Da Penhora On-Line e da Penhora de Faturamento – Athos Gusmão Carneiro – p. 1
Reassentamento dos Atingidos por Barragens: Limites da Competência Regulatória da Aneel – Lúcia Penna – p. 4 Legalidade da Taxa Selic em Matéria Tributária – José Carlos Francisco – p. 21 A Percepção Ecológica dos Pobres – Rafael Carrard – p. 26 A Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Novo CPC – Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa – Sergio Pinto Martins – p. 35 Análise do Sistema Prisional Brasileiro – Aladio Anastacio Dullius e Jackson André Müller Hartmann – p. 46 Acórdão na Íntegra – Superior Tribunal de Justiça – p. 63 Pesquisa Temática – Competência Ambiental – p. 68 Jurisprudência Comentada – Arbitragem Internacional – Forma da Citação – Desnecessidade de Carta Rogatória (Comentários ao Julgamento do Superior Tribunal de Justiça na Sentença Estrangeira Contestada nº 3660) – Nikolai Sosa Rebelo e Alysson Dutra Rojas Garcia – p. 72
Jornal Jurídico
Medidas Provisórias – p. 79 Normas Legais – p. 83 Indicadores – p. 84
Abril/2016 – Edição 229
Doutrina
Da Penhora On-Line e da Penhora de Faturamento
(Bacen-Jud). O Banco Central, de imediato, comunica a requisição aos bancos, os quais cumprem a ordem e assim é comunicado ao juiz requisitante. Sendo efetivados bloqueios por diversos bancos, ultrapassando sua soma o valor devido, o juiz determinará qual bloqueio irá permanecer e, incontinenti, determinará a liberação dos demais.
ATHOS GUSMÃO CARNEIRO
2. Pergunta-se: será necessária a formal lavratura de “termo de penhora”? Theodoro Jr. sustenta que sim (Repro, 176/20), cumprindo ao escrivão lavrar termo nos autos, com a intimação do executado na forma do art. 652, § 4º, a fim de manifestar-se sobre a penhora (já o prazo para oferecimento de embargos, na execução por título extrajudicial, corre da juntada aos autos do mandado de citação cumprido – art. 738). Todavia, tendo em vista inclusive o disposto no § 6º do art. 659 (penhora de numerários realizada por meios eletrônicos), entendemos deva o juiz considerar já efetivada a penhora mediante a comunicação de indisponibilidade do numerário do devedor e, dessarte, determinar de imediato a ouvida do executado a respeito do bloqueio (= da penhora) efetuado.
Ministro Aposentado do Superior Tribunal de Justiça, Advogado.
1. O conceito de penhora, como vimos, não foi alterado pelas reformas no processo de execução: visa a permitir a expropriação de bens do devedor e considera-se feita mediante a apreensão e o depósito dos bens suficientes, documentados pela lavratura do auto de penhora (art. 664). Cumpre, todavia, sublinhar a atual regulamentação da penhora em dinheiro ou em aplicação financeira, que, nos termos do art. 655-A, será feita mediante requisição à autoridade supervisora do sistema bancário. O anterior entendimento de que a penhora on-line seria uma medida excepcional, somente admissível quando esgotada a busca de outros bens a penhorar, encontra-se superado, máxime tendo em vista a atual redação do art. 655, I, que coloca o dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação financeira, em primeiro lugar na ordem preferencial de bens passíveis de expropriação. Na prática, iniciada a execução por quantia certa e requerida pelo exequente a penhora on-line, o juiz liminarmente requisitará ao Banco Central o bloqueio de ativos em nome do devedor, informando o montante do crédito em execução (principal atualizado, mais estimativa para honorários e custas) e determinando a indisponibilidade do depósito ou aplicação financeira do devedor até o valor indicado. Os Tribunais têm assinado convênios com o Bacen, proporcionando aos juízes senhas para o acesso ao sistema eletrônico
Ao devedor de má-fé ficou destarte dificultado o usual expediente de (em fraude) retirar o numerário de suas contas tão logo sabedor da iminência da penhora. Notemos que a nova sistemática não ofende o sigilo bancário, pois não são investigadas as movimentações financeiras do devedor, sequer o total das quantias depositadas ou em
aplicação, mas apenas determinada sua indisponibilidade no limite do crédito exequendo. Aliás, de qualquer forma, quando necessária ao pleno exercício da jurisdição, ao juiz é lícito determinar a quebra do sigilo bancário.
siderando a possibilidade de que queira arguir a invalidade ou ineficácia da penhora, ou postular sua substituição por outro bem ou por fiança bancária ou seguro-garantia judicial – art. 656, § 2º, e art. 668.
3. Pode ocorrer a frustração parcial ou total da penhora, caso o valor bloqueado seja inferior ao montante necessário ao completo pagamento da dívida (penhora insuficiente, e não será raro que o devedor não disponha de quantia nenhuma, ou apenas quantia ínfima em seu nome).
4. A penhora on-line pressupõe (mas não necessariamente) requerimento do exequente – art. 655-A, caput –, e o Magistrado somente poderá negá-la por fundadas razões de direito, como, v.g., se o crédito já for garantido por hipoteca, valendo ainda sublinhar a possibilidade de sua substituição. Como refere Cássio Scarpinella Bueno,
Nestas penhoras on-line de dinheiro depositado ou em aplicação, dispensa-se, pois, a formalidade da lavratura de termo de penhora (substituído pela comunicação relativa à efetivação do bloqueio), mas não a intimação do devedor, inclusive con1 No aresto do RMS 25.397, consta da ementa que, embora inadmissível a penhora de valores depositados em conta-corrente destinada ao recebimento de salários ou proventos, caso o valor não seja gasto para suprir as necessidades do executado, e sim sirva como reserva de capital, a verba perde seu caráter alimentar, tornando-se penhorável (STJ, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 14.10.2008).
a regra é inequivocamente inspirada em razões de interesse público, de maior eficiência da prestação jurisdicional, não havendo razão paras relegá-la à disponibilidade das partes e, menos ainda, para um “segundo plano”, como se a penhora on-line tivesse como pressuposto, por qualquer razão, o malogro de outras tentativas de penhora, sobre outros bens do executado. (Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2008, n. 5.1.1, p. 244-245)
A importância penhorada fica sob a guarda dos dirigentes do banco depositário, independentemente de lavratura do termo. Caso seja liberada sem ordem do juízo, responderão os administradores como depositários infiéis (arts. 904 e 666, § 3º), pelo que ficam obrigados a repor à conta judicial a quantia liberada, sob pena de prisão. (Elpídio Donizetti in Revista Dialética, 51/75)
5. Reformando aresto do TJRS, o STJ julgou desnecessário, diante da nova sistemática da Lei nº 11.382/2006, o prévio esgotamento dos meios disponíveis para a localização de bens em nome do executado, antes de requerer ao juiz a expedição de ofício ao Banco Central do Brasil (REsp 1.052.264, 1ª T., Relª Min. Denise Arruda, DJe 23.03.2009). No mesmo sentido, a 2ª Turma deu provimento a recurso especial oriundo do TJBA, com o asserto de que a Lei nº 11.382 promoveu “profundas e significativas alterações no processo de execução de títulos extrajudiciais, de que é exemplo a Certidão de Dívida Ativa
Abril/2016 – Ed. 229
Pode acontecer, ainda, que a conta bancária seja total ou parcialmente impenhorável, porque proveniente do pagamento dos salários ou proventos do devedor (salvo se o crédito for de alimentos), caso em que este, o executado, terá o ônus de demonstrar tal circunstância (art. 649, IV, § 2º). Theodoro Jr. refere, no entanto, que a indisponibilidade da conta onde são depositados os salários ou proventos do devedor não será absoluta, quando a conta servir como “veículo de entesouramento”, com investimentos em cadernetas de poupança ou aplicações financeiras (Processo de execução e cumprimento da sentença, cit. 26. ed., n. 220, p. 289)1. Mas é impenhorável o depósito em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários-mínimos – art. 649, X.
2
(CDA), com o objetivo de resgatar a dívida histórica do legislador para com o credor, devolvendo à prestação jurisdicional em tais hipóteses a efetividade outrora perdida”; assim, o art. 655 colocou o dinheiro, em espécie ou depositado em instituição financeira, em primeiro lugar na ordem de penhora, e o art. 655A autoriza expressamente a utilização do sistema “Bacen-Jud” ou congênere na busca de informações sobre ativos financeiros e a respectiva penhora (REsp 1.097.895, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 16.04.2009).
Abril/2016 – Ed. 229
Também na 2ª Turma, o Ministro Herman Benjamin, como relator do REsp 1.103.760, salientou que a penhora on-line representou uma “mudança nos paradigmas culturais do processo de execução”, afirmando que as novas regras tiveram o objetivo de dar mais rapidez e eficácia às decisões judiciais e que, sem representar negação da regra da menor onerosidade disposta no art. 620, o dinheiro sempre esteve em primeiro lugar na ordem prevista no art. 655 do CPC; atualmente, o dinheiro circula mais por intermédio de cartões de crédito, débitos automáticos e operações financeiras pela Internet, sendo que algumas empresas sequer possuem bens passíveis de penhora – e até o mobiliário costuma ser adquirido pelo sistema de leasing, tudo dificultando a localização de bens.
3
6. Mesmo assim, o princípio da menor onerosidade (art. 620) pode, excepcionalmente e em determinadas situações específicas, ser invocado para relativizar o rigorismo da penhora, amoldando a execução às peculiaridades do caso concreto (REsp 741.507, Rel. Min. Teoria Zavascki, J. 02.10.2008), inclusive pela substituição do bem penhorado, desde que não resulte em prejuízo algum ao exequente (art. 668). Com frequência, para a necessária preservação de seu capital de giro, a empresa executada postulará a substituição da penhora por fiança bancária ou seguro garantia judicial (art. 656, § 2º).
Assim, no magistério de Theodoro Jr., em se tratando de execução contra empresa, a penhora do saldo bancário haverá de respeitar a intangibilidade do capital de giro, cumprindo à executada demonstrar a impossibilidade de subsistência da própria empresa, caso mantido o bloqueio, e indicar outros bens idôneos como garantia da execução (RePro, 176/35). 7. No concernente à penhora de percentual do faturamento da empresa executada, cuida ser de medida drástica e igualmente capaz de afetar o capital de giro (principalmente de pequenas empresas) e sua possibilidade de atendimento a pagamentos preferenciais, absolutamente indispensáveis ao funcionamento (como, v.g., os salários de seus empregados ou os pagamentos devidos a fornecedores); assim, tal modalidade de penhora não será determinada incontinenti, assegurando-se à executada a possibilidade de oferecer outros bens hábeis à garantia do crédito em execução. Vale aqui sublinhar que a penhora de faturamento está situada em sétima colocação na ordem preferencial de bens a serem objeto de penhora, enquanto a constrição judicial em numerários ou aplicações financeiras foi posta em primeiro lugar – art. 655. Ao juiz processante, portanto, é recomendável redobrada prudência. 8. A lei prevê expressamente a nomeação de depositário responsável pela reserva do percentual do faturamento, prestações de contas e pagamentos ao credor, e tudo indica a conveniência em que tal encargo seja confiado, de regra, a funcionário judicial ou pessoa de confiança do juiz (mesmo porque é questionada a possibilidade de prisão do depositário infiel). O depositário não administra a empresa devedora (não se trata de penhora de estabelecimento, regulada nos arts. 677 e 678), mas sim limitar-se-á a fiscalizar sua contabilidade e proceder aos pagamentos periódicos ao credor, conforme acordado em plano a ser previamente aprovado pelo Magistrado.
Doutrina
Reassentamento dos Atingidos por Barragens: Limites da Competência Regulatória da Aneel
barragens; 1.3 Atuação dos órgãos ambientais e da Aneel no processo de remanejamento das populações atingidas por barragens; 2 Competência para a emissão de declaração expropriatória das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos por barragens; 2.1 Fundamento legal da declaração de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos por barragens; 2.1.1 Reassentamento dos atingidos por barragens: hipótese de reforma agrária?; 2.1.2 Reassentamento dos atingidos por barragens: hipótese de interesse social ou utilidade pública?; 2.1.3 Hipótese de utilidade pública específica do setor elétrico: artigo 10 da Lei nº 9.074, de 1995; 2.2 Estudos de Caso: Usinas Hidrelétricas Três Irmãos e São Salvador; Conclusão; Referências.
LÚCIA PENNA
Procuradora Federal/ANEEL. Especialista em Direito Regulatório da Energia Elétrica pela Universidade de Brasília.
SUMÁRIO: Introdução; 1 O modelo regulador de Estado e a questão do remanejamento dos atingidos por barragens; 1.1 Modelo regulador de Estado e competência regulatória das agências; 1.2 Mudança de enfoque das questões atinentes ao remanejamento das populações atingidas por
INTRODUÇÃO Atualmente, as declarações de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento das populações deslocadas em razão da implantação de usinas hidrelétricas são emitidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a pedido dos empreendedores, como condição para a promoção das desapropriações das áreas destinadas a esse fim. Esse processo abrange a construção do canteiro de obras, o enchimento dos reservatórios, a criação de áreas de preservação ambiental, entre outros. Contudo, a determinação acerca de qual órgão ou entidade possui legitimidade para atuar nessa seara vem sendo objeto de questionamentos por parte dos atingidos pela implantação das usinas e dos agentes econômicos. Citam-se, por exemplo, as ações ajuizadas perante o Poder Judiciário questionando as declarações de utilidade pública emitidas nos casos das Usinas Hidrelétricas Três Irmãos, no Estado de São Paulo, e São Salvador, no Estado do Tocantins. Nesses dois casos, a questão posta é se, por meio da emissão das declarações de utilidade pública, não se estaria, sob o pretexto
de viabilizar a construção de usinas hidrelétricas, promovendo reforma agrária, de competência exclusiva da União. No presente estudo, busca-se aprofundar esse tema, indagando-se que fundamento legal dá suporte à emissão da referida declaração pela Aneel, bem como o valor ou princípio que se busca proteger por meio desse ato. Sob esse ângulo, procura-se saber se, ao emitir as referidas declarações, a Aneel atua dentro dos limites de sua competência regulatória e se há interferência indevida na esfera de atuação de outros entes estatais. Essa análise será dividida em duas partes. Na primeira, buscam-se analisar os fundamentos da competência regulatória da Aneel dentro do contexto atual, bem como a mudança do enfoque regulatório dado às questões ligadas ao processo de remanejamento das populações atingidas por barragens. Na segunda, são apresentados dois estudos de caso, referentes às Usinas Hidrelétricas Três Irmãos, no Estado de São Paulo, e São Salvador, no Estado do Tocantins.
Abril/2016 – Ed. 229
A partir desses estudos, procura-se analisar se a declaração de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento das populações atingidas por barragens insere-se na competência regulatória da Aneel, identificando-se os valores ou princípios que se buscam alcançar por meio da referida declaração.
5
1 O MODELO REGULADOR DE ESTADO E A QUESTÃO DO REMANEJAMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS 1.1 Modelo regulador de Estado e competência regulatória das agências A criação da Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, por meio da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, teve como
pano de fundo a crise do modelo do Estado intervencionista, ocorrida em meados da década de noventa no Brasil. Foi o início de um processo de reformas voltado à redução da intervenção do Estado na economia, que passou de protagonista na execução dos serviços a planejador, regulador e fiscalizador dos serviços delegados à iniciativa privada. Dentro desse novo paradigma, caracterizado por um modelo de Estado Regulador, adquire especial importância a figura das agências reguladoras (Justen Filho, 2002, p. 23-25). A atuação dessas agências está fundada em um conceito mais amplo de regulação estatal. Esse conceito identifica-se com a atividade do Poder Público sobre o domínio econômico, por meio do estabelecimento e implementação de normas para uma dada atividade ou para a tutela de um determinado interesse, visando a garantir o equilíbrio no sistema regulado e a consagração de objetivos públicos consentâneos com os princípios constitucionais (Justen Filho, 2002, p. 24-45; Marques Neto, 2005, p. 29-37). Sob essa perspectiva, a competência regulatória das agências abrange não só a busca do equilíbrio interno ao mercado, por meio da correção das chamadas falhas de mercado no setor elétrico, mas também envolve a introdução de objetivos de ordem geral que não seriam alcançados exclusivamente pela ação da livre iniciativa dos agentes econômicos. Essas mudanças, resultantes da consolidação do modelo de Estado Regulador, produziram reflexos importantes no setor elétrico, notadamente no que se refere ao tratamento das questões atinentes ao remanejamento das populações atingidas por barragens e à atuação da Aneel ao longo desse processo.
1.2 Mudança de enfoque das questões atinentes ao remanejamento das populações atingidas por barragens
Durante o regime militar, as ações empreendidas no setor objetivavam liberar, ao menor custo possível e dentro do cronograma de obras, as terras necessárias à implantação da usina.
A necessidade de deslocamento das populações que residem e trabalham nas áreas de implantação de usinas hidrelétricas traz à tona um conflito de interesses.
A aquisição dessas áreas, em geral, se baseava em critérios unilaterais, de cuja elaboração os proprietários não participavam. A interpretação estrita da lei vedava a indenização pela perda da terra aos não proprietários, mesmo aos que detinham a sua posse e a exploravam para o seu sustento, e não reconhecia aos trabalhadores rurais o direito a qualquer compensação pela perda de seus empregos em decorrência da inundação das terras.
De outro, há o prejuízo causado às populações que vivem na área de implantação da usina, decorrente do abandono de um espaço construído, que comporta uma infraestrutura básica – tanto para fins produtivos, como para fins de moradia e de desenvolvimento de atividades comunitárias –, seguido da migração compulsória e da readaptação em um novo ambiente físico e social (Bloemer, 2001, p. 96-97).
Além disso, quando adotados, os projetos de reassentamento, normalmente preteridos em relação a soluções mais simples e diretas, eram feitos sem a participação dos interessados. Limitavam-se à concessão de lotes de terra e de moradias, não incluindo o suporte técnico-financeiro ou o apoio social indispensáveis ao seu êxito. Havia, dessa forma, um excessivo ônus suportado pelas populações locais, as quais, para viabilizar a construção de uma obra com vantagens para toda a coletividade, deveriam suportar a sua retirada.
Há um desequilíbrio latente entre os benefícios trazidos para a coletividade, em decorrência do aumento da oferta de energia, e o excessivo ônus suportado pelas populações locais, que, por residirem ou trabalharem na área de implantação da usina, são obrigadas a se deslocarem para outras áreas.
Essa conjuntura deu início a uma intensa mobilização política, com o surgimento de movimentos sociais, como o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, e o aumento da pressão por parte das instituições financeiras internacionais, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, que passaram a condicionar a liberação de financiamentos à observância das questões sócio-ambientais ligadas ao empreendimento.
Esse desequilíbrio pode dar origem a conflitos de interesses, inerentes ao processo de concepção e implantação de usinas hidrelétricas. Contudo, por muito tempo, o Estado focalizou apenas as questões econômicas decorrentes da implantação desses empreendimentos, deixando de lado outros aspectos, ligados a questões políticas e sociais (Banco Mundial, 2008).
Isso resultou na mudança de enfoque das questões atinentes ao remanejamento das populações atingidas por barragens. De acordo com relatório apresentado pelo Banco Mundial, caso emblemático dessa mudança foi a construção da Usina Hidrelétrica Itaparica, que se iniciou em 1975 e só foi concluída em 1988 (Banco Mundial, 2008).
Abril/2016 – Ed. 229
De um lado, há o interesse da coletividade em ver atendida a crescente demanda por energia elétrica, insumo reconhecidamente indispensável aos processos de produção modernos e associado, nas sociedades em desenvolvimento, ao aumento da renda per capita e a melhorias na qualidade de vida da população, propiciando melhores níveis de habitação, saúde e educação.
6
Segundo o referido relatório, não obstante os estudos e as ações pertinentes ao meio ambiente e ao remanejamento populacional só terem sido iniciados quando a obra já estava em andamento – assim como ocorreu, por exemplo, em relação à Usina Hidrelétrica Sobradinho, que entrou em operação em 1979 –, o processo de negociação em Itaparica sofreu transformações significativas no decorrer da implantação do empreendimento. Essas transformações foram o reflexo das mudanças no grau de mobilização e organização da população local, que passou a participar ativamente das discussões sobre as alternativas e critérios de reassentamento rural e relocação urbana. Firmou-se, a partir de então, a premissa segundo a qual os proprietários e, de maneira geral, a população envolvida no processo de liberação das áreas atingidas pela construção da usina, composta inclusive pelos arrendatários, meeiros, empregados e demais trabalhadores que dependem das referidas áreas para a sua subsistência, devem participar de maneira ativa no processo.
Abril/2016 – Ed. 229
Por outro lado, os projetos, concebidos dentro de um novo enfoque de inserção regional do empreendimento, passaram a incorporar medidas destinadas ao suporte nas áreas técnica, econômica e social – e o setor passou a assumir novas responsabilidades no tocante ao destino da população a ser deslocada.
7
1.3 Atuação dos órgãos ambientais e da Aneel no processo de remanejamento das populações atingidas por barragens Foi demonstrado que há um novo enfoque das questões ligadas ao remanejamento das populações locais, quando da construção de uma usina hidrelétrica. Nesse contexto, o empreendedor, por um lado, passa a ter que prever, entre os custos realizados para
a operação da usina, não apenas as despesas realizadas com as indenizações pagas aos proprietários das terras atingidas. Deve, também, prever as despesas com a adoção de medidas compensatórias àqueles indivíduos que, apesar de não serem proprietários das áreas afetadas, têm nestas a garantia de sua subsistência. Isso porque o remanejamento dos grupos populacionais afetados por empreendimentos do setor elétrico é um processo social complexo, que comporta uma pluralidade de ações envolvendo, entre outras modalidades, a indenização, o reassentamento e a reorganização das propriedades em áreas remanescentes. Por outro lado, como reflexo da consolidação do modelo de Estado Regulador, a atuação estatal passa a ser a de regular e fiscalizar a efetiva adoção, pelo empreendedor, das medidas necessárias à mitigação dos efeitos decorrentes das alterações induzidas à estrutura social e cultural das populações deslocadas. Atualmente, essa tarefa vem sendo desempenhada pelos órgãos ambientais no curso do processo de licenciamento. Nesse processo, é feita a avaliação dos impactos ambientais do empreendimento, introduzida como instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente por meio da Lei nº 6.938/1981 e exigida pela Constituição Federal (art. 225, § 1º, IV) como condição para a construção, a instalação, a ampliação e o funcionamento de atividades ou obras que, a exemplo das usinas hidrelétricas, são potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente1. 1 Especificamente em relação aos empreendimentos de geração hidrelétrica, a exigência de estudo prévio de impacto ambiental está prevista na Resolução Conama nº 001/1986, que situa as usinas de geração de energia elétrica com potência acima de 10MW no campo das obras e dos empreendimentos sujeitos à avaliação de impacto ambiental.
A atuação dos órgãos de defesa do meio ambiente nesse processo está atrelada à internalização das questões sócio-ambientais no setor elétrico, decorrente do quadro de degradação ambiental resultante da adoção de um modelo de desenvolvimento econômico desatrelado da implementação de uma política ambiental efetiva (Banco Mundial, 2008). Essa reformulação do marco regulatório da proteção ambiental no setor elétrico foi reforçada pela edição, em 1986, do I Plano Diretor de Meio Ambiente do Setor Elétrico (I PDMA), aprimorado, em 1990, pelo II Plano Diretor de Meio Ambiente do Setor Elétrico (II PDMA). Esses instrumentos, elaborados sob a coordenação da Eletrobrás, marcaram a reorientação do setor no equacionamento das questões sócio-ambientais, incluindo, entre seus temas prioritários, o remanejamento de grupos populacionais (Banco Mundial, 2008). Vejamos de que forma se dá a atuação dos órgãos ambientais e em que medida a Aneel intervém nesse processo. Os procedimentos gerais para o licenciamento ambiental estão previstos na Resolução Conama nº 237, de 19 de dezembro de 1997. Além dela, a Resolução Conama nº 006, de 16 de setembro de 1987, e a Instrução Normativa Ibama nº 065, de 13 de abril de 2005, de forma mais específica, estabelecem procedimentos para o licenciamento ambiental de empreendimentos geradores de energia elétrica. Esses instrumentos, contudo, não fixam regras detalhadas quanto à definição das ações a serem incorporadas aos planos e programas do setor no campo sócio-ambiental.
A sistematização das referências para o desenvolvimento das análises relativas aos aspectos sócio-ambientais, a cada etapa de planejamento, construção e operação dos empreendimentos do setor elétrico, e as diretrizes para o remanejamento dos contingentes populacionais em áreas onde são implantados, encontram-se no Plano Diretor de Meio Ambiente do Setor Elétrico, aprimorado em 1990. Apesar desse instrumento não mais servir como documento estratégico, devido às mudanças ocorridas no panorama nacional, ele se mantém como referência para o setor, tendo-se em vista a importância das premissas sobre as quais foi delineado (Banco Mundial, 2008). De acordo com o referido instrumento, o empreendedor, ao elaborar o EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental), deve apresentar um plano das alternativas de remanejamento das famílias cujas terras serão atingidas pela implantação da usina. A apresentação desse plano é necessária para a concessão da licença prévia, por meio da qual o órgão licenciador atesta a viabilidade ambiental do empreendimento, estabelecendo os requisitos básicos e os condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação (Centrais Elétricas..., 1990, v. 2, p. 40). Esse plano deve incluir um programa de reassentamento da população, que preveja não apenas instalações físicas e equipamentos sociais, mas também apoio técnico e financeiro e outras providências que visem assegurar, a médio prazo, a integração social e a autossustentação econômica dos reassentados. Após a concessão da licença prévia, o projeto de reassentamento apresentado pelo empreendedor passa por ajustes e aprimoramentos, mediante ampla participação da população local, através de reuniões e audiências públicas, que também contam com a participação do Ministério Público Estadual e Federal, dos Poderes Executivo e Legislativo Municipais e de representantes de entidades não-governamentais.
Abril/2016 – Ed. 229
Considera-se, portanto, que a efetiva adoção pelo empreendedor das medidas necessárias ao remanejamento dos atingidos pela construção de usinas hidrelétricas integra a análise da viabilidade ambiental do empreendimento.
8
Definidos os critérios norteadores do projeto de reassentamento da população, inclusive seu cronograma físico-financeiro, o órgão ambiental concede a licença de instalação do empreendimento, por meio da qual autoriza o início das obras, de acordo com os planos e projetos aprovados (Centrais Elétricas..., 1990, v. 2, p. 40). A partir desse momento, tem início a efetiva implantação do programa de reassentamento aprovado pelo órgão ambiental, nos termos dos requisitos e condicionantes impostos nas licenças expedidas. Cumpridos tais requisitos e condicionantes, o órgão ambiental emite a licença de operação, necessária para a entrada em operação da usina. O empreendedor passa então a monitorar regularmente os reassentamentos, com vistas à avaliação da eficácia das ações empreendidas, promovendo, se for o caso, ajustes aos projetos implementados (Centrais Elétricas Brasileiras, 1990, v. 2, p. 40).
Abril/2016 – Ed. 229
A Aneel intervém nesse processo por meio da emissão das declarações de utilidade pública das áreas necessárias destinadas ao reassentamento das populações deslocadas, as quais são requeridas pelo empreendedor durante o processo de execução do plano de remanejamento. Essa é a primeira fase do procedimento expropriatório, em que o Poder Público manifesta sua vontade de transferir a propriedade de determinado bem para seu patrimônio, ou para o de pessoa delegada, com o objetivo de executar atividade de interesse público prevista em lei. Após essa fase declaratória, há a chamada fase executória, em que o empreendedor, por delegação do Poder Público, adota as providências concretas para a desapropriação das áreas necessárias à instalação da usina (Carvalho Filho, 2005, p. 640).
9
Para obter a declaração expropriatória necessária à execução da desapropriação, o empreendedor deve comprovar o cumprimento
dos requisitos previstos na Resolução nº 279, de 11 de setembro de 2007, da Aneel, que trata dos procedimentos gerais para requerimento de declaração de utilidade pública para fins de desapropriação das áreas necessárias à implantação de instalações de geração de energia elétrica. Esses requisitos estão ligados à especificação das áreas de terras necessárias à implantação do empreendimento, bem como à demonstração da obtenção de licença prévia emitida pelo órgão ambiental. Para ilustrar como isso se dá na prática, citam-se dois exemplos recentes. Tanto a Companhia Energética São Salvador (CESS) como o Consórcio Estreito Energia (Ceste), consórcios vencedores das licitações para a construção das Usinas Hidrelétricas São Salvador e Estreito, respectivamente, apresentaram, como requisito para a obtenção de licença prévia junto ao Ibama, planos de remanejamento das populações atingidas pela construção das barragens. Em ambos os casos, os planos apresentados pelos empreendedores foram divulgados por meio da distribuição de cartilhas e da realização de reuniões e audiências públicas, destinadas a divulgação e a esclarecimentos acerca da implantação dos empreendimentos, tratando, inclusive, de aspectos relacionados à delimitação das áreas afetadas e aos critérios para indenização. Essas ações, realizadas sob a coordenação do Ibama no curso do processo de licenciamento ambiental, contaram com a participação dos atingidos, proprietários e não proprietários, dos Poderes Executivo e Legislativo Municipais, do Ministério Público Estadual e Federal, de representantes de entidades não governamentais e outros, e resultaram na integração, ao plano de remanejamento inicialmente apresentado pelos empreendedores, de muitas das reivindicações feitas pelos interessados. No caso, por exemplo, da Usina Hidrelétrica São Salvador, o plano de remanejamento incluiu as seguintes alternativas: a) a aquisição das propriedades e benfeitorias necessárias à instala-
Já no caso da Usina Hidrelétrica Estreito, como opção ao recebimento de indenização pela aquisição das propriedades e benfeitorias atingidas pela construção da usina, constou do plano de remanejamento o oferecimento de lotes de 40 ha, para proprietários, e de 12 ha, para não proprietários, todos com casas construídas em reassentamentos coletivos, ou concessão de cartas de crédito no valor de cinquenta e sete mil reais para proprietários, e de trinta e sete mil reais para não proprietários, com direito a cesta básica por um ano e assistência técnica e social por três anos no novo lote (Movimento dos Atingidos por Barragens, 2008). Para viabilizar os reassentamentos apresentados como opção aos atingidos, a Aneel, a pedido dos empreendedores, emitiu declarações de utilidade pública das áreas destinadas a esse fim, sendo certo que a implementação total dos planos de remanejamento dos referidos empreendimentos encontra-se em andamento, sob a fiscalização do Ibama. Ao longo desse processo, os órgãos de atuação estatal se deparam com novas questões e desafios a serem superados. Por exemplo, em alguns casos, observaram-se atitudes oportunistas de famílias que se mudaram para a área de construção da usina, motivadas pelos boatos de que poderiam ganhar terras, casas e dinheiro ao serem deslocadas para outro lugar (Silveira, 2008). Em outros casos, as populações locais, representadas pelo Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, questionaram os valores das indenizações oferecidas pelos empreendedores,
bem como a exclusão, do plano de remanejamento por eles apresentado, daqueles indivíduos que, apesar de não serem proprietários de terras, exercem profissões ligadas ao rio, como os pescadores, os barraqueiros e as quebradeiras de coco (Movimento..., 2008). A análise da efetividade da atuação estatal, no que se refere à resolução do conflito de interesses envolvido no processo de remanejamento das populações locais, não constitui objeto deste trabalho. Atendo-se aos objetivos buscados por meio deste estudo, pode-se concluir que a atuação dos órgãos e entidades envolvidos no sentido de solucionar tais questões evidencia a mudança do enfoque regulatório dado ao remanejamento dos atingidos em relação à praxe anterior. Tal mudança é reflexo da consolidação do modelo regulador de Estado. Além disso, observa-se que a apresentação, pelo empreendedor, de um plano de reassentamento da população, constitui-se em requisito necessário para que o órgão competente para o licenciamento avalie a viabilidade sócio-ambiental do empreendimento, emitindo as licenças necessárias à construção, à instalação, à ampliação e ao funcionamento da usina.
2 COMPETÊNCIA PARA A EMISSÃO DE DECLARAÇÃO EXPROPRIATÓRIA DAS ÁREAS DESTINADAS AO REASSENTAMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS 2.1 Fundamento legal da declaração de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos por barragens
Abril/2016 – Ed. 229
ção da usina, mediante indenização; b) a permuta das áreas remanescentes das propriedades adquiridas pela concessionária; c) o estabelecimento em lotes de 80 ha, para proprietários, e de 27,3 ha, para não proprietários, localizados em reassentamentos coletivos; e d) a concessão de cartas de crédito no valor de setenta mil reais, para proprietários e não proprietários, além da indenização pelas benfeitorias realizadas (Movimento..., 2008).
Uma questão polêmica refere-se à competência da Aneel para emitir declarações de utilidade pública das áreas necessárias
10
à implantação de usinas hidrelétricas, especialmente daquelas destinadas ao reassentamento das populações locais deslocadas. Essa discussão tem como ponto de partida a análise do enquadramento da desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos pela implantação de empreendimentos hidrelétricos, segundo os parâmetros estabelecidos na Constituição Federal. Isso porque a adoção de um ou outro fundamento constitucional terá diferentes implicações quanto à competência para a emissão da respectiva declaração expropriatória, definida em lei.
Abril/2016 – Ed. 229
Na desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária (art. 184 da Constituição Federal), a competência para a declaração expropriatória deve ser veiculada por meio de decreto do Presidente da República, sendo a promoção da desapropriação de competência exclusiva da União, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), autarquia federal criada por meio do Decreto nº 1.110, de 9 de julho de 1970.
11
Já em relação à desapropriação por necessidade ou utilidade pública e à desapropriação por interesse social (art. 5º, XXIV, da Constituição Federal), a regra é a competência concorrente da União, dos Estados, dos Municípios e dos Territórios para a emissão da declaração expropriatória, podendo a lei, excepcionalmente, atribuir competência declaratória a outros entes (Carvalho Filho, 2005, p. 635). Vejamos, então, em qual dessas modalidades se enquadra a desapropriação para fins de reassentamento, com o objetivo de se identificar a regra de competência declaratória aplicável à espécie.
2.1.1 Reassentamento dos atingidos por barragens: hipótese de reforma agrária? A pergunta que inicialmente se faz é se o reassentamento dos atingidos por barragens e, consequentemente, a declaração expropriatória emitida com esse fim obedecem às regras do instituto da desapropriação para fins de reforma agrária, o que afastaria a competência da Aneel para atuar nesse campo. Rememorando e separando os elementos que integram o problema jurídico, vê-se que a desapropriação em estudo implica a destinação das áreas expropriadas ao uso das populações deslocadas, que passam a viver em reassentamentos coletivos instalados nessas áreas. Tal destinação é apontada por alguns como elemento suficiente para a caracterização da realização de reforma agrária. Entende-se, contudo, que, apesar de ser uma das medidas adotadas na reforma agrária, essa não é uma característica exclusiva dessa modalidade de desapropriação. A desapropriação por interesse social também se opera predominantemente mediante destinação do bem expropriado a uma atividade de terceiros. Essa característica decorre da própria essência da desapropriação por interesse social, na medida em que é voltada para a justa distribuição da propriedade e para o bem-estar social, nos termos do art. 1º da Lei nº 4.132, de 10 de setembro de 1962, que regulamenta a referida modalidade expropriatória. Aliás, deve-se ter em mente que a desapropriação para fins de reforma agrária não é senão uma modalidade específica de desapropriação por interesse social, sendo, portanto, natural que muitas das características da desapropriação por interesse social sejam compartilhadas por essa modalidade específica de desapropriação (Salles, 2000, p. 107).
Como se vê, a existência de transferência das áreas desapropriadas para terceiros, apesar de configurar, em última análise, uma medida de justiça distributiva, não é suficiente para caracterizar o ato como desapropriação para fins de reforma agrária. Nos termos dos arts. 185 e 186 da Constituição Federal, o escopo da desapropriação para fins de reforma agrária é o de permitir a perda da propriedade, quando esta não esteja cumprindo sua função social, excluídas a pequena e média propriedade rural, assim definidas em lei, e a propriedade produtiva. Ou seja, a desapropriação destinada à promoção de reforma agrária insere-se em um projeto amplo, que reflete objetivo nacional de transformação da estrutura fundiária e de fomento ao progresso social e ao desenvolvimento econômico do País. Isso fica claro a partir da análise do conceito de reforma agrária trazido pela Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 (Estatuto da Terra): Art. 1º [...] Considera-se reforma agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e o aumento de produtividade.
Art. 16. A reforma agrária visa a estabelecer um sistema de relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra, capaz de promover na justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o desenvolvimento econômico do país com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio. (arts. 1º, § 1º, e 16 da Lei nº 4.504/1964)
Ocorre que a declaração destinada à desapropriação para fins de reassentamento das populações atingidas pelas barragens não é motivada pela eventual improdutividade da área a ser desapropriada ou pela má-distribuição da terra, mas sim por sua conveniência para o alojamento daquelas populações. A desapropriação de propriedade produtiva apenas é impedida quando se visar nela proceder à reforma agrária, o que não impede a desapropriação de tais terras por uma das outras razões que a lei assegura. Na desapropriação em estudo, as áreas expropriadas se destinam a possibilitar o remanejamento das populações atingidas pela construção de usinas hidrelétricas, mediante a construção de reassentamentos. Assim, o critério para a escolha da propriedade a ser desapropriada não é centrado na produtividade ou não da propriedade, mas sim na sua conveniência para o estabelecimento das famílias. As áreas de reassentamento deverão estar preferencialmente localizadas na mesma região, tendo em vista atenuar ao máximo o impacto sócio-cultural sobre os reassentados e sobre as áreas receptoras e ainda a desarticulação das economias locais ou regionais decorrente da saída de produtores, prestadores de serviços, comerciantes e consumidores para outras regiões (Centrais Elétricas..., v. 2, p. 40). Leva-se em consideração, ainda, se o potencial agronômico é compatível com a vocação das famílias a serem beneficiadas pelo plano de reassentamento e se atendem a diversos requisitos técnicos, como distância das sedes municipais, fácil acesso,
Abril/2016 – Ed. 229
Também em relação à desapropriação por utilidade pública, apesar de predominar a utilização do bem expropriado pelo próprio expropriante, esse elemento não lhe é essencial. Prova disso é que o Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, que regulamenta a desapropriação por utilidade pública, prevê casos de utilidade pública que implicam a entrega do bem expropriado para a utilização por terceiros, como, por exemplo, a criação e o melhoramento de centros de população (art. 5º, e), assistência pública, obras de higiene e decoração, casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes medicinais (art. 5º, g), funcionamento dos meios de transportes coletivos (art. 5º, j) e para fins de urbanização (art. 5º, i) (Salles, 2000, p. 107).
12
água suficiente, terras de boa qualidade e, se possível, com pastagens formadas, entre outros (Centrais Elétricas..., v. 2, p. 40). Ou seja, apesar de envolver a transferência da área a ser desapropriada para terceiros, esse tipo de declaração expropriatória não tem o objetivo de promover a redistribuição das propriedades improdutivas, mas sim o de reparar os prejuízos que a obra pública ocasionou às populações ribeirinhas ao desalojá-las do local onde viviam e de onde extraíam o seu meio de subsistência. Afasta-se, portanto, o enquadramento da desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos como hipótese de desapropriação para fins de reforma agrária.
2.1.2 R eassentamento dos atingidos por barragens: hipótese de interesse social ou utilidade pública?
Abril/2016 – Ed. 229
Ao se afastar a aplicação do pressuposto constitucional do interesse social para fins de reforma agrária, afasta-se, consequentemente, a competência exclusiva da União para promover a desapropriação e emitir a respectiva declaração expropriatória.
13
Isso porque, como já se disse, nas demais hipóteses de desapropriação previstas na Constituição Federal, a competência para a emissão da declaração expropriatória, em regra, é concorrente da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos Territórios, podendo a lei atribuir competência declaratória a outro ente (Carvalho Filho, 2005, p. 635). Quanto à diferenciação entre as hipóteses de necessidade ou utilidade pública e interesse social, a doutrina diz o seguinte: a) há utilidade pública, nesta se incluindo a necessidade pública, quando a transferência do bem se mostra conveniente para a Administração, sendo que, no caso de necessidade pública, há uma situação de emergência; e b) há interesse social quando
o Poder Público tem o objetivo preponderante de atenuar desigualdades sociais e promover o bem-estar social, mediante a justa distribuição da propriedade (Mello, 2002, p. 729-731). Ao se confrontar a desapropriação para fins de reassentamento com os conceitos traçados pela doutrina, percebem-se pontos de aproximação tanto em relação ao pressuposto da utilidade pública como ao do interesse social. A desapropriação para fins de reassentamento é uma medida necessária para a viabilização da realização de uma obra hidrelétrica, sendo que a realização dessa obra resulta de uma conveniência da Administração, consubstanciada no aumento da oferta de energia para atender à crescente demanda do referido insumo no País. Sob essa perspectiva, há uma identificação com a desapropriação por utilidade pública. Por outro lado, observa-se que a desapropriação em estudo visa a atenuar desigualdades sociais geradas a partir da realização de um empreendimento hidrelétrico, o que a aproxima da desapropriação por interesse social. Essa aparente ambiguidade decorre do fato de que os conceitos de utilidade pública e de interesse social são, em sua essência, conceitos jurídicos indeterminados, isto é, despojados de uma precisão que permita identificá-los a priori (Carvalho Filho, 2005, p. 617). A partir do reconhecimento desse fato, considerando que a desapropriação é uma limitação ao direito fundamental de propriedade, e que, como tal, apenas deve ser utilizada em casos excepcionais e expressamente previstos em lei, a maior parte da doutrina entende que tanto as hipóteses de utilidade pública, previstas no art. 5º do Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, como as hipóteses de interesse social, previstas no art. 2º da Lei nº 4.132, de 1962, são taxativas, e não meramente exemplificativas
Não se pode deixar de registrar, contudo, que alguns autores defendem que, ocorrendo caso de necessidade ou utilidade pública, ou de interesse social, ainda que não previsto em lei, será possível a desapropriação do bem pretendido pelo Poder Público para atendimento daquela finalidade, porque a revisão constitucional dos pressupostos da expropriação seria suficiente (Salles, 2000, p. 93-97). Sem embargo do posicionamento manifestado por esses autores, entende-se que a taxatividade dos casos de utilidade pública e de interesse social é fundamental para que o Judiciário tenha parâmetros para aferir a legalidade do ato administrativo, tanto mais quando se considera que esse ato envolve a restrição ao direito constitucional de propriedade. Partindo-se dessa premissa, passa-se à identificação das hipóteses legais que, em tese, poderiam ser utilizadas como fundamento para a desapropriação de áreas destinadas ao reassentamento de atingidos por barragens. São hipóteses de interesse social, nos termos do art. 2º da Lei nº 4.132, de 1962: Art. 2º Considera-se de interesse social: I – o aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros de população a que deve ou possa suprir por seu destino econômico; II – a instalação ou a intensificação das culturas nas áreas em cuja exploração não se obedeça a plano de zoneamento agrícola (Vetado); III – o estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas de povoamento e trabalho agrícola:
IV – a manutenção de posseiros em terrenos urbanos onde, com a tolerância expressa ou tácita do proprietário, tenham construído sua habilitação, formando núcleos residenciais de mais de 10 (dez) famílias; V – a construção de casa populares; VI – as terras e águas suscetíveis de valorização extraordinária, pela conclusão de obras e serviços públicos, notadamente de saneamento, portos, transporte, eletrificação armazenamento de água e irrigação, no caso em que não sejam ditas áreas socialmente aproveitadas; VII – a proteção do solo e a preservação de cursos e mananciais de água e de reservas florestais; VIII – a utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características, sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas. (Incluído pela Lei nº 6.513, de 20.12.1977)
A leitura das hipóteses de interesse social previstas na lei afasta qualquer tentativa de enquadramento da desapropriação para fins de reassentamento dos atingidos como modalidade de desapropriação por interesse social. Isso porque, embora a desapropriação em estudo possua pontos de aproximação em relação ao conceito de desapropriação por interesse social traçado abstratamente pela doutrina, as hipóteses de cabimento dessa modalidade previstas pelo legislador, por sua especificidade, não permitem o seu enquadramento como tal. Desse modo, considerando-se que o rol traçado pela Lei nº 4.132, de 1962, é taxativo e que as hipóteses específicas traçadas no referido instrumento legal não contemplam a desapropriação em estudo, afasta-se a possibilidade de enquadramento desse tipo de desapropriação como modalidade de desapropriação por interesse social. Já as hipóteses de utilidade pública, previstas no art. 5º do Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, são mais amplas, o que possibilita o enquadramento da desapropriação para fins de reassentamento dos atingidos por barragens em mais de uma hipótese prevista
Abril/2016 – Ed. 229
(Mello, 2002, p. 729-731; Di Pietro, 2001, p. 157-158; Carvalho Filho, 2005, p. 617; Harada, 2005, p. 37).
14
em lei, o que atrairia a competência concorrente da União, dos Estados, dos Municípios e dos Territórios para a emissão da respectiva declaração expropriatória. Pode-se pensar, por exemplo, que a desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos por barragens decorre de uma necessidade pública caracterizada por uma situação de calamidade (art. 5º, c, do Decreto-Lei nº 3.365/1941), ou de uma situação de utilidade pública pela criação e melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência (art. 5º, e, do Decreto-Lei nº 3.365/1941).
Abril/2016 – Ed. 229
Também se pode entender que a desapropriação em alusão se enquadra na hipótese contida na alínea f do art. 5º do Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, que considera caso de utilidade pública “o aproveitamento industrial [...] da energia hidráulica”.
15
Ao definir como caso de utilidade pública o aproveitamento industrial da energia hidráulica, o dispositivo legal em referência – não obstante tenha perdido parte de sua aplicabilidade com a transferência da titularidade dos potenciais hidráulicos para a União por meio do Código de Águas e, posteriormente, pela Constituição Federal de 1988 – poderia, em tese, ser considerado aplicável aos casos em que a implantação da estrutura necessária ao aproveitamento do potencial hidráulico dependa da utilização do instituto da desapropriação, seja para o enchimento do reservatório da usina e para a formação da área de preservação ambiental em seu entorno, seja para o reassentamento das populações deslocadas (Câmara Filho, 1994, p. 77-78). Contudo, como se verá em seguida, as hipóteses de utilidade pública, enumeradas em caráter genérico pelo Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, dão lugar a uma hipótese específica de utilidade pública prevista na legislação do setor elétrico, em relação à qual o legislador atribui expressamente à Aneel a competência para emitir a respectiva declaração expropriatória.
2.1.3 Hipótese de utilidade pública específica do setor elétrico: artigo 10 da Lei nº 9.074, de 1995 A Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, passou a prever hipótese específica de desapropriação por utilidade pública, atribuindo ao poder concedente a competência para emitir declaração para fins de desapropriação das áreas necessárias à implantação de instalações destinadas a serviços públicos de energia elétrica, autoprodutor e produtor independente. Confira-se a redação original do art. 10 da lei em referência: Art. 10. Cabe ao poder concedente declarar a utilidade pública para fins de desapropriação ou instituição de servidão administrativa, das áreas necessárias à implantação de instalações concedidas, destinadas a serviços públicos de energia elétrica, autoprodutor e produtor independente.
Posteriormente, a Lei nº 9.648, de 27 de maio de 1998, alterou a redação do art. 10 da Lei nº 9.074, de 1995, o qual, tendo em vista a criação da Aneel por meio da Lei nº 9.427, de 1996, passou a prever que a esta caberia emitir as declarações de utilidade pública das áreas necessárias às instalações de energia elétrica: Art. 10. Cabe à Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel declarar a utilidade pública, para fins de desapropriação ou instituição de servidão administrativa, das áreas necessárias à implantação de instalações de concessionários, permissionários e autorizados de energia elétrica.
Referido dispositivo veio a complementar, de maneira específica para o setor elétrico, o disposto na Lei de Concessões (Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995), que trata, de maneira genérica, da declaração de utilidade pública dos bens necessários à execução do serviço ou obra pública. Nesse sentido, dispõe o art. 29, VIII, da mencionada lei: Art. 29. Incumbe ao poder concedente: [...]
[...]
Um primeiro ponto que deve ser ressaltado é que a previsão de hipótese específica de utilidade pública encontra respaldo no Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, que, além dos casos de utilidade pública nele enumerados, se reporta aos “demais casos previstos em leis especiais” (art. 5º, p). Registre-se que, para os autores que defendem que o rol do art. 5º do Decreto-Lei nº 3.365/1941 é meramente exemplificativo, mostra-se despicienda a previsão contida na referida alínea p, diante da possibilidade de desapropriação de bens, sempre que se verificarem os pressupostos constitucionais de utilidade ou necessidade pública ou interesse social (Salles, 2000, p. 236). Feita essa observação inicial, questiona-se o alcance da expressão “áreas necessárias à implantação de instalações de concessionários, permissionários e autorizados de energia elétrica”. A interpretação literal da lei aponta para duas direções no que toca à questão do reassentamento dos atingidos por barragens.
de instalações de energia elétrica, como, por exemplo, as áreas de instalação do canteiro de obras e de enchimento dos reservatórios da usina, excluindo-se as demais áreas que, não obstante sejam necessárias ao processo de implantação do empreendimento como um todo, não são destinadas à implantação da usina em si. Outra interpretação possível é a de que, sendo o reassentamento das populações atingidas uma medida exigida pelos órgãos ambientais como condição para a emissão das licenças ambientais necessárias à implantação da obra hidrelétrica, as áreas destinadas a esse fim inserem-se no conceito de “áreas necessárias à implantação de instalações de energia elétrica”. Nesse sentido, a falta de previsão expressa de desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento das populações atingidas pela construção de barragens não significa impedimento legal, mas decorre da impossibilidade de o legislador prever todas as situações em que seria necessária a utilização do instituto da desapropriação para viabilizar a construção de usinas hidrelétricas.
2.2 Estudos de caso: Usinas Hidrelétricas Três Irmãos e São Salvador
Uma primeira interpretação possível é a de que as áreas destinadas ao reassentamento dos impactados por barragens não estão inseridas no conceito de “áreas necessárias à implantação de instalações de energia elétrica”, uma vez que, justamente por serem áreas que não foram diretamente afetadas pela construção da usina, passaram a ser utilizadas para o reassentamento das populações deslocadas.
Em pelo menos dois casos levados ao Judiciário se questionou se a desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento das populações deslocadas em razão da implantação de usinas hidrelétricas configura hipótese de desapropriação para fins de reforma agrária, o que atrairia a competência exclusiva da União para emitir a respectiva declaração expropriatória, por meio de decreto do Presidente da República.
Trata-se, como se vê, de uma interpretação mais restritiva, na medida em que apenas considera contidas no conceito trazido pela lei aquelas áreas diretamente necessárias à implantação
No caso da Usina Hidrelétrica São Salvador, no Estado do Tocantins, a Companhia Energética São Salvador (CESS) elaborou um plano de reassentamento das populações atingidas
Abril/2016 – Ed. 229
VIII – declarar de utilidade pública os bens necessários à execução do serviço ou obra pública, promovendo as desapropriações, diretamente ou mediante outorga de poderes à concessionária, caso em que será desta a responsabilidade pelas indenizações cabíveis;
16
pelo enchimento dos reservatórios e pela criação de uma área de preservação permanente em seu entorno. Objetivando dar execução ao referido plano, a concessionária solicitou e logrou obter junto à Aneel a declaração de utilidade pública das áreas necessárias ao reassentamento da população deslocada (Agência Nacional de Energia Elétrica, 2007, p. 46).
Abril/2016 – Ed. 229
Igualmente, no que se refere à implantação da Usina Hidrelétrica Três Irmãos, no Estado de São Paulo, a Companhia Energética de São Paulo (Cesp), objetivando dar execução ao plano de reassentamento das populações atingidas, solicitou a declaração de utilidade pública das áreas destinadas a essa finalidade. Nesse caso, diferentemente do que ocorreu em relação à Usina Hidrelétrica São Salvador, a declaração expropriatória foi emitida pelo Município de Pereira Barreto, no Estado de São Paulo, onde estavam localizadas as áreas a serem desapropriadas. Isso porque, à época dos fatos, ainda não havia sido criada a Aneel, o que só veio a ocorrer com a edição da Lei nº 9.427, de 1996, nem haviam sido editadas as Leis nºs 9.074, de 1995, e 9.478, de 1998, que instituíram hipótese específica de utilidade pública para fins de desapropriação das áreas atingidas por barragens.
17
Ainda que a discussão judicial travada no caso da Usina Hidrelétrica Três Irmãos seja anterior à própria criação da Aneel e à previsão legal da hipótese específica de utilidade pública ora em estudo, a sua análise, assim como a análise do caso refere à Usina São Salvador, é de grande valia para o presente trabalho. Isso porque em ambas as situações os proprietários dos imóveis rurais declarados de utilidade pública ajuizaram ação com o objetivo de ver anulada a declaração de utilidade pública emitida pelo Poder Público. Para isso, o fundamento utilizado foi o mesmo, isto é, de que a emissão do ato declaratório em tais casos caberia exclusivamente à União, por se tratar de modalidade de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária.
Longe de ser uma questão pacífica, várias foram as soluções dadas à questão pelo Judiciário, as quais podem ser divididas em dois grupos. O primeiro aponta para o entendimento de que a desapropriação para fins de reassentamento estaria inserida em um processo de reforma agrária, conduzido necessariamente pela União. O segundo entende que essa modalidade de desapropriação, não obstante envolva a destinação das áreas expropriadas ao reassentamento dos atingidos, não se confunde com a desapropriação para fins de reforma agrária. Segundo esse entendimento, a competência para a emissão da referida declaração seria concorrente da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e Territórios, nada impedindo que a lei atribua essa competência a outro ente. O Juízo da 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, no caso da Usina Hidrelétrica São Salvador, adotou a primeira interpretação, reforçada pelo entendimento de que, em matéria de desapropriação, a interpretação da lei deve ser restritiva, por se tratar de limitação ao direito fundamental de propriedade. Essa decisão ainda não transitou em julgado, devendo ser objeto de análise pelas instâncias superiores, em sede de recurso2. Já no tocante à Usina Hidrelétrica Três Irmãos, o Supremo Tribunal Federal, confirmando posicionamento adotado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, entendeu que a desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos pela construção do empreendimento em questão decorreu de uma necessidade pública, caracterizada por uma situação de calamidade, e de uma situação de utilidade pública pela criação e pelo melhoramento de centros de população, seu abastecimento regular de meios de subsistência (art. 5º, alíneas c e e, do Decreto-Lei nº 3.365/1941). 2 Mandado de Segurança nº 2008.34.00.020610-9/DF, em trâmite perante a 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal.
[...] Não se trata de reforma agrária, mas, sim, do esforço municipal para mitigar as “agruras daqueles atingidos pelo represamento das águas”, verdadeira calamidade pública. Uso útil e necessário, pois, do bem desapropriado o que autoriza a desapropriação como decretada, correlata a utilidade e a necessidade pública.
Nesse caso, portanto, prevaleceu a segunda orientação, de que não se trata de desapropriação para fins de reforma agrária, mas sim de desapropriação por utilidade pública. Nesse sentido, seria legítima a emissão pelo Município de Pereira Barreto da declaração expropriatória, considerando-se que, à época dos fatos, ainda não havia sido editada legislação específica do setor dando à Aneel a atribuição de emitir as declarações de utilidade pública das áreas necessárias à implantação de empreendimentos hidrelétricos. A pergunta que se faz, então, é qual dessas duas interpretações deve prevalecer. Para os que defendem que se deve excluir do conceito de “áreas necessárias à implantação de instalações de energia elétrica” aquelas para reassentamento das populações atingidas por barragens, prepondera a ideia segundo a qual, sendo a desapropriação uma limitação ao direito fundamental de propriedade, qualquer interpretação da lei deve ser feita de forma restritiva. Contudo, ainda que não houvesse lei específica sobre o assunto, várias hipóteses de utilidade pública previstas no Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, se amoldariam, em tese, à hipótese estudada. 3 STF, RE 198.765/SP, 1ª T., Rel. Min. Menezes Direito, J. 05.05.2009, DJe 04.09.2009.
Em outras palavras, ou a desapropriação para fins de reassentamento está abrangida pela hipótese prevista no art. 10 da Lei nº 9.074, de 1995, caso em que a competência declaratória será da Aneel, ou está abarcada pelas hipóteses previstas no Decreto nº 3.365, de 1941, caso em que a competência declaratória será concorrente dos entes da federação. A questão, portanto, tal como posta, cinge-se à definição do ente detentor de competência declaratória. A adoção de um posicionamento ou de outro repercute unicamente sobre qual deles será competente para a emissão da declaração expropriatória das terras destinadas ao reassentamento, e não sobre a existência, em si, de fundamento legal para a prática do referido ato expropriatório. Sob o aspecto da atuação regulatória da Aneel, entende-se que a interpretação que lhe assegura uma maior efetividade é a de que a declaração de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos insere-se no conceito previsto no art. 10 da Lei nº 9.074, de 1995. Reconhece-se, dessa forma, que a atuação da Aneel está voltada não só para o equilíbrio interno do setor, mas também para a inserção e a concretização de objetivos e princípios consagrados na Constituição Federal, como reflexo da consolidação do modelo regulador de Estado. Ao manifestar a sua vontade de promover a transferência de bens imóveis destinados ao reassentamento dessas populações deslocadas, por meio da emissão de uma declaração de utilidade pública, busca-se, em última análise, equilibrar os diferentes interesses em conflito, de forma a sopesar o excessivo ônus que recai sobre uma parcela da população em decorrência da realização de uma obra que trará benefícios para toda a coletividade, do ponto de vista do suprimento energético e do desenvolvimento socioeconômico.
Abril/2016 – Ed. 229
Ao analisar a competência do Município para declarar a utilidade pública das terras destinadas à implantação da Usina Três Irmãos, o Ministro Menezes Direito consignou em seu voto o seguinte3:
18
Ao buscar assegurar que uma parcela da população não sofra ônus excessivo em decorrência de uma obra de interesse nacional, a Aneel procura dar efetividade material ao princípio da isonomia. Isso implica dizer que, sob a perspectiva da atuação da Administração Pública, quaisquer atos que os órgãos administrativos pratiquem devem refletir a igualdade de oportunidade para todos os administrados (Mello, 2002, p. 56).
insere-se na competência regulatória da Aneel, sendo certo que a sua intervenção regulatória, em articulação com os órgãos ambientais, favorece o tratamento das questões relativas ao remanejamento dos impactados em correspondência com a realidade do setor, de forma a se buscar a consagração dos objetivos traçados pela Constituição Federal.
Além disso, busca-se assegurar a observância do princípio da proporcionalidade, segundo o qual as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e na intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para o cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. Ou seja, ninguém está obrigado a suportar constrições, em sua liberdade ou propriedade, que não sejam indispensáveis à satisfação do interesse público (Mello, 2002, p. 93).
CONCLUSÃO
Abril/2016 – Ed. 229
A simples retirada das populações que residem e trabalham na área de implantação de usinas hidrelétricas, sem a viabilização da adoção, pela concessionária, de medidas compensatórias que alcancem não só os proprietários, mas também aqueles que, apesar de não terem um título de propriedade, dependem economicamente das áreas impactadas, representaria um tratamento desigual e um ônus desproporcional para esse segmento da sociedade. A declaração de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento de tais populações visa justamente a possibilitar que a restrição imposta à situação jurídica das populações locais seja a menor possível, de forma que o cumprimento da finalidade de interesse público buscado com a realização da obra seja proporcional em relação aos efeitos indesejados.
19
Sob essa perspectiva, conclui-se que o acompanhamento do processo de implantação de empreendimentos hidrelétricos
Por meio do presente trabalho, observou-se que a atuação da Aneel no processo de reassentamento das populações deslocadas em razão da implantação de usinas hidrelétricas constitui questão polêmica, submetida, inclusive, ao crivo do Poder Judiciário. Na base de tais questionamentos está a assertiva de que a Aneel, ao emitir as declarações de utilidade pública das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos, estaria indo além de suas competências institucionais. Sob o pretexto de viabilizar a construção de um empreendimento hidrelétrico, a Aneel estaria promovendo atos típicos de reforma agrária, os quais, por força de norma constitucional expressa, são de competência exclusiva da União. Contudo, verificou-se, no presente trabalho, que a desapropriação das áreas destinadas ao reassentamento das populações ribeirinhas não constitui hipótese de desapropriação para fins de reforma agrária, mas sim de desapropriação por utilidade pública, por se tratar de medida motivada por sua conveniência para o alojamento daquelas populações, e não pela eventual improdutividade da área a ser desapropriada. Por outro lado, pode-se constatar que a emissão da referida declaração pela Aneel encontra respaldo na legislação específica do setor, que expressamente atribui àquela agência reguladora
A inclusão das áreas destinadas ao reassentamento dos atingidos no referido conceito legal decorre da percepção de que tal medida integra a análise acerca da viabilidade socioambiental do empreendimento realizada pelos órgãos ambientais como condição para o início da construção e da operação da usina. Sob outra perspectiva, o reassentamento das populações atingidas por barragens envolve um conflito de interesses, identificado, de um lado, pelos benefícios auferidos por toda a coletividade, com a realização da obra hidrelétrica, e, de outro, pelo excessivo ônus suportado pelas populações locais. Nesse contexto, a finalidade buscada por meio da emissão da declaração expropriatória para fins de reassentamento é a de promover o equilíbrio entre interesses conflitantes, propiciando a realização de valores alicerçados, em última análise, nos princípios da isonomia e da proporcionalidade. Portanto, a emissão da referida declaração pela Aneel, além de encontrar respaldo na Constituição Federal e na legislação específica do setor, serve para reafirmar o seu papel como ente regulador do setor elétrico. Trata-se de reflexo de uma atuação regulatória que, com a consolidação do modelo regulador de Estado, passa a abranger a busca do equilíbrio interno ao mercado, bem como busca introduzir objetivos de ordem geral que não seriam alcançados exclusivamente pela ação da livre iniciativa dos agentes econômicos.
REFERÊNCIAS BRASIL. Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Resolução nº 279, de 11 de setembro de 2007. Diário Oficial da União, 17 set. 2007. Seção 1, v. 144, n. 179, p. 72.
______. Resolução Autorizativa nº 1.217, de 22 de janeiro de 2008. Diário Oficial da União, 29 jan. 2008. Seção 1, v. 145, n. 20, p. 46. BANCO Mundial. Licenciamento ambiental de empreendimentos hidrelétricos no Brasil: uma contribuição para o debate: relatório principal. Washington: Banco Mundial, v. 2, 2008. Disponível em: <http://www.mme. gov.br/download.do?attachmentId=15209&download>. Acesso em: 9 jan. 2009. BLOEMER, Neusa Maria Sens. A hidrelétrica de Campos Novos: camponeses, migração compulsória e atuação do setor elétrico. In: REIS, Maria José; BLOEMER, Neusa Maria Sens (Org.). Hidrelétricas e populações locais. Florianópolis: UFSC, 2001. CÂMARA FILHO, Roberto Mattoso. A desapropriação por utilidade pública. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1994. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 13. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. CENTRAIS Elétricas Brasileiras AS (Eletrobrás). Plano diretor de meio ambiente: 1991-1993. Rio de Janeiro, 1990. 2 v. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001. HARADA, Kiyoshi. Desapropriação: doutrina e prática. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Agências reguladoras independentes: fundamentos e seu regime jurídico. Belo Horizonte: Fórum, 2005. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. MOVIMENTO dos Atingidos por Barragens. Violações de direitos humanos na UHE Estreito. Movimento dos Atingidos por Barragens. Disponível em: <http://www.mabnacional.org.br/noticias/101208_uhe_estreito.html>. Acesso em: 10 dez. 2008. SALLES, José Carlos de Moraes. A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. SILVEIRA, Luiz. Um novo modelo para obras de hidrelétricas. Gazeta Mercantil, 19 dez. 2008.
Abril/2016 – Ed. 229
a competência para declarar a utilidade pública das “áreas necessárias à implantação de empreendimentos hidrelétricos”.
20
Doutrina
Legalidade da Taxa Selic em Matéria Tributária JOSÉ CARLOS FRANCISCO
Professor na Universidade Mackenzie/SP, Professor na Fundação Getúlio Vargas (FGV-Law), Professor no Centro de Extensão Universitária – CEU/SP, Professor no Curso FMB, Professor na Escola Paulista de Direito Social, Mestre e Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo – USP, Juiz Federal na 3ª Região.
A aplicação de juros pela taxa apurada no Sistema Especial de Liquidação e Custódia do Bacen (Selic) às obrigações tributárias devidas pelo sujeito passivo é cercada de polêmicas, dentre elas o seu fundamento normativo e a cumulação de juros moratórios com juros compensatórios. Sobre essa questão, primeiramente, observo que os juros, quanto à sua causa ou fundamento, podem ser moratórios (importando em reposição pelo atraso no pagamento) e remuneratórios (quando compensam a utilização do dinheiro alheio, privando seu legítimo titular do emprego econômico de seu patrimônio). De outro lado, quanto à forma de cálculo, os juros podem ser pré-fixados, pós-fixados ou flutuantes, ao passo que, quanto ao tempo, os juros podem ser iniciais e finais. A taxa de juros a ser aplicada é tema de direito material, razão pela qual será definida pela legislação vigente ao tempo em que a obrigação pendia sem adimplemento, vale dizer, durante a mora do sujeito passivo, em respeito ao princípio tempus regit actum e à irretroatividade da lei em prejuízo do indivíduo.
Em matéria tributária, normalmente, há padronização dos juros exigidos pela Administração Fazendária, cabendo à lei a indicação de qual taxa será cobrada. Na ausência de previsão legal, aplica-se a regra geral do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (CTN, que possui força normativa de lei complementar nesse ponto em razão de recepção pelo art. 146, III, da Constituição vigente), segundo o qual: “Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês”, valendo observar que essa apuração é linear (ou seja, os juros não são capitalizáveis). Em se tratando de exações federais, há legislação específica prevendo a aplicação de Selic às dívidas tributárias (sejam pagas em atraso, parceladas ou não), tais como o art. 34, parágrafo único, da Lei nº 8.212/1991, na redação dada pela Lei nº 9.528/1997: As contribuições sociais e outras importâncias arrecadadas pelo INSS, incluídas ou não em notificação fiscal de lançamento, pagas com atraso, objeto ou não de parcelamento, ficam sujeitas aos juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia-Selic, a que se refere o art. 13 da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995, incidentes sobre o valor atualizado, e multa de mora, todos de caráter irrelevável. Parágrafo único. O percentual dos juros moratórios relativos aos meses de vencimentos ou pagamentos das contribuições corresponderá a um por cento.
No mesmo sentido, está o art. 14, III, da Lei nº 9.250/1995, segundo o qual:
Há, ainda, o art. 5º, § 3º, da Lei nº 9.430/1996, nos seguintes termos: O imposto de renda devido, apurado na forma do art. 1º, será pago em quota única, até o último dia útil do mês subseqüente ao do encerramento do período de apuração. [...] § 3º As quotas do imposto serão acrescidas de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – Selic, para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir do primeiro dia do segundo mês subseqüente ao do encerramento do período de apuração até o último dia do mês anterior ao do pagamento e de um por cento no mês do pagamento.
Também é muito comum a incidência de juros em casos de dívidas consolidadas para fins de parcelamento, cabendo à lei a fixação da taxa a ser empregada, que pode ser a Taxa de Juros a Longo Prazo (TJLP), Taxa Referencial (TR) e, até mesmo, a Selic. Portanto, não há que se falar em violação à legalidade em razão de inexistência de leis tributárias prevendo a aplicação da Selic. É verdade que os critérios de apuração da Selic constam de resoluções do Bacen ou circulares (por exemplo, Resolução Bacen nº 1.124/1986 e Circular Bacen nº 2.868/99, Circular Bacen nº 2.900/1999 e Circular Bacen nº 3.108/2002), mas esses atos normativos encontram parâmetros nos limites gerais indicados na Lei nº 4.595/1964.
Os meios empregados pela Lei nº 4.595/1964 para definir a estrutura do sistema monetário têm sido considerados vagos, pois confiam ao regulamento a tarefa de normatização de conjuntura. Embora o Constituinte de 1988 tenha conferido competência normativa ao Congresso Nacional para tratar do tema (na forma de lei, nos termos dos incisos XIII e XIV do art. 48 da Constituição), isso não significa que a lei formal do Legislativo deva tratar de todos os aspectos pertinentes ao sistema monetário, mas importa em exigir que nela constem limites gerais mais claros que darão a estrutura das medidas que serão empregadas na conjuntura econômica. Vale observar que o Conselho Monetário Nacional (CMN) integra a estrutura básica da Administração Federal, sendo que a Lei nº 4.595/1964, em seu art. 3º, estabelece traços gerais das políticas a serem implementadas (incluindo limites de sua competência). Essa transferência de competência para o CMN, promovida pela nº Lei 4.595/1964, está abrigada pelo previsto no art. 25 do ADCT, tendo sido considerada pelo Congresso Nacional como delegação legislativa, sobre o que foram editadas as Leis nº 7.770/1989, nº 8.392/1991 (art. 1º) e Lei nº 9.069/1995 (art. 73), as quais prorrogaram a competência do CMN até a promulgação da lei complementar referida no caput do art. 192 da Constituição vigente. Ou seja, a Selic tem fundamento normativo válido tanto para seu cálculo (leis que prorrogam a competência do CMN com amparo no art. 25 do ADCT) quanto para aplicação em matéria tributária, incluindo o recolhimento dos tributos em atraso. Tratando do tema, Simone Lahorgue Nunes (Os fundamentos e os limites do poder regulamentar no âmbito do mercado financeiro, Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 81), após admitir, apenas como hipótese, que o art. 25 do ADCT impõe a revogação da Lei nº 4.595 no que tange ao Conselho Monetário Nacional, observa o seguinte: “Das duas, uma: (i) ou o sistema financeiro nacional como um todo deixará de funcionar por falta de regulamentação;
Abril/2016 – Ed. 229
À opção do contribuinte, o saldo do imposto a pagar poderá ser parcelado em até seis quotas iguais, mensais e sucessivas, observado o seguinte: [...] III – as demais quotas, acrescidas de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data prevista para a entrega da declaração de rendimentos até o mês anterior ao do pagamento e de 1% no mês do pagamento, vencerão no último dia útil de cada mês.
22
Abril/2016 – Ed. 229
(ii) ou a nova lei conterá no seu texto a regulamentação de todo o sistema, o que significa dizer que deverá tal lei dispor sobre a matéria que é diariamente regulamentada em um grande número de resoluções e circulares.” Ainda que esses atos legislativos simplifiquem a discussão sobre os termos gerais previstos na Lei nº 4.595/1964, considerando-os como delegação para evitar questionamentos sobre a amplitude decisória que confia ao Executivo, é duvidoso que nova lei poderá tratar do tema de maneira pormenorizada e, ainda assim, permitir a necessária mobilidade e eficiência na condução da política monetária. Assim, são inaplicáveis ao presente o entendimento contido na ADIn 493 (RTJ 143/724) e nas Súmulas nº 160 e nº 176, ambas do eg. STJ.
23
Acerca da composição da Selic (se é apenas juros ou também correção monetária), embora sistematicamente seja chamada de taxa de juros, é de extrema relevância observar que a Selic, de fato, é taxa de “remuneração”, pois abrange correção monetária e juros, o que impede que a mesma seja aplicada, cumulativamente, com qualquer outro índice de correção ou de juros. Com efeito, a Selic é calculada para remunerar (com correção monetária e juros) operações de overnight realizadas no Sistema de Liquidação e Custódia do Bacen (opera com LTN, LFT, MTN, MBC, LBC etc.). Assim, a Selic é empregada, em matéria tributária, como forma remuneratória e moratória, sendo impossível cumulá-la com correção ou juros, sob pena de bis in idem (note-se que há aplicação da Selic acumulada do termo inicial da obrigação até o pagamento, mas no mês efetivo da quitação aplica-se 1%, pois a Selic ainda não foi apurada (não sendo necessário ajuste posterior à apuração). Reconheço que há discussões sobre ao fato de a Selic ser elevada para aplicação à matéria tributária. Esse tema é da competência discricionária do agente normativo, mas cumpre observar que apenas em casos de manifesto descabimento da medida é possível ao Poder Judiciário declarar a invalidade dos
atos discricionários do Poder Executivo e do Poder Legislativo, o que não nos parece ocorrer no caso em tela. Note-se que se a taxa de juros for irrisória, contribuintes podem ser tentados a não pagar o tributo tempestivamente, fazendo posterior recolhimento (em caso de extrema necessidade ou em razão de anistias ou planos especiais de parcelamento), muitas vezes, excluindo a multa moratória pelo instituto da denúncia espontânea, sem falar em hipóteses de decadência do poder-dever de lançar. Portanto, rejeitamos argumentos quanto à violação do Decreto nº 22.626/1933 (Lei da “Usura”), até porque esse ato normativo não é aplicado aos bancos nem ao Poder Público (DL 1.113/1939 e Lei nº 4.595/1964, valendo, também, anotar a Súmula nº 596, do eg. STF), tanto que o art. 192, § 3º, da Constituição de 1988 foi revogado pela Emenda nº 40/2003. Não há meios seguros para afirmar que o atraso da obrigação fiscal gera “ganho” para o Fisco ou para o contribuinte, já que a diversidade dos índices de correção monetária impede afirmações nesse sentido (em decorrência dos elementos que definem a “cesta de produtos” que compõe sua base de cálculo). Note-se que se houver ganhos para o Fisco, também haverá para o contribuinte que promove a compensação ou que recebe a restituição também pela Selic (por exemplo, arts. 16 e 39, § 4º, ambos da Lei nº 9.250/1995, na recuperação do indébito mediante restituição ou compensação), em visível tratamento isonômico. Afinal, ante aos naturais critérios de apuração e aplicação da Selic, nos termos da legislação de regência, não há que se falar em vedação à capitalização da taxa de juros. Embora reconheçamos a existência de entendimento diverso em precedentes do eg. STJ, verificamos que o eg. STF, tratando do tema (ADIn 1933 MC/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nelson Jobim, v.u., DJ 31.05.2002, p. 041), decidiu que:
Por sua vez, na ADIn 2214 MC/MS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, v.u., DJ 19.04.2002, p. 045, constou que: [...] Lei nº 1.952, de 19 de março de 1999, do Estado do Mato Grosso do Sul, que transfere os depósitos judiciais, referentes a tributos estaduais, à conta do Erário da unidade federada. Não-ocorrência de violação aos princípios constitucionais da separação dos Poderes, da isonomia e do devido processo legal (CF, arts. 2º e 5º, caput e inciso LIV), e ao art. 148, I e II, da Carta Federal. 3. Incólume permanece o princípio da separação dos Poderes, porquanto os depósitos judiciais não são atos submetidos à atividade jurisdicional, tendo natureza administrativa, da mesma forma que os precatórios. 4. A isonomia é resguardada, visto que a lei estadual prevê a aplicação da taxa Selic, que traduz rigorosa igualdade de tratamento entre o contribuinte e o Fisco. 5. Devolução do depósito após o trânsito em julgado já prevista no art. 32 da Lei de Execuções Fiscais – Lei nº 6.830, de 22 de dezembro de 1980. Inexistência de ofensa ao princípio do devido processo legal. 6. O depósito judicial, sendo uma faculdade do contribuinte a ser exercida ou não, dependendo de sua vontade, não tem característica de empréstimo compulsório, nem índole confiscatória (CF, art. 150, IV), pois o mesmo valor corrigido monetariamente lhe será restituído se vencedor na ação, rendendo juros com taxa de melhor aproveitamento do que à época anterior à vigência da norma [...]
Esse entendimento também foi abrigado no eg. TRF da 3ª Região, como se pode notar na AC 434483, 3ª T., Relª Desª Fed. Cecília Marcondes, v.u., DJU de 28.01.2004, p. 143: [...] II – O art. 161, § 1º, do CTN, prevê a possibilidade de regulamentação da taxa de juros por lei extravagante. Havendo expressa previsão legal, nenhuma ilegalidade milita contra a incidência da taxa Selic. O art. 192, § 3º, da CF/1988, que tratava da limitação da taxa de juros e fora expressamente revogado pela Emenda Constitucional nº 40, de
29.05.2003, dependia de lei complementar regulamentadora para sua eficácia (STF, RE 178.263-3/RS), reportando-se tal limitação ao Sistema Financeiro Nacional [...]
A mesma linha também resta assentada na AMS 226462, 3ª T., Rel. Des. Fed. Carlos Muta, v.u., DJU 30.07.2003, p. 353: CONSTITUCIONAL – TRIBUTÁRIO – CONFISSÃO DE DÉBITO PARA EFEITO DE PARCELAMENTO – DENÚNCIA ESPONTÂNEA – AUSÊNCIA – MULTA MORATÓRIA – CABIMENTO – ARTIGO 138, CTN – SÚMULA Nº 208/TFR – JUROS MORATÓRIOS – TAXA SELIC – VALIDADE. 1. Os contribuintes que efetivamente recolhem o tributo, no prazo ou fora dele – porém, neste último caso, com os encargos legais respectivos –, não podem ser equiparados àqueles outros que, embora confessando a dívida antes de qualquer procedimento fiscal, não efetuam pagamento, enquanto quitação com efeito de extinção do crédito tributário (art. 156, I, CTN), mas apenas contratam o seu parcelamento, assim remetendo para data futura a plena satisfação do interesse fiscal. 2. A confissão da dívida garante ao contribuinte, como benefício, a regularização si et in quantum de sua situação fiscal, com o que se afastam as penalidades da inadimplência, permitindo-lhe efetuar os recolhimentos do tributo a longo prazo, e gozar do direito à expedição de certidão fiscal respectiva. 3. Não permite a legislação tributária que, além de tais benefícios, sejam conferidos outros como a própria exclusão da multa moratória, encargo que é conseqüência da inadimplência anteriormente apurada (fato consumado), e cujo cabimento foi pactuado no acordo de parcelamento, firmando, assim, ato jurídico perfeito, a que se vinculam as partes. 4. O cumprimento regular do parcelamento projeta efeitos futuros, impedindo a aplicação de penalidades fiscais ou outra forma qualquer de restrição a direito em face da adimplência doravante verificada, mas não importa, em absoluto, no reconhecimento do direito do contribuinte à exclusão dos encargos resultantes da inadimplência consumada no passado, pactuados no acordo, cujos benefícios são expressos. 5. É isonômica a interpretação que diferencia o pagamento do tributo no prazo legal – ou, fora dele, mas com os encargos legais –, da mera confissão da dívida com pedido de parcelamento, para efeito de atribuir ao contribuinte, nesta última situação, o encargo da multa moratória, afastando a hipótese configuradora de denúncia espontânea. 6. A supressão de tal encargo, no caso de parcelamento, ao contrário de viabilizar a recuperação de créditos tributários duvidosos, tende a estimular a ampliação da inadimplência, na medida em que a capitalização dos contribuintes, com base nos recursos sonegados ao Fisco e com a possibilidade da vantagem específica de
Abril/2016 – Ed. 229
Constitucional. Lei federal que dispõe sobre os depósitos judiciais e extra judiciais de tributos e contribuições federais. Determina que os valores sejam repassados à conta única do tesouro nacional. Alegada violação ao princípio de separação dos poderes, da isonomia e devido processo legal. Remuneração dos depósitos pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custodia. Rentabilidade superior ao sistema anterior à Lei nº 9.703/1998. Ausência de plausibilidade jurídica. Liminar indeferida.
24
reequilibrar a competitividade econômica e comercial entre concorrentes, seja mais favorável economicamente do que a própria regularidade fiscal. 7. A aplicação da Súmula nº 208/TFR, na exegese do art. 138 do CTN, consolida um tratamento isonômico para os contribuintes e confere ao interesse público, que não se confunde com o interesse meramente fiscal, o seu devido alcance. 8. O percentual legalmente fixado para a multa moratória justifica-se pela natureza punitiva do encargo, não podendo, assim, ser equiparada, no tratamento jurídico, ao tributo – que, por conceito, não pode corresponder à sanção por ato ilícito –, ou a outros institutos jurídicos, de natureza distinta ou com aplicação em relações jurídicas específicas (correção monetária, juros moratórios e multa moratória nas relações privadas – Código de Defesa do Consumidor). 9. O limite de 12%, a título de juros (§ 3º do art. 192 da CF), tem incidência prevista apenas para os contratos de crédito concedido no âmbito do sistema financeiro nacional, o que impede sua aplicação nas relações tributárias, estando, ademais, a norma limitadora a depender de regulamentação legal para produzir eficácia plena, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. O art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, permite que a lei ordinária fixe o percentual dos juros moratórios. Finalmente, a aplicação da taxa Selic, como juros moratórios, encontra respaldo legal, não ofendendo qualquer preceito constitucional: precedentes.
Abril/2016 – Ed. 229
No Primeiro Conselho de Contribuintes, Primeira Câmara, no Recurso Voluntário nº 128490 (Processo nº 10880.041204/95-67, Relª Cons. Sandra Maria Faroni, m.v.), em embargos de declaração, restou assentado que:
25
Acolhem-se os embargos de declaração para deixar claro que, na execução do acórdão, os juros de mora à taxa Selic só incidem sobre o valor do tributo, não alcançando o valor da multa aplicada. Sobre a multa podem incidir juros de mora à taxa de 1% ao mês, contados a partir do vencimento do prazo para impugnação.
Em conclusão, acreditamos que, em matéria de exações, a aplicação da Selic encontra fundamento jurídico válido tanto para seu cálculo quanto para sua aplicação em tributos a recolher (atrasados ou parcelados) ou a serem restituídos, restando como recomposição de natureza moratória, inacumulável com outras espécies de juros (moratórios ou compensatórios) e com a correção monetária.
Doutrina
A Percepção Ecológica dos Pobres RAFAEL CARRARD
Defensor Público do Estado do Rio Grande do Sul, Mestrando em Direito na Universidade de Caxias do Sul.
RESUMO: As lutas entre classes sociais não são de hoje. Durante séculos pautaram a existência da humanidade. Como não poderia deixar de ser, diante da crescente preocupação com o meio ambiente verificada nas últimas décadas, as diferenças sociais contaminaram as discussões sobre o tema. Visões distintas acerca do meio ambiente variam de acordo com a realidade social dos indivíduos. O presente estudo visa exatamente a identificar em que medida ocorrem aludidas percepções diferentes, quais as causas do fenômeno e possíveis soluções para o problema, de maneira que se garanta a todos, sem limitações, um meio ambiente sadio, verdadeiro objetivo traçado pela Constituição Federal. PALAVRAS-CHAVE: Correntes do ecologismo; pobres; hipossuficiência. SUMÁRIO: Introdução; A realidade social da população pobre brasileira; O ecologismo dos hipossuficientes; O caminho a ser seguido.
portanto, o Estado brasileiro denota virtude ao laborar, no plano ideal, de forma indistinta em favor de todo o seu povo. O presente estudo, no entanto, ainda que, de forma sintética, busca ir além da mera análise jurídica da realidade ambiental brasileira. Os apontamentos a seguir formulados preocupam-se, de sobremaneira, com a efetividade das disposições constitucionais, especialmente em face da triste realidade legislativa nacional, tão pródiga em prever e distribuir direitos, mas que encontra seríssimas dificuldades em tornar concretas as conquistas constitucionais, especialmente das pessoas menos abastadas financeiramente e desprotegidas socialmente. O problema proposto, então, passa pela verificação da realidade da população social e economicamente frágil, infelizmente representada pela grande maioria dos brasileiros, que acaba por dividir, obrigatoriamente, eventuais preocupações ambientais com questões ligadas à própria sobrevivência, visto que a realidade econômica a qual estão submetidas direciona suas aflições, prioritariamente, para ações básicas da condição humana, como comer, vestir-se e locomover-se.
INTRODUÇÃO
As ponderações do presente texto, de igual sorte, também se ocupam com o que se convencionou chamar de “ecologismo dos pobres”, movimento social que se preocupa com os anseios da população que mais sofre com a degradação ambiental.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, erigiu o meio ambiente à condição de direito universal, ou, em outras palavras, formulou preceito explícito de caráter genérico, sem destinatários específicos.
A REALIDADE SOCIAL DA POPULAÇÃO POBRE BRASILEIRA
Tanto a Carta Política brasileira como toda a legislação infraconstitucional – em momento algum – afirmam qualquer distinção entre os beneficiários do meio ambiente sadio. Do ponto de vista formal,
A harmonia entre o homem e o meio ambiente pressupõe o bem-estar do primeiro, independentemente da sua condição social, com o mínimo de prejuízo ao segundo, de forma que não se inviabilize a
mesma relação para as gerações futuras. Dito de forma diversa, a meta a ser atingida é a da sustentabilidade verdadeiramente eficaz, tão falada e idealizada, mas tão difícil de ser atingida. Gilberto Montibeller-Filho1, ao citar Sachs, consigna a existência de cinco dimensões da “sustentabilidade do ecodesenvolvimento”: sustentabilidades social, econômica, ecológica, espacial e cultural. Sintetiza a sustentabilidade social da seguinte forma: O processo deve se dar de maneira que se reduzam substancialmente as diferenças sociais. E considerar o desenvolvimento em sua multidimensionalidade, abrangendo todo o espectro de necessidades materiais e não materiais. (Sachs, 1993, p. 25)
Abril/2016 – Ed. 229
Juarez Freitas2, ao também analisar as inúmeras dimensões da sustentabilidade, refere a necessidade de se imprimir ao termo uma conotação social. Para ele, “não se pode admitir um modelo excludente, pois de nada serve cogitar da sobrevivência de poucos ou do estilo oligárquico relapso e indiferente, que nega a conexão de todos os seres e a ligação de tudo”.
27
Portanto, os sistemas constitucional e legal vigentes deveriam redundar em realidade inclusiva, pela qual todos pudessem usufruir de maneira igualitária dos benefícios de um meio ambiente rico e diversificado como o brasileiro. As brutais diferenças sociais que singularizam o País desde o descobrimento demonstram, todavia, que a natureza da relação travada entre o homem e o meio ambiente está intimamente ligada à condição econômica e social de certos grupos, ou seja, há inúmeras formas de o homem relacionar-se com o ambiente em que vive. 1 MONTIBELLER-FILHO, Gilberto. O mito do desenvolvimento sustentável. Florianópolis: Editora da UFSC, 2008. p. 53. 2 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade – Direito ao futuro. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 55.
Para que seja possível se identificar as condições socioeconômicas da população brasileira, requisito prévio para a correta compreensão do tema proposto, indispensável a análise de alguns dados relevantes. Registros estatísticos indicam um choque de realidade. Segundo números do IBGE3 coletados no Censo Demográfico 2010, muito embora o brasileiro, no ano de referência, tivesse renda média de R$ 668,00, 25% das pessoas contavam com rendimento médio nominal mensal domiciliar per capita de até R$ 188,00, sendo que metade da população recebia até R$ 375,00, valor inferior ao salário-mínimo da época do estudo (R$ 510,00). Enquanto cerca da metade da população urbana recebia, em média, até R$ 415,00, nas áreas rurais esse valor era de aproximadamente R$ 170,00. Isso que foram consideradas apenas pessoas e domicílios com declaração de rendimento positivo, excluindo aqueles indivíduos ou lares com renda zero ou sem declaração. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – Dieese, em abril de 2010, portanto no mesmo período do Censo 2010, Porto Alegre contava com cesta básica calculada em R$ 268,72 e São Paulo, em R$ 261,394. Segundo o mesmo estudo, o salário-mínimo necessário para suprir as despesas de um trabalhador e sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência, deveria ser, em abril de 2010, de R$ 2.257,52, o que correspondia a 4,42 vezes o piso de fato pago no mês de referência, que era de R$ 510,00. 3 Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=2019&id_pagina=1>. Acesso em: 16 ago. 2012. 4 Disponível em: <http://www.dieese.org.br/rel/rac/racmai10.pdf>. Acesso em: 16 ago. 2012.
Basta simples cálculo aritmético para se constatar que somente com alimentação, item indispensável para sua sobrevivência, o brasileiro consome praticamente a totalidade dos seus rendimentos. Não bastassem os dados apresentados, é público e notório que a condição de hipossuficiência econômica, aqui utilizada apenas a título exemplificativo entre outras várias espécies de hipossuficiência, é fonte indutora da hipossuficiência social, mais abrangente do que a mera precariedade financeira. A população extremamente pobre acaba por sofrer com as consequências naturais da falta de recursos, que podem ser identificadas, entre outras, na debilidade da estrutura sanitária, na falta de adequado atendimento médico e de representatividade política efetiva e na inexistência de atividades de lazer. Disso se conclui que a maior parte da população brasileira acaba por se preocupar apenas em sobreviver, não em viver com qualidade. Questões estranhas a aludido contexto acabam em um plano secundário e irrelevante. O IBGE, em 2008, realizou pesquisa sobre saneamento básico nos Municípios brasileiros. Por meio do estudo, foi possível se concluir que pouco se avançou desde 2000, especialmente no que diz respeito à rede coletora de esgoto, cuja deficiência ocasiona redução expressiva na qualidade de vida dos cidadãos. Os dados foram sintetizados na seguinte tabela5: Tabela 1 – Municípios, total e com algum serviço de saneamento básico, por tipo de serviço, segundo as Grandes Regiões e as Unidades da Federação – 2000/2008. Municípios Com algum serviço de saneamento básico
Brasil Norte Rondônia Acre Amazonas Roraima Pará Amapá Tocantins
Tipo de serviço
Total 2000 5 507 449 52 22 62 15 143 16 139
Total 2008 5 564 449 52 22 62 15 143 16 139
2000 5 497 446 51 22 62 15 141 16 139
Rede geral de distribuição de água 2008 5 564 449 52 22 62 15 143 16 139
2000 5 391 422 39 22 60 15 132 16 138
2008 5 531 442 48 22 62 15 140 16 139
Rede coletora de esgoto 2000 2 877 32 5 3 1 2 12 5 4
2008 3 069 60 5 6 11 6 9 5 18
Manejo de resíduos sólidos 2000 5 475 445 51 22 61 15 141 16 139
2008 5 562 449 52 22 62 15 143 16 139
Manejo de águas pluviais 2000 4 327 222 21 11 30 4 103 6 47
5 Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb2008/PNSB_2008.pdf>. Acesso em: 16 ago. 2012.
2008 5 256 403 46 22 46 15 134 3 137
Abril/2016 – Ed. 229
Grandes Regiões e Unidades da Federação
28
Municípios Com algum serviço de saneamento básico Grandes Regiões e Unidades da Federação
Total
Rede geral de distribuição de água
Rede coletora de esgoto
Manejo de resíduos sólidos
Manejo de águas pluviais
2000
2008
2000
2008
2000
2008
2000
2008
2000
2008
2000
2008
1 787
1 793
1 782
1 793
1 722
1 772
767
819
1 769
1 792
1 227
1 615
Maranhão
217
217
212
217
198
215
6
14
204
216
109
209
Piauí
221
223
221
223
200
218
3
10
217
223
211
223
Ceará
184
184
184
184
183
184
90
128
184
184
124
183
Rio Grande do Norte
166
167
166
167
159
167
52
59
165
167
14
167
Paraíba
223
223
223
223
211
212
131
163
223
223
180
222
Pernambuco
185
185
185
185
182
185
166
163
185
185
169
169
Alagoas
101
102
101
102
101
102
38
42
101
102
85
87
Sergipe
75
75
75
75
75
75
50
26
75
75
71
75
Bahia
415
417
415
417
413
414
231
214
415
417
264
280
1 666
1 668
1 666
1 668
1 666
1 668
1 547
1 586
1 666
1 667
1 468
1 643
Minas Gerais
853
853
853
853
853
853
757
781
853
853
671
831
Espírito Santo
77
78
77
78
77
78
70
76
77
78
77
76
Rio de Janeiro
91
92
91
92
91
92
79
85
91
91
90
91
São Paulo
645
645
645
645
645
645
641
644
645
645
630
645
1 159
1 188
1 157
1 188
1 142
1 185
451
472
1 149
1 188
1 094
1 172
Paraná
399
399
399
399
398
399
152
168
399
399
377
399
Santa Catarina
293
293
292
293
283
292
87
103
291
293
269
292
Rio Grande do Sul
467
496
466
496
461
494
212
201
459
496
448
481
Centro-Oeste
446
466
446
466
439
464
80
132
446
466
316
423
Mato Grosso do Sul
77
78
77
78
77
78
24
35
77
78
72
78
Mato Grosso
126
141
126
141
119
139
18
27
126
141
97
98
Goiás
242
246
242
246
242
246
37
69
242
246
146
246
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
Nordeste
Sudeste
Sul
Abril/2016 – Ed. 229
Tipo de serviço
Total
Distrito Federal
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais, Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2000/2008.
29
Nota: O Município pode apresentar mais de um tipo de serviço de saneamento básico.
Na análise da rede coletora de esgoto, os únicos estados com mais da metade dos domicílios atendidos por rede geral foram Distrito Federal (86,3%), São Paulo (82,1%) e Minas Gerais (68,9%). O Rio de Janeiro (49,2%) e o Paraná (46,3%), com quase metade dos domicílios atendidos, situaram-se acima da média nacional (44,0%), enquanto os demais apresentaram menos de 35% de cobertura, ficando as menores proporções com os Estados do Amapá (3,5%), Pará (1,7%) e Rondônia (1,6).
grande desafio a ser vencido, o de aproximar a parcela mais pobre da sociedade nacional de uma cultura ambiental sadia.
Diante dos dados informados, fica claro que a baixa renda do povo brasileiro, somada à falta de estrutura básica que permita o mínimo de qualidade de vida, remete o meio ambiente a uma das últimas colocações no rol de prioridades da população.
A providência, contudo, não é fácil. Desde sempre os mais ricos exploraram os mais pobres, não só nas relações pessoais, como também nas relações entre os Estados.
O ECOLOGISMO DOS HIPOSSUFICIENTES Juarez Freitas6, ao tratar da necessidade de mudanças de paradigma para a garantia de um ambiente “duradouramente limpo”, diz que a busca por esse ideal requer “(a) acentuada transcendência do vigente modelo calcado no anacrônico patrimonialismo insaciável, assim como (b) a geração de novas memórias, aptas a gravar valores que os tempos não consigam facilmente extinguir”. Essas “novas memórias”, que podem ser traduzidas em novos e firmes valores ambientais, não estão sendo gravadas no íntimo da maior parte da população brasileira. Ainda que indiscutivelmente tenha havido progresso nas últimas décadas, há um 6 FREITAS, Juarez. Op. cit., p. 17.
Maude Barlow e Tony Clarke7 relatam que os países nórdicos são responsáveis por uma quantidade desproporcional de consumo de água no mundo, não só pelos seus hábitos individuais e por seu estilo de vida, mas também porque a maior parte das indústrias situa-se no Norte, sendo que onde há indústria há consumo de água em excesso. Não há, no sistema capitalista moderno, qualquer preocupação daqueles que têm com aqueles que não têm. Juan Martinez-Alier8 identifica muito bem as espécies de relações travadas entre setores socialmente distintos e o meio ambiente. Divide ele as correntes ambientais em três dimensões principais: o culto à vida silvestre, o evangelho da ecossuficiência e o ecologismo dos pobres. O culto à vida silvestre guarda relação com a defesa da natureza intocada, com o respeito absoluto às florestas primárias e com o 7 BARLOW, Maude; CLARKE, Tony. Ouro azul. Como as grandes corporações estão se apoderando da água doce do nosso planeta. São Paulo: M. Books do Brasil, 2003. p. 68. 8 MARTINEZ-ALIER, Juan. O ecologismo dos pobres: conflitos ambientais e linguagem de valoração. Trad. Maurício Waldman. São Paulo: Contexto, 2007. p. 34.
Abril/2016 – Ed. 229
Nesse contexto, a relação dos indivíduos extremamente pobres com o meio ambiente acaba por tomar feições apenas fictícias. A ordem de prioridades no cotidiano da população não estimula a criação de vínculos entre o pobre e o meio ambiente.
A aspiração, entretanto, passa muito além da mera conscientização dos pobres, argumento que – não raro – permeia o discurso fácil que, por vezes, toma conta das discussões sobre o tema. Passa, antes de tudo, pela evolução social dos menos amparados economicamente.
30
curso da água; o evangelho da ecossuficiência, por sua vez, tem preocupação com os efeitos do crescimento econômico, com os impactos ambientais e com os riscos à saúde decorrentes das atividades industriais, da urbanização e das técnicas modernas da agricultura. O que mais interessa para o presente estudo, porém, é a corrente identificada como ecologismo dos pobres, também conceituado como ecologismo da livelihood 9, que teve origem no movimento por justiça ambiental instaurado na década de 60 nos Estados Unidos. Nessa época, estimuladas pelo movimento dos direitos civis de Martin Luther King, comunidades pobres americanas revoltaram-se com casos de “racismo ambiental”, visto que por muito tempo bairros pobres ou habitados por minorias raciais sofreram com contaminação demasiada do ar, transferência do lixo municipal, depósitos de dejetos tóxicos, entre outros problemas ambientais. Refere o autor que a linha-mestra de tal corrente não é a simples reverência sagrada à natureza, mas, antes de tudo
Abril/2016 – Ed. 229
[...] um interesse material pelo meio ambiente como fonte de condição para a subsistência; não em razão de uma preocupação relacionada com os direitos das demais espécies e das futuras gerações de humanos, mas, sim, pelos humanos pobres de hoje. Essa corrente não compartilha dos mesmos fundamentos éticos (nem estéticos) do culto ao silvestre. Sua ética nasce de uma demanda por justiça social contemporânea entre os humanos.
As ponderações Martinez-Alier são absolutamente convenientes. Com a expansão das discussões ambientais a partir da década de 70, após a Conferência de Estocolmo, o assunto virou tema recorrente nos mais variados ramos da sociedade. Da academia
31
9 N.T.: Em inglês, subsistência ou ganha-pão.
à economia, as impressões sobre a matéria se diversificaram e se popularizaram. Como todo assunto relevante que trilha tal caminho, daí surgiram conquistas e armadilhas. O mérito da popularização das discussões ambientais reside na indiscutível disseminação de uma cultura positiva e preservacionista. As novas gerações crescem sob outra doutrina de base, pois aprendem desde cedo valores que até pouco tempo não eram ostentados por gerações passadas. Por outro lado, a massiva exposição da matéria ambiental fez nascer um excessivo apego à dimensão estética do meio ambiente. Para a maioria esmagadora da população, sustentabilidade está ligada à mera preservação do verde, das florestas, dos oceanos, da fauna. Nessa realidade, a dimensão social da sustentabilidade perde fôlego, e a população pobre acaba relegada a um segundo plano. Esquece-se que a parcela dominante dos cidadãos brasileiros vive em comunidades sem saneamento
E o pior: exatamente em vista da precariedade econômica dos hipossuficientes, uma série de serviços deixa de ser prestada a tais indivíduos, inclusive de ordem ambiental. A economia, cada vez mais eficiente na produção de resíduos e de outros elementos poluidores, atinge de cheio o meio em que vivem os pobres, que acabam convivendo com lixões, rios poluídos e um ar de cada vez menor qualidade, posto que parques industriais – via de regra – são instalados próximos a comunidades pobres das cidades. É necessária uma aproximação dos fragilizados economicamente do seu meio. Impõe-se, para tanto, a criação de um vínculo que incuta nos indivíduos um apego natural pelo meio ambiente. Essa relação, porém, inevitavelmente passa pelo incremento positivo na qualidade de vida dos pobres. O Professor Henri Acselrad analisa com propriedade a relevância dos movimentos por justiça ambiental:
Nas últimas décadas, em face do aumento expressivo da interferência da economia na vida dos estados, o discurso do ecodesenvolvimento foi suplantado pelo discurso do desenvolvimento sustentável, que procura compatibilizar a manutenção do meio ambiente com o crescimento econômico. Essa suposta compatibilização, entretanto, que encontra belas exposições no campo teórico, tem ferido com muito mais ênfase aqueles que ocupam os andares mais baixos da pirâmide social. Enrique Leff11, ao identificar a prevalência dos ditames econômicos sobre os valores ambientais na doutrina do desenvolvimento sustentável, arrola a desigual distribuição social dos custos ecológicos e a marginalização social como uma das formas de se suprimir as “externalidades do desenvolvimento”. Diz ele: Porém, o conceito de ambiente cobra um sentido estratégico no processo político de supressão das “externalidades do desenvolvimento” – a exploração econômica da natureza, a degradação ambiental, a desigual distribuição social dos custos ecológicos e a marginalização social – que persistem apesar da ecologização dos processos produtivos e da capacitação da natureza.
Cabe ressaltar também a defesa dos direitos das populações futuras. E como os representantes do movimento fazem a articulação lógica entre lutas presentes e “direitos futuros”? Propondo a interrupção dos mecanismos de transferência dos custos ambientais do desenvolvimento para os mais pobres. Pois o que esses movimentos tentam mostrar é que, enquanto os males ambientais puderem ser transferidos para os mais pobres, a pressão geral sobre o ambiente não cessará. Fazem assim a ligação entre o discurso genérico sobre o futuro e as condições históricas concretas pelas quais, no presente, se está definindo o futuro. Aí se dá a junção estratégica entre justiça social e proteção ambiental: pela afirmação de que, para barrar a pressão destrutiva sobre o ambiente de todos, é preciso começar protegendo os mais fracos.10
O problema é exatamente este: o desenfreado crescimento econômico tem um preço ambiental, que acaba sendo pago prioritariamente pelos pobres, os quais internalizam as externalidades da economia de mercado.
10 ACSELRAD, H. Ambientalização das lutas sociais – O caso do movimento de justiça ambiental. Estudos Avançados (USP. Impresso), v. 24, p. 103-120, 2010.
11 LEFF, Henrique. Saber ambiental – Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Trad. Lúcia Mathilde Endlich Orth. Rio de Janeiro: Vozes, 2011. p. 18.
Peguemos como exemplo os lixões das grandes cidades, que, via de regra, situam-se nos bolsões de pobreza existentes na periferia dos centros urbanos. Como se pretender a criação de vínculos duradouros entre a população pobre que labora e vive na companhia do rescaldo
Abril/2016 – Ed. 229
básico, condição mínima, como o próprio nome sugere, para uma vida digna.
32
da sociedade de consumo, se a realidade de tais indivíduos é a convivência diária com o lixo produzido de forma cada vez mais irrazoável? Essa carga assumida pelos relegados do sistema econômico, porém, começa a ser questionada, ainda que de forma tímida. Leff12 identifica uma crescente resistência dos grupos minoritários que acabam sofrendo com as externalidades de economia de mercado. Refere o autor:
Abril/2016 – Ed. 229
Também hoje os processos de emancipação dos grupos indígenas estão gerando diversas manifestações de resistência diante das políticas de globalização e da capitalização da vida; é daí que emergem as estratégias das comunidades para autoadministrar seu patrimônio de recursos naturais e culturais. Está havendo um confronto de interesses para assimilar as condições de sustentabilidade aos mecanismos do mercado diante de um processo políticos de reaproximação social da natureza. Este movimento de resistência se articula à construção de um paradigma alternativo de sustentabilidade, no qual os recursos ambientais se convertem em potenciais capazes de reconstruir o processo econômico dentro de uma nova racionalidade produtiva, propondo um projeto social baseado na produtividade da natureza, nas autonomias culturais e na democracia participativa. (Leff, 1994)
33
Mais adiante13, ao versar sobre “os conflitos de distribuição ecológica”, Leff consigna que o ecologismo dos pobres distingue-se da ordem econômica dominante por seus objetivos, já que os pobres lutam pela sobrevivência e por valores ligados à qualidade de vida.
O CAMINHO A SER SEGUIDO Mas qual seria a solução a garantir uma aproximação entre os pobres e o meio ambiente? 12 Idem, p. 31. 13 Idem, p. 69.
Muitos invocam o aumento do Produto Interno Bruto do País (PIB), índice que por várias décadas dominou (e ainda domina, infelizmente) a cena econômica nacional. Tal conceito, no entanto, está muito mais ligado a fatores meramente econômicos do que a conquistas sociais do povo brasileiro. É necessário, antes de mais nada, que a qualidade de vida dos cidadãos cresça substancialmente, não só sob o aspecto financeiro, mas especialmente sob o prisma social. Cristiane Derani14 refere, ao contrário dos que defendem o PIB como índice soberano, que, para se alcançar uma melhor qualidade de vida, é necessária, inclusive, uma queda no valor nominal do PIB. Diz ela: Em termos de cálculo do PIB, pelo fato de este ponto representar um valor médio – ou seja, o lucro máximo mediado pelo fator ambiental, chegando-se a um lucro ambientalmente satisfatório –, provoca-se necessariamente um reflexo negativo no produto interno, que deverá cair para atender ao “ambientalismo correto”. Para que a qualidade de vida, ou bem-estar, integre essa operação matemática, deve-se amargar uma queda no valor nominal do produto interno bruto. Em contrapartida, esta sociedade será compensada pela melhora da qualidade de vida, cuja dinâmica obedece a outra lógica que não o simples alcance do lucro.
Mais adiante, continua a autora: Insisto no fato de que o bem-estar não se resume num meio ambiente íntegro, tampouco em condições materiais. Seu conteúdo é constituído pela soma desses elementos. Portanto, deve-se concluir que o desenvolvimento verdadeiro de uma sociedade, com a presença irrevogável de uma sadia qualidade de vida, não pode ser refletido, com fidelidade, na operação matemática responsável pela representação numérica do produto interno bruto. 14 DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Saraiva. 2008. p. 86.
O progresso social dos indivíduos ocasiona o surgimento de novos valores, que, na esfera ambiental, devem ultrapassar o tradicional vínculo estético que liga o homem ao seu meio. A erradicação da pobreza extrema, com a criação de um índice universal de desenvolvimento que incorpore fatores ambientais, não considerados pelo PIB ou pelo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), é condição decisiva para que novas políticas públicas sejam desenvolvidas com fim último de incutir na população um sentimento de apego duradouro ao meio ambiente.
Abril/2016 – Ed. 229
Disso se conclui que a evolução da dimensão social da sustentabilidade é a que mais exige pronta e efetiva ação da sociedade brasileira, especialmente das autoridades públicas, premissa básica para que a previsão constitucional que determina a universalidade de acesso a um meio ambiente sadio deixe o campo teórico e passe, definitivamente, a surtir efeitos concretos, de maneira que o meio ambiente não seja visto pelos pobres como mero pressuposto de sobrevivência, mas sim como fator propulsor de uma qualidade de vida mais digna.
34
Doutrina
A Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Novo CPC – Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa
A desconsideração da personalidade jurídica vem sendo usada pelos Tribunais de diversos modos, pois não há um regramento legal tratando do tema. Neste artigo vou tratar da desconsideração da personalidade jurídica da empresa e a sua aplicação no processo do trabalho, inclusive a desconsideração da personalidade jurídica inversa. Ao final, serão feitas algumas considerações sobre o incidente de desconsideração da personalidade jurídica prevista no novo CPC.
1 PESSOA JURÍDICA SERGIO PINTO MARTINS Desembargador do TRT da 2ª Região, Professor Titular de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da USP.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Pessoa jurídica; 2 Desconsideração da personalidade jurídica; 2.1 Denominação; 2.2 Distinção; 2.3 Histórico; 2.4 Código de Defesa do Consumidor; 2.5 Código Civil de 2002; 2.6 Infração à ordem econômica; 2.7 Meio ambiente; 2.8 Desconsideração da personalidade jurídica inversa; 2.9 CPC de 2015; 2.10 Conclusão.
INTRODUÇÃO A desconsideração da personalidade jurídica tem sido usada no processo do trabalho quando não há bens na sociedade para pagar dívidas desta e os bens são transferidos para o sócio da empresa. Tem havido muitos abusos na empresa e ilicitudes praticadas, razão pela qual os Tribunais têm se utilizado da desconsideração da personalidade jurídica para atingir os bens dos sócios.
A personalidade jurídica é uma abstração, uma criação da lei. Os homens se unem em uma empresa para poder praticar atos de comércio. Fábio Konder Comparato afirma que “a função geral da personalização de coletividades consiste na criação de um centro de interesses autônomo, relativamente às vicissitudes que afetam a existência das pessoas físicas que lhe deram origem, ou que atuam em sua área: fundadores, sócios, administradores”1. A pessoa jurídica visa a fazer com que os esforços das pessoas e o emprego de recursos econômicos sejam direcionados para a realização das atividades produtivas. As pessoas isoladamente não têm condições normais de se inserir sozinhas no mercado. Daí porque a lei estabelece personalidade jurídica às empresas para que elas possam realizar as suas atividades. Previa o art. 20 do Código Civil de 1916 que a pessoa jurídica tem existência jurídica distinta da de seus membros. Esse dispositivo não 1 COMPARATO, Fabio Konder; SALOMÃO, Calixto. O poder de controle das sociedades anônimas. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 356.
Em regra, observa-se a autonomia patrimonial, a separação patrimonial entre a sociedade e os seus sócios, em que os sócios não respondem pelas dívidas da sociedade.
2 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA 2.1 Denominação A desconsideração da personalidade jurídica também é chamada de disregard doctrine, em que se busca levantar o véu que encobre a corporação (to lift the corporate veil) para atingir os bens dos sócios. Fala-se ainda em piercing the corporate veil, cracking open the corporate shell, nos Direitos inglês e americano; superamento della personalità giuridica, no Direito italiano; Durchgriff der juristichen Person, no Direito alemão; teoria de la penetración ou desestimación de la personalidad, no Direito argentino; mise à l’écart de la personnalité morale ou abus de la notion de personalité sociale, no Direito francês.
2.2 Distinção Será feita a desconsideração da personalidade jurídica no caso em concreto para, desconsiderando a personalidade jurídica da empresa, atingir os bens do sócio. A despersonalização ou despersonificação tem por objetivo a anulação definitiva da personalidade jurídica. Seria melhor falar em desconstituição ou anulação da personalidade jurídica, pois ela não tem condições legais de continuar existindo.
2.3 Histórico No caso Bank of United States v. Deveaux, em 1809, que foi levantado o véu que encobre a corporação para considerar as características individuais do sócio. Essa decisão foi repudiada veementemente pela doutrina da época2. No caso Salomon v. Salomon, em 1897, Aaron Salomon constituiu uma empresa, Salomon e Co., com mais seis membros da sua própria família. Cada um deles tinha apenas uma ação da sociedade. Salomon ficou com vinte mil ações do capital social, que foram pagas com a transferência do fundo de comércio, do qual, até aquele momento, era detentor único. A sociedade ficou insolvente. Aaron emitiu títulos privilegiados, nos quais tinha preferência em relação a todos os demais credores quirografários. Recebeu o patrimônio da empresa, isentando-se de pagar as dívidas e prejudicando os credores quirografários. Foi constatado o ato fraudulento de Aaron e foi feita a desconsideração da personalidade jurídica. A empresa era uma entidade fiduciária de Salomon ou um agente ou trustee. A Casa dos Lordes reformou a decisão de primeiro grau, que tinha deferido a desconsideração da personalidade jurídica, considerando que a companhia tinha sido devidamente constituída. Isso levou ao estudo da desconsideração da personalidade jurídica da empresa3. No caso State v. Standard Oil Co, a Corte Suprema do Estado de Ohio, em 1892, entendeu por desconsiderar a autonomia de quatro pessoas jurídicas para verificar a dominação do mercado. Os acionistas da Standar Oil Co celebraram um trust agreement com os acionistas de outras sociedades petrolíferas, que trans2 KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. A desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine) e os grupos de empresas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 64. 3 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 277-278.
Abril/2016 – Ed. 229
foi repetido no Código Civil de 2002, mas na prática é a realidade. A pessoa jurídica é titular de seus direitos e de suas obrigações, inclusive no que diz respeito à sua responsabilidade patrimonial.
36
mitiram as suas ações a um trust da Standar Oil Co, formado por nove fiduciários (trustee), tendo recebido certificados do referido trust. Os nove fiduciários passaram a dominar integralmente as empresas, como se fosse um monopólio. Houve, portanto, concentração do poder de controle de nove empresas de petróleo nas mãos de acionistas da Standard Oil Co. Outro caso foi o do julgamento Fisrt National Bank of Chicago v. F. C. Trebein Company. Trebein, um devedor insolvente, criou uma pessoa jurídica com a sua esposa, a filha, o genro e o cunhado. Integrou todo o patrimônio nessa empresa. Somente quatro ações não eram dele, das seiscentas existentes. Foi feita a desconsideração da personalidade jurídica para que os credores recebessem os seus direitos. No Direito inglês, o Companies Act, de 1929, estabelecia, na Seção 279:
Abril/2016 – Ed. 229
Se no curso da liquidação de sociedade constata-se que um seu negócio foi concluído com o objetivo de perpetrar uma fraude contra credores, dela ou de terceiros, ou mesmo uma fraude de outra natureza, a Corte, a pedido do liquidante, credor ou interessado, pode declarar, se considerar cabível, que toda pessoa que participou, de forma consciente, da referida operação fraudulenta será direta e ilimitadamente responsável pela obrigação, ou mesmo pela totalidade do passivo da sociedade.
37
Rolf Serick apresentou tese de doutorado sobre o assunto à Universidade de Tubingen, em 1953, considerada um dos trabalhos pioneiros sobre o tema. Ele analisou a jurisprudência alemã e norte-americana sobre o tema. Se for verificado no caso concreto o abuso de forma, com o objetivo de causar danos a terceiros, o juiz pode desconsiderar a personalidade jurídica da empresa e atingir os sócios4. Em se tratando de situações lícitas, a autonomia da pessoa jurídica deve ser observada. Não é possível 4 SERICK, Rolf. Superamento della personalità giuridica. Milano: Giuffrè, 1966. p. 276.
desconsiderar a autonomia subjetiva da pessoa jurídica apenas porque o objetivo de uma norma ou a causa de um negócio não foram atendidos. Calixto Salomão, ao analisar o trabalho de Serick, esclarece que “o autor adota um conceito unitário de desconsideração, ligado a uma visão unitária da pessoa jurídica como ente dotado de essência pré-jurídica, que se contrapõe e eventualmente se sobrepõe ao valor específico de cada norma”5. Piero Verrucoli, estudando o Direito anglo-saxão, ampliou a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica do abuso do direito para a fraude e a violação da lei6. No Brasil, o primeiro a tratar do tema foi Rubens Requião, em conferência proferida na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, no fim da década de 60, intitulada “Abuso de Direito e Fraude Através da Personalidade Jurídica: Disregard Doctrine”. Afirma que o juiz deve indagar se há de se consagrar a fraude ou o abuso de direito ou se deve desconsiderar a personalidade jurídica da empresa para penetrar em seu âmago e alcançar os bens do sócio. Entende que a teoria deve ser aplicada pelos juízes, independentemente de previsão legal específica. Mesmo não havendo dispositivo jurídico específico, entender de forma contrária seria amparar a fraude7. O Código Civil de 1916 não tratava do tema. No âmbito trabalhista, o art. 2º da CLT consagra a responsabilidade objetiva do empregador, pois ele é a empresa. É a apli5 SALOMÃO, Calixto. O novo direito societário. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 210. 6 VERRUCOLI, Piero. Il superamento della personalità giuridica della società di capitalli nella common law e nella civil law. Milano: Giuffrè, 1964. 7 REQUIÃO, Rubens. Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica. Revista dos Tribunais, v. 410, p. 14, dez. 1969; Aspectos modernos do direito comercial I. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 275/95.
o entendimento foi unânime no sentido de reconhecer que os direitos e obrigações trabalhistas nascem, persistem e extinguem-se em razão do funcionamento da empresa. Daí a decisão de consagrar-se a despersonalização do empregador, motivador da continuidade do contrato de trabalho. E a redação do art. 2º da CLT acabou refletindo, em parte, a mencionada e inconciliável controvérsia.9
Mostra o § 2º do art. 2º da CLT que o empregador pode ser o grupo de empresas, inclusive de fato, mediante a desconsideração da personalidade jurídica para saber quem é o empregador. Reza o art. 10 da CLT que “qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados”. Dispõe o art. 448 da CLT que “a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados”. 8 SÜSSEKIND, Arnaldo. A consolidação das leis do trabalho histórica. Org. Aloysio Santos. Rio de Janeiro: Senai, Sesi, 1993. p. 20. 9 SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 186-187.
Determina o art. 596 do CPC de 1973 que “os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade senão nos casos previstos em lei”. A desconsideração da personalidade jurídica tem de ser considerada para obter justiça e evitar fraudes aos credores da empresa, nos casos em que forem empregados artifícios ilícitos para burlar os direitos dos credores. A teoria maior entende que deve ser desconsiderada a pessoa jurídica para atingir os bens dos sócios em casos de desvio de função da sociedade, em razão de fraude e abusos10. O elemento subjetivo se caracteriza com a intenção de fraude ou a utilização abusiva da pessoa jurídica com o fim de lesar credores. O instituto tem de ser entendido como exceção, nos casos em que houver ilícito, em razão de que não existe outra solução apta a proporcionar justiça, e não como regra, pois, do contrário, haveria insegurança das relações jurídicas. A teoria menor considera que basta o credor mostrar prejuízo para se falar na desconsideração da personalidade jurídica, o que não pode ser admitido, principalmente diante do art. 50 do Código Civil.
2.4 Código de Defesa do Consumidor O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) foi o primeiro dispositivo que tratou da desconsideração da personalidade jurídica. Dispõe o art. 28: 10 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 35.
Abril/2016 – Ed. 229
cação da teoria da instituição. Leciona Arnaldo Süssekind que “não pretendeu a Consolidação, na solução realista que adotou, inovar o sistema legal alusivo aos sujeitos de direito das relações jurídicas, para classificar a empresa como pessoa jurídica, independentemente da pessoa do seu proprietário (subjetivação da empresa)”8. Afirma que
38
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. § 1º (Vetado). § 2º As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 3º° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 4º As sociedades coligadas só responderão por culpa. § 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
No Código de Defesa do Consumidor são requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade: a) abuso de direito; b) excesso de poder; c) infração à lei;
Abril/2016 – Ed. 229
d) fato ou ato ilícito;
39
e) violação dos estatutos da sociedade anônima ou do contrato social; f) falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. A responsabilidade é estabelecida em decorrência de má-administração feita pelos sócios. Poderá, ainda, ser feita a desconsideração da pessoa jurídica sempre que a sua personalidade for, de alguma forma, obstá-
culo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores (§ 5º do art. 28 do CDC). Esse dispositivo adota a teoria menor.
2.5 Código Civil de 2002 O Código Civil de 2002 tratou da matéria no art. 50: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
Filiou-se o Código Civil à teoria subjetivista, pois exige abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade da sociedade ou, então, por confusão patrimonial. O desvio de finalidade da sociedade é caracterizado quando os sócios praticam atos contrários aos fins sociais previstos na lei ou no contrato social, fazendo uso irregular da empresa. Na jurisprudência, já se utilizou desse fundamento para dívida trabalhista: Desconsideração da personalidade jurídica da executada. Responsabilidade pessoal do sócio. O descumprimento dos direitos trabalhistas configura o “desvio de finalidade”, conceito legal indeterminado presente no art. 50 do Código Civil brasileiro, que permite a desconsideração da pessoa jurídica. Logo, exauridas as tentativas de execução contra a pessoa jurídica, cabe deferir o redirecionamento da execução aos sócios da executada. Apelo a que se nega provimento. (TRT 4ª R., AP 0156100-55.1997.5.04.0291, Relª Desª Ana Rosa Pereira Zago Sagrilo, J. 09.06.2011)
A confusão patrimonial ocorre quando o patrimônio do sócio e da sociedade é um só. É o que ocorre em pequenas empresas em que a conta-corrente do sócio é usada para a empresa e vice-versa. A escrituração contábil não distingue um patrimônio de outro. O patrimônio é um só. Não existem dois patrimônios distintos. Em casos como esses, o sócio ora alega que o pa-
Segundo o Código Civil, o juiz não pode determinar, de ofício, a desconsideração da personalidade jurídica, pois exige requerimento da parte ou do Ministério Público. O juiz não prestará a atividade jurisdicional, a não ser quando provocado (art. 2º do CPC). A matéria não é de ordem pública para o juiz agir de ofício. Uma posição entende que devem ser respeitados os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Alexandre do Couto e Silva afirma que “o processo não pode perder sua função de instrumento para a aplicação do direito material, pois é o resultado de vários atos que se exteriorizam e se ordenam por meio do procedimento, com sentido finalístico, para estabilizar direitos conflitantes”11. Entretanto, não há violação ao devido processo legal, pois este depende da previsão da lei ordinária, que não trata do tema. A outra posição afirma que pode haver apenas a desconsideração por despacho do juiz no curso da execução, em razão da constatação de fraude. Não há necessidade de propositura de ação autônoma. O STJ já entendeu que não há necessidade de procedimento autônomo: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL – COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL – FALÊNCIA – FRAUDE E CONFUSÃO PATRIMONIAL ENTRE A EMPRESA FALIDA E
11 SILVA, Alexandre Couto. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica no Direito brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 204.
A AGRAVANTE VERIFICADAS PELAS INSTÂNCIAS ORIGINÁRIAS – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA: DESNECESSIDADE DE PROCEDIMENTO AUTÔNOMO PARA SUA DECRETAÇÃO – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO 1. Tendo as instâncias ordinárias detectado a fraude e a confusão patrimonial entre as empresa falida e a empresa desconsiderada, ora agravante (cujas sócias são filhas do ex-controlador da primeira), pode ser desconsiderada a personalidade jurídica como medida incidental, independentemente de ação autônoma (revocatória). Precedentes. 2. Impossibilidade de revisão dos aspectos fático-probatórios que levaram à conclusão da fraude, ante o óbice da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Não há falar em ofensa ao devido processo legal, pois a agravante interpôs a tempo e modo devidos o recurso cabível perante o Tribunal de origem, o qual, todavia, não foi acolhido. 4. Agravo regimental não provido. (REsp 418.385/SP, 2ª Seção, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 14.03.2012, DJU 16.03.2012) PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – AGRAVO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – AÇÃO AUTÔNOMA – DESNECESSIDADE A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para esse fim. Agravo no agravo em recurso especial não provido. (REsp 9.925/MG, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 08.11.2011, DJU 17.11.2011)
Geralmente, o empregado não sabe na fase de conhecimento que houve fraude ou confusão patrimonial. Isso só se verifica na execução. Assim, a desconsideração da personalidade jurídica vai se verificar na fase de execução. Não exige a jurisprudência que seja proposta ação autônoma pelo autor, mas mero incidente processual no curso da execução. O contraditório e a ampla defesa serão exercidos na execução. Passa o sócio a responder pela dívida da sociedade, principalmente quando se beneficiou do trabalho do empregado, por estar na empresa na época de prestação de serviços do trabalhador.
Abril/2016 – Ed. 229
trimônio é seu, ora da sociedade, de acordo com os seus interesses. A confusão patrimonial caracteriza a desconsideração da personalidade jurídica sob o ponto de vista objetivo. Não há necessidade de se fazer prova do elemento subjetivo.
40
O sócio não é parte na execução. Parte é a pessoa jurídica, a empresa. A coisa julgada se dá em relação à parte, e não a terceiros. Assim, o remédio cabível para discutir a desconsideração da personalidade jurídica é o de embargos de terceiro12, e não de embargos à execução. Tem direito o sócio ao benefício de ordem, de serem executados antes os bens da sociedade e depois os dele. Dispõe o art. 1.024 do Código Civil: “Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais”. No mesmo sentido o art. 596 do CPC: “Os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade senão nos casos previstos em lei; o sócio, demandado pelo pagamento da dívida, tem direito a exigir que sejam primeiro excutidos os bens da sociedade”.
2.6 Infração à ordem econômica A Lei Antitruste (Lei nº 8.884/1994) previa, no art. 18, que
Abril/2016 – Ed. 229
a personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
41
O dispositivo era semelhante ao do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor. A Lei nº 8.884/1994 foi revogada pela Lei nº 12.529/2011. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já utilizou a desconsideração da personalidade jurídica em caso de falta de encerramento da empresa: 12 BRUSCHI, Gilberto Gomes. Aspectos processuais da desconsideração da personalidade jurídica. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 97-99.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL Possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica porque caracterizada uma das situações previstas na lei. Pessoa jurídica desativada irregularmente. O ente jurídico não pode servir de escudo para frustrar a satisfação do crédito quando presente a hipótese legal que permite a desconsideração de sua personalidade. Agravo provido. (AI 700344002214, 19ª Câmara Cível, Rel. Des. Guinther Spode, J. 22.06.2010) RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA – SÓCIO-COTISTA – TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA – ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES DA SOCIEDADE SEM QUITAÇÃO DO PASSIVO LABORAL – Em sede de Direito do Trabalho, em que os créditos trabalhistas não podem ficar a descoberto, vem-se abrindo uma exceção ao princípio da responsabilidade limitada do sócio, ao se aplicar a teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard of legal entity) para que o empregado possa, verificando a insuficiência do patrimônio societário, sujeitar à execução os bens dos sócios individualmente considerados, porém solidária e ilimitadamente, até o pagamento integral dos créditos dos empregados, visando impedir a consumação de fraudes e abusos de direito cometidos pela sociedade. (TST, ROAR 545348, SBDI 2, Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal, DJU 14.05.2001, p. 1216)
Dispõe o art. 34 da Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, que a personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
A Lei nº 12.529/2011 estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente (Súmula nº 435 do STJ).
Recentemente, a 3ª Turma do STJ entendeu que a dissolução irregular da empresa, por si só, não é suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica. Havendo meros indícios de encerramento irregular da sociedade conjugados com a inexistência de bens para cobrir a execução, não são motivos suficientes para a desconsideração da personalidade jurídica. O Ministro Relator, Villas Bôas Cueva, entendeu que a desconsideração da personalidade jurídica tem de ser entendida como medida excepcional, com o objetivo de reprimir atos fraudulentos. O tribunal de origem entendeu que era possível desconsiderar a personalidade jurídica de uma concessionária de veículos, a pedido de uma montadora de veículos. Restaram infrutíferas as tentativas de penhora on-line em relação à concessionária. Esta estava registrada perante a Secretaria da Receita Federal, mas não vem apresentando declarações de imposto de renda. O simples fato de que a sociedade não exerce mais as suas atividades no endereço em que estava sediada e de não haver bens capazes para satisfazer o crédito da montadora não importa em se determinar a desconsideração da personalidade jurídica.
2.7 Meio ambiente
No Direito alemão, a doutrina e a jurisprudência usam a teoria apenas nas sociedades unipessoais. Na jurisprudência, verifica-se também a utilização da desconsideração inversa: DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA INVERSA – Admissibilidade. Hipótese em que configurada a transferência de bens particulares do sócio-executado em favor da pessoa jurídica, com retirada posterior da sociedade. Decisão reformada para autorizar a desconsideração da personalidade jurídica inversa para permitir a penhora de bens da sociedade. Recurso provido para tal fim. (TJSP, AI 6722557220118260000/SP) Agravo de instrumento. Desconsideração da personalidade jurídica. Possibilidade. Assim, diante das inúmeras e infrutíferas tentativas de localizar bens em nome dos executados capazes de garantir o juízo executório, bem como da confusão havida entre o patrimônio de seu sócio majoritário, ao lado de sua esposa, e da sociedade que o mesmo integra, possível afigura-se a desconsideração inversa da personalidade jurídica determinada na origem. Em decisão monocrática, dou provimento ao agravo de instrumento. (TJRS, Agravo de Instrumento nº 70041914102, 20ª Câmara Cível, Rel. Des. Glênio José Wasserstein Hekman, J. 04.04.2011)
2.8 Desconsideração da personalidade jurídica inversa
EXECUÇÃO – SÓCIO INSOLVENTE QUE INTEGRA SEU PATRIMÔNIO AO DE OUTRA EMPRESA – TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA – RESPONSABILIDADE DA EMPRESA – Aplica-se ao caso a teoria da desconsideração inversa da personalidade jurídica da empresa, por se tratar de hipótese de sócio que se tornou insolvente e incorporou seu patrimônio a outra sociedade empresária, prejudicando o credor, caso em que se deve adentrar ao patrimônio da empresa a fim de que esta responda pela obrigação do sócio. Trata-se de técnica que visa a impedir que o devedor utilize o ente jurídico para, por meio da confusão patrimonial, burlar a lei, escondendo seu patrimônio. (TRT 3ª R., 0001200691998501006, 2ª T., Rel. Luiz Ronan Neves Koury, Publ. 10.09.2010)
Abril/2016 – Ed. 229
Reza o art. 4º da Lei nº 9.605/1998 que “poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente”. A Lei nº 9.695/1998 versa sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
sociedade. Assim, se o sócio não tinha bens, era desconsiderada a personalidade jurídica para atingir os bens da sociedade em virtude de dívidas do sócio.
A desconsideração da personalidade jurídica inversa surge no direito de família, em que os bens do sócio eram escondidos na
EXECUÇÃO – DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PESSOA JURÍDICA – CABIMENTO – ART. 28 DO CDC – ENUNCIADO Nº 283 DO CJF/STJ –
42
A Lei nº 9.605/1998 não faz referência à necessidade de o ato ser praticado com dolo ou culpa, mas apenas que tenha sido constatado prejuízo ao meio ambiente.
RESPONSABILIDADE – CONFIGURAÇÃO – 1. O direito do trabalho adota a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica das empresas, sendo aplicável o art. 28 do CDC, e não o art. 50 do CC. 2. O mero prejuízo do trabalhador autoriza a desconsideração direta da personalidade jurídica da empresa executada, a fim de que o véu societário seja afastado e os bens dos sócios respondam pelas dívidas. 3. Cabível também a desconsideração inversa da pessoa jurídica, a fim de que os bens de uma terceira sociedade empresária, também integrada pelo sócio da empresa empregadora, respondam pela dívida por esta contraída, bastando que se verifique o prejuízo do credor trabalhista e o controle acionário pelo sócio, situações estas detectadas nos presentes autos, sendo caso de aplicação do Enunciado nº 283 do CJF/STJ. (TRT 3ª R., AP 0012006919985010063, 7ª T., Rel. Rogério Lucas Martins, Publ. 12.12.2014)
A desconsideração da personalidade jurídica inversa pode ser usada para atingir a sociedade em razão de dívida do sócio, que transferiu bens para sociedade, como em um caso de empregador doméstico que transferiu seus bens para a sociedade, causando prejuízo ao recebimento dos direitos do empregado doméstico.
Abril/2016 – Ed. 229
No caso a seguir, o TRT da 2ª Região não determinou a desconsideração da personalidade jurídica inversa:
43
PERSONALIDADE JURÍDICA – CONSÓRCIO DE EMPRESAS – EMPREGADO QUE NÃO PERTENCEU A SEU PRÓPRIO QUADRO DE PESSOAL – AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE POR DÉBITOS TRABALHISTAS – A desconsideração da personalidade jurídica inversa – que consiste na responsabilização da sociedade por obrigação do sócio – somente se justifica em situação de comprovada prática fraudulenta do devedor que transfere seus bens pessoais para a sociedade com o fim de ocultá-los e preservá-los de possível constrição judicial. Assim, somente é possível quando verificado o esvaziamento do patrimônio pessoal do sócio por meio da transferência de bens para a pessoa jurídica sobre a qual o devedor detém controle, com a única finalidade de ocultá-los de terceiros. Nesse particular, a responsabilidade ocorre no sentido oposto, ou seja, os bens da sociedade respondem por atos praticados pelos sócios. Na hipótese vertente, não se vislumbra o quadro delineado, já que o consórcio de empresas tem previsão no art. 278 da Lei nº 6.404/1976, sendo, pois, uma associação de recursos, não exigindo a lei que exista qualquer participação societária entre as participantes e as empresas componentes mantêm total autonomia, exercendo seus atos
comuns mediante mandato outorgado pelas consorciadas a uma delas. A independência entre as sociedades consorciadas decorre do contrato e a legislação é clara no sentido de que as consorciadas se obrigam apenas nas condições previstas no contrato, respondendo cada uma por suas obrigações individuais. A única possibilidade de responsabilização limita-se aos atos praticados em consórcio que guardem relação com o objeto do próprio contrato (art. 33, V, Lei nº 8.666/1993), não havendo se cogitar em ampliação desta responsabilidade de forma a atingir as consorciadas por débitos trabalhistas a que não deram causa; vale dizer, de empregado que não pertenceu a seu próprio quadro de pessoal. Agravo de petição a que se dá provimento. Agravo de petição da embargante, pelas razões de fls. 49/61, pretendendo a reforma da r. sentença de fls. 47 e verso, que julgou improcedentes os pedidos dos embargos de terceiro. Irresignação fundada, em síntese, no seguinte ponto: desconstituição de penhora – ausência de responsabilidade do consórcio de empresas. (AP 00018005420145020402/SP, Ac. 20150436178, 8ª T., Rel. Sidnei Alves Teixeira, J. 20.05.2015, Publ. 25.05.2015)
2.9 CPC de 2015 A desconsideração da personalidade jurídica da empresa já era feita na prática na execução trabalhista sem que houvesse um procedimento a seguir. Prescreve o art. 769 da CLT que, na omissão da CLT e havendo compatibilidade, aplica-se o CPC. Determina o art. 15 do CPC de 2015 que, “na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas, administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”. Supletivo significa completar, servir de complemento, suprir, suplementar. Subsidiário é o que auxilia, que ajuda, que socorre, que apoia ou reforça. O art. 15 do CPC/2015 não revogou o art. 769 da CLT. São dispositivos que se complementam. O art. 769 da CLT manda aplicar o Direito Processual comum. Este diz respeito não só ao direito processual civil, mas ao direito processual penal. O Código de
Há autores entendendo pela aplicação subsidiariamente do CPC em relação à desconsideração da personalidade jurídica13. O CPC de 2015 passou a tratar do incidente de desconsideração da personalidade jurídica nos arts. 133 a 137. Não vejo incompatibilidade na aplicação do CPC de 2015 ao processo do trabalho, pois serão observados o contraditório e a ampla defesa. A desconsideração de ofício fere o contraditório e a ampla defesa. O art. 878 da CLT dispõe que a execução poderá ser promovida de ofício pelo juiz e não que deverá ser promovida de ofício pelo juiz. A regra maior do inciso LV do art. 5º da Constituição, do contraditório e da ampla defesa, tem de ser observada, não só por se tratar de uma norma que tem hierarquia superior à CLT, mas também por tratar de um direito fundamental da pessoa. Não estão previstas as hipóteses em que será feita a desconsideração da pessoa jurídica que fica a cargo da lei14. A desconsideração da personalidade jurídica tem natureza de incidente, que ocorrerá, principalmente, no processo do trabalho 13 ALMEIDA, Amador Paes. Teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard docrtine) e a responsabilidade dos sócios no CPC/2015. Estudos em homenagem ao Ministro Walmir Oliveira da Costa. Coord. Sergio Pinto Martins. São Paulo: Gen/Atlas, 2015. p. 377-385; TESHEINER, José Maria Rosa; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro; RODRIGUES, Ana Francisca Rodrigues. A aplicabilidade da desconsideração da personalidade jurídica da empresa ao processo do trabalho e o novo CPC. Estudos em homenagem ao Ministro Walmir Oliveira da Costa. Coord. Sergio Pinto Martins. São Paulo: Gen/Atlas, 2015. p. 420-423. 14 MARTINS, Sergio Pinto. Direito processual do trabalho. 37. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 781.
na execução. Tem mais característica de incidente no curso do processo do que de intervenção de terceiros. A partir do momento em que o terceiro é citado, passa a ser parte no processo. Para que pessoa estranha ao processo faça parte dele e sobre ele produzam consequências, é necessário que seja citado e lhe proporcione contraditório e defesa. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo (art. 133 do CPC). O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei (§ 1º do art. 133 do CPC). Deve atender requisitos de petição inicial. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial (art. 134 do CPC). A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas. Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica (§ 2º do art. 134 do CPC). Requerida a desconsideração da personalidade jurídica na inicial, a hipótese é de litisconsórcio passivo facultativo.
O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para a desconsideração da personalidade jurídica.
Abril/2016 – Ed. 229
Processo Penal é aplicado nos casos de coisa julgada criminal, como dos arts. 65 a 67 do CPP.
Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15
44
A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese de a alegação ser feita na petição inicial.
dias (art. 135 do CPC). Haverá citação para que a parte possa exercer o seu direito de contraditório e de ampla defesa. Não se poderá fazer penhora de imediato, mas a lei exige citação para que a parte contrária se defenda. Na instrução poderá haver necessidade de tomar depoimentos pessoais e testemunhais. Poderá ainda ser necessária ser feita perícia para a verificação da desconsideração da personalidade jurídica. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória (art. 136 do CPC). Sendo a decisão interlocutória, no processo do trabalho dela não cabe recurso (§ 2º do art. 799 da CLT, § 1º do art. 893 da CLT e Súmula nº 214 do TST). Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo regimental. Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente (art. 137 do CPC). Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar (§ 3º do art. 792 do CPC).
Abril/2016 – Ed. 229
Antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 dias (§ 4º do art. 792 da CPC).
45
2.10 Conclusão A defesa do sócio, na desconsideração da personalidade jurídica, será feita por meio de embargos de terceiro. A utilização da desconsideração da personalidade jurídica contida no CPC de 2015 importa a aplicação da certeza e da segurança jurídica ao terceiro, que poderá exercer melhor o contraditório e a ampla defesa.
Doutrina
Análise do Sistema Prisional Brasileiro
país como la mala salud, la energía hacinamiento, en paralelo, así como la visión de la sociedad moderna en relación con el prisionero, la pena de muerte y de la institución penal. Desde esta perspectiva, y ofrece algunas reflexiones sobre este fenómeno en nuestro país también, el examen de su aparición, su evolución y, por último, la etapa actual en la que se encuentra. PALABRAS CLAVE: Penitenciaría; condenados; preso.
ALADIO ANASTACIO DULLIUS
Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela UMSA − Buenos Aires.
JACKSON ANDRÉ MÜLLER HARTMANN
Bacharel em Direito pela Unijuí − Santa Rosa/RS.
RESUMO: O presente trabalho de pesquisa faz uma análise do sistema carcerário e de sua evolução até chegar aos dias atuais. Traz as conceituações dos estabelecimentos prisionais, buscando identificar as diferenças entre os modelos adotados, conforme opinião de estudiosos que visitaram prisões em diferentes partes do mundo. Discute brevemente a atual falência do sistema penitenciário, buscando levantar os maiores problemas que assolam as casas de recuperação em nosso País, como a saúde precária, a superpopulação, o poder paralelo, bem como a visão da sociedade atual, no tocante ao preso, a pena de morte e o estabelecimento penitenciário. Nessa perspectiva, tece algumas considerações e reflexões acerca desse fenômeno em nosso País, igualmente analisando o seu surgimento, a sua evolução e, por fim, o atual estágio em que se encontra. PALAVRAS-CHAVE: Penitenciária; condenado; prisioneiro. RESUMEN: La investigación analiza el sistema penitenciario, su evolución hasta nuestros días. Trae los conceptos de las prisiones, tratando de identificar las diferencias entre los modelos, según la opinión de los expertos que visitaron cárceles en diferentes partes del mundo. Explica brevemente el actual fracaso del sistema penitenciario, buscando elevar los mayores problemas que plagan la casa a mitad de camino en nuestro
SUMÁRIO: Introdução; 1 Discussão geral do sistema prisional; 1.1 Breve histórico do sistema prisional; 1.2 Conceito de estabelecimentos prisionais; 1.3 Principais diferenças entre os sistemas prisionais; 2 Sistema prisional brasileiro: maiores problemas e a visão da sociedade; 2.1 Maiores problemas do sistema prisional brasileiro; 2.2.A visão da sociedade brasileira a respeito do tema; 2.3 Dignidade da pessoa humana e garantias do preso; Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO A prática punitiva dos povos passa constantemente por transformações, segundo a realidade política e econômica vigente, a qual aponta, por meio de um regramento jurídico, os movimentos deste sistema, ou seja, a vida neste ambiente, se haverá e quando haverá investimento na sua melhoria e adequação à realidade e necessidade. O sistema penitenciário brasileiro encontra inúmeras dificuldades na atualidade, tendo em vista o total abandono por parte das autoridades responsáveis, dificuldades essas que serão palco de estudo. Para tanto, em um primeiro momento, analisa-se a história das penitenciárias, uma conceituação genérica dos estabelecimentos penitenciários, um apontamento das diferenças entre prisões de alguns países, até chegarmos aos principais problemas que afligem o modelo adotado pelo nosso Estado.
Em uma segunda abordagem, discutir-se-á, com base em dados e estatísticas e apoiando-se na doutrina e na jurisprudência, os maiores problemas enfrentados pelas casas de recuperação brasileiras, a visão da sociedade acerca do preso, da prisão e da aplicação de penas extremas. Neste sentido, este estudo pretende fazer uma reflexão acerca do modelo prisional aderido pelo Estado brasileiro, tendo em vista traçar um perfil deste com base na sua evolução e atualidade, fazendo comparativos com outros modelos e dados do sistema pátrio.
Abril/2016 – Ed. 229
Para atingir este objetivo, no primeiro capítulo serão abordados um breve histórico do sistema prisional, conceitos sobre os estabelecimentos prisionais e as diferenças entre eles; já no segundo capítulo faremos uma análise dos maiores problemas do sistema prisional brasileiro, incluindo a visão da sociedade brasileira e um relato sobre as garantias do preso e a dignidade da pessoa humana.
47
Cabe colocar que em momento algum se busca, neste trabalho, esgotar as questões concernentes aos institutos in foco. Nosso interesse é unicamente apresentar uma abordagem breve e sucinta sobre os temas elencados, com apoio na doutrina e legislação pertinentes e entendimento dos tribunais. O método é dedutivo e a pesquisa será bibliográfica.
1 DISCUSSÃO GERAL DO SISTEMA PRISIONAL O sistema carcerário passou por diversas alterações até os dias atuais, dependendo do preceito conjuntivo da política preponde-
rante, o qual estipula regras, direitos e deveres, princípios , entre outros, embasadores do ordenamento, em que se trata da vida de um ser humano que cometeu um erro, um descumprimento à regra da época e tempo determinado. Porém, é imprescindível que não se perca de vista que, no momento em que o indivíduo perde a liberdade pelo cometimento de um crime, ele continua a ter direitos estabelecidos mundialmente, intrínsecos do ser humano, como o da dignidade da pessoa humana e o da manutenção dos laços afetivos para com os seus entes queridos, o que é de grande importância para a ressocialização e reconstrução da vida do apenado. Neste primeiro capítulo, far-se-á uma abordagem histórica, trazendo uma conceituação da temática em tela, as principais características e diferenças dos sistemas prisionais vigentes, conforme ordenamento pátrio em vigor. Buscar-se-á posições doutrinárias no intuito de estabelecer um parâmetro lógico, sempre tentando estabelecer uma ligação, entre a prática e a teoria, para demonstrar as mudanças ocorridas durante os longos séculos de existência do modelo carcerário, que sofre mudanças, mas poucos avanços. O objetivo deste trabalho não é aprofundar o estudo na história e na conceituação, apenas serve de parâmetro para o entendimento dos problemas e das alternativas para uma compreensão da realidade atual. Por último, neste capítulo, traçar-se-á, em perfil do modelo brasileiro, um histórico do Código Penal e da legislação de execuções penais, para dar uma maior proximidade e compre-
1.1 Breve histórico do sistema prisional Sabe-se que, de início, a justiça na terra era atribuída aos deuses, principalmente controlada pela igreja, em que o justo só é elevado ao céu e a penitência é entendida como uma volta ao seio do povo de Deus, daquele que cometeu um pecado, ou seja, uma passagem necessária para um retorno para junto da sociedade, com arrependimento e purificação (Bíblia, 1990, p. 1398-1399). Portanto, o cumprimento de penas e o seu estabelecimento eram atribuídos aos sacerdotes, que, por sua vez, seriam os representantes de Deus na terra. Nas palavras de Beccaria (1999, p. 3), a justiça humana tende a sofrer modificações, dependendo da força política preponderante à época e espaço, quando assim asseverava: A justiça divina e a justiça natural são, por sua essência, constantes e invariáveis, porque as relações existentes entre dois objetos da mesma natureza não podem mudar nunca. Mas, a justiça humana, ou, se quiser, a justiça política, não sendo mais do que uma relação estabelecida entre uma ação e o estado variável da sociedade, também pode variar, à medida que essa ação se torne vantajosa ou necessária ao estado social. Só se pode determinar bem a natureza dessa justiça examinando com atenção as relações complicadas das inconstantes combinações que governam os homens.
Das palavras do autor observa-se, portanto, que a justiça depende do homem e das diretrizes firmadas por ele, quando toma as decisões políticas, sendo nestas que se decide punir ou não punir determinadas condutas.
O mesmo autor ainda afirma que o Estado, devido à dimensão do poder a ele atribuído, decide fazer justiça, residindo na pessoa do legislador esse poder, o qual tende a tipificar as condutas proibidas em Lei, e assim coloca: Podem fixar as penas de cada delito e que o direito de fazer leis penais não pode residir senão na pessoa do legislador, que representa toda a sociedade unida por um contrato social. Ora, o magistrado, que também faz parte da sociedade, não pode com justiça infligir a outro membro dessa sociedade uma pena que não seja estatuída pela lei; e, do momento em que o juiz é mais severo do que a lei, ele é injusto, pois acrescenta um castigo novo ao que já está determinado. Segue-se que nenhum magistrado pode, mesmo sob o pretexto do bem público, aumentar a pena pronunciada contra o crime de um cidadão. (Beccaria 1999, p. 16)
O autor supracitado teve relevante papel no reconhecimento do direito da pessoa do preso e dos regimes impostos a este. Durante vários séculos, a prisão serviu de contenção nas civilizações mais antigas (Egito, Pérsia, Babilônia, Grécia etc.). A sua finalidade era ser lugar de custódia e tortura, sendo a primeira instituição penal na antiguidade o Hospício de San Michel, em Roma, o qual era destinado primeiramente a encarcerar “meninos incorrigíveis”, e denominado Casa de Correção (Magnabosco, 1998). Por conseguinte, aponta que se realizaram congressos sobre o assunto, os quais já assumiam caráter internacional, como o de Londres em 1872. Assis (2007, p. 2) apresenta um julgamento do regime progressivo, que envolveu variantes de outros sistemas, e assim observa: A ideia de um sistema penitenciário progressivo surgiu no final do século XIX, mas, no entanto, sua utilização generalizou-se através da Europa só depois da I Guerra Mundial. A essência desse regime consistia em distribuir o tempo de duração da condenação em períodos, ampliando-se em cada um deles os privilégios que o recluso poderia desfrutar, de
Abril/2016 – Ed. 229
ensão, tendo em vista uma preocupação, neste estudo, com a melhoria do modelo vigente, em busca da administração carcerária com respeito e participação, o que será tratado no capítulo seguinte.
48
acordo com sua boa conduta e do avanço alcançado pelo tratamento reformador. Outro aspecto importante era o fato de possibilitar ao recluso reincorporar-se à sociedade antes do término da condenação. Basicamente, o sistema progressivo tinha como fundamento dois princípios: estimular a boa conduta do recluso e obter sua reforma moral para uma futura vida em sociedade. O avanço considerável obtido pelo sistema progressivo justifica-se pela importância por ele dada à vontade do recluso e de que ele diminuíra o rigor excessivo na aplicação da pena privativa de liberdade. Da filosofia original do sistema progressivo surgiram várias variantes e peculiaridades em outros sistemas, o que na verdade se constituíam num aperfeiçoamento do próprio sistema progressivo. As primeiras mudanças decorreram do surgimento do sistema progressivo inglês, desenvolvido pelo capitão Alexandre Maconochie, no ano de 1840, na Ilha de Norfolk, na Austrália. Esse sistema consistia em medir a duração da pena através de uma soma do trabalho e da boa conduta imposta ao condenado, de forma que a medida que o condenado satisfazia essas condições ele computava um certo número de marcas (mark system), de tal forma que a quantidade de marcas que o condenado necessitava obter antes de sua liberação deveria ser proporcional à gravidade do delito por ele praticado. A duração da pena baseava-se então da conjugação entre a gravidade do delito, o aproveitamento do trabalho e pela conduta do apenado.
Abril/2016 – Ed. 229
Apenas com a criação da Comissão Penitenciária Internacional, que se transformou na Comissão Penal e Penitenciária (1929), que deu origem à elaboração das Regras Mínimas da ONU, e depois da II Guerra Mundial surge em vários países a Lei de Execução Penal (LEP), como na Polônia, Argentina, França, Espanha, Brasil, e outros estados-membros da ONU (Magnabosco, 1998).
49
No nosso País, as políticas punitivas, eram baseadas nas ordenações manuelinas e filipinas, que se baseavam na ideia de intimação pelo terror, ou seja, um instrumento punitivo contra o crime com emprego de ideias religiosas e políticas da época. Em 1830, após a independência, os ideários ordenativos ficaram de lado, passando-se a construção de uma legislação adequada à nação brasileira, principalmente para afastar o domínio dos colonizadores e a sua opressão.
Nas palavras de Pereira Cuano (2010, p. 3), uma transformação, com base no sentimento nacionalista, veja: Proclamada a independência do Brasil, duas ordens de motivo viriam contribuir para a substituição das velhas Ordenações: de um lado, a situação de vida autônoma da nação, que exigia uma legislação própria, reclamada mais ainda pelo orgulho nacional e a animosidade contra tudo o que pudesse lembrar o antigo domínio. Por outro lado, as ideias liberais e as novas doutrinas do Direito, do mesmo modo que as condições sociais, vale lembrar que, bem diferentes daquelas que as Ordenações foram destinadas a reger, exigiam a elaboração de um Código Penal brasileiro, no plano constitucional, que segundo o art. 179, 18, da Carta Política do Império, que impunha a urgente organização de “um Código Criminal fundado nas sólidas bases da justiça e da equidade”. Foi esse Código obra legislativa realmente honrosa para a cultura jurídica nacional, como expressão avançada do pensamento penalista no seu tempo; legislação liberal, baseada no princípio da utilidade pública, como havia de resultar naturalmente da influência de Bentham, que se exerceu sobre o novo Código, como já se fizera sentir no Código Francês de 1810.
Como se percebe, há um avanço no regime punitivo, o qual é construído em uma cultura liberal, o que, entre outros avanços, trouxe a individualização da pena e o princípio da utilidade desta. Todavia, foi a partir do Código Penal, em 1890, que se aboliu a pena de morte e surgiu o regime penitenciário de caráter correcional, com fins de ressocializar e reeducar o detento, mas que, já no início de sua implantação, enfrentou movimentos reformistas (Magnabosco, 1998). Pereira Cuano (2010, p. 5), aduz que o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil foi promulgado pelo Decreto de Governo Provisório, sob o nº 847, de 11 de outubro de 1890, só tendo entrado em vigor no ano de 1891, face o Decreto nº 1.127, de 6 de dezembro de 1890, que assinava o prazo de seis meses para a sua execução no território nacional (art. 411 do CP).
O primeiro Código Penal republicano foi menos feliz que o seu antecessor. A pressa com que foi concluído prejudicou-o em mais de um ponto, e nele a crítica pôde assinalar, fundadamente, graves defeitos, embora muitas vezes com excesso de severidade. Não tardou a impor-se a ideia de sua reforma, e em menos de três anos depois da sua entrada em vigor já aparecia o primeiro projeto de Código, para substituí-lo. O movimento de reforma, entretanto tornara-se imperioso. Em 1916, o Instituto da Ordem dos Advogados, no Rio de Janeiro, fazia sentir no Congresso a necessidade urgente da reforma penal e, dois anos depois, uma Comissão da Câmara e do Senado entrava a discutir as bases de um projeto, que ficou também sem andamento.
Regia o País, naquela época, o pensamento de Estado Novo, e, em 1940, durante o governo de Getúlio Vargas, é publicada a consolidação das Leis Penais, completado com leis modificadoras, chamado de Código Penal brasileiro. Deste momento em diante, as penas são divididas em principais e acessórias, dependendo da gravidade do delito, sendo de três tipos: as primeiras reclusão, detenção e multa; enquanto que as segundas consistem na perda da função pública, nas interdições de direitos e na publicação da sentença. A reclusão é a mais rigorosa, executando-se de acordo com o sistema progressivo, dividindo-se sua duração em quatro períodos (Pereira Cuano, 2010). O modelo penal de 1940 vinha a sofrer modificações nos anos de 1969, 1977, 1981 e 1984, sempre adequados à ideologia vigente da época. No ano de 1984, foi estabelecida a lei que cuida da execução das penas, Lei nº 7.210, visando regulamentar a classificação e individualização das penas, rezando ideias mínimas para
tratamento do apenado, procurando resguardar seus direitos e estabelecendo seus deveres. Das inovações trazidas, é oportuno pautar a redação do art. 39 do CPB e a do art. 29 da LEP, que possibilitam ao preso trabalhar e a receber salário pelo seu esforço. Já a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 incorporou várias matérias já estabelecidas, preocupando-se principalmente com o princípio da humanidade, ou seja, a dignidade da pessoa humana, e demais fundamentos trazidos pelo art. 5º desta Carta, como proibição da tortura e respeito à integridade física e moral, o que significa, inexoravelmente, um avanço no sistema democrático brasileiro. Ainda, cabe ressaltar que, com o reconhecimento da autonomia do Direito Penitenciário pela Constituição Brasileira (art. 24, I), todas as universidades terão de adotar o ensino do direito penitenciário. A reforma penal não se fará sem a renovação do ensino universitário das disciplinas relacionadas com o sistema penal (Magnabosco, 1998). Procurando entender o sistema prisional, buscar-se-á na próxima discussão uma conceituação, apontando as características das prisões, as quais dependem muito do regime ao qual o preso é submetido.
Para melhor entendimento do tema proposto, é oportuno que se traga à reflexão alguns conceitos postos no ensejo de estabelecer o devido raciocínio lógico.
Abril/2016 – Ed. 229
O Código era dividido em 4 livros, sendo que o primeiro tratava dos crimes e penas, o segundo militava sobre os crimes em espécie, o terceiro, das contravenções em espécie, e o quarto, das disposições gerais, sendo composto de quatrocentos e doze artigos.
No intuito de buscar uma conceituação, encontramos no portal do Ministério da Justiça, o seguinte:
50
1.2 Conceito de estabelecimentos prisionais
a) Estabelecimentos Penais: são todos utilizados pela justiça para alojar quem é preso, independente de ser provisório, condenado ou submetidos à medida de segurança; b) Estabelecimentos para Idosos: são estabelecimentos penais próprios, autônomos, que se incorporam aos dos adultos, que servem para abrigamento de presos que tenham no mínimo sessenta anos de idade ao ingressarem ou os que atinjam essa idade quando de sua privação de liberdade; c) Cadeias Públicas: são estabelecimentos penais de presos em caráter provisório, sendo de segurança máxima; d) Penitenciárias: são estabelecimentos destinados a recolher presos em condenação à pena privativa de liberdade ao regime fechado; d.1) Penitenciária de Segurança Máxima Especial: são estabelecimentos penais que abrigam presos de condenação em regime fechado, que possuem celas individuais; d.2) Penitenciárias de Segurança Médias ou Máxima: são estabelecimentos penais que abrigam preso de condenação de regime fechado e que possuem celas individuais ou coletivas; e) Colônias Agrícolas Industriais ou Similares: estas são estabelecimentos penais que abrigam preso do regime semiaberto;
Abril/2016 – Ed. 229
f) Casas do Albergado: casas do albergado são estabelecimentos penais que abrigam presos que cumprem pena privativa de liberdade em regime aberto, ou, ainda, pena de limitação de fim de semana;
51
g) Centros de Observação Criminológica: são estabelecimentos penais próprios do regime fechado e de segurança máxima, onde são realizados exames criminológicos, estes, indicadores da destinação que será dada ao preso, quanto ao estabelecimento adequado e ao tipo de tratamento que será submetido; h) Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico: os hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico são estabelecimentos penais que abrigam pessoas submetidas à medida de segurança. (Portal..., 2009)
Destarte, o Estado estabelece, em cada caso concreto, em qual estabelecimento penal o apenado deva cumprir sua pena, sempre enfocando o desejo reformador da casa.
Entre os mais modernos estabelecimentos carcerários encontram-se: Walnut Street Jail, na Filadélfia (1829); Auburn, Nova Iorque, em (1817); e o sistema da Pensilvânia, todos nos Estados Unidos da América. Consideram-se modernos, pois instalam a disciplina, removem a tentação da fuga e reabilitam o ofensor. No sistema de Auburn, os prisioneiros dormem em celas separadas, mas trabalham, durante o dia, em conjunto com os demais prisioneiros. Este método de sistema está sendo implantado em todos os EUA. Já no sistema da Pensilvânia, o ofensor é isolado durante todo o período do confinamento (Magnabosco, 1998). Deste modo, denota-se que os sistemas são baseados na premissa do isolamento, na substituição dos maus hábitos da preguiça e do crime, subordinando o preso ao silêncio e à penitência para que se encontre apto ao retorno junto à sociedade, curado dos vícios e pronto a tornar-se responsável pelos seus atos, respeitando a ordem e a autoridade. Todos têm o direito de voltar ao seio da sociedade após terem pagado sua dívida para com ela, mas, para tanto, é necessária a sua passagem em estabelecimento penal, conduzida pelo Estado, no intuito de regeneração, com segurança a sua vida, pois precisa sair desta casa vivo e com saúde. Nesta ótica, há a exigência de segurança e disciplina no interior da instituição custodial, onde deverá haver uma correta coerção e supervisão estatal nestes estabelecimentos, controlando o nível de liberdade dos apenados. Para tanto, Thompson (1998, p. 96) assevera que: I. Dada a exigência de segurança média e máxima, não se pode esperar que o regime funcione como agente reformador. II. Dada a exigência de segurança, não se pode encontrar um nível de liberdade interna capaz de, automaticamente, assegurar a disciplina. Necessariamente, terá de haver supervisão e coerção.
Entretanto, o comentário trazido pelo autor adentra aos moldes e padrões internos do equilíbrio e à estabilidade do sistema, colocando sob égide o poder do preso e o poder estatal, quanto a estabelecimento real e efetivo de custódia ao apenado, propondo que o funcionário, ou seja, o agente carcerário, não se envolva emocionalmente com o preso, tendo em vista, o exercício da coerção, quando esta necessária for. Frente a estes compromissos demandados, muitas objeções podem ser lançadas como desafios, entretanto, apesar de já terem sido plantadas as sementes pela Carta Maior, falta apenas a concretização de garantia. Neste plano, discutir-se-á a seguir o levantamento das diferenças entre os sistemas prisionais visando enfocar os acertos e os defeitos do que já está sendo efetuado, por meio de uma comparação efetiva.
1.3 Principais diferenças entre os sistemas prisionais Ao falar em diferenças entre os sistemas prisionais, primeiramente buscamos a ideia de Rezende (1999, p. 2), que faz uma comparação com o sistema europeu assim expondo: Existem poucas coincidentes, no entanto, são várias as diferenças, entre elas a não aplicação continuada aqui no Brasil das penas alternativas, se for o caso, conforme o tipo de delito praticado pelo indivíduo (há lei para isso). Veja-se, no Brasil, comina-se a pena privativa de liberdade em 75% ou mais dos crimes previstos; além do mais, há necessidade de instituição do trabalho aos presos de maneira intensa, aliado a cursos de profissionalização e conscientização moral. Reitero a expressão: de maneira intensa. No entanto, a principal diferença possivelmente esteja na não aplicação seguida de verbas específicas para o setor. Na Europa, aplicam-se verbas maciças. Sei que não poderemos aplicar verbas nesse setor à semelhança europeia, somos um país pobre, mas poderia ser bem
maior nesse sentido. No Brasil, infelizmente, a sociedade ainda não se conscientizou de que o “crime”, o “delito”, a “infração” não nascem do nada. Tudo isso emerge dentro da própria sociedade. Ela ainda não entendeu de que há necessidade de se “consertar” o homem desvirtuado de sua missão social, método aplicado por inteiro em todo o sistema prisional europeu, onde tudo é feito no sentido de devolver ao homem prisioneiro a sua dignidade, restituir-lhe aquilo que a sua própria conduta lhe extraiu. E, para isso, necessária a destinação de verbas especiais e contínuas. Assim fazendo, a violência que impera entre nós fatalmente diminuirá.
Observa-se que, conforme expõe o autor, o sistema prisional é reflexo direto da sociedade, dependendo muito dos recursos financeiros colocados à disposição deste, mas o que implica mesmo é a conscientização moral acerca do crime (Assis, 2007). Quanto à comparação com os países latino-americanos, trouxemos o entendimento de Callegari (2009, p. 2), que assim expõe: Não há grandes diferenças entre os sistemas prisionais nos países latino-americanos, pois, como no Brasil, todos têm os mesmos problemas, ou seja, superpopulação, ausência de trabalho para o apenado, condições de higiene e assistência à saúde. Ademais, falta um programa efetivo de assistência ao egresso, possibilitando a reinserção no meio social. Os principais problemas no sistema prisional brasileiro são: superpopulação carcerária, presídios sem as mínimas condições de higiene, programas de trabalho e assistência ao apenado, controle dos presídios por facções criminosas, mistura de presos provisórios (sem julgamento) com presos já condenados, ausência de classificação e separação dos presos por delitos cometidos, além de lentidão na análise dos processos de progressão de regime prisional. A Lei de Execução Penal é adequada à realidade contemporânea brasileira, aliás, é uma lei excelente em termos de direitos garantidos aos apenados, pois nela há uma previsão que contempla desde o espaço nas celas até a assistência que o preso necessita. O problema é que na prática a lei não é cumprida, pois, como sabemos, não há investimentos do Poder Executivo nessa área. Assim, temos uma lei excelente, porém, sem efetividade. É possível que uma pessoa que contrate um bom advogado também fique presa. O problema é que a prisão deve ser vista não como regra, mas como exceção, isto é, para os casos em que se justifique como necessária, principalmente enquanto não houver o julgamento definitivo do processo. A Constituição Federal presume que todo cidadão é inocente e o Supremo Tribunal Federal tem resguardado este direito. Há casos em
Abril/2016 – Ed. 229
III. Dadas as exigências de segurança e disciplina, não se poderá definir o papel do funcionário comum como sendo também o de amigo e conselheiro do preso.
52
que, mesmo com bons advogados, os tribunais têm mantido a prisão, mas é claro que o advogado que tem mais recursos do cliente à sua disposição poderá também contar com mais recursos para a defesa.
Abril/2016 – Ed. 229
Nos Estados Unidos, por sua vez, existe apenas uma instituição responsável pela área de segurança de cada cidade. Escolhido pela população, o denominado “xerife” cuida tanto do policiamento ostensivo quanto da polícia investigativa e também da guarda e acautelamento dos presos. Lá, o detento tem que ser ouvido em até 24 horas pelo juiz, que fica em um setor ao lado da unidade prisional, que é denominada Corte (JusBrasil, 2009).
53
Para finalizar este tema, após o relato da história, do conceito e das diferenças, concluímos que depende unicamente da vontade política da sociedade, centralizando as esperanças, para que tenhamos um sistema prisional, aqui no Brasil, mais humano e moderno, baseado em um sistema mais digno, o que será pauta no próximo capítulo.
2 SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: MAIORES PROBLEMAS E A VISÃO DA SOCIEDADE
Nas palavras de Assis (2007, p. 3), o sistema norte-americano divide-se em três, conforme aponta:
Neste segundo momento, abordar-se-á o sistema nacional, o qual passa por diversos entraves, que dificultam sua eficácia.
Os sistemas penitenciários podem ser basicamente divididos em três, os quais, numa sequência evolutiva, foram o pensilvânico, o auburniano e o progressivo. Quando a Colônia da Pensilvânia (então uma das Treze Colônias inglesas na América) foi criada em 1681 ela tinha como objetivo atenuar a dureza da legislação penal inglesa. A cominação da pena de morte foi limitada ao crime de homicídio e também foram substituídas as penas de castigos físicos e de mutilações pelas penas privativas de liberdade e de trabalhos forçados, que em 1786 vieram finalmente a ser abolidos, persistindo então apenas a do encarceramento. [...] O sistema penitenciário auburniano surgiu da necessidade de se superar as limitações e os defeitos do regime pensilvânico. A sua denominação decorre da construção da prisão de Auburn, em 1816, na qual os prisioneiros eram divididos em categorias, sendo que aqueles que possuíam um potencial maior de recuperação somente eram isolados durante o período noturno, sendo-lhes permitidos trabalharem juntos durante o dia [...] A adoção do regime progressivo coincidiu com a ideia da consolidação da pena privativa de liberdade como instituto penal (em substituição à pena de deportação e à de trabalhos forçados) e da necessidade da busca de uma reabilitação do preso.
O modelo penitenciário brasileiro foi construído para servir aos senhores, em tempos de revolução, império e ditadura, em que o pensamento acerca de pessoa presa era completamente diferente do vivido atualmente, pois o País nunca tinha vivido nenhum momento de democracia tão longo, o que, sem dúvida, influi na administração pública, e esta, por sua vez, age diretamente na administração carcerária.
Nota-se, portanto, que existem muitas semelhanças e poucas diferenças, como bem frisadas anteriormente. O problema é apenas a condução do sistema prisional pelos governos e pela sociedade, colocando-o como prioridade nas políticas de governo, ou deixando-o de lado, sem incentivos e fiscalização.
Como pauta deste capítulo, levantar-se-ão os principais problemas, trazidos pelos doutrinadores, as políticas governamentais, também o entendimento da sociedade acerca do problema e, por derradeiro, a dignidade do cidadão preso.
2.1 Maiores problemas do sistema prisional brasileiro O Brasil convive com um abandono do sistema prisional; o que deveria ser um instrumento de ressocialização, muitas vezes funciona como escola do crime, devido à forma como é tratado pelo Estado e pela sociedade (Assis, 2007). Quanto ao papel do Estado, este não está cumprindo o estabelecido em diversos diplomas legais, como a Lei de Execuções
Anote-se que a Lei de Execuções Penais, em seu art. 1º, estabelece que “a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. Além disso, a mesma norma prevê a classificação, assistência, educação e trabalho aos apenados, o que visivelmente não é cumprido na sua integralidade. Nas expressões de Assis (2007, p. 1), o descaso com a saúde do preso é deplorável. Observe: A superlotação das celas, sua precariedade e sua insalubridade tornam as prisões num ambiente propício à proliferação de epidemias e ao contágio de doenças. Todos esses fatores estruturais aliados ainda à má alimentação dos presos, seu sedentarismo, o uso de drogas, a falta de higiene e toda a lugubridade da prisão, fazem com que um preso que adentrou lá numa condição sadia, de lá não saia sem ser acometido de uma doença ou com sua resistência física e saúde fragilizadas. O que acaba ocorrendo é uma dupla penalização na pessoa do condenado: a pena de prisão propriamente dita e o lamentável estado de saúde que ele adquire durante a sua permanência no cárcere. Também pode ser constatado o descumprimento dos dispositivos da Lei de Execução Penal, a qual prevê no inciso VII do art. 40 o direito à saúde por parte do preso, como uma obrigação do Estado. Outro descumprimento do disposto da Lei de Execução Penal, no que se refere à saúde do preso, é quanto ao cumprimento da pena em regime domiciliar pelo preso sentenciado e acometido de grave enfermidade (conforme art. 117, inciso II). Nessa hipótese, tornar-se-á desnecessária a manutenção do preso enfermo em estabelecimento prisional, não apenas pelo descumprimento do dispositivo legal, mas também pelo fato de que a pena teria perdido aí o seu caráter retributivo, haja vista que ela não poderia retribuir ao condenado a pena de morrer dentro da prisão.
Dessa forma, a manutenção do encarceramento de um preso com um estado deplorável de saúde estaria fazendo com que a pena não apenas perdesse o seu caráter ressocializador, mas também estaria sendo descumprido um princípio geral do direito, consagrado pelo art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, o qual também é aplicável subsidiariamente à esfera criminal, e, por via de consequência, à execução penal, que em seu texto dispõe que “na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.
Percebe-se o déficit na proteção da saúde do preso, dificultado pela falta de profissionais e medicamentos disponíveis, o que degrada a vida do preso, muitas vezes provocando lesões irreversíveis ou levando-o à morte. Ainda, as dificuldades na progressão de regime, pela falta de assistência judiciária, impunidade e poder paralelo, dentro dos presídios, também embatem a eficácia do sistema. Assis (2007, p. 2) também relata um grave problema do sistema, que são as rebeliões, conforme pode se observar: A conjugação de todos esses fatores negativos acima mencionados, aliados ainda à falta de segurança das prisões e ao ócio dos detentos, leva à deflagração de outro grave problema do sistema carcerário brasileiro: as rebeliões e as fugas de presos. As rebeliões, embora se constituam em levantes organizados pelos presos de forma violenta, nada mais são do que um grito de reivindicação de seus direitos e de uma forma de chamar a atenção das autoridades quanto à situação subumana na qual eles são submetidos dentro das prisões. Com relação às fugas, sua ocorrência basicamente pode ser associada à falta de segurança dos estabelecimentos prisionais aliada à atuação das organizações criminosas, e, infelizmente, também pela corrupção praticada por parte de policiais e de agentes da administração prisional. De acordo com números do último censo penitenciário, cerca de 40% dos presos, sejam eles provisórios ou já sentenciados definitivamente, estão sob a guarda da polícia civil, ou seja, cumprindo pena nos distritos
Abril/2016 – Ed. 229
Penais, Constituição Federal, Código Penal, além das regras internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a Resolução da ONU, que prevê as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso (Assis, 2007).
54
policiais. Ocorre que estes não são locais adequados para o cumprimento da pena de reclusão. No entanto, isso tem ocorrido em virtude da ausência ou da insuficiência de cadeias públicas e de presídios em nosso sistema carcerário. O problema maior é que, nesses estabelecimentos, não há possibilidade de trabalho ou de estudo por parte do preso, e a superlotação das celas é ainda mais acentuada, chegando a ser em média de 5 presos para cada vaga, quando nas penitenciárias a média é de 3,3 presos/vaga. As instalações nesses estabelecimentos são precárias, inseguras, e os agentes responsáveis pela sua administração não têm muito preparo para a função, e muitas vezes o que se tem visto é a facilitação por parte desses funcionários para a fuga de detentos ou para que estes possam ser arrebatados por membros de sua organização criminosa.
Abril/2016 – Ed. 229
Todos esses fatores fazem com que não se passe um dia em nosso país sem termos notícia da ocorrência de uma rebelião de presos, mesmo que seja ela de pequenas proporções. No que se refere às fugas, em análise a todas as falhas existentes dentro de nosso sistema carcerário e ainda levando-se em conta o martírio pelo qual os presos são submetidos dentro das prisões, não há que se exigir uma conduta diversa por parte dos reclusos, se não a de diuturnamente planejar numa forma de fugir desse inferno.
55
A falta de espaço, nos ditames da norma, como mostra o autor, demonstra um descontrole dos apenados, provocando rebeliões, fugas e atentados contra a vida do preso e dos trabalhadores dos sistema. Isto, aliado a organizações criminosas de tráfico de drogas, que invadem os estabelecimentos em busca de resgatar preso e atacar autoridades do sistema, acentua a dificuldade de administração destas casas prisionais (Assis, 2007). Ainda, é oportuno anotar que contribui para esta situação a pena atribuída como provisória ao delituoso, mas que, em vez de durar apenas 81 dias, passa de ano e abarrota o sistema prisional, bem como a colocação de mulheres em presídios masculinos, em vez de colocadas em casas especiais, exclusivas para elas, o que também prejudica o sistema.
Diniz (1996, p. 1) relata dados dos presídios do ano de 1996, o que, até o presente momento, passados 14 anos, continuam ou pioraram. Veja: O Brasil tem ao todo 511 Estabelecimentos de Confinamento, somando aproximadamente 60 mil vagas para presos. Todavia, estão presos nestes estabelecimentos 130 mil presos, representando um déficit de 70 mil leitos. E ainda existem 275 mil mandados de prisão expedidos e não cumpridos. Cada preso custa por mês para os cofres da nação o total de 4,5 salários-mínimos, sendo que o gasto geral dos Governos Federal e Estaduais é de 60 milhões num só mês. (Dados obtidos na Teleconferência do Ministério da Justiça, Sistema Penitenciário − Penas Alternativas, em 30.04.1996)
Ainda, o autor supracitado aponta que, com estes estabelecimentos, nosso País tinha em 1995 e 2005 a população carcerária de pouco mais de 148 mil presos, saltando para 361.402, o que representou um crescimento de 143,91% em uma década. A taxa anual de crescimento oscilava entre 10 e 12%. Atualmente, (dados do ano de 2009), constata-se, temos uma população de presos, em um total geral no sistema e na polícia, de 473.626, um crescimento desolado e sem controle por parte do órgão encarregado, tendo em vista que aumento de preso significa aumento de violência e aumento do número de cidadãos que descumprem as normas jurídicas estabelecidas, o que deveria ser encarado de forma diversa, com muito mais preocupação. A reportagem do jornal O Globo (2008, p. 2) fala acerca do relatório da CPI do sistema penitenciário, trazendo alguns dados alarmantes sobre o custo efetivo do preso e do número de mortos naquele espaço. Veja: [...] as investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Carcerário. Foram visitados porões, corredores, pátios e celas de uma estrutura falida, insegura e malcheirosa. Na prática, é um depósito de gente.
Segundo o Ministério da Justiça, 1.048 presos morreram dentro de cadeias e presídios brasileiros em 2007. Para a CPI do sistema carcerário, o número é maior: 1.250 mortos em um ano. A média é de três mortes por dia. Significa que viver na prisão, sob a custódia do Estado, é duas vezes mais perigoso do que morar na cidade mais violenta do país.
Como se nota, o que ocorre atrás das grades de um presídio é a barbárie, o horror, o retrato do inferno, a realidade deste sistema, como constatou a CPI. Todavia, é um aparelho que parece funcionar, apenas aparentemente, somente para perpetuar o horror, e que torna quase impossível pensar na recuperação de quem nele entrou, se a mudança não começar, pois este é o reflexo da sociedade. Ademais, a situação é assustadora. No Rio Grande do Sul, por exemplo, além da unidade, violência, saúde precária e a superpopulação carcerária, diversos são os problemas enfrentados, inclusive, com decisão judicial contra o Estado, conforme exposta a seguir: O Estado deve criar 3.387 vagas para o regime fechado. A construção pode ser feita de forma escalonada: 25% das vagas em 550 dias, 50% em 915 dias, 75% em 1280 dias e 100% em 1.645 dias. [...] O confinamento puro e simples de pessoas como o que se está fazendo é cruel e desumano e somente tem levado ao descrédito do poder estatal, a criação de facções e de poderes paralelos ao do Estado, dentro da prisão, demonstra a total falta de controle estatal sobre a população carcerária. [...].
Nem se pode argumentar que o problema carcerário é apenas dos apenados que lá se encontram, a precária situação das casas prisionais serve ainda como local para disseminação de doenças infectocontagiosas que se alastra entre os presos e na comunidade. (Rio Grande do Sul, 2009)
Ademais, a superpopulação afeta não apenas as casas nas capitais, mas também o interior do RS. Observe alguns dados: O mapa da população carcerária da Penitenciária Modulada Estadual de Osório, conforme a Susepe, a capacidade do regime fechado é de 360 vagas, mas conta com 840 presos, enquanto a do regime semiaberto é de 116 vagas, mas conta com 243 presos. Trata-se do 3º estabelecimento penal mais lotado no Estado, somente superado pelo Presídio Central de Porto Alegre e pela Penitenciária Estadual do Jacuí. Também é a modulada com maior lotação no Estado. Recentemente, o Estado divulgou a criação de 288 vagas na Penitenciária Modulada Estadual de Osório. (Radioosorio, 2009, p. 22)
O governo começa a reagir frente aos problemas, mesmo que lentamente, dando início a um plano nacional de saúde no sistema penitenciário, procurando estabelecer algumas diretrizes, como se observa, a seguir: Prestar assistência integral resolutiva, contínua e de boa qualidade às necessidades de saúde da população penitenciária; Contribuir para o controle e/ou redução dos agravos mais frequentes que acometem a população penitenciária; Definir e implementar ações e serviços consoantes com os princípios e diretrizes do SUS; Proporcionar o estabelecimento de parcerias por meio do desenvolvimento de ações intersetoriais; Contribuir para a democratização do conhecimento do processo saúde/ doença, da organização dos serviços e da produção social da saúde;
Abril/2016 – Ed. 229
Segundo o Ministério da Justiça, o Brasil tem 422 mil presos e são necessárias mais 185 mil vagas. Cada detento custa R$ 1,6 mil por mês aos cofres públicos. É bem mais do que ganha, por exemplo, um agente prisional em Goiás, que precisou comprar as algemas porque o Estado não fornece. “Meu salário é R$ 640,00 liquido”, diz o vigilante penitenciário Humberto Stefan. [...].
Provocar o reconhecimento da saúde como um direito da cidadania; Estimular o efetivo exercício do controle social. (Cartilha, 2010)
56
Essa assistência esta estabelecida há muito tempo no art. 10 e seguintes da Lei de Execuções Penais, mas não vinha sendo colocada em prática. As soluções, ou amenizações, precisam ser aceleradas, pois os percalços são muitos. Além dos apontados, ainda podem ser assinaladas como freios do sistema a reincidência, a falta de recursos para aparelhar os estabelecimentos e melhorar a sua infraestrutura e a conscientização da sociedade (Assis, 2007). Deste modo, a visão da sociedade quanto ao crime em si e a reabilitação e ressocialização do preso será nosso próximo esboço.
2.2.A visão da sociedade brasileira a respeito do tema
Abril/2016 – Ed. 229
O olhar da sociedade ainda reflete uma visão antiga, excludente e de caráter punitivo, sendo que a separação do joio do trigo torna-se necessária, mas de forma justa e digna.
57
Neste sentido, a imagem do preso é a de um ser humano, capaz de se recuperar, precisando ser intensificada, pois a grande maioria é vítima do sistema, sendo que, se for tratado com atenção, poderá retornar ao convívio dos seus como uma pessoa melhor, inclusive, não que o preso deva ter regalias que o cidadão comum não possua, mas uma política de inclusão, que trata o preso como preso, mas em primeiro lugar como ser humano e que este pode ser muito útil à sociedade após sua reabilitação.
a adoção da pena capital (penalidade de morte) como uma forma de legislação e política pública necessária para enfrentar o problema. Bom, diversos argumentos são apresentados contra e a favor, numa discussão ética e lógica formal, mas penso que antes de tudo devemos olhar para nossa realidade de caos e catástrofe social.
Santana (2010, p. 2), comentando o assunto, expõe: Eu achava muito temerário que se entregasse a um aparelhamento penal deficiente, que não consegue sequer alojar os criminosos diante dos aviltantes presídios abarrotados, com deficiências técnicas e de pessoal no âmbito policial que beiram à ausência mais completa de civilização, a tarefa de executar a pena máxima contra a vida dos criminosos de práticas hediondas. Seria muito arriscado. Lutei muito em debates, encontros e comigo mesmo para chegar até a posição em que me encontro: “sou favorável à pena de morte nos casos extremos de crueldade”. Evidentemente que se me fosse concedida a faculdade, hipótese impensável, mas só para argumentar, de redigir a lei da pena de morte, eu teria um cuidado especial e inarredável: só poderiam ser condenados à pena de morte aqueles criminosos de delitos hediondos sobre os quais, no decorrer do processo penal a que respondem, não pairasse a mínima dúvida de sua culpabilidade. Qualquer dúvida, qualquer controvérsia, qualquer argueiro na formação de culpa do acusado de crime hediondo faria com que o juiz deixasse de aplicar a pena de morte.
O íntimo sentimento da maioria da sociedade é o de que lugar de bandido é na cadeia, inclusive com a imposição de penas extremas, como o aduzido por Campos (2010, p. 1), quando trata da pena de morte. Observe:
Como se vê, a opinião das pessoas que lutavam contra a penalidade extrema vem se modificando e agora estão se manifestando a favor da pena de morte, em casos de crueldade na prática de crime. Todavia, enquanto ela, a “pena de morte,” estiver longe, como uma ficção, a pessoa a apoia; no momento em que essa passar a ser “próxima”, como, por exemplo, ter um filho ou um parente no corredor da morte, essa opinião poderá mudar.
Um debate que jamais sai de pauta quando se trata da questão da criminalidade e da violência disseminada em nossa sociedade é sobre
Segundo pesquisa de opinião realizada pelo Jornal Folha de São Paulo (2004, p. 1),
Situação similar acontece quando o assunto é prisão perpétua. Apoiam a pena 81% dos ouvidos em São Paulo (eram 76% em 2002), ante 72% dos ouvidos em outras capitais brasileiras.
Isto é decorrente do desmedido aumento da criminalidade e da impunidade, especialmente a que atinge direta e imediatamente a população mais sofrida, assistindo ano após ano este acréscimo, principalmente, o crime de gabinete, passar impune. Sendo que o mesmo atinge indireta e mediatamente a todos, e resulta na falta de ações básicas de saúde, educação e segurança, por causa do solapamento que a corrupção e outros desmandos causam nos recursos públicos. Nota-se que os bandidos estão mais soltos do que nunca (Zamith Junior, 2010). Ademais, a visão da sociedade de que cadeia é lugar de pobre está implantada no seu seio, devido a que o pobre possui uma maior dificuldade de acesso à justiça e a defensores, à melhor qualidade de vida com educação de qualidade, sendo que estes só se superarão quando a sociedade toda tiver acesso aos bens da nação. É necessária a mudança na consciência social, haja vista que a violência contra presos parece ser socialmente aceita, em uma impressão de que estes devem ser maltratados e permanecerem reclusos em más condições, gerando assim uma falsa sensação de manutenção da ordem pública. Ainda, é oportuno que se traga ao debate a questão de interesse público e privado, tendo em vista que há uma inversão na questão punitiva, na qual os crimes privados são punidos de forma rigorosa, enquanto que os crimes públicos são abrandados. Pois se os crimes públicos, geralmente relacionados a recursos financeiros públicos, afetam e maltratam muitas vezes milhares
de pessoas ao mesmo tempo, e os crimes privados maltratam geralmente apenas uma única pessoa, poderia ser o inverso o modelo punitivo. O modelo adotado, além de ser excludente, também não respeita a pessoa, pois aquele que está atrás das grades é tratado como lixo humano e não como um ser humano, que merece uma atenção especial, que necessita que a visão da sociedade se volte para atender à construção de presídios dignos, conforme as necessidades dos presos. Nesta perspectiva serão pauta do próximo estudo as garantias do preso, esculpidas pelas legislações.
2.3 Dignidade da pessoa humana e garantias do preso O Estado tem autorização para prender alguém com base na proteção dos bens jurídicos tutelados por ele mesmo, no intuito da pacificação da convivência harmoniosa entre os membros da sociedade. Com isso, é instituído um direito penal para regular condutas humanas, estipulando penas àqueles que descumprirem o que está prescrito, mas este também regula a observância das garantias fundamentais, pois fazem parte do alicerce da própria constituição do Estado. O respeito à pessoa é algo intrínseco a ela, simplesmente por ser humana, natural, que o acompanha, não importando a sua condição financeira ou local de estadia, cabendo ao Estado promover a proteção desta garantia fundamental. Neste sentido já se proclamaram normas internacionais e nacionais, visando estabelecer o papel do poder estatal, no intuito do proteger o indivíduo apenado de sofrimentos que possam ferir as garantias estabelecidas, conforme Assis (2007, p. 4), aponta:
Abril/2016 – Ed. 229
são a favor da adoção da pena de morte 59% dos que moram em São Paulo − eram 51% nas três pesquisas anteriores (2002, 2000 e 1997). No Brasil, a porcentagem atual diminui para 49%.
58
As garantias legais previstas durante a execução da pena, assim como os direitos humanos do preso, estão previstos em diversos estatutos legais. Em nível mundial existem várias convenções como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a Resolução da ONU que prevê as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso. Em nível nacional, nossa Carta Magna reservou 32 incisos do art. 5º, que trata das garantias fundamentais do cidadão, destinados à proteção das garantias do homem preso. Existe ainda em legislação específica − a Lei de Execução Penal − os incisos de I a XV do art. 41, que dispõe sobre os direitos infraconstitucionais garantidos ao sentenciado no decorrer na execução penal.
Abril/2016 – Ed. 229
Conforme o autor ressalta, as garantias já se encontram esculpidas nos ordenamentos jurídicos, sendo desnecessário qualquer procedimento cruel ou degradante à pessoa do preso ou à pessoa ligada a este, apenas um atendimento a este em seguimento do regramento; e qualquer atitude de opressão fere a legalidade, devendo ser combatida pela sociedade.
59
Entretanto, a vida em uma prisão ainda enfrenta diversos problemas, como agressões físicas e morais, castigos que representam perda de personalidade em uma metodologia que não apresenta perspectivas de retorno à sociedade. Como se não bastasse o indivíduo perder direitos, segundo uma sentença judicial, ainda corre o risco de perder sua dignidade em um estabelecimento prisional. Segundo Assis (2007, p. 5), a realidade quanto ao sofrimento dentro dos presídios é muito diverso da estabelecida em Lei. Veja: Dentro da prisão, dentre várias outras garantias que são desrespeitadas, o preso sofre principalmente com a prática de torturas e de agressões físicas. Essas agressões geralmente partem tanto dos outros presos como dos próprios agentes da administração prisional.
Os abusos e as agressões cometidos por agentes penitenciários e por policiais ocorrem de forma acentuada principalmente após a ocorrência de rebeliões ou tentativas de fuga. Após serem dominados, os amotinados sofrem a chamada “correição”, que nada mais é do que o espancamento que acontece após a contenção dessas insurreições, o qual tem a natureza de castigo. Muitas vezes esse espancamento extrapola e termina em execução, como no caso que não poderia deixar de ser citado do “massacre” do Carandiru, em São Paulo, no ano 1992, no qual oficialmente foram executados 111 presos. O despreparo e a desqualificação desses agentes fazem com que eles consigam conter os motins e rebeliões carcerárias somente por meio da violência, cometendo vários abusos e impondo aos presos uma espécie de “disciplina carcerária” que não está prevista em lei, sendo que na maioria das vezes esses agentes acabam não sendo responsabilizados por seus atos e permanecem impunes. Entre os próprios presos a prática de atos violentos e a impunidade ocorrem de forma ainda mais exacerbada. A ocorrência de homicídios, abusos sexuais, espancamentos e extorsões são uma prática comum por parte dos presos que já estão mais “criminalizados” dentro da ambiente da prisão e que, em razão disso, exercem um domínio sobre os demais presos, que acabam subordinados a essa hierarquia paralela. Contribui para esse quadro o fato de não serem separados os marginais contumazes e sentenciados a longas penas dos condenados primários.
Como se percebe, nas anotações trazidas pelo autor, inúmeras ofensas à dignidade da pessoa ocorrem dentro dos estabelecimentos prisionais, fugindo do controle dos órgãos responsáveis, ou estes sendo coniventes com o problema. As ofensas à dignidade da pessoa humana precisam ser tratadas como ofensas aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, e, portanto, não devem passar imunes, pois não pode mais ser tolerado este tipo de comportamento de seres humanos contra seres humanos, tendo em vista que se trata de um ser igual a outro. O princípio da humanidade deve prevalecer no cumprimento da pena, podendo o apenado cumprir sua pena perto dos seus
Devem ainda ser destacados os ditames dos arts. 3º, 40, 41, 42 e 43 da LEP quanto aos direitos do preso, nos quais fica claro que será de responsabilidade do Estado a sua execução, o que somente com a pressão dos indivíduos que compõem a sociedade, acontecerá, pois foi deixada de lado, evitando-se inclusive que se toque no assunto. Ressalta-se que a crise vivenciada pelos mais diversos países, na atualidade, quanto ao aparelho carcerário não permite cumprir com os objetivos esculpidos pela Legislação, contudo precisam de restabelecimento e efetivação imediata, que unicamente acontecerão se houver vontade política e coragem para que seja dado o pontapé inicial (Ribeiro, 2009). Ainda é oportuno ressaltar que o tratamento dado às mulheres e aos maiores de sessenta anos deve ser diferenciado conforme previsão contida na Constituição Federal, no Código Penal e na Lei de Execuções Penais, até pela condição de vulnerabilidade, com celas separadas dos demais presos, evitando que sofram algum tipo de violência, mas o respeito é apropriado em todas as idades e sexo, tanto por parte do Estado quanto por parte do preso, que deve ser fiscalizado por aquele, fazendo valer a política da dignidade em todas as casas. O Estado deslocou seu foco para uma simples manutenção da ordem, esquecendo-se dos princípios orientadores, seus fundamentos, e isto levou à mudança de visão acerca do preso, pois, quando o próprio Estado esquece que o indivíduo preso é um cidadão que faz parte do mesmo, isto se reflete em toda sociedade, a qual passa a tratar o preso, mesmo depois de ter cumprido apena, como não mais sendo este um cidadão (Ribeiro, 2009).
Por fim, aponta-se que o estudo baseou-se, no modelo ideológico de Estado Democrático de Direito, pois este, na visão do autor, prima pela participação dos cidadãos nas decisões da administração pública e coloca o ser humano em um patamar de respeito e dignidade, porém encontra percalços que devem ser sanados com a ajuda da sociedade civil.
CONCLUSÃO De todo o exposto, conclui-se que ocorreram poucos avanços no que diz respeito ao sistema carcerário brasileiro, ou seja, insuficientes para a demanda de um país imenso igual ao nosso, impondo às autoridades e à sociedade uma visão mais reformista e preocupada com o bem estar do ser humano, indiferentemente ao local em que este se encontra, devendo ser tratado como ser humano, com respeito. Além do espaço físico, o sistema pede um olhar mais atuante, ou seja, vontade política, no sentido de treinamento de profissionais para lidar com os apenados, incluindo-se rol, médicos, advogados e todo um aparato mais humano, no sentido de valorizar a vida, que precisa de apoio para voltar a produzir frutos bons. Neste sentido, a ocupação do preso torna-se imprescindível, juntamente com o ensino técnico, no intuito de aperfeiçoar o conhecimento deste e prepará-lo para seu retorno, sendo colocado em um patamar de ser humano igual aos demais, após sua saída da prisão, enfrentando o mercado de trabalho e produzindo riquezas à sociedade novamente, pois, se for diferente, o crime irá prepará-lo, aí todos têm a perder. Analisando todos os aspectos conjunturais do Brasil, percebe-se que as discussões acerca da temática precisam ser incentivadas incluindo a sociedade civil organizada nesse debate, minimizando os problemas referentes ao sistema prisional nacional,
Abril/2016 – Ed. 229
familiares, com privacidade e liberdade de expressão, além das demais garantias estabelecidas, tendo por fim o ser humano, e não o usando como meio.
60
trazendo à cena, por que não, os atores privados a participarem desse desafio, efetuar o tratamento penal. Ainda no tocante ao sistema pátrio, várias iniciativas poderiam ser tomadas, como a revisão de todo o modelo prisional, todavia, toda e qualquer reforma que se possa pensar passa, no momento atual, pela necessidade de geração de maior número de vagas carcerárias. Contudo, a simples construção de vagas não é a resposta a todas as demandas, é cogente que os presídios tenham estruturas capazes de abrigar seus detentos, maiores e com finalidades melhores. Quanto à visão da sociedade, ressalta-se a necessidade de uma mudança de cultura, com uma visão mais humana, pois estamos falando de cidadãos que o Estado cessa a liberdade, não a dignidade. Por fim, bate-se na tecla da educação, pois é desde o início da vida que se aprende a distinguir o certo do errado, sendo por meio da educação que brotará a solução para mais este percalço da sociedade.
Abril/2016 – Ed. 229
REFERÊNCIAS
61
ANDRADE, Lédio Rosa de. Direito penal diferenciado. 2. ed. Florianópolis: Conceito, 2009. ASSIS, Rafael Damaceno de. A realidade atual do sistema penitenciário brasileiro. Disponível em: <http://br.monografias.com/trabalhos908/a-realidade-atual/a-realidade-atual.shtml>. Acesso em: 26 jun. 2010. ______. A evolução histórica dos regimes prisionais e do sistema penitenciário. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/24894>. Acesso em: 26 jun. 2010. BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 1. ed. São Paulo: Edipro, 1999.
BÍBLIA SAGRADA. Edição pastoral. São Paulo: Paulus, 1990. BITENCOURT, Cézar Roberto. Falência da pena de prisão. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 26 jun. 2010. ______. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em: 26 jun. 2010. ______. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 26 jun. 2010. CALLEGARI, André. Prisão deve ser vista como exceção, e não como regra: Entrevista. Disponível em: <http://www.ihuonline.unisinos.br/index. php?option=com_tema_capa&Itemid=23&task=detalhe&id=1617>. Acesso em: 26 jun. 2010. CAMPOS, Maurício. Pena de morte: “Política de Segurança” ou Ideologia?. Disponível em: <http://www.midiaindependente.org/pt/red/2010/06/473200. shtml>. Acesso em: 24 out. 2010. CARTILHA, Plano nacional de saúde do sistema penitenciário. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cartilha_pnssp.pdf>. Acesso em: 26 ago. 2010. CHRISTIE, Nils. A indústria do controle do crime: a caminho dos GULAGs em estilo ocidental. Trad. Luís Leiria. Rio de Janeiro: Forense, 1998 DINIZ, Eduardo Albuquerque Rodrigues. Realidade do sistema penitenciário brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, a. 1, n. 1, nov. 1996. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1008>. Acesso em: 10 set. 2010. JORNAL Folha de São Paulo. Em questões morais, conservadorismo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u89099. shtml>. Acesso em: 24 out. 2010. JUSBRASIL. Comitiva apresenta resultados da visita ao sistema prisional norte-americano. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/politica/2598725/comitiva-apresenta-resultados-da-visita-ao-sistema-prisional-norte-americano>. Acesso em: 26 jun. 2010.
MAGNABOSCO, Danielle. Sistema penitenciário brasileiro: aspectos sociológicos. Jus Navigandi, Teresina, 1998. Disponível em: <http://jus2.uol. com.br/doutrina/texto.asp?id=1010>. Acesso em: 26 jun. 2010. O GLOBO. Sistema penitenciário vive um “apagão carcerário”. 2008. Disponível em: <http://g1.globo.com/noticias/brasil/0,,mul537366-5598,00-siste ma+penitenciario+vive+um+apagao+carcerario.html>. Acesso em: 23 out. 2010. PEREREIRA CUANO, Rodrigo. História do Direito penal Brasileiro. Disponível em: <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/884/historia_do_direito_penal_brasileiro>. Acesso em: 26 set. 2010. PORTAL do Ministério da Justiça- Estabelecimentos penais. Disponível em: <www.mj.gov.br/data/pages/mjd574e9ceitemidab2ef2d92825476e8516e63c78fc7c4cptbrie.htm>. Acesso em: 26 de jun. 2010. RADIOOSORIO. Interdição da penitenciária modulada estadual de Osório: Reportagem. Disponível em: <http://www.radioosorio.com.br/blog. php?idBlog=5&iPagina=22>. Acesso em: 26 set. 2010. RECOMEÇO Jornal. Uma análise do sistema penitenciário. Disponível em: <http://www.nossacasa.net/recomeco/0075.htm>. Acesso em: 26 jun. 2010. REZENDE, Afonso Celso. Sistema prisional: Entrevista. Disponível em: <http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=1416&>. Acesso em: 26 jun. 2010.
RIO Grande do Sul. Ação Civil Pública nº 001/1.07.0283822-9. Juiz Prolator: Dra. Rosana Broglio Garbin. 7ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central. J. 06.02.2009. SANTANA, Paulo. Razões à pena de morte. Disponível em: <http:// wp.clicrbs.com.br/paulosantana/2010/06/02/razoes-a-pena-de-morte/?topo=77,1,1>. Acesso em: 24 out. 2010. THOMPSON, Augusto. A questão penitenciária. De acordo com a Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Forense, 2010. ZAMITH JUNIOR, Carlos. Lugar de bandido é na cadeia. Será? Disponível em: <http://www.diariodeumjuiz.com/?p=2229>. Acesso em: 26 set. 2010.
Abril/2016 – Ed. 229
RIBEIRO, Jair Aparecido. Liberdade e cumprimento de pena de presos no sistema carcerário paranaense. 2009. Disponível em: <http://www.artigonal.com/direito-artigos/liberdade-e-cumprimento-de-pena-de-presos-no-sistema-carcerario-paranaense-1518528.html>. Acesso em: 26 jun. 2010.
62
Acórdão na Íntegra
Superior Tribunal de Justiça Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 830.613/SP (2015/0324958-4) Relatora: Ministra Maria Thereza de Assis Moura Agravante: Wilson Dias de Melo Advogada: Carmem Lígia Zopolato Fante e Silva Advogado: José Aparecido da Silva Agravado: Ministério Público do Estado de São Paulo EMENTA PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO DO ART. 158 DO CP – (I) TESE REFERENTE À DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282/STF E 356/STF – (II) TESE AMPARADA NO PEDIDO ABSOLUTÓRIO – REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO – INADMISSIBILIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO 1. Esta Corte possui o entendimento no sentido de que é condição sine qua non ao conhecimento do especial que tenham sido ventilados, no contexto do acórdão objurgado, os dispositivos legais indicados como malferidos na formulação recursal, emitindo-se, sobre cada um deles, juízo de valor, interpretando-se-lhes o sentido e a compreensão, em atenção ao disposto no art. 105, inciso III, da Constituição Federal, que exige o prequestionamento por meio da apreciação da questão federal pelo Tribunal a quo, de modo a se evitar a supressão de instância. Súmulas nºs 282/STF e 356/STF. 2. É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um cotejo fático-probatório a fim de analisar a existência de provas suficientes a embasar o decreto condenatório, ou a ensejar a absolvição, porquanto é vedado na via eleita o reexame de fatos e provas. Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: A Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJSP) votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília, 15 de março de 2016 (data do Julgamento). Ministra Maria Thereza de Assis Moura Relatora RELATÓRIO Ministra Maria Thereza de Assis Moura (Relatora): Trata-se de agravo regimental interposto por Wilson Dias de Melo, contra decisão monocrática, de minha lavra, que negou provimento ao agravo em recurso especial, nos seguintes termos (fl. 427): “PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO DO ART. 158 DO CP – (I) TESE REFERENTE À DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282/STF E 356/STF – (II) TESE AMPARADA NO PEDIDO ABSOLUTÓRIO – REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO – INADMISSIBILIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.”
Sustenta o recorrente, às fls. 439/450, que “cumpriu todas as exigências para processamento, conhecimento e julgamento do Recurso Especial interposto, sendo ainda evidente que a matéria federal fora enfrentada pela instância a quo que deu o Agravante como incurso
Aduz que “o Acórdão recorrido não valorou adequadamente a prova no que diz respeito à capitulação jurídica da conduta decorrente do fato provado, o que deverá ser feito por este E. STJ que melhor solução dará ao caso sem que para tanto tenha que reexaminar provas para rever este ou aquele fato, o que seria vedado pela Súmula nº 7” (fl. 441). É o relatório. EMENTA PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO DO ART. 158 DO CP – (I) TESE REFERENTE À DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282/STF E 356/STF – (II) TESE AMPARADA NO PEDIDO ABSOLUTÓRIO – REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO – INADMISSIBILIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO 1. Esta Corte possui o entendimento no sentido de que é condição sine qua non ao conhecimento do especial que tenham sido ventilados, no contexto do acórdão objurgado, os dispositivos legais indicados como malferidos na formulação recursal, emitindo-se, sobre cada um deles, juízo de valor, interpretando-se-lhes o sentido e a compreensão, em atenção ao disposto no art. 105, inciso III, da Constituição Federal, que exige o prequestionamento por meio da apreciação da questão federal pelo Tribunal a quo, de modo a se evitar a supressão de instância. Súmulas nºs 282/STF e 356/STF. 2. É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um cotejo fático-probatório a fim de analisar a existência de provas suficientes a embasar o decreto condenatório, ou a ensejar a absolvição, porquanto é vedado na via eleita o reexame de fatos e provas. Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
VOTO Ministra Maria Thereza de Assis Moura (Relatora): A insurgência não merece prosperar. Com efeito, conforme se explicitou na decisão agravada, no que tange à alegada violação do art. 158 do Código Penal sob o amparo da tese de desclassificação do crime de extorsão para o tipo penal descrito no art. 345 do Código Penal, ao fundamento de que o recorrente “nada mais fez do que exagerar em sua conduta e exercer arbitrariamente de suas próprias razões, já que, como é necessário para tanto, sua pretensão era legítima” (fl. 322), verifica-se que referida tese não foi objeto de apreciação pela Corte de origem, tampouco foram opostos embargos de declaração para fins de prequestionamento. Assim, tem-se que, perquirir nessa via estreita sobre a violação da referida norma, sem que se tenha explicitado a tese jurídica de que ora se controverte, seria frustrar a exigência constitucional do prequestionamento, pressuposto inafastável que objetiva evitar a supressão de instância. Desse modo, na espécie têm incidência, por simetria, os Enunciados nºs 282 e 356 da Súmula do Excelso Pretório, respectivamente, in verbis: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada.” “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.”
É assente na Corte o entendimento no sentido de que é condição sine qua non ao conhecimento do especial que tenham sido ventilados, no contexto do acórdão objurgado, os dispositivos legais indicados como malferidos na formulação recursal, emitindo-se,
Abril/2016 – Ed. 229
no art. 158 quando na verdade o fato provado demonstra que outra capitulação jurídica deveria ser dada” (fls. 440/441).
64
sobre cada um deles, juízo de valor, interpretando-se-lhes o sentido e a compreensão, em atenção ao disposto no art. 105, inciso III, da Constituição Federal, que exige o prequestionamento por meio da apreciação da questão federal pelo Tribunal a quo, de modo a se evitar a supressão de instância. Mesmo se tratando de nulidades absolutas e condições da ação, é imprescindível o prequestionamento, pois este é exigência indispensável ao conhecimento do recurso especial, fora do qual não se pode reconhecer sequer matéria de ordem pública, passível de conhecimento de ofício nas instâncias ordinárias. A propósito, os seguintes precedentes: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – TRÁFICO DE DROGAS – DOSIMETRIA – CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006 – APLICAÇÃO NA ORIGEM NO PATAMAR DE 1/6 (UM SEXTO) – DISCRICIONARIEDADE DO MAGISTRADO – MOTIVAÇÃO CONCRETA – SÚMULA Nº 7/STJ – ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM – INOVAÇÃO RECURSAL – IMPOSSIBILIDADE – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE – AUSÊNCIA DO REQUISITO OBJETIVO – DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS – AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO
Abril/2016 – Ed. 229
[...]
65
4. Quanto ao mais, constato que o Tribunal de origem não apreciou a alegação trazida no presente recurso, no sentido de que teria ocorrido bis in idem na consideração da quantidade e natureza da droga tanto na fixação da pena-base, quanto na determinação do grau de redução da causa de diminuição de pena prevista no aludido dispositivo. 5. Na verdade, esses argumentos nem sequer foram suscitados nas razões de apelação. Assim, não se mostra possível analisar a questão, por ausência do requisito indispensável do prequestionamento, incidindo, assim, os óbices constantes das Súmulas nºs 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 6. [...]
7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg-REsp 1.430.101/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 5ª T., Julgado em 12.08.2014, DJe 21.08.2014) “PENAL E PROCESSO PENAL – RECURSO ESPECIAL – 1 CONTRARIEDADE AO ART. 159, CAPUT E § 1º, DO CPP – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282/STF E 356/STF – 2 NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 155, § 4º, II, DO CP – NÃO OCORRÊNCIA – FURTO QUALIFICADO – ESCALADA – AUSÊNCIA DE PERÍCIA – EXISTÊNCIA DE FOTOS E TESTEMUNHOS – DINÂMICA DELITIVA FILMADA – MATERIALIDADE COMPROVADA – 3 RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO 1. A ausência de apreciação pelo Tribunal local do conteúdo normativo do artigo tido por violado impede o exame da matéria por esta Corte Superior, pois, além de não se ter explicitado previamente a tese jurídica controvertida, não houve o preenchimento do requisito constitucional do prequestionamento. Inteligência dos Enunciados nºs 282 e 356, ambos da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 2. [...] 3. Recurso especial a que se nega provimento.” (REsp 1.392.386/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 5ª T., Julgado em 03.09.2013, DJe 09.09.2013) “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – ADMINISTRATIVO – ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – VIOLAÇÃO AO ART. 1º DO DECRETO Nº 20.910/1932 – MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 282/STF, POR ANALOGIA – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO 1. Restou consignado na decisão agravada que a prescrição arguida nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932 não foi enfrentada pelo Tribunal de origem, acarretando o vício de ausência de prequestionamento, o que inviabiliza o conhecimento da questão, nos termos da Súmula nº 282/STF. 2. Ainda que a prescrição seja matéria de ordem pública, o seu conhecimento em sede de recurso especial exige o prequestionamento da matéria pela Corte de origem. Precedentes.
(AgRg-REsp 850.516/SP, Relª Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJ/PE), 6ª T., Julgado em 20.08.2013, DJe 04.09.2013)
Outrossim, conforme exposto na decisão recorrida, no que tange à alegada violação do art. 158 do Código Penal, sob o amparo da tese absolutória, ao argumento de que a conduta não poderia ter sido capitulada como extorsão, pois o recorrente era “coproprietário do veículo e inclusive recebeu diretamente da vítima a sua cota-parte, tudo a demonstrar que exercitou um direito de forma inadequada” (fl. 328), observa-se que o recorrente pretende, em verdade, rediscutir as razões que levaram o Tribunal de origem a manter um decreto condenatório. Com efeito, a Corte a quo, soberana na análise das circunstâncias fáticas da causa asseverou que (fls. 297/299): “[...] a materialidade e a autoria do delito estão suficientemente comprovadas, calcadas nos boletins de ocorrência (fls. 05/07 e 334/35), no ofício de fls. 15/16, na medida protetiva de fls. 29/31, no exame de corpo de delito de fl. 32, em que comprovada, na vítima, lesão corporal leve, provocada por agente contundente, no laudo pericial de fls. 53/55, documento de fl. 130 e demais elementos de prova amealhados aos autos, restando isolada a versão do apelante. [...] O quadro probatório foi corretamente analisado pelo digno julgador, ficando patente o fato de que o apelante buscava obter da vítima a assinatura do documento transferindo-lhe a propriedade da camionete da família, agredindo-a fisicamente e conduzindo-a ao cartório, onde, a final, foi levado a efeito seu intento, de lá saindo com almejada assinatura, com firma reconhecida, da vítima, aposta no documento.”
É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um cotejo fático-probatório a fim de analisar a existência de provas suficientes a embasar o decreto condenatório, ou a ensejar a absolvição. Nesse contexto, verifica-se não possuir
esta senda eleita espaço para a análise das matérias suscitadas pelo recorrente, cuja missão pacificadora restara exaurida pelas instâncias anteriores. De fato, para se chegar a conclusão diversa da que chegou o Tribunal de origem, seria inevitável o revolvimento do arcabouço carreado aos autos, procedimento sabidamente inviável na instância especial. Com efeito, não se mostra plausível nova análise do contexto probatório por parte desta Corte Superior, a qual não pode ser considerada uma terceira instância recursal. Desse modo, não é possível, em sede de recurso especial, acolher a pretensão do recorrente, pois demandaria reexame de fatos e provas, o que é vedado nos termos da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial”. Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: “PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO DOS ARTS. 59, III, E 61, I, DO CP – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282 E 356/STF E 211/STJ – MALFERIMENTO DO ART. 386, V, CPP – REEXAME DE PROVAS – SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO 1. [...]
3. Agravo regimental a que se nega provimento.”
Abril/2016 – Ed. 229
3. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(AgRg-AREsp 442.919/PE, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., Julgado em 04.02.2014, DJe 18.02.2014)
66
2. É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um cotejo fático e probatório a fim de analisar a existência de provas suficientes a embasar o decreto condenatório, ou a ensejar a absolvição, porquanto é vedado, na via eleita, o reexame de provas, conforme disciplina o Enunciado nº 7 da Súmula desta Corte.
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – ROUBO QUALIFICADO – PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO – REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz
1. A alteração das conclusões do acórdão recorrido exige reapreciação do acervo fático-probatório da demanda, o que faz incidir o óbice da Súmula nº 7, STJ.
Secretário: Bel. Eliseu Augusto Nunes de Santana
2. Agravo regimental não provido.” (AgRg-REsp 1.449.908/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, 5ª T., Julgado em 22.05.2014, DJe 27.05.2014)
Por fim, conforme consignado na decisão impugnada, inexiste qualquer ilegalidade patente no acórdão recorrido, passível de correção pela via do habeas corpus de ofício, especialmente se considerado que a pena e seu regime inicial de cumprimento estão adequadamente fundamentados. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Carlos Frederico Santos
AUTUAÇÃO Agravante: Wilson Dias de Melo Advogado: José Aparecido da Silva Advogada: Carmem Lígia Zopolato Fante e Silva Agravado: Ministério Público do Estado de São Paulo Assunto: Direito penal – Crimes contra o patrimônio – Extorsão AGRAVO REGIMENTAL Agravante: Wilson Dias de Melo Advogado: José Aparecido da Silva
É como voto.
Advogada: Carmem Lígia Zopolato Fante e Silva
Abril/2016 – Ed. 229
CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEXTA TURMA AgRg-AREsp 830.613/SP Matéria criminal Número Registro: 2015/0324958-4 Números Origem: 00062245620108260081 00180000 180000 308/2010 3082010 RI0018DLJ0000 Em Mesa
67
Julgado: 15.03.2016
Relatora: Exma. Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Agravado: Ministério Público do Estado de São Paulo CERTIDÃO Certifico que a egrégia Sexta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP) votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Pesquisa Temática
Competência Ambiental Competência ambiental – ADIn – construção na zona costeira – criação de exceção – emenda à Constituição Estadual – inexistência de cláusulas pétreas – inconstitucionalidade formal ou material – inocorrência “Ação direta de inconstitucionalidade. Emenda à Constituição do Estado da Paraíba. Alínea d do art. 229 da CE. Meio ambiente. Direito fundamental. Construção na zona costeira. Área do porto organizado de Cabedelo. Criação de exceção. Inexistência de cláusulas pétreas. Âmbito da competência legislativa do Estado. Inocorrência de inconstitucionalidade formal ou material. Improcedência do pedido. O poder constituinte reformador no Estado da Paraíba pode editar emenda à Constituição dentro do âmbito de sua competência concorrente traçada no art. 24 da Constituição Federal, tendo como limite apenas os casos previstos no art. 60, § 1º, da Carta Nacional. Não havendo, na Carta Estadual, cláusulas pétreas que impeçam a modificação do texto constitucional, mesmo que digam respeito a direitos fundamentais, respeitadas as cláusulas de digam respeito à dignidade da vida humana, revela-se legítima a modificação do ordenamento jurídico para autorizar a prática de atos que assegurem o desenvolvimento econômico.” (TJPB – ADIn 888.2004.003654-4/001 – Rel. Des. Romero Marcelo da Fonseca Oliveira – DJe 21.09.2011)
Competência ambiental – ADIn – legislação proibindo emissão de sons acima do permitido – exceção para igrejas e cultos – possibilidade “Ação declaratória de inconstitucionalidade. Lei Distrital nº 4.092/2008, art. 10, inciso III. Exceção legal para igrejas e cultos em relação às proibições de emissão de sons e ruídos acima do nível máximo de pressão sonora permitido. Precedente: ADI 20090020015645. Nova lei com idêntico conteúdo. Possibilidade. Liberdade religiosa e livre exercício de culto. Direito fundamental. Inexistência de direito absoluto e irrestringível. Princípio da harmonização dos direitos fundamentais horizontais. Direito à saúde. Direito ao meio ambiente sadio. Poder de polícia. Políticas urbanas. Ação procedente. 1. É cabível a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) perante este Tribunal de Justiça, tendo em vista que a Constituição Federal, no art. 125, § 2º, outorga aos estados e, por extensão, ao Distrito Federal, competência para apreciar representação de inconstitucionalidade cujo objeto consista em lei estadual ou municipal em confronto com a Constituição Estadual ou Lei Orgânica do Distrito Federal. 2. O Poder Legislativo distrital, ao editar nova norma veiculando o mesmo conteúdo normativo já declarado inconstitucional (ADI 20090020015645), se ampara na independência dos poderes estatais, eis que não fica vinculado à decisão proferida pelo Poder Judiciário em controle abstrato de constitucionalidade normativa (art. 129, RITJDFT). 3. A liberdade religiosa cuida-se de direito fundamental, assegurado pela garantia constitucional do livre exercício de cultos religiosos. 4. Não há direitos absolutos, ilimitados e ilimitáveis. Pela aplicação do princípio da harmonização dos direitos fundamentais horizontais, é preciso ponderar os direitos em conflito para compatibilizá-los. 5. É desprovido de motivação válida, é irrazoável e desproporcional ato normativo que admite a irrestrita liberdade religiosa, alocando-a acima de todo e qualquer outro direito fundamental. 6. O direito à saúde é prerrogativa constitucional indisponível, sendo dever do estado implementar políticas públicas que instrumentalizem este direito (art. 204, I, LODF). 7. A submissão dos vizinhos a constantes incômodos gerados pela violação de seus domicílios, ambientes de trabalho ou de lazer pelo som excessivo (acima do limite legal), sem qualquer restrição de volume, horário e constância, significa restrição exagerada ao direito à saúde física e mental. 8. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, está expresso na LODF. 9;. O ruído é um agente poluidor capaz de alterar o equilíbrio e a harmonia de qualquer ecossistema, subjugando a tranquilidade e o sossego, além de violar, em hipóteses mais extremas, a própria dignidade da pessoa humana. Ainda que possa ser considerado fenômeno tipicamente urbano, não deve merecer comportamento tolerante ou complacente do Poder Público (ADI 2009 00 2 0015645-5). 10. Não há inconstitucionalidade do preceito questionado por violação ao art. 15, inciso XIV, da LODF. Isto porque, a competência privativa do Distrito Federal para exercer o poder de polícia administrativa não restou violada, já que o legislador apenas regulou matéria antes descoberta, o que também é uma faceta do poder de polícia, em sentido amplo. 11. As políticas urbanas devem estar afinadas em um conjunto de medidas que promovam a melhoria da qualidade de vida e devem estar calcadas nos princípios: da justa distribuição de benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização; prevalência do interesse coletivo sobre o individual; e combate a todas as formas de poluição. A função social da propriedade urbana é preenchida quando, dentre outros valores, é protegido o meio ambiente. É inconstitucional preceito normativo contrário aos princípios que norteiam as políticas urbanas. 12. Procedente o pedido para declarar, com efeitos ex tunc e eficácia erga omnes, a inconstitucionalidade material do inciso III do art. 10 da Lei Distrital nº 4.092/2008, por incompatibilidade vertical com a lei orgânica do distrito federal.” (TJDFT – ADInc 20110020052437 – (535816) – Rel. Des. Silvânio Barbosa dos Santos – DJe 27.09.2011 – p. 68)
Competência ambiental – contratação temporária – prorrogação – ilegitimidade passiva do Ministro de Estado do Meio Ambiente – incompetência do Superior Tribunal de Justiça – reconhecimento “Mandado de segurança. Contratação temporária de pessoal para realização de atividades técnicas vinculadas ao projeto de apoio às políticas públicas na área ambiental. Ilegitimidade passiva do Ministro de Estado do Meio Ambiente. Incompetência do Superior Tribunal de Justiça. 1. Busca-se no presente mandado de segurança prorrogar a contratação temporária de pessoal para realização de atividades técnicas vinculadas ao Projeto de Cooperação Internacional intitulado ‘Apoio às Políticas Públicas na Área Ambiental’. 2. As alegações da exordial não demonstram, de forma inequívoca, qual o ato praticado pela Ministra de Estado do Meio Ambiente teria afrontado o direito que ora se postula garantir. Da análise da documentação apresentada, depreende-se que os comunicados encaminhados aos impetrantes noticiando o término dos respectivos contratos temporários estão assinados pelo Coordenador-Geral de Recursos Humanos, e não pelo titular máximo daquela Pasta. Ademais, infere-se do art. 1º da Portaria nº 84/2009 que compete ao Coordenador-Geral de Gestão de Pessoas da Subsecretaria de Planejamento do Ministério do Meio Ambiente assinar atos de contratação temporária de pessoal pelo Ministério do Meio Ambiente. 3. Impõe-se, portanto, reconhecer a ilegitimidade da autoridade coatora e, por conseguinte, a incompetência absoluta deste Superior Tribunal de Justiça, para processar e julgar o writ. 4. Segurança denegada, na forma do § 5º do art. 6º da Lei nº 12.016/2009.” (STJ – MS 16.008 – (2010/0224767-3) – 1ª S. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 22.09.2011 – p. 852)
Competência ambiental – criação da Câmara Especial do Meio Ambiente – observância “É criada a Câmara Especial do Meio Ambiente, com competência para os feitos de natureza civil e medidas cautelares, que envolvam interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos diretamente ligados ao meio ambiente, independentemente de a pretensão se mostrar de/ordem constitutiva, meramente declaratórta ou de condenado.” (TJSP – Ap 994.07.142251-0 – São Paulo – 13ª CDPúb. – Rel. Borelli Thomaz – DJe 06.10.2011 – p. 1030)
Competência ambiental – criação de vara especializada – ação de desapropriação por utilidade pública – redistribuição – inadmissibilidade – competência absoluta da vara de origem – reconhecimento “Processual civil. Conflito negativo de competência. Ação de desapropriação por utilidade pública. Criação de vara especializada em matéria agrária e ambiental. Provimento Coger nº 49/2010. Art. 95 do CPC. Local do imóvel. competência absoluta. I – A controvérsia reside na determinação da correta distribuição do processo considerando a criação de vara especializada em matéria agrária e ambiental. II – O Provimento Coger nº 49/2010, que regulamenta a distribuição e redistribuição de processos decorrente da criação da 8ª Vara Federal na Seção Judiciária do Maranhão, dispôs no art. 7º, § 2º, acerca da redistribuição de processos de natureza ambiental e agrária em tramitação nas Subseções Judiciária de Caxias e Imperatriz, que possuam os assuntos e/ou as classes estabelecidos no art. 2º daquele Provimento. III – A despeito do que determina o Provimento Coger nº 49/2010, a competência da Subseção Judiciária de Imperatriz/MA é absoluta, nos termos do art. 95 do CPC, pois trata-se de ação de desapropriação por utilidade pública, fundada em direito de propriedade, devendo o processo permanecer no local em cuja jurisdição se encontra a área desapropriada. Precedentes. IV – Conflito conhecido, para declarar competente o Juízo Federal da Subseção Judiciária de Imperatriz, o suscitado.” (TRF 1ª R. – CC 0053795-04.2010.4.01.0000/MA – Rel. Juiz Fed. Conv. Murilo Fernandes de Almeida – DJe 17.10.2011 – p. 5)
Abril/2016 – Ed. 229
Competência ambiental – crime cometido contra animal silvestre ameaçado de extinção – jurisdição da Justiça Federal – observância
69
“Habeas corpus. Crime ambiental. Porte ilegal de arma de fogo. Incompetência da Justiça Federal. Inépcia da denúncia. Ausência de justa causa. Documentação adequada para o porte de arma de fogo. Alegações defensivas inacolhidas. Ordem denegada. 1. Competência da Justiça Federal. A corte de origem perfilhou entendimento consentâneo com a orientação jurisprudencial deste Sodalício, uma vez que o suposto delito foi cometido contra animal silvestre ameaçado de extinção – Panthera onça –, constante da lista do Anexo da Instrução Normativa nº 3/2003 do Ministério do Meio Ambiente. 2. O trancamento da ação penal por meio do habeas corpus é medida excepcional, que somente pode ser adotada quando houver comprovação, de plano, da atipicidade da conduta, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito. 3. O liame entre o delito perpetrado e a conduta do paciente está demonstrado quantum satis, uma vez que fora apreendido na fazenda do acusado 1 (um) exemplar da espécie panthera onça e grande quantidade de armas e munições. Ademais, a denúncia está lastreada em laudo pericial, autos circunstanciados de busca, depoimentos prestados perante autoridade policial e fotos. 4. Fatos narrados na denúncia com conotação diversa da atribuída pela acusação. Tese defensiva. Não é possível, nesta etapa processual, trilhar o caminho proposto pela defesa, visto que, para se adotarem as conclusões aventadas na inicial desta impetração, se faz necessário o aprofundamento, inoportuno, do mérito da ação penal, motivo pelo qual o entendimento firmado na origem merece ser mantido. 5. Atipicidade da conduta de porte ilegal de arma de fogo. O egrégio Tribunal a quo considerou que a documentação apresentada pelo paciente era insuficiente, por não atender todas as especificidades normativas, e por não açambarcar o porte de armas e munições em determinadas circunstâncias, como as que ocorreram nos autos. 6. Desse modo, aferir a legitimidade de toda a documentação apresentada pelo paciente, bem como firmar convicção sobre em que condições os artefatos bélicos foram apreendidos demanda incursão indevida
no acervo fático-probatório dos autos, medida interditada na via angusta do habeas corpus. 7. Incidência da causa de aumento de pena prevista no art. 29, § 5º, da Lei nº 9.605/1998. A profissionalidade da caça não foi debatida pelo Tribunal a quo, situação que impede a instância ad quem de apreciá-la, sob pena de supressão de instância. 8. Ordem denegada.” (STJ – HC 144.481 – (2009/0156574-0) – 6ª T. – Rel. Min. Vasco Della Giustina – DJe 10.10.2011 – p. 1067)
Competência ambiental – construção em área de uso sustentável – licenciamento concedido pela Semace – embargo pelo Ibama – inadmissibilidade “Administrativo e processual civil. Obra em área de preservação ambiental. Embargo. Levantamento. 1. Decisão agravada que concedeu a tutela antecipada ‘para determinar o levantamento do embargo/interdição oposto pelo Ibama ao empreendimento Condomínio Flores de Guaramiranga’, por entender o Juízo a quo que ‘a competência administrativa para a concessão do licenciamento em relação ao empreendimento é da Semace, e não do Ibama’, e que ‘a manutenção do embargo poderá afetar a segurança da obra, além de acarretar aos empreendedores prejuízos incalculáveis, e, aos operários nele empregados, o risco de perda de suas ocupações’. 2. Agravo que não discute a competência para se conceder o licenciamento, pois o embargo teve como fundamento, não a incompetência da Semace, mas a construção em Área de Preservação Permanente e a falta de licença válida, tendo, ainda, um posterior laudo técnico consignado que a área ‘se trata de encosta de morro de inclinação que se enquadra no art. 10 da Lei nº 4.771/1965 [...] e se apresenta revestida por vegetação de porte florestal’. 3. A licença foi renovada no dia 03.12.2008, antes do deferimento da tutela antecipada, proferida em 18.12.2008. Portanto, mesmo que, à época da vistoria, em novembro de 2008, o prazo de validade da licença anterior tivesse expirado, a sua renovação, ainda que a destempo, supre a sua exigência. 4. Quanto às outras fundamentações do embargo, há, nos autos, documentos técnicos que as contradizem, produzidos quando o Ministério Público do Estado do Ceará questionou o licenciamento da obra em ação civil pública, que, ressalte-se, foi posteriormente julgada improcedente pelo Juízo da Comarca de Guaramiranga. 5. Primeiramente, o parecer oficial da Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Estado do Ceará – Semace, órgão responsável pelo licenciamento, elaborado para revisar o procedimento realizado pela gestão anterior e vistoriar a execução da obra. Tal documento concluiu que ‘o empreendimento se situa em Área de Uso sustentável, que admite o disciplinamento do processo de ocupação na APA’ e que ‘o Condomínio Flores de Guaramiranga está sendo implantado em área que cuja vegetação foi substancialmente alterada com plantios de café e bananeira’. 6. Ainda, o relatório do estudo e/ou auditoria ambiental, de março de 2008, elaborado por uma equipe técnica da UFC que esclarece que ‘cerca de 1,512 hectares serão reservados como Área de Reserva Legal’, além de 2,8 hectares terem sido ‘incluídos como Área de Preservação Permanente’, pelo que ‘apenas 0,2895 hectares [...] correspondem à área a ser efetivamente construída’. Consigna, também, o documento que ‘no que diz respeito à situação topográfica das edificações não há maiores impedimentos exceto, conforme se constatou em campo, o forte declive da via que dá acesso ao Condomínio’. 7. Assim, o parecer oficial da Semace e o relatório elaborado pela equipe técnica da UFC se contrapõem às alegações de que a obra estaria sendo toda construída em Área de Preservação Permanente ou que estariam sendo derrubadas florestas situadas em áreas de inclinação nas quais o Código Florestal (art. 10) só tolera a extração de madeira para uso racional em rendimento permanente. Informações, também técnicas e oficiais, que, ao menos neste momento processual, dão lastro à manutenção do levantamento do embargo. 8. Agravo de instrumento ao qual se nega provimento, para manter, por outros fundamentos, a decisão agravada.” (TRF 5ª R. – AGTR 2009.05.00.000507-6 – (94153/CE) – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Francisco Cavalcanti – DJe 09.09.2011 – p. 264)
“Ambiental. Processual civil. Ação civil pública. Legitimidade do Ministério Público Federal. Degradação ambiental. Unidade de conservação federal. Zona de amortecimento. Competência da Justiça Federal. 1. O Ministério Público é instituição a quem a Constituição Federal atribuiu a função de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Entre as funções atribuídas ao Ministério Público, encontra-se a promoção do inquérito civil e da ação civil pública para a ‘proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos’ (art. 129, III, da CF). Legitimidade do MPF no caso dos autos. 2. A jurisprudência do col. STJ reconhece a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, nos termos do art. 109, inciso I, da Carta Magna, quando se tratar de demanda envolvendo construção irregular localizada dentro da zona de amortecimento do Parque Nacional. Precedente: STJ, CC 73.028, 1ª S., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 10.11.2009. 3. O Ministério Público Federal, in casu, busca a tutela dos interesses difusos, que gravitam em torno do Parque Nacional de Jericoacoara de sua zona de amortecimento, nos termos do art. 225, § 1º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, o qual se encontra sob a administração do Ibama, órgão federal, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente, conforme estabelece o art. 4º da Lei nº 11.486/2007, o que reforça o entendimento da fixação da competência da Justiça Federal para o processo e o julgamento da presente demanda. 4. Agravo de instrumento provido.” (TRF 5ª R. – AI 0012998-38.2011.4.05.0000 – (118888/CE) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias – DJe 13.10.2011)
Competência ambiental – impactos causados sobre bem de domínio da União – jurisdição da Justiça Federal – inexistência “Agravo de instrumento. administrativo. dano ambiental. competência da Justiça Federal. Falta de interesse da União Federal. Ausência de legitimidade do Ministério Público Federal. Extinção do processo principal sem resolução do mérito. Trata-se de agravo, na modalidade de instrumento, com pleito de tutela antecipada recursal, interposto pelo
Abril/2016 – Ed. 229
Competência ambiental – construção irregular em zona de amortecimento – promoção de ação civil pública pelo MP – admissibilidade – jurisdição da Justiça Federal – reconhecimento
70
Ministério Público Federal em face da Petróleo Brasileiro S/A – Petrobrás e do Instituto Estadual do Meio Ambiente – INEA, objetivando cassar a decisão do Juízo da Vara Federal de Magé – Seção Judiciária do Rio de Janeiro, que declinou da competência, por entender inexistir qualquer interesse jurídico da União que justifique a fixação da competência da Justiça Federal. Neste cenário jurídico-processual, a meu juízo, d.m.v., não se vislumbra, quer a competência da Justiça Federal, quer a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal. Por outra banda, a questão deduzida não envolve como acenado. Tratando-se a discussão sobre impactos ambientais causados sobre bem de domínio da União, qual seja, a Baía de Guanabara, pertencente ao mar territorial brasileiro (art. 20, IV, CF), decorre a incidência do art. 109, I, da CRFB. Tal conclusão extrai-se inclusive da dicção expressa do Código de Águas (Decreto nº 24.643/1934), que afirma serem águas públicas de uso comum os mares territoriais, nos mesmos incluídos os golfos, baías, enseadas e portos. E sim direitos individuais homogêneos, de caráter disponível, conforme epigrafado, o que alija a pertinência subjetiva para a lide do Parquet Federal, cabendo, a teor do efeito translativo, extinguir o processo, perante o Juízo a quo, sem resolução do mérito. Processo principal extinto sem resolução do mérito. Recurso desprovido.” (TRF 2ª R. – AI 2011.02.01.002351-8 – Rel. Poul Erik Dyrlund – DJe 22.09.2011 – p. 282)
Competência ambiental – ocupação do solo urbano ou rural – presença de interesse público – art. 34 da Lei nº 11.697/2008 – aplicabilidade “Civil. Processo civil. Agravo de instrumento. Suspensão do feito. Ação reivindicatória. Gleba de terras. Interesse público. Terracap. Competência da Vara do Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Distrito Federal. 1. Versando a discussão sobre questão relativa a ocupação do solo urbano ou rural, mesmo que envolva interesse de particulares, presente o interesse público, incide a aplicação do art. 34 da Lei nº 11.697/2008 e inciso IV do art. 2º da Resolução nº 3/2009 deste Tribunal de Justiça. 2. Recurso conhecido e desprovido.” (TJDFT – Proc. 20110020132071 – (538185) – Rel. Des. Alfeu Machado – DJe 04.10.2011 – p. 86)
Competência ambiental originária – prefeito – acusação de crime – poluir e destruir a flora por lançamento de resíduos sólidos – instauração de ação penal – possibilidade
Abril/2016 – Ed. 229
“Denunciante. Ministério Público. Denunciados. Vanderlei Luiz Spinelli Valério, Ademir José Gheller e Idevaldo Zardo Relator. Des. Lidio J. R. de Macedo. Denúncia-crime. Processo de competência originária. Prefeito municipal e outros. crime contra o meio ambiente. causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos a saúde humana, ou destruição significativa da flora por meio de lançamento de resíduos sólidos, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos (art. 54, inciso V, da Lei nº 9.605/1998). Preliminar. Pleito de reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva do Estado, em face do acusado Idevaldo Zardo. Fotocópia de documento de identidade que demonstra contar o acusado com idade superior a 70 anos na data de hoje. Reconhecimento necessário. Prescrição retroativa declarada. Em face dos demais acusados Vanderlei Luiz Spinelli Valério e Ademir José Gheller (atual prefeito municipal). Denúncia que preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal. Ausência de motivos a ensejar na rejeição da exordial acusatória. Alegações defensivas que não ilidem de plano as acusações atribuídas. In dubio pro societate. Imprescindível instrução criminal. Justa causa para instauração da ação penal presente. Desnecessário afastamento do cargo, bem como ser decretada a prisão preventiva do prefeito municipal. Denúncia parcialmente recebida. I – ‘[...]. I – Nos termos do art. 115 do CP, são reduzidos pela metade os prazos prescricionais quando o réu era, ao tempo da sentença, maior de 70 (setenta) anos [...]’ (STJ, HC 146655/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, J. 01.06.2010). II – É de se ressaltar que na fase do recebimento de denúncia, vigora o princípio do in dubio pro societate, uma vez que somente com a dilação probatória poder-se-á perscrutar a real prática dos fatos descritos, a participação e o elemento subjetivo da ação dos denunciados, bem como sua eventual adequação ao tipo em cujas sanções restaram incursos, respeitada a ampla defesa e sob o crivo do contraditório.” (TJPR – DenCrime 0543762-9 – Rel. Des. Lidio José Rotoli de Macedo – DJe 20.09.2011 – p. 520)
71
Competência ambiental – poder de polícia – fiscalização e autuação – jurisdição comum dos entes federados – reconhecimento “Ambiental e constitucional. Apelação cível. Meio ambiente. Fiscalização. Competência comum dos entes federados. Poder de polícia. Autuação. Desobediência a condicionantes estabelecidas em razão de termo de compromisso. Infração ambiental gravíssima. Recurso desprovido. 1. É evidente a competência do Município para fiscalizar e autuar o cometimento de infrações ambientais, pois, nos termos do art. 23, inciso VI, da CF é competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. O art. 225 da CF impõe ao Poder Público o dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2. O art. 143 da Lei Municipal nº 4.438/1997 (Código Municipal de Meio Ambiente do Município de Vitória) autoriza o Poder Executivo Municipal a prever classificação e graduação das infrações e penalidades aplicáveis, com fundamento na legislação ambiental e considerando a especificidade de cada recurso ambiental. 3. Nos termos do art. 17, inciso XXVIII, do Decreto Municipal nº 10.023/1997, que regula o Poder de Polícia Ambiental previsto no Código Municipal de Meio Ambiente, constitui infração gravíssima ‘instalar, operar, ampliar obras ou atividades de elevado potencial poluidor ou degradador, sem licenciamento ambiental ou em descumprimento de condicionantes e prazos ou em desacordo com a legislação e normas vigentes’. 4. Recurso desprovido.” (TJES – AC 24100925338 – Rel. Des. Samuel Meira Brasil Junior – DJe 28.09.2011 – p. 51)
Jurisprudência Comentada
Arbitragem Internacional – Forma da Citação – Desnecessidade de Carta Rogatória (Comentários ao julgamento do Superior Tribunal de Justiça na Sentença Estrangeira Contestada nº 3660) NIKOLAI SOSA REBELO
Advogado, Pós-Graduado em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
ALYSSON DUTRA ROJAS GARCIA Acadêmico de Direito na Uniritter.
A DECISÃO EM ANÁLISE1 SENTENÇA ESTRANGEIRA – JUÍZO ARBITRAL – CONTRATO INTERNACIONAL FIRMADO COM CLÁUSULA ARBITRAL – CONTRATO INADIMPLIDO
1 Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/revista/abreDocumento.js p?componente=ITA&sequencial=888462&num_registro=200802182824&dat a=20090625&formato=HTML>. Acesso em: 18 out. 2013.
– LEI Nº 9.307/1996 (LEI DE ARBITRAGEM), ARTS. 38, III, E 39, PARÁGRAFO ÚNICO – SENTENÇA HOMOLOGADA – 1. Contrato internacional de fornecimento de algodão firmado entre agricultor brasileiro e empresa francesa, com cláusula arbitral expressa. Procedimento arbitral instaurado ante o inadimplemento do contrato pela parte brasileira. 2. Nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei de Arbitragem, é descabida a alegação, in casu, de necessidade de citação por meio de carta rogatória ou de ausência de citação, ante a comprovação de que o requerido foi comunicado acerca do início do procedimento de arbitragem, bem como dos atos ali realizados, tanto por meio das empresas de serviços de courier, como também via correio eletrônico e fax. 3. O requerido não se desincumbiu do ônus constante no art. 38, III, da mesma lei, qual seja, a comprovação de que não fora notificado do procedimento de arbitragem ou que tenha sido violado o princípio do contraditório, impossibilitando sua ampla defesa. 4. Doutrina e precedentes da Corte Especial. 5. Sentença arbitral homologada. (SEC 3.660/GB, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Corte Especial, Julgado em 28.05.2009, DJe 25.06.2009)
SÍNTESE DO CASO
Abril/2016 – Ed. 229
Primeiramente, impõe-se destacar que o mérito do acórdão diz respeito a procedimento de arbitragem internacional, utilizado como forma de solução de conflitos em relação comercial. O caso levado ao Superior Tribunal de Justiça trata de homologação de decisão arbitral estrangeira, na qual a parte brasileira se defendeu na via judicial com fundamento no suposto prejuízo do direito de defesa por falta de citação por carta rogatória, quando da instauração de procedimento arbitral. O deslinde da demanda não poderia ser outro se não favorável homologação da sentença arbitral, conforme veremos a seguir.
73
principal objetivo de padronizar e regular as condutas a serem seguidas pelos comerciantes europeus, a lex mercatoria tem encontrado novamente seu espaço nas relações empresariais contemporâneas. A arbitragem, no atual contexto, efetiva estes usos e costumes comerciais a partir do momento em que as partes elegem normas, foro, número de árbitros, ou seja, detém nas mãos a autonomia necessária para dar um bom deslinde a qualquer litígio que venha a ser instaurado.
DA RELAÇÃO COMERCIAL TRANSNACIONAL E DO CONCEITO DE ARBITRAGEM INTERNACIONAL
A arbitragem, ao dispor às partes contratantes que elejam as normas aplicáveis ao caso, desde que disponíveis os direitos a serem debatidos, traz ao debate a utilização da lex mercatoria, a qual volta à cena quando o assunto envolve sociedades empresárias de territórios soberanos diferentes. Isso se dá pois é praxe a adoção dos usos e costumes comerciais internacionais na resolução de conflitos oriundos dessas relações3.
Segundo Irineu Strenger, é considerada arbitragem internacional quando: envolver partes de nações diferentes; quando for fixada, na convenção de arbitragem, que o procedimento será situado fora do Estado no qual as partes têm seus estabelecimentos; quando o local a ser executado parte substancial das obrigações da relação comercial for distinto do local da sede das partes; ou, ainda, a convenção prever expressamente que o objeto da arbitragem tem conexão com mais de um país2.
Ora, não se está falando em um mercado sem leis ou de um procedimento sem base legal, pelo contrário, está sob análise o ramo do direito que vai para além da legislação nacional, envolvendo partes transnacionais que buscam a solução de um conflito de forma célere, confiável e efetiva4. Por isso é criticável a postura do comerciante que voluntariamente se submete a arbitragem e, depois, a questiona no judiciário, como ocorreu no caso em exame.
Além de ser tratado como matéria relativa ao processo, a arbitragem tem relação com o direito comercial (atualmente denominado genericamente no Direito brasileiro de direito empresarial), ramo jurídico no qual é mais permeada a autonomia da vontade. Derivado da lex mercatoria, que foi a lei criada pelo próprios comerciantes em meados do século XIV, e que teve o
A Lei nº 9.307 permite isso ao entregar ao repertório de direitos do contratante a liberdade de optar por um procedimento arbitral, o qual seguirá a forma convencionada pelas partes e afastará o rigorismo das legislações procedimentais pátrias.
2 STRENGER, Irineu. Arbitragem internacional – Conceitos básicos. In: PUCCI, Adriana Noemi (coord.). Arbitragem comercial internacional. São Paulo: LTr, 1998. p. 21 e 22.
3 GOLDMAN, Berthold. Frontières du Droit et Lex Mercatoria. Archives de Philosophie du Droit, n. 9, p. 178, 1964. 4 GOLDMAN, Berthold. La lex mercatoria dans le contrats et l’arbitrage internationaux: realité et perpectives. Journal du Droit International (Clunet). p. 489, 1979.
Em nota de rodapé, este mesmo autor lembra que o texto da Convenção de Nova Iorque se aproxima do art. 38, inciso III, da Lei de Arbitragem Brasileira, que impede a homologação da sentença arbitral estrangeira quando o réu provar que “não foi notificado da designação do árbitro ou do procedimento de arbitragem, ou tenha sido violado o princípio do contraditório, impossibilitando a ampla defesa”.
Os Tribunais brasileiros, desde 2002, quando do julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal do recurso interposto em processo de homologação de sentença arbitral5, passaram a absorver o fim ao qual se destina o instituto da arbitragem com maior ânimo.
A citação no processo civil judicial brasileiro pode se dar de 03 formas distintas, basicamente: por correio, por oficial de justiça ou por edital, estando ainda previsto na legislação processual o meio eletrônico de citação (Código de Processo Civil, art. 221, e Lei do Processo Eletrônico nº 11.419/2006). É solene e rija, portanto, a forma com que se efetiva a citação. No caso de necessidade de atos destinados a partes que se encontrem em outros países, exige-se a utilização da Carta Rogatória (CPC, art. 201), emitida pelas autoridades brasileiras às autoridades judiciárias estrangeiras, atendendo os requisitos do art. 202 do CPC. Além disso, a concretização do ato dependerá do procedimento previsto no país de destino da carta, observando as regras de direito internacional privado do próprio local de destino da carta rogatória. Não é qualquer meio considerado hábil a triangularizar a relação processual, ato que é indispensável à validade do processo.
DOS PRINCÍPIOS APLICADOS AO PROCEDIMENTO ARBITRAL O processo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça aqui comentado tratou da homologação de sentença arbitral decidida pelo procedimento na forma do regulamento da International Cotton Association Limited (“ICA” ou International Cotton Association), em Liverpool, Inglaterra. A contratante brasileira contestou a validade da decisão do árbitro em razão de falta de citação por carta rogatória. Assim, a parte brasileira buscou utilizar uma das defesas para não homologação da sentença arbitral estrangeira que é: [...] a existência de afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Segundo o art. V, nº 1, letra b, da Convenção de Nova Iorque, ao demandado é facultado alegar que “não recebeu notificação apropriada acerca da designação do árbitro ou do processo de arbitragem, ou (que) lhe foi impossível, por outras razões, apresentar seus argumentos”. Provada pelo réu essa circunstância, tem-se um fundamento autônomo para a improcedência do pedido homologatório.6 5 SE 5206-AgRg, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, Julgado em 12.12.2001, DJ 30.04.2004, p. 00029; Ement., v. 02149-06, p. 00958. 6 ABBUD, André de Albuquerque Cavalcanti. Homologação de sentenças
Os julgados e a doutrina constataram claramente as dificuldades de se efetivar a citação em determinados casos, seja por dificuldades idôneas, seja por ardilosidade da parte ré. Mesmo os instrumentos processuais existentes, cuja finalidade é a realização da citação mais célere, são pouco eficientes, visto a procrastinação causada voluntariamente pela parte interessada no arrastamento da demanda, com a finalidade de inviabilizar a prestação jurisdicional7. arbitrais estrangeiras. São Paulo: Atlas, 2008. p. 146. 7 JOBIM, Marco Felix. Direito à duração razoável do processo: responsabilidade civil do estado em decorrência da intempestividade processual. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 179.
Abril/2016 – Ed. 229
A arbitragem aproxima os empresários da nova lex mercatoria, aquela colocada frente aos litigantes por comissões arbitrais espalhadas pelo mundo. Dotadas de notoriedade, estas câmaras têm sido a porta de entrada de muitos conflitos envolvendo, principalmente, pessoas jurídicas, o que contribui, inclusive, para o crescimento da economia, pois viabiliza a solução célere desses litígios, gerando, assim, novos negócios.
74
Abril/2016 – Ed. 229
Assim, a alegação da parte irresignada foi pela necessidade do procedimento da carta rogatória para sua válida citação. A decisão do Superior Tribunal de Justiça, no entanto, e com total razão, não acolheu a justificativa da parte brasileira, pois o processo de arbitragem tem caráter contratual, podendo prever as formas dos atos procedimentais, apesar de ser definido como espécie de jurisdição. Segundo Strenger, “reconhece-se na arbitragem internacional uma natureza mista: convencional por sua origem e jurisdicional por sua função”8. Joel Dias Figueira Júnior, amparado em outros autores, afirma que a arbitragem tem natureza “heteropublicista (mista ou eclética), isto é, privada e pública, importando num negócio jurídico processual”9. Na obra de Ricardo Ranzolin sobre o controle judicial da arbitragem, resta esclarecida a peculiar natureza deste instituto, no qual as partes criam deveres processuais de uma perante a outra, formando uma relação triangular de obrigações múltiplas entre as partes reciprocamente e dessas com o árbitro, também, por sua vez, com deveres contratuais perante os litigantes10. Trata-se de substancial diferença em relação à relação processual judicial, na qual as partes não tem obrigações uma perante a outra.
75
Outro ponto a ser destacado e sempre questionado com a intenção de afastar o uso da arbitragem no direito pátrio era a suposta violação ao princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário. A jurisprudência já pacificou o assunto pela ponderação de princípios, uma vez que vige também o princípio da demanda, que significa dizer que o próprio direito processual tem conotação subjetiva, apesar de ser considerado também direito público. O dever do Estado de prestar a jurisdição é contraprestação ao 8 STRENGER, Irineu. Op. cit., p. 24. 9 FIGEURIA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução – Análise crítica da Lei nº 9.307, de 23.09.1996, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 175. 10 RANZOLIN, Ricardo. Controle judicial da arbitragem. Rio de Janeiro: GZ, Rio de Janeiro, 2011. p. 79 e 80.
cidadão. É, portanto, sob a ótica do jurisdicionado, um direito de usar o processo que pode ser exercido ou não. A inafastabilidade do Poder Judiciário vale para impedir a renúncia ampla e genérica, direcionada ao legislador, mas, no caso concreto, a parte poderá renunciar o seu direito processual, pois não está obrigado sequer a buscar seu direito material. E diante dessa natureza de conotação subjetiva, o princípio basilar da arbitragem é a autonomia da vontade das partes11. Nas palavras de Ricardo Ranzolin, “remanesce na esfera do direito subjetivo dos cidadãos a condição de formular renúncia ao exercício da pretensão de direito processual – desde que seja uma renúncia específica e delimitada (a lides delimitadas)12”. Tal princípio vale também para regras de procedimento, ou seja, quer dizer que as partes podem determinar as normas processuais para a solução de seu litígio, pois estes integram o direito subjetivo ao processo judicial renunciado em determinada relação jurídica específica, por meio do compromisso de solucionar seus conflitos com a outra parte por meio de arbitragem. Conforme lição da doutrina, pode-se definir o procedimento por uma das seguintes formas: a) as partes definem o rito procedimental na convenção de arbitragem; b) o procedimento será definido pelo órgão arbitral institucional ou entidade especializada ou pelo árbitro ou tribunal arbitral, conforme indicação das partes na convenção arbitral; c) não havendo estipulação acerca do procedimento, caberá ao árbitro ou colégio arbitral discipliná-lo.13
A lei de arbitragem brasileira, a Lei Federal nº 9.307/1996, disciplinou a questão da citação nos casos de homologação, no sentido de possibilitar o exercício da autonomia da vontade também para estabelecer as formas de comunicação dos atos 11 STRENGER, Irineu. Op. cit., p. 24. 12 RANZOLIN, Ricardo. Op. cit., p. 102. 13 FIGEURIA JÚNIOR, Joel Dias. Op. cit., p. 208.
do procedimento arbitral a até mesmo a citação, conforme art. 39, parágrafo único:
conhecimento dos atos, fazendo pedidos, alegações e provas, resumindo a lição nos seguintes termos16:
Art. 39. Também será denegada a homologação para o reconhecimento ou execução da sentença arbitral estrangeira, se o Supremo Tribunal Federal constatar que:
Em resumo: a) de um lado, a observância do contraditório é rigorosamente necessária, sendo ilegítimas as flexibilizações contrárias à efetividade dessa garantia e nulos os atos praticados; b) de outro, a observância do contraditório é uma sanatória que legitima flexibilizações ou qualquer outra possível infidelidade às regras de procedimento escolhidas pelas partes, ditadas em lei ou contidas no regimento de dada instituição arbitral.
Parágrafo único. Não será considerada ofensa à ordem pública nacional a efetivação da citação da parte residente ou domiciliada no Brasil, nos moldes da convenção de arbitragem ou da lei processual do país onde se realizou a arbitragem, admitindo-se, inclusive, a citação postal com prova inequívoca de recebimento, desde que assegure à parte brasileira tempo hábil para o exercício do direito de defesa.
Certamente que a ordem pública deve ser respeitada no procedimento arbitral, devendo ser observados os requisitos principiológicos do due process of law e as garantias constitucionais de ampla defesa, contraditório e outros14. Nesse sentido, merece ser citada a valiosa lição de Cândido Rangel Dinamarco, no sentido de que é característica essencial da arbitragem a flexibilidade e simplicidade do procedimento arbitral, não sendo necessária a aplicação de normas processuais previstas na lei, respeitando-se sempre o contraditório pela possibilidade de a parte “participar pedindo, participar provando, participar alegando”15. O renomado processualista vai além na sua análise, dizendo que mesmo eventuais falhas de procedimento, mesmo contrariando vontade das partes expressa na convenção ou no termo de arbitragem, são convalidadas quando observado o contraditório pela participação plena e efetiva da parte, tendo 14 KROETZ, Tarcísio Araújo. Arbitragem: conceitos e pressupostos de validade de acordo com a Lei nº 9.307/1996. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 76. 15 DINAMARCO, Cândido Rangel. A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 26.
No acórdão aqui comentado, ficou demonstrado que houve citação por diversos meios, e, ainda que não estivessem previstos na convenção ou no regulamento da Câmara de Arbitragem escolhida, atingiram plenamente o seu fim de dar ciência à parte acerca da instauração do processo arbitral. A fase preliminar de notificação acerca da intenção de iniciar tal procedimento é a primeira das três fases da arbitragem explicadas na doutrina, podendo ser, nos termos do art. 6º da Lei de Arbitragem brasileira, por qualquer método idôneo que demonstre o efetivo recebimento17. Nesse viés, a Lei de Arbitragem deu um enfoque célere e apropriado ao atendimento do direito da parte postulante, pois permite que a notificação do postulado quanto ao início do procedimento arbitral se dê de forma mais simples, desde que tenha ocorrido de forma comprovadamente idônea e regulamentada entre as partes ou pela comissão arbitral. O julgado sob exame demonstra o afastamento da Corte Superior do rigorismo processual, ao aceitar como válida a citação realizada no procedimento arbitral levado a juízo, dando a devida vigência à Lei de Arbitragem. 16 Idem, p. 26 e 27. 17 Idem, p. 110 e 111.
Abril/2016 – Ed. 229
[...]
76
DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO Podemos apontar que os procedimentos processuais existentes no ordenamento brasileiro, os quais são dotados de formalismo e não dão efetividade ao princípio constitucional da razoável duração do processo18, não tem a tecnologia trazida no instituto da arbitragem, o qual visa a resolver litígio em menor tempo, com julgadores mais especializados e com maior efetividade.
Abril/2016 – Ed. 229
A Constituição brasileira previu, no capítulo destinado aos direitos e garantias fundamentais, o princípio da razoável duração do processo, não garantiu, porém, estrutura à Administração Pública para que este princípio fosse transportado à realidade19. As Câmaras arbitrais não sofrem deste mal. Possuem regulamentos bem escritos, com regras colocadas sistematicamente e de forma a dar resposta célere e satisfatória a seus interessados, respeitando as normas que regem a arbitragem e aquelas elegidas pelos contratantes, vez que eles possuem a autonomia de moldar as regras aplicáveis ao caso, podendo optar, inclusive, pela equidade.
77
O método informal de notificação dos litigantes, do qual se tem ciência a partir do regulamento da comissão arbitral, como no caso em exame, é, portanto, meio de se instrumentalizar a efetivação de um princípio previsto na Constituição Federal da República Federativa do Brasil, qual seja, a razoável duração do processo, pois latente no cotidiano do operador de justiça as mais ardis maneiras que as partes sob o juízo estatal encontram para frustrar citações. 18 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestação jurisdicional: insuficiência da reforma das leis processuais. Revista de Processo, São Paulo, n. 125, p. 71, jul. 2005. 19 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional descomplicado. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 209.
A citação no procedimento arbitral pode se dar por serviço de courier, e-mail, fax, ou qualquer meio que se destine a este fim de forma efetiva, e o julgado analisado se vale disto para satisfazer a pretensão dos interessados. Logo, a razoável duração do processo está tão presente no procedimento arbitral quanto em qualquer outro, e as tecnologias por ele adotadas fazem o transporte deste princípio para a realidade, como no caso da citação via correio eletrônico.
DA MATURIDADE DAS CORTES JULGADORAS Primeiramente, houve a resistência dos operadores do direito ao acatamento da Lei de Arbitragem como constitucional, controvérsia que perdurou até meados de 2002, quando, em virtude do julgamento do recurso interposto em processo de homologação de sentença arbitral, foi declarada a constitucionalidade da Lei nº 9.307/1996. Assim, encerrou-se tal discussão, de forma que o instituto já não mais poderia ser objeto de críticas no sentido de ser uma afronta à Constituição Federal e ao acesso ao judiciário, princípio nela insculpido. Mesmo após a constitucionalidade declarada da lei, não pararam os casos de julgamentos exarados via procedimento arbitral que vão parar no judiciário, o que é de fatal prejuízo ao instituto da arbitragem, pois a posterior judicialização do litígio gera falta de confiança no mercado brasileiro, se tornando mais um item para o chamado custo de transação (custo Brasil), conforme teorias da análise econômica do direito20. Por isso, deve ser observada e ressaltada a evolução das Cortes frente aos enfrentamentos deste tipo, colocando um basta na protelação que se busca por comerciantes e empresários que agem dotados de má-fé. Eis o enquadramento do caso em apreço a este pensamento: 20 Teoria dos custos de transação surgidas pelos estudos de Ronald Coase.
trata-se de um procedimento arbitral devidamente instaurado, o qual tinha sua incidência acordada em instrumento particular e que veio a ser questionado posteriormente no judiciário pelo interessado sucumbente. Vemos, dessa forma, com mais essa decisão do Superior Tribunal de Justiça, que o judiciário não adota mais postura de insegurança frente aos procedimentos arbitrais. De outra banda, alguns interessados que sucumbem ante a arbitragem ainda procuram o judiciário como subterfúgio, o que não se pode admitir, sob pena de total desprestígio do instituto da arbitragem, importante ferramenta do desenvolvimento de negócios e da economia internacional atual.
CONCLUSÃO
Não prosperaram, no caso comentado, os argumentos do comerciante brasileiro, pois afrontam ao instituto da arbitragem, o princípio do pacta sunt servanda, a boa-fé, entre outros princípios e normas. Por esse motivo, consideramos bem lançadas as razões de decidir exaradas pelo Relator do caso examinado.
Abril/2016 – Ed. 229
O procedimento arbitral confere aos interessados a entrega da possibilidade de se resolver um litígio com base nas normas que estes mesmos interessados entendem por aplicável, seja de um ordenamento ou de outro, seja com base na lex mercatoria. Os atos praticados no procedimento arbitral, ao contrário da demanda estatal, são simplificados, e mais, se aproximam de um diálogo no qual se busca um fim comum: a solução de um conflito.
78
Medida Provisória Medida Provisória nº 721, de 29.03.2016 Abre crédito extraordinário, em favor de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, no valor de R$ 1.950.000.000,00, para o fim que especifica. (DOU de 30.03.2016)
Medida Provisória nº 720, de 29.03.2016 Dispõe sobre a prestação de auxílio financeiro pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, relativo ao exercício de 2015, com o objetivo de fomentar as exportações do País. (DOU de 30.03.2016)
Medida Provisória nº 719, de 29.03.2016 Altera a Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, que dispõe sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento; a Lei nº 12.712, de 30 de agosto de 2012, e a Lei nº 8.374, de 30 de dezembro de 1991, para dispor sobre o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por embarcações ou por sua carga; e a Lei nº 13.259, de 16 de março de 2016, para dispor sobre a dação em pagamento de bens imóveis como forma de extinção do crédito tributário inscrito em dívida ativa da União. (DOU de 30.03.2016)
Medida Provisória nº 718, de 16.03.2016 Altera a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto, para dispor sobre o controle de dopagem, a Lei nº 12.780, de 9 de janeiro de 2013, que dispõe sobre medidas tributárias referentes à realização, no Brasil, dos Jogos Olímpicos de 2016 e dos Jogos Paraolímpicos de 2016, e dá outras providências. (DOU - Ed. Extra de 17.03.2016 - Ret. DOU de 22.03.2016)
Medida Provisória nº 718, de 16.03.2016 Altera a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto, para dispor sobre o controle de dopagem, a Lei nº 12.780, de 9 de janeiro de 2013, que dispõe sobre medidas tributárias referentes à realização, no Brasil, dos Jogos Olímpicos de 2016 e dos Jogos Paraolímpicos de 2016, e dá outras providências. (DOU - Ed. Extra de 17.03.2016 - Ret. DOU de 22.03.2016)
Medida Provisória nº 717, de 16.03.2016 Cria o cargo de Ministro de Estado Chefe do Gabinete Pessoal do Presidente da República, altera a Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, e dá outras providências. (DOU - Ed. Extra de 16.03.2016)
Medida Provisória nº 716, de 11.03.2016 Abre crédito extraordinário, em favor dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação, da Defesa e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, no valor de R$ 420.000.000,00, para os fins que especifica. (DOU de 14.03.2016)
Medida Provisória nº 715, de 01.03.2016 Abre crédito extraordinário, em favor do Ministério do Desenvolvimento Agrário, no valor de R$ 316.230.970,00, para o fim que especifica. (DOU de 02.03.2016)
Medida Provisória nº 714, de 01.03.2016 Extingue o Adicional de Tarifa Aeroportuária e altera a Lei nº 5.862, de 12 de dezembro de 1972, e a Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986. (DOU de 02.03.2016)
Altera a Lei nº 12.249, de 11 de junho de 2010, para dispor sobre o Imposto de Renda Retido na Fonte sobre a remessa de valores destinados à cobertura de gastos pessoais, no exterior, de pessoas físicas residentes no País, em viagens de turismo, negócios, serviços, treinamento ou missões oficiais, e dá outras providências. (DOU de 02.03.2016)
Abril/2016 – Ed. 229
Medida Provisória nº 713, de 01.03.2016
80
Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com. 2.186-16, DE 23.08.2001
Patrimônio Genético. Diversidade Biológica
2.187-13, DE 24.08.2001
Previdência Social. Alteração na Legislação
2.189-49, DE 23.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.190-34, DE 23.08.2001
Vigilância Sanitária. Alteração da Lei nº 9.782/1999
2.192-70, DE 24.08.2001
Proes. Bancos Estaduais
2.196-3, DE 24.08.2001
Instituições Financeiras Federais. Recuperação. Empresa Gestora de Ativos – Emgea
2.197-43, DE 24.08.2001
SFH. Disposições
2.198-5, DE 24.08.2001
Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica
2.199-14, DE 24.08.2001
IR. Incentivos Fiscais
2.200-2, DE 24.08.2001
Infraestrutura de Chaves Públicas. ICP-Brasil
2.206-1, DE 06.09.2001
Programa Nacional de Renda Mínima
2.208, DE 17.08.2001
Estudante Menor de 18 Anos. Comprovação
2.209, DE 29.08.2001
Comercializadora Brasileira de Energia Elétrica – CBEE
2.210, DE 29.08.2001
Orçamento. Crédito Extraordinário
2.211, DE 29.08.2001
Orçamento 2001 e 2002. Diretrizes
2.213-1, DE 30.08.2001
Programa Bolsa-Renda. Estiagem
2.214, DE 31.08.2001
Administração Pública Federal. Recursos
Planos de Saúde. Alteração da Lei nº 9.656/1998
2.215-10, DE 31.08.2001
Militares das Forças Armadas. Reestruturação da Remuneração
Programa Nacional de Alimentação Escolar. Dinheiro Direto na Escola
2.220, DE 04.09.2001
Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU
2.224, DE 04.09.2001
Capitais Brasileiros no Exterior
2.179-36, DE 24.08.2001
União e Banco Central. Relações Financeiras
2.225-45, DE 04.09.2001
2.180-35, DE 24.08.2001
Advocacia-Geral da União. Alteração na Legislação
Servidor Público. Tráfico de Entorpecentes. Alteração das Leis nºs 6.368/1976 e 8.112/1990
2.181-45, DE 24.08.2001
Operações Financeiras do Tesouro Nacional
2.226, DE 04.09.2001
Alteração da CLT
2.183-56, DE 24.08.2001
Reforma Agrária. Alteração na Legislação
2.227, DE 04.09.2001
Plano Real. Correção Monetária. Exceção
2.184-23, DE 24.08.2001
Carreira Policial. Gratificação
2.228-1, DE 06.09.2001
2.185-35, DE 24.08.2001
Dívida Pública Mobiliária. Consolidação. Assunção. Refinanciamento
Cultura. Política Nacional do Cinema – Ancine. Prodecine. Funcines
2.229-43, DE 06.09.2001
Policiais Civis da União e DF. Alteração na legislação
2 .156-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento do Nordeste – Adene
2.157-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA
2.158-35, DE 24.08.2001
Cofins, PIS/Pasep e IR. Alteração na Legislação
2.159-70, DE 24.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.161-35, DE 23.08.2001
Programa Nacional de Desestatização. Alteração da Lei nº 9.491/1997
2.162-72, DE 23.08.2001
Notas do Tesouro Nacional – NTN
2.163-41, DE 23.08.2001
Meio Ambiente. Alteração da Lei nº 9.605/1998
2.164-41, DE 24.08.2001
Alteração da CLT. Trabalho a Tempo Parcial e PAT
2.165-36, DE 23.08.2001
Servidor Público e Militar. Auxílio-Transporte
2.166-67, DE 24.08.2001
Código Florestal. Alteração da Lei nº 4.771/1965
2.167-53, DE 23.08.2001
Recebimento de Valores Mobiliários pela União
2.168-40, DE 24.08.2001
Cooperativas. Recoop. Sescoop
2.169-43, DE 24.08.2001
Servidor Público. Vantagem de 28,86%
2.170-36, DE 23.08.2001
Tesouro Nacional. Administração de Recursos
2.172-32, DE 23.08.2001
Usura. Agiotagem
2.173-24, DE 23.08.2001
Anuidades Escolares
2.174-28, DE 24.08.2001
União. Programa de Desligamento Voluntário – PDV
2.177-44, DE 24.08.2001 2.178-36, DE 24.08.2001
Normas do Juris SÍNTESE atingidas pelas Medidas Provisórias em vigor (até 31.03.2016)
Abril/2016 – Ed. 229
Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive as medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com.
81
MP 698 699 700 700 700 700 700 700 700 701 701 701 701 701 703 703
DOU 23.10.2015-extra 11.11.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 09.12.2015 21.12.2015 21.12.2015
ART 1º 1º 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 1º 2º 3º 4º 5º 1º 2º
NORMA LEGAL Lei nº 11.977/2009 Lei nº 9.503/1997 Decreto-Lei nº 3.365/1941 Lei nº 6.015/1973 Lei nº 10.406/2002 Lei nº 9.514/1997 Lei nº 6.766/1979 Lei nº 12.787/2013 Lei nº 6.015/1973 Lei nº 6.704/1979 Lei nº 9.818/1999 Lei nº 11.281/2006 Lei nº 12.712/2012 Decreto-Lei nº 857/1969 Lei nº 12.846/2013 Lei nº 8.429/1992
ALTERAÇÃO 6º-A 253-A, 271-A e 320-A 2º, 4º, 4º-A, 5º, 7º, 15-A, 176-A, 176-B, 195-B, 221, 235, 1.225, 1.473 22 26 38 235 1º, 4º 5º 2º 56 2º 15, 16, 17, ,17-A, 17-B, 18, 20, 25, 29, 30 17
MP 703 705 706 707 707 713 714 714 714 714 714 714 717 718
DOU 21.12.2015 24.12.2015 28.12.2015 31.12.2015 31.12.2015 02.03.2016 02.03.2016 02.03.2016 02.03.2016 02.03.2016 02.03.2016 02.03.2016 16.03.2016-extra 17.03.2016
ART 2º 1º 1º 1º 2º 1º 3º 4º 5º 5º 5º 5º 4º 2º
NORMA LEGAL Lei nº 12.846/2013 Lei nº 12.722/2012 Lei nº 12.783/2013 Lei nº 12.096/2009 Lei nº 12.844/2013 Lei nº 12.249/2010 Lei nº 5.862/1972 Lei nº 7.565/1986 Lei nº 7.565/1986 Lei nº 7.920/1989 Lei nº 8.399/1992 Lei nº 12.462/2011 Lei nº 10.683/2003 Lei nº 9.615/1998
718
17.03.2016
4º
Lei nº 12.780/2013
ALTERAÇÃO 16 4º 11 1º-A 8º, 9º 60 2º 181 181 e 182 63 5º 1º, 11, 48-A, 48-B, 48-C, 50, 50-B, 55-A, 55-B e 55-C 5º, 19 e 20
DOU 17.03.2016 17.03.2016 30.03.2016 30.03.2016 30.03.2016 30.03.2016 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 27.08.2001
ART 7º 8º 1º 2º 3º 4º 32 32 32 32 32 2º e 93 3º e 93 10 e 93 19 e 93 34 e 75 64 69 70 72 73 73 e 93 75 82 93 93 93 93 93 93 1º e 6º 6º 1º 7º e 8º
NORMA LEGAL Lei nº 10.973/2004 Lei nº 8.010/1990 Lei nº 10.820/2003 Lei nº 12.712/2012 Lei nº 8.374/1991 Lei nº 13.259/2016 DL 1.376/74 DL 2.397/87 Lei nº 8.034/90 Lei nº 9.532/97 DL 1.376/74 Lei nº 9.718/98 Lei nº 9.701/98 Lei nº 9.779/99 Lei nº 9.715/98 Lei nº 9.532/97 D nº 70.235/72 DL 1.455/76 Lei nº 9.430/96 Lei nº 8.218/91 Lei nº 9.317/96 Lei nº 9.317/96 Lei nº 9.532/97 Lei nº 8.981/95 Lei nº 9.432/97 LC 70/91 LC 85/96 Lei nº 7.714/88 Lei nº 9.004/95 Lei nº 9.493/97 Lei nº 9.491/97 Lei nº 9.094/95 Lei nº 9.605/98 Lei nº 7.998/90
2.164-41
27.08.2001
1º e 2º
CLT
2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.164-41 2.165-36 2.165-36 2.166-67
27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 25.08.2001-extra
3º 4º 5º 6º 9º 10 13 13 1º
Lei nº 4.923/65 Lei nº 5.889/73 Lei nº 6.321/76 Lei nº 6.494/77 Lei nº 8.036/90 Lei nº 9.601/98 Lei nº 7.418/85 Lei nº 8.627/93 Lei nº 4.771/65
2.166-67 2.167-53 2.168-40 2.168-40 2.168-40 2.170-36 2.172-32 2.173-24 2.177-44
25.08.2001 24.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 27.08.2001
3º 2º e 3º 13 14 18 8º 7º 1º e 2º 1º e 8º
Lei nº 9.393/96 Lei nº 9.619/98 Lei nº 5.764/71 Lei nº 9.138/95 Lei nº 10.186/01 Lei nº 8.212/91 Lei nº 1.521/51 Lei nº 9.870/99 Lei nº 9.656/98
ALTERAÇÃO 20 1º 1º 38 10 e 14 4º 1º e 11 12 1º 2º 1º 3º e 8º 1º 14 e 17 2º e 4º 1º e 64-A 1º, 25 e 64-A 1º, 9º, 10, 16, 18, 19 e 64-A 63 11 e 12 1º e 64-A 9º e 15 1º, 15 e 64-A 29 11 6º e 7º Revogada 5º Revogada 7º 2º, 4º, 5º, 6º e 30 2º 79-A 2º, 2º-A, 2º-B, 3º-A, 7º-A, 8º-A, 8º-B e 8º-C 58-A, 59, 130-A, 143, 476-A, 627-A, 643 e 652 1º 18 2º 1º 19-A, 20, 29-C e 29-D 2º 1º 6º 1º, 3º-A, 4º, 14, 16, 37-A, 44, 44-A, 44-B e 44-C 10 1º e 4º-A 88 2º 7º 60 4º, § 3º 1º e 6º 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 24-A, 24-B, 24-C, 24-D, 25, 26, 27, 28, 29, 29-A, 30, 31, 32, 34, 35, 35-A, 35-B, 35-C, 35-D, 35-E, 35-F, 35-G, 35-H e 35-I
MP 2.178-36 2.178-36 2.180-35 2.180-35
DOU 25.08.2001-extra 25.08.2001-extra 27.08.2001 27.08.2001
ART 16 32 1º 4º
NORMA LEGAL Lei nº 9.533/97 Lei nº 8.913/97 Lei nº 8.437/92 Lei nº 9.494/97
2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.180-35 2.181-45 2.181-45 2.181-45 2.183-56 2.183-56 2.183-56 2.187-13 2.187-13 2.187-13 2.187-13 2.187-13 2.189-49 2.189-49 2.189-49 2.189-49 2.190-34 2.192-70 2.196-3 2.196-3 2.197-43 2.197-43 2.197-43 2.199-14 2.211 2.211 2.214 2.215-10 2.215-10
27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 24.08.2001 25.08.2001-extra 25.08.2001 25.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 27.08.2001 30.08.2001 30.08.2001 01.09.2001-extra 01.09.2001 01.09.2001
6º 7º 8º 10 14 21 45 46 52 1º 3º 4º 2º 3º e 16 4º e 16 7º 16 10 11 13 14 7º e 8º 23 12 14 3º e 8º 4º e 8º 5º 18 1º 2º 1º 41 41
Lei nº 7.347/85 Lei nº 8.429/92 Lei nº 9.704/98 CPC Lei nº 4.348/64 Lei nº 10.257/01 Lei nº 8.177/91 Lei nº 9.365/96 Lei nº 10.150/00 DL 3.365/41 Lei nº 8.177/91 Lei nº 8.629/93 Lei nº 6.015/73 Lei nº 8.212/91 Lei nº 8.213/91 Lei nº 9.639/98 Lei nº 9.711/98 Lei nº 9.532/97 Lei nº 9.250/95 Lei nº 9.430/96 Lei nº 9.317/96 Lei nº 9.294/96 Lei nº 9.496/97 Lei nº 8.036/90 Lei nº 7.827/89 Lei nº 8.692/93 Lei nº 4.380/64 Lei nº 8.036/90 Lei nº 9.532/97 Lei nº 9.995/00 Lei nº 10.266/01 Lei nº 10.261/01 Lei nº 8.448/92 Lei nº 8.460/92
2.217-3
05.09.2001
1º
Lei nº 10.233/01
2.220 2.224 2.225-45 2.225-45
05.09.2001-extra 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001
Lei nº 6.015/73 Lei nº 4.131/62 Lei nº 6.368/76 Lei nº 8.112/90
2.225-45 2.225-45 2.226 2.226 2.228-1 2.228-1
05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001 05.09.2001
15 4º 1º 2º, 3º e 15 4º 5º 1º 3º 51 52 e 53
2.229-43 2.229-43
10.09.2001 10.09.2001
72 74
Lei nº 9.986/00 Lei nº 8.745/93
Lei nº 8.429/92 Lei nº 9.525/97 CLT Lei nº 9.469/97 Lei nº 8.685/93 Lei nº 8.313/91
ALTERAÇÃO 4º Revogada 1º e 4º 1º-A, 1º-B (CPC e CLT), 1º-C, 1º-D, 1ºE, 1º-F, 2º-A e 2º-B 1º e 2º 17 1º 741 4º 53 18 6º 1º 10, 15-A, 15-B e 27 5º 2º, 2º-A, 5º, 6º, 7º, 11, 12, 17, 18 e 26-A 80 38, 55, 56, 68, 101 e 102 41, 95, 96, 134, 144, 145, 146 e 147 1º, 2º e 5º 7º, 8º, 9º, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 6º, II, 34 e 82, II, f 10 e 25 79 9º 2º, 3º e 7º 1º, 3º, 6º, 7º-A e 7º-B 9º 9º-A 23 e 25 9º, 14 e 18 9º, 20, 23, 29-A e 29-B 4º 35 e 70 18, 34, 38 e 51 1º 6º 2º, 20, 25, 26 e 27, 5º, 7º-A, 13, 14, 14-A, 23, 24, 27, 28, 30, 32, 34-A, 38, 44, 51-A e 61-A 74, 77, 78-A, 78-B, 78-C, 78-D, 78-E, 78-F, 78-G, 78-H, 78-I 78-J, 82, 83, 84, 85-A, 85-B, 85-C, 85-D, 86, 88, 89, 100, 102-A, 103-A, 103-B, 103-C, 103-D, 113-A, 114-A, 15, 116-A, 118 e 119 167, I 6º 3º 25, 26, 46, 47, 61, 62-A, 67, 91, 117 e 119 17 2º 896-A 6º 5º 3º, II, a (a partir de 01.01.2007), e 18, § 3º 22 4º
Abril/2016 – Ed. 229
MP 718 718 719 719 719 719 2.156-5 2.156-5 2.156-5 2.156-5 2.157-5 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.158-35 2.161-35 2.162-72 2.163-41 2.164-41
82
Normas Legais
Lei nº 13.263, de 23.03.2016 Altera a Lei nº 13.033, de 24 de setembro de 2014, para dispor sobre os percentuais de adição de biodiesel ao óleo diesel comercializado no território nacional. (DOU de 24.03.2016) Lei nº 13.262, de 22.03.2016 Autoriza o Banco do Brasil S.A. e a Caixa Econômica Federal a constituírem subsidiárias e adquirirem participação nos termos e condições previstos no art. 2º da Lei nº 11.908, de 3 de março de 2009; reabre o prazo previsto no art. 9º da Lei nº 13.155, de 4 de agosto de 2015; altera a data da exigibilidade do disposto no inciso II do § 1º e no § 3º do art. 10 da Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003; e dá outras providências. (DOU de 23.03.2016) Lei nº 13.261, de 22.03.2016 Dispõe sobre a normatização, a fiscalização e a comercialização de planos de assistência funerária. (DOU de 23.03.2016) Lei nº 13.260, de 16.03.2016 Regulamenta o disposto no inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo, tratando de disposições investigatórias e processuais e reformulando o conceito de organização terrorista; e altera as Leis nºs 7.960, de 21 de dezembro de 1989, e 12.850, de 2 de agosto de 2013. (DOU de 17.03.2016 – Edição extra) Lei nº 13.259, de 16.03.2016 Altera as Leis nºs 8.981, de 20 de janeiro de 1995, para dispor acerca da incidência de imposto sobre a renda na hipótese de ganho de capital em decorrência da alienação de bens e direitos de qualquer natureza, e 12.973, de 13 de maio de 2014, para possibilitar opção de tributação de empresas coligadas no exterior na forma de empresas controladas; e regulamenta o inciso XI do art. 156 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional. (DOU de 17.03.2016 – Edição extra) Lei nº 13.258, de 08.03.2016 Altera o inciso XX do art. 19 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro), para dispor sobre a expedição da permissão internacional para conduzir veículo. (DOU de 09.03.2016) Lei nº 13.257, de 08.03.2016 Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância e altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008, e a Lei nº 12.662, de 5 de junho de 2012. (DOU de 09.03.2016)
Indicadores
I – Índices de Atualização dos Débitos Trabalhistas TABELA ÚNICA PARA ATUALIZAÇÃO DE DÉBITOS TRABALHISTAS ATÉ 30 DE ABRIL DE 2016 - PARA 1º DE MAIO DE 2016* *TR prefixada de 1º abril/2016 a 1º maio/2016 (Banco Central) = 0,13040%
Mês/Ano 1993 1994 1995 1996 1997 1998 JAN 0,000234053 0,009090340 2,378267676 1,806883477 1,648840612 1,501881662
Mês/Ano 2005 2006 2007 2008 2009 2010 JAN 1,152015733 1,120272519 1,097900245 1,082258248 1,064849619 1,057352925
FEV
0,000184642 0,006426994 2,329321640 1,784530449 1,636663833 1,484866576
FEV
1,149854007 1,117672812 1,095502191 1,081166270 1,062893895 1,057352925
MAR
0,000146078 0,004595305 2,286942312 1,767518087 1,625906800 1,478272005
MAR
1,148748911 1,116863086 1,094712903 1,080903610 1,062414746 1,057352925
ABR
0,000116110 0,003239552 2,235529602 1,753248399 1,615702059 1,465093489
ABR
1,145729912 1,114552619 1,092663067 1,080461702 1,060889187 1,056516164
MAIO
0,000090555 0,002219328 2,160627141 1,741758021 1,605728877 1,458210734
MAIO
1,143439603 1,113600490 1,091274965 1,079430845 1,060407762 1,056516164
JUN
0,000070372 0,001515520 2,092675863 1,731562581 1,595590495 1,451616042
JUN
1,140557414 1,111501975 1,089434909 1,078636968 1,059931852 1,055977616
JUL
0,000054099 2,837562675 2,033969404 1,721065800 1,585231010 1,444519120
JUL
1,137153913 1,109353158 1,088396579 1,077402265 1,059236993 1,055356011
AGO
0,041496732 2,701767722 1,974909729 1,711054421 1,574868376 1,436613436
AGO
1,134233262 1,107414076 1,086800070 1,075344057 1,058124904 1,054142693
SET
0,031120993 2,645389188 1,924778863 1,700384508 1,565055478 1,431247689
SET
1,130315588 1,104722970 1,085209153 1,073654125 1,057916494 1,053185347
OUT
0,023117659 2,582401825 1,888161743 1,689201991 1,554988483 1,424818906
OUT
1,127342785 1,103045239 1,084827294 1,071543185 1,057916494 1,052446530
NOV
0,016932293 2,518062802 1,857439690 1,676762093 1,544864983 1,412261080
NOV
1,124980326 1,100980899 1,083589834 1,068864610 1,057916494 1,051950009
DEZ
0,012435585 2,446597684 1,831095716 1,663213555 1,521533784 1,403648294
DEZ
1,122814417 1,099571249 1,082950893 1,067137981 1,057916494 1,051596673
Mês/Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 JAN 1,393290572 1,317787094 1,290729409 1,261891951 1,227491019 1,172964197
Mês/Ano 2011 2012 2013 2014 2015 2016 JAN 1,050120204 1,037587110 1,034589808 1,032617271 1,023819410 1,005761007
FEV
1,386133963 1,314961242 1,288964816 1,258630838 1,221532384 1,171464722
FEV
1,049369904 1,036691409 1,034589808 1,031455851 1,022921285 1,004435152
MAR
1,374726482 1,311907122 1,288490651 1,257158705 1,216525166 1,170928437
MAR
1,048820323 1,036691409 1,034589808 1,030902257 1,022749463 1,003474827
ABR
1,358943710 1,308972406 1,286273116 1,254952499 1,211941603 1,168850221
ABR
1,047550691 1,035585404 1,034589808 1,030628110 1,021425695 1,001304000
MAIO
1,350715153 1,307271646 1,284287608 1,252001531 1,206891967 1,167829538
MAIO
1,047164287 1,035350379 1,034589808 1,030155268 1,020329861 1,000000000
JUN
1,342978255 1,304022023 1,281945493 1,249375344 1,201305895 1,166026860
JUN
1,045522817 1,034866062 1,034589808 1,029533430 1,019154776
JUL
1,338817212 1,301237375 1,280079138 1,247401954 1,196322017 1,163977097
JUL
1,044359400 1,034866062 1,034589808 1,029054920 1,017310392
AGO
1,334901944 1,299227470 1,276962074 1,244097631 1,189819653 1,161709440
AGO
1,043077458 1,034717063 1,034373624 1,027971438 1,014970884
SET
1,330982202 1,296601851 1,272589456 1,241018664 1,185034483 1,159384873
SET
1,040916515 1,034589808 1,034373624 1,027352971 1,013079465
OUT
1,327378369 1,295257374 1,270522316 1,238597206 1,181061393 1,157384912
OUT
1,039873522 1,034589808 1,034291915 1,026456874 1,011138079
NOV
1,324378652 1,293555056 1,266832035 1,235178233 1,177278796 1,156103949
NOV
1,039229200 1,034589808 1,033341241 1,025392517 1,009331376
DEZ
1,321737820 1,292008521 1,264394282 1,231921034 1,175191656 1,154780570
DEZ
1,038559329 1,034589808 1,033127384 1,024897492 1,008023969
OBS.: Foram consideradas as divisões por 1.000 ocorridas em março/1986, janeiro/1989, agosto/1993, e por 2.750 ocorridas em julho/1994.
TABELA PARA ATUALIZAÇÃO DIÁRIA DE DÉBITOS TRABALHISTAS
Abril/2016 – Ed. 229
MÊS: ABRIL ANO: 2016
85
DIA
MÊS
TAXA “PRO RATA DIE” (%)
TR ACUMULADA (%)
COEFICIENTE ACUMULADO
1º
ABRIL
0,006516%
0,000000%
1,00000000
2
ABRIL
-
0,006516%
1,00006516
3
ABRIL
-
0,006516%
1,00006516
4
ABRIL
0,006516%
0,006516%
1,00006516
5
ABRIL
0,006516%
0,013032%
1,00013032
6
ABRIL
0,006516%
0,019549%
1,00019549
7
ABRIL
0,006516%
0,026066%
1,00026066
8
ABRIL
0,006516%
0,032584%
1,00032584
9
ABRIL
-
0,039102%
1,00039102
10
ABRIL
-
0,039102%
1,00039102
11
ABRIL
0,006516%
0,039102%
1,00039102
12
ABRIL
0,006516%
0,045621%
1,00045621
13
ABRIL
0,006516%
0,052140%
1,00052140
14
ABRIL
0,006516%
0,058659%
1,00058659
15
ABRIL
0,006516%
0,065179%
1,00065179
16
ABRIL
-
0,071699%
1,00071699
17
ABRIL
-
0,071699%
1,00071699
18
ABRIL
0,006516%
0,071699%
1,00071699
19
ABRIL
0,006516%
0,078220%
1,00078220
20
ABRIL
0,006516%
0,084741%
1,00084741
21
ABRIL
-
0,091262%
1,00091262
22
ABRIL
0,006516%
0,091262%
1,00091262
23
ABRIL
-
0,097784%
1,00097784
24
ABRIL
-
0,097784%
1,00097784
25
ABRIL
0,006516%
0,097784%
1,00097784
26
ABRIL
0,006516%
0,104306%
1,00104306
27
ABRIL
0,006516%
0,110829%
1,00110829
28
ABRIL
0,006516%
0,117352%
1,00117352
29
ABRIL
0,006516%
0,123876%
1,00123876
30
ABRIL
-
0,130400%
1,00130400
1º
MAIO
-
0,130400%
1,00130400
2 – Juros de mora (incidentes a partir da propositura da ação e aplicados sobre o principal corrigido): • Até 28.02.1987 – Juros simples – 0,5% ao mês; • De 01.03.1987 até 31.01.1991 – Juros capitalizados mensalmente – 1% ao mês; • De 01.02.1991 em diante – Juros simples – 1% ao mês.
Fórmula para cálculo da taxa efetiva (T) dos juros capitalizados: T = (1,01)n – 1, onde “n” é igual ao número de dias decorridos desde a data da propositura da ação, contidos no período compreendido entre 01.03.1987 e 31.01.1991, dividido por 30.
Juros Capitalizados Mensalmente Nº Meses
% Efetivo
Nº Meses
% Efetivo
Nº Meses
% Efetivo
01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16
1,0000 2,0100 3,0301 4,0604 5,1010 6,1520 7,2135 8,2856 9,3685 10,4622 11,5668 12,6825 13,8093 14,9474 16,0968 17,2578
17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32
18,4304 19,6147 20,8108 22,0190 23,2391 24,4715 25,7163 26,9734 28,2431 29,5256 30,8208 32,1290 33,4503 34,7848 36,1327 37,4940
33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 –
38,8690 40,257+6 41,6602 43,0768 44,5076 45,9527 47,4122 48,8863 50,3752 51,8789 53,3977 54,9317 56,4810 58,0458 59,6263 –
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
01.10.1989
NCz$
381,73
Decreto nº 98.211/89
02.10.1989
01.09.1990
Cr$
6.056,31
Port. 3.588/90
03.09.1990
01.11.1989
NCz$
557,33
Decreto nº 98.346/89
31.10.1989
01.10.1990
Cr$
6.425,14
Port. 3.628/90
01.10.1990
01.12.1989
NCz$
788,18
Decreto nº 98.456/89
01.12.1989
01.11.1990
Cr$
8.329,55
Port. 3.719/90
01.11.1990
01.01.1990
NCz$
1.283,95
Decreto nº 98.783/89
29.12.1989
01.12.1990
Cr$
8.836,82
Port. 3.787/90
03.12.1990
Cr$
12.325,50
Port. 3.828/90
31.12.1990
01.02.1990
NCz$
2.004,37
Decreto nº 98.900/90
01.02.1990
01.01.1991
01.03.1990
NCz$
3.674,06
Decreto nº 98.985/90
01.03.1990
01.02.1991
Cr$
15.895,46
MP 295/91
01.02.1991
01.04.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.143/90
24.04.1990
01.03.1991
Cr$
17.000,00
Lei nº 8.178/91
04.03.1991
Cr$
42.000,00
Lei nº 8.222/91
06.09.1991
01.05.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.352/90
23.05.1990
01.09.1991
01.06.1990
Cr$
3.857,76
Port. 3.387/90
04.06.1990
01.01.1992
Cr$
96.037,33
Port. 42/92
21.01.1992
01.07.1990
Cr$
4.904,76
Port. 3.501/90
16.07.1990
01.05.1992
Cr$
230.000,00
Lei nº 8.419/92
08.05.1992
01.08.1990
Cr$
5.203,46
Port. 429/90
01.08.1990
01.09.1992
Cr$
522.186,94
Port. 601/92
31.08.1992
Abril/2016 – Ed. 229
II – Evolução do Salário-Mínimo desde 1989
86
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Vigência
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
01.01.1993
Cr$
1.250.700,00
Lei nº 8.542/92
24.12.1992
03.04.2000
R$
151,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.03.1993
Cr$
1.709.400,00
Port. Interm. 4/93
01.03.1993
01.04.2001
R$
180,00
MP 2.142/01 (atual 2.194-6)
30.03.2001
01.05.1993
Cr$
3.303.300,00
Port. Interm. 7/93
04.05.1993
01.04.2002
R$
200,00
Lei nº 10.525/02
28.03.2002
01.07.1993
Cr$
4.639.800,00
Port. Interm. 11/93
01.08.1993
01.04.2003
R$
240,00
Lei nº 10.699/03
10.07.2003
01.08.1993
CR$
5.534,00
Port. Interm. 12/93
03.08.1993
01.05.2004
R$
260,00
Lei nº 10.888/04
25.06.2004
01.09.1993
CR$
9.606,00
Port. Interm. 14/93
02.09.1993
01.05.2005
R$
300,00
Lei nº 11.164/05
19.08.2005
01.10.1993
CR$
12.024,00
Port. Interm. 15/93
04.10.1993
01.04.2006
R$
350,00
MP 288/06
31.03.2006
01.11.1993
CR$
15.021,00
Port. Interm. 17/93
03.11.1993
01.04.2006
R$
350,00
Lei nº 11.321/06
10.07.2006
01.12.1993
CR$
18.760,00
Port. Interm. 19/93
02.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
MP 362/07
30.03.2007-extra
01.01.1994
CR$
32.882,00
Port. Interm. 20/93
31.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
Lei nº 11.498/07
29.06.2007
01.02.1994
CR$
42.829,00
Port. Interm. 02/94
02.02.1994
01.03.2008
R$
415,00
MP 421/08
29.02.2008-extra
01.03.1994
URV
64,79
Port. Interm. 04/94
03.03.1994
01.02.2009
R$
465,00
MP 456/09
30.01.2009-extra
01.07.1994
R$
64,79
Lei nº 9.069/95
30.06.1994/30.06.1995
01.01.2010
R$
510,00
MP 474/09
24.12.2009
01.09.1994
R$
70,00
Lei nº 9.063/95
01.09.1994/20.06.1995
01.01.2011
R$
540,00
MP 516/10
31.12.2010
01.05.1995
R$
100,00
Lei nº 9.032/95
29.04.1995
01.03.2011
R$
545,00
Lei nº 12.382/11
28.02.2011
01.05.1996
R$
112,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2012
RS
622,00
Decreto nº 7.655/11
26.12.2011
01.05.1997
R$
120,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2013
R$
678.00
Decreto nº 7.872/11
26.12.2012
01.05.1998
R$
130,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2014
R$
724,00
Decreto nº 8.166/13
24.12.2013
01.05.1999
R$
136,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2015
R$
788,00
Decreto nº 8.381/14
29.12.2014
Abril/2016 – Ed. 229
III – Previdência Social – Valores de Benefícios (Abril/2015)
87
Salário-de-benefício mínimo Salário-de-benefício máximo Renda mensal vitalícia Salário-família:
R$ 788,00 R$ 4.663,75 R$ 788,00 I - R$ 37,18 (trinta e sete reais e dezoito centavos) para o segurado com remuneração mensal não superior a R$ 725,02 (setecentos e vinte e cinco reais e dois centavos);
II - R$ 26,20 (vinte e seis reais e vinte centavos) para o segurado com remuneração mensal superior a R$ 725,02 (setecentos e vinte e cinco reais e dois centavos) e igual ou inferior a R$ 1.089,72 (um mil e oitenta e nove reais e setenta e dois centavos). Benefícios a idosos e portadores de deficiência Um salário-mínimo (Decreto nº 1.744/1995)
INSS – JANEIRO 2016 TABELA DE CONTRIBUIÇÃO (EMPREGADO, EMPREGADO DOMÉSTICO E TRABALHADOR AVULSO) PARA PAGAMENTO DE REMUNERAÇÃO A PARTIR DE 1º DE JANEIRO DE 2016 Salário-de-contribuição (R$)
Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%)
até 1.556,94
8%*
de 1.556,95 até 2.594,92
9%*
de 2.594,93 até 5.189,82
11%*
ESCALA DE SALÁRIOS-BASE PARA OS SEGURADOS CONTRIBUINTE INDIVIDUAL E FACULTATIVO
Nota: Escala extinta, conforme o art. 9º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003, DOU 09.05.2003, e o art. 39 da Instrução Normativa DC/INSS nº 89, de 11.06.2003, DOU 13.06.2003.
* Alíquota reduzida para salários e remunerações até três salários-mínimos, em razão do disposto no inciso II do art. 17 da Lei nº 9.311, de 24.10.1996, que instituiu a Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e de Direitos de Natureza Financeira – CPMF.
IV – Imposto de Renda na Fonte TABELA PROGRESSIVA MENSAL Alíquota %
Até 1.903,98
-
Parcela a deduzir do imposto em R$ -
De 1.903,99 até 2.826,65
7,5 142,80
De 2.826,66 até 3.751,05
15,0 354,80
De 3.751,06 até 4.664,68
22,5 636,13
Acima de 4.664,68
27,5 869,36
Dedução por dependente
O imposto de renda anual devido, incidente sobre os rendimentos de pessoas físicas, será calculado de acordo com a tabela progressiva anual correspondente à soma das tabelas progressivas mensais vigentes nos meses de cada ano-calendário.
189,59
V – Limites de Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho NOVOS VALORES PARA DEPÓSITOS RECURSAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO (Ato nº 397/2015 do TST, DJe de 13.07.2015, vigência a partir de 01.08.2015) Recurso Ordinário
R$ 8.183,06
Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recurso em Ação Rescisória
R$ 16.366,10
Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.
Abril/2016 – Ed. 229
Base de cálculo em R$
TABELA PROGRESSIVA ANUAL
88
VI – Indexadores Indexador INPC IGPM UFIR SELIC
Outubro
Novembro
Dezembro
Janeiro
Fevereiro
Março
0,77 1,11 0,90 1,51 1,00 1,89 1,52 0,49 1,14 1,29 Extinta, a partir de outubro de 2000, pela MP 1.973-67, atual Lei nº 10.522, de 19.07.2002, DOU 22.07.2002, art. 29, § 3º. 1,11 1,06 1,16 1,06 0,95 Valor de Referência Base Maio/1992 – Cruzeiros 79.297,75 Emissão anterior a Jan./1989 79.297,75
TDA
0,44 0,51 1,16
Valores nominais reajustados – Reais 91,87 Emissão anterior a Jan./1989 157,23
(*) Referente ao primeiro dia de cada mês.
VII – Índices de Atualização dos Débitos Judiciais
Abril/2016 – Ed. 229
Tabela editada em face da Jurisprudência ora predominante.
89
Mês/Ano 1993 1994 1995 1996 1997 1998
Mês/Ano 1999
JAN 140.277,063840 3631,929071 FEV 180.634,775106 5132,642163 MAR 225.414,135854 7214,955088 ABR 287.583,354522 10323,157739 MAIO 369.170,752199 14747,663145 JUN 468.034,679637 21049,339606 JUL 610.176,811842 11,346741 AGO 799,392641 12,036622 SET 1065,910147 12,693821 OUT 1445,693932 12,885497 NOV 1938,964701 13,125167 DEZ 2636,991993 13,554359
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
13,851199 16,819757 14,082514 17,065325 14,221930 17,186488 14,422459 17,236328 14,699370 17,396625 15,077143 17,619301 15,351547 17,853637 15,729195 18,067880 15,889632 18,158219 16,075540 18,161850 16,300597 18,230865 16,546736 18,292849
18,353215 18,501876 18,585134 18,711512 18,823781 18,844487 18,910442 18,944480 18,938796 18,957734 19,012711 19,041230
19,149765 19,312538 19,416825 19,511967 19,599770 19,740888 19,770499 19,715141 19,618536 19,557718 19,579231 19,543988
2002
2003
19,626072 21,280595 22,402504 24,517690 19,753641 21,410406 22,575003 24,780029 20,008462 21,421111 22,685620 24,856847 20,264570 21,448958 22,794510 25,010959 20,359813 21,468262 22,985983 25,181033 20,369992 21,457527 23,117003 25,203695 20,384250 21,521899 23,255705 25,357437 20,535093 21,821053 23,513843 25,649047 20,648036 22,085087 23,699602 25,869628 20,728563 22,180052 23,803880 26,084345 20,927557 22,215540 24,027636 26,493869 21,124276 22,279965 24,337592 27,392011
2000
2001
28,131595 28,826445 29,247311 29,647999 30,057141 30,354706 30,336493 30,348627 30,403254 30,652560 30,772104 30,885960
2004 31,052744 31,310481 31,432591 31,611756 31,741364 31,868329 32,027670 32,261471 32,422778 32,477896 32,533108 32,676253
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2005 2006 2007
2008
32,957268 34,620735 35,594754 37,429911 33,145124 34,752293 35,769168 37,688177 33,290962 34,832223 35,919398 37,869080 33,533986 34,926270 36,077443 38,062212 33,839145 34,968181 36,171244 38,305810 34,076019 35,013639 36,265289 38,673545 34,038535 34,989129 36,377711 39,025474 34,048746 35,027617 36,494119 39,251821 34,048746 35,020611 36,709434 39,334249 34,099819 35,076643 36,801207 39,393250 34,297597 35,227472 36,911610 39,590216 34,482804 35,375427 37,070329 39,740658
2009
2010
39,855905 40,110982 40,235326 40,315796 40,537532 40,780757 40,952036 41,046225 41,079061 41,144787 41,243534 41,396135
41,495485 41,860645 42,153669 42,452960 42,762866 42,946746 42,899504 42,869474 42,839465 43,070798 43,467049 43,914759
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2011 2012 2013
44,178247 46,864232 44,593522 47,103239 44,834327 47,286941 45,130233 47,372057 45,455170 47,675238 45,714264 47,937451 45,814835 48,062088 45,814835 48,268754 46,007257 48,485963 46,214289 48,791424 46,362174 49,137843 46,626438 49,403187
2014
2015
2016
49,768770 52,537233 55,809388 62,102540 50,226642 52,868217 56,635366 63,040288 50,487820 53,206573 57,292336 63,639170 50,790746 53,642866 58,157450 63,919182 51,090411 54,061280 58,570367 51,269227 54,385647 59,150213 51,412780 54,527049 59,605669 51,345943 54,597934 59,951381 51,428096 54,696210 60,101259 51,566951 54,964221 60,407775 51,881509 55,173085 60,872914 52,161669 55,465502 61,548603
Observação I – Dividir o valor a atualizar (observar o padrão monetário vigente à época) pelo fator do mês do termo inicial e multiplicar pelo fator do mês do termo final, obtendo-se o resultado na moeda vigente na data do termo final, não sendo necessário efetuar qualquer conversão. Esclarecendo que, nesta tabela, não estão incluídos os juros moratórios, apenas a correção monetária.
Padrões monetários a considerar: Cr$ (cruzeiro): de out./1964 a jan./1967
NCz$ (cruzado novo): de jan./1989 a fev./1990
NCr$ (cruzeiro novo): de fev./1967 a maio/1970
Cr$ (cruzeiro): de mar./1990 a jul./1993
Cr$ (cruzeiro): de jun./1970 a fev./1986
CR$ (cruzeiro real): de ago./1993 a jun./1994
Cz$ (cruzado): de mar./1986 a dez./1988
R$ (real): de jul./1994 em diante
Exemplo: Atualização, até abril de 2016, do valor de Cz$1.000,00 fixado em janeiro de 1988 Cz$1.000,00 : 596,94 (janeiro/1988) x 63,919182 (abril/2016) = R$ 107,07
Out./1964 a fev./1986: ORTN Mar./1986 e mar./1987 a jan./1989: OTN Abr./1986 a fev./1987: OTN pro rata Fev./1989: 42,72% (conforme STJ, índice de jan./1989
Abr./1989 a mar./1991: IPC do IBGE (de mar./1989 a fev./1991) Abr./1991 a jul./1994: INPC do IBGE (de mar./1991 a jun./1994) Ago./1994 a jul./1995: IPC-r do IBGE (de jul./1994 a jun./1995) Ago./1995 em diante: INPC do IBGE (de jul./1995 em diante), sendo que, com relação à aplicação da deflação, a matéria ficará sub judice)
Mar./1989: 10,14% (conforme STJ, índice de fev./1989) Observação III – Aplicação do índice de 10,14%, relativo ao mês de fevereiro de 1989, ao invés de 23,60%, em cumprimento ao decidido no Processo nº G-36.676/2002. Fonte: Site do TJSP * Aplicável aos cálculos judiciais, exceto para aqueles com normas específicas estabelecidas por lei ou com decisão transitada em julgado, que estabelece critérios e índices diferentes.
Abril/2016 – Ed. 229
Observação II – Os fatores de atualização monetária foram compostos pela aplicação dos seguintes índices:
90
IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.
TELEFONES PARA CONTATOS
Diretor Editorial e de Produtos: Elton José Donato
Vendas/Assinaturas
Coordenador Editorial: Cristiano Agrella Basaglia
Grande São Paulo (11) 2188.7777
Editora Responsável: Simone Saletti
Demais Localidades 0800.7072244
Diagramação: Jane Batista Silveira
Renovação
Revisão Final: Sabrina Faucão Fauth
Grande São Paulo (11) 2188.7512
Editoração Eletrônica: IOB
Demais Localidades 0800.7247570
Publicação: IOB
Cobrança
Site Jurídico IOB: www.sage.com.br
São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900
E-mail: netiob@sage.com.br
Demais Localidades 0800.7247900
Fale com o Editor: conselho.editorial@sage.com.br
Consultoria para envio de acórdãos: (51) 2101.6200
Envio de artigos: Envie seu artigo para conselho.editorial@sage.com.br
SAC e Suporte Técnico São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900 Demais Localidades 0800.7247900 E-mail: sacsintese@sage.com
Jornal Jurídico Abril/2016 – Edição 229