando do peso dos equipamentos, roubando na contagem das séries, brincando com todos e perdendo um tempão conversando com os amigos. Aí aparecem nossos queridos instrutores com a frase que mais ouço todos os dias: “Vamos Dani!” Gosto muito das aulas de spinning, do som forte de balada, da sala escura com efeitos de laser rodopiando em volta da gente, a 29


vontade de superação, o suor, a sensação de estar indo além, se superando. É neste lugar que me sinto mais capaz. E a sala de ginástica então. Com paredes vermelhas e metálicas. É a hora do desespero. Quando você pensa que finalmente conseguiu entender a coreografia maluca, que esta fazendo o movimento certo vem uma multidão de mulheres estranhas na direção oposta. Tentei até dançar axé às 6 da manhã, não deu certo. Nas aulas de Zumba então, parece que estou perdida no deserto do Saara há dias. Mas de todas estas aventuras, o mais importante é sentimento de amizade que nasceu. É ficar batendo um papo gostoso com os amigos e até esquecer o que fui fazer lá. É ver o gordinho emagrecer. O recém operado se superar. Ver os meus amigos se inscrevendo também porque eles sabem que você vai estar lá e acompanhar mil histórias de pessoas tão frágeis como a gente que estão tentando se cuidar com pouco mais. 30


Chego em casa toda dolorida, às vezes relaxo na alimentação, me sinto uma pateta. Parece que vai ser muito difícil chegar lá, mas não consigo ficar longe deste lugar tão gostoso que me trouxe tanta alegria. E a fome vai batendo, com o cheiro da comida do vizinho. Começo a pensar em todas as porcarias que comi durante o dia e juro que vou mudar, que dali pra frente somente frutas frescas e saladas ficarão no cardápio. Olho para o lado e vejo o pessoal com o corpo sarado tomando shakes misteriosos. O tempo passa e tudo o que eu quero é um gole da abençoada água. Sem perceber já estou tramando em meu íntimo a tomar uma cerveja assim que chegar em casa.

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Lady e Nino e outras histórias Por Eliana Maestrelli Nasceu e mora em Campinas/SP. É formada em Letras pela Unicamp, atuou no ensino e brevemente no turismo.

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Sรณ nรฃo dรก para deixar de respirar

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Sempre gostei muito de café, acho até que sou meio viciada. Principalmente de manhã e depois do almoço, para espantar a sonolência que sinto nessas horas e me ajudar a despertar. Só que fazendo a experiência de não tomar café por um dia, para ver como me sentiria percebi que não foi assim tão difícil como eu imaginava. Achei que não iria conseguir. Por força do hábito, até cheguei a pegar os apetrechos para preparar meu café de manhã, ou a seguir para o Café mais próximo depois do almoço, mas consegui me conter e resistir. Apesar de sentir falta foi interessante e surpreendente perceber que poderia ficar sem ele. Fiquei tão satisfeita com o resultado que estou até me perguntando se não posso abdicar desse hábito definitivamente, ou o que mais posso explorar e identificar se é mesmo necessário, ou fundamental. Mesmo sem ter tirado mais nada do meu dia a dia, me pareceu que boa parte dos meus hábitos não são tão essenciais como eu imagino, mas meras comodidades, confortos que eu gosto de poder desfrutar. Embora a internet, o 34


celular, os programas de TV, etc., façam parte do meu cotidiano, consegui identificar que pude abrir mão deles quando algum fator externo exigiu. Acredito que eu não consigo me imaginar ficar sem é o contato humano, ter boas companhias para conversar, confidenciar, compartilhar e até tomar um café. Acho que na verdade, o que não consigo ficar sem mesmo é respirar.

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Cr么nica? O que 茅 isso?

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Afinal de contas do que é feita uma crônica? Ou, como é feita? Gosto muito do gênero, tenho as minhas preferidas, autores favoritos, mas tenho que confessar que não sei bem que gênero é esse e nem como se escreve. Digo isso porque às vezes escrevo um texto e tenho certeza de que se trata de uma crônica, só que quando peço para alguém ler, recebo comentários como: - Está bom o seu artigo. - Artigo?! Já ouvi também: - Gostei do seu ensaio. - Ensaio, é? - Sim. Teve até uma vez em que chamaram minha “crônica” de poesia. Embora eu tenha até ficado contente, porque adoro poesia, não tenho uma veia de poeta. Além disso, para 37


mim poesia é o gênero mais difícil de escrever, tem ritmo, sonoridade. Bem isso era o que eu pensava antes, porque fui surpreendida mesmo é pela crônica. Tento recobrar o que aprendi sobre ela: que o tema é o ponto central, que é leve e breve, não se aprofunda sobre o tema, a linguagem é mais coloquial, o título e a primeira frase já devem dar ao leitor uma indicação do que ela trata e que de preferência a primeira e a última frase devem estar de preferência ligadas. Presto atenção ao que aprendi e me esforço. Busco um tema. Acho que fiz tudo certo e - nada. Parece que crônica mesmo é minha inaptidão para escrever crônicas. Por isso estou aqui perguntando a você, caro leitor: - Será que essa é uma crônica?

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Lady e Nino

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Lady era muito pacata. Até demais. Raramente bravejava com alguma coisa. Sua maior alegria era sair para caminhar. Não reclamava se não fosse, mas quando saía deixava isso claro demonstrando sua felicidade. Talvez por isso, ele tenha percebido que não corria perigo e não se intimidou, mesmo ela sendo muito maior que ele. Era até engraçado ver que ela parecia não ter muita noção do seu tamanho. Passava às vezes em lugares tão estreitos, quase derrubava alguma coisa, como se não percebesse que tinha um porte, digamos, avantajado. Lady era uma Collie preta e branca, de pelos longos e uma mancha branca no pescoço. Pertencia a uma tia. Era tão dócil que minha tia e minhas primas não punham coleira nela quando a levavam para passear. E mesmo só visitando, uma ou duas vezes por ano, independente da hora que eu chegasse a primeira coisa que fazia era me pedir para sair com ela. O convite era feito num alongamento, esticando as patas dianteiras. Se fosse muito tarde, eu dizia que naquele 40


momento não seria possível, mas que no dia seguinte nós sairíamos. Ao que ela compreensiva, acatava, para me lembrar da promessa no dia seguinte. Ele, um gato preto de uma vizinha, que chegou um dia e sem cerimônias comeu a comida da Lady. Parece que gostou tanto da acolhida, que tomou conta do território e acabou ficando. Não voltou mais para a casa da dona original. Minha tia e minhas primas o chamaram de Nino. Nunca gostei muito de gatos, sempre preferi os cachorros porque achava esses mais afetivos. Como o Nino parecia reforçar minha opinião, ele não ajudou a elevar o meu conceito sobre os gatos. Os dois tinham um ponto em comum: gostavam de andar. Embora ele, quase sempre, preferisse não ter companhia. Saía principalmente à noite sem dar maiores satisfações e voltava quando bem entendesse, mas sempre voltava. Afinal era muito bem tratado, tinha comida farta e ninguém se metia em sua vida. Coisa que eu acho que ele 41


prezava. Só aparecia mesmo para comer e dormir. Já saciado, caia em um sono profundo, de dar inveja a qualquer mortal. Seu lugar favorito para fazer a sesta depois de encher a pança era em cima de um tanquinho, que ficava ao lado da porta da cozinha. Gostava de se aconchegar lá. Como era comum nos reunirmos na cozinha para bater papo, me lembro dele nessas ocasiões, só levantando a cabeça, meio dormindo, olhando para a gente como que dizendo: - Será que não dá para conversar em outro lugar? Não estão vendo que eu estou tentando dormir aqui? Se o Nino reforçava minha opinião sobre gatos, Lady confirmava minha predileção por cachorros. Achava que ela fazia jus ao nome por sua natureza afetiva e acolhedora. Era carinhosa de uma maneira silenciosa e delicada. Fazia as honras da casa quando eu levantava, me acompanhava até a cozinha. Seguia na frente, e quando chegava na porta olhava para trás e para a porta como que indicando para eu entrar para tomar o café da manhã. Uma das vezes que visitei meus tios 42


fiquei doente, de cama. Ela não hesitou em me fazer companhia. Praticamente montou guarda na porta do quarto em que eu ficava até que eu melhorasse. É verdade que com o tempo, o Nino até se empenhou em ser mais companheiro. Quando minha tia e primas levavam a Lady para passear, ele acompanhava de longe. Passava entre uma cerca, um jardim, seguindo, sem querer ser notado, mas mesmo com essa tentativa de aproximação jamais foi visto no colo de ninguém, ou permitindo que lhe fizessem um carinho. Já a Lady, gostava de companhia e eu com certeza gostava da dela. Acho que ela percebia isso. Tanto, que também me permitia que a levasse para passear sem coleira. Ela parecia entender o que a gente falava. Quando estava muito adiante, eu só dizia: - Lady, me espere.

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Ela parava e olhava de lado, sem virar totalmente a cabeça para trás, para ver se eu estava me aproximando, se eu já estivesse perto, continuava. As pessoas que a viam achavam isso incrível e costumavam dizer: - Sua cachorra foi muito bem treinada. Mal sabiam que não tinha sido treinada e muito menos era minha. Na verdade, me via uma ou duas vezes por ano. Mesmo assim me acolheu tão incondicionalmente, que me permitia de passear com ela como se fossemos velhas conhecidas. Da mesma forma que acolheu o Nino, partilhou com ele sua comida e deixou que ficasse o quanto quisesse. Ela morreu antes dele. O Nino ainda viveu um bom tempo depois. Não sei dizer se ele sentiu falta dela. Quanto a mim, ainda me lembro dela com saudade e retribuo o carinho que ela me dedicou prestando a ela essa singela homenagem.

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O pedreiro lá de casa e outras histórias Por Filastor Brega Nasceu em1960 em Bernardino de Campos – SP. Faz teatro desde 1975 e profissionalizouse como ator em 1980 no Teatro Escola Macunaíma-SP e participou em mais de 35 espetáculos teatrais. Há três anos dedica-se ao cinema, onde atua, escreve, dirige e ministra aulas de atuação e roteiro. Formado em Administração de Empresas, é pós-graduado em Cinema – Linguagem Áudio Visual pela Universidade Gama Filho.

Sempre para minha família: Vania, Marianna e Igor.

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O pedreiro lรก de casa

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O serviço que prometeu aprontar em um mês e meio, já estava fazendo aniversário do dobro do tempo e aparentemente não havia chegado nem na metade. Disse que a culpa era dos ajudantes que iam embora... Porque eram vagabundos... Já havia passado uns cinco e eram todos “irmãos” lá da igreja que ele frequentava. Seu nome eu já nem lembrava mais, por que só me falou no primeiro dia e no dialeto lá da região em que nasceu. Mas o apelido era “Loro”. A princípio pensei que era porque ele falava demais, mas conforme o tempo passava descobri que era uma variação de loiro, cabelos claros. Hoje ele é do bem, mas já havia sido um “cabra ruim”... Mulherengo, bebum e briguento. Quem o salvou foi Cristo... E agora ele ia todos os dias na igreja com a família e prestava serviços de graça para os irmãos e pastores. Aliás, veio me comunicar ia parar o serviço em casa por três dias, pois 47


teria que trocar o piso da igreja. Bati o pé e falei que não, pois o seu compromisso era terminar o serviço em minha casa primeiro. Era alto, forte, meio gordo. Mas tinha uma disposição fora do comum. Era enrolão, mas um bom trabalhador. Quando não estava conversando, cantava os hinos da igreja em alto e bom tom. Em uma semana que ficou sozinho o serviço parou de render e eu me ofereci para ser seu ajudante. Três dias de trabalho mexendo massa e enchendo laje... Fiquei doente com o corpo todo dolorido. Enfim arrumou um novo ajudante “irmão” e até hoje ainda não me pagou aqueles três dias em que trabalhei para ele. O pagamento era feito todo final de semana (Fui informado anteriormente que nunca deveria pagar adiantado, pois normalmente, quando se faz isso, eles acabam sumindo ou pegando outro serviço). Mesmo assim um dia, veio me falar que havia cobrado pouco pelo serviço e eu o chamei 48


para conversar no escritório. Estava arrumando a bagunça da casa e por acaso tinha um facão no chão. Meio que assustado perguntou se era pra ele. Falei calmamente que não, mas bem que merecia. Falei ainda que se eu tentasse pegar o facão, que eu é que levaria uma surra, pois era muito mais forte. Peguei a planta e expliquei junto com o contrato que estávamos fazendo tudo o que foi combinado. Sem tirar e sem por nada. Ele falou que não poderia continuar com o serviço, pois estava tendo prejuízo. Já meio irritado eu disse que quem estava tendo prejuízo era eu. Ele falava cada vez mais rápido e a única palavra que eu conseguia entender. Era Deus no final de cada frase que ele falava. Perdi a paciência e pedi que pegasse suas coisas e fosse embora com o ajudante. Cordialmente começou a juntar o seu material. Fui acompanhando e olhando para o que tinha sido feito e o trabalho que ia dar contratar outro pedreiro e que esse outro poderia ser ainda pior. Caminhei de um lado... caminhei de outro... e fiz uma nova 49


proposta baixando cinquenta por cento do valor que queria... E que teria que terminar em quinze dias. Fiz o novo contrato e ele terminou todo o serviço em 30 dias e eu paguei mais vinte por cento do valor. Quando terminou, mais ou menos, fizemos um churrasco com picanha, linguiça e frango. Cerveja que nenhum dos dois tomou e três litros de refrigerante que só os dois tomaram. Algumas coisinhas ainda por fazer... Mas já havia decidido que não mais o queria por ali... Agradeci educadamente e levantei as mãos para os céus e cantei um pedacinho do hino da igreja que havia aprendido com ele. Não vou esquecer nunca do “Loro”... Principalmente por ainda morar em parte da casa que ele construiu. A cada dia aparece uma trinca nova, a caixa de gordura é uma desgraça, e o desnível da cozinha ficou bem centralizado. Quando chove muito, a água da área de luz entra no quarto encharcando o assoalho de madeira. E tive que trocar pelo menos umas cem telhas que ele quebrou e que me fizeram 50


subir ao telhado em dia de chuva para fazer cessar a água que jorrava pela iluminação do teto. Gente boa! Segundo ouvi dizer tem outros muito piores.

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Juiz ladr達o

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Ia aos estádios desde os seis anos de idade, acompanhado pelo seu fanático pai, para acompanhar o seu time de coração. O Esporte Clube Corinthians Paulista. Aos doze começou a ir sozinho com os amigos. Seu nome Evilásio da Silva, apelidado de Corin de seis meses de vida. Conseguia ser mais fanático que seu pai. Às vezes nem sua própria família aguentava os seus exageros. No último jogo do Timão na “Libertadores da América” ficou arrasado, não pelo empate e eliminação, mas sim pela maneira que eu time foi surrupiado pela arbitragem. Corin nunca foi violento, e nem era chegado a palavrões. Mas esse comandante da arbitragem havia passado de todos os limites do que era aceitável. Jogo empatado em um a um e o trio responsável pelos acertos e irregularidades dentro do campo deixaram de anotar dois pênaltis e anularam dois gols legítimos, alegando impedimento. Era para ter sido cinco a um e o seu Corinthians teria se classificado. Nunca havia presenciado uma 53


lambança tão grande e descarada como essa no futebol. Enquanto a torcida em pé aplaudia e cantava o hino durante exatos sete minutos, Corin xingava e arquitetava um plano contra o meliante. Foi o último torcedor a deixar o estádio e estava decidido a por em prática a sua vingança. Na mesma noite descobriu o hotel em que o algoz estava hospedado, infiltrou-se no meio da criadagem, conseguiu um uniforme de garçom e ficou aguardando o pedido do café da manhã do quarto 234. O pedido chegou e ele ficou feliz como se fosse um pênalti a favor. Preparou a bandeja com o café da manhã, colocou no carrinho e foi em direção ao quarto. Bateu na porta e perguntou: - Usted es el juez Amarilla? No que o outro respondeu: - Sí, lo soy. 54


Empurrou o carrinho para dentro, fechou a porta, tirou o uniforme de garçom e estava com a camiseta do seu time por baixo e bateu forte em seu próprio peito. O apavorado todo poderoso afastou-se para o canto do quarto assustado, sentando no chão. Corin gritou: - Yo no sirvo juez ladrón! Virou o carrinho de café no meio do quarto e saiu batendo a porta. O juiz levantou-se saindo da poça de urina em que estava sentado, ligou e pediu a antecipação para o primeiro voo para o Paraguai que a princípio estava marcado para as catorze horas, sem tomar o café da manhã. Corin estava satisfeito, como se o seu time tivesse sido classificado para a próxima fase.

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A carta e outras histórias Por Jane Leal Jane Leal é atriz, cantora e produtora. Atuou em muitas peças teatrais e dentre elas, alguns clássicos infantis. Apresentou e desenvolveu projetos paradidáticos de teatro e narração de estórias a escolas de primeiro grau, baseados em clássicos da literatura infantil, principalmente obras de Monteiro Lobato. Ganhou prêmio de melhor atriz em 1995 por destaque com o público na peça teatral O RINOCERONTE CARECA escrita por Marco Guillardi. O prêmio foi concedido pelo SATED- Sindicato dos Artistas de São Paulo, em Campinas. Foi apresentadora de programas de TV, participou de vários comerciais e no cinema protagonizou o média metragem “A VIAGEM DE ARIANE” escrito e dirigido por Gaetano 56


Gherardi e apresentado na mostra paralela de Cinema de Gramado em 2002. Este temperamento eclético foi incentivado desde a infância por sua família. Ainda muito criança, ouvia as estórias escritas por sua mãe, lia muito, escrevia, desenhava e cantava. Sempre teve um carinho especial pela literatura infantil; em sua recente viagem para a Alemanha, escreve O PEQUENO GRANDE MUNDO e resolve enfrentar um novo desafio, o de ilustrar a sua própria estória.

À Margarida Lourenço (Margaridinha), minha mãe maravilhosa, amorosa e talentosa, que me estimulou a escrever com o seu exemplo. À minha avó, pelo carinho. Ao Dimaz Restivo, pelo seu apoio sempre!

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A carta

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Prezado amigo, Como vai? Eu estou bem. Desculpe-me se demoro a mandar noticias. Tudo é belo e grandioso por aqui, o que num primeiro momento foi a realização de um sonho! Não sei por que sou tão sensível a ponto de deixar-me impressionar pelas situações e circunstâncias! Talvez eu seja mesmo muito influenciável. Será?! Quando cheguei, estava muito feliz! Pela primeira vez morando num país estrangeiro recheado de histórias, imersa numa cultura diferente, rodeada por museus, bibliotecas, castelos, teatros, monumentos e histórias...infelizmente, muitas delas bem tristes. Há dez meses moro na “Brunen Strasse” uma rua tão grande que parece uma avenida; e é um ponto turístico muito prestigiado, considerado um lugar muito estiloso, “da moda”, como dizem por aí. Têm muitas galerias de arte dos dois lados da rua; e estou bem próxima de um dos símbolos mais importantes da história da humanidade, daquele que dividiu pessoas, pensamentos e sentimentos. Marco das famílias destruídas, desmembradas, dos 59


amores desfeitos e dos sonhos despedaçados: um muro, simplesmente!...Aiai, que pitoresco! As construções também podem ser culpadas por serem instrumentos de dor! O crime pode ser culposo ou doloso. A culpa cabe ao instrumento, o carma, o motivo pelo qual foi construído. Mas o dolo não. Este cabe somente aos idealizadores e construtores, gananciosos, poderosos e opressores! Credo!!! Vejo marcas de balas nas paredes das construções e caminho por praças tão exuberantes, que também são cemitérios! Em muitos pontos do chão e por onde quer que eu vá, vejo placas com nomes de falecidos. Parece que no prédio onde moro, também já morreram pessoas. E olhe que eu nem fui visitar os campos de concentração! Sinto um mal estar, só de imaginar! Mas...apesar desta atmosfera nada acolhedora, estou feliz. Estudando, lendo, escrevendo e desenhando bastante! Na cidade tem uma biblioteca de música ma-ra-vi-lho-sa! Posso conseguir o que eu quiser de partituras! Recentemente, no metrô vi um anúncio: OS VAMPIROS MORAM EM BERLIM. Levei um susto! Mas apesar da dificuldade do idioma entendi, 60


tratava-se de um banco de sangue e o tal anúncio, queria incentivar as pessoas a serem doadoras. Como as culturas são diferentes! Que humor estranho!... É... será que preciso dizer que sinto falta do Brasil? Tem feito tanto frio por aqui! As pessoas são tão mal humoradas! As noites são tão longas e os dias tão curtos!...O inverno é tão cruel, mas tão bom para auto reflexões!... Saudades, viu? Quando der, escrevo de novo, quando sentir vontade. Tenho andado meio desanimada ultimamente, uma vontade doida de chorar! Mande-me noticias! Beijos à todos! De sua amiga e quase irmã de coração, eu.

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Viagem

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Numa tarde ensolarada em meio a um trânsito pra lá de confuso, parei na padaria, que por sinal é bem próxima de casa, para comprar algumas coisinhas para o lanchinho. Eu estava muito cansada, meu dia como sempre, é muito corrido. Vivo disputando o meu tempo com o relógio. Estacionei e desci do carro observando o murundum de gente entre as buzinas e os estalos dos semáforos proibindo ou liberando a passagem dos pedestres. Do outro lado da rua, acima de uma banca de jornal, estava um quadro “de azulejo português!”, me disseram certa vez. E era mesmo. Curiosíssimo! Devia estar lá há anos! Como eu nunca havia percebido? Tá certo que o local era inusitado, a lateral de uma casa velha. E numa altura acima do campo de visão habitual. Mas a imagem era tão convidativa que senti-me transportar para o mundo das idéias. Senti o calor do sol de verão em minha pele, o cheiro da água 63


salgada e o frescor do vento suave. Eu estava tranqüila e feliz! – Que estress, que nada!- um mergulho na água morna do mar, num azul de céu profundo. A água do mar acariciando-me a pele.Ouvi as gaivotas, pisei na areia quente e ao longe vi e ouvi os pescadores que chegavam com suas embarcações trazendo peixes frescos. Doces memórias.-Que sensação boa!- respirei fundo... e...já estava de volta na padaria. O cheiro do pãozinho quente me trouxe a realidade. Sorri internamente e pensei: “talvez esta seja a missão deste quadro: transformar os estressados transeuntes em astronautas teletransportados além do tempo e do espaço!” Esta visão foi para mim, como um resgate de meu verdadeiro ser.

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A traíra e outras histórias Por Juliana Valbert

“Escrever é uma arte que vive sendo revisada”

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A traĂ­ra

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Alice já tinha um futuro: ser advogada. Na escola, vivia fazendo julgamentos com os amigos afim de defender alguém. Ninguém ousava se meter com ela, ninguém. Certo dia Alice chegou com uma nota de 50 reais nas mãos e um sorriso triunfante no rosto, rindo. - O que foi, querida? – Perguntou a mãe, curiosa. - Mãe, ganhei esse dinheiro num julgamento na escola! - Ah, que bom! E o qual foi? Falou o pai, orgulhoso da filha. - Bom, era pra saber se o namorado da Ana tinha traído ela ou não. Eu defendi ela e ganhei! - E como você soube que ele traiu mesmo? - Porquê eu fiz ele trair ela comigo! Hahahahaha! O cara bem vestido 67


Era meio dia e eu estava indo para meu almoço, correndo contra o tempo nas ruas do Rio de Janeiro, num calor insuportável. No tédio, avistei um cara chique na minha frente, usando terno, chapéu e sapatos caros, meio anos vinte. Ele sorria todo orgulhoso, andando em passos leves e esperando por algo. Como sou curioso, resolvi segui-lo para saber quais eram seus planos neste dia chato. Provavelmente ele estaria indo á uma reunião ou ao almoço com seus colegas de trabalho. Lá ele sentaria e pediria caviar e vinho branco, conversando sobre as estáticas da empresa em que trabalha. Mas como nada é perfeito, ele tem um chefe e neste oportuno momento ele usa para falar mal o chefe de mal comido, afinal, o cara de terno tinha uma esposa que o amava incondicionalmente. Depois do café de sobremesa eles iriam juntos para o trabalho pensando em como solucionar problemas das próprias vidas enquanto o cara de terno apenas assobiaria e olharia para a natureza pensando em como estava feliz...

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Epa, perai, onde ele está indo? O cara de terno está indo para a Igreja. Entro, uns metros atrás dele e sento-me num banco do fundo. Ele está inquieto, mesmo ajoelhado no banquinho e reza baixinho, quase chorando. Depois, levanta-se e vai até o padre. O padre o olha espantado e chama-o quase empurrando para cabine onde confessamos nossos pecados. Pecados? Que tipo de pecado este homem pode cometer? Falar mal do chefe? Comer um chocolate escondido??? Ele fica por mais de 20 minutos lá e eu, já cansado e sem tempo, resolvo desistir da minha investigação. Ah, vida, que enganação!

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N贸me 茅 com acento?

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Era dia de entrevista de emprego. Todos já tinham ido para a outra sala, exceto aqueles que esperavam a secretária buscar outra folha para reescrever seus nomes. - Ninguém me escuta, eu digo que me chamo Elaine mas escutam Eliane ou Eliana... Tem gente que escreve Elaini! - Já estou cansada de me chamar Cinconegue... as pessoas fazem piada e não sabem escrever, se separa o Cinco do negue, se tem acento... - Ora, e eu que me chamo Lynildes? Tenho que soletrar três vezes! - Nunca sabem se meu nome tem H e se no final é m ou n... Estou de saco cheio de pessoas analfabetas! – disse Humberto, de braços cruzados. - Me chamo Chistiane, assim, ao invés do R tem H... Bem que a pronuncia podia ser diferente! E foi assim a discussão de quem tinha o pior nome... Tinha o Rômulo com o, a 71


Adelaide com i e até o Matheus com TH e a Giuliane, com G e E... e não Juliana! - Vocês estão fazendo tempestade num copo de água... – disse a secretária que havia voltado e escutará a conversa; Minha prima chama-se Clarisbalden e lhe digo mais, ela adora esse nome! Diz que se sente especial! Então, diante dessa nova afirmação, todos refletiram... Sim, eles eram especiais! Eles eram únicos! Até Lynildes, que estavas triste desde que chegará, sorriu ao dizer – Ninguém no mundo deve ter meu nome! E, viu, querido leitor, não tenho nada contra nomes comuns e clichês como João e Ana, mas... Que é bom ter algo que só você possui, é! Despeço-me aqui, quieta desde o inicio da conversa, apenas pensando e observando meus novos amigos com quem me identifiquei muito... A propósito, meu nome é Leivanira! 72


Chuva de verão e outras histórias Por Silvia Faggiani

Graduada pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, é professora há mais de 30 anos e tem o magistério como sua grande paixão.

Para você, Isabela, que aos meus rabiscos deu forma, dos meus sonhos fez planos, mudou o meu ócio em tempo ganho, dedico o que compus.

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Chuva de ver達o

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Nossa, que chuva! E agora, filho? Disse a jovem mãe, no hall da agência bancária, enquanto, esperava ser atendida. Em seu colo, o pequeno de aproximadamente dois anos, esperava uma saída, para o problema que surgira. Sabia, no entanto, que podia contar com uma solução rápida da mãe; pois a conhecia muito bem. Era verão, quase final de tarde. A chuva repentina, embora esperada, chegou mais cedo aquele dia. Chuva de verão é assim mesmo: imprevisível e surpreendente também. Avessa a horários pré-estabelecidos chega quando tem vontade. De temperamento forte e humor variado pode ser: mansa e contínua (chuva gostosa!); moderada e espaçada, como criança peralta que salta cancelas; às vezes, furiosa e torrencial também, sem motivo aparente. No entanto, naquele vinte e três de janeiro de 2013, antecipou-se um pouco. Chegou afobada. Não se justificou. Foi ríspida conosco e nos fez seus reféns, por um 75


período razoavelmente longo, naquele recinto bancário. Não sei o que pode ter ocorrido?! Prisioneiros seus, só nos restava esperar, enquanto, ela dominava soberana lá fora. A jovem com a criança no colo, ao que tudo indica, tinha pressa. Muita pressa! Liberdade também fazia parte dos seus planos. A maneira como solucionou o problema me encantou. Estava “carregada”: bolsa, mochila da criança e ainda portava sacolas e muitas! Não pensou duas vezes; reduziu o número destas e com a que sobrou improvisou uma capa para o seu pequeno. Vestiu-o e disse: “FICOU MUNITO! A TOUCA FICO DEVENDO, TÁ?!" Solucionado o problema, tentou cumprir os seus planos. Os menos atrevidos, entretanto, continuaram reféns da chuva moderada que caía. Observei-os, através da vidraça embaçada, até perdê-los de vista. Em seus olhos, havia um quê de contentamento pela conquista. Livres, “dançavam na chuva”, saltando poças d´água. O que era para ser empecilho tornou-se brincadeira gostosa. 76


E assim, em meio a uma cumplicidade sem limites, nos braรงos da mรฃe como um superherรณi, o pequeno segue feliz com ela, o seu caminho.

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Lembranรงas felizes

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Junho de 83. Estava eu, nessa época, vivendo um dilema. Havia recém-adquirido uma escola maternal e não sabia com quem deixar minhas filhas pequenas (dois e sete anos) enquanto estivesse fora. Já havia passado por experiências negativas antes e não queria repeti-las. Foi quando, após ponderar vários nomes, fiquei com a Marilda. Uma adolescente de quinze anos que, na minha ausência, faria as vezes de mãe também. Assim esperava eu. Marilda era linda, extrovertida, falante, brincalhona. Resumindo: uma criança crescida. Os meses que passou conosco encheu nosso lar de alegria, embora a casa ficasse em completa desordem. Pelo que entendi, as tardes com ela eram pura folia dividida em cinco tempos assim: brincar de casinha, balançar na pracinha, tomar um lanchinho, nadar com a Marilda na enorme piscina de lona azul e ver os peixinhos por horas a fio, depois esperar a mamãe chegar. Certo dia, indaguei-me: Cadê as minhas fitas? Horas depois, sem inquirir, no mesmo dia, eu 79


já tinha a resposta; pois ao chegar vi as meninas me esperando tão lindas, com suas cabeças cobertas de fitas de vários tamanhos e diferentes cores: verdes, vermelhas, azuis e amarelas, Marilda sapeca, usou todas elas em sua Arte Multicor. O tempo voou. As meninas cresceram. Marilda casou-se. Porém, um belo dia, encontro-a na cidade: bem mais adulta, mas ainda bela. Assim que me viu, do outro lado da rua, foi logo gritando: Professorinha, como estão as meninas? Respondi: Bem! E pensei comigo mesma: porém, felizes mesmo quando estavam com você: Marilda.

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Se beber, fique em casa

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J.V. morava na mesma rua que nós, quase na divisa do bairro. Trabalhava com o meu pai e tinha por hábito beber. Vivia embriagado. Vê-lo sóbrio era como que “sonhar acordado”. Bem perto de casa, havia uma aconchegante capela, onde congregávamos. Para lá, também se dirigira ele, apenas quando não estava abstinente. Quando aos sábados (dia, em que a juventude se reunia) ele chegava já sabíamos, tudo o que havia sido cuidadosamente planejado, iria por água abaixo. Naquele sábado de maio de 1971, não foi diferente. Durante a reunião, já tinha feito várias intromissões quando, em dado momento, extrapolou. O dirigente pediu que abríssemos nossas Bíblias em Números 1:8; J.V. não se conteve e do fundo do salão gritou: “Protesto! PRO-TES-TO! Se é Números tem de ser, no mínimo, dois”. O riso tomou conta do recinto diante da sua colocação. Minha mãe com o objetivo de 82


contê-lo fingiu ir para casa chamar a Polícia. Mal sabia ela que a vingança viria poucos dias depois. No início da semana seguinte, meu pai chega sorrindo do serviço. Qual o motivo desse riso?, perguntou minha mãe. - É que o João falou para todo mundo lá serviço, assim: “Morro de dó do Jorge, viu! Que mulher brava ele tem”.

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O anjo Por Jane Leal e Filastor Brega

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Gabriel trabalhou por anos a fio no único mercado daquela pequena cidade. Era um rapaz bonito. Um pouco quieto, mas muito prestativo. Todos sabiam que tinha uma espécie de retardamento mental, embora nunca se lembrassem disso. Na verdade tornou-se uma espécie de lenda local porque era muito simples, gentil e sempre sincero. Dizia exatamente o que pensava e o que sentia às pessoas. Alguns o consideravam como uma espécie de vidente. - Sabia das coisas! – de fato, compreendia todo mundo. Pensando bem, nunca falava as coisas de forma muito lógica. Parecia expressar-se de coração para coração. - Empacotador de mercado! - esta era a sua pseudo função. Era na verdade, psicólogo, filósofo, amigo, conselheiro amoroso...- e olhe, que dos bons! - Dizem que nunca namorou! - É claro; nunca...nem beijou!

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-E dizem que a sabedoria experiência de vida.

vem

com a

-Hum, experiência...vivência... – Ah, isso ele não tinha mesmo! Só um jeito simples de ver a vida. Nada de complicação. Resolvia tudo com um doce, uma flor, um sorriso, um abraço apertado. Nada de falar muito; somente poucas palavras, essenciais, pontuais. Foi assim que eu aprendi que verborragia é como hemorragia: um desperdício de tempo! O dia inteiro, no caixa do mercado, as compras iam passando e o Gabriel só empacotando. Lá mesmo ele percebia as pessoas. Se estavam tristes, sorria pra elas. Se alegres, sorria pra elas! Frustradas? Simplesmente sorria. Apaixonadas, desiludidas... e pra todos, ele só sorria e só dizia: - Lindo dia! – linda tarde, linda noite...e só!

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-Engraçado ! –ria com muito gosto o rapaz que até agora estava revoltado com Deus e o mundo por ter largado o computador para fazer compras a pedido dos pais. -Que Lindo!- sorria a mocinha, que até então distraída, pensava em seu amor por Inácio. -Que esquisito!...- dizia aquele cara mal humorado, rindo, batendo nas costas do menino, rapaz, amigo, sei lá! E rindo, sem parar. -Até eu, rio só de lembrar! O Seu Joaquim, era aquele cara que sempre arrumava encrenca. Brigava com todo mundo no mercado. Reclamava de tudo. Mas se via o Gabriel? Ria! Lembro-me de que quase sempre ficava sozinho. Mais parecia uma criança crescida. Nas horas vagas, observava atento o caminho das formigas. Correndo pra lá e pra cá com os cachorros. Tinha um sorriso brilhante e um olhar: muito especial!

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-...muito amoroso!Gertrudes.

elogiava

a

Dona

Humm, ela sempre levava bolinhos de chuva pra ele. E a gente aproveitava, Claro! Todas as noites, apontava para as estrelas e dizia que era de lá. E que ainda pra lá, iria voltar! Família, parece que não tinha. Um dia, dois, três e ele não foi trabalhar. Nunca mais. A cidade inteira procurou por Gabriel por toda parte, nos lugares possíveis e até imagináveis. Não estava aqui, lá , nem acolá! -Cadê o Gabriel?! – perguntavam todos assustados. -Não sei! - Não vi. - Sei lá eu! -Sumiu!!! Gritavam atrapalhados num vem e vai destrambelhado. Mas só o Pituco sabia, a

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calopsita Kika, a gatinha Cema e o pequenino Marcelo. E talvez até as formigas! Toda vez que se falava do Gabriel, eles olhavam pra cima. E não diziam nada. Mas o menininho, dizia conhecer um segredo. Mas que não podia contar pra ninguém. E com jeito bem matreiro, só sorria! Gabriel - Menino, por favor separe os produtos da geladeira, dos de limpeza. - Ele está assim, porque está com muitos problemas no trabalho. - O que foi Gabriel? - Ele ama muito a senhora. - Do que você tá falando? - Do seu marido! - Nossa! Entrou um cisco no meu olho... Obrigada Gabriel! Amanhã eu volto. 89


- Dona Yara... Tome uma flor...

- Gabriel! Pega um carrinho pro seu Otávio. - Já tá aqui... - Pode deixar que eu guardo as compras. Que é isso moleque... Me solta! - Ele só quer dar um abraço no senhor! - Um só menino... Tá bom... Tá bom... Obrigado!

- Lindo dia pra senhora, D. Júlia! - Pra você também Gabriel.

- Linda tarde Julinho! - Valeu Biel... Procê também!

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- Boa noite Seu Isis! - Tô precisando mesmo... Obrigado!

- E eu lá tenho culpa Seu Joaquim, os preços subiram por culpa do governo... Eu não tenho nada a ver com isso! - A culpa é de vocês sim! Aceitam tudo que eles fazem... Tem que sair na rua pra protestar... Se não fica essa merda do jeito que tá. - Olha que tá vindo ali... - Vem cá Gabriel... Dá um abraço no velho Quincas... Bom menino!

- O Gabriel não veio hoje? - O Gabriel não veio hoje? - O Gabriel não veio hoje?

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- Ninguém sabe, ninguém viu.

- Marcelinho, sabe do Gabriel? - É um segredo... Não posso contar pra ninguém. Ri.

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Divagando numa livraria Por Daniela Casabona, Eliana Maestrelli e Juliana Valbert

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Em meio a um mar de possibilidades, procuro encontrar a razão de retornar com tanta frequência no meio das prateleiras. Estou sempre procurando, às vezes não sei bem o que. Se bem que acontece muito de um livro chamar tanto a minha atenção que eu não posso deixar de pegar. Da sessão espiritual à infantil, caminho na incerteza desse ou daquele...admito que julgo um livro pela capa, pelo título, mas quem não faz isso? São tantas as opções, tento fazer uma análise do que se passa na minha cabeça e vou para a sessão de autoajuda. Me divirto com temas malucos, que oferecem importantes soluções para os dilemas do mundo, mas nada explica a fundo. Na verdade o que me diverte mesmo é ficar divagando. Adoro livrarias, pegar os livros, folhear, ler trechos sem nem sempre encontrar nada específico. Só olhar, observar, 94


o lugar, os livros, as pessoas. É um lugar bom de se estar. São nove horas da noite e minha esposa me espera...depois de tanto tempo vagar depois do trabalho, tudo de bom ou ruim deve estar se passando na cabeça dela...por fim, no intuito e na correria, pego aquele livro de autoajuda para pessoas que não sabem do valor da vida...E quem sabe minha esposa não queira vir na próxima vez ser feliz comigo? Agora na fila do caixa a vejo chegando cheia de sacolas. Se ela gastasse mais com livros talvez sobrasse mais dinheiro. Quem sabe com esse presente ela fique mais contente. Chega e pensar e deixar vir o que vier. O que eu quero mesmo é tomar um café.

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Fome Por Silvia Faggiani e Jane Leal

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- O sol já está quente. Que barulho esquisito! Sou eu ou é você? - Pela intensidade pressuponho que venha de você. Faz aulas de canto e tem o diafragma bem mais desenvolvido. - Inspirando, expirando... abraço o meu querido. Parece que já está esfriando, é bom ficar juntinho. Mas que barulho é esse?! - Esfriando, juntinho, fiquei confuso. Afinal, trata-se de sanduíche na chapa, sardinha em lata ou sanduíche de gente? Mas que barulho é esse?... - Eu sabia, é chuva! Corra e guarde tudo! Vamos! Vai estragar os sanduíches! Gente!... - Não desconversa! É sanduíche, mas de... -...sapato, tamanco, de bota...não, chinelo não dá! Cê tá maluco, com este tempo?! Dê-me logo as meias. A minha mala pode ser confusa, porém nunca poderia ser chamada de sanduíche. Hum...e esse barulho? (Juntos): - Que FO-ME! 97


Sobre a organizadora: Juliana Maringoni, graduada em Jornalismo – PUC Campinas, especialista em Jornalismo Literário – Academia Brasileira de Jornalismo Literário e em Planejamento, Implementação e Gestão da Educação – Universidade Federal Fluminense Atua como professora de Escrita e Criatividade.

Contato contato@editorarosarose.com.br www.editorarosarose.com.br

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