A Necessidade da Quebra do Protagonismo Judicial: a Comparticipação na Construção do Provimento Jurisdicional, uma Abordagem Habermasiana e Fazzalariana – Gabriela Soares Balestero e Alexandre Gustavo Melo Franco Bahia – p. 1
Fraudes Fiscais e Contábeis Relacionadas ao ISS – Imposto sobre Serviços – Luciano Chahin Maragno – p. 12 Compatibilização do Plano Diretor e os Planos de Saneamento Básico e Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos – Sylvio Toshiro Mukai – p. 23 A Resignificação da Dependência Econômica – Murilo C. S. Oliveira – p. 28 Os Contratos Administrativos e a Arbitragem – Luciano Benetti Timm e Thiago Tavares da Silva – p. 48 Da Possibilidade de Fiança Como Medida Alternativa à Prisão Cautelar nos Crimes de Tráfico de Drogas – Mateus Marques e Marçal Carvalho – p. 60 Acórdão na Íntegra –Tribunal Regional Federal da 1ª Região – p. 69 Pesquisa Temática – IPVA – p. 72 Jurisprudência Comentada – Adoção à Brasileira – Revogação – Pedido Feito pela Mãe – Impossibilidade – Lourival Serejo – p. 75
Jornal Jurídico
Medida Provisória – p. 77 Normas Legais – p. 80 Indicadores – p. 84
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Doutrina
A Necessidade da Quebra do Protagonismo Judicial: a Comparticipação na Construção do Provimento Jurisdicional, uma Abordagem Habermasiana e Fazzalariana GABRIELA SOARES BALESTERO Advogada Militante Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie em 2006, Especialista em Direito Constitucional, Pós-Graduanda em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito do Sul de Minas.
ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA Mestre e Doutor em Direito Constitucional (UFMG), Professor Permanente do Programa de Mestrado em Direito da Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM), Professor Adjunto na Faculdade Batista de Minas Gerais, Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), Advogado.
RESUMO: A finalidade deste artigo é estudar e analisar a questão do ativismo judicial, ou seja, a degeneração de um processo criado de forma solipsista pelo Magistrado, sem a participação das partes para a construção do provimento. Portanto, o presente estudo possui dois objetivos específicos: i) a reformulação processual sob uma perspectiva democrática; ii) a construção do provimento jurisdicional pelos sujeitos do processo em simétrica paridade de armas. PALAVRAS-CHAVE: Ativismo judicial; participação das partes; reformulação processual; paridade de armas.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Processo como um procedimento em contraditório; 2 A necessidade da quebra do protagonismo judicial; 3 Uma releitura processual – Habermas; Considerações finais; Referências.
INTRODUÇÃO No presente artigo será analisada a importância das partes na construção do provimento, consoante a teoria fazzalariana, bem como a questão do ativismo judicial, decorrente das decisões solipsistas e muitas vezes arbitrárias do Poder Judiciário brasileiro. Alguns questionamentos são pertinentes ao presente estudo como quais seriam os limites do julgador na tomada de decisões e se poderia o Judiciário atuar como substituto do legislador no tratamento de questões que não estariam previstas legalmente. Pretende-se discutir quais seriam os limites do Poder Judiciário na tomada de decisões de maneira que o provimento Jurisdicional seja construído de maneira democrática. Entende-se que um modelo democrático de processo deve seguir a perspectiva habermasiana e fazzalariana, na qual há uma estrutura policêntrica em que há a participação de todos os sujeitos envolvidos no processo na construção do provimento jurisdicional.
1 PROCESSO COMO UM PROCEDIMENTO EM CONTRADITÓRIO Em 1868, Bülow1, em seu famoso livro Teoria das exceções e dos pressupostos processuais, foi o grande responsável por estabelecer 1 BULOW, Oskar. Teoria das exceções e dos pressupostos processuais. Campinas: LZN, 2005.
a teoria de que o processo é uma relação jurídica entre as partes, e o juiz, não se confundindo com a relação jurídica de direito material, ou seja, para ele, haveriam dois planos de relações, uma de direito material e outra de direito processual.
do ato estatal, atividade regulada por uma estrutura normativa, composta de uma sequência de normas, de atos e de posições subjetivas, que se desenvolvem em uma dinâmica bastante específica, na preparação de um provimento”.
A teoria de Bülow foi criticada por Goldschmidt2, que lançou contra ela a teoria do processo como situação jurídica, pois, para ele, o direito, através do processo, passa a sofrer uma mutação estrutural, isto é, o que era direito subjetivo passa a ser mera expectativa.
Se, pois, no procedimento de formação do provimento, ou seja, se nas atividades preparatórias por meio das quais se realizam os pressupostos do provimento, são chamados a participar, em uma ou mais fases, os “interessados”, em contraditório, colhemos a essência do “processo”: que é, exatamente, um procedimento, ao qual, além do autor do ato final, participam, em contraditório entre si, os “interessados”, isto é, os destinatários dos efeitos de tal ato.6
O processo como procedimento em contraditório: uma ideia simples e genial, que se afasta do “velho e inadequado clichê pandectístico da relação jurídica processual’, [..] esquema estático [...] que leva em conta a realidade, mas não a explica”. O contraditório, como estrutura dialética do processo, que comprova a autonomia deste em relação a seu resultado, porque “ele [o contraditório] existe e se desenvolve, ainda que não advenha a medida jurisdicional [...] e é empregado mesmo para estabelecer se o provimento jurisdicional deva, no caso concreto, ser emitido ou recusado”.
Consoante o entendimento de Aroldo Plínio Gonçalves5: “O procedimento é uma atividade preparatória de um determina2 GOLDSCHMIDT, James. Princípios generales del proceso. Buenos Aires: Ejea, 1961. 3 FAZZALARI, Elio. Instituições de direito processual. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006. 4 Em apresentação no livro de FAZZALARI, Elio. Instituições de direito processual. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006. p. 5. 5 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001. p. 102.
Nesse passo, requer-se a participação simetricamente igual dos interessados na construção do provimento, e, deste modo, nenhum julgador deve proferir qualquer decisão utilizando argumentos não debatidos pelas partes em contraditório. Tal estrutura consiste na participação dos destinatários dos efeitos do ato final em sua fase preparatória; na simétrica paridade das suas posições; na mútua implicação das suas atividades (destinadas, respectivamente, a promover e impedir a emanação do provimento); na relevância delas para o autor do provimento; de modo que cada contraditor possa exercitar um conjunto – conspícuo ou modesto, não importa – de escolhas, de reações, de controles, e deva sofrer os controles e as reações dos outros, e que o autor do ato deva prestar contas dos resultados.7
Em um processo encarado sob uma perspectiva democrática, há a construção do provimento jurisdicional pelas partes em simétrica paridade de armas, sendo, necessário, portanto, o afastamento do decisionismo do julgador e a implantação da comparticipação na formação das decisões. A degeneração de um processo governado e dirigido solitariamente pelo juiz, como já criticada em trabalho anterior (Nunes, 2006, p. 23), gerará 6 FAZZALARI, Elio. Instituições de direito processual. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006. p. 33. 7 Ibidem, p. 119/120.
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Tais teorias em tempos recentes vêm sendo criticadas pelo italiano Élio Fazzalari3, com uma ideia (aparentemente) simples mas de extrema importância, buscando afastar o velho clichê da relação jurídica processual, consoante explicação de Ada Pellegrini Grinover4:
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claros déficits de legitimidade, que impedirão uma real democratização do processo, que pressupõe uma interdependência entre os sujeitos processuais, uma corresponsabilidade entre estes e, especialmente, um policentrismo processual. [...] Tal perspectiva procedimental, defendida por Habermas, como já expresso, importa na percepção de um Estado constitucional que se legitima, por meio de procedimentos (Habermas, 1994, p. 664) que devem estar de acordo com os direitos fundamentais e com o princípio da soberania do povo.8
Seguindo o mesmo entendimento, Aroldo Plínio Gonçalves9 afirma que “o controle das partes sobre os atos do juiz é de suma importância e, nesse aspecto, a publicidade e a comunicação, a cientificação do ato processual às partes (que é, também, garantia processual) é de extrema relevância”. A implementação dinâmica dos princípios fundamentais do processo mediante a estruturação técnica adequada permitirá uma democratização do processo sem preocupações com o esvaziamento do papel diretor do juiz e do papel contributivo das partes na formação das decisões.10
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O juiz deve ser visto como um garantidor dos direitos fundamentais, respeitando e assegurando às partes a participação na formação das decisões, ou seja, na produção do provimento jurisdicional de forma a derrubar a teoria da relação jurídica processual.
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Certo é que o jurista não pode desenvolver o seu dever se ignora as outras componentes – morais, sociais, políticas, econômicas – da comunidade; mas também os cultores destas últimas não podem operar nos setores de sua competência se não conhecem o papel que o direito tem na sociedade. É necessário, portanto, a consciência das rationes 8 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 195/196. 9 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001. p. 112. 10 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 197.
distinguendi da jurisprudência e das outras “ciências sociais”; do fato de que cada uma delas tem formatado e utilizado – nem poderia ser de outra forma: não é lícito, também, o processo da história – instrumentos próprios para colher a realidade do próprio ponto de vista. Em suma, é contemplada a complementaridade das diversas abordagens; não é admitido, ao contrário, sincretismo de métodos.11
Nesse passo, o procedimento seria uma sequência de atos valorados, que alcançariam o ato final proferido pelo Magistrado, cuja formação todos concorreram, havendo o que Fazzalari denomina de combinação12, na qual haveriam conexões entre normas, atos e posições subjetivas em meio ao processo. Conclui-se que não existe entre os sujeitos processuais uma submissão das partes ao juiz, e sim uma interdependência, sendo inaceitável, portanto, o esquema de relação jurídico processual. Não se podem mais realizar interpretações do sistema processual sem tomar por base o “modelo constitucional de processo” e sem perceber que, além de se buscar a eficiência (geração de resultados úteis), há de se buscar uma aplicação que implemente a percepção dinâmica das normas constitucionais, lidas de modo a permitir participação e legitimidade em todas as decisões proferidas. Inaugura-se uma concepção garantística do processo em contraponto e superação com sua concepção publicística e socializadora.13
Fazzalari14 entende que a participação é um elemento estrutural e legitimante das atividades processuais, daí sendo importante a participação técnica das partes na construção do provimento Jurisdicional.
11 FAZZALARI, Elio Fazzalari. Instituições de direito processual. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006. p. 75. 12 Ibidem, p. 91. 13 NUNES, Dierle José Coelho. Teoria do processo contemporâneo. Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas, Edição Especial, p. 14, 2008. 14 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 207.
Porém, infelizmente essa não é a realidade atualmente vista no ordenamento jurídico brasileiro, na qual há a concentração excessiva de todo o poder decisório nas mãos do Judiciário diante da postura solipsista do Magistrado na tomada de decisões, tornando-as cada vez mais arbitrárias. O ativismo judicial vem sendo debatido pela doutrina, especialmente após a criação das súmulas vinculantes pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que acrescentou à Constituição o art. 103-A. Destaca-se que sempre houve uma tendência dos tribunais que os juízos inferiores devessem seguir a orientação dos superiores de forma que a uniformização da jurisprudência pudesse conviver com o princípio da hierarquia dos tribunais. Além desse aspecto, não se pode mais acreditar em um Estado Democrático de Direito no qual o Judiciário deixe de julgar casos e passe a julgar somente teses, como a lógica da produtividade e da eficiência a qualquer custo parece impor, que permite aos juízes exercerem um papel “judicializante” (da política e das relações sociais), que pode gerar impactos políticos, econômicos e jurídicos nefastos.16
15 FAZZALARI, Elio Fazzalari. Instituições de direito processual. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006. p. 94. 16 NUNES, Dierle José Coelho. Teoria do processo contemporâneo. Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas, Edição Especial, p. 14, 2008.
Porém, a partir do momento em que há a possibilidade de edição de súmulas vinculantes pelos Tribunais Superiores com a obrigatoriedade de aplicação a todos os tribunais inferiores, questiona-se a existência dos princípios como a inexistência de hierarquia entre os tribunais, liberdade de convencimento e independência do juiz enquanto agente político. Falávamos do problema na crença do texto que jaz em tentativas como a da emenda. Acredita-se que os problemas do Judiciário podem ser resolvidos a partir do momento em que o STF, à maneira do common law, estabeleça um texto que servirá de precedente vinculante para que os demais Tribunais interpretem num certo sentido a aplicação de uma lei a certa situação. Mas uma vez, fica patente a discussão entre “público” e “privado”: afinal, o STF (ou outro Tribunal), ao ter um caso para decidir, deverá considerar o caso ou sua possível repercussão (transcendência) nacional? A mera colocação da questão nestes termos, aliás, já encerra em si um problema, porque começamos a criar classes de processos “super” e “sub” privilegiados.17
O processo judicial, que deveria ser encarado como um procedimento em contraditório, resguardando os princípios constitucionais, ou seja, um processo mais democrático, tem a sua solução congelada, diante da aplicação da súmula em casos idênticos, de maneira a restringir a atuação das partes e até mesmo dos tribunais inferiores. Há, no caso, o predomínio da assimetria, ou seja, as partes estão submetidas ao Poder Judiciário, ao juiz, em uma relação processual baseada na hierarquia. Com a concepção procedimental do Estado de Direito em Habermas e a teoria fazzalariana, busca-se uma reconstrução processual mais democrática. Portanto, propõe-se um modelo democrático de processo em que predomina o policentrismo, ou seja, uma participação legí17 BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco. Reforma do Judiciário: o que uma súmula vinculante pode vincular? Revista Forense Eletrônica – Suplemento, v. 378, seção de doutrina, p. 668, mar./abr. 2005.
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Se, pois, o procedimento é regulado de modo que dele participem também aqueles em cuja esfera pública o ato final é destinado a desenvolver efeitos – de modo que o autor dele (do ato final, ou seja, o juiz) deve dar a tais destinatários o conhecimento da sua atividade, e se tal participação é armada de modo que os contrapostos “interessados” (aqueles que aspiram a emanação do ato final – “interessados” em sentido estrito – e aqueles que queiram evitá-lo, ou seja, os “contrainteressados”) estejam sob plano de simétrica paridade, então o procedimento compreende o “contraditório”, faz-se mais articulado e complexo, e do genus “procedimento” é possível extrair a species “processo”.15
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tima e simétrica de todos os sujeitos participantes do processo, sem qualquer grau de hierarquia.
essenciais da sociedade. Portanto, verifica-se, por exemplo, a judicialização da política19, da saúde.
2 A NECESSIDADE DA QUEBRA DO PROTAGONISMO JUDICIAL
Consoante Daniel Sarmento20, “no cenário brasileiro, o neoconstitucionalismo é também impulsionado por outro fenômeno: a descrença geral da população em relação à política majoritária e, em especial, o descrédito do Poder Legislativo e dos partidos políticos”21.
As teorias de Bülow do processo como relação jurídica entre as partes subordinadas ao juiz reduziram o processo a um instrumento para que o Magistrado atue de maneira solipsista na tomada de decisões no caso concreto. O processo passa a ser o local em que o juiz atua de acordo com as suas próprias convicções e ideologias, havendo uma degeneração de todo o conteúdo da relação jurídica processual, ocasionando o descrédito do Judiciário e o protagonismo do juiz.
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Tal fenômeno apelidado de ativismo judicial é sintetizado pela afirmação de Streck: “Forma-se, desse modo, um círculo vicioso: primeiro, admitem-se discricionarismos e arbitrariedades em nome da ‘ideologia do caso concreto’, circunstância que, pela multiplicidade de respostas, acarreta um sistema desgovernado, fragmentado”18.
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A deficiência estatal na realização de políticas públicas e do legislativo na elaboração de leis que realmente acompanhem a mobilidade social e tecnológica proporcionou a derrocada dos ideais dos Estados sociais e a busca incessante pelo Poder Judiciário na esperança da implementação das atividades
18 STRECK, Lenio Luiz. Constituição, sistemas sociais e hermenêutica: desconstruindo os modelos de juiz: a hermenêutica jurídica e a superação do sujeito-objeto. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 110/111.
19 “Tal expressão ganhou delineamento a partir do trabalho coordenado por C. Neal Tate e Torjön Vallinder, intitulado The global expansion of judicial power, no qual foi denominada de judicialização a tendência de transferir poder decisório do Poder Executivo e do Poder Legislativo para o Poder Judiciário.” (NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 179) 20 SARMENTO, Daniel. O neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 32. 21 Nesse ponto, cabe informar os fatores de desestabilização democrática trazidos por Rodolfo Viana em sua obra Direito constitucional democrático. Atualmente, verifica-se que diversos fatores desestabilizaram a democracia, destruindo a sua imagem romântica, perfeita, constatando-se que tal situação não ocorre apenas nos chamados países subdesenvolvidos, mas sim nos chamados países de primeiro mundo. Os fatores de desestabilização democrática são considerados causas exógenas, compreendem os fenômenos da “globalização”, “complexidade” e “risco”. Já as causas endógenas compreendem a “crise do princípio representativo” e a “fenomenologia do refluxo”. a) Globalização: a globalização ainda é um fenômeno e implica um novo regime, é um sistema social, econômico, político, é um fenômeno de certa universalização, pois desloca muitas decisões para fora do país, ou seja, há espaços extranacionais, há agências, organizações, que tomam decisões. Nesse sentido, há uma interpenetração entre os níveis local e global, pois as tendências da sociedade mundial convivem com as identidades locais. Isso ocorre porque a política interna passa a ser influenciada por fatores externos, restringindo a autonomia e a liberdade da vontade popular; b) Complexidade: a complexidade é a dificuldade de adaptação da democracia em uma sociedade complexa. Para Niklas Luhmann, a “complexidade” é uma derivação conceitual relacionada essencialmente com o que se poderia chamar de “especialização funcional autorreferenciada” dos sistemas sociais. Verifica-se, pois, a dificuldade em se regulamentar uma sociedade complexa no sistema constitucional
O Poder Judiciário figura a concepção neoliberal de produtividade; em especial, após a Emenda Constitucional nº 45, trouxe à Constituição Federal brasileira a previsão expressa do princípio da celeridade processual. e o caráter operacional da democracia fica abalado, tendo em vista que o indivíduo, sendo obrigado a se especializar, não tem disponibilidade para a vida pública, acabando por enfraquecer esses laços sociais de forma brusca; c) Risco: segundo Ulrich Beck, sociedade de risco “designa um tipo de sociedade que se tornou consciente do paradoxo do conhecimento científico, ou seja, de que a produção de novos conhecimentos gera também novas incertezas”. Logo, atualmente, a ciência não tem a competência de avaliar a consequência da meteórica evolução tecnológica, não tendo como calcular, prever e gerir os riscos do seu próprio desenvolvimento, tornando pública a sua incerteza. Há o confronto entre a democracia e a tecnocracia, havendo dúvidas quanto à competência, à capacidade do povo em suas decisões. Portanto, a democracia é desafiada a resolver temas que fogem da cognição da própria ciência. Desta forma, a tecnocracia pode acarretar o esvaziamento da política que é o cerne da democracia, e consequentemente as decisões sobre a implantação de tecnologias devam ser retiradas do público, reforçando a ideia da competência do povo para a definição da melhor estratégia de decisão e de governabilidade. Entretanto, tal situação também gera conflitos, pois a credibilidade do discurso tecnocrático é abalada diante do fato de o homem comum não possuir capacidade técnica suficiente para fornecer respostas seguras aos problemas decorrentes das falhas da ciência; d) Refluxo: segundo Rodolfo Viana Pereira, “o último fator de crise é representado pelo que Noberto Bobbio chamou de ‘refluxo à democracia’. A expressão designa uma categoria de eventos que inclui três fenômenos particulares: o afastamento da política, a renúncia à política e a recusa da política” (PEREIRA, Rodolfo Viana. Direito constitucional democrático. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008).
Nesse passo, a produtividade judicial passa a predominar os julgamentos em massa; as ações repetitivas, as súmulas vinculantes são o retrato de um Poder Judiciário pautado em números de julgamentos do que em análises criteriosas do caso concreto. Surge, então, o ativismo judicial ocasionado pelo protagonismo do juiz, pois é entregue a ele uma capacidade sobre-humana de proferir uma decisão mais justa de acordo com as suas concepções pessoais e ideologias, em sua maioria desprezando possíveis contribuições das partes, dos advogados e até mesmo da jurisprudência e da doutrina. Segundo Daniel Sarmento, “muitas vezes o Poder Judiciário pode atuar bloqueando mudanças importantes promovidas pelos outros poderes em favor dos excluídos, defendendo o status quo. E essa defesa pode ocorrer inclusive através do uso da retórica dos direitos fundamentais”22. Em sentido semelhante, Dierle Nunes23: A degeneração de um processo governado e dirigido solitariamente pelo juiz, como já criticada em trabalho anterior (Nunes, 2006, p. 23), gerará claros déficits de legitimidade, que impedirão uma real democratização do processo, que pressupõe uma interdependência entre os sujeitos processuais, uma corresponsabilidade entre estes e, especialmente, um policentrismo processual.
22 “É verdade que o ativismo judicial pode, em certos contextos, atuar em sinergia com a mobilização social na esfera pública. Isso ocorreu, por exemplo, no movimento dos direitos civis nos Estados Unidos dos anos 50 e 60, que foi aquecido pelas respostas positivas obtidas na Suprema Corte, no período da Corte de Warren. Mas nem sempre é assim. A ênfase judicialista pode afastar do cenário de disputa por direitos as pessoas e movimentos que não pertençam nem tenham proximidade com as corporações jurídicas.” (SARMENTO, Daniel. O neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 36/37) 23 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 195.
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Isso gera uma expectativa da sociedade de que o Poder Judiciário traga uma resposta para todos os problemas nacionais, como, por exemplo, os casos em que a justiça toma certas decisões baseadas na opinião pública como “mensalão”, “perda de mandato por infidelidade partidária”, “nepotismo” e outros.
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Nessa vereda, busca-se um afastamento do decisionismo do julgador para que sejam abertos espaços alternativos que proporcionem a discussão, a participação dos interessados na formação das decisões. Uma das consequências da inclusão da efetiva participação da população na esfera pública é o alargamento do foro tradicional da política, ou seja, os debates e as tomadas de decisões fugiriam dos foros tradicionais para alcançar outros âmbitos mais populares, como fóruns, debates via Internet, associações criadas com essa finalidade, etc., de forma a utilizar os meios de comunicação como instrumento para essa abertura política à população.
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O alargamento desses espaços alternativos para debates, bem como o incentivo das informações fornecidas pelos meios de comunicação em massa podem aumentar o nível de legitimidade, de participação popular.
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Como afirma Paulo Bonavides24: “Sem participação não há sociedade democrática. A participação é o lado dinâmico da democracia, a vontade atuante que, difusa ou organizada, conduz no pluralismo o processo político à nacionalização, produz o consenso e permite concretizar, com legitimidade, uma política de superação e pacificação de conflitos”. Para Dierle José Coelho Nunes25, “o processo não pode ser, nesse contexto, enxergado como um mal a ser resolvido, eis que este constitui uma garantia de legitimidade e participação dos cidadãos na formação das decisões”. 24 BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal do estado social. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 2-3. 25 NUNES, Dierle José Coelho. Teoria do processo contemporâneo. Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas, Edição Especial, p. 14, 2008.
Um processo construído a partir da comparticipação das partes permite que todos os sujeitos processuais discutam argumentos normativos para a produção do provimento na busca de uma solução mais adequada ao caso concreto, evitando decisões arbitrárias do julgador.
3 UMA RELEITURA PROCESSUAL – HABERMAS A teoria do processo como um procedimento em contraditório possui, em sua essência, viés democrático com forte influência de Habermas, na qual o Direito funcionaria como um mediador, um instrumento26, entre a facticidade e as pretensões de validade, como mecanismo de integração social. Ademais, para Habermas, haveria duas ações estratégicas: a integração sistêmica correspondente à economia, dinheiro e poder e a integração social, que são as ações comunicativas, orientadas pelo consenso social, composta por outros elementos como os valores, a moral, a ética. No âmbito da jurisdição, Habermas – apoiado em Klaus Günther – divide a teoria do discurso em discursos de fundamentação ou 26 “Mas, para atingir esse objetivo, Habermas indica transformações necessárias ao modo de produção e aplicação do direito. A fundamentação do direito e do Estado Democrático vai ser deslocada, da soberania do povo, para a soberania de um procedimento discursivo público sob condições ideais. O resultado é uma reconfiguração da separação dos poderes de acordo com os tipos de discursos predominantes em cada um deles. O poder administrativo (Executivo), o Legislativo e o Judiciário ganham assim atribuições e competências cuja legitimidade pressupõe um outro poder, chamado por Habermas de ‘poder comunicativo’, que é o poder resultante de uma discussão pública racional onde todos os implicados passam a ser, ao mesmo tempo, destinatários e autores do próprio direito.” (SIMIONI, Rafael Lazzarotto. Direito e racionalidade comunicativa: a teoria discursiva do direito no pensamento de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá, 2007. p. 12)
de justificação das normas jurídicas e discursos de aplicação. Os discursos de justificação, próprios do legislador, procuram estabilizar em normas expectativas de comportamento, gerando discursos gerais e abstratos, pensados para uma gama (finita) de possibilidades de aplicação. Já os discursos de aplicação tomam a norma reconstruída a partir das particularidades do caso concreto27. O Poder Judiciário não pode fazer discursos de justificação, ou seja, criar a norma jurídica, diante da ausência da participação popular, apenas podendo fazer discursos de aplicação da norma.
Busca-se a preservação das liberdades de maneira a preservar abertos os canais de participação política de forma a proporcionar o bom funcionamento do regime democrático.
Assim, descrendo na viabilidade de princípios morais consensuais ou neutros, dedutíveis pela razão e suscetíveis de fundar um ativismo judicial em termos consistentes com a democracia, Ely propõe a limitação do judicial review (judicial self – restraint) a questões relativas à preservação da integridade do próprio regime democrático. Isto é: o papel do Judiciário não seria o de fazer escolhas substantivas, incluindo a conteudização de princípios e direitos, tarefa reservada, nos Estados Democráticos, aos agentes políticos investidos pelo voto popular; sua missão seria a de garantir a lisura dos procedimentos pelos quais a democracia se realiza. Um controle, enfim, centrado apenas nas condições de formulação do ato legislativo (input), desprovido de qualquer pretensão de alcançar o seu resultado substantivo (outcome). Para Ely, “apenas uma teoria que enxergue o controle de constitucionalidade atribuindo aos tribunais, como um reforço da democracia, e não como um guardião superior que arbitra quais resultados devem e quais não
A legitimidade seria uma condição da força normativa do direito, transferindo o problema da realização dos direitos, que possui cerne positivista, para se tornar um problema de legitimação. Para isso, Habermas propõe um novo paradigma para o direito, denominado “procedimentalismo”, no qual o direito gerado através do discurso democrático (no qual aquele que se submete à norma pode reconhecê-la como um seu coautor) pode atuar sobre a sociedade, de maneira a diminuir as tensões sociais que percebemos hoje.
27 Cf. GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. São Paulo: Landy, 2004; BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco. A interpretação jurídica no estado democrático de direito: contribuição a partir da teoria do discurso de Jürgen Habermas. In: CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo (Coord.). Jurisdição e hermenêutica constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004. p. 301-357. 28 BINENBOLN, Gustavo. A nova jurisdição constitucional brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 102.
Portanto, Jürgen Habermas30 atribui um papel central à linguagem no processo de formação da opinião e da vontade dos cidadãos. Sua teoria se desenvolve no interior de um Estado Democrático de Direito que pressupõe a existência de um espaço 29 SIMIONI, Rafael Lazzarotto. Direito e racionalidade comunicativa: a teoria discursiva do direito no pensamento de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá, 2007. p. 12-13. 30 “Essa legitimidade democrática, na modernidade, cabe esclarecer, remete-se ao chamado vínculo ou coesão interna entre Estado de Direito e Democracia, de que nos fala Habermas, fundamentalmente a partir do Direito e Democracia: entre faticidade e validade.” (OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de. Direito, política e filosofia: contribuições para uma teoria discursiva da constituição democrática no marco do patriotismo constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 5)
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devem ser admitidos, será compatível com a própria democracia”.28
Segundo Rafael Lazzarotto Simioni29, na teoria de Habermas, a normatividade do direito é fruto da legitimidade, e os problemas de eficácia do direito, ou seja, da própria realização do direito, estariam atrelados à questão da legitimidade. Nesse sentido, sendo os cidadãos ao mesmo tempo destinatários e autores do direito, passariam a assumir a responsabilidade individual pelo seu cumprimento.
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público não restrito ao âmbito estatal, de uma comunidade de homens livres e iguais capazes de criar as leis que os regem e onde os próprios envolvidos têm de entrar em acordo, prevalecendo a força do melhor argumento. Habermas apresenta a democracia como o núcleo de um sistema de direitos fundamentais, havendo a institucionalização democrática dos direitos, em que os cidadãos aparecem não somente como destinatários das leis, mas também, consoante Rousseau, como seus autores. Portanto, como destinatários e autores do seu próprio Direito, os cidadãos devem poder participar e ter voz ativa nos processos de interpretação constitucional. Nesse passo, Habermas tenta equilibrar e compatibilizar a soberania popular e os direitos humanos aos direitos econômicos e sociais básicos, essenciais à dignidade humana, constituinte do chamado mínimo existencial.
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Adaptando a teoria habermasiana ao processo, o princípio da democracia proporcionaria a abertura de um campo de discussões na quais abrangeria vários tipos de discursos, sejam morais, éticos, pragmáticos, incluindo as negociações, de maneira a modelar as normas jurídicas. Portanto, o princípio da democracia fixa os parâmetros e legitima a produção do próprio direito.
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A jurisdição, portanto, não pode desenvolver o direito por uma interpretação construtiva desconectada do poder comunicativo. O poder comunicativo, que é a única fonte de legitimação do Estado de Direito, só se exerce argumentativamente através de um procedimento institucionalizado com base no princípio do discurso, vale dizer, só se exerce nas condições ideais de uma discussão pública com a participação de todos os implicados. Por isso, nem um órgão colegiado e muito menos um juízo monocrático pode pretender interpretar construtivamente o direito. O poder jurisdicional não é hierarquicamente superior ao poder comunicativo. A jurisdição não pode, portanto, submeter a si o poder comunicativo, porque ele é a fonte de toda legitimação do direito e do Estado de Direito. Até porque a legislação implícita, criada pela jurisdição, coloca em risco a racionalidade, o exercício do direito e sobrecarrega a
base de legitimação do Poder Judiciário. Por mais conhecimentos técnicos e experiência que os especialistas do direito possuam, as decisões jurídicas provocam consequência para sociedade, que não podem ser legitimadas por discursos técnicos de especialistas na interpretação do direito: a interpretação da Constituição e dos objetivos das políticas públicas não é monopólio da jurisdição. Como se vê, na teoria do discurso de Habermas, o poder jurisdicional sofre restrições. Porque no paradigma procedimentalista do direito, a jurisdição está subordinada ao poder comunicativo da autonomia política dos cidadãos. E é exatamente as condições para o exercício dessa autonomia política, como gênese do processo democrático, que a jurisdição tem que proteger.31
Mister o uso do espaço discursivo instaurado pelo processo, ou seja, um espaço público para a problematização e a formação de todos os provimentos, ou seja, a comparticipação das partes. A ampliação do contraditório, na verdade, constituiria uma garantia ao princípio da não surpresa32, pois impõe o debate acerca de todas as questões envolvidas no processo antes da tomada de decisão pelo juiz. Ao se fazer uma releitura da teoria do processo a partir da teoria habermasiana, vislumbra-se que o processo estruturado em perspectiva comparticipativa e policêntrica, ancorado nos princípios processuais constitucionais, impõe um espaço público no qual se apresentam as condições comunicativas para que todos os envolvidos, assumindo a responsabilidade de seu papel, participem na formação de provimentos 31 SIMIONI, Rafael Lazzarotto. Direito e racionalidade comunicativa: a teoria discursiva do direito no pensamento de Jürgen Habermas. Curitiba: Juruá, 2007. p. 212/213. 32 “Garante-se, desse modo, a cada afetado a exposição de razões relevantes para determinação do tema a ser debatido e julgado endoprocessualmente, dentro de uma linha temporal, de uma fixação adequada do objeto de discussão e de uma distribuição dos papéis a serem desenvolvidos, em um espaço público processual moldado pelos princípios do modelo constitucional de processo, notadamente o contraditório como garantia da influência e de não surpresa.” (NUNES, Dierle José Coelho. Teoria do processo contemporâneo. Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas, Edição Especial, 2008, p. 27)
Para Habermas34, “essa legitimidade democrática, na modernidade, remete-se ao chamado vínculo ou coesão interna entre Estado de Direito e Democracia, de que nos fala Habermas, fundamentalmente a partir do Direito e democracia: entre facticidade e validade”. O espaço público, para que haja a comparticipação e a discussão de maneira democrática, é o processo. A implementação dinâmica dos princípios fundamentais do processo mediante a estruturação técnica adequada permitirá uma democratização do processo sem preocupações com o esvaziamento do papel diretor do juiz e do papel contributivo das partes na formação das decisões.35
Essa releitura processual se coaduna com o paradigma do Estado Democrático de Direito na qual se busca a prevalência da soberania popular em todos os campos. O Professor Dierle José Coelho Nunes apresenta um modelo de como seria a comparticipação na construção do provimento jurisdicional, na qual haveria um procedimento bifásico: a primeira fase seria preparatória e a segunda fase seria de discussão.
protagonismo (das partes ou do juiz), mediante a depuração de todos os elementos fáticos e jurídicos colocados pelas partes, advogados, promotores e juízes. Tal fase poderia ser realizada mediante a prévia troca de petições (um arrazoado para cada parte) e a fixação de uma audiência preliminar de debate e de discussão obrigatória de todos os pontos controvertidos, de fato e de direito, de modo que todos os sujeitos processuais estariam prontos (se desejassem estar) e saberiam todos os argumentos relevantes a serem discutidos na segunda fase, quando ocorreria a segunda audiência de colheita de provas e de discussão dos pontos principais. Na excepcional hipótese de surgimento de novos fatos e argumentos jurídicos no curso da segunda audiência, deveria ser garantida a discussão em contraditório com sua implementação plena. Com a ampla suscitação das dúvidas, normas, fatos, súmulas e entendimentos jurisprudenciais potencialmente aplicáveis na espécie (sem nenhuma utilização estratégica pelo juiz da coação neoliberal de prejulgamento, que poderia gerar acordos prejudiciais às partes mais débeis ou, mesmo, inexequíveis), ocorria uma preparação do thema probandum e da discussão, reduzindo a quase zero a potencialidade de decisões de surpresa.36
A percepção democrática do direito visa a que todos os interessados possam influenciar na formação das decisões, refutando, portanto, a possibilidade de decisões solipsistas dos Magistrados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desse modo, a cognição bifásica que assegure uma fase preparatória adequada poderia servir de modelo para um procedimento que atendesse aos anseios comparticipativos da democratização processual se essa primeira fase fosse utilizada como locus de fomento do debate por todos os sujeitos processuais, sem qualquer pressuposição de
Por fim, percebe-se a necessidade do afastamento do decisionismo do julgador na tomada de decisões para que sejam abertos espaços alternativos que proporcionem a discussão, a comparticipação das partes na produção do provimento jurisdicional, dentro de uma fase discursiva em meio ao próprio processo.
33 Ibidem, p. 211. 34 OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de. Direito, política e filosofia: contribuições para uma teoria discursiva da constituição democrática no marco do patriotismo constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2007. p. 5. 35 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 197.
Conforme analisado, as decisões judiciais devem ser pautadas sobre argumentos de direito e oriundas da participação simé36 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. p. 243/244.
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legítimos que permitirá a clarificação discursiva das questões fáticas e jurídicas. (Habermas, 1994, p. 270)33
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trica dos envolvidos, e não sobre questões religiosas, políticas, científicas, etc. Sendo assim, é necessária a complementação das decisões com outros sistemas ou institutos, porém não a substituição pelo julgador de argumentos jurídicos por argumentos científicos, tecnológicos, religiosos, fora do âmbito do direito. Ademais, nenhum julgador deve proferir qualquer decisão utilizando argumentos não debatidos pelas partes em contraditório, diante da necessidade da participação simetricamente igual dos interessados na construção do provimento, de forma que os cidadãos interessados se sintam mais próximos da Justiça, afastando, portanto, a ideia de que o juiz é o único portador da cognição para a elaboração das decisões judiciais. Um processo constitucional democrático permitirá que o cidadão seja autodestinatário dos provimentos, seja no âmbito legislativo, administrativo e judicial, tendo que vista que a decisão não será apenas a expressão da vontade de maneira solitária pelo decisor, mas sim construída e discutida pelas partes endoprocessualmente.
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REFERÊNCIAS
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Doutrina
Fraudes Fiscais e Contábeis Relacionadas ao ISS – Imposto sobre Serviços LUCIANO CHAHIN MARAGNO
Formado em Administração de Empresas pelo Centro Universitário de Santo André. Profissionalmente, foi Fiscal de Rendas no Município de Santo André/SP e Auditor do Tribunal de Contas no Estado da Paraíba. Atualmente, ocupa o cargo de Auditor Fiscal Tributário na Cidade de São Paulo, atuando diretamente com fiscalização de ISS – Imposto sobre Serviços.
RESUMO: A arrecadação municipal do Imposto sobre Serviços cresceu demasiadamente na última década, impulsionada principalmente pelo crescimento econômico nacional das empresas do setor terciário – o setor de serviços. Aumentou também a capacidade da administração tributária acompanhar e fiscalizar esse crescimento. Contudo, o maior implemento ainda se dera em uma velocidade muito maior que esses outros, devido à criatividade do empresariado nacional, no que diz respeito à utilização de práticas contábeis um pouco duvidosas – contabilidade criativa fraudulenta –, objetivando, na maioria dos casos, a economia tributária ilegal, muitas vezes acompanhada de uma sonegação fiscal de ISS, impactando na arrecadação tributária de ISS das grandes metrópoles, que poderia alcançar um patamar muito maior em relação ao atual cenário, propiciando, assim, melhor efetividade de serviços essenciais colocados à disposição da sociedade pela Administração Pública.
PALAVRAS-CHAVE: Imposto sobre Serviços; arrecadação municipal; crescimento do setor terciário; contabilidade criativa fraudulenta; economia tributária ilegal; sonegação fiscal de ISS.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Principais fraudes contábeis e fiscais e seus objetivos pretendidos; 1.1 Trânsitos de receitas de serviços prestados apenas por contas patrimoniais, não passando por contas de resultado; 1.2 Receitas de serviços prestados lançadas com saldo devedor e com nomenclatura não convencional no livro razão e DRE; 1.3 Simulação contábil de estabelecimento prestador de serviços em pequeno município satélite à capital e que forneça incentivos fiscais, quase sempre ilegais; 1.4 Dupla contabilidade, ou contabilidade paralela; 1.5 Reembolsos de despesas transformados em aumento de capital social; 1.6 Cancelamento de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) posterior à efetiva ocorrência da prestação de serviços; 2 Implemento na arrecadação do Imposto sobre Serviços – ISS; Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO O presente trabalho versará sobre fraudes fiscais e contábeis relacionadas ao ISS – principal tributo administrado atualmente pela Secretaria de Finanças da Cidade de São Paulo –, haja vista o avanço ocorrido nos últimos anos no setor terciário da economia nas grandes metrópoles – o setor de serviços. Objetiva, portanto, apresentar ao leitor as principais condutas fiscais fraudulentas acompanhadas quase sempre de uma contabilidade maquiada (criativa) que, muitas vezes, propicia ao agente executor uma grande, mas desonesta, economia tributária, prejudicando, assim, o ingresso de receitas derivadas (tributárias) junto aos cofres públicos municipais.
Inicialmente, serão apresentadas algumas práticas contábeis, usualmente utilizadas para adequar dados e fatos empresariais a contento dos usuários e controladores, mas que acabam por distorcer a situação econômico-financeira da entidade aos mais diversos interesses – pois na realidade acabam tornando-se fraudes contábeis e fiscais, objetivando, conforme antes exposto, uma economia tributária questionável. Sequencialmente, ainda, será exposto o cenário de expansão que se encontra a arrecadação do Imposto sobre Serviços juntos aos Municípios, ultrapassando, em muitos casos, inclusive a receita oriunda da exação do IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano. E, finalmente, a conclusão será apresentada por meio de sugestões de implemento e aprimoramento da arrecadação tributária, com ênfase na importância da participação de sociedade consumidora de serviços como um todo, que muitas vezes negligencia, até sem intenção, o cumprimento de sua obrigação e dever, como cidadão, de coibir, não participar, tampouco incentivar condutas típicas de sonegação fiscal.
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1 PRINCIPAIS FRAUDES CONTÁBEIS E FISCAIS E SEUS OBJETIVOS PRETENDIDOS
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Os objetivos de utilização de condutas fiscais e contábeis fraudulentas podem ser dos mais variados, tais como: obtenção de empréstimos ou créditos perante governo ou instituições financeiras; fluxo de caixa e demonstração de resultado de exercício positivo para acionistas, partes beneficiárias, debenturistas, controladores e empregados; credibilidade e posicionamento consolidado, junto ao mercado e, diretamente ligada ao nosso propósito até aqui transcrito, propiciar economia fiscal à entidade, traduzida muitas vezes na depreciação da imagem
da empresa perante órgãos públicos e setores de controle da economia. Conforme nos ensinam Ariovaldo dos Santos, Professor Doutor do Departamento de Contabilidade e Atuária – FEA/USP e Ivan Ricardo Guevara Grateron, Professor da Universidad Centroccidental Lisandro Alvarado/UCLA – Barquisimeto/Venezuela1: Esta situação, em muitos casos, tem obrigado os gestores da entidade a introduzir modificações, muitas vezes por via de artifícios nos registros contábeis, que são avalizadas nos pareceres de auditores independentes. De forma geral, os usuários entendem os pareceres dos auditores como um plus, ou valor agregado, de qualidade à informação e tomam o nome do auditor como um símbolo de credibilidade, confiança e segurança. De alguns anos para cá, os resultados dos trabalhos das auditorias independentes ultrapassaram os interesses específicos dos administradores das entidades auditadas. As próprias leis e normas que requerem esses serviços citam outros interessados indiretos. Em outras palavras, todos aqueles que, de alguma forma, tenham qualquer tipo de relação com a entidade auditada terão interesse na opinião dos auditores e nela basearão suas decisões. Muitos são os fatores que favorecem o exercício da criatividade contábil, mas talvez o maior dos incentivos seja a impunidade, em todos os sentidos (jurídico, social, mercantil, etc.) do mani-
1 SANTOS, Ariovaldo; GRATERON, Ivan Ricardi Guevara. Contabilidade criativa e responsabilidade dos auditores. Revista Contabilidade & Finanças – USP, São Paulo, n. 32, p. 7-22, maio/ago. 2003.
pulador da informação. Os auditores citam as seguintes causas como origem da contabilidade criativa:
ser consideradas fraudulentas perante a legislação tributária e contábil.
a) Características dos princípios e normas contábeis:
Abaixo, verificamos um quadro resumo elaborado por Claudio Marcelo Rodrigues Cordeiro2, com base em estudos do Doutor em contabilidade Juan Monterrey Mayoral, em que são apresentados, com maior clareza, alguns objetivos almejados pela entidade quando da utilização da contabilidade criativa:
• flexibilidade, arbitrariedade e subjetividade na aplicação; • diferentes, porém válidas, interpretações dos princípios e normas contábeis; • conceito-base de imagem fidedigna pouco claro ou indeterminado; e • cuidados da Administração na aplicação de princípios como prudência, confrontação de receitas e despesas e uniformidade. b) Características sociais e de comportamento humano: • valores éticos e culturais; e • atitude do administrador diante da fraude. Como se pode observar, para a prática da contabilidade criativa, o gerente utiliza, principalmente, a flexibilidade dos princípios e normas contábeis a que a empresa se obriga. Ou seja, pelo texto supracitado, verificamos que a existência da flexibilidade da legislação contábil, somada a características e valores éticos do comportamento humano, contribui para que seja extrapolada a singela linha que separa a contabilidade criativa da fraude contábil, ou engenharia contábil criminosa. Diversos podem ser os objetivos almejados pela utilização da contabilidade criativa, contudo ratificando o foco do nosso estudo sobre o ISS, destacaremos, ao final desse tópico, as principais condutas contábeis e fiscais que efetivamente podem
Objetivos perseguidos
Incentivos para a empresa
Pressão da comunidade investidora para que a empresa se encontre em uma situação ideal. Exigência de responder adequadamente às expectativas Melhorar a do mercado geradas por prognósticos favoráveis. imagem apreInteresses em determinadas políticas de dividendos. sentada Desejo de obter recursos externos. Necessidade de procurar “parceiros” para absorção da empresa. Sistema de remuneração vinculado aos lucros. Existência de uma clara preferência externa por comportamentos regulares. Estabilizar a Efeito positivo da estabilidade na situação da empresa, imagem no com reflexo positivo na cotação das ações. decorrer dos Benefícios nas políticas de dividendos em razão de gaanos nhos menos oscilantes. Preferência externa por perfis de riscos reduzidos. Preferência por pagar poucos impostos. Interesse em distribuir baixos níveis de resultados. Existência de possibilidade de atribuir êxitos em anos posteriores. Debilitar a imagem de- Sistemas de remunerações que se baseiam em aumentos monstrada salariais vinculados às melhoras conseguidas. Dependências de tarifas máximas prescritas pelo Estado. Interesse na obtenção de subvenções condicionadas à situação que atravessa a empresa.
2 CORDEIRO, Cláudio Marcelo Rodrigues. Contabilidade criativa: um estudo sobre a sua caracterização. Disponível em: <http://www.crcpr.org.br/ publicacoes/downloads/revista136/contabilidade_criativa.htm>. Acesso em: 2 jun. 2011.
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• existência de múltiplas estimativas;
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Atenta-se que um dos objetivos perseguidos por toda gama de empresas contribuintes de ISS por meio da utilização da contabilidade criativa, foco do nosso estudo no momento, é o pagamento de menos impostos, conforme anteriormente destacado por Cordeiro. Contudo, para o implemento de tal objetivo, conforme já ressaltado, a entidade, muitas vezes, por ignorância, má orientação ou intencionalmente mesmo, se utiliza de condutas fiscais e contábeis impróprias ou ilegais, afrontando com aviltância a legislação tributária, contábil e até penal, tentando, muitas vezes, transmitir uma imagem debilitada e fraca da empresa, maquiando fraudulentamente seus reais dados contábeis e fiscais.
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Ou seja, almejando propiciar economia fiscal à entidade, traduzida em uma fracassada tentativa de elisão fiscal (balizamento da lei fiscal, conduta não fraudulenta, conhecida como planejamento tributário), por meio de uma contabilidade criativa (earnings management ou manuseio de resultados), profissionais e empresas acabam praticando, por meio da engenharia contábil e fiscal fraudulentas, a tão conhecida conduta da evasão de divisas, tipificada como crime de evasão de divisas e sonegação fiscal – lei de crimes contra a ordem tributária – art. 1º, Lei nº 8.137/1990 e alterações.
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Atentamos aqui para a conceituação e, consequentemente, distinção entre as condutas denominadas por fraude e erro. O erro contábil, ou fiscal, caracteriza-se por um ato praticado com negligência, imperícia ou imprudência do seu autor, quando da elaboração, ou execução, de registro de atos, ou fatos contábeis/fiscais. Ou seja, não há, por parte do agente, a intenção em ludibriar ou enganar possíveis usuários de tais informações. Diferentemente é a fraude contábil, ou fiscal, em que fica evidente a intenção do autor em cometer tal conduta, objetivando, no caso em tela, a economia tributária, manipulando atos, ou fatos contábeis/fiscais, de modo a distorcer ou suprimir informações relevantes da apreciação do Fisco. Nesse caso, quando o
Fisco detecta a prática de condutas fiscais fraudulentas deve, sob pena de responsabilidade solidária, além da aplicação de penalidade pecuniária de 100% do imposto devido e sonegado (art. 14 da Lei Municipal nº 13.476/2002, com redação dada pela Lei nº 13.701/2003 e alterações), providenciar a representação de provável conduta criminosa – sonegação fiscal –, por parte do sujeito passivo, tipificada no art. 1º, Lei nº 8.137/1990 e alterações. Na realidade, segundo a supracitada conduta, algumas vezes nos deparamos com entidades que possuem dupla contabilidade: uma gerencial, na qual se encontram discriminados o real resultado da entidade, suas despesas, custos e receitas efetivas, segregadas por unidade econômica de negócios, tantas quantas a entidade possuir e quase nunca disponibilizadas ao crivo da fiscalização; e outra oficial, que na maioria das vezes demonstra a realidade econômico-financeira da entidade como um todo – centralizada pela matriz –, observando, contudo, de maneira macro, as normas contábeis e princípios fundamentais de contabilidade comumente aceitos na atualidade (IFRS), haja vista que a segregação da escrituração contábil, por centro de custos, por unidade de negócio/filial é uma opção dada à entidade e não uma imposição, conforme se verifica na NBCT 2.6 – Da Escrituração Contábil das Filiais. Contudo, as informações de faturamento, despesas, custos, abatimentos e descontos, por exemplo, podem se encontrar apresentadas de maneira destorcida ou fraudulenta, por meio de diversas condutas que serão expostas mais adiante, a fim de propiciar economia fiscal à entidade. E o Fisco? Onde entra nessa história? Ressaltamos aqui a importância da carreira típica de Estado, de Auditor Fiscal, sem a qual, muitas vezes, passaria despercebida uma conduta fiscal, ou contábil, imprópria e fraudulenta.
A seguir, apresentaremos mais algumas das principais transações contábeis “criativas”, segundo a visão dos Professores Oriol Amat Salas, John Blake e Soledad Moya Gutiérrez3, que certamente podem influenciar e repercutir tributariamente, minimizando erroneamente a carga a ser paga por entidades que dela se utilizam, deflagrando, na maioria dos casos, a conduta fiscal fraudulenta – sonegação fiscal. São elas: Aumento ou redução de despesas – As normas contábeis facilitam manobras como, por exemplo, a elasticidade no prazo de amortizações do ativo intangível e nas depreciações de bens do imobilizado de uso. A empresa, alterando o prazo da depreciação, provoca, em conseqüência, alterações nas despesas do período. 3 SALAS, O. A. Blake; GUTIÉRREZ, S. M. La contabilidad creativa en España y en el Reino Unido: un estudio comparativo. Disponível em: <http://www. econ.upf.edu/docs/papers/downloads/181.pdf>. Acesso em: 6 jun. 2011.
Aumento ou redução das receitas – É possível antecipar ou diferir o reconhecimento de receitas com o argumento da convenção do conservadorismo (prudência) e do princípio da confrontação das despesas com as receitas (competência). Aumento ou redução de ativos – As manipulações descritas no primeiro item impactam o valor dos ativos. Outro exemplo seria a alternância de métodos válidos para se avaliar os estoques. Aumento ou redução do patrimônio líquido – Todos os exemplos anteriores têm reflexos no patrimônio líquido da empresa, afetando de forma direta os índices de endividamento, estrutura patrimonial e de lucratividade, podendo levar os usuários a decisões equivocadas, não apenas sobre o capital próprio, mas também em relação ao valor da empresa como um todo. Aumento ou redução do passivo – As empresas podem valer-se de artifícios para, aparentemente, reduzir seu endividamento. Reclassificação de ativos e passivos– Existem divergências de onde classificar os gastos com certos bens. Informação contida no relatório da Administração ou no parecer dos auditores – A inclusão ou não de informações pode conduzir o usuário a conclusões equivocadas sobre o passado e as expectativas para o futuro do empreendimento.
As transações contábeis fraudulentas supracitadas demonstram, de maneira genérica e, ao mesmo tempo, abrangente, o princípio de utilização da chamada “maquiagem contábil”, com busca a fins e objetivos diversos pela entidade – aumentar lucro, inflar ativos, etc. Contudo, a partir dessas informações, iremos segmentar as fraudes contábeis, que objetivam a economia fiscal, ou melhor, sonegação fiscal especificamente relacionada ao Imposto sobre Serviços – ISS. Entre as principais fraudes contábeis relacionadas à economia fiscal, que acabam se deflagrando em fraudes fiscais e, consequentemente, crimes contra a ordem tributária, podemos destacar, além das supracitadas.
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O Fisco, no cumprimento de seu ofício, efetuando diligências a supostos estabelecimentos de contribuintes, que poderá dizer, por exemplo, se um Balanço Patrimonial ou uma DRE, apesar de observarem, no geral, as normas contábeis e os princípios fundamentais de contabilidade comumente aceitos, refletem, ou não, a situação dos bens, direitos, faturamento, despesas e custos observados de fato, in loco, durante a execução do procedimento de fiscalização conhecido como diligência. É a percepção de indícios, pela autoridade fiscal, dos sinais exteriores de riqueza e de caracterização de estabelecimento prestador de serviços, detectados durante as diligências e confrontados com as demonstrações contábeis, ou fiscais da entidade e sua respectiva documentação suporte comprobatória, que fornecerá informação suficiente e necessária ao agente fazendário para análise da situação tributária verídica do contribuinte e emissão de juízo.
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1.1 Trânsitos de receitas de serviços prestados apenas por contas patrimoniais, não passando por contas de resultado
1.2 Receitas de serviços prestados lançadas com saldo devedor e com nomenclatura não convencional no livro razão e DRE
Débito: Ativo circulante (disponibilidades/bancos) Crédito: Passivo circulante (empréstimos com bancos ou terceiros/financiamentos)
Muitas entidades utilizam-se da prática de lançamento incorreto de receitas de prestação de serviços, como reembolso de despesas, classificando tal rubrica com saldo devedor, como se despesa o fosse, observado, aqui, o regime de competência.
Ou seja, a receita é incluída no balanço patrimonial, diretamente no ativo circulante, sem transitar pela demonstração de resultados do exercício. A contrapartida é um crédito fictício (obrigação) no passivo circulante. Conforme ocorre a quitação, por exemplo, do supracitado empréstimo fictício, ocorre a saída do ativo do dinheiro recebido (regime de caixa – crédito ativo) e, em contrapartida, diminui-se a obrigação a pagar (regime de caixa – débito passivo). Assim sendo, observa-se a saída contábil, formalmente correta (não se considerando os juros passivos sobre o empréstimo), da soma em dinheiro que se deseja sonegar à tributação.
A contrapartida da referida impropriedade contábil normalmente é um lançamento a crédito em alguma conta do grupo passivo circulante, por exemplo, contas a pagar, como se a entidade estivesse registrando uma obrigação a vencer. Essa partida dobrada, por si só, já representa uma grave impropriedade contábil, de difícil detecção quando da análise macro contábil da entidade, uma vez que quem recebera tal receita fora a própria empresa. Nessa situação, observa-se que o montante monetário não oferecido à tributação pela entidade (receita de reembolso), obviamente, além de não transitar pelas contas patrimoniais do ativo circulante (disponibilidades), diminui o lucro líquido e o faturamento da entidade, aqui então passando a impactar diretamente no montante oferecido à tributação pelo ISS.
Detecção: Verificar a contumaz obtenção de empréstimos pela entidade e suas respectivas quitações; solicitar documentação-suporte, tais como cópias dos contratos de empréstimo firmados entre as partes, bem como notas promissórias e/ou termo de confissão de dívidas da entidade requisitante; confrontar o fluxo mensal ou trimestral (balancetes) de ingresso e desembolso efetivo de dinheiro para cobrir custos e despesas correntes da entidade, ou se há investimentos nesta (atentar para novo tratamento contábil do ativo diferido), para detectar a real necessidade de capital de giro, e justificar a constante aquisição de empréstimos.
Detecção: É possível detectar essa fraude contábil questionando-se a natureza daquele reembolso de despesas; quem de fato está sendo reembolsado: a entidade ou seu fornecedor? Observar, também, com atenção o grupo das contas a pagar, que, nesse tipo de conduta, encontra-se demasiadamente inflado, haja vista a enorme quantidade de reembolsos “obrigacionais” adquiridos pela entidade, sem o consequente adimplemento da obrigação. Esse tipo de impropriedade contábil pode, ainda, levar a um estouro de caixa dissimulado, haja vista a saída de dinheiro efetivo do caixa, quando da tentativa de quitação das obrigações (reembolsos a pagar), outrora adquiridos. Assim sendo, percebemos que essa prática é utilizada principalmente
1.3 Simulação contábil de estabelecimento prestador de serviços em pequeno Município satélite à capital e que forneça incentivos fiscais, quase sempre ilegais Inicialmente, teceremos um breve comentário sobre as consequências oriundas de uma equivocada eleição, pelas entidades empresariais, do real estabelecimento prestador de serviços, deflagrando, assim, em alguns casos, em uma conduta fraudulenta conhecida como simulação de estabelecimento prestador de serviços. A simulação de estabelecimento prestador de serviços pode ocorrer, por exemplo, quando uma entidade possui contabilidade centralizada em sua matriz fictícia, localizada em Município que propicie incentivos fiscais irregulares (por exemplo, alíquota efetiva de ISS inferior a 2%, mediante redução da base de cálculo, chegando a 0,35% em alguns casos), enquanto que a unidade de negócio efetivamente produtiva, aonde de fato ocorre toda a regra matriz de exação de ISS, encontra-se localizada em um Município vizinho, normalmente uma metrópole. Observe que a entidade até pode possuir uma unidade administrativa em um Município dito “paraíso fiscal”, contudo, a mesma não pode apropriar a esta, ao seu bel prazer, o custo dos serviços prestados, bem como a totalidade de sua receita auferida, haja vista tratar-se, na maioria das vezes, de um mero depósito documental, administrativo ou contábil da empresa, sem condições, portanto, de propiciar a efetiva prestação de serviços, objeto da entidade empresarial.
Detecção: É possível a detecção firmando-se convênios com o Fisco Federal e Estadual, por meio dos quais se consegue obter diversas informações sobre a empresa, filiais, sócios, outras empresas dos sócios, alterações de endereço, etc. Outra maneira de coibir tal conduta, que vem sendo adotada por algumas grandes metrópoles, é a criação de um Cadastro de Prestadores de Serviços de Outros Municípios – CPOM – no qual empresas prestadoras de determinados serviços, estabelecidas em Municípios circunvizinhos às capitais, quando da prestação de serviços para clientes estabelecidos na metrópole, devem promover sua inscrição municipal também nessa última (CPOM), comprovando seu efetivo funcionamento de estabelecimento prestador (por meio de fotografia, despesas e custos, etc.) naquele Município satélite ao grande centro. No ano de 2006, quando da criação do CPOM na Cidade de São Paulo, segundo matéria publicada no Diário do Comércio e reproduzida pelo site da Associação Paulista de Estudos Tributários, em 01.09.20064, a capital contou com um acréscimo de R$ 800 milhões, ou 25%, na receita anual de Imposto sobre Serviços (ISS) depois de iniciada uma batalha judicial contra a guerra fiscal adotada por Municípios da região metropolitana – haja vista o questionamento judicial do CPOM por diversas entidades e até mesmo por Municípios circunvizinhos à metrópole. Ainda segundo a matéria, até a data de publicação do artigo pela Associação Paulista de Estudos Tributários – APET, a Secretaria de Finanças da Capital Paulista já havia cadastrado 34,7 mil empresas com sede em outros Municípios ou Estados que atuam na cidade. A Administração rejeitara, contudo, o pedido de cadastramento de 2.202 empresas que, por apresentação de 4 São Paulo combate sonegação de ISS. Diário do Comércio. Disponível em: <http://www.apet.org.br/noticias/ver.asp?not_id=3345>. Acesso em: 6 jun. 2011.
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por entidades que possuem um fluxo de caixa alto, ou seja, com excesso de disponibilidades, dada a desproporcionalidade de saídas do caixa.
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documentação incompleta (comprovantes de estabelecimento de fato – luz, condomínio, aluguel, despesas com pessoal, etc.) ou mesmo má-fé, não conseguiram comprovar a existência de estabelecimento prestador fora da Cidade de São Paulo.
desta maneira, o não oferecimento do real faturamento da empresa à tributação pelo ISS, consumando-se, assim, a ocorrência da fraude contábil, deflagradora da fraude fiscal almejada pela entidade (economia tributária).
1.4 Dupla contabilidade, ou contabilidade paralela
1.5 Reembolsos de despesas transformados em aumento de capital social
Normalmente, observaremos esse tipo de fraude contábil em empresas pequenas e/ou familiares, nas quais a venda de serviços ocorre sem emissão de documentos fiscais para acobertar a prestação por acordo ou conluio entre as partes.
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Mas por que isso acontece principalmente em pequenas empresas? A resposta é simples: pois não há segregação de funções e o proprietário normalmente que negocia e recebe em carteira (cheques ou dinheiro). Em empresas grandes, a não emissão de notas fiscais envolveria obrigatoriamente terceiros (financeiro) e poderia, consequentemente, acarretar em roubos e desvios dentro da entidade – controle. Outro ponto negativo: obrigatoriamente, funcionários seriam envolvidos – a entidade ficaria vulnerável, a mercê destes (vontades, ameaças, denúncias, etc.).
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Observa-se, no caso dessa dupla contabilidade, que grande parte das despesas da entidade sonegadora não estará contabilmente escriturada (mesmo que em livro caixa) e, assim sendo, um bom sistema de informações fiscal da municipalidade poderia detectar tal ausência: declarações eletrônicas de serviços prestados e tomados pelos contribuintes. Outra maneira de detecção: circularização com os principais fornecedores da entidade, objeto de procedimento de fiscalização, com objetivo de obtenção de todas as faturas emitidas contra a mesma em determinado período. Com essas medidas (lançando-se, a posteriori, todas as despesas e gastos não contabilizados), fatalmente seria detectado pela auditoria fiscal um estouro de caixa dissimulado, provando-se,
Como já é do nosso conhecimento, o reembolso de despesas empresas trata-se, na verdade, para fins tributários de ISS, de uma receita do prestador dos serviços, haja vista que a base de cálculo desse tributo é o preço total do serviço, conforme nos mostra o art. 9º do Decreto nº 406/1968, com posterior alteração pelo art. 7º da Lei Complementar nº 116/2003, não sendo admitida, em regra, qualquer dedução desse montante, salvo as exceções previstas na lista de serviços, anexa aos supracitados diplomas legais. Esse assunto e o entendimento apresentado encontram-se pacificados, inclusive pelos Tribunais do País. Contudo, holdings (pessoas jurídicas que controlam outras do mesmo grupo) utilizam-se de um artifício um tanto quanto criativo, contabilmente falando: forjam por meio de um aumento de capital social (debita-se bancos/caixa e credita-se capital social) o ingresso desse reembolso de despesas na controlada, esquivando-se do pagamento de ISS. Ou seja, a receita recebida pela controlada para prestar serviços à controladora, antes chamado de reembolso de despesas e normalmente tributável mensalmente (pacificado inclusive), passou a ser caracterizado como “aumento simulado do capital social”. É possível detectar tal fraude por meio do princípio contábil da continuidade, quando da análise da origem da receita da entidade controlada, que deixa de receber o reembolso mensal de despesas da controladora e passa a receber um grande aumento de capital social, uma vez por ano, coincidentemente em valor
1.6 Cancelamento de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) posterior à efetiva ocorrência da prestação de serviços Tal prática, apesar de não ser uma fraude contábil propriamente dita, mas sim uma fraude fiscal, ocorre necessariamente quando o tomador dos serviços encontra-se localizado fora do território municipal do prestador, sendo o serviço passível de recolhimento no local da sede do estabelecimento prestador (regra geral do local de incidência, art. 3º da Lei Complementar nº 116/2003). O prestador efetuou a emissão de uma NF-e, enviou ao tomador dos serviços, localizado em outro Município e, posteriormente, efetuou o cancelamento dessa NF-e, antes do vencimento do ISS deflagrado por esta – essa operação fica registrada no sistema de gerenciamento eletrônico da municipalidade e o status da referida NF-e apresenta ela como “cancelada”. Nessa circunstância, o Fisco municipal no qual se encontra o prestador de serviços não tem acesso aos dados, eletronicamente, se o tomador recebeu ou não tal NF-e, ou melhor, se realmente o serviço acobertado por esta ocorrera de fato ou não, haja vista que, nesse caso, o potencial tomador dos referidos serviços encontra-se em outro Município, sob tutela e jurisdição de outro Fisco municipal, consequentemente atendendo suas exigências eletrônicas locais. Observe que não há como cruzar eletronicamente tais dados e informações entre Municípios, possibilidade esta apenas quando os dados são intramunicipais (prestador e tomador sob a mesma tutela), ou haja convênio entre distintos Municípios. A detecção desse tipo de fraude pode ser apurada por meio do procedimento fiscal de circularização de informações ele-
trônicas com os referidos tomadores de tais serviços, objeto do cancelamento, para constatar se os mesmos tomaram ou não a empreitada.
2 IMPLEMENTO NA ARRECADAÇÃO DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS – ISS Conforme inicialmente enfatizado, nos últimos dez anos a arrecadação de ISS em muito aumentou nos Municípios brasileiros, por conta do crescimento do setor terciário – o de serviços –, somando-se, ainda, à modernização de instrumentos tecnológicos de auditoria fiscal – ferramentas de auditoria digital –, bem como uma melhor capacidade técnica do Fisco na detecção das fraudes fiscais e contábeis apresentadas neste artigo e relacionadas ao Imposto sobre Serviços, tudo isso, conjuntamente, possibilitando um melhor acompanhamento desse aumento econômico no setor de serviços e seu consequente implemento de arrecadação tributária. Segundo matéria publicada em 23 de março de 2011 no site Bússula do Investidor5, o Sudeste responde por 66,6% do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) recolhido em todo o País. Apesar da crise econômica deflagrada em 2008, o desempenho da região, em 2009, teve uma elevação anual de 3,9%. Esses dados encontram-se no anuário Multi Cidades – Finanças dos Municípios do Brasil, publicado pela Frente Nacional de Prefeitos. Na capital carioca, por exemplo, o ISS representa 55% da sua receita tributária, sendo a base da arrecadação tributária própria e muito disso se deve, ainda, segundo a matéria, ao implemento de medidas de combate à sonegação fiscal, bem 5 Arrecadação de ISS cresce no sudeste, aponta FNP. Último Instante, 23 mar. 2011. Disponível em: <http://www.bussoladoinvestidor.com.br/noticia/arrecadacao_de_iss_cresce_no_sudeste_aponta_fnp-10747,1.html>. Acesso em: 6 jun. 2011.
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próximo (proporcional) à somatória de reembolsos auferidos em exercícios anteriores (antes da fraude se iniciar).
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como capacitação de agentes e suas atuações firmes na área de fiscalização de prestadores de serviços.
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Mas também se observa um crescimento arrecadatório de ISS no que diz respeito aos pequenos Municípios. Em pesquisa realizada pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada é ressaltado pelo Técnico de Planejamento e Pesquisa, Sr. Rodrigo Orair, em co-autoria com André Alencar Amorim, da Confederação Nacional dos Municípios, um incremento da arrecadação de ISS em Municípios de pequeno e médio porte de 2000 a 2009, em detrimento à arrecadação de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), anteriormente tido como a principal receita tributária direta desses Municípios6.
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Somando-se aos fatores supracitados, destaca-se, ainda, o advento da Lei Complementar nº 116, de 2003, que praticamente dobrou a quantidade de itens da lista de serviços passíveis de tributação pelo Imposto sobre Serviços a partir de 2004, quando em comparação com o Decreto-Lei nº 406/1968 e derrogações, que regia especificamente a matéria até 31.12.2003. Com isso, setores da economia que antes de 2004 encontravam-se em litígio com a administração tributária municipal, acobertados por incontáveis recursos judiciários e discussões sobre a incidência ou não de ISS sobre determinados serviços prestados por esses, se depararam com uma nova realidade: a taxatividade e tipificação de tais serviços como sujeitos à incidência do tributo, outrora objeto de litígio. Essa mudança, portanto, além de diminuir sensivelmente eventuais disputas judiciais entre Fisco e contribuinte, colaboraram para um implemento na arrecadação tributária de ISS pelos Municípios.
6 Arrecadação de ISS cresce em pequenos municípios. IPEA, 28 fev. 2011. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_con tent&view=article&id=7458:arrecadacao-de-iss-cresce-em-pequenos-mu nicipios&catid=3:dimac&Itemid=3>. Acesso em: 6 jun. 2011.
CONCLUSÃO Mas será que ainda é possível almejar um aumento da arrecadação do Imposto sobre Serviços nas grandes metrópoles, como São Paulo, por exemplo? Em nosso entendimento, há a possibilidade de um relevante aumento na arrecadação de ISS nas grandes cidades. Mas, para isso, é necessário que sejam tomadas algumas medidas relevantes, entre as quais: 1. Uma significativa atualização da base de dados dos contribuintes sujeitos ao ISS, fato que seguramente aumentaria a efetividade e diminuiria o custo de atuação da auditoria fiscal municipal – a falta de atualização cadastral fomenta a realização de trabalhos sem qualquer resultado positivo, muitas vezes deflagrando um alto custo, em vão, à administração tributária. Em termos práticos: ocorrências de diligências a estabelecimentos que não existem há muito tempo; enorme quantidade de empresas de pequeno e médio porte em situação clandestina que assim permanecem, sem qualquer recolhimento tributário, haja vista a relativa incapacidade de detecção destas. 2. Convênios com outros órgãos de fiscalização, tais como: Banco Central, Superintendência de Seguros Privados e Secretaria da Fazenda do respectivo Estado-membro, entre outros, objetivando troca de informações fiscais dos respectivos sob tutela em comum. 3. Acesso, via convênio, ao Sistema Público de Escrituração Digital – SPED – gerenciado pela Receita Federal do Brasil em conjunto com o Serpro – Serviço Federal de Processamento, a fim de otimização e padronização dos procedimentos de auditoria fiscal tributária, os quais
Mas a principal e mais relevante das medidas a serem adotadas é a efetiva participação da sociedade consumidora de serviços, ou seja, a população em geral. Se o cidadão exigisse sua nota fiscal, quando da prestação do serviço, grande parte da fraude fiscal relacionada ao ISS seria extinta, haja vista o registro da prestação de serviço, agora seria acobertado por documento fiscal hábil. A população deve criar a consciência de que, ao não solicitar o documento fiscal, está abrindo mão de dinheiro público em favor de uma terceira pessoa, que não o Estado, fato este tão grave quanto o não recolhimento tributário pelo próprio prestador de serviços. Salienta-se que essa receita pública, apesar de ser um tributo de receita não vinculada a um fim específico, ingressará aos cofres públicos e poderá possibilitar que a Administração Pública desempenhe com efetividade
sua atividade-fim que, simplificadamente, nada mais é do que possibilitar serviços essenciais dignos à população em geral.
REFERÊNCIAS ARRECADAÇÃO de ISS cresce em pequenos municípios. IPEA, 28 fev. 2011. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/portal/index. php?option=com_content&view=article&id=7458:arrecadacao-de-iss-cresce-em-pequenos-municipios&catid=3:dimac&Itemid=3>. Acesso em: 6 jun. 2011. ARRECADAÇÃO de ISS cresce no sudeste, aponta FNP. Último Instante, 23 mar. 2011. Disponível em: <http://www.bussoladoinvestidor.com.br/noticia/arrecadacao_de_iss_cresce_no_sudeste_aponta_fnp-10747,1.html>. Acesso em: 6 jun. 2011. CORDEIRO, Cláudio Marcelo Rodrigues. Contabilidade criativa: um estudo sobre a sua caracterização. Disponível em: <http://www.crcpr.org.br/publicacoes/downloads/revista136/contabilidade_criativa.htm> Acesso em: 2 jun. 2011. FURASTE, Pedro Augusto. Normas técnicas para o trabalho científico. Explicitação das normas da ABNT. 12. ed. Porto Alegre, [s.n.], 2003. ISKANDAR, Jamil Ibrahim. Normas da ABNT: comentadas para trabalhos científicos. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2004. MARAGNO, Luciano Chahin; HUNG, Tsai Meng. Como definir o local de incidência do imposto sobre serviços. 2. ed. São Paulo: IOB, 2011. SALAS, O. A. Blake; GUTIÉRREZ, S. M. La contabilidad creativa en España y en el Reino Unido: un estudio comparativo. Disponível em: <http://www. econ.upf.edu/docs/papers/downloads/181.pdf>. Acesso em: 6 jun. 2011. SANTOS, Ariovaldo; GRATERON, Ivan Ricardi Guevara. Contabilidade criativa e responsabilidade dos auditores. Revista Contabilidade & Finanças – USP, São Paulo, n. 32, p. 7-22, maio/ago. 2003. SÃO PAULO combate sonegação de ISS. Diário do Comércio. Disponível em: <http://www.apet.org.br/noticias/ver.asp?not_id=3345>. Acesso em: 6 jun. 2011.
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passariam a utilizar ferramentas e sistemas digitais próprios para cruzamento de dados informatizados. É o advento da chamada inteligência fiscal sincronizada e informatizada.
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Doutrina
Compatibilização do Plano Diretor e os Planos de Saneamento Básico e Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos SYLVIO TOSHIRO MUKAI
Mestre em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Advogado.
SUMÁRIO: Planejamento urbano; Plano diretor; Planos de saneamento básico e municipal de gestão integrada de resíduos sólidos.
PLANEJAMENTO URBANO Inicialmente, como descreve José Afonso da Silva1, o processo de planejamento dependia – única e exclusivamente – da vontade dos governantes, que, por meio de atos jurídicos, traduziam as ideias em “planos” que instrumentalizariam o processo de planejamento. Essa discricionariedade dos governantes causava constrangimento a seus administrados e a seus bens, que questionavam a sua cons1 Direito urbanístico brasileiro. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 89.
titucionalidade e a falta de um processo jurídico e administrativo de planejamento devidamente regulamentado. A necessidade de efetuar uma regulamentação, como afirma o já mencionado José Afonso da Silva2, fez o planejamento deixar de ser uma mera concretização da vontade dos administradores (ou governantes) para passar a ser definido solidamente na Carta Magna de 1988, devendo, também, obedecer à previsão legal. Com isso, o planejamento deixou de atender apenas às regras técnicas, que eram transformadas em “planos”, para poder atender a regras técnico-jurídicas. Para ilustrar tal assertiva, podem ser destacadas da Constituição Federal de 1988 algumas normas, como no art. 21, inciso IX, que atribuiu competência à União para a elaboração e a execução de “planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento social”. No art. 174, foi atribuído ao Poder Público o planejamento, em se tratando de domínio econômico, entre outras atribuições. Soma-se a isso o disposto no art. 30, inciso VIII, que deu a responsabilidade para definir o “planejamento e os planos urbanísticos para ordenamento do seu território” aos Municípios. Essa atribuição constitucional deixa evidenciada a importância do planejamento urbano para que os Municípios efetuem o devido ordenamento do seu território. Esse ordenamento é realizado, principalmente, por meio do Plano Diretor.
2 Ob. cit., p. 90.
Em nosso país, quase 80% da população habita os centros urbanos. Esse acúmulo de pessoas torna cada vez mais evidentes os nossos problemas urbanos e a nossa relativa incapacidade em solucioná-los. Os principais problemas urbanos, como bem anotam Evangelina Pinho e Nelson Saule Júnior3, são: degradação ambiental, ausência de saneamento ambiental, uso e ocupação impróprio do solo, falta de moradia digna para as camadas mais pobres da população, insegurança e aumento da violência urbana, inadequado suprimento de água, entre outros. A grande maioria desses problemas é originária de uma ausência de política urbana, o que deu margem para um crescimento das grandes cidades no Brasil, que não atendiam e não atendem aos preceitos do interesse público e tampouco se traduzem na observância da necessidade de ser garantido o pleno desenvolvimento das funções sociais das cidades e o bem-estar de seus habitantes. Isso se traduziu na exacerbação de problemas antigos das cidades brasileiras, problemas que remontam aos tempos coloniais. É fato que os primeiros aglomerados urbanos no Brasil não se caracterizavam pelo planejamento, o que difere as cidades da América portuguesa das da América espanhola naquele período específico. Essa ausência de planejamento tornou-se uma característica da evolução histórica das cidades em nosso País. Assim, no começo do século XX, influenciados pelo aparecimento do urbanismo e tentando uma solução para os graves problemas de saúde pública, houve uma preocupação real em
3 Implantação de serviço de abastecimento de água e de coleta de esgoto em loteamento situado em área de proteção de mananciais. In: SAULE JUNIOR, Nelson (Coord.). Direito à cidade. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 288.
tornar a capital brasileira uma cidade pelo menos salubre, o que até aquele momento não era. A incorporação dos valores urbanísticos não refletiu em um melhor planejamento urbano, ou em tornar as cidades brasileiras centros de integração. Na verdade o urbanismo, neste primeiro momento, serviu muito mais para segregar as pessoas de baixo poder aquisitivo daquelas melhor abonadas. Isso fica evidenciado quando se observa que toda e qualquer urbanificação de determinado local implicava o deslocamento das populações de baixa renda para localizações distanciadas, de forma a se esconder os graves problemas sociais. Outro ponto a ser destacado é que a introdução do urbanismo não significou a adoção do planejamento urbano como essencial para o ordenamento do crescimento das cidades. Ao contrário, a principal metrópole brasileira, São Paulo, cresceu de forma abrupta e com uma forma de planejamento que atendia principalmente a interesses privados, da especulação imobiliária, e não de garantir uma cidade que permitisse à maioria dos seus habitantes o usufruto de determinados direitos que caracterização efetivamente uma cidade sustentável, o que resultou na proliferação de subabitações, na ocupação de áreas de manancial, no uso e na ocupação irregular do solo, na ausência de um saneamento ambiental adequado. O planejamento urbano só recebeu algum destaque entre nós em meados da década de 70 do século passado, quando se adotaram os chamados Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado. Ocorre que tais planos sempre careceram de eficácia, tornando-se, no mais das vezes, mera carta de intenção, com cada administrador público planejando o desenvolvimento do município segundo suas próprias convicções, o que resultava em uma descontinuidade administrativa e, por conseguinte, no abandono de qualquer planejamento.
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Em 1988, com o advento da Constituição Federal, essa situação recebe um novo dimensionamento, quando estabelece, em seu art. 182, que a política de desenvolvimento urbano, a ser executada pelo Poder Público municipal, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. A Constituição estabeleceu, ainda, que o plano diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.
O art. 18 torna claro que o referido Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos é condição necessária para o Distrito Federal e os Municípios terem acesso aos recursos financeiros da União, ou por ela controlados, destinados a empreendimentos ou serviços relacionados à limpeza urbana ou tratamento e manejo de resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade.
Assim, pode-se definir o plano diretor como o instrumento básico da política de desenvolvimento urbano, que visa a ordenar o crescimento das cidades, por meio da fixação de diretrizes objetivas, programas e projetos para esse determinado fim, considerando certo horizonte de tempo.
Já o art. 19 do mencionado diploma legal estabelece o conteúdo mínimo que um Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos deve obrigatoriamente ter, a saber:
Ocorre que, por força da edição de legislações específicas, outros planos foram inseridos no contexto do desenvolvimento urbano, devendo eles serem devidamente compatibilizados para permitir que as cidades tenham o seu devido desenvolvimento de suas funções sociais, nos estritos termos do art. 182 da Constituição Federal.
I – diagnóstico da situação dos resíduos sólidos gerados no respectivo território, contendo a origem, o volume, a caracterização dos resíduos e as formas de destinação e disposição final adotadas;
PLANOS DE SANEAMENTO BÁSICO E MUNICIPAL DE GESTÃO INTEGRADA DE RESÍDUOS SÓLIDOS Neste sentido, dois planos se destacam: o plano de saneamento básico (inciso I do art. 9º da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007) e os planos de resíduos sólidos (inciso I do art. 8º da Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010). O plano de resíduo sólido que necessariamente deverá ser adotado pelos Municípios é o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, nos termos do disposto nos arts. 18 e 19 da mencionada Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010.
Art. 19. O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos tem o seguinte conteúdo mínimo:
II – identificação de áreas favoráveis para disposição final ambientalmente adequada de rejeitos, observado o plano diretor de que trata o § 1º do art. 182 da Constituição Federal e o zoneamento ambiental, se houver; III – identificação das possibilidades de implantação de soluções consorciadas ou compartilhadas com outros Municípios, considerando, nos critérios de economia de escala, a proximidade dos locais estabelecidos e as formas de prevenção dos riscos ambientais; IV – identificação dos resíduos sólidos e dos geradores sujeitos a plano de gerenciamento específico nos termos do art. 20 ou a sistema de logística reversa na forma do art. 33, observadas as disposições desta lei e de seu regulamento, bem como as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS; V – procedimentos operacionais e especificações mínimas a serem adotados nos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, incluída a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e observada a Lei nº 11.445, de 2007; VI – indicadores de desempenho operacional e ambiental dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos;
VIII – definição das responsabilidades quanto à sua implementação e operacionalização, incluídas as etapas do plano de gerenciamento de resíduos sólidos a que se refere o art. 20 a cargo do Poder Público; IX – programas e ações de capacitação técnica voltados para sua implementação e operacionalização; X – programas e ações de educação ambiental que promovam a não geração, a redução, a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos; XI – programas e ações para a participação dos grupos interessados, em especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver; XII – mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda, mediante a valorização dos resíduos sólidos; XIII – sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, bem como a forma de cobrança desses serviços, observada a Lei nº 11.445, de 2007; XIV – metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente adequada; XV – descrição das formas e dos limites da participação do Poder Público local na coleta seletiva e na logística reversa, respeitado o disposto no art. 33, e de outras ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; XVI – meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito local, da implementação e operacionalização dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos de que trata o art. 20 e dos sistemas de logística reversa previstos no art. 33; XVII – ações preventivas e corretivas a serem praticadas, incluindo programa de monitoramento; XVIII – identificação dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos, incluindo áreas contaminadas, e respectivas medidas saneadoras;
XIX – periodicidade de sua revisão, observado prioritariamente o período de vigência do plano plurianual municipal. § 1º O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos pode estar inserido no plano de saneamento básico previsto no art. 19 da Lei nº 11.445, de 2007, respeitado o conteúdo mínimo previsto nos incisos do caput e observado o disposto no § 2º, todos deste artigo. § 2º Para Municípios com menos de 20.000 (vinte mil) habitantes, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos terá conteúdo simplificado, na forma do regulamento. [...].
Destaque-se a necessidade de que tal Plano observe as disposições do Plano Diretor quanto à disposição final de rejeitos, e que os procedimentos operacionais e especificações mínimas a serem adotados nos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, incluída a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e observada a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, o que – por óbvio – inclui o próprio Plano de Saneamento Básico. Estabelece, também, que o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos pode estar inserido no Plano de Saneamento Básico (§ 1º do art. 19). De outro lado, a existência do Plano de Saneamento Básico é condição de validade para a concretização de contratos de prestação de serviços de saneamento básico (inciso I do art. 11 da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007). A Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, denominada Estatuto da Cidade, deixa claro e evidente que o Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana (art. 40, caput). Essa condição de instrumento básico implica a necessidade de que o referido plano considere em suas disposições aspectos de cunho ambiental, inerentes ao planejamento municipal, tal qual definido na alínea c do inciso III do art. 4º do citado diploma legal, e, por conseguin-
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VII – regras para o transporte e outras etapas do gerenciamento de resíduos sólidos de que trata o art. 20, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS e demais disposições pertinentes da legislação federal e estadual;
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te, de alocação de espaços dentro da área municipal para disposição e tratamento final de resíduos sólidos e de outros rejeitos. Ocorre que a legislação específica de saneamento básico e a que trata de resíduos sólidos são claramente posteriores à grande maioria dos Planos Diretores editados após o advento do Estatuto da Cidade, ou daqueles que foram devidamente revisados à luz do mencionado diploma legal.
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Outrossim, é importante destacar que, apesar de considerações e normatizações de ordem ambiental, e mesmo relativa a prestação de serviços de saneamento básico e relacionadas com resíduos sólidos (o que eventualmente inclui legislação esparsa relativas ao tema), fato é que os Planos Diretores não teriam como tratar de tais temas com as minucias requeridas pela legislação específica.
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De outro lado, tanto os Planos de Saneamento Básico quanto os Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos não podem ignorar as determinações e especificações contidas nos Planos Diretores, já que estes, enquanto instrumentos básicos de desenvolvimento e expansão urbana, não apenas norteiam o referido desenvolvimento dos centros urbanos, mas, também, trazem os parâmetros para que a propriedade imóvel urbana possa atender sua função social. Não se pode esquecer de que a política urbana traduzida no Estatuto da Cidade objetiva que as cidades desenvolvam plenamente suas funções sociais, ao mesmo tempo em que proporcionem uma sadia qualidade de vida aos seus moradores.
Quando se observa que as funções sociais das cidades se configuram no exercício do direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações, e que uma sadia qualidade de vida implica necessariamente que as condições de salubridade dos centros urbanos seja realmente efetivas, nota-se claramente que se encontram plenamente imbricados os três planos. Neste sentido, por mais que a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, não determine que nos Planos de Saneamento Básico observem as disposições do Plano Diretor, como a legislação que trata de resíduos sólidos faz claramente, fato é que apenas com o atendimento das diretrizes do Plano Diretor é que os serviços de que tratam os Planos de Saneamento Básico poderão ser plenamente prestados e atenderão às expectativas do interesse público. A compatibilização entre os citados planos e o plano plurianual é uma necessidade para a efetividade do planejamento municipal. O que implica a necessidade que as revisões de tais planos ocorram em períodos de tempos compatíveis, que não se fique apenas na revisão e na edição de planos plurianuais, mas sim que a revisão ou a edição dos Planos Diretores (que – por força das disposições contidas no Estatuto da Cidade – se encontram em fase de realização por parte dos Municípios) deve servir de parâmetro para que seja estabelecida a própria edição ou a revisão dos Planos de Saneamento Básico e os Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, já que o primeiro estabelece os pontos básicos do desenvolvimento e expansão dos centros urbanos.
Doutrina
A Resignificação da Dependência Econômica MURILO C. S. OLIVEIRA
Juiz do Trabalho na Bahia, Especialista e Mestre em Direito pela UFBA, Doutor em Direito pela UFPR, Membro do Instituto Baiano de Direito do Trabalho – IBDT.
RESUMO: O artigo apresenta o critério da dependência econômica como nota distintiva da relação de emprego, a partir de uma racionalidade transdisciplinar sobre o trabalho assalariado. Inicia pela demonstração dos problemas provocados pelo critério da subordinação jurídica diante das relações contemporâneas de trabalho. Baseando-se na economia política clássica, são delineados os traços do trabalho assalariado no capitalismo. A par da contribuição interdisciplinar, apresenta-se a (re)significação da dependência econômica. Na defesa deste critério, são refutadas as conhecidas críticas à ideia, de modo a considerar que a antiga noção de dependência econômica é superficial (epidérmica). No aprofundamento deste conceito, a concepção jurídica de trabalho dependente é refeita, notadamente a partir da ideia de ausência propriedade. PALAVRAS-CHAVES: dependência econômica. trabalho assalariado. subordinação jurídica. relação de emprego. SUMÁRIO: Introdução; 1 Rompendo com a subordinação distintiva; 2 Entendendo o trabalho assalariado; 3 O retorno da dependência econômica; 4 Ultrapassando a clássica dependência econômica; 5 Refazendo a delimitação jurídica do trabalho dependente; Conclusões; Referências.
INTRODUÇÃO Na contemporaneidade, o principal debate do Direito (individual) do Trabalho concentra-se na (re)avaliação da eficácia e dimensão do critério de subordinação jurídica como nota distintiva dessa disciplina. Diante de novas situações de trabalho e, igualmente, de velhas situações com novos epítetos, persistem dúvidas sobre a adequação do conceito clássico de subordinação jurídica no trato dessas questões. A atipicidade do trabalho coloca-se, intermediariamente, entre a autonomia e a subordinação, trazendo intensas dificuldades de operação para o conceito clássico de subordinação jurídica. O atípico pode, igualmente, ser entendido como a heterogeneidade contemporânea do trabalho. Essa heterogeneidade comporta uma complexidade de formas de trabalho, que englobam desde o emprego não registrado, o trabalho precário (contratações à margem da CLT, a exemplo daquelas por meio de pessoa jurídica – PJs), trabalho informal (pequenos autônomos e grupos familiares vinculados ao sistema simples de produção) até as parcerias, entre outras situações. Nessa heterogeneidade de formas de trabalho, identificam-se trabalhadores que prestam pessoalmente serviços submetidos não à subordinação clássica do Direito do Trabalho, mas sim em uma condição de dependência. Fora da noção clássica de “subordinação jurídica”, esses trabalhadores dependentes integrantes dessa atipicidade são excluídos da tutela legal da relação de emprego. Entretanto, a realidade desses dependentes desprotegidos repete o problema da excessiva exploração do trabalhador que culminou no surgimento do Direito do Trabalho, embora o faça por meio de formas distintas da relação
de trabalho subordinado clássica. Não obstante, tem-se indubitavelmente repetida a condição originária trabalhista: uma parte hipossuficiente que carece de proteção legal ante ao poder econômico do seu tomador de serviços. A desigualdade das partes nessas novas relações de trabalho persiste, ensejando a necessidade de um tratamento diferenciado e protetivo.
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No âmbito normativo, a Constituição Federal de 1988, que irradia seus princípios e valores no sistema normativo, elenca como seu fundamento a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III). Para além da constitucionalização da tutela do trabalhador (art. 7º), o ordenamento jurídico brasileiro estabelece a proteção ao trabalho como um dos seus valores fundamentais e objetivos do Estado brasileiro. Nesse contexto valorativo constitucional, o sistema normativo trabalhista tem o objetivo de proteger os trabalhadores (expressão literal do art. 7º), cabendo a reinterpretação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a fim de cumprir o programa constitucional, na direção da noção ampla de empregado, notadamente pelo viés da acepção de trabalho dependente.
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Nessa contextualidade, a dependência econômica apresenta-se como um critério distintivo da relação de emprego capaz de comportar as diversas manifestações atuais de trabalho assalariado, inclusive hábil a desvendar criticamente a atipicidade de certas formas de trabalhar e elucidar algumas ocultações do assalariamento disfarçado. Em outras palavras, a questão cinge-se a tentar rearticular a sinonímia entre empregado e assalariado, a qual, atualmente, não se realiza adequadamente pelo critério da subordinação jurídica. Defende-se que a tradução jurídica da noção de assalariado corresponde à ideia de dependência econômica. Com efeito, este artigo apresenta uma síntese da tese de doutoramento1 que resgata o critério da dependência econômica 1 Tese de doutorado defendida pelo autor em 29 de julho de 2011 na Universidade Federal do Paraná, sob orientação da Professora Dra. Aldacy
em uma perspectiva mais aprofundada da ideia de trabalho assalariado. Vale lembrar que a dependência econômica é uma ideia antiga, cuja aplicação foi recusada apenas por “razões doutrinárias”, até porque o texto legal (“sob dependência”) mais se aproxima semanticamente da dependência econômica do que da subordinação jurídica. No entanto, a noção antiga de dependência econômica, considerada aqui “epidérmica”, não atende, da mesma forma, às expectativas contemporâneas.
1 ROMPENDO COM A SUBORDINAÇÃO DISTINTIVA No bojo do pós-fordismo e da crise do Direito do Trabalho2, novos e velhos problemas são colocados para a subordinação jurídica. Percebe-se que a marca da sujeição hierárquica do trabalhador foi atenuada ou diluída pelas dinâmicas de gestão do trabalho mais flexíveis, tornando mais difícil – pelo olhar tradicional – visualizar o mesmo assalariado, por força dos seus novos epítetos, como o (antigo) empregado. O novo do modismo contemporâneo disfarça, ilude e simula o velho padrão capitalista de trabalho assalariado, valendo-se de categorias e contratos de parceria, colaboração, autonomia, entre outros. Os problemas do conceito de subordinação já iniciam pela sua própria definição. No debate histórico-doutrinário do juslaboralismo, a noção de subordinação jurídica pode ser dividida em dois sentidos bem demarcados. No sentido subjetivo, consiste em ordens e disciplina, fundada na ideia de poder, sendo esta a concepção hegemônica. No sentido objetivo, relaciona-se Racid Coutinho, intitulada: A (re)significação do critério da dependência econômica: uma compreensão interdisciplinar do assalariamento em crítica à dogmática trabalhista. 2 Tais debates foram enfrentados e aprofundados na dissertação de mestrado, no capítulo intitulado Crise do direito do trabalho (Oliveira, 2009).
Cotejando a concepção hegemônica, infere-se que a escolha pela subordinação hierárquica corresponde a uma grande mudança de foco, no sentido de, desprezando as características pessoais dos sujeitos da relação, apenas considerar a forma de execução da relação. É o objeto contratual que fixaria a relação de emprego e não seus sujeitos. Isto é, era a subordinação jurídica o objeto contratualmente negociado entre trabalhador e empregador e não mais a venda da força de trabalho. Se antes o Direito do Trabalho destinava-se aos hipossuficientes marcados pelo seu estado de assalariados, agora, somente interessam os assalariados que laboram sobre forte subordinação hierárquica e pessoal. Essa ideia de subordinação seria melhor retratada com o verbete “sujeição”, entendida como sujeito dependente do poder de outro. Mas o signo “sujeição” tem significante muito relacionado à sujeição do escravo, o que justifica sua não utilização pelo peso histórico que rememora, ou seja, “[...] poderia sugerir submissão do trabalhador, a recordar o estado de servidão a que se viu submetido o escravo em certas etapas da história humana” (Romita, 1979, p. 72). Tratava-se de uma mudança de filosofia idealista. Retira-se simbolicamente o nome de sujeição pessoal, mas essa alteração de nomenclatura nada modifica a realidade de sujeição pessoal. Isso porque não era conveniente ao juvenil capitalismo (ou à doutrina juslaboral) resgatar traços do trabalho forçado, mesmo que estes fossem os mais aproximados ao da nova realidade. Na atualidade pós-fordista, as formas atípicas de trabalho – novas formas – são o sintoma maior da crise da subordinação. Um dos traços marcantes desse pós-fordismo que mais contribuiu para a formação dessas situações atípicas é precisamente a
tônica de colaboração e autonomia. Com as potencialidades de gestão e a possibilidade de controle na dispersão, a reengenharia produtiva não se vale mais do clássico padrão de trabalho apoiado nas relações de hierarquia-disciplina. No pós-fordismo é possível visualizar outro cenário para o modo de trabalhar: não se exige a presença do trabalhador na sede da empresa; os serviços são determinados e até executados eletronicamente; a jornada dispensa a fiscalização, inclusive porque se prefere a remuneração por produtividade, a qual, pelo seu baixo valor, exige o máximo de trabalho, já impondo jornadas maiores, inclusive sem pagamento de horas extraordinárias; dispensa-se o poder punitivo ao repassar, por meio do expediente formal da falsa parceria, a posse (embora se diga que houve venda) da mercadoria a ser comercializada, fazendo com que a maior punição – não receber pelo trabalho prestado – ocorra quando a atividade não for realizada devidamente. Essas novas estratégias de gestão da mão de obra sinalizam para a aparência de autonomia e independência. Presos a uma versão estreita e limitada do conceito de empregado como aquela jungida à subordinação pessoal e hierárquica, o dogmatismo não mais identifica o estado de dependência no qual ele sempre esteve. Com isso, operou-se a redução dogmática do campo de aplicação do Direito do Trabalho pela cegueira dogmática-jurisprudencial. Por outro lado, os problemas do critério da subordinação vinculam-se a uma tentativa de redução de custos por meio de estratégias gerenciais. Apenas ao visualizar o empregado como aquele que vive de ordens e teme punição, a doutrina juslaboral quase que, subliminarmente, estimulou a gestão de pessoal a, retirando este traço fundamental de ordens, eliminar também a proteção trabalhista. Isto é, a limitação jurídica do conceito de empregado propiciou o sucesso econômico da nova técnica de gestão de pessoal. A consequência prática é que a restrição do conceito de subordinação à tão somente subordinação pessoal
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com inserção em produção alheia, por ausência de domínio dos fatores de produção, fundando-se na ideia de organização (ou propriedade), sendo esta posição minoritária.
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e hierárquica produziu a exclusão da proteção aos assalariados que não são rigidamente hierarquizados.
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Por isso, é preciso notar que a fuga da subordinação representa o ideal de lucro sem responsabilidade, confirmando a lógica capitalista de extração de mais riqueza mediante a redução dos custos. Logo, não pairam dúvidas de que o motivo principal do esvaziamento ou da própria crise da subordinação jurídica é justamente o interesse de evasão à proteção trabalhista, precisamente ao custo desta tutela legal. Não somente o discurso modista de formas novas de trabalho e de um novo perfil do trabalhador legitima a opção por uma contratação de força de trabalho por fora do marco regulatório do emprego. É antes uma decisão econômica redução de custos como necessidade da intensa concorrência, inclusive com práticas sistêmicas de dumping social que conduzem a criar novas modalidades de contratação, inclusive sob a lógica de colaboração e autonomia.
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A insuficiência da subordinação jurídica se demonstra, porquanto seu sentido prevalecente e hegemônico (subordinação subjetiva) é a noção de subordinação pessoal ou hierárquica. Seu conteúdo corresponde essencialmente ao dueto ordem-punição, elementos externos pautados em uma relação rigidamente hierárquica do empregador (superior) com o empregado (inferior). Ocorre que as dinâmicas contemporâneas de trabalho firmam-se, cada vez mais, em uma relação aparente de colaboração, ruindo com a antiga rígida hierarquia. A contemporaneidade enfraquece o enunciador (ordens e fiscalização) para uma afirmação subliminar do enunciado (trabalho). Antes mesmo das formas novas e das dinâmicas de autonomia, a concepção clássica da subordinação jurídica era, em uma perspectiva crítica, incapaz de justificar situações distintas do tradicional trabalho operário-fabril. A subordinação clássica sempre teve dificuldades de abranger o trabalho intelectual ou especializado tecnicamente, tendo que, para esses tipos de tra-
balhadores, ser reformulada para uma subordinação externa e tênue . Nessas situações, é preciso considerar a subordinação por indícios externos , tal como respeito a horário de trabalho e necessidade de comparecimento na empresa (Barassi, 1953, p. 411). No mesmo sentido, a noção clássica de subordinação não explica satisfatoriamente o trabalho a domicílio, inclusive porque, nesses casos, sequer pode valer-se da ideia de subordinação externa, pois não controla nem o tempo e nem o local da prestação dos serviços. Ademais, a ideia de controle se manifesta igualmente em outras situações distintas daquela de trabalho dependente. Ou seja, afirma-se, cada vez mais, que o controle se realiza sem a clássica subordinação. Existe controle nos contratos de obra/resultado e estes, ainda assim, podem ser desenvolvidos sob o prisma da autonomia ou da dependência. Há controle nas terceirizações, conforme se constata em uma leitura atenta desses contratos de apoio empresarial, notadamente quando as empresas prestadoras de serviços e seus empregados observam atentamente o padrão de trabalho e a cultura organizacional da tomadora. Nos contratos de franquia, ocorre a observância de um padrão minucioso de trabalho, caracterizando manifesta subordinação técnica e organizativa do franqueado para com seu franqueador. Logo, a sujeição à forte subordinação não se restringe ao trabalho dependente, o que demonstra que a subordinação não é algo exclusivo da relação de emprego. Nesses termos, se a condição originária do Direito Laboral foi a proteção aos trabalhadores economicamente fracos e se a atual crise limita essa proteção ao contingente diminuto de pessoas, a perspectiva futura do Direito do Trabalho caso queira permanecer com sua ontologia é ampliar sua proteção para os demais hipossuficientes. Para tanto, é imprescindível superar a concepção de subordinação como sujeição hierárquica. Em outro sentido, as concepções renovadas de subordinação ob-
A teoria da subordinação jurídica nunca rompeu a superficialidade da questão do estado de assalariado, justamente por creditar correção teórica a uma concepção insustentável epistemologicamente. A essência do assalariamento, como modelo capitalista de organização das relações de trabalho, não reside nos conceitos jurídicos, os quais somente visualizaram sua epiderme quando se vincularam à ideia de ordens (hierarquia) ou integração (acoplamento). É o mito da completude da ciência jurídica que legitima e impulsiona uma explicação apenas “jurídica” para a realidade social, ainda no afã irrefletido de uma “teoria pura”, no caso para o Direito do Trabalho. Diante da principal consequência do assalariamento – “receber ordens” – e ansiosa por rejeitar os “perigos” de uma concepção econômica de dependência, a doutrina encontrou seu “melhor” critério, passando a definir o empregado – expressão jurídica do assalariado – como aquele sujeito subordinado. À primeira vista, os assalariados, ao venderem sua força de trabalho, colocavam sua energia à disposição dos seus tomadores, logo aceitando, como necessidade técnica, a direção dos seus serviços. Logo, o conteúdo jurídico imediato da situação econômica de assalariado era estar “sob ordens”. 3 Em todas, realça-se o aspecto da integração do trabalho em detrimento ao aspecto da sujeição pessoal às ordens. Cita-se a: subordinação estrutural de Maurício Delgado Godinho (2006); a subordinação estrutural-reticular de José Eduardo Chaves Junior e Marcus Menezes Barberino Mendes (2008); a subordinação integrativa de Lorena Porto (2009); a subordinação potencial de Danilo Gaspar (2011).
No entanto, este primeiro cenário de disposição da força de trabalho se modifica sensivelmente nas situações de trabalho intelectual (ou domínio técnico) ou em domicílio. Nessas hipóteses, a principal consequência fica mitigada, “adelgaçada”, “diluída” e “tênue”. Tal como o local de trabalho ou fiscalização de horário de trabalho não servem como paradigma de comprovação da subordinação. Igualmente, o contexto pós-fordista implementa sistemas externalizantes de trabalho, fugindo também da versão clássica de estar “sob ordens”. Assim, pode-se verificar novos e antigos assalariados não sujeitos à subordinação, demonstrando que esta não integra ao conceito de assalariamento. O assalariado caracteriza-se por colocar à venda sua força de trabalho, ou seja, por dispor de sua energia em favor de outro. Se o traço marcante da relação de emprego é estar à disposição de outrem, derivam-se daí duas possibilidades: a primeira, de comandar intensamente esta “disposição”; a segunda, de apenas estabelecer o resultado deste trabalho à disposição, considerando que o próprio trabalhador tem as condições (técnicas, intelectuais ou materiais) de realizar seu ofício sem vigilância e fiscalização. Não obstante as duas possibilidades de “disposição”, a subordinação somente visualiza a primeira acepção, apenas compreende a disposição como estrita obediência às ordens contínuas. Por decorrência, a subordinação deve ser vista como consequência da relação de emprego e não sua causa. Pela sua gênese positivista e pela sua natureza de consequência possível, é urgente retirar do critério da subordinação jurídica o protagonismo da definição da relação de emprego. Ainda no aprofundamento dessas questões, averigua-se que é infundada a caracterização do Direito do Trabalho como a regulação fordista do trabalho assalariado. Isto é, o Direito do Trabalho se constitui como o marco regulatório do trabalho assalariado na sociedade capitalista e não como a correspondência jurídica da dinâmica organizativa do fordismo. Com efeito, o instituto
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jetiva3 têm seus méritos, especialmente seu esforço de corrigir uma redução conceitual indevidamente realizada pela doutrina ao contentar-se com uma forte hierarquia. Todavia, continuam considerando uma consequência do fenômeno a direção ampla subjacente à integração como o próprio fenômeno do trabalho dependente.
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juslaboral impregnado de fordismo e, no caso brasileiro, de positivismo foi o critério da subordinação jurídica. O Direito do Trabalho não é, portanto, um produto do fordismo, nem sob o aspecto cronológico, nem sobre o aspecto ontológico, embora se possa qualificar a noção clássica de subordinação jurídica como um conceito jurídico delimitado pela realidade fordista. Assim, a opção pela subordinação jurídica, na sua acepção clássica, representou uma guinada reducionista do campo de incidência do Direito do Trabalho, a qual, indevidamente, limitou o conceito de dependência à situação de sujeição hierárquica. Disso, há que se perceber que a subordinação jurídica não capta a noção integral de assalariamento, mas apenas as consequências deste fenômeno.
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2 ENTENDENDO O TRABALHO ASSALARIADO Fugindo do positivismo e da dogmática, é imperioso voltar a entender o que é trabalho assalariado para, então, repensar a proteção jurídica dessa relação de trabalho. Na filosofia política, John Locke (1978) atribui ao trabalho a fonte da propriedade. Pressupondo que o homem tem a propriedade de sua própria pessoa, terá, igualmente, a propriedade sobre os frutos do seu trabalho. É o trabalho da pessoa sobre os bens naturais, originalmente comuns a todos, que os coloca fora dessa propriedade comum e dentro da propriedade individual. Em nome do trabalho realizado, a pessoa se apresenta perante a coletividade como proprietária, exigindo um direito natural à garantia dessa propriedade pela sua justa origem no trabalho. Essa noção, impregnada de individualismo, pressupõe que a liberdade individual somente se concretiza quando o indivíduo é proprietário de si mesmo, sendo a sociedade o mercado de encontro entre esses proprietários.
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Além de criar a propriedade, o trabalho também cria a riqueza. Rompendo com a crença fisiocrata de que a agricultura é a
criadora da riqueza, Adam Smith (2010) credita a riqueza das nações não ao acúmulo de metais ou aos ganhos das trocas, mas sim ao trabalho humano. Em grande medida, a riqueza cresce conforme a divisão do trabalho, que exerce a função de motor desse crescimento e que desenvolve os papéis dos indivíduos no sistema social. A divisão do trabalho se perfaz como tendência natural do desenvolvimento dos processos de troca, sendo, entretanto, dependente de uma acumulação de capital. A partir daquele considerado como pai da economia política, o trabalho é concebido como ideia abstrata que cria valor e, simultaneamente, como atividade concreta produtora dos homens. No entanto, a estruturação social capitalista, notadamente a divisão da propriedade, não permitiu que os trabalhadores fossem os titulares do resultado do seu labor, como deveria ocorrer pela ideia de John Locke. Descontadas as despesas com os meios de produção (matéria-prima, instalações e instrumentos), a criação de riqueza se expressa na diferença entre o valor criado pela força de trabalho (produto apropriado pelo capitalista) e a remuneração paga a mesma força de trabalho. Isso porque o salário, em essência, não pode corresponder ao total do valor criado pelo trabalho, sob pena de não ser salário, mas uma retribuição integral do trabalho agregado, tal como em uma legítima sociedade. Adam Smith já tinha percebido que o produto do trabalho não é somente do trabalhador. [...] todo o produto do trabalho nem sempre pertence ao trabalhador. Ele deve, na maioria dos casos, dividi-lo com o proprietário do estoque, que o emprega (Smith, 2010, p. 44). A riqueza social, então, é o produto do trabalho social, sendo apropriada, no bojo das relações salariais, pelos contratantes proprietários, na forma de mais-valia (trabalho excedente não pago). Karl Marx elucida a questão: O modo capitalista de apropriar-se dos bens, decorrente do modo capitalista de produção, ou seja, a propriedade privada capitalista, é a primeira negação da propriedade privada individual, baseada no trabalho próprio .
Despossuído de propriedades e possuído por prementes necessidades de subsistência, o trabalhador surge discursivamente como um sujeito livre, por não mais estar sob os grilhões da escravidão ou o pagamento sensorial da corveia na servidão. Robert Castel desvela: O assalariado é então ‘livre’ para trabalhar, mas a partir do lugar que ocupa num sistema territorializado de dependência, e o trabalho que executa é exatamente o mesmo tipo do da corvéia . O capitalismo empreende um discurso de ampla liberdade de trabalho, que se estende da possibilidade de escolha do emprego ou mesmo da desistência deste a qualquer tempo. Entretanto, estrutura relações sociais, políticas e econômicas que tecem fios invisíveis que limitam tais possibilidades, alocando, em regra, o trabalhador sempre na condição de dependente. Ao privar da substancial propriedade, impele sempre uma dependência do não proprietário para com o proprietário, até porque a pobreza vicia a liberdade. Uma real liberdade de trabalho corresponderia à liberdade de acesso aos meios de produção, não à situação de imperativo de sobrevivência que compele o trabalhador a, com a necessidade subjugando a vontade, trabalhar. A maioria das funções, na atual divisão social do trabalho, não são desejadas, mas aceitas por razões de necessidade e realizadas sem desejo, de modo insosso e desprezível. Em outras palavras, a separação entre meios de produção e trabalhador acarreta também em alienação/estranhamento e subalternatividade do trabalhador frente à mercadoria. O estranhamento no trabalho remete a caracterização deste como mercadoria, talvez por isso seja chamado de mão de obra .
Com isso, a situação objetiva de trabalhar para outrem já significa a subordinação formal deste que trabalha em favor daquele que recebe o trabalho. Essa subordinação cinge-se ao manifesto controle do tomador do serviço, por meio não da direção técnica, mas sim da detenção da propriedade dos meios de produzir. Nessas circunstâncias, o direito de propriedade na circulação capitalista empreende o papel de sonegar qualquer propriedade oriunda do trabalho para aquele que não é previamente proprietário, como o trabalhador. Portanto, o assalariado se caracteriza pela constante necessidade e dependência, pois somente possui sua força de trabalho. A coação ao trabalho se faz pela miséria e pela necessidade de obter meios para a sobrevivência , embora esta condição de dependente esteja camuflada pela formatação jurídica de liberdade contratual oriunda de individualismo e formalismo jurídicos iluministas. Como reforço a essa dependência estrutural, visualiza-se, ainda, a situação dos desempregados que formam um exército industrial de reserva, o qual reitera a disputa pela condição de vendedor de força de trabalho. A questão central do modelo capitalista é, portanto, o monopólio por uma classe social dos meios de produção, impelindo a classe não proprietária a vender sua força de trabalho, inclusive com cessão de trabalho excedente. Diferentemente dos modos de produção anteriores – que se pautavam em trabalho forçado (escravo, corveia, etc.) por meio da atuação do poder do Estado –, o capitalismo construiu um modelo de trabalho formalmente livre, mas que, pela não detenção dos meios de produção, realiza-se como trabalho socialmente imposto. Se a coação era baseada na lei, agora ela ocorre pela própria estrutura social e, assim, de modo invisível. Em síntese, a liberdade de trabalho dos não proprietários em um regime capitalista cria um estado estrutural de dependência do assalariado em face do capital, a despeito das garantias jurídico-formais. A liberdade de trabalho do assalariado subjaz a
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Vê-se que nas relações de trabalho entre proprietários e não proprietários, o primeiro se apropria dos valores produzidos pelo segundo, o que ocorre sob a aparência (ou pela ocultação) de livre contrato de trabalho com um salário justo . A apropriação do valor se converte em (nova) propriedade: a propriedade das mercadorias produzidas pelos trabalhadores.
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necessidade imperiosa de sobrevivência, explicada pela perda anterior da titularidade dos meios de trabalho e reforçada pelo receio de prosseguir nas fileiras dos desempregados. Por fios invisíveis, estabelece-se uma dependência estrutural de um para com o outro, daquele que, como imperativo de sobrevivência, precisa imediata e cotidianamente vender-se ao outro, quer seja por não haver outra possibilidade econômica (ausência de propriedade), quer seja porque, em termos técnicos, não sabe desenvolver outro ofício senão aquela função parcelar-polivalente.
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A produção dessa riqueza tem observado a lógica da intensificação do processo de trabalho, sendo essa a tônica do capitalismo , ora pela extensão da jornada de trabalho, ora pelo aumento de produtividade oriundo das inovações técnicas e da divisão do trabalho, ou mesmo pela conjunção de ambas. Para obter mais produtividade no mesmo tempo, é necessária a intensificação do trabalho (obtenção de maior eficácia), seja pelo aumento da velocidade da máquina, seja pela cumulação da operação de máquinas para um único empregado, seja pela maior disciplina e controle para eliminar os poros da jornada . Precisamente, as diversas formas de organizar a produção (fordismo e toyotismo), com metodologias distintas, somente concretizam a lógica do capital de mais acumulação por meio da intensificação do trabalho. O diferencial do pós-fordismo não reside no avanço tecnológico, mas na relativa ruptura com o parcelamento das funções e com a implementação de uma lógica voraz de colaboração de classes. Como decorrência, o toyotismo foi economicamente bem sucedido porque conseguiu, pela sua sistemática de gerência produtiva, dar respostas satisfatórias (ganhos de produtividade e lucro) às oscilações contemporâneas do mercado (retração e expansão), além da incorporação da precariedade ao sistema produtivo.
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Essa análise, pautada essencialmente na crítica de Karl Marx à economia política clássica, revela-se adequada para explicar
as relações contemporâneas de trabalho no capitalismo. A compreensão dialética da totalidade do conjunto social permitiu a Marx identificar as estruturas gerais do trabalho assalariado e formular suas implicações, notadamente a ideia central: a dependência estrutural e prévia do assalariado ao empregador. Como consequência, o sujeito assalariado é aquele que, forjado no despossuimento, é impelido, embora juridicamente livre, a vender-se como mercadoria – como uma força – em troca do salário, cujo proveito econômico resultante desse trabalho é apropriado por outro. Despossuído, coagido e expropriado são termos delimitadores do conceito de trabalhador assalariado. No Brasil, o assalariamento segue essa estrutura geral, com o tempero próprio da historicidade e política latino-americana. De início, a formação do mercado de trabalho brasileiro foi caracterizada por políticas e mecanismos legais de coação para a condição de assalariado. Com destaque, teve-se a não inclusão dos ex-escravos e o aprisionamento das terras, além do aprisionamento “contratual” dos imigrantes. Essas circunstâncias históricas engendram, também nas terras brasileiras, uma estrutural dependência daqueles não proprietários para com os proprietários daqui. Ou seja, o ponto de partida dos assalariados brasileiros foi justamente a construção político-social do despossuimento da maioria, forjando necessária venda da mão de obra como condição de sobrevivência dos trabalhadores. Por isso, a liberdade de trabalho somente reside nos planos dos discursos, inclusive porque sequer foi albergada nas ordens jurídicas anteriores à CLT, vide o exemplo do trabalho do imigrante da Lei nº 108/1837. A pseudo liberdade também inscreveu suas marcas neste País como o efeito palpável da retórica política e jurídica de trabalho livre, quando a necessidade desses despossuídos corroía totalmente a livre opção de trabalhar. O despossuimento do obreiro brasileiro é a marca forte do capitalismo local. Como garantia do reforço desta imposição da venda da força de trabalho, o mercado de trabalho local ainda se vale dos
Agravando a dependência, os novos discursos da reengenharia pós-fordista tentam recolocar a situação de precariedade e instabilidade anterior ao próprio trabalhismo. No tempo presente, a principal consequência dessa precariedade do trabalho tem sido o esvaziamento da forma clássica do emprego pelas diversas medidas de externalização e precarização. Talvez como resposta do capital a um certo status de proteção legal obtido na forma jurídica do emprego ou mesmo apenas a renovação da lógica ontológica de extração de lucro, foram criadas novas formatações de não emprego para a prática de trabalho assalariado. Assim, o cenário político-social do mercado de trabalho nacional assemelha-se a um grande mosaico, com figuras aparentemente díspares e antagônicas – assalariado protegido e precário, toyotismo e fordismo, flexibilização de relações já “flexíveis”, trabalho escravo contemporâneo e robotização – que se firmam como integrantes de uma mesma dinâmica. Sem prejuízo da singularidade histórica, a expansão do capitalismo – leia-se mais extração de riqueza do trabalho – realiza-se com mais intensidade e com mais enfraquecimento dos trabalhadores, o que lhes atribui uma condição estruturalmente mais dependente do Capital quando comparada aos países de capitalismo central. Por sinal, o verbete “dependente” desacompanhado de qualquer adjetivo é justamente o texto literal da definição legal de empregado, consoante art. 3º da CLT. Todavia, o positivismo e seu afã puritano reduz, intencionalmente, esta dependência à subordinação jurídica. O mercado de trabalho brasileiro, portanto, não é destinatário, em termos hegemônicos, da proteção do Direito do Trabalho. Conjuntamente com as questões sociais, políticas e históricas
descritas anteriormente, a conceituação de empregado adotada pelos operadores jurídicos tem uma parcela de responsabilidade nesta considerável ineficácia do Direito Laboral. Justamente a subordinação jurídica, precisamente sua vertente subjetiva, simboliza um acesso estreito e limitado para o mundo da tutela trabalhista. Como visto, esta “pequenina entrada” colabora significativamente para impedir que mais assalariados recebam a proteção social que o Estado brasileiro juridicamente se comprometeu. Nesses termos, a subordinação jurídica exerce o papel de concausa para o agravamento deste cenário de reduzido reconhecimento da relação empregatícia. Por força dos limites que a doutrina trabalhista lhe imputou, a subordinação jurídica não deu conta do trabalho ilegal e informal e, principalmente, sucumbiu diante dos discursos da autonomia e colaboração amparados na acumulação flexível. Se já se apresentava como um critério estreito diante da totalidade dos assalariados, assume a tendência, na contemporaneidade, de distanciar o conceito de assalariado do conceito de emprego, pois os assalariados dependentes de hoje são coordenados/integrados a empresas, mas não classicamente subordinados.
3 O RETORNO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA Diante dos problemas do conceito clássico da subordinação jurídica e das situações paradoxais de trabalho dependente não subordinado, a dependência econômica tem sido novamente cogitada como nota distintiva do Direito do Trabalho. Por consequência, parcela da doutrina nacional e estrangeira cada vez mais se vale da antiga ideia de dependência como critério mais pertinente para o enfrentamento das situações atuais de trabalho. O critério, outrora renegado e tido como inaceitável pelo seu conteúdo extrajurídico, desponta novamente no debate doutrinário.
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expedientes do exército industrial de reserva (desemprego) e da persistente informalidade. A dependência aqui revela-se intensa e viciadora da vontade do trabalhador, inclusive ocultada em uma legislação pensada e operacionalizada pelo positivismo.
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No horizonte estrangeiro, o debate está franqueado, tendo a dependência econômica um lugar de destaque como alternativa ou complemento à subordinação jurídica. As novas figuras atípicas nas relações de trabalho são todas envoltas pelo estado de dependência econômica que é de difícil enquadramento na clássica subordinação. O Professor português José João Abrantes (2004, p. 94-95) enuncia que: na Itália, a legislação valeu-se do epíteto “parassubordinado” (il lavoro parasubordinato); na Alemanha, designa-se “pessoas semelhantes a trabalhadores” (arbeitnehmerähnliche persone)4, pois são prestadores de serviço economicamente dependentes (tarifsvertragsgesetz), também intitulados quase-trabalhadores; em Portugal, denomina-se contratos equiparados.
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No espectro da Organização Internacional do Trabalho – OIT, discute-se o problema do conceito de empregado e o seu campo de destinatários. No debate da 91ª Reunião da OIT em 20035, enfrentou-se a questão do “ámbito de la relación de trabajo” e, por consequência, as situações de “trabajo encubiertas o ambiguas”. No relatório do debate, afirma-se que “la dependencia económica, es cierto, no entraña subordinación en todos los casos, pero puede ser un criterio útil para determinar si un trabajador es un asalariado y no un empleado por cuenta propria” (OIT, 2010, p. 31-32).
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4 O “assemelhado ao empregado” do direito alemão é mais um exemplo do retorno à dependência econômica. “Impressiva, em tais prestadores-colaboradores, é a marca da dependência econômica que os acaba por conduzir a uma situação fática de equivalente à relação de emprego, o que é enfaticamente ressaltado por Wollenschläger, quando define o assemelhado como aquele que frequentemente se encontra em situação de carência econômica tal qual o empregado tutelado.” (Vilhena, 2005, p. 545-546) 5 Na mesma trilha, a Recomendação nº 198 da OIT afirma o objetivo de tornar claras as definições em cada legislação nacional dos critérios de reconhecimento do vínculo de emprego, visando assegurar a proteção legal contra situações de trabalho “encubierto”.
No Brasil, Arion Sayão Romita, o mesmo autor que introduziu no País o conceito de subordinação objetiva, já sinaliza para a retomada da dependência econômica, afirmando que o atual contexto propicia a revalorização da dependência econômica como critério legitimador da aplicação das leis a quem contrata serviços remunerados por conta de outrem, ainda que não juridicamente subordinado (Romita, 2004, p. 1287). A condição de dependente do trabalhador é indiscutivelmente a causa e a razão de ser do Direito do Trabalho. Com efeito, é o traço da dependência o constitutivo da singularidade do juslaboralismo, haja vista que seu caráter protetivo, limitador da exploração deste trabalho, é o caractere que o distingue das demais disciplinas das relações privadas. Serve, então, como medida de garantia de civilidade a uma relação econômica que é estruturalmente injusta e desproporcional. O Direito do Trabalho destina-se àqueles que somente têm a força de trabalho como possibilidade de vida e, assim, como seres dependentes daqueles que lhes ofertem um salário. A oferta de trabalho, na forma de assalariamento capitalista, resulta em exploração da própria pessoa, porque manifesta-se como apropriação alheia do trabalho daquela. Perante as situações de excessiva exploração do trabalho humano, a ontologia juslaboral foi criada almejando combater a exploração do homem pelo homem, seja por sua atenuação (reformismo cristão), limitação (socialismo utópico) ou mesmo a supressão (comunismo). Independentemente dos graus de tolerância da exploração, resta clarividente o compromisso ontológico do Direito do Trabalho em questionar a desigualdade entre o patrão (tomador dos serviços) e o trabalhador (prestador dos serviços), ou melhor, em contestar a hipossuficiência nas relações laborais, embora persista sua função geral de legitimar essa exploração capitalista.
dica. Ademais, a própria legitimação ontológica da subordinação jurídica se dava pelo paralelismo do seu conceito com o de dependência econômica, ou seja, pela existência conjunta com essa última noção. Da história e da ontologia, confirma-se que a tutela do trabalho sempre foi legitimada socialmente pela condição hipossuficiente do trabalhador. E a medida desta hipossuficiência de quem trabalhar para outrem é justamente a dependência econômica. É a razão histórica e ontológica que justifica e legitima o modelo de proteção do Direito do Trabalho em favor daquele sujeito não proprietário que vende sua força de trabalho, pela sua prévia condição de dependente econômico.
Em outro sentido, a dependência econômica é, de igual modo, o fundamento da expansão do Direito do Trabalho. Na busca pela proteção dos sujeitos em debilidade econômica, o Direito do Trabalho empreende um histórico de recorrente alargamento do campo dos seus destinatários. Rememore-se que a intervenção protetiva da legislação trabalhista iniciou-se exclusivamente para as “meias forças” – mulheres e crianças –, embora adstrita ao fundamento geral de integridade física, garantida por meio da limitação da jornada. Adiante, afirmou-se como sistema protetivo para os operários fabris, baseando-se não mais em poder de polícia, mas agora considerado como um direito social: o Direito do Trabalho. Ultrapassa a fronteira da fábrica ao estender essa proteção aos empregados do comércio em geral, inclusive abrangendo sujeitos economicamente médios como os altos empregados e gerentes. Transcende o trabalho manual em direção ao trabalho intelectual. Chega à residência familiar protegendo os domésticos e ao campo tutelando os rurícolas e, ainda, afirma-se como tuitivo mesmo para o trabalho fora da fábrica, aquele praticado no domicílio obreiro.
4 ULTRAPASSANDO A CLÁSSICA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA
Todo o fundamento do princípio da proteção trabalhista e, igualmente, do princípio da irrenunciabilidade é a debilidade econômica frente ao empregador, e não a subordinação jurí-
Um outro autor francês, Alexandre Zinguerevitch, formulou um conceito mais amplo de contrato de trabalho, a partir dos traços mais gerais da dependência econômica, enfocando es-
A retomada da dependência econômica para que seja mais efetiva deve ser (re)pensada em uma dimensão mais aprofundada em relação aquela ideia apresentada no início do século XX. O perfil daquele sujeito que vive da venda do seu trabalho seria a primeira tradução jurídica para o conceito de dependência econômica. O primeiro autor a usar o conceito de dependência foi o francês Paul Cuche em 1913, para o qual a dependência econômica decorria de dois requisitos inseparáveis. Primeiro, o trabalho deverá ser a única ou principal fonte de sobrevivência do trabalhador, conferindo ao serviço prestado a condição para o seu sustento. Segundo, o empregador deve absorver de forma regular e integral os serviços prestados pelo trabalhador, havendo, portanto, a inserção e exclusividade do trabalho deste na empresa. Em síntese, o trabalho do obreiro lhe garantiria prevalecentemente sua subsistência e seria exclusivo em favor de um tomador.
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A justificação histórica e ontológica da criação de uma tutela legal para as relações de trabalho é a condição essencialmente dependente do trabalhador assalariado para com o capital. Por essa razão, o critério da dependência econômica detém uma força histórica marcante no Direito do Trabalho, como delimitação conceitual jurídica da condição de assalariado. Apesar dessa importância histórica e ontológica, entendeu-se que a dependência econômica era tão somente a causa “pré-jurídica”, nada além disso. Estando fora da seara jurídica, não poderia, então, servir como critério jurídico, sob pena de ofensa ao puritanismo conceitual positivista. Há inexplicável paradoxo nessa rejeição de importância e utilidade.
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pecialmente a questão da privação da liberdade econômica. Zinguerevitch pretendia defender uma noção ampla de contrato de trabalho a partir dos critérios gerais da OIT, em especial o princípio diretor de que o trabalho não pode ser tratado como mercadoria, quebrando ou limitando juridicamente o “livre jogo” da lei de oferta e procura de mão de obra no mercado de trabalho.
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O pressuposto de Zinguerevitch era “[...] o que caracteriza essencialmente as relações entre o patrão e o empregado é estado de fraqueza e dependência econômica no qual se encontra o segundo em relação ao primeiro” (1936, p. 28). Logo, quem não pode trabalhar para si mesmo e, assim, precisa fornecer seu trabalho para outro é economicamente fraco. Seriam, então, dependentes aqueles sujeitos “privados de liberdade econômica”. Como resposta às críticas, muitos autores aderiram à justaposição da dependência econômica à subordinação jurídica. Cabe notar que o próprio Paul Cuche referia-se à dependência econômica como um critério adicional à subordinação jurídica.
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Como visto, a delimitação jurídica do critério da dependência econômica sempre se ateve à superficialidade quando concebe o dependente como sendo aquele trabalhador que vive da remuneração. Este viver de salário representa apenas a epiderme do fenômeno, haja vista que todos os que prestam serviços, inclusive os autônomos, vivem da contraprestação pecuniária recebida. De igual modo, empresas podem se encontrar em uma situação de dependência econômica para com outras empresas maiores, a exemplo dos processos produtivos de subcontratação. Como reparo a esta superficialidade, José Martins Catharino já esboçava uma acepção relativizada da dependência econômica, visando torná-la mais juridicamente eficaz. “Na sua concepção relativa, [...] bastando que o salário seja o principal meio de vida, e a absorção parcial e predominante do seu tempo disponível
por empregador” (Catharino, 1982, p. 203). O mesmo autor destaca adiante que ainda assim há falha no critério, invocando a hipótese fática em que uma pessoa trabalhe e seja igualmente remunerada por duas empresas. Entretanto, o professor baiano frisa que a ausência de dependência econômica, ou seja, uma situação de independência econômica do obreiro, é manifestação clara da desfiguração do contrato de emprego. Catharino registra que as divergências com a ideia da dependência econômica não resultam sua invalidade, graças a sua sólida raiz histórica e política do critério que lhes garantem sustentação (1982, p. 204). Atrelada à aparência primária da dependência econômica, a doutrina juslaboral teceu diversas críticas a este critério, concluindo pela sua imprestabilidade. A primeira negativa à dependência econômica provém do seu caráter extrajurídico6, que corresponde a um demérito, pois o conceito não foi formulado nos precisos e completos marcos conceituais do direito. Além do equívoco epistemológico advindo do positivismo que sustenta essa crítica à extrajuridicidade, há uma pretensão subliminar de completude do sistema jurídico que, assim, não pode admitir critérios que não sejam autossuficientes no próprio direito. Outra crítica advém de um cenário hipotético em que o empregado é mais rico do que seu empregador, cuja situação há subordinação, mas não dependência. A princípio, o cenário da crítica 6 A crítica de Orlando Gomes e Elson Gottschalk é forte contra o extrajurídico. Afirmam que “[...] padecem do mesmo vício de origem [a dependência econômica e dependência social]. Pretendem caracterizar um contrato com elementos metajurídicos. O erro de seus defensores provém de procurarem, preferentemente, analisar a condição social e econômica do trabalhador, em vez de examinar a relação jurídica da qual ele participa. [...] O equívoco dos que adotam critérios extrajurídicos reside exatamente no fato de se não preocuparem com a fixação do elemento característico do contrato de trabalho, mas sim com a qualidade da pessoa que deve ser protegida” (Gomes; Gottschalk, 2005, p. 141).
Nesse bojo, é possível adequar – tornando-o mais real, racional e factível – o exemplo para aquela situação em que o obreiro não está totalmente privado de patrimônio, seja porque detém uma herança ou outra fonte de renda considerável. Usando o exemplo de Jorge Luiz Souto Maior (2008, p. 63), que nega validade à dependência econômica, pode-se, ao contrário, confirmá-la. Trata-se da situação na qual um juiz do trabalho – que aufere grande remuneração quando comparada ao mercado médio de trabalho – atua como professor em faculdade privada. Nessa situação, a condição personalíssima desse professor – excepcionalmente hiperssuficiente pela outra ocupação – não significaria autonomia. Ao inverso, no âmbito das relações internas à faculdade, esse professor-juiz é tão dependente quanto um professor-professor ou um professor-advogado, pois nenhum destes é o detentor do capital que funda a faculdade. Não sendo proprietários, não lhes cabe estruturar a forma de trabalhar, tampouco fixar os objetivos institucionais da empresa e, principalmente, não lhes é apropriado o resultado do seu trabalho. A inexistência de dependência econômica no contrato de trabalho é uma “exceção da exceção” quando comparada com a exis-
tência de dependência econômica, pois aqueles que não têm os meios de produção (dinheiro, propriedades, etc.) têm a liberdade (única opção) de vender seu trabalho em troca da sobrevivência. É esse o traço marcante do trabalho assalariado e da relação de emprego. Negar a dependência econômica invocando a hipótese da pessoa rica que se sujeita a trabalhar como empregado é impugnar a realidade social a partir da exemplificação de um “caso de laboratório” (Uriarte; Alvarez, 2001, p. 212). A crítica relativa à exclusividade é infundada, eis que se apresenta como uma consequência superficial do fenômeno. Quem vive de salário deve, por suas necessidades vitais, buscar o número máximo possível de tomadores, a fim de garantir sua sobrevivência. A necessidade de vender-se a mais de uma empresa é, ao contrário, reforço da debilidade econômica do trabalhador que não consegue encontrar os meios de subsistência satisfatória em um único empregador, quando lhe é fisicamente possível trabalhar para diversos tomadores. Note-se que este é o exemplo sintomático do avulso que precisa necessariamente de diversos tomadores para realizar sua sobrevivência. Todas as críticas anteriores foram responsáveis para a rejeição do critério da dependência econômica como nota distintiva da relação empregatícia. Embora seja pacífico que a dependência é a causa. Urge, portanto, transpor essa visão epidérmica para começar a entender com profundidade interdisciplinar a noção de trabalho dependente.
5 REFAZENDO A DELIMITAÇÃO JURÍDICA DO TRABALHO DEPENDENTE Se a dependência econômica tem sido, até então, enfrentada sobre seus aspectos superficiais e igualmente criticada pelos problemas oriundos dessa aparência, é premente romper com essa análise epidérmica. O aprofundamento da noção
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é quase fictício, cabendo a indagação de quantos empregados estão nessa situação afortunada. A crítica, então, inicia-se em uma pressuposição idealista, porque pouco considera a realidade concreta e sua manifestação cotidiana. Ainda assim, cabe endossar o exercício de imaginação e reiterar a dúvida: teria mesmo o empregado mais propriedade do que a empresa que trabalha? Caso a resposta fosse afirmativa, seria lógico que o sujeito, com possibilidade de comprar uma empresa decidisse, ao inverso, vender seus serviços em manifesto prejuízo econômico? A resposta positiva significaria que o sujeito iria preferir economicamente a redução do seu patrimônio, em manifesta ofensa à lógica capitalista de acumulação. Essa opção, justamente pela irracionalidade diante da dinâmica do sistema, não merece aceitação, porque nega a razoabilidade na vontade do sujeito.
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de dependência implica refazer, agora com o esteio em uma compreensão interdisciplinar e crítica, uma delimitação jurídica do trabalho assalariado. Almeja-se resgatar a sinonímia integral entre trabalhador assalariado e trabalhador dependente.
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O primeiro elemento dessa delimitação jurídica é reconhecer que o poder – e sua consequência potencial de subordinar os trabalhadores – de uma empresa capitalista decorre da sua propriedade. Retomando Karl Marx, vê-se que “o capitalista não é capitalista por ser dirigente industrial, mas ele tem o comando industrial porque é capitalista” (2006, p. 385). O capitalista comanda a empresa em nome da propriedade de que é titular. Por ser o sujeito proprietário, pode-se afirmar como o comandante da empresa. Por decorrência, o poder diretivo é mera consequência da produção capitalista e não sua qualidade distintiva.
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O fundamento central da relação de trabalho é a propriedade, precisamente porque o caráter singular dessa relação é o intercâmbio entre proprietários e não proprietários. Entretanto, essa questão é ocultada no Direito do Trabalho. A ênfase que o juslaboralismo confere ao poder diretivo atua, de certa medida, como ocultadora e naturalizadora dessa relação entre proprietário e não proprietário7. O contrato de trabalho aparece, então, como o momento jurídico de legitimação da subordinação, embora antes mesmo do contrato o trabalhador já seja dependente por não ser proprietário. 7 O jovem Orlando Gomes, conjugando as contribuições de La Cueva e Sinzeheimer, aponta que o direito de propriedade funda uma situação de poder do empregador sobre o empregado. Convém reproduzir o elucidativo trecho: “É fato incontroverso que a propriedade não confere apenas um poder sobre as coisas, mas, também, sobre os homens. Nos domínios da produção de riqueza, esse poder do proprietário concretiza-se, juridicamente, em um conjunto de faculdades através de cujo exercício faz sentir sua autoridade sobre os trabalhadores, isto é, sobre os homens que, não podendo ser proprietário de meios de produção, põem, à disposição dos que podem, a sua força-trabalho” (Gomes, 1944, p. 119).
Sendo o assalariado um sujeito despossuído por ausência de propriedade capaz de lhe permitir atuar como empreendedor , fica livremente impelido a vender sua força de trabalho. O despossuimento é que demarca sua condição de dependente e não o fato de depender de salário. A relação de dependência do assalariado para com a empresa é prévia ao contrato de trabalho e estrutural na sociedade capitalista, na medida em que a força de trabalho somente se realiza quando vendida ao capital. Seu destino dirige-se estruturalmente à alienação em favor do empregador sob a condução sutil dos fios invisíveis da teia capitalista. O trabalho desconectado da propriedade no mundo capitalista reduz o sujeito trabalhador a apenas força de trabalho, ou seja, a algo a ser vendido como mercadoria em troca de salário. Infere-se aí que o viver do salário é a consequência do ser despossuído e não a própria condição de dependente. A direção dos serviços não é condição essencial para existência de trabalho dependente, embora seja uma das consequências mais habituais. O exemplo do vendedor externo ou do trabalhador intelectual é emblemático no sentido de demonstrar que nem todo trabalho assalariado é heterodirigido. Por isso, é a condição de proprietário dos meios de produção que legitima o comando do capitalista e não a situação inversa. O poder ínsito à propriedade dos meios de produção explica como pode ocorrer trabalho por conta alheia sem a direção dos serviços. Há casos em que o empregador é o dono do resultado do trabalho sem necessitar exercer o comando. O segundo elemento é a pseudo liberdade de trabalho. A despeito das liberdades discursivas do capitalismo, aos despossuídos cabe a “livre” única opção de vender sua força de trabalho. A liberdade de trabalho dos que não têm substancial propriedade é inócua: se não tem como possuir meios de produção, sempre tem que se vender. Nesse primeiro sentido, ela é totalmente inexistente.
Adiante, em um segundo sentido, a liberdade de trabalho é deveras pequena, embora existente quando o empregado pode ter alguma escolha na qual oferecer seu serviço. Em momentos de grande crescimento econômico, a força de trabalho, valorizada pela larga procura, tem alguma liberdade: vender-se para empregador A ou empregador B, conforme o maior quinhão prometido. Nesse modelo societal, a liberdade plena de trabalho teria que pressupor a real capacidade de todo trabalhador acessar a condição de empresário. Ou seja, a verdadeira liberdade justificaria que a condição de empregado fosse uma real e livre opção do trabalhador, mas nunca uma necessidade de sobrevivência. Infere-se que, no capitalismo, o homem trabalhador não mais vende mercadoria (produto do trabalho), mas é a sua força que é comercializada. Dissocia-se, com evidência, o feitor do trabalho e o proprietário do resultado, situação que até então era coligada. O autônomo é aquele que é proprietário da matéria-prima e do resultado do trabalho, sendo que nele foi empregado sua força. Assim, o autônomo tem liberdade para quem vender e não somente se vincula a um único tomador. Aqueles que têm capital razoável para instituir e dirigir sozinhos sua empresa, mas que preferem seguir certos modelos de parceria (franquias, contratos de prestação de serviços, parceiros capitalizados, entre outros), são, por opção, sócios do capital, não sendo dependentes econômicos. É essa a distinção da dependência econômica com a subordinação objetiva que incluiria estas pessoas integradas a um processo produtivo.
Tudo isso leva a compreender o sujeito assalariado como sinônimo total de sujeito dependente, como aquele que tem seu trabalho apropriado pela empresa. Encontra-se o sujeito dependente como o ser despossuído e coagido a se vender como apenas mercadoria (força de trabalho). Nesse particular, a subordinação jurídica em nada capta a questão do assalariado e sua pseudo liberdade. A dependência econômica, então, engloba a subordinação jurídica, sendo muito mais ampla do que esta, uma vez que, considerando os elementos prévios do assalariado, pode também considerar o trabalhador subordinado normalmente como dependente. O trabalho por conta alheia implica estado de dependência do trabalhador, a qual é “uma consequência ou um efeito da prestação de trabalho para terceiros, pertencerem originariamente a pessoa distinta da que efetivamente trabalha, esta se reserva um poder de direção ou de controle sobre os resultados [...]” (Olea, 1969, p. 32). O esqueleto geral do assalariamento é a relação de trabalho entre um proprietário e outro não proprietário, na qual há uma dependência estrutural e prévia do segundo para com o primeiro. É essa dependência prévia a tônica do regime do assalariamento, pois quem vende trabalho e não mercadoria (vendida somente pelo proprietário) é assalariado. Quem vende trabalho é sempre subsumido ao seu comprador, pois vende algo que, por ser uma parte de um produto qualquer, somente se concretiza quando for vendida, isto é, quando colocada em ação na produção. A venda de trabalho (força de trabalho) é, assim, sempre dependente no capitalismo. Com desenvolvimento econômico-social, a pobreza individual deixa de ser sinônimo de despossuimento. Associa-se, prima facie, assalariamento à pobreza individual, o que é um equívoco consoante análise aprofundada, uma vez que despossuimento não significa necessariamente miséria ou pobreza individual. Como na concepção clássica da dependência econômica, a epiderme do fenômeno foi caracterizada como o próprio fe-
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Conjuntamente com o poder do capitalista baseado em sua propriedade, o assalariado é o sujeito privado de real liberdade. O capitalismo dissocia os fatores de produção (capital versus trabalho) e, consequentemente, sempre força o trabalhador a vender seu trabalho, salvo quando o trabalhador é titular do capital, situação em que ele já é o próprio capital. O capital afasta inicialmente o trabalho dos meios de produção, mas simultaneamente força a venda de trabalho como condição de sobrevivência.
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nômeno. O assalariado era inicialmente o sujeito despossuído universal, logo, sujeito pobre ou miserável. Entretanto, o atual assalariado não é necessariamente o sujeito inserido na situação de pobreza. A condição salarial transpõe, para alguns, a margem da pobreza, elevando-os a condição de classe média ou até de altos empregados. Nem por isso deixam estes de ser sujeitos dependentes econômicos.
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A par dessa distinção entre pobreza e assalariamento, falar em despossuimento corresponde a afirmar que o sujeito, tendo algum patrimônio, não tem propriedade suficiente para montar sua empresa, ou seja, não detém os meios de produção. Embora tenha até um automóvel ou uma residência, o trabalhador não tem como viabilizar economicamente a constituição de uma empresa, o que lhe coloca em uma relação social de venda compulsória de força de trabalho. Portanto, é preciso distinguir, novamente, que a dependência econômica atinge o sujeito pobre pauperizado e os demais sujeitos medianos (profissionais intelectuais, artistas, vendedores, técnicos, professores, entre outros) que também ocupam a posição social de assalariado.
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Percebendo a dependência como prévia, estrutural e distinta de pobreza, cumpre firmar sua delimitação conceitual não mais pelas consequências do fenômeno do trabalho assalariado – como fez parcialmente a teoria da subordinação jurídica. Sabe-se que as definições construídas sobre as consequências dos fenômenos tendem a não captar a sua inteireza, como também a se esvaziar quando o mesmo fenômeno alterna seus efeitos. São estes os exemplos dos diversos critérios que atuaram como notas distintivas do Direito do Trabalho, eis que todos captavam apenas uma consequência parcial do assalariamento e logo se tornavam inadequados. A dependência técnica não se adequa ao empregado com domínio técnico, a sujeição hierárquica não combina com o trabalho intelectual, a vigilância e fiscalização têm dificuldades de materialização no trabalho a domicílio, a pobreza individual não explica a ocorrência de altos e médios
assalariados e, por fim, a integração à empresa comporta, além dos assalariados, os autônomos. Em todos esses casos, a ênfase foi na consequência e não na causa. O sentido da expressão venda de força de trabalho refere-se ao bem cuja utilidade econômica é restrita, por depender do seu acoplamento a um empreendimento, mais precisamente pela sua conjunção com a propriedade (meios de produção). Sendo o trabalho um elementos da empresa, seu destino é o de estar contido nesta. O trabalho dissociado da propriedade não pode agir como empresa; somente lhe cabe retornar à empresa pela venda compulsória de força de trabalho . Ao contrário, quando o trabalho encontra-se associado à propriedade, seu resultado deixa de ser apenas força de trabalho (valor de uso) e passa a ser uma real mercadoria (valor de troca), recebendo os epítetos jurídicos de produto ou serviço. Nessa definição, é preciso realçar que o trabalhador dependente é exatamente aquele que, por ser despossuído, trabalha por conta alheia e, assim, não se apodera dos resultados dessa entrega de trabalho. O trabalho por conta alheia origina o sujeito dependente como fundamento do Direito do Trabalho. Daí, forma-se, por simetria, o conceito de empresa como ente que se apropria dos resultados positivos e negativos – os riscos do negócio –, inclusive porque normalmente dirige a organização da empresa. Nesse particular, dirigir a organização da empresa é um conceito muito mais amplo do que o estabelecimento da hierarquia e de sua faceta mais visível de “emitir ordens”. O ícone da empresa não é o mando, mas a propriedade. Mais importante do que dirigir os serviços – o que pode ser traduzido em um controle contínuo da atuação do empregado – é estruturar e organizar os serviços, os quais poderão até ser executados sem essa reiterada direção (vide situação do vendedor viajante). Organizar a empresa diz respeito a estabelecer os rumos da atividade econômica, fixar a dimensão territorial de atuação, definir os
A condição de dono não propicia a atuação como chefe emissor de ordens e fiscalizador, até porque esse papel é cotidianamente atribuído aos seus capatazes. O dono cria e organiza, delega a direção aos altos empregados, mas sempre é o proprietário da riqueza gerada pela força de trabalho que comprou. É este o comando geral inerente a qualquer titular de empresa, sendo o modelo fordista apenas uma possibilidade entre muitas, a exemplo das pós-fordistas, de dirigir a atividade da empresa. A par disso, o termo “dependente” deve ser compreendido menos como um adjetivo (subordinado e assujeitado) e mais como aquele que predica a ação “depender”. O verbo “depender” – ação daquele que é dependente – deve privilegiar a semântica de “pertencer”, “estar contido” e “fazer parte” em detrimento da subordinação advinda do “estar sujeito” ou carecer economicamente (Houaiss, 2009, p. 616). O empregado é dependente porque sua força de trabalho não se realiza sozinha, pois pertence estruturalmente à empresa, fazendo parte desta e, como consequência possível, podendo ser subordinado. A demarcação da dependência foi feita, até aqui, sem adjetivos, em uma concepção generalizante. Todavia, é preciso fazer uma opção de recorte desta ampla delimitação, visando enfatizar seu aspecto preponderante. A ênfase no aspecto econômico consiste no realce da força e do poder da propriedade. Fala-se em “econômica” para sempre relembrar que a causa e a continuidade do estado de dependente advém da apropriação alheia do trabalho, ocorrida em nome da propriedade. A chave da compreensão crítica da dependência é, então, seu conteúdo econômico, como correlato à ausência de propriedade. Trata-se da percepção de que essa forma de trabalho depen-
dente é estruturada pelas condições econômicas da sociedade capitalista. Em nome da propriedade, coage-se ao trabalho, como também, por força da propriedade, expropria-se a riqueza criada pelo trabalhador. Não é à toa que o centro do capitalismo converge à propriedade e não ao trabalho, embora seja o trabalho fundador da riqueza que se represa em propriedade. Qualificar a dependência como econômica significa explicitar a natureza capitalista da venda da força de trabalho e seu consequente Direito capitalista do Trabalho, que na fuga conveniente do extrajurídico termina esquecendo suas imbricações econômicas. Almeja-se destacar que a manifestação concreta de vontade e a liberdade, no capitalismo, pressupõe um sujeito proprietário, sendo remanescente a coação e a restrição da vontade para os não proprietários. Daí, resta impraticável considerar como contratantes iguais na sua livre vontade negocial o empregado e o empregador, nas recorrentes tendências flexibilizantes de retorno da convalidação da autonomia privada. Da mesma forma, objetiva rememorar que se os sistemas jurídicos pretendem concretizar o valor da dignidade humana devem combater o poder veiculado pela propriedade, por meio de limitações constitucionais e legais. O ascendente solidarismo de uma constituição dirigente, para lograr seu firmamento, precisa conter o capital. Nessa direção, deve-se, cada vez mais, fortalecer as limitações dos poderes dos proprietários, tal como ocorre com a “função social da propriedade”, direito do consumidor, lei do inquilinato e, ontologicamente, o princípio da proteção do trabalhador no Direito do Trabalho. Nesses termos, os fios invisíveis da produção capitalista estabelecem a dependência antes do próprio contrato (coação para venda da força de trabalho), limitam as possibilidades de ocupação (dependência técnica) e, no sistema legal brasileiro, caracterizam a execução do contrato como intenso arbítrio sem possibilidade de defesa imediata do trabalho (a dispensa sem justificação, a inexis-
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preços dos bens e serviços que comercializa e, principalmente, ser juridicamente o proprietário do resultado do trabalho dos seus empregados.
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tência de direito de defesa perante a punição, as possibilidades de transferências já previstas em lei) e as demais condições de sonegação de direitos da precariedade brasileira. Por fim, quando da extinção contratual, muitos ainda temem reclamar na Justiça, receosos do poder do ex-empregador em posterior perseguição (lista suja e informações desabonadoras). A relação de trabalho assalariado perpassa, nesses termos, pelas ideias de propriedade, poder e sujeição. A propriedade confere poderes e obriga àqueles que são proprietários apenas de si a se sujeitaram, como condição de vida, ao trabalho para o outro. Em essência, a leitura jurídica do fenômeno social do assalariamento indica que o trabalhador vive sob “sujeição” porque atua conforme o interesse alheio, por falta de propriedade. Assim, a dependência equivale à “sujeição”, destacando o traço do poder nessa relação, enquanto a econômica elucida que o fundamento desse poder é a propriedade. Enfim, serve para que não se esqueça que o Direito do Trabalho é, essencialmente, o direito capitalista do trabalho, que confere uma dita civilidade à expropriação do trabalho dos não proprietários.
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CONCLUSÕES
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No retorno interdisciplinar à compreensão do sujeito assalariado, verifica-se que seus caracteres cingem-se à tríade do despossuimento, coação e expropriação. Se o trabalhador é o produtor da riqueza na modernidade, prossegue expropriado da propriedade que cria. Se a liberdade de trabalho é proclamada nos discursos jurídicos, a realidade de necessidade lhe impele, como única opção, a se vender como mão de obra. Se pelo império da necessidade tem que se vender, pouco espaço haverá para manifestação de uma vontade livre. Seja no fordismo ou no toyotismo, mantém-se o processo de intensificação do trabalho assalariado, em reforço da condição dependente do trabalhador, inclusive com a vertente de dependência consenti-
da pela lógica da colaboração. Dessa análise, constata-se que dependência se apresenta prévia e estruturalmente ao próprio contrato de trabalho. O diagnóstico, conforme visão oriunda da política, economia e sociologia, é que a atipicidade flexível e suas inovações modistas no mundo do trabalho são veiculadoras de mais precariedade no lugar de um status de proteção advindo do contrato de trabalho e sua tutela jurídica. Sem o medo da possibilidade de um outro regime político-social, não há mais razão econômica para o capitalismo manter, de maneira irresignada, um sistema de proteção (custoso) em favor do assalariado, bem típico de um Estado Social. Na mesma política, os dilemas estão postos: cumprir o programa constitucional de uma sociedade estruturada na dignidade humana, que dialoga com o valor social do trabalho e a livre iniciativa, na conciliação destes pela ideia de justiça social; ou, no plano do economicus, implementar uma sociedade baseada na busca da eficiência e riqueza que qualifica as tutelas jurídicas como obstáculos (onerosamente) desnecessários. Como compromissária da primeira opção de justiça social, a dependência econômica se apresenta como a caracterização do trabalhador como o sujeito despossuído, coagido e expropriado. Por não possuir propriedade substancial – o que não significa pobreza individual –, é conduzido a vender de sua força de trabalho como simples valor de uso, quando poderia, caso tivesse propriedade, vendê-la como valor de troca. Sendo obrigado a se vender, assume socialmente uma posição de assujeitado ao poder daquele que pode lhe comprar, inclusive dirigindo-o ou não. Por fim, a riqueza que se produz nesse trabalho – o valor agregado – não lhe pertence, eis que, juridicamente, é a propriedade originária do empregador, apesar de pressupor uma propriedade prévia.
Afirmar a dependência como econômica demarca o aspecto econômico da relação, oriundo do poder que a propriedade confere ao seu titular. Destina-se a frisar que o Direito do Trabalho é, essencialmente, o direito capitalista do trabalho, o qual, ao mesmo tempo que confere uma civilidade à expropriação do trabalho dos não proprietários, prossegue mantendo essa relação estruturalmente de expropriação. Nesse desiderato, a dependência econômica proposta, quando comparada à subordinação jurídica, tem muito mais a oferecer, seja na identificação da essência (e não da consequência) do assalariamento, inclusive a par das singularidades brasileiras, seja pela delimitação conceitual aberta perante as realidades formalmente disfarçadas ou pela aptidão a desfazer as ocultações capitalistas, a dependência econômica incorpora melhor as tarefas do Direito do Trabalho na busca por dignidade humana e justiça social.
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Na operacionalização dessa ideia ressignificada de dependência, articula-se uma racionalidade de abertura e amplitude conceitual, que transfere para o conceito de trabalho autônomo o padrão fechado da tipicidade. Na ruptura com o positivismo, afasta-se, igualmente, da pretensão de completude dos conceitos jurídicos, inclusive reconhecendo a inadequação de um conceito milimétrico que tende à ineficácia e obsolência pela inovação, complexidade e pela processualidade histórica. Como contraposição à ideia de dependência econômica, a autonomia é, então, advinda da titularidade sobre uma organização produtiva, ainda que seja diminuta, isto é, a existência de propriedade suficiente (e trabalho humano) para a constituição da ideia (ampla) de empresa é que caracteriza a autonomia. Infere-se que é justamente a propriedade que cria as condições para o exercício do poder de direção ou mesmo propicia sua delegação para os chefes, gerentes, entre outros.
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ZINGUEREVITCH, Alexandre. La notion de contrat de travail. Paris: Pedone, 1936.
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Doutrina
Os Contratos Administrativos e a Arbitragem LUCIANO BENETTI TIMM
Advogado, Pós-Doutorado pela Universidade da Califórnia/Berkeley – LLM Warwick, Doutor pela UFRGS, Diretor do CBAr.
THIAGO TAVARES DA SILVA
Advogado, Membro do Grupo de Estudos de Arbitragem na PUCRS em 2008, Especialista em Direito Empresarial pela UFRGS.
RESUMO: Um assunto que tem gerado muita discussão no universo jurídico é a possibilidade de a Administração Pública utilizar a arbitragem como instrumento para resolução dos litígios que envolvem os contratos administrativos. Esses são orientados por princípios que obrigam o Poder Público a seguir certas condutas no momento da contratação. Contudo, a relação entre o público e o privado vem sofrendo modificações. Cada vez mais a iniciativa privada participa da vida do ente estatal, seja por meio de investimentos no Poder Público, seja por meio de parcerias para obtenção de determinado fim econômico e social. Essa cooperação admite uma visão do Estado sob a forma de empresa. O veloz crescimento da economia aproximou quase que imperceptivelmente os entes estatais dos privados, assim como o Direito Administrativo viu-se obrigado a flexibilizar conceitos e formas para satisfazer ambos os contratantes e atender aos anseios da sociedade. A arbitragem surge como uma ferramenta rápida e eficaz para solução de controvérsias decorrentes de um contrato administrativo que contenha uma cláusula compromissória. A união desses institutos cria uma nova situação no ordenamento jurídico, fazendo com que a Administração
Pública atue com eficiência, obtendo benefícios econômicos substanciais. O engessamento do Estado ganha oxigênio para acompanhar a evolução do Direito enquanto sistema de normas que regem a sociedade, a qual permanece em constante bouleversement. ABSTRACT: A subject that has generated much discussion in legal scholarship is the possibility of the government using arbitration to resolve disputes involving its agreements. Normally, Brazilian administrative law has very rigid rules without much room for flexibility. However, the relationship between public and private sectors has undergone substantial modifications. Increasingly, the private sector is more related in infrastructure and other governmental areas through partnerships to achieve certain economic and social purpose. Thus, the Administrative Law was forced to soften concepts and ways to satisfy both private entrepreneurs and the public interest as well. The arbitration arises as a quick and effective resolution of disputes under an administrative. SUMÁRIO: Introdução; 1 Uma visão contemporânea dos contratos administrativos; 1.1 Contexto atual; 1.2 A visão dos contratos administrativos sob a ótica do law and economics; 2 Da arbitragem e sua aplicação nos contratos administrativos; 2.1 Pressupostos argumentativos; 2.2 Maior eficiência da arbitragem; Conclusão.
INTRODUÇÃO Com o constante crescimento econômico do Brasil, tanto por fatores relacionados ao mercado doméstico como internacional, percebe-se cada vez mais a necessidade de investimentos no setor de energia e de infraestrutura. Ainda que o Poder Público venha reiteradamente aumentando sua arrecadação tributária, a natureza escassa do orçamento público reflete a insuficiência do Estado sozinho fazer frente a toda demanda por serviços públicos e por investimento. Daí a necessidade da cooperação da iniciativa privada. Paralela a essa evolução econômica e social do País,
surge a Lei nº 9.307/1996, ou seja, a possibilidade de as partes envolvidas em litígios, ou, ainda, no momento da elaboração das cláusulas de determinado contrato, valerem-se da arbitragem como forma alternativa de resolução de conflitos, tornando cada vez mais presente tal instituto, cujo procedimento imprime mais celeridade e expertise dos julgadores, tudo isso, não obstante, o exercício total e pleno da autonomia da vontade dos contratantes e do direito de acesso à justiça (privada). Percebe-se, na prática dos negócios, cada vez mais frequentemente a utilização desse procedimento em contratos de concessão nas áreas de energia elétrica, telecomunicações, transporte aquaviário e rodoviário, gás e petróleo, esses tipicamente entabulados via contratos administrativos. Aliás, muitos negócios só são perfectibilizados quando incluída uma cláusula compromissória prevendo a arbitragem.
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Alguns países, como Chile1 e Portugal, por exemplo, vêm adotando medidas que oxigenam a Administração Pública e sua forma de pensar e agir. Concepções antigas do direito administrativo ligadas
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1 No Chile, existe a figura dos Contratos de Concessão de Obras Públicas. Essa modalidade de contrato administrativo permite que o terceiro (concessionário) realize determinada obra pública às suas expensas, sendo que o poder concedente o autoriza, por um lapso temporal, a cobrar um valor dos usuários. Esses contratos, por força do Decreto Supremo nº 900, de 31 de outubro de 1996, daquele país, podem ser resolvidos por meio da arbitragem. A Professora Selma Lemes, ao realizar pesquisa de campo, entrevistou o Advogado chileno Rafael Ibarra Coronado, chefe da Coordenação Geral das Concessões. Naquela oportunidade, ela questionou-o se fora importante a inserção da arbitragem nos contratos de concessão de obras públicas, a que ele respondeu: “Sim, é de importância vital. Sem elas não teríamos mais de 3 (três) concessões. Não teríamos atraído as empresas, pois não teriam interesse no negócio”. Ainda na ocasião, esclarecera o advogado que o Chile mantinha 45 contratos de concessão em andamento e que haviam muitos outros em estudo (LEMES, Selma Ferreira. Arbitragem na administração pública – Fundamentos jurídicos e eficiência econômica. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 270/271).
ao século XIX dão lugar a inovações jurídicas das quais antes não se visualizava qualquer possibilidade. Uma autora portuguesa2, em sua dissertação de Mestrado intitulada “A fuga para o direito privado – Contributo para o estudo da actividade de direito privado da Administração Pública”, defende, inclusive, que o Estado dos anos 1990 encara o administrado como consumidor ou cliente, fugindo, portanto, da ideia do conceito de cidadão, modelo impresso pelo Estado liberal. Para a referida professora, “a utilização do Direito Privado por parte da Administração Pública passou a ser muito mais ampla. Raros têm sido os esforços doutrinais no sentido de reconduzir estas matérias a verdadeiras categorias sistematizadas”3. Trata-se daquele fenômeno que já chamamos em outra publicação de “privatização” do Direito Público em oposição à hiperdivulgada “publicização” do Direito Privado. A formatação com a qual o Estado passa a atuar nesse cenário econômico e social exige uma nova forma de compreensão do Direito Administrativo. A morosidade do Poder Judiciário, sua “politização”4 e a falta de conhecimento técnico para apreciar determinadas questões, por exemplo, incentivam a utilização de métodos alternativos para solução de conflitos, inclusive para questões ligadas à Administração Pública. Acredita-se que, a partir desse novo modelo jurídico, o Poder Público não seja mais visto como um inimigo da iniciativa privada, ou mesmo uma parte contratante superior5. É mais do que tempo de o 2 ESTORNINHO, Maria João. A fuga para o direito privado – Contributo para o estudo da actividade de direito privado da administração pública. Coimbra: Almedina, 1999. p. 14. 3 Idem, p. 40. 4 Expressão cunhada de PINHEIRO, Armando Castelar. Direito e economia num mundo globalizado: cooperação ou confronto? In: TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direito e economia. São Paulo: IOB-Thomson, 2005. 5 “[...] o direito administrativo nasceu como um direito do Estado enquanto administrador, passou a ser um direito do Estado e dos administradores, e tornou-se hoje, com seu núcleo constitucional e como seu prolongamen-
O presente estudo traz à baila, portanto, um assunto ainda polêmico (veja-se a posição da Advocacia-Geral da União recentemente no Parecer nº AGU/AG-12/2010, contrário à arbitragem no pré-sal) ao sugerir que, em diversos casos, a Administração Pública poderá afastar a tutela jurisdicional estatal prevista em nossa Carta Magna, diante de uma contratação com empresas, e eleger um ou mais árbitros para solucionar algum litígio. Supõe-se que essa atitude colaborativa seja a que trará maiores incentivos ao investimento privado, sem com isso gerar qualquer prejuízo ao interesse público, a não ser que se imagine que cumprir contratos negociados tenha esse risco. Lembre-se aqui da expressão cunhada por José Emilío Nunes Pinto de que a cláusula arbitral compõe a equação econômico-finaceira do negócio.
1 UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 1.1 Contexto atual A discussão quanto à origem das relações contratuais para fins de colaboração entre o Estado e os particulares já vem de longa data. Mas é a partir do século XIX que a Administração Pública passa a procurar abrigo nos contratos, tendo em vista as suas necessidades econômicas, industriais, proteção ao ambiente, políticas de energia e desenvolvimento tecnológico, etc.6 to, um direito comum dos administrados face ao Estado administrador.” (NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Mutações do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 25) 6 “Na verdade, a partir do pós-guerra, e com a passagem ao Estado Social,
Mas foi com a globalização econômica dos anos 90 do século XX que diminuíram as barreiras geográficas entre mercados e com a crise do Estado Social (déficit público) houve a necessidade de um maior estreitamento entre governos e empresas para fins de investimento em infraestrutura e energia (entre outros, como sistema prisional). O estreitamento da relação entre os setores público e privado justifica-se, outrossim, pela busca contínua e incansável das empresas rumo à inovação e ao desenvolvimento tecnológico em um embate darwiniano no mercado em busca de lucro ao qual o setor público não está submetido. Isso gera, em regra, maior eficiência das empresas e, portanto, uma inexorável necessidade da Administração Pública em aproveitar o know how de empresas privadas e, assim, melhor atender os interesses da população (tanto é assim que mesmo o capitalismo de Estado asiático atribui às empresas o papel de inovação). Contudo, se a prática social exige cooperação entre o público e o privado, boa parte da nossa legislação, a doutrina, a jurisprudência e, sobretudo, a cultura dos nossos legisladores e juristas ainda estão atreladas a um Direito Administrativo conservador e pouco flexível do século XIX de matriz francesa. Esse esquema mental não é afeito a atos de colaboração e igualdade (pelo menos do ponto de vista formal) entre o público e o privado e enxerga com desconfiança o espaço do mercado7. o enorme alargamento das funções do Estado vai determinar uma nova vitalidade à teoria dos contratos da Administração Pública. Nessa altura, porém, o enorme incremento da actividade contratual da Administração Pública vai passar a ser determinado, não apenas pelo alargamento das tarefas do Estado, mas também pelo aparecimento de uma nova mentalidade.” (Idem, p. 44) 7 Note-se que essa visão não implica assumir que o mercado tudo resolva. Muito antes pelo contrário. Como reconhecido pela literatura jurídica mais atual, é importante referir que “a Administração intervém com cada vez maior intensidade na vida social. Foi-se o tempo de Estado Gendarme,
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Estado descer do seu pedestal e virar um colaborador do seu cocontratante, gerando ganhos para ambas as partes, maior eficiência à sociedade.
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Nesse diapasão, conforme Oliveira Ascensão8, o Direito Privado não pode ser admitido como o “direito dos egoísmos individuais”, assim como o direito público, conjunto de normas balizadoras da Administração Pública, o “direito das relações de dominação”. O referido autor entende que “o progresso não está na absorção dum pelo outro, mas na sua coordenação em fórmulas sucessivamente mais perfeitas”.
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Na realidade, o “senso comum” disseminado entre muitos operadores do Direito e na literatura jurídica nacional é o de que a utilização pela Administração Pública dos institutos jurídicos do Direito Privado não ensejaria o alcance do interesse público por permitir a barganha entre os agentes públicos e os privados. Naturalmente que poderia haver confusão entre interesses públicos e privados nos contratos públicos, mas isso não é privilégio do Direito Privado. A “imunização paralisante” do Direito Administrativo brasileiro herdeiro do século XIX (ainda recheado de “cláusulas exorbitantes” e “fatos do príncipe” e licitações) não evita o conflito de interesses entre o administrador público e a Administração Pública e ainda adiciona um problema novo, que é o de não criar incentivos corretos ao investimento privado em áreas de infraestrutura e de energia.
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Ora, qual seria a intenção do Estado em realizar o exercício do poder designado pelo povo senão o interesse público? Sem dúvida, a má utilização dessas ferramentas ou para fins particulares dos governantes nos remete à ideia de corrupção. inerte guardião dos direitos individuais. O Estado hoje continua protegendo, mas também constrói estradas, promove a educação, responsabiliza-se pela saúde, interfere na economia. É incontestável que a atividade administrativa se põe muito mais complexa hoje que outrora” (SUNDFELD, Carlos Ari; MONTEIRO, Vera. Direito administrativo: introdução ao direito administrativo. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 120). 8 ASCENSÃO, José de Oliveira. O direito. Introdução e teoria geral: uma perspectiva luso-brasileira. Coimbra: Almedina, 1991. p. 311.
Contudo, devemos ter em mente que essas mesmas pessoas, aptas legalmente a valer-se da “máquina pública” para defender os interesses dos administrados, mesmo quando dentro do princípio da legalidade, em alguns casos (ou muitos infelizmente), auferem vantagens econômicas ilícitas em prol dos seus próprios interesses. Portanto, não podemos achar que a utilização de ferramentas do Direito Privado só serviria para favorecer alguma classe ou alguém, mas sim propiciar ao Estado um crescimento veloz, que acompanhe a economia global.
1.2 A visão dos contratos administrativos sob a ótica do law and economics Importante salientarmos que os contratos também funcionam como “termômetros” da economia; observados o seu cumprimento e a respeitabilidade do que fora previamente acordado, teremos maior segurança para realização de negócios e, consequentemente, mais atrativos para os investidores. Selma Lemes9 afirma que a Administração Pública direta ou indireta, ao conduzir seus atos administrativos por meio dos contratos por ela firmados, produz efeitos economicamente mais rentáveis, na medida em que concede aos contratos repercussões positivas no tocante à “otimização de recursos públicos”. Assim, a partir do momento em que percebemos que essa otimização dos recursos decorrentes da utilização correta dos contratos administrativos dotados de maior flexibilidade e ductibilidade não seria equivocada, concluímos que se está a reduzir, portanto, os “custos de transação”10 oriundos de determinados atos administrativos. 9 LEMES, Selma Ferreira. Op. cit., p. 150. 10 Cf. defendemos já, o “custo de transação” é expressão utilizada no jargão econômico que traduz os custos para negociar e fazer cumprir os contra-
Nesse sentido, precisamos de um Direito Administrativo que reforce a barganha das partes e que, portanto, valorize os contratos, percebendo que os pactos celebrados sob a égide desse instituto são fios condutores para celebração de negociações mais seguras e, não obstante, entendida como uma alavanca para uma economia sólida sob o ponto de vista dos investidores. Segundo Décio Zylbersztajn e Rachel Sztajn11, o conceito básico de economia nos custos de transação é que existem problemas futuros potenciais nos contratos, problemas esses que são antecipados pelos agentes que desenham os arranjos institucionais no presente. Parte do pressuposto que os agentes podem descumprir promessas, motivados pelo oportunismo e pela possibilidade de apropriação de valor dos investimentos de ativos específicos. Na impossibilidade de desenhar contratos completos (decorrência da tos (TIMM, Luciano Benetti. Arbitragem e sociedade de economia mista. Superior Tribunal de Justiça. AES Uruguaiana Empreendimentos Ltda. vs. Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). Revista Brasileira de Arbitragem, v. 15, p. 166-176, 2007). 11 ZYLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel. Análise econômica do direito e das organizações. In: ZYLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel (Org.). Direito & Economia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p. 8.
racionalidade limitada), as lacunas são inevitáveis. Os agentes potencialmente oportunistas sentir-se-ão estimulados a romper ou adimplir os contratos, sendo justificável a existência de um corpo legal, formal, de normas, que se soma às regras informais, para disciplinar o preenchimento das lacunas.
Selma Lemes refere que o cumprimento dos contratos está diretamente ligado aos custos relativos a adimpli-los ou inadimpli-los12. Nessa senda, é incumbência do Direito Administrativo implementar políticas que incentivem e induzam as partes à cooperação e para a observância do que fora entabulado originalmente, fazendo valer o princípio do pacta sunt servanda, ou seja, as instituições estatais são quem determinarão o aumento do volume das negociações, estimulando a entrada de divisas ou a diminuição. O fato é que um Direito Administrativo muito inflexível poderia impedir a ocorrência de negócios que seriam socialmente eficientes (dados os custos de transação decorrentes da imprevisibilidade, da constante mudança das regras do jogo, etc.). Entretanto, o Estado brasileiro parece estar se adaptando a essa nova forma de concepção acerca dos contratos administrativos, assim como vem mudando sua mentalidade sobre essas contratações a ponto de reconhecer o fato de não conseguir mais realizar grandes empreendimentos sem o auxílio do capital privado. Trata-se de uma realidade econômica e de mercado13. Conforme já defendemos, o Estado vem abdicando de algumas prerrogativas caracterizadoras do Direito Administrativo, para se 12 LEMES, Selma Ferreira. Op. cit., p. 163. 13 TIMM. Luciano Benetti; DRUCK, Tatiana Oliveira. O contrato de parcerias público-privadas no ambiente contratual brasileiro. In: TIMM. Luciano Benetti; CASTRO, José Augusto Dias de (Org.). Estudo sobre as parcerias público-privadas. São Paulo: IOB-Thomson, 2006. p. 157.
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Lembremos aqui o Teorema de Coase, no sentido de que a atuação legislativa do Estado é fundamental na sociedade justamente pela impossibilidade (dados os elevados custos de transação) de se criarem todas as regras jurídicas para dirimir todos os conflitos privados. Mas essa intervenção estatal deve sempre levar em conta os efeitos da legislação no comportamento das pessoas (tomadas sempre como racionais); e que só deve acontecer quando as partes não forem capazes de chegar por si mesmas à melhor solução (mais eficiente), sob pena de impedir determinadas transações de ocorrerem no mercado (como foi o caso dos contratos de leasing em dólar logo após as salomônicas decisões do STJ sobre o tema).
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tornar um contratante no mercado, possibilitando o estreitamento das relações contratuais entre os entes públicos e privados14. Os comportamentos oportunistas do governo, valendo-se do seu poder de império, também são abarcados pela análise econômica do Direito. Essas atitudes classificadas como “a falta de sinceridade e honestidade nas transações”15 colocam impasse na hora da negociação, concepção essa entendida no meio jurídico como a falta da boa-fé contratual. A Revista Update16 apresenta um estudo realizado pela empresa de auditoria KPMG, no qual demonstra um avanço considerável nos próximos cinco anos, somente no setor de infraestrutura, podendo ser investidos R$ 80 bilhões por meio dos contratos de parceria público-privada.
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A nova visão do Direito Administrativo implica dizermos que a Administração Pública está tendendo a inclinar-se para uma visão de negociação17, com maior abertura de espaço para diálogos entre as esferas públicas e privadas, vislumbrando, assim, uma nova forma de governança estatal. A imposição de cláusulas exorbitantes, tomadas de decisões unilaterais sem qualquer preocupação com o reflexo econômico, cede lugar para um tratamento mais igualitário quando estamos diante de um contrato, no qual uma das partes seja o Estado18.
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14 Idem, p. 152. 15 Idem, p. 165. 16 GOITIA, Vladimir. Infraestrutura: no buraco. Update: negócios no centro-oeste. Edição especial. São Paulo, n. 426, p. 23-24, maio 2006. 17 NETTO, Cássio Telles Ferreira. Contratos administrativos e arbitragem. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. p. 32. 18 “Qualquer espécie de restrição à liberdade deve, pois, estar fundamentada em um ganho qualquer para a sociedade. A lei é de ser interpretada. Nem se venha argumentar que a Administração, porque vinculada à lei, não pode alçar vôos de hermenêutica no cumprimento de suas atividades. Os
Para afastar óbices que relativizam a idoneidade dos contratos, incumbe às partes contratantes priorizar formas que atendam a confiabilidade de ambos e que produzam ganhos recíprocos. Nesse contexto, “os advogados são [considerados] engenheiros de custos de transação”19. No entanto, ainda que o setor público adote uma postura mais cooperativa para atrair investimentos e isso se reflita em um Direito Administrativo mais atualizado e reinventado, ainda assim existirá sempre a lacuna no contrato a ser integrada por algum terceiro imparcial quando as partes não chegam a um entendimento. É a chamada incompletude dos contratos na literatura econômica. Nosso argumento é o de que um árbitro tende a cumprir melhor o papel de completar os contratos incompletos do que o Poder Judiciário.
2 DA ARBITRAGEM E SUA APLICAÇÃO NOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 2.1 Pressupostos argumentativos O que antes era tido como um procedimento programático e ineficaz, hoje, após uma revolução legal e cultural no País depois da grilhões que prendem o agente público às regras não são tão robustos a ponto de inibir-lhe completamente a liberdade de raciocínio. Assim como não se admite discricionariedade absoluta, não existe também vinculação inarredável; não se pode entender que se pratiquem, em nome da lei, atos contrários ao interesse público.” (TRF 4ª R., Agravo de Instrumento nº 2006.04.00.024041-4/RS, Rel. Juiz Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Julgado em 03.08.2006. Disponível em: <http://www.trf4.jus.br/trf4/jurisjud/ inteiro_teor.php?orgao=1&numeroProcesso=200604000240414&dataPub licacao=16/08/2006>. Acesso em: 3 set. 2008) 19 PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito e economia num mundo globalizado: cooperação ou confronto? In: TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direito e economia. São Paulo: IOB-Thomson, 2005. p. 47.
O pensamento sobre o instituto vem angariando cada vez mais adeptos em nosso País, de modo que, no ano de 2006, o Brasil ocupou posição destacada e empresas nacionais foram as quartas em volume de arbitragens no ranking da Câmara de Comércio Internacional entre os 142 países que mais utilizaram a arbitragem. É público e notório o fato de que o crescimento e a conscientização na cultura jurídica de que tal instituto é sim uma via proveitosa para as partes contratantes, a qual vem sendo cada vez mais explorada. Sabemos que o processo judicial não tem custo zero (a começar pelas taxas judiciais e de sucumbência e ainda o custo de oportunidade) e que muitas vezes os juízes não estão preparados tecnicamente para decidir sobre alguma matéria, cuja complexidade não lhes permite aplicar a decisão correta e justa ao caso concreto, não esquecendo, obviamente, o moroso e engessado processo judicial que perdura durante anos, deixando as partes ao alvedrio de um sistema complicado. Dito isso, o ponto de partida para a discussão central deste artigo reside no art. 1º da Lei de Arbitragem, referente aos direitos patrimoniais disponíveis. Em princípio, seriam disponíveis aqueles direitos em que as partes podem dispor livremente ou, ainda, aqueles passíveis de 20 WALD, Arnold. Novos rumos para a arbitragem no Brasil. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 14, 2001. p. 341.
negociação, cujos bens estejam livres no mercado sem qualquer impedimento, possibilitando, assim, que se submetam à arbitragem para resolução de eventual conflito como forma do exercício da autonomia da vontade. Inicialmente, os bens públicos estariam jungidos pela indisponibilidade dos interesses públicos, não sendo resolvidos por essa forma alternativa de pôr fim aos litígios. Cumpre demonstrar que a jurisprudência nacional vem se mostrando favorável ao reconhecimento da intenção das partes em utilizarem a arbitragem como fonte alternativa para resolução dos seus conflitos, como sugere a pesquisa do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr) e da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, a qual desenvolveu um projeto para investigar a relação entre arbitragem e o Poder Judiciário, cujo objetivo é compreender como os Magistrados brasileiros estão aplicando os dispositivos da LA21. Assim como a jurisprudência demonstra estar se curvando ao procedimento, as discussões acadêmicas, artigos jurídicos, notícias e doutrinas que tratam da matéria também começam a debater o tema. O Estado parece estar se aproximando e precisando do auxílio da iniciativa privada, cada vez mais (embora com algumas resistências, como já enunciado neste trabalho). Tendo, em consequência disso, que se adaptar aos preceitos da eficiência econômica, adequando os seus contratos ao mercado versátil no qual estamos inseridos. Um posicionamento histórico impondo igual relevância sobre o instituo em apreço foi a sugestão do Consultor Geral da República Themístocles Brandão Cavalcanti22 nos idos de 1955. 21 Disponível em: <http://www.cbar.org.br/bib_pesquisa_fgv_cbar.html>. Acesso em: 12 set. 2010. 22 CAVALCANTI, Themístocles B. Concessão de serviço público. Encampação. Juízo arbitral. Revista de Direito Administrativo, p. 45-517, jul./set. 1956.
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publicação da Lei nº 9.307 (Lei de Arbitragem, ou simplesmente LA), passou a ser frequentemente empregado em contratos empresariais e societários, vindo a assumir a preferência dos agentes econômicos devido a sua adequada e rápida solução obtida quando provocada e instaurada sua jurisdição20.
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Contudo, as decisões judiciais começam a trilhar seu caminho em prol da arbitragem com o “Caso Lage”, no qual o Supremo Tribunal Federal, no ano de 1973, reconheceu a utilização da arbitragem como forma alternativa de resolução de conflitos em contratos administrativos.
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até então existente acerca da arbitragem, permitindo-lhe a sua inserção nesses instrumentos.
2.2 Maior eficiência da arbitragem
Percebemos que o instituto recebeu, genericamente falando, por meio desses históricos precedentes, e vem recebendo, de acordo com os julgados que mostraremos mais adiante, a chancela do Poder Judiciário no que tange às contratações realizadas pelo Estado, inserindo, em seus contratos, cláusulas que autorizem a instituição do Juízo Arbitral.
Para Marcos Nóbrega, os contratos administrativos, em sua grande maioria, são incompletos24, de modo que a arbitragem é uma boa opção para resolver as divergências advindas dessa relação jurídica estabelecida. E, ainda, completa: “Tal assertiva se justifica pela maior expertise do árbitro em lidar com complexos contratos de infraestrutura em comparação com o judiciário, além da condição de maior celeridade para resolução do conflito”25.
As modernas legislações existentes amoldaram-se para possibilitar ao ente público a utilização da arbitragem em contratos administrativos que envolvam como objeto o setor das telecomunicações, o transporte aquaviário, a comercialização de energia elétrica, nas concessões para exploração e produção de petróleo e gás, mais uma gama de outras situações.
Por que a arbitragem funciona bem em contratos incompletos? Porque o árbitro (dadas as características desse modo de solução de controvérsias) está em melhores condições de completar o contrato (porque é um expert na área em discussão) de modo mais eficiente (melhor qualidade e a um custo econômico, em sentido amplo, menor).
Ao encontro do que dissemos anteriormente, a Lei das PPPs, como assim é conhecida a Lei nº 11.079/2004, em seu art. 11, III, autoriza a utilização da arbitragem como meio legal de contratação, inovando os contratos firmados pela Administração Pública, os quais também são regulados pelas Leis nºs 8.666/1993 e 8.794/1995.
A par disso, o árbitro está em melhores condições de flexibilizar e modernizar a interpretação dos contratos administrativos. O exercício da advocacia empresarial dá aos árbitros a percepção de como os contratos são negociados na prática, a barganha que é feita entre as partes e as necessidades dos clientes. In-
Observadas as inovações ora apresentadas, cumpre-nos afirmar que nem todos os contratos administrativos dispõem sobre direitos patrimoniais indisponíveis23, expulsando o preconceito 23 “Assim, não há falar-se em indisponibilidade absoluta, mas relativa, pois é indubitável que, para atingir os fins colimados e objetivados pelo interesse público, a Administração conta com certa parcela de liberdade para agir, dispor e contratar, tudo para atingir o mister de realizar suas atribuições focadas no interesse público, no interesse geral.” (LEMES, Selma Ferreira. Op. cit., p. 128)
24 Contratos incompletos, segundo Marcos Nóbrega, são aqueles incapazes de “traduzir todas as necessidades e tensões que convergem para a seara contratual”, pois devem “resolver conflitos distributivos entre as partes e absorver choques externos” (NÓBREGA, Marcos. Contratos incompletos e infraestrutura: contratos administrativos, concessões de serviços públicos e PPPs. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (Redae), Salvador: Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 18, maio/jun./jul. 2009. Disponível em: <http://www.direitodoEstado.com/ revista/REDAE-18-MAIO-2009-MARCOS-NOBREGA.pdf>. Acesso em: 21 ago. 2010). 25 Idem.
Nesse sentido, um estudo realizado pelo Advogado Maurício Gomm26, no que concerne ao posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, refere que os contratos administrativos regem-se pelas cláusulas e preceitos de Direito Público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios de Direito Privado, o que vem a reforçar a possibilidade de adoção do juízo arbitral para dirimir questões contratuais.
E, ainda, leciona Eros Grau27, atinente à possibilidade em estudo: [...] quando se afirma que a arbitragem se presta para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, isso não significa que não possa a administração socorrer-se dessa via, visando ao mesmo fim. Pois não há qualquer correlação entre disponibilidade ou indisponibilidade do interesse público. Dispor de direitos patrimoniais é transferi-los a terceiros. Disponíveis são os direitos patrimoniais que podem ser alienados. A administração, para a realização do interesse público, pratica atos da mais variada ordem, dispondo de determinados direitos patrimoniais, ainda que não possa fazê-los em relação a outros deles [...].
administrativos. De acordo com Selma Lemes28, em Portugal foi expedida uma resolução pelo Conselho de Ministros, no ano de 2001, orientando o setor público a utilizar a arbitragem. De fato, verificamos que a legislação anda ao encontro da arbitragem, referindo-se aos contratos administrativos. A economia mundial, bem como o mercado, no afã de buscar por soluções mais céleres, e nisso o Poder Público reconhece a necessidade para manter os índices econômicos em patamares de concorrência, somado ao fato de os contratos serem fatores determinantes de um poder econômico forte, deduz ser a arbitragem um atrativo aos investidores, de modo que, mesmo diante de uma contratação do Estado com o ente privado, os benefícios são interessantes, pois: a) Contribui para aprimorar a governabilidade dos Estados contemporâneos, constituindo vantagem em termos de eficiência; b) Propicia mecanismo de controle e prevenção contra o abuso do poder estatal, o que representa uma conquista no campo da legalidade; c) Estimula a participação mais consciente e responsável das partes envolvidas, o que certamente valoriza a cidadania e possibilita o alcance de decisões mais justas às partes e, portanto, mais facilmente cumpridas, representando aperfeiçoamento no campo da legitimidade.29
Os argumentos que antes colocavam barreiras à utilização da arbitragem nos contratos administrativos estão sendo superados. Novas formas de contratualização vêm ganhando força frente à doutrina arraigada em princípios que obstaculizavam negócios e afastavam investidores externos, admitindo, portanto, o juízo arbitral para o deslinde de controvérsias no âmbito dos contratos
Em face do anteriormente exposto, a PricewaterhouseCoopers, em 2006, por meio de um estudo, International Arbitration: a study into corporate attitudes and practices, constatou que os aspectos de flexibilidade no procedimento, a privacidade das partes e a livre escolha do árbitro ou árbitros que julgarão a
26 GOMM, Maurício. Brasil: rápidas considerações sobre a arbitragem em contratos de parcerias público- -privadas. Revista de Mediação e Arbitragem Empresarial, Brasília, n. 11, p. 35, fev. 2005. 27 Eros Grau apud GOMM, Maurício. Op. cit.
28 LEMES, Selma Ferreira. Uso da arbitragem na administração pública. Jornal Valor Econômico. Disponível em: www.valoronline.com.br. Acesso em: 4 out. 2008. 29 NETTO, Cássio Telles Ferreira. Op. cit., p. 33.
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felizmente, essa passagem pelo setor privado não é presente na carreira da Magistratura nacional, fazendo com que muitos juízes de carreira criem certos preconceitos (além de terem um esquema mental mais dogmático, até pela exigência de aprovação em rígidos e concorridos concursos públicos).
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lide são critérios que incentivam o meio empresarial a utilizar a arbitragem30. A prática ilustra os avanços significativos e as vantagens obtidas, como, por exemplo, os contratos de concessão vinculados à ampliação da Rodovia dos Imigrantes, em São Paulo, e a construção do Eurotúnel, em cujas situações a arbitragem foi largamente utilizada. Não obstante, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios31 esclareceu que se aplicam aos contratos administrativos a legislação privada, ao tratar da cláusula de arbitragem em um contrato de saneamento de esgoto firmado pela Caesb – Companhia de Saneamento do Distrito Federal.
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Como não poderia ser diferente, decisões oriundas do Poder Judiciário começam a aparecer de forma a tornar mais visível a mudança do pensamento dos operadores do direito. O leading case AES Uruguaiana Empreendimentos Ltda. x CEEE – Companhia Estadual de Energia Elétrica tornou possível a inserção, bem como reconheceu a validade da cláusula compromissória nos contratos firmados pela Administração Pública com o particular.
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Assim, nos contratos administrativos firmados pelo Estado, que versarem sobre serviços públicos de natureza industrial ou atividade econômica de produção ou comercialização de bens, desde que visem ao lucro, os direitos e obrigações deles emanados serão considerados como disponíveis, logo, poderão submeter-se à arbitragem. Ao contrário daqueles exercidos em decorrência do poder de império da Administração Pública, 30 PricewaterhouseCoopers (Inglaterra). International Arbitration: a study into corporate attitudes and practices. Londres, 2006, p. 32. Disponível em: <http://www.pwc.com/Extweb/pwcpublications.nsf/docid/0B3FD76A855 1573E85257168005122C8>. Acesso em: 19 set. 2008. 31 Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Apelação Cível nº 2001.01.1.002704-2, 2ª Turma Cível, Rel. Des. Teófilo Caetano, Julgado em 13.08.2008. Disponível em: www.tjdft.jus.br. Acesso em: 17 set. 2008.
cujas atividades econômicas figuram como direitos indisponíveis, não podendo estipular cláusula compromissória ou compromisso arbitral em virtude de estarem relacionados com o interesse público primário32. Afirma o Relator do leading case que o contrato de serviço público, posto à discussão daquela Corte, tendo como objeto a compra e a venda de energia elétrica comercializada por uma empresa estatal, não há que referir a imposição de qualquer óbice com a finalidade de barrar a inicialização da arbitragem naquele caso, em se tratando de um contrato administrativo. Assim, uma vez que a atividade-fim visa ao lucro, estaríamos diante de um interesse público secundário, pois o bem é negociável e, inclusive, possui valor de mercado. Trata-se de atos praticados pela administração e orientados pelo Estado, o que pressupõe sua disponibilidade tendo em vista que é oriundo do interesse público primário33. Outro julgado importante que vai ao encontro do nosso estudo, também emanado do Superior Tribunal de Justiça, foi a decisão do Mandado de Segurança nº 11.308, advindo do Distrito Federal, publicado em 19.05.2008. Trata-se de mandado de segurança impetrado contra a Portaria Ministerial nº 782, de 07.12.2005, expedida pelo Ministro de Es32 Define Celso Antonio Bandeira de Mello que interesse público primário é aquele “que a lei aponta como sendo o interesse da coletividade: da observância da ordem jurídica estabelecida a título de bem curar o interesse de todos” (MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 22). 33 Para Sérvulo Correia, o interesse público não é o elemento essencial do direito administrativo, de modo que “a Administração Pública, ao utilizar meios de direito privado, é ainda o interesse público que está a guiá-la” (CORREIA, José Manuel Sérvulo. Os princípios constitucionais da administração pública. In: Estudos sobre a Constituição. Lisboa: Livraria Petrony, v. 3, 1979. p. 662).
tado de Ciência e Tecnologia, ratificando a rescisão contratual intentada pela Nuclebrás Equipamentos Pesados S/A – Nuclep, a qual mantinha contrato de arrendamento para administração, exploração e operação do terminal portuário e de área retroportuária com a empresa TMC – Terminal Multimodal de Coroa Grande S/A.
Portanto, é tranquilo o entendimento nas instâncias máximas do Poder Judiciário de que o exercício da jurisdição privada, como assim é concebida, não fere em princípio a garantia constitucional do juiz natural (art. 5º, LII, da Constituição Federal de 1988), bem como, a inafastabilidade de qualquer ameaça ou lesão ao direito da jurisdição estatal (art. 5º, XXXV, da Carta Magna).
O referido contrato possuía cláusula compromissória, obrigando as partes a submeterem qualquer oposição de interesses à via arbitral. Contudo, ante a insurgência da impetrada diante do mandado manejado, a qual não mediu esforços para “derrubar” e tornar inválida a cláusula, entendeu o Judiciário que sociedades de economia mista podem optar pela arbitragem.
Contudo, mesmo após destacarmos diversas pesquisas, artigos jurídicos e até julgados dos tribunais superiores, há de atentarmos para o fato de as decisões que fragilizam todo o esforço de apresentar o Brasil como um rentável destinatário de investimentos dos agentes externos, o qual é visto como um Estado que utiliza mecanismos eficientes dentro de uma economia global.
34 Segundo o juiz de primeiro grau que prolatou a sentença, “a jurisprudência já se pronunciou diversas vezes sobre a possibilidade de uma sociedade de economia mista – que é a natureza da Copel – utilizar o instituto da arbitragem, desde que se trate de ato de gestão, de direito patrimonial de caráter disponível. Outra não é a natureza de contratos de venda e compra de energia elétrica, tais como os debatidos nos autos. Não é possível ampliar o conceito de indisponibilidade para albergar relações contratuais em que a autora, sob a alegação de nulidade, diverge de empresas contratantes quanto à obrigação de pagar decorrente de obras ou serviços prestados”. Complementou a Desembargadora Relatora do Acórdão: “Dessa forma, uma vez convencionado pelas partes que a solução de eventual controvérsia se dará via arbitragem, não poderá um dos interessados, unilateralmente, afastar a submissão ao juízo arbitral para resolver a questão perante o Poder Judiciário” (Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Apelação Cível nº 0000249-07.2007.404.7000/PR, 4ª T., Relª Desª Marga Inge Barth Tessler, Julgado em 02.06.2010. Disponível em: www.trf4.jus.br. Acesso em: 27 jul. 2010).
Se parece tranquilo hoje, no Poder Judiciário, o entendimento de que em sociedades de economia mista (e outras situações com interesses públicos secundários) haja a possibilidade de utilização da via arbitral, ainda não há certeza de como será a interpretação desse mesmo Judiciário em relação a contratos firmados diretamente por União, Estados e Municípios em situações em que, hipoteticamente, se poderiam caracterizar como interesses primários da Administração. Sustentamos aqui que, mesmos nesses casos, o direito em jogo poderá ser disponível e, portanto, arbitrável. Contratos de infraestrutura, via de regra, envolvem direitos disponíveis da Administração Pública. Aliás, é difícil encontrar direitos indisponíveis negociados por contrato. Afinal, como ter contratos (que são atos voluntários) sobre direitos indisponíveis in abstrato? É mais perceber, imaginar, o Direito Administrativo como cogente às partes e ao árbitro, e os direitos negociados via contrato como disponíveis. Assim, por tudo o que dissemos até o presente momento, existem sólidos argumentos para sustentar a legalidade da faculdade conferida e autorizada ao Estado para inserir, nos seus contratos, a cláusula compromissória de arbitragem, a qual poderá submeter
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Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao julgar um recurso de apelação que discutia a validade da arbitragem em contratos firmados pela Administração Pública, manteve a decisão de primeiro grau que extinguiu o feito sem julgamento de mérito, determinando que a demanda fosse conduzida pelo juízo arbitral34.
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seus litígios ao juízo arbitral, não existindo suficientes argumentos capazes de minar a contratação da qual referimos, tampouco, arguir nulidade desse dispositivo contratual, a não ser categorias dogmáticas vazias como “interesse primário” e “interesse público”, que são conceitos, no mais das vezes, preenchidos por ideologias ou preconceitos oriundos do século XIX. Categorias jurídicas dogmáticas não podem sobrepor-se às necessidades econômicas e sociais (muito antes pelo contrário, como se deduz do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil). A interpretação jurídica deve moldar as regras à realidade e não o contrário.
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Os fatores econômicos antes ilustrados lançam luz no procedimento arbitral como uma forma de flexibilizar as negociações, contribuindo para uma economia de mercado mais eficiente e melhor vista perante os players do mercado internacional, atraindo, portanto, mais investimentos para o nosso País.
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A arbitragem, dessa forma, vigora na atualidade como uma alternativa adequada e eficaz para os contratos administrativos. A uma, porque é mais célere, reduzindo os custos de transação das partes. A duas, porque pressupõe maior expertise do árbitro, reduzindo a assimetria de informações entre os agentes de mercado e os julgadores. A três, porque se pode esperar maior neutralidade do árbitro, se comparado a um Magistrado togado, sendo o emprego da arbitragem uma boa “sinalização” ao mercado (no jargão econômico). E, ainda, o Poder Judiciário sempre poderá controlar o conteúdo da decisão via ação anulatória do art. 29 da LA, não se tratando de uma renúncia total e completa do Poder Judiciário.
CONCLUSÃO É visível que o Estado necessita de investimentos privados e parcerias entre setor público e privado e, para isso, há de se
admitir um Direito Administrativo mais flexível e mais adequado ao princípio da eficiência na Administração Pública. Um sistema respaldado nesse princípio basilar da análise econômica do Direito não tende a admitir que o Poder Judiciário altere os efeitos de determinada relação contratual, claro que quando despida dos vícios do negócio jurídico. As decisões que emanam do Judiciário, assim como nos contratos, proporcionam expectativas aos agentes econômicos, de modo que, ao serem proferidas, estipula-se o “preço”, servindo como base para aumentar ou reduzir os custos da negociação. Não podemos deixar de citar, ainda, os ganhos do Estado na esfera econômica. A cláusula compromissória marca nos contratos a confiabilidade do adimplemento das obrigações estipuladas naquele instrumento, fato que atrai não só os investidores privados, mas também os estrangeiros para nossa economia, uma vez que o cumprimento dos contratos possui efeitos macroeconômicos à medida que funciona como um termômetro da economia local. A arbitragem, portanto, vigora na atualidade como uma alternativa adequada e eficaz para interpretar, completar e resolver conflitos atinentes aos contratos administrativos, em que pese juristas mais conservadores e detentores de um esquema mental oriundo do século XIX tentarem impor obstáculos a essa forma de pensamento. Mesmo assim, a evolução do Direito, enquanto conjunto de normas que ao menos devem acompanhar a sociedade, transpõe gradativamente as dificuldades dogmáticas ainda encontradas, demonstrada por meio da mudança das legislações somadas aos novos entendimentos jurisprudenciais e de práticas de vários entes do Poder Executivo (exemplificativamente os Estados de Minas Gerais, São Paulo e, mais recentemente, do Rio Grande do Sul), fortificada com uma doutrina que afirma com propriedade que é possível, como regra, os contratos administrativos estipularem cláusula compromissória como via adequada para a solução dos conflitos (sejam os interesses públicos em jogo ditos “primários” ou “secundários”).
Doutrina
Da Possibilidade de Fiança Como Medida Alternativa à Prisão Cautelar nos Crimes de Tráfico de Drogas MATEUS MARQUES
the Law nº 11.343/2006 (drug traffic). Thus, it is argued on the subject in study on the possibility of fixing the mentioned alternative injunction to jail even before explicit legal prohibition. KEYWORDS: Precautionary prison; bail; drug traffic; alternative measures. SUMÁRIO: Considerações iniciais; I – Das alterações advindas com a Lei nº 12.403/2011 em relação às prisões cautelares e a fixação de fiança como medida alternativa ao cárcere; II – Do respaldo constitucional para a possibilidade de utilização de medida cautelar não prevista em lei em favor do réu; III – A fixação da fiança como medida alternativa ao cárcere nos crimes de tráfico de drogas; Considerações finais; Referências.
Professor da Estácio/FARGS, Mestrando em Ciências Criminais pela PUCRS, Especialista em Ciências Penais pela PUCRS, Advogado Criminalista.
MARÇAL CARVALHO
Professor da ULBRA/Torres, Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS, Especialista em Ciências Penais pela PUCRS, Advogado Criminalista.
RESUMO: A discussão que ora se propõe tem como objetivo principal aprofundar os estudos em relação às alterações advindas com a Lei nº 12.403/2011, principalmente no que se refere à possibilidade de fixação do instituto da fiança para os crimes oriundos da Lei nº 11.343/2006 (tráfico de drogas). Ademais, argumenta-se quanto ao tema em estudo sobre a possibilidade de fixação da referida medida cautelar alternativa ao cárcere mesmo diante de expressa vedação legal. PALAVRAS-CHAVE: Prisão cautelar; fiança; tráfico de drogas; medidas alternativas. ABSTRACT: The discussion that is now proposed aims to go deep in the study of the changes introduced by the Law nº 12.403/2011, especially as regards the possibility of fixing the Institute of bail for crimes arising from
CONSIDERAÇÕES INICIAIS O instituto da fiança no processo penal, antes da entrada em vigor da Lei nº 12.403/2011, era compreendido apenas como medida de contracautela que substituía a prisão em flagrante, mediante a prestação de caução, assumindo o agente, como condição de manutenção de sua liberdade. Com o advento da “nova lei”, que alterou o sistema de prisão, de liberdade provisória e, ainda, inseriu diversas medias cautelares alternativas à prisão, além de revitalizar o instituto da fiança (completamente esquecido e sem aplicabilidade até então), dando um novo sentido, como o compromisso de cumprir certas obrigações processuais (pagamento das despesas processuais, multa e indenização, em casos de condenação), cabendo sua aplicação aos crimes em que a pena privativa de liberdade não seja superior a 4 anos.
Diante das constantes mudanças em nosso ordenamento jurídico, principalmente em relação às decisões judiciais, tem-se visto que é possível a aplicação do instituto da fiança mesmo para os crimes considerados “inafiançáveis”, pois, sendo medida autônoma da liberdade provisória1, o Magistrado, ao fazer uso de outra medida cautelar não prevista em lei, mantendo o controle de pertinência e adequação (além da proporcionalidade), evitando, por vezes, o descontrole em relação às restrições de direitos fundamentais, ficando em suas mãos uma alternativa para se evitar uma desproporcional decretação da prisão cautelar.
fundamento no art. 319, também do CPP, salvo nos casos de vedação ou impedimento.
Não almeja o presente estudo versar sobre a (i)legalidade na concessão de fiança aos crimes considerados inafiançáveis, mas sim discutir sobre o fato de que a prisão deve ser considerada a ultima ratio do sistema cautelar, autorizada, também nesses casos, quando não houver outra medida alternativa que satisfaça tal pretensão.
Diante das referidas alterações, e ainda diante da nova redação do art. 310 do CPP, o Magistrado, ao receber o auto de prisão em flagrante, deverá: a) relaxar a prisão; b) converter em preventiva se presentes os requisitos do art. 312 do CPP e se se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; c) conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
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I – DAS ALTERAÇÕES ADVINDAS COM A LEI Nº 12.403/2011 EM RELAÇÃO ÀS PRISÕES CAUTELARES E A FIXAÇÃO DE FIANÇA COMO MEDIDA ALTERNATIVA AO CÁRCERE
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O sistema cautelar do processo penal sofreu ampla readequação em sua estrutura a partir da promulgação da Lei nº 12.403/2011. Além de reorganizar as questões relativas à prisão e à liberdade provisória, restabeleceu o prestígio do instituto da fiança, tornando regra a admissibilidade de sua concessão em dois momentos: a) como condição imposta na concessão da liberdade provisória, de acordo com o art. 310 do Código de Processo Penal (CPP); e b) como medida cautelar diversa à prisão, com 1 LOPES JUNIOR, Aury. (Prisões cautelares) Lei nº 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 179.
Encerra-se, assim, a angustiante dicotomia entre o cárcere e a liberdade, que eram os dois extremos existentes ao longo da persecução penal, em uma verdadeira bipolaridade2 cautelar do sistema brasileiro. Assim, insere-se um rol de medidas alternativas não tão extremas quanto o cárcere, nem tão brandas como a mera manutenção da liberdade do agente, até então condicionada ao mero comparecimento aos atos da persecução penal.
Segundo a lei, o valor ou bens pagos como fiança terá(ão) como objetivos custear o processo, as possíveis indenizações, a prestação pecuniária ou a multa, em caso de condenação (art. 336 do CPP). Mas é preciso cuidado quanto ao valor fixado, pois, quanto mais elevado o valor da fiança, mais desigual o processo penal, mais favoritismo para os maiores detentores do capital. Por outro lado, importante mencionar que a liberdade provisória com a proibição da fiança é fruto de um delírio legislativo3, fundamentado na Carta Magna, que previu a inafiançabilidade para vários e graves delitos. Analisando superficialmente, a ideia parece ter sido a proibição de qualquer restrição de liberdade para aquele preso em crime inafiançável, tremendo equívoco, 2 TÁVORA, Nestor; RODRIGUES ALENCAR, Rosmar. Curso de direito processual penal. 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2013. p. 665. 3 PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 586.
Ainda, e como as demais medidas cautelares diversas, dependendo da situação que se apresenta, a fiança pode ser aplicada de forma isolada ou cumulada com outra prevista no art. 3194 do Código de Processo Penal e tem como função precípua assegurar o comparecimento a atos do processo, bem como evitar obstrução do seu andamento ou em caso de resistência à ordem judicial. Nos dois primeiros casos, é manifesta a tutela do processo, seja pelo viés de tutela da prova, seja para assegurar a aplicação da lei penal5. 4 “Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX – monitoração eletrônica.” 5 LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 894.
Entretanto, com a previsão de um elenco de medidas cautelares, inseridas no art. 319 do CPP, tem-se a vantagem, atualmente, de indicar ao Magistrado, de forma exemplificativa, a ampla possibilidade de aplicação de medidas diversas da prisão preventiva, ou seja, delimitando de certa forma as regras do jogo, deixando que a decretação da prisão de alguém ocorra em último caso. Assim, leciona com razão Alexandre Morais da Rosa, quando refere sobre as regras do jogo (processo): Embora se tenham regras processuais dispostas na Constituição Federal e ainda no Código de Processo Penal, em cada processo individualizado, com seu julgador e seus jogadores6, acontecerá jogo único. As diversas compreensões comporão o fenômeno processual numa verdadeira fusão de horizontes, naquilo que se chamou de bricolage de significantes.7
Desse modo, embora a existência de um rol expresso de medidas cautelares adversas ao cárcere, nada impede que o Magistrado estabeleça outras tantas que sejam adequadas ao caso concreto, inclusive buscando em outras leis penais especiais esse entendimento, desde que, é claro, não exceda os limites autorizados pela legislação.
II – DO RESPALDO CONSTITUCIONAL PARA A POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR NÃO PREVISTA EM LEI EM FAVOR DO RÉU O enfoque constitucional, no que concerne aos direitos e garantias inerentes à dignidade da pessoa humana e ao devido
6 MORAIS DA ROSA, Alexandre. Guia compacto do processo penal conforme a teoria dos jogos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013. p. 24. 7 Idem, p. 167.
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pois a própria Constituição exige que, em razão de qualquer modalidade de prisão, seja feita por meio de ordem escrita e fundamentada por autoridade judiciária competente.
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processo legal, aliado aos ditames de direito penal e processo penal, se apresenta de suma importância para a análise da presente problemática. A nova Lei nº 12.403/2011 trouxe importantes reformas, com o claro intuito de devolver ao campo da excepcionalidade a medida que segrega a liberdade, assumindo a natureza cautelar de toda a prisão antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, de modo a reconhecer tardiamente que a regra é liberdade. Neste sentido, pertinentes são as palavras de Eugênio Pacelli: [...] não temos o menor receio em afirmar que a expressão “liberdade provisória” somente foi mantida em razão de seu inadequado manejo no Texto Constitucional, conforme se vê no art. 5º, inciso LXVI, a dizer que ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Eis, então, a primeira crítica às novas regras: não é porque o constituinte de 1988, desavisado e desatualizado com a legislação processual penal de sua época, tenha se referido à liberdade provisória, com e sem fiança, que a nossa história deve permanecer atrelada a este equívoco. O que é provisório é sempre a prisão, assim como todas as demais medidas cautelares, que sempre implicarão restrições a direitos subjetivos.
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A liberdade é a regra; mesmo após a condenação passada em julgado, a prisão eventualmente aplicada não será perpétua, isto é, será sempre provisória.8
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No que tange à aplicação das normas penais e processuais penais, nos deparamos com o inevitável confronto entre liberdade e segurança, preceitos tidos como invioláveis pela Carta Magna em seu art. 5º, caput9. 8 PACELLI, Eugênio. Op. cit., p. 519. 9 Art. 5º da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]”.
Vale lembrar que, na constância do Estado Democrático de Direito, a presunção de inocência10 constitui-se valor absoluto, de modo que a inversão desse status de inocência transfere ao Estado, por seus órgãos constituídos, voltados à investigação, a acusação e o julgamento, o ônus de provar a culpa do réu11. Desta forma, podemos concluir que, sendo o acusado inocente até que se prove o contrário, não deve ser recolhido ao cárcere antes da hora. A liberdade individual é a regra; a prisão cautelar é a exceção. A construção desta premissa permite-nos concluir que a estrutura dos direitos e garantias individuais, constante no art. 5º da Constituição Federal, forma-se em torno do controle de legalidade absoluta da prisão, em particular, da provisória12. Tal controle traz desdobramentos importantíssimos também nas concepções de liberdade provisória, pois, partindo do pressuposto de que não existe prisão preventiva obrigatória, ponto pacífico na doutrina, conclui-se que não há crime que enseje prisão cautelar pura e simplesmente calcado na existência da acusação, ficando o juiz adstrito à análise dos requisitos do art. 312 do CPP13. Uma vez ausentes, imperioso que se conceda a liberdade provisória. 10 Art. 5º, LVII, da CF: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; [...]”. 11 NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e liberdade: as reformas processuais penais introduzidas pela Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 14. 12 Idem, ibidem. 13 “Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.”
Entretanto, na prática, visualizamos uma discrepância muito grave, em que muitas vezes o paradoxo se instala na prática, tendo o mesmo juiz, que, em determinado caso, nega a liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico ilícito de drogas, sem maiores justificativas, aplicando na literalidade o contido no art. 44 da Lei nº 11.343/2006, termina por não decretar a prisão preventiva a outro acusado pelo mesmo delito, que, no entanto, não foi preso em flagrante. Gulherme de Souza Nucci explica: Qual a diferença entre ambos os acusados pelo mesmo crime, imaginando-se terem os dois idênticas condições pessoais (primariedade, sem antecedentes)? A única resposta plausível é azar do primeiro e sorte do segundo, o que transforma a justiça criminal numa autêntica loteria, algo desprezível diante de um sistema tão regrado e justo como é a Constituição Federal, em matéria de direitos e garantias individuais.14
Temos que o princípio da especialidade não pode romper com as barreiras sistêmicas, colocando em risco a sua própria coerência15, ou seja, apesar da inegável especialidade da lei de drogas com relação às normas do CPP, o sistema processual constitui-se em um conjunto segundo o qual, e seguindo os preceitos constitucionais, forte no art. 5º da Constituição, uma vez ausentes os requisitos do art. 312 do CPP, não há porque se manter preso o acusado por tráfico ilícito de drogas nestes termos. 14 NUCCI, Guilherme de Souza. Op. cit., p. 15/16. 15 Idem, p. 18.
Ademais, atenta-se para outro fator contrário à interpretação literal do art. 44 da Lei de Drogas: a modificação introduzida à Lei dos Crimes Hediondos, da qual retirou-se a proibição à liberdade provisória sem fiança. Então, admitindo que a Lei de Drogas é tão especial quanto a Lei dos Crimes Hediondos, tendo sido a segunda alterada em 2007, portanto, posterior à Lei nº 11.343/2006, mas, reconhecendo a equiparação de naturezas, natural concluir também pela equiparação, no que tange à aplicação da concessão da liberdade provisória desta naquela. Isso sem falarmos na proclamação de inconstitucionalidade à vedação da conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, prescrita no art. 44, parte final, da Lei de Drogas16, pelo STF.
III – A FIXAÇÃO DA FIANÇA COMO MEDIDA ALTERNATIVA AO CÁRCERE NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS A respeito da vedação de concessão de fiança para os crimes de tráfico de drogas, insculpida no art. 323 do CPP, subsistindo apenas a medida extrema de restrição cautelar da liberdade e a imposição de garantia pecuniária, temos que, a despeito da expressa vedação legal, a fixação de caução é mandatória. Evidente a desproporcionalidade de condicionar a concessão de liberdade ao pagamento de fiança no caso de crimes em tese menos graves, como são os delitos afiançáveis. Estar-se-ia a exigir mais (pagamento de fiança) daquele que cometeu crime menos grave, enquanto ao autor da conduta eleita pelo 16 “Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.” (grifo nosso)
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Surge, entretanto, o problema da inafiançabilidade para determinados crimes, entre eles o crime de trafico ilícitos de drogas, cuja lei reguladora (Lei nº 12.343/2006), em seu art. 44, reza que os crimes previstos nos arts.33, caput, § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia, liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.
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legislador como mais danosa à sociedade (crime inafiançável) seria dispensado tratamento privilegiado.
provisória mediante fiança, não impedindo, contudo, a restituição da liberdade mediante o comparecimento aos atos do processo, conforme a antiga redação do art. 310, parágrafo único, do CPP.18
É desproporcional, inaceitável diante do nosso sistema constitucional, adotar-se posicionamento muito mais rigoroso para aqueles que cometeram crimes menos graves em comparação com aqueles que cometeram crimes mais graves.
Nesse sentido, tenho que, de acordo com a gravidade da infração, devem corresponder os mecanismos progressivamente mais severos de condicionamento da manutenção da liberdade.
Sobre esse prisma, assiste razão o entendimento de Eugênio Pacelli, quando afirma que [...] o que queremos assentar, portanto, é que a inafiançabilidade constitucional, embora pretenda a proibição de qualquer forma de restituição da liberdade, não se compadece com o sistema de garantias individuais estruturado nela própria (Constituição), sobretudo no ponto em que se exige ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária (e não legal ou constitucional) para qualquer privação de liberdade (art. 5º, LXI).
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Veja-se, então, o despropósito da lei, beirando à contradição: de um lado, evita-se a fiança para não onerar excessivamente autores de infrações menos graves, para as quais sequer se prevê pena privativa de liberdade; do outro, proíbe-se a fiança para as mais reprováveis e graves infrações penais!17
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Não há nenhuma razão para restringir-se a liberdade provisória com mais exigências para aqueles que cometeram crimes menos graves em comparação com relação àqueles que cometeram crimes mais graves. Justificativa haveria se o tratamento fosse outro: mais restrições para aqueles que cometeram crimes mais graves. Em meio a esse entendimento, também é lição de Eugênio Pacelli: [...] se o objetivo era o estabelecimento de um regime de liberdade mais gravoso para os autores de crimes mais graves, não se deveria fazer alusão à inafiançabilidade, cujo sentido, desde o ano de 1977 (Lei nº 6.414), se reporta apenas à proibição de aplicação de liberdade 17 PACELLI, Eugênio. Op. cit., p. 592.
Importante ressaltar que a utilização da referida medida cautelar não implica abuso de poder, vez que acarreta lesão menos gravosa ao patrimônio jurídico do cidadão. Nessa esteira, a utilização do poder de cautela é plenamente compatível com a limitação da atuação estatal. Destaca-se que a ponderação da medida cautelar a ser aplicada, mediante critérios de discricionariedade regrada e de livre convencimento motivado, é garantia do livre exercício da atividade judicante e decorre do princípio da proporcionalidade e do poder-dever do Magistrado no que se refere à distribuição da justiça nos casos concretos, elementos que não podem ser afetados pelo texto da Lei nº 12.403/2011. Sobre esse ponto, bem acentua Gustavo Badaró: Ao mais, o princípio da proporcionalidade é um princípio constitucional, que rege todo e qualquer ato estatal de restrição de direito fundamental do indivíduo. Assim, mesmo sem uma previsão expressa de tal princípio na normatização infraconstitucional da prisão preventiva, sua aplicação decorre da proteção constitucional do direito à liberdade e da própria natureza das medidas cautelares.19
Em outras palavras, a resolução da questão se dá no plano constitucional. Se a Carta Magna consagra a dignidade humana como fundamento da República, a justiça como objetivo 18 Idem, p. 524. 19 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A prisão preventiva e princípio da proporcionalidade. In: LIMA, Marcellus Polastri; RIBEIRO, Bruno de Morais (Coord.). Estudos criminais em homenagem a Weber Martins Batista. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 167.
Assim, a adoção da prestação pecuniária não se trata de abuso de poder, mas, sobretudo, do cumprimento dos postulados constitucionais e, dentro de um contexto neoconstitucional, de reconhecimento da força normativa da Constituição, da expansão do Poder Judiciário para garantir direitos fundamentais e de uma nova hermenêutica constitucional. De acordo com esse entendimento, leciona Renato Brasileiro de Lima: [...] pensamos que a legalidade, na sua função de garantia, impede que se imponha uma medida restritiva de direito fundamental mais gravosa que não tenha previsão legal. Entretanto, considerando sua função precípua de garantia de direitos fundamentais, ela autoriza, para cumprir tal função, a alternatividade e a redutibilidade das medidas cautelares, objetivando uma medida alternativa menos gravosa. Ou seja, ao fazer uso do poder geral de cautela no processo penal, o juiz poderá ter uma alternativa não prevista em lei para se evitar uma desproporcional decretação da prisão cautelar que, assim, passa, inclusive, a ser uma opção de aplicação de hipótese cautelar mais benéfica ao acusado.20
Em face das peculiaridades do caso concreto, tenho que agiu com acerto o Magistrado a quo. Efetivamente, constatado “alto grau de previsibilidade” – conforme mencionado na decisão atacada – de que eventual pena privativa de liberdade será substituída por restritivas de direitos, não se justifica a manutenção da segregação antecipada, uma vez que não pode o acusado permanecer durante a instrução processual em situação mais gravosa do que a decorrente da pena imposta. Ou seja, seria um contrassenso o réu aguardar preso a tramitação do processo para, ao final, cumprir serviços à comunidade ou efetuar o pagamento de prestação ecuniária. Diante desse quadro, possuindo elementos suficientes para aferir a alta probabilidade de substituição da sanção corporal, mostra-se escorreita a decisão que, de plano, concede liberdade provisória ao acusado. De outro lado, não cabe ao impetrante invocar, na espécie em tela, o disposto no art. 323, II, do CPP (“Não será concedida fiança: [...] II – nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos”), uma vez que a não observância da referida norma legal se deu, in casu, para beneficiar o réu, e não prejudicá-lo. Com efeito, é preciso lembrar que, a despeito da vedação legal – mas em face das peculiaridades do caso concreto –, a aludida contracautela está sendo utilizada para substituir a prisão cautelar, o que, sem dúvida, é muito mais vantajoso que a permanência do réu no cárcere. Afora isso, conforme bem destacado na r. decisão monocrática, não seria razoável – havendo ofensa inclusive ao princípio da proporcionalidade – “dispensar” o pagamento de fiança para os casos de tráfico de drogas – em face, como visto, da própria vedação legal – e exigir o pagamento da referida contracautela para outros delitos, em tese, de menor gravidade.21
Cabe registrar que a fixação de caução em delitos de tráfico ilícito de entorpecentes já desafiou a impetração de habeas corpus perante o eg. Tribunal Regional Federal e que comungou do entendimento ora exarado:
Assim sendo, verifica-se que não há eventual lesão ao ordenamento jurídico em relação à prestação de caução pecuniária, visando, por um lado, a garantir a liberdade do réu e substituir
20 LIMA, Renato Brasileiro de. Nova prisão cautelar: doutrina, jurisprudência e prática. Niterói/RJ: Ímpetus, 2011. p. 377.
21 TRF 4ª R., HC 5010774-69.2011.404.0000/PR, Rel. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro, Julgado em 02.08.2011.
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fundamental a ser alcançado pelos integrantes do corpo social e garante o direito à liberdade a qualquer pessoa, temos que a ingerência estatal na esfera da liberdade individual do acusado apenas se justifica de forma legítima, após esgotados todos os demais meios para proteção dos bens jurídicos tutelados, por razões de política criminal, pela lei penal. Daí se afirmar que o direito penal é a ultima ratio e a restrição à liberdade a extrema ratio da ultima ratio.
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a incômoda manutenção da prisão provisória decorrente do flagrante e, por outro, compensar o perigo a que a sociedade é exposta com sua soltura e vinculá-lo ao processo com o recolhimento de certa quantia em dinheiro. Por fim, consolida-se a interpretação no sentido de que, seja prevista em lei, seja na Constituição, nenhuma norma relativa à inafiançabilidade poderá ser entendida como proibitiva da restituição da liberdade (provisória). E mais: nenhuma lei poderá vedar a possibilidade de exame judicial acerca da desnecessidade de manutenção de prisão cautelar22 (ou seja, a de restituição de liberdade), não se olvidando, ainda, que “não haverá liberdade sempre que as leis permitirem que o homem deixe de ser pessoa e se torne coisa”23.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Diante de um sistema penal, que passa por um gradual e constante processo de perecimento, fator este aliado à superlotação dos presídios, patrocinada por uma legislação penal cujo apelo e rigidez nitidamente advêm da influência midiática que nos faz concluir para a total ineficiência da pena de prisão, seja ela provisória ou definitiva, atuando mais como fator criminógeno, uma vez que a prisão, ao invés de frear a delinquência parece estimulá-la, convertendo-se em um instrumento que oportuniza toda espécie de desumanidades. Com as alvissareiras modificações trazidas pela Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011, partindo da premissa de que “provisória” deve ser a prisão cautelar, bem como de que a regra é a liberdade, não necessitando ser legitimada e tampouco deve-se admitir, tão pas22 PACELLI, Eugênio. Op. cit., p.589. 23 BECARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 1. ed. Campinas: Russell, 2006. p. 93.
sivamente, o emprego do adjetivo “provisória”, como adverte Aury Lopes Junior24, “a fiança, instituto outrora morto e esquecido, na doutrina, renasce como instituto louvável”. Novas medidas cautelares, se aplicadas corretamente, podem dar ensejo a outras, o que acarretará, sobremaneira, a diminuição do índice de prisões provisórias. Nasce a ideia de desprisionalização, com intuito de retirar força das penas privativas de liberdade, substituindo-as por penas alternativas, todas previstas na Constituição. Respaldo constitucional este, que sobram para o êxito da nova sistemática da prisão e da liberdade no sistema processual penal brasileiro. Bastam boa vontade e respeito aos direitos e garantias constitucionais. Lembrando que o processo penal de uma nação nada mais é senão a consequência de um fluxo, constante e único, dos elementos autoritários ou democráticos de sua Constituição, sendo que o total desrespeito às garantias constitucionais basilares como a presunção de inocência, especialidade da norma penal, proporcionalidade e dignidade da pessoa humana corresponde a um sistema constitucional que felizmente não vigora mais.
REFERÊNCIAS BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. A prisão preventiva e princípio da proporcionalidade. In: LIMA, Marcellus Polastri; RIBEIRO, Bruno de Morais (Coord.). Estudos criminais em homenagem a Weber Martins Batista. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2008 BECARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 1. ed. Campinas: Russell, 2006. 24 LOPES JUNIOR, Aury. (Prisões Cautelares), cit... p. 182.
LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. ______. (Prisões cautelares) Lei nº 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. MARCÃO, Renato. Prisões cautelares, liberdade provisória e medidas cautelares restritivas. De acordo com a Lei nº 12.403, de 04.05.2011. São Paulo: Saraiva, 2011. MORAIS DA ROSA, Alexandre. Guia compacto do processo penal conforme a teoria dos jogos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013.
NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e liberdade: as reformas processuais penais introduzidas pela Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2013. SCARANCE FERNANDES, Antonio. Processo penal constitucional. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. TÁVORA, Nestor; RODRIGUES ALENCAR, Rosmar. Curso de direito processual penal. 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2013. WEDY, Miguel Tedesco. Eficiência e prisões cautelares. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
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LIMA, Renato Brasileiro de. Nova prisão cautelar: doutrina, jurisprudência e prática. Niterói/RJ: Ímpetus, 2011.
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Acórdão na Íntegra
Tribunal Regional Federal da 1ª Região Numeração Única: 0004884-39.2007.4.01.3500 Apelação Criminal nº 2007.35.00.004893-2/GO Relator: Desembargador Federal Olindo Herculano de Menezes Apelante: João Crispim Quintanilha Advogado dativo: Flavia Elisa Albernaz Apelado: Ministério Público Federal Procurador: Marcelo Ribeiro de Oliveira
EMENTA PENAL – ESTELIONATO – FRAUDE CONTRA O SEGURO-DESEMPREGO E FGTS – DIFICULDADES FINANCEIRAS
João Crispim Quintanilha apela de sentença da 11ª Vara Federal/GO, que o condenou a 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, à razão de 1/20 (um vigésimo) – SM, pelo crime de estelionato (art. 171, § 3º, do CP), com substituição. Conforme proposição do Ministério Público Federal, o codenunciado João Emílio de Pina Quintanilha obteve o benefício da suspensão condicional do processo, uma vez que, no caso concreto, era aplicável a causa de diminuição de pena, prevista no § 1º do art. 171 do CP. A denúncia expôs os fatos: [...] 1. Consta dos autos que os denunciados João Emílio de Pina Quintanilha e João Crispim Quintanilha, em unidade de desígnio, receberam indevidamente 03 (três) parcelas do Seguro Desemprego, no valor de R$ 321,79 (trezentos e vinte e um reais e setenta e nove centavos) cada, em 19.07, 23.08 e 19.10.2004 (fl. 93), e sacaram em 04.06.2004 a quantia de R$ 192,72 (cento e noventa e dois reais e setenta e dois centavos) do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, também de forma fraudulenta.
1. Comprovadas a materialidade e a autoria do delito – fraude ao programa do seguro-desemprego e ao FGTS –, merece confirmação o decreto condenatório, que aplicou a pena de forma criteriosa, em quantitativo suficiente para reprovação e prevenção do crime.
2. De fato, o denunciado João Emílio de Pina Quintanilha rescindiu de forma unilateral, em 04.04.2004, o contrato de trabalho que mantinha com a empresa Santa Marta Distribuidora de Drogas Ltda., CNPJ nº XXXX, fato que, conforme legislação de regência, o impedia de sacar o FGTS e de receber o seguro desemprego.
2. A pobreza e as dificuldades econômicas, que atingem a todos, em maior ou menor extensão, não podem ser aceitas como justificativa e/ou explicação para o cometimento de crimes.
3. Em razão do pedido de demissão de João Emilio, a empresa empregadora emitiu o Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho – TRCT, acostado à fl. 14 dos autos.
3. Desprovimento da apelação.
4. Contudo, o segundo denunciado, João Crispim Quintanilha, pai de João Emílio e cuja profissão é contador, confeccionou um novo TRCT, alterando em especial o campo referente a causa do afastamento do empregado. No documento fraudado constou que houve dispensa sem justa causa em vez de dispensa a pedido, situação que, se verídica, daria direito a João Emílio de levantar o saldo existente na conta do FGTS e de receber o benefício do Seguro Desemprego (fl. 06).
ACÓRDÃO Decide a Turma negar provimento à apelação, à unanimidade. 4ª Turma do TRF da 1ª Região – Brasília, 2 de julho de 2013. Desembargador Federal Olindo Menezes, Relator
RELATÓRIO O Exmo. Sr. Desembargador Federal Olindo Menezes (Relator):
5. A fraude veio a lume porque a empresa empregadora, Santa Marta Distribuidora de Drogas Ltda., solicitou à Caixa Econômica Federal o certificado de regularidade do FGTS, instante em que a empresa pública federal detectou a irregularidade referente ao ex-empregado João Emílio, pelo fato de que na GFIP – Guia de Recolhimento do FGTS e Previdência
Social, constar o código “J” e no documento apresentado por João Emílio apresentar código “01”.
não produziu o acusado prova alguma capaz de sustentar a exculpante suscitada (CPP, art. 156).
6. Registre-se que o código “J” indica afastamento iniciado pelo empregado sem justa causa, e código “01” indica dispensa pela empresa sem justa causa. No primeiro caso não há o levantamento do fundo côo o recebimento do benefício.
[...]
[...]
Sustenta que se encontrava em dificuldades financeiras para pagar a faculdade de direito do filho, não restando alternativa que não a prática do crime. Pede, sucessivamente, a aplicação da Lei nº 9.099/1990. O órgão do Ministério Público Federal nesta instância, em parecer firmado pelo Procurador Regional da República Guilherme Zanina Schelb (fls. 296-300), manifesta-se pelo desprovimento da apelação. É o relatório. Sigam os autos ao exame do revisor, que pedirá a designação de dia para o julgamento (art. 613, I, do CPP).
VOTO O Exmo. Sr. Desembargador Federal Olindo Menezes (Relator) O acusado não discute a autoria e a materialidade do crime, que foram plenamente demonstradas na sentença. Busca, apenas, mas com argumentos genéricos, justificar sua conduta, alegando que estava com dificuldades financeiras para pagar a faculdade de direito do filho. A sentença deu pela inexistência de elementos de prova que sustentassem a excludente de ilicitude, nestes termos: [...] Quanto à tese defensiva segundo a qual incidiria, na espécie, a excludente de ilicitude insculpida nos arts. 23, inciso I e 24, do Código Penal, uma vez que o acusado João Crispim somente teria agido de forma a praticar o crime de estelionato descrito na inicial acusatória, visando a angariar valores que seriam destinados a pagar a faculdade de seu filho, o corréu João Emílio, não há que ser acolhida, uma vez que
A mera alegação de dificuldades financeiras não pode justificar a prática do delito e caracterizar estado de necessidade. O acusado possui grau de instrução superior de Contador e paga aluguel de apartamento no centro de Goiânia, com salário aproximado de R$ 3.000,00 na época dos fatos. Não há, de fato, indicação de miserabilidade para demonstrar que estava em estado de necessidade quando cometeu a fraude contra o seguro desemprego e o FGTS. As razões do recurso são insuficientes para afastar o decreto condenatório. Ao contrário do que alega, a prova dos autos indica que o acusado possui condições financeiras suficientes para manter a si e sua família, sendo a prática do crime uma opção consciente, com vontade livre e dirigida para lesar o bem jurídico tutelado pela norma jurídica. A pobreza – diga-se o mesmo das dificuldades econômicas, que atingem a todos, em maior ou menor extensão –, ressalvada a dimensão extrema, não pode ser aceita como justificativa e/ou explicação para o cometimento de crimes. Em face do exposto, nego provimento à apelação, mantendo a sentença em todos os seus termos. É o voto. 1 “Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal)”.
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7. Os denunciados, agindo com tal artifício, induziram a CEF no levantamento do FGTS e no pagamento do benefício do seguro desemprego, em concurso formal.
Mesmo se o acusado tivesse sido condenado à pena mínima prevista para o crime de estelionato qualificado, 1 ano e 4 meses de reclusão, ela ultrapassaria o limite objetivo de 1 ano fixado no art. 891 da Lei nº 9.099/1995, não havendo como cogitar na possibilidade de suspensão condicional do processo.
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Pesquisa Temática
IPVA Ação anulatória de débito fiscal – diferencial de alíquotas – ICMS – IPVA – duplicidade de tributação – efeitos “Administrativo/tributário/processual civil. Ação anulatória de débito fiscal. Diferencial de alíquotas. ICMS/IPVA. Embora anêmica em relação à provas a petição inicial não deve ser tida como inepta quando for possível vislumbrar o direito alegado. Rejeitada a preliminar de inépcia da petição inicial. Válido documento obtido através do sítio do órgão fazendário na rede mundial de computadores. Tanto contribuinte quanto Fazenda Pública fazem, respectivamente, contra prova e prova parcial na lides. Causa madura. Aplicação do § 1º do art. 515 do CPC. Sistema de persuasão racional das provas. Aplicação análoga do art. 397 do CPC. Informação dúbia em parte dos autos de infração. Duplicidade de tributação por impostos diversos (ICMS/IPVA). Contribuinte fora da incidência de ICMS. A inobservância do art. 202 do CTN acarreta a nulidade da CDA. Apelação conhecida e provida. Unanimidade.” (TJPA – Ap 20083005179-0 – (103583) – Belém – 5ª C.Cív.Isol. – Relª Desª Luzia Nadja Guimarães Nascimento – DJe 19.01.2012 – p. 96)
Ação anulatória de débito fiscal – IPVA – registro de veículo – Estado que não domicílio do proprietário – efeitos “Agravo de instrumento. Ação anulatória de débito fiscal. Requerimento de tutela antecipada. Suspensão da exigibilidade do crédito. IPVA. Suposto registro de veículo em Estado da Federação diverso daquele de domicílio do proprietário. Inobservância do disposto no art. 120 do CTB. Dados apresentados pelo Fisco, não infirmados pelos recorrentes. Requisitos do art. 273 do CPC. Recurso provido. Conforme dispõe o art. 273 do CPC, para a concessão de tutela antecipada, necessária é a existência de prova inequívoca para o convencimento da verossimilhança da alegação e que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou a manifesta intenção de protelar. No caso dos autos, tendo a Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais apurado o débito fiscal em procedimento administrativo aparentemente regular, e não tendo os agravantes infirmado os dados trazidos pelo Fisco, de que o débito de IPVA teria resultado de registro indevido de veículo em Estado diverso daquele em que se encontrava domiciliado o proprietário (art. 120 do CTB), impõe-se o reconhecimento da ausência de prova inequívoca da verossimilhança das alegações da parte.” (TJMG – AI 1.0145.11.048457-6/001 – 1ª C.Cív. – Rel. Eduardo Andrade – DJe 03.02.2012)
IPVA – aquisição de veículo – deficiente físico – isenção – admissibilidade “Constitucional e tributário. Agravo de instrumento. Aquisição de veículo por deficiente físico. IPVA. Isenção. Observância dos requisitos exigidos para fruição do benefício. Benesse legal prevista no art. 6º, IV, a, 1.4, da Lei Estadual nº 6.555/2004. Agravo conhecido e provido. Decisão unânime.” (TJAL – AI 2012.001888-4 – (2.1208/2012) – Rel. Des. Pedro Augusto Mendonça de Araújo – DJe 08.11.2012 – p. 29)
IPVA – aquisição de veículo – portador de necessidades especiais – isenção “Tributário. Agravo regimental. Isenção. IPVA. Pessoa portadora de deficiência física. Legislação estadual. Princípio da igualdade tributária. Fundamento constitucional. Recurso especial não conhecido. 1. Trata-se de agravo regimental contra decisão que negou seguimento a recurso especial cujo mérito diz respeito à isenção do IPVA para portadores de deficiência física. 2. O acórdão recorrido ampara-se em fundamento eminentemente constitucional, qual seja, no princípio da igualdade tributária (art. 150, II, da CF/1988), que serviu de parâmetro para o Tribunal a quo estender a isenção prevista no art. 4º, VI, § 9º, do Decreto nº 32.144/1985, norma instituída pelo Estado do Rio Grande do Sul. 3. Não compete ao STJ, em julgamento de recurso especial, reformar decisum proferido com base em norma constitucional, sob pena de usurpação da competência do STF (art. 102, III, da CF/1988). 4. Ainda que houvesse fundamentação infraconstitucional no acórdão recorrido, observo que o agravante não interpôs recurso extraordinário, o que atrai a incidência da Súmula nº 126/STJ: ‘É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário’. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 89.908 – Proc. 2011/0214172-3/RS – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – J. 08.05.2012 – DJe 22.05.2012)
IPVA – alienação do veículo – débito fiscal anterior – pagamento – responsabilidade – adquirente “Juizados Especiais da Fazenda Pública. Débito de IPVA anterior à aquisição do veículo. Dever de pagamento do adquirente. Arts. 131 do Código Tributário Nacional e 1º, § 2º, da Lei nº 7.431/1985. Recurso conhecido e provido. 1. Cumpre ao novo adquirente arcar com o pagamento do IPVA em atraso, conforme as expressas disposições normativas dos arts. 131 do Código Tributário Nacional e 1º, § 2º, da Lei nº 7.431/1985, que instituiu o IPVA no Distrito Federal, podendo eventualmente se dirigir contra o alienante em ação de regresso. 2. Recurso conhecido e provido.” (TJDFT – Proc. 20110111998752 – (593104) – Relª Juíza Sandra Reves Vasques Tonussi – DJe 06.06.2012 – p. 382)
IPVA – autarquia – imunidade – cabimento – ressarcimento – mandado de segurança – via inadequada “Apelação cível. Direito tributário. Ação declaratória de inexistência de débito tributário. IPVA. Imunidade. Art. 150, VI, § 2º, da CR/1988. Lei Complementar nº 116/2003. O mandado de segurança, seja ele na forma repressiva ou preventiva, é cabível para a proteção de direito líquido e certo, não protegido por habeas corpus nem por habeas data, em sendo o responsável pelo abuso de poder ou ilegalidade autoridade pública, ou agente de pessoa jurídica, no exercício de atribuições do poder público, nos termos do art. 5º, LXIX, da CF/1988. Não pode a Administração Fazendária Estadual local cobrar IPVA de entidade autárquica, pois, esta goza da imunidade tributária de que fala o art. 150, VI, e § 2º, da CR/1988.” (TJMG – AC-RN 1.0112.10.011404-3/001 – 4ª C.Cív. – Rel. Dárcio Lopardi Mendes – DJe 05.06.2012)
IPVA – cobrança – exegese “Recurso de agravo. direito tributário. execução fiscal. IPVA. prescrição. agravo improvido. decisão unânime. 1. Da detida análise dos autos verifica-se que a Certidão de Dívida Ativa (fls. 15) que fundamenta a execução fiscal, considerou exigíveis os IPVAs de 2005, 2006 e 2007 respectivamente nos meses de abril/2005, abril/2006 e abril/2007. 2. Ora, se os impostos relativos àqueles exercícios já eram exigíveis nos meses de abril/2005, abril/2006 e abril/2007, é de rigor reconhecer que os respectivos créditos tributários já haviam sido, antes, definitivamente constituídos. 3. Destarte, os IPVAs dos anos de 2005, 2006 e 2007 certamente lançados pelo menos em abril dos respectivos anos, deveriam ter sido objeto de cobrança, respectivamente, até os meses de abril/2010, abril/2011 e abril/2012. Porém, como o executivo fiscal em tela foi ajuizado somente em 09 de agosto de 2012, é de rigor se reconhecer a prescrição dos créditos tributários dos exercícios supramencionados, à luz dos próprios termos da CDA que instrui o feito.” (TJPE – AG 0019720-85.2012.8.17.0000 – 1ª CDPúb. – Rel. Des. Jorge Américo Pereira de Lira – DJe 07.11.2012)
IPVA – furto de veículo – isenção – cabimento – licenciamento – não extensão “Direito Tributário. Mandado de segurança. Reexame necessário. IPVA. Furto de veículo. Isenção. Taxa de licenciamento anual de veículos. Legitimidade. Sentença reformada em parte. Nos termos do art. 3º, VIII, da Lei Estadual nº 14.937/2003, e do art. 7º, VIII, do Decreto Estadual nº 43.709/2003, basta a comprovação do furto para que o proprietário do veículo seja declarado isento do pagamento do IPVA no período em que o bem não estiver sob sua posse. No julgamento do incidente de Uniformização de Jurisprudência de nº 1.0480.09.123561-8/002, a Corte Superior deste Tribunal de Justiça concluiu pela constitucionalidade da exigência da taxa de licenciamento anual de veículos com base na Lei Estadual nº 14.938/2003.” (TJMG – RN 1.0024.09.576130-0/001 – 4ª C.Cív. – Rel. Moreira Diniz – DJe 02.05.2012)
“Direito processual civil. Direito tributário. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Exceção de pré-executividade. Alienação fiduciária. Inclusão do credor fiduciante no polo passivo da execução. Possibilidade. Excesso de execução. Embargos. Não apresentação. Exceção de pré-executividade. Via imprópria. Recurso desprovido. Ante a inequívoca constatação de que a propriedade do automóvel alienado em garantia é do credor fiduciário, não há dúvida de que ele pode ser incluído no polo passivo de execução fiscal na qual se exige o pagamento de IPVA incidente sobre o referido bem. A via adequada para questionamento de valor posto em execução de sentença, com alegação de excesso, é a dos embargos, não se admitindo, por se cuidar de erro grosseiro, a apresentação de exceção de pré-executividade, e sua consideração como se de embargos fosse.” (TJMG – AI 1.0701.11.019996-8/001 – 4ª C.Cív. – Rel. Moreira Diniz – DJe 11.01.2012)
IPVA – transporte coletivo urbano – isenção – alcance “Tributário. IPVA. Decisão recorrida que concede a liminar para suspender a exigibilidade da cobrança do IPVA. Veículo que foi adquirido em 25.10.2010, com o requerimento administrativo somente no ano de 2011. Pedido administrativo formulado após a ocorrência do fato gerador do imposto. Decisão reformada. Recurso provido.” (TJSP – AI 0112357-06.2012.8.26.0000 – Guarulhos – 2ª CDPúb. – Rel. Claudio Augusto Pedrassi – DJe 05.09.2012 – p. 1439)
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IPVA – imóvel alienado em garantia – credor fiduciário – responsabilização
IPVA – veículo acidentado – perda total – ação anulatória de débito fiscal – baixa no cadastro – apresentação de partes do veículo – inexigibilidade “Processo civil e tributário. Ação anulatória de débito tributário (IPVA). Veículo acidentado. Perda total. Sucata encaminhada para o Detran/DF. Posterior entrega a terceiro. Venda da sucata em leilão. Baixa na inscrição do veículo. Condicionamento à entrega de recorte do chassis e placas do veículo. Impossibilidade. Honorários advocatícios. Fixação em
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quantum elevado. Redução. Recurso parcialmente provido. 1. Não se afigura razoável a exigência de apresentação de partes do veículo que sofreu perda total, como condição para sua baixa nos cadastros e suspensão da cobrança de tributos, se o próprio órgão de trânsito, a quem a sucata do veículo objeto de acidente foi dirigida, as entregou a terceiro que leiloou os salvados em outra unidade da federação, sem promover as medidas necessárias. 2. Excessiva a verba honorária, impõe-se a sua redução, de modo a adequá-la ao art. 20, § 4º, do CPC. 3. Recurso parcialmente provido.” (TJDFT – Proc. 20070111219064 – (611825) – Rel. Des. Arnoldo Camanho de Assis – DJe 27.08.2012 – p. 128)
IPVA – veículo adaptado – portador de necessidades especiais – prequestionamento – necessidade “Processual civil. Mandado de segurança. Isenção de IPVA relativo a veículo adaptado à portador de deficiência física. Ausência de prequestionamento. Interpretação de direito local. Impossibilidade. Súmula nº 280/STF. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AG-REsp 124.521 – (2011/0291903-3) – 1ª T. – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – DJe 11.10.2012)
IPVA – veículo alienado – débito fiscal – responsabilidade – proprietário à época do fato gerador – efeitos “Embargos à execução fiscal. IPVA. Veículo automotor alienado a terceiro previamente ao fato gerador. Ilegitimidade do proprietário anterior para figurar no polo passivo da ação executiva. Precedentes. Condenação do exequente ao pagamento de honorários. Descabimento. Ausência de prova de comunicação da transferência do bem. Princípio da causalidade. ‘‘1. Demonstradas a venda e a tradição do bem móvel, perfectibilizou-se o negócio jurídico e a efetiva transmissão da propriedade, de modo que o vendedor se exonera das obrigações tributárias (IPVA) referentes ao veículo desde o momento da sua venda, transferindo-as para o adquirente’ (AC 2011.048472-9, Rel. Des. Jaime Ramos, J. 14.07.2011). 2. ‘De acordo com o princípio da causalidade, o litigante só é responsável pelos encargos sucumbenciais se der causa à propositura da ação. Como a execução fiscal foi ajuizada contra a pessoa que constava dos registros do órgão de trânsito como proprietário do automóvel, o credor não pode ser responsabilizado pela interposição dos embargos em que se acolheu a alegação de ilegitimidade. Logo, mesmo julgados procedentes, incabível a fixação de verba honorária’ (TJSC, AC 2006.029984-9, de Blumenau, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, J. em 24.04.2007)’ (AC 2009.032031-8, Rel. Des. Jaime Ramos, J. 13.08.2009) (AC 2011.075162-0, de Tubarão, Rel. Des. Subst. Rodrigo Collaço, DJe 21.03.2012). Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJSC – AC 2012.032476-3 – Rel. Des. Jorge Luiz de Borba – DJe 16.07.2012)
IPVA – veículo alienado – comunicação de venda ao Detran – necessidade – cobrança indevida – efeitos “Administrativo e tributário. Alienação de veículo. Cumprimento do dever de comunicação da venda de veículo ao Detran/DF e posteriormente à Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal, ainda que fora do prazo legal (art. 134 do Código de Trânsito). Má prestação do serviço pela autarquia distrital. Cobrança indevida do IPVA. Inscrição ilícita do nome do autor em dívida ativa. Dano moral configurado, na modalidade in re ipsa. Dever de indenizar o réu. Quantum reparatório arbitrado com razoabilidade e proporcionalidade (R$ 2.000,00). Recurso improvido. Sentença mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, com súmula de julgamento servindo de acórdão, na forma do art. 46 da Lei nº 9.099/1995. Sem condenação em custas. Honorários fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.” (TJDFT – Proc. 20110111177378 – (562712) – Rel. Juiz José Guilherme de Souza – DJe 06.02.2012)
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IPVA – veículo alienado – sujeição ativa – comprador – fato gerador do tributo – norma estadual instituidora – análise
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“Apelação cível. Tributário. IPVA. Veículo alienado. Responsabilidade pelo pagamento. Comprovação da transferência da propriedade. Responsabilidade do adquirente. Art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei nº 7.543/1988 e art. 131, inciso I, do CTN. Ausência de comunicação da alienação ao órgão de trânsito. Irrelevância. Incidência apenas em período anterior. Recurso parcialmente provido. ‘Demonstradas a venda e a tradição do bem móvel, perfectibilizou-se o negócio jurídico e a efetiva transmissão da propriedade, de modo que o vendedor se exonera das obrigações tributárias (IPVA) referentes ao veículo desde o momento da sua venda, transferindo-as para o adquirente’ (AC 2011.048472-9, Rel. Des. Jaime Ramos, J. 14.07.2011).” (TJSC – AC 2011.029203-0 – Rel. Juiz Rodrigo Collaço – DJe 05.03.2012)
Isenção – aquisição de automóvel – ICMS – IPVA – portador de necessidades especiais – cabimento – alcance “Constitucional e tributário. Apelação e reexame necessário. Mandado de segurança. Isenção. ICMS e IPVA. Aquisição de veículo automotor. Portador de necessidades especiais. Princípios da igualdade e da isonomia tributária. 1. O Convênio nº 03/2007, que trata da isenção do ICMS e a Lei Complementar Estadual nº 114/2002, relativa ao IPVA, para aquisição de veículos destinados a pessoas portadoras de deficiência física, ao exigir como condição que seja o veículo automotor dirigido por pessoa portadora de deficiência física, afronta o princípio constitucional da isonomia, notadamente, da isonomia tributária, de vez que trata de forma desigual pessoas agrupadas em razão de uma característica comum, qual seja, a necessidade especial. 2. Apelo improvido e reexame improcedente.” (TJAC – Ap 0007055-15.2011.8.01.0001 – (11.993) – C.Cív. – Relª Desª Eva Evangelista de Araujo Souza – DJe 13.02.2012 – p. 18)
Jurisprudência Comentada
Adoção à Brasileira – Revogação – Pedido Feito pela Mãe – Impossibilidade
IV – Apelação conhecida e improvida. Inteligência do art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente. (TJMA – Ac. 44.448/2003 – 4ª C.Cív. – Relª Desª Maria Dulce Soares Clementino – DJe 16.05.2003)
COMENTÁRIO
LOURIVAL SEREJO
Representante do IBDFam no Estado do Maranhão, Juiz da 3ª Vara da Família, Juiz Corregedor e Membro do TRE/MA.
EMENTA Adoção à brasileira. Ação anulatória movida pela perfilhadora, ao argumento de que o perfilhado não é seu filho biológico. Motivação fundada em problemas de relacionamento entre esta e o perfilhado. Autora que sabia, no momento do registro, não ser a mãe biológica. Impossibilidade jurídica do pedido. Irrevogabilidade da adoção. Inteligência do art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente. I – Não se pode admitir que aquele que promove “adoção à brasileira” – modalidade na qual é ínsita a falsidade daquilo que é declarado – venha posteriormente pretender anular tal adoção valendo-se exatamente dessa falsidade. Tal entendimento seria permitir o favorecimento pela própria torpeza. II – Não pode a adotante, treze anos depois de consumada a adoção, requerer em juízo sua anulação com base em falsidade, uma vez que sua vontade não estava viciada quando da sua realização. III – De todo impossível, portanto, a pretensão da autora, pois esta equivale a submeter o estado familiar do perfilhado ao seu talante. Ou seja, foi-lhe “permitindo” que continuasse seu filho enquanto conveniente, ocorrendo problemas de relacionamento, o estado de filho passaria a ser imediatamente resolúvel.
A questão decidida por este acórdão merece uma análise detalhada à luz dos novos paradigmas do Direito de Família. A situação é clamorosa e reflete a condição humana em sua complexidade, com os embates e crises que se apresentam a cada instante. A adoção do menor foi feita em tenra idade, pela recorrente, dona Z. A partir de então, a única pessoa a quem o menor L. estava ligado era ela, sua mãe. Seus pais biológicos são desconhecidos. Até os treze anos de idade, L. foi criado como filho biológico e afetivo, tendo sua mãe a posse de estado, pública e notória. De repente, com os surgimentos dos problemas afetos à adolescência, Z. arrependeu-se de ser mãe e passa a repudiá-lo. A afetividade que se espera deste tipo de adoção rompeu-se de forma desastrosa, com prejuízo para o filho desprezado. Esta é uma situação dramática em que a Justiça se depara com duas alternativas: indeferir o pedido inicial e obrigar Z. a continuar como mãe de L. ou anular a adoção efetivada para reparar uma situação que se tornou problemática. Mas esta segunda hipótese, por outro lado, é impensável se considerarmos que o menor não tem ninguém a quem buscar neste mundo a não ser Z., e a legislação brasileira não permite a revogação da adoção (art. 48 do ECA).
Pela leitura do acórdão, percebe-se que a Justiça agiu certo ao optar pela primeira alternativa, isto é, mantendo o vínculo entre a recorrente e seu filho, mesmo repudiado. Embora certa do ponto de vista legal, a decisão, ora comentada, leva a várias indagações e análises profundas que ultrapassam as fronteiras do Direito de Família, com sua vasta área interdisciplinar. O que temos a considerar é que não se pode deixar ao léu um menino criado como filho por 13 anos e, de repente, ele ser desprezado. O instituto da adoção hoje, mais do que nunca, tem o prestígio que merece: é irrevogável.
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Creio que a decisão da Justiça foi correta ao impor à mãe (sem adjetivo) o dever de cuidar do filho que escolheu com amor, desde o nascimento. Admitir-se uma adoção condicional às virtudes do adotado seria o caos desse instituto que veio, desde o Direito Romano, com uma finalidade humanística e que, nos dias atuais, com a valorização da afetividade, com a desbiologização da paternidade, tornou-se o verdadeiro elo de ligação entre pais e filhos. Esses aspectos já foram bem analisados por Luiz Edson
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Fachin, em sua obra Da paternidade: relação biológica e afetiva (Editora Del Rey). Tudo o que foi dito sobre a desbiologização da paternidade, com mais razão, se aplica à desbiologização da maternidade, onde a aproximação e a dedicação é, quase sempre, mais forte e constante. Neste caso, como em tantos que os Tribunais têm decidido, o vício de origem da adoção é irrelevante diante do tempo decorrido e do propósito inicial de optar espontaneamente pela maternidade ou paternidade. Para estabelecimento da paz doméstica, para que Z. retome a consciência do seu papel de mãe de L., sugere-se a ajuda de profissionais especializados, como terapeutas familiares, psicólogos, educadores, pois o que existe, na verdade, é um problema característico da sociedade moderna, agravado com a discriminação que se estabeleceu no momento em que a mãe decidiu repudiar o filho eleito por amor em uma decisão consciente.
2.186-16, DE 23.08.2001
Patrimônio Genético. Diversidade Biológica Previdência Social. Alteração na Legislação
2 .156-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento do Nordeste – Adene
2.187-13, DE 24.08.2001
2.157-5, DE 24.08.2001
Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA
2.189-49, DE 23.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.158-35, DE 24.08.2001
Cofins, PIS/Pasep e IR. Alteração na Legislação
2.190-34, DE 23.08.2001
Vigilância Sanitária. Alteração da Lei nº 9.782/1999
2.159-70, DE 24.08.2001
IR. Alteração na Legislação
2.192-70, DE 24.08.2001
Proes. Bancos Estaduais
2.161-35, DE 23.08.2001
Programa Nacional de Desestatização. Alteração da Lei nº 9.491/1997
2.196-3, DE 24.08.2001
Instituições Financeiras Federais. Recuperação. Empresa Gestora de Ativos – Emgea
2.162-72, DE 23.08.2001
Notas do Tesouro Nacional – NTN
2.197-43, DE 24.08.2001
SFH. Disposições
2.163-41, DE 23.08.2001
Meio Ambiente. Alteração da Lei nº 9.605/1998
2.198-5, DE 24.08.2001
Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica
2.164-41, DE 24.08.2001
Alteração da CLT. Trabalho a Tempo Parcial e PAT
2.199-14, DE 24.08.2001
IR. Incentivos Fiscais
2.165-36, DE 23.08.2001
Servidor Público e Militar. Auxílio-Transporte
2.200-2, DE 24.08.2001
Infraestrutura de Chaves Públicas. ICP-Brasil
2.166-67, DE 24.08.2001
Código Florestal. Alteração da Lei nº 4.771/1965
2.206-1, DE 06.09.2001
Programa Nacional de Renda Mínima
2.167-53, DE 23.08.2001
Recebimento de Valores Mobiliários pela União
2.208, DE 17.08.2001
Estudante Menor de 18 Anos. Comprovação
2.168-40, DE 24.08.2001
Cooperativas. Recoop. Sescoop
2.209, DE 29.08.2001
Comercializadora Brasileira de Energia Elétrica – CBEE
2.169-43, DE 24.08.2001
Servidor Público. Vantagem de 28,86%
2.210, DE 29.08.2001
Orçamento. Crédito Extraordinário
2.170-36, DE 23.08.2001
Tesouro Nacional. Administração de Recursos
2.211, DE 29.08.2001
Orçamento 2001 e 2002. Diretrizes
2.172-32, DE 23.08.2001
Usura. Agiotagem
2.213-1, DE 30.08.2001
Programa Bolsa-Renda. Estiagem
2.173-24, DE 23.08.2001
Anuidades Escolares
2.214, DE 31.08.2001
Administração Pública Federal. Recursos
2.174-28, DE 24.08.2001
União. Programa de Desligamento Voluntário – PDV
2.215-10, DE 31.08.2001
Militares das Forças Armadas. Reestruturação da Remuneração
2.177-44, DE 24.08.2001
Planos de Saúde. Alteração da Lei nº 9.656/1998
2.220, DE 04.09.2001
Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU
2.178-36, DE 24.08.2001
Programa Nacional de Alimentação Escolar. Dinheiro Direto na Escola
2.224, DE 04.09.2001
Capitais Brasileiros no Exterior
2.179-36, DE 24.08.2001
União e Banco Central. Relações Financeiras
2.225-45, DE 04.09.2001
Servidor Público. Tráfico de Entorpecentes. Alteração das Leis nºs 6.368/1976 e 8.112/1990 Alteração da CLT
2.180-35, DE 24.08.2001
Advocacia-Geral da União. Alteração na Legislação
2.226, DE 04.09.2001
2.181-45, DE 24.08.2001
Operações Financeiras do Tesouro Nacional
2.227, DE 04.09.2001
Plano Real. Correção Monetária. Exceção
2.183-56, DE 24.08.2001
Reforma Agrária. Alteração na Legislação
2.228-1, DE 06.09.2001
2.184-23, DE 24.08.2001
Carreira Policial. Gratificação
Cultura. Política Nacional do Cinema – Ancine. Prodecine. Funcines
2.185-35, DE 24.08.2001
Dívida Pública Mobiliária. Consolidação. Assunção. Refinanciamento
2.229-43, DE 06.09.2001
Policiais Civis da União e DF. Alteração na legislação
Normas do Juris SÍNTESE atingidas pelas Medidas Provisórias em vigor (até 31.12.2013) Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive as medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com. MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
627
12.11.2013
2º
DL 1.598 de 1977
7º, 8º, 8º-A, 12, 13, 15, 17, 19, 20, 21, 22, 23, 24-A, 24-B, 25, 27, 29, 31, 33 e 38-A
627
12.11.2013
38
Lei nº 4.506 de 1964
57
627
12.11.2013
49
Lei nº 9.718 de 1998
3º
12.11.2013
50
Lei nº 10.865 de 2004 15 e 27
627
12.11.2013
5º
Lei nº 9.430 de 1996
2º, 25, 27, 29 e 54
627
627
12.11.2013
8º
Lei nº 9.249 de 1995
9º, 13, 15, 20 e 21
627
12.11.2013
51
Lei nº 10.637 de 2002 1º e 3º
32 e 51
627
12.11.2013
52
Lei nº 10.833 de 2003 1º e 3º
627
12.11.2013
9º
Lei nº 8.981 de 1995
Janeiro/2014 – Ed. 202
Nota: Prezado assinante, todas as normas selecionadas, inclusive medidas provisórias, podem ser consultadas em nosso endereço eletrônico www.sintese.com.
76
Janeiro/2014 – Ed. 202
77
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
627
12.11.2013
92
Lei nº 12.865 de 2013 39 e 40
ALTERAÇÃO
2.158-35
27.08.2001
93
LC 85/96
Revogada
627
12.11.2013
94
Lei nº 9.249 de 1995
25
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 7.714/88
5º
627
12.11.2013
99
Lei nº 4.506 de 1964
58
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.004/95
Revogada
627
12.11.2013
99
Lei nº 6.099 de 1974
15
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.493/97
7º
627
12.11.2013
99
DL 1.598 de 1977
8º, 15, 20, 27, 29, 31, 32, 33, 34 e 38
627
12.11.2013
99
Lei nº 8.218 de 1991
18
2.161-35
24.08.2001
1º e 6º
Lei nº 9.491/97
2º, 4º, 5º, 6º e 30
627
12.11.2013
99
Lei nº 8.981 de 1995
31
2.162-72
24.08.2001
6º
Lei nº 9.094/95
2º
627
12.11.2013
99
Lei nº 9.249 de 1995
21 e 31
2.163-41
24.08.2001
1º
Lei nº 9.605/98
79-A
627
12.11.2013
99
Lei nº 9.532 de 1997
1º
2.164-41
27.08.2001
7º e 8º
Lei nº 7.998/90
2º, 2º-A, 2º-B, 3º-A, 7º-A, 8º-A, 8º-B e 8º-C
627
12.11.2013
99
Lei nº 9.718 de 1998
3º
2.164-41
27.08.2001
1º e 2º
CLT
627
12.11.2013
99
MP 2.158-35 de 2001 74
58-A, 59, 130-A, 143, 476-A, 627-A, 643 e 652
627
12.11.2013
99
Lei nº 11.941 de 2009 15 a 24, 59 e 60
2.164-41
27.08.2001
3º
Lei nº 4.923/65
1º
627
12.11.2013
100
Lei nº 10.637 de 2002 55
2.164-41
27.08.2001
4º
Lei nº 5.889/73
18
628
29.11.2013
5º
DL 880 de 1969
DL 880 de 1969
2.164-41
27.08.2001
5º
Lei nº 6.321/76
2º
2.156-5
27.08.2001
32
DL 1.376/74
1º e 11
2.164-41
27.08.2001
6º
Lei nº 6.494/77
1º
2.156-5
27.08.2001
32
DL 2.397/87
12
2.164-41
27.08.2001
9º
Lei nº 8.036/90
19-A, 20, 29-C e 29-D
2.156-5
27.08.2001
32
Lei nº 8.034/90
1º
2.156-5
27.08.2001
32
Lei nº 9.532/97
2º
2.164-41
27.08.2001
10
Lei nº 9.601/98
2º
2.157-5
27.08.2001
32
DL 1.376/74
1º
2.165-36
24.08.2001
13
Lei nº 7.418/85
1º
2.158-35
27.08.2001
2º e 93
Lei nº 9.718/98
3º e 8º
2.165-36
24.08.2001
13
Lei nº 8.627/93
6º
2.158-35
27.08.2001
3º e 93
Lei nº 9.701/98
1º
2.166-67
25.08.2001-extra
1º
Lei nº 4.771/65
1º, 3º-A, 4º, 14, 16, 37-A, 44, 44-A, 44-B e 44-C
2.158-35
27.08.2001
10 e 93
Lei nº 9.779/99
14 e 17
2.166-67
25.08.2001
3º
Lei nº 9.393/96
10
2.158-35
27.08.2001
19 e 93
Lei nº 9.715/98
2º e 4º
2.167-53
24.08.2001
2º e 3º
Lei nº 9.619/98
1º e 4º-A
2.158-35
27.08.2001
34 e 75
Lei nº 9.532/97
1º e 64-A
2.168-40
27.08.2001
13
Lei nº 5.764/71
88
2.158-35
27.08.2001
64
D nº 70.235/72
1º, 25 e 64-A
2.168-40
27.08.2001
14
Lei nº 9.138/95
2º
2.158-35
27.08.2001
69
DL 1.455/76
1º, 9º, 10, 16, 18, 19 e 64-A
2.168-40
27.08.2001
18
Lei nº 10.186/01
7º
2.158-35
27.08.2001
70
Lei nº 9.430/96
63
2.170-36
24.08.2001
8º
Lei nº 8.212/91
60
2.158-35
27.08.2001
72
Lei nº 8.218/91
11 e 12
2.172-32
24.08.2001
7º
Lei nº 1.521/51
4º, § 3º
2.158-35
27.08.2001
73
Lei nº 9.317/96
1º e 64-A
2.173-24
24.08.2001
1º e 2º
Lei nº 9.870/99
1º e 6º
2.158-35
27.08.2001
73 e 93
Lei nº 9.317/96
9º e 15
2.177-44
27.08.2001
1º e 8º
Lei nº 9.656/98
2.158-35
27.08.2001
75
Lei nº 9.532/97
1º, 15 e 64-A
2.158-35
27.08.2001
82
Lei nº 8.981/95
29
2.158-35
27.08.2001
93
Lei nº 9.432/97
11
1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 24-A, 24-B, 24-C, 24-D, 25, 26, 27, 28, 29, 29-A, 30, 31, 32, 34, 35, 35-A, 35-B, 35-C, 35-D, 35-E, 35-F, 35-G, 35-H e 35-I
2.158-35
27.08.2001
93
LC 70/91
6º e 7º
2.178-36
25.08.2001-extra
16
Lei nº 9.533/97
4º
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
MP
DOU
ART
NORMA LEGAL
ALTERAÇÃO
2.178-36
25.08.2001-extra
32
Lei nº 8.913/97
Revogada
2.196-3
25.08.2001
14
Lei nº 7.827/89
9º-A
2.180-35
27.08.2001
1º
Lei nº 8.437/92
1º e 4º
2.197-43
27.08.2001
3º e 8º
Lei nº 8.692/93
23 e 25
2.180-35
27.08.2001
4º
Lei nº 9.494/97
1º-A, 1º-B (CPC e CLT), 1º-C, 1º-D, 1ºE, 1º-F, 2º-A e 2º-B
2.197-43
27.08.2001
4º e 8º
Lei nº 4.380/64
9º, 14 e 18
2.180-35
27.08.2001
6º
Lei nº 7.347/85
1º e 2º
2.197-43
27.08.2001
5º
Lei nº 8.036/90
9º, 20, 23, 29-A e 29-B
2.180-35
27.08.2001
7º
Lei nº 8.429/92
17
2.199-14
27.08.2001
18
Lei nº 9.532/97
4º
2.180-35
27.08.2001
8º
Lei nº 9.704/98
1º
2.211
30.08.2001
1º
Lei nº 9.995/00
35 e 70
2.180-35
27.08.2001
10
CPC
741
2.211
30.08.2001
2º
Lei nº 10.266/01
18, 34, 38 e 51
2.180-35
27.08.2001
14
Lei nº 4.348/64
4º
2.214
01.09.2001-extra
1º
Lei nº 10.261/01
1º
2.180-35
27.08.2001
21
Lei nº 10.257/01
53
2.215-10
01.09.2001
41
Lei nº 8.448/92
6º
2.181-45
27.08.2001
45
Lei nº 8.177/91
18
2.215-10
01.09.2001
41
Lei nº 8.460/92
2.181-45
27.08.2001
46
Lei nº 9.365/96
6º
2º, 20, 25, 26 e 27, 5º, 7º-A, 13, 14, 14-A, 23, 24, 27, 28, 30, 32, 34-A, 38, 44, 51-A e 61-A
2.181-45
27.08.2001
52
Lei nº 10.150/00
1º
2.217-3
05.09.2001
1º
Lei nº 10.233/01
2.183-56
27.08.2001
1º
DL 3.365/41
10, 15-A, 15-B e 27
2.183-56
27.08.2001
3º
Lei nº 8.177/91
5º
74, 77, 78-A, 78-B, 78-C, 78-D, 78-E, 78-F, 78-G, 78-H, 78-I 78-J, 82, 83, 84, 85-A, 85-B, 85-C, 85-D, 86, 88, 89, 100, 102-A, 103-A, 103-B, 103-C, 103-D, 113-A, 114-A, 15, 116-A, 118 e 119
2.183-56
27.08.2001
4º
Lei nº 8.629/93
2º, 2º-A, 5º, 6º, 7º, 11, 12, 17, 18 e 26-A
2.220
05.09.2001-extra
15
Lei nº 6.015/73
167, I
2.187-13
27.08.2001
2º
Lei nº 6.015/73
80
2.224
05.09.2001
4º
Lei nº 4.131/62
6º
2.187-13
27.08.2001
3º e 16
Lei nº 8.212/91
38, 55, 56, 68, 101 e 102
2.225-45
05.09.2001
1º
Lei nº 6.368/76
3º
2.187-13
27.08.2001
4º e 16
Lei nº 8.213/91
41, 95, 96, 134, 144, 145, 146 e 147
2.225-45
05.09.2001
2º, 3º e 15 Lei nº 8.112/90
25, 26, 46, 47, 61, 62-A, 67, 91, 117 e 119
2.187-13
27.08.2001
7º
Lei nº 9.639/98
1º, 2º e 5º
2.225-45
05.09.2001
4º
Lei nº 8.429/92
17
2.187-13
27.08.2001
16
Lei nº 9.711/98
7º, 8º, 9º, 12, 13, 14, 15, 16 e 17
2.225-45
05.09.2001
5º
Lei nº 9.525/97
2º
2.189-49
24.08.2001
10
Lei nº 9.532/97
6º, II, 34 e 82, II, f
2.226
05.09.2001
1º
CLT
896-A
2.189-49
24.08.2001
11
Lei nº 9.250/95
10 e 25
2.226
05.09.2001
3º
Lei nº 9.469/97
6º
2.189-49
24.08.2001
13
Lei nº 9.430/96
79
2.228-1
05.09.2001
51
Lei nº 8.685/93
5º
2.189-49
24.08.2001
14
Lei nº 9.317/96
9º
2.228-1
05.09.2001
52 e 53
Lei nº 8.313/91
2.190-34
24.08.2001
7º e 8º
Lei nº 9.294/96
2º, 3º e 7º
3º, II, a (a partir de 01.01.2007), e 18, § 3º
2.192-70
25.08.2001-extra
23
Lei nº 9.496/97
1º, 3º, 6º, 7º-A e 7º-B
2.229-43
10.09.2001
72
Lei nº 9.986/00
22
2.196-3
25.08.2001
12
Lei nº 8.036/90
9º
2.229-43
10.09.2001
74
Lei nº 8.745/93
4º
Janeiro/2014 – Ed. 202
MP
78
Normas Legais
Dezembro/2013 Lei nº 12.951, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento de Investimento para 2013, em favor de empresas estatais, crédito suplementar no valor de R$ 16.649.201.758,00, e reduz o Orçamento de Investimento de empresas no valor de R$ 16.974.733.834,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.950, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério do Desenvolvimento Agrário, crédito suplementar no valor de R$ 17.600.000,00, para reforço de dotação constante da Lei Orçamentária vigente. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.949, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento de Investimento para 2013, em favor da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária – Infraero, crédito suplementar no valor de R$ 455.020.300,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.948, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, crédito especial no valor de R$ 116.082.503,00, para o fim que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.947, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento de Investimento para 2013, em favor de empresas estatais, crédito especial no valor de R$ 737.989.256,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.946, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor da Secretaria de Portos da Presidência da República, crédito especial no valor de R$ 65.000.000,00, para o fim que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.945, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e do Turismo, de Encargos Financeiros da União, de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios e de Operações Oficiais de Crédito, crédito suplementar no valor de R$ 839.651.997,00 para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.944, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Pesca e Aquicultura, crédito especial no valor de R$ 28.400.000,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.943, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor do Ministério da Saúde, crédito suplementar no valor de R$ 107.050.000,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.942, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Fazenda e do Turismo e de Encargos Financeiros da União, crédito especial no valor de R$ 367.260.302,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.941, de 27.12.2013
Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, em favor dos Ministérios da Previdência Social, do Trabalho e Emprego e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, crédito suplementar no valor de R$ 174.731.771,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.940, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios de Minas e Energia e dos Transportes, crédito especial no valor de R$ 14.346.000,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.939, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério dos Transportes, crédito suplementar no valor de R$ 17.200.000,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.938, de 27.12.2013
Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, em favor dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão e das Cidades, crédito especial no valor de R$ 425.280.862,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.937, de 27.12.2013
Abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor do Ministério da Saúde, crédito especial no valor de R$ 64.754.694,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Abre ao Orçamento de Investimento para 2013, em favor das empresas estatais que menciona, crédito especial no valor de R$ 986.053.775,00, para os fins que especifica. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.935, de 27.12.2013
Transforma cargos vagos do Plano special de Cargos da Cultura, alocados no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.934, de 27.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. (DOU 30.12.2013)
Lei nº 12.933, de 26.12.2013
Dispõe sobre o benefício do pagamento de meia-entrada para estudantes, idosos, pessoas com deficiência e jovens de 15 a 29 anos comprovadamente carentes em espetáculos artístico-culturais e esportivos, e revoga a Medida Provisória no 2.208, de 17 de agosto de 2001. Mensagem de Veto (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.932, de 26.12.2013
Altera o Decreto-Lei nº 1.040, de 21 de outubro de 1969, para modificar a composição do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais de Contabilidade. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.931, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de membro e cargos em comissão, no âmbito do Ministério Público Federal. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.930, de 26.12.2013
Altera a Lei nº 10.771, de 21 de novembro de 2003, na parte que dispõe sobre a criação de Procuradorias da República em Municípios no âmbito do Ministério Público Federal. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.929, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 8a Região. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.928, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de funções comissionadas no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 5a Região e dá outras providências. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.927, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.926, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 4a Região. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.925, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 22a Região. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.924, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 15a Região. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.923, de 26.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Superior do Trabalho. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.922, de 26.12.2013
Dispõe sobre a transformação de funções comissionadas em cargos em comissão, no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 3a Região. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.921, de 26.12.2013
Proíbe a fabricação, a comercialização, a distribuição e a propaganda de produtos nacionais e importados, de qualquer natureza, bem como embalagens, destinados ao público infantojuvenil, reproduzindo a forma de cigarros e similares. (DOU 27.12.2013)
Lei nº 12.920, de 24.12.2013
Dá a denominação de Aeroporto Internacional do Rio Grande do Norte/São Gonçalo do Amarante – Governador Aluizio Alves ao Aeroporto São Gonçalo do Amarante, no Estado do Rio Grande do Norte. (DOU 26.12.2013 – Edição extra)
Lei nº 12.919, de 24.12.2013
Dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e execução da Lei Orçamentária de 2014 e dá outras providências. Mensagem de veto (DOU 26.12.2013 – Edição extra)
Lei nº 12.918, de 20.12.2013
Altera o art. 1º da Lei nº 7.150, de 1º de dezembro de 1983, que fixa os efetivos do Exército em tempo de paz. (DOU 23.12.2013)
Lei nº 12.917, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério do Meio Ambiente, crédito suplementar no valor de R$ 51.002.603,00, para reforço de dotação constante da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Janeiro/2014 – Ed. 202
Lei nº 12.936, de 27.12.2013
80
Janeiro/2014 – Ed. 202
81
Lei nº 12.916, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, do Turismo e das Cidades, crédito suplementar no valor de R$ 240.000.000,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.915, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor das Justiças Federal, Eleitoral e do Trabalho, do Ministério Público da União, do Ministério das Relações Exteriores e das Secretarias de Assuntos Estratégicos, de Portos e da Micro e Pequena Empresa, crédito suplementar no valor de R$ 182.208.690,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.914, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor das Justiças Federal, Eleitoral e do Trabalho, do Ministério Público da União e da Secretaria de Portos da Presidência da República, crédito especial no valor de R$ 46.743.678,00, para os fins que especifica. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.913, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Justiça e da Defesa, crédito suplementar no valor de R$ 404.152.417,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.912, de 18.12.2013
Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, em favor do Ministério das Cidades, crédito suplementar no valor de R$ 44.308.421,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.911, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação, da Educação e do Esporte e de Operações Oficiais de Crédito, crédito suplementar no valor de R$ 1.389.085.155,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.910, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério da Justiça, crédito especial no valor de R$ 1.528.000,00, para os fins que especifica. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.909, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério do Desenvolvimento Agrário, crédito suplementar no valor de R$ 10.000.000,00, para reforço de dotação constante da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.908, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério do Meio Ambiente, crédito suplementar no valor de R$ 1.100.000,00, para reforço de dotação constante da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.907, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, crédito especial no valor de R$ 2.350.000,00, para os fins que especifica. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.906, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento de Investimento para 2013 crédito suplementar no valor total de R$ 8.207.509,00, em favor de Companhias Docas e da Empresa Gerencial de Projetos Navais – EMGEPRON, e reduz o Orçamento de Investimento de empresas estatais no valor global de R$ 24.880.202,00, para os fins que especifica. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.905, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério da Justiça, crédito suplementar no valor de R$ 62.000.000,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.904, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Tribunal de Contas da União e das Justiças Federal, Eleitoral e do Trabalho, crédito especial no valor de R$ 34.958.072,00, para os fins que especifica. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.903, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério dos Transportes, crédito especial no valor de R$ 269.472.439,00, para os fins que especifica. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.902, de 18.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, crédito suplementar no valor de R$ 230.000.000,00, para reforço de dotação constante da Lei Orçamentária vigente. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.901, de 18.12.2013
Altera o caput do art. 2º e o Anexo IV.1 da Lei nº 12.708, de 17 de agosto de 2012, que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e execução da Lei Orçamentária de 2013 e dá outras providências. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.900, de 18.12.2013
Dispõe sobre a criação de cargos de provimento efetivo no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho da 1a Região. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.899, de 18.12.2013
Altera o art. 42 da Lei nº 10.741, de 1º de outubro 2003, que institui o Estatuto do Idoso, para dispor sobre a prioridade e a segurança do idoso nos procedimentos de embarque e desembarque nos veículos de transporte coletivo. (DOU 19.12.2013)
Dispõe sobre a criação de Funções Comissionadas do DNIT – FCDNIT, no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, e dá outras providências. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.897, de 18.12.2013
Autoriza o Poder Executivo federal a instituir serviço social autônomo denominado Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural – ANATER e dá outras providências. Mensagem de veto (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.896, de 18.12.2013
Acrescenta os §§ 5º e 6º ao art. 15 da Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, vedando a exigência de comparecimento do idoso enfermo aos órgãos públicos e assegurando-lhe o atendimento domiciliar para obtenção de laudo de saúde. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.895, de 18.12.2013
Altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, obrigando os hospitais de todo o País a manter, em local visível de suas dependências, aviso informando sobre o direito da parturiente a acompanhante. (DOU 19.12.2013)
Lei nº 12.894, de 17.12.2013
Acrescenta inciso V ao art. 1º da Lei nº 10.446, de 8 de maio de 2002, para prever a atribuição da Polícia Federal para apurar os crimes de falsificação, corrupção e adulteração de medicamentos, assim como sua venda, inclusive pela internet, quando houver repercussão interestadual ou internacional. (DOU 18.12.2013)
Lei nº 12.893, de 17.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor da Justiça Federal, Justiça Militar da União, Justiça do Trabalho e de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, crédito suplementar no valor de R$ 48.013.037,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 17.12.2013 – Edição extra)
Lei nº 12.892, de 13.12.2013
Declara o ambientalista Chico Mendes Patrono do Meio Ambiente Brasileiro. (DOU 16.12.2013)
Lei nº 12.891, de 11.12.2013
Altera as Leis nºs 4.737, de 15 de julho de 1965, 9.096, de 19 de setembro de 1995, e 9.504, de 30 de setembro de 1997, para diminuir o custo das campanhas eleitorais, e revoga dispositivos das Leis nºs 4.737, de 15 de julho de 1965, e 9.504, de 30 de setembro de 1997. Mensagem de veto (DOU 12.12.2013 – Edição extra)
Lei nº 12.890, de 10.12.2013
Altera a Lei nº 6.894, de 16 de dezembro de 1980, para incluir os remineralizadores como uma categoria de insumo destinado à agricultura, e dá outras providências. (DOU 11.12.2013)
Lei nº 12.889, de 6.12.2013
Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor das Justiças Eleitoral e do Trabalho, do Ministério da Educação e do Ministério Público da União, crédito suplementar no valor de R$ 942.240.394,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. (DOU 6.12.2013 – Edição extra)
Janeiro/2014 – Ed. 202
Lei nº 12.898, de 18.12.2013
82
Indicadores I – Índices de Atualização dos Débitos Trabalhistas (Vigência: Dezembro/2013 – Atualização: Janeiro/2014)
1 – Índice de Atualização Monetária até 31 de janeiro de 2014 – Decreto-Lei nº 2.322/1987 combinado com a Lei nº 7.738/1989 (incluindo a Lei nº 8.177/1991 – TR – a partir de fev. 1991) – TR prefixada de 1º jan./2014 a 1º fev./2014 (Banco Central) = 0,11260% 1991
1992
1993
1994
1995
1996
2003
2004
2005
2006
2007
2008
JAN
Mês/Ano
0,014924142
0,002850556
0,000226915
0,008813116
2,305738702
1,751779754
JAN
1,190056770
1,137192828
1,116883220
1,086108065
1,064418068
1,049253099
FEV
0,012414665
0,002271722
0,000179011
0,006230993
2,258285352
1,730108416
FEV
1,184279853
1,135739082
1,114787420
1,083587640
1,062093146
1,048194422
MAR
0,011602491
0,001808552
0,000141623
0,004455164
2,217198447
1,713614873
MAR
1,179425338
1,135219152
1,113716025
1,082802609
1,061327929
1,047939773
ABR
0,010693540
0,001455340
0,000112569
0,003140757
2,167353648
1,699780360
ABR
1,174981558
1,133204314
1,110789096
1,080562602
1,059340606
1,047511341
MAIO
0,009816892
0,001201966
0,000087794
0,002151646
2,094735454
1,688640400
MAIO
1,170085918
1,132214759
1,108568633
1,079639510
1,057994837
1,046511922
JUN
0,009007149
0,001003227
0,000068226
0,001469302
2,028856456
1,678755885
JUN
1,164670202
1,130467057
1,105774341
1,077604992
1,056210896
1,045742255
JUL
0,008233226
0,000828771
0,000052449
2,751026785
1,971940342
1,668579220
JUL
1,159838315
1,128479804
1,102474634
1,075521707
1,055204232
1,044545207
AGO
0,007481350
0,000670038
0,040231225
2,619373111
1,914681783
1,658873154
AGO
1,153534251
1,126281303
1,099643053
1,073641760
1,053656410
1,042549766
SET
0,006682760
0,000543774
0,030171910
2,564713928
1,866079737
1,648528636
SET
1,148895013
1,124027627
1,095844855
1,071032724
1,052114011
1,040911372
OUT
0,005722521
0,000433701
0,022412650
2,503647463
1,830579312
1,637687147
OUT
1,145043088
1,122088658
1,092962713
1,069406157
1,051743797
1,038864808
NOV
0,004777925
0,000346766
0,016415916
2,441270559
1,800794176
1,625626624
NOV
1,141375847
1,120846760
1,090672301
1,067404774
1,050544076
1,036267921
DEZ
0,003660684
0,000281261
0,012056343
2,371984880
1,775253603
1,612491270
DEZ
1,139352357
1,119563740
1,088572444
1,066038113
1,049924621
1,034593948
Mês/Ano
Mês/Ano
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2009
2010
2011
2012
2013
2014
JAN
1,598556651
1,456079444
1,350800008
1,277599126
1,251366607
1,223408592
JAN
1,032375373
1,025107302
1,018095154
1,005944277
1,003038382
1,001126000
FEV
1,586751222
1,439583259
1,343861650
1,274859453
1,249655828
1,220246932
FEV
1,030479291
1,025107302
1,017367736
1,005075891
1,003038382
1,000000000
MAR
1,576322241
1,433189799
1,332802059
1,271898473
1,249196124
1,218819694
MAR
1,030014755
1,025107302
1,016834915
1,005075891
1,003038382
ABR
1,566428710
1,420413183
1,317500607
1,269053256
1,247046216
1,216680769
ABR
1,028535720
1,024296060
1,015604003
1,004003615
1,003038382
MAIO
1,556759676
1,413740329
1,309522993
1,267404363
1,245121259
1,213819796
MAIO
1,028068977
1,024296060
1,015229383
1,003775758
1,003038382
JUN
1,546930480
1,407346752
1,302022044
1,264253842
1,242850571
1,211273699
JUN
1,027607581
1,023773935
1,013637971
1,003306211
1,003038382
JUL
1,536886924
1,400466262
1,297987897
1,261554116
1,241041133
1,209360491
JUL
1,026933912
1,023171287
1,012510035
1,003306211
1,003038382
AGO
1,526840314
1,392801674
1,294192032
1,259605507
1,238019128
1,206156938
AGO
1,025855738
1,021994971
1,011267188
1,003161756
1,002828791
SET
1,517326676
1,387599563
1,290391828
1,257059960
1,233779860
1,203171868
SET
1,025653684
1,021066821
1,009172146
1,003038382
1,002828791
OUT
1,507566689
1,381366836
1,286897900
1,255756485
1,231775761
1,200824257
OUT
1,025653684
1,020350535
1,008160961
1,003038382
1,002749573
NOV
1,497751921
1,369191981
1,283989664
1,254106081
1,228198020
1,197509551
NOV
1,025653684
1,019869157
1,007536288
1,003038382
1,001827892
DEZ
1,475132243
1,360841855
1,281429368
1,252606711
1,225834611
1,194351685
DEZ
1,025653684
1,019526596
1,006886846
1,003038382
1,001620556
Mês/Ano
OBS.: Foram consideradas as divisões por 1.000 ocorridas em março/1986, janeiro/1989, agosto/1993, e por 2.750 ocorridas em julho/1994.
* NOTA DO TRT DA 2ª REGIÃO SOBRE O ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA A atualização de débitos trabalhistas é definida no art. 39 da Lei nº 8.177/1991, que não sofreu alteração com a Lei nº 12.703/2012: tal lei modificou os parâmetros para cálculo dos rendimentos da caderneta de poupança, mas não alterou a TR, índice-base para atualização monetária. A TR tem sido calculada com valor “zero” desde setembro de 2012, o que não é nenhuma discrepância, dados os valores mais baixos da Taxa Selic. Observamos que, nas poupanças “novas” (abertas após a Lei nº 12.703/2012), o rendimento tem sido inferior a 0,5%, o que significaria, matematicamente, TR negativa (por isso a TR fica “zerada” nas tabelas de atualização). Lembramos, ainda, que a TR vem apresentando valor mensal muito baixo há muitos anos: o que, efetivamente, garante a preservação do valor dos débitos trabalhistas é a taxa de juros, que, ultimamente, tem sido superior à Selic – daí a TR “negativa” das poupanças novas. A alteração da TR como índice de atualização oficial das tabelas só poderá ser efetuada se houver mudança da legislação, já que a tabela é unificada nacionalmente. Até o fechamento desta edição, a tabela não foi divulgada pelo Tribunal.
2 – Juros de mora (incidentes a partir da propositura da ação e aplicados sobre o principal corrigido): • Até 28.02.1987 – Juros simples – 0,5% ao mês; • De 01.03.1987 até 31.01.1991 – Juros capitalizados mensalmente – 1% ao mês; • De 01.02.1991 em diante – Juros simples – 1% ao mês.
Fórmula para cálculo da taxa efetiva (T) dos juros capitalizados: T = (1,01)n – 1, onde “n” é igual ao número de dias decorridos desde a data da propositura da ação, contidos no período compreendido entre 01.03.1987 e 31.01.1991, dividido por 30.
Juros Capitalizados Mensalmente Nº Meses 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16
% Efetivo 1,0000 2,0100 3,0301 4,0604 5,1010 6,1520 7,2135 8,2856 9,3685 10,4622 11,5668 12,6825 13,8093 14,9474 16,0968 17,2578
Nº Meses 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32
% Efetivo 18,4304 19,6147 20,8108 22,0190 23,2391 24,4715 25,7163 26,9734 28,2431 29,5256 30,8208 32,1290 33,4503 34,7848 36,1327 37,4940
Nº Meses 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 –
% Efetivo 38,8690 40,257+6 41,6602 43,0768 44,5076 45,9527 47,4122 48,8863 50,3752 51,8789 53,3977 54,9317 56,4810 58,0458 59,6263 –
Moeda
Valor
Norma Legal
DOU
Valor
Norma Legal
DOU
01.10.1989
Vigência
NCz$
381,73
Decreto nº 98.211/89
02.10.1989
VigênciaMoeda 01.09.1990
Cr$
6.056,31
Port. 3.588/90
03.09.1990
01.11.1989
NCz$
557,33
Decreto nº 98.346/89
31.10.1989
01.10.1990
Cr$
6.425,14
Port. 3.628/90
01.10.1990
01.12.1989
NCz$
788,18
Decreto nº 98.456/89
01.12.1989
01.11.1990
Cr$
8.329,55
Port. 3.719/90
01.11.1990
01.01.1990
NCz$
1.283,95
Decreto nº 98.783/89
29.12.1989
01.12.1990
Cr$
8.836,82
Port. 3.787/90
03.12.1990
Cr$
12.325,50
Port. 3.828/90
31.12.1990
01.02.1990
NCz$
2.004,37
Decreto nº 98.900/90
01.02.1990
01.01.1991
01.03.1990
NCz$
3.674,06
Decreto nº 98.985/90
01.03.1990
01.02.1991
Cr$
15.895,46
MP 295/91
01.02.1991
01.04.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.143/90
24.04.1990
01.03.1991
Cr$
17.000,00
Lei nº 8.178/91
04.03.1991
Cr$
42.000,00
Lei nº 8.222/91
06.09.1991
01.05.1990
Cr$
3.674,06
Port. 3.352/90
23.05.1990
01.09.1991
01.06.1990
Cr$
3.857,76
Port. 3.387/90
04.06.1990
01.01.1992
Cr$
96.037,33
Port. 42/92
21.01.1992
01.07.1990
Cr$
4.904,76
Port. 3.501/90
16.07.1990
01.05.1992
Cr$
230.000,00
Lei nº 8.419/92
08.05.1992
01.08.1990
Cr$
5.203,46
Port. 429/90
01.08.1990
01.09.1992
Cr$
522.186,94
Port. 601/92
31.08.1992
Janeiro/2014 – Ed. 202
II – Evolução do Salário-Mínimo desde 1989
84
VigênciaMoeda
Valor
Norma Legal
DOU
Valor
Norma Legal
DOU
01.01.1993
Cr$
1.250.700,00
Lei nº 8.542/92
24.12.1992
VigênciaMoeda 01.05.1999
R$
136,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.03.1993
Cr$
1.709.400,00
Port. Interm. 4/93
01.03.1993
03.04.2000
R$
151,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.05.1993
Cr$
3.303.300,00
Port. Interm. 7/93
04.05.1993
01.04.2001
R$
180,00
MP 2.142/01 (atual 2.194-6)
30.03.2001
01.07.1993
Cr$
4.639.800,00
Port. Interm. 11/93
01.08.1993
01.04.2002
R$
200,00
Lei nº 10.525/02
28.03.2002
01.08.1993
CR$
5.534,00
Port. Interm. 12/93
03.08.1993
01.04.2003
R$
240,00
Lei nº 10.699/03
10.07.2003
01.09.1993
CR$
9.606,00
Port. Interm. 14/93
02.09.1993
01.05.2004
R$
260,00
Lei nº 10.888/04
25.06.2004
01.10.1993
CR$
12.024,00
Port. Interm. 15/93
04.10.1993
01.05.2005
R$
300,00
Lei nº 11.164/05
19.08.2005
01.11.1993
CR$
15.021,00
Port. Interm. 17/93
03.11.1993
01.04.2006
R$
350,00
MP 288/06
31.03.2006
01.12.1993
CR$
18.760,00
Port. Interm. 19/93
02.12.1993
01.04.2006
R$
350,00
Lei nº 11.321/06
10.07.2006
01.01.1994
CR$
32.882,00
Port. Interm. 20/93
31.12.1993
01.04.2007
R$
380,00
MP 362/07
30.03.2007-extra
01.02.1994
CR$
42.829,00
Port. Interm. 02/94
02.02.1994
01.04.2007
R$
380,00
Lei nº 11.498/07
29.06.2007
01.03.1994
URV
64,79
Port. Interm. 04/94
03.03.1994
01.03.2008
R$
415,00
MP 421/08
29.02.2008-extra
01.07.1994
R$
64,79
Lei nº 9.069/95
30.06.1994/30.06.1995
01.02.2009
R$
465,00
MP 456/09
30.01.2009-extra
01.09.1994
R$
70,00
Lei nº 9.063/95
01.09.1994/20.06.1995
01.01.2010
R$
510,00
MP 474/09
24.12.2009
01.05.1995
R$
100,00
Lei nº 9.032/95
29.04.1995
01.01.2011
R$
540,00
MP 516/10
31.12.2010
01.05.1996
R$
112,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.03.2011
R$
545,00
Lei nº 12.382/11
28.02.2011
01.05.1997
R$
120,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2012
RS
622,00
Decreto nº 7.655/11
26.12.2011
01.05.1998
R$
130,00
Lei nº 9.971/00
19.05.2000
01.01.2013
R$
678.00
Decreto nº 7.872/11
26.12.2012
Janeiro/2014 – Ed. 202
III – Previdência Social – Valores de Benefícios (Dezembro/2013) 1 – Salário-de-benefício mínimo: R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais) 2 – Salário-de-benefício máximo: R$ 3.916,20 (três mil, novecentos e dezesseis reais e vinte centavos) 3 – Renda mensal vitalícia: R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais) 4 – Auxílio-funeral*
85
5 – Auxílio-natalidade* 6 – Salário-família: – R$ 31,22 (trinta e um reais e vinte e dois centavos) para o segurado com remuneração mensal não superior R$ 608,80 (seiscentos e oito reais e oitenta e centavos); – R$ 22,00 (vinte e dois reais) para o segurado com remuneração mensal superior a R$ 608,80 (seiscentos e oito reais e oitenta
7 – Benefícios a idosos e portadores de deficiência: Valor de um salário-mínimo (Decreto nº 1.744/1995).
8 – Tabela de contribuição (empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso) para pagamento de remuneração Salário-de-contribuição (R$) Até R$ 1.247,70
Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%)
8,00*
De R$ 1.247,71 até R$ 2.079,50
9,00*
* Benefícios extintos a partir de jan. 1996 (Lei nº 8.742/1993, art. 40).
De R$ 2.079,51 até R$ 4.159,00
11,00*
9 – Escala de salários-base para os segurados contribuinte individual e facultativo
IV – Imposto de Renda na Fonte
Nota: Escala extinta, conforme o art. 9º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003, DOU 09.05.2003, e o art. 39 da Instrução Normativa DC/INSS nº 89, de 11.06.2003, DOU 13.06.2003.
* Alíquota reduzida para salários e remunerações até três salários-mínimos, em razão do disposto no inciso II do art. 17 da Lei nº 9.311, de 24.10.1996, que instituiu a Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e de Direitos de Natureza Financeira – CPMF.
TABELA PROGRESSIVA MENSAL Base de cálculo em R$ Até 1.710,78
-
Alíquota %
Parcela a deduzir do imposto em R$
-
De 1.710,79 até 2.563,91
7,5
128,31
De 2.563,92 até 3.418,59
15,0
320,60
De 3.418,60 até 4.271,59
22,5
577,00
Acima de 4.271,59
27,5
790,58
V – Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho Novos valores para Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho (Ato nº 491/2012 do TST, DJe de 20.07.2012, vigência a partir de 01.08.2012) Recurso Ordinário
R$ 6.598,21
Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recurso em Ação Rescisória
R$ 13.196,42
Janeiro/2014 – Ed. 202
e centavos) e igual ou inferior a R$ 915,05 (nocentos e quinze reais e cinco centavos).
Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.
86
VI – Indexadores Indexador
Julho
Agosto
Setembro
Outubro
Novembro
Dezembro
INPC IGPM UFIR SELIC
- 0,13 0,26
0,16 0,71
0,27 0,71
0,61 0,81
0,54 0,29
0,72 0,60
0,72
0,79
Extinta, a partir de outubro de 2000, pela MP 1.973-67, atual Lei nº 10.522, de 19.07.2002, DOU 22.07.2002, art. 29, § 3º.
0,72
0,15
1,50
0,86
Valor de Referência Base Maio/1992 – Cruzeiros 79.297,75 Emissão anterior a Jan./1989 79.297,75
TDA
Valores nominais reajustados – Reais 91,87 Emissão anterior a Jan./1989 157,23
(*) Referente ao primeiro dia de cada mês.
VII – Índices de Atualização dos Débitos Judiciais Tabela editada em face da Jurisprudência ora predominante.
Janeiro/2014 – Ed. 202
Mês/Ano
87
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1.942,73 2.329,52 2.838,99 3.173,71 3.332,71 3.555,33 3.940,38 4.418,74 5.108,95 5.906,96 7.152,15 9.046,04
11.230,66 14.141,65 17.603,52 21.409,40 25.871,12 32.209,55 38.925,24 47.519,93 58.154,89 72.100,44 90.897,02 111.703,35
140.277,06 180.634,78 225.414,14 287.583,35 369.170,75 468.034,68 610.176,81 799,392641 1.065,91 1.445,69 1.938,96 2.636,99
3.631,93 5.132,64 7.214,96 10.323,16 14.747,66 21.049,34 11,346741 12,036622 12,693821 12,885497 13,125167 13,554359
13,851199 14,082514 14,22193 14,422459 14,69937 15,077143 15,351547 15,729195 15,889632 16,07554 16,300597 16,546736
16,819757 17,065325 17,186488 17,236328 17,396625 17,619301 17,853637 18,06788 18,158219 18,16185 18,230865 18,292849
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
1997
1998
1999
2000
2001
2002
18,353215 18,501876 18,585134 18,711512 18,823781 18,844487 18,910442 18,94448 18,938796 18,957734 19,012711 19,04123
19,149765 19,312538 19,416825 19,511967 19,59977 19,740888 19,770499 19,715141 19,618536 19,557718 19,579231 19,543988
19,626072 19,753641 20,008462 20,26457 20,359813 20,369992 20,38425 20,535093 20,648036 20,728563 20,927557 21,124276
21,280595 21,410406 21,421111 21,448958 21,468262 21,457527 21,521899 21,821053 22,085087 22,180052 22,21554 22,279965
22,402504 22,575003 22,68562 22,79451 22,985983 23,117003 23,255705 23,513843 23,699602 23,80388 24,027636 24,337592
24,51769 24,780029 24,856847 25,010959 25,181033 25,203695 25,357437 25,649047 25,869628 26,084345 26,493869 27,392011
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2003
2004
2005
2006
2007
2008
28,131595 28,826445 29,247311 29,647999 30,057141 30,354706 30,336493 30,348627 30,403254 30,65256 30,772104 30,88596
31,052744 31,310481 31,432591 31,611756 31,741364 31,868329 32,02767 32,261471 32,422778 32,477896 32,533108 32,676253
32,957268 33,145124 33,290962 33,533986 33,839145 34,076019 34,038535 34,048746 34,048746 34,099819 34,297597 34,482804
34,620735 34,752293 34,832223 34,92627 34,968181 35,013639 34,989129 35,027617 35,020611 35,076643 35,227472 35,375427
35,594754 35,769168 35,919398 36,077443 36,171244 36,265289 36,377711 36,494119 36,709434 36,801207 36,91161 37,070329
37,429911 37,688177 37,86908 38,062212 38,30581 38,673545 39,025474 39,251821 39,334249 39,39325 39,590216 39,740658
Mês/Ano JAN FEV MAR ABR MAIO JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2009
2010
2011
2012
2013
2014
39,855905 40,110982 40,235326 40,315796 40,537532 40,780757 40,952036 41,046225 41,079061 41,144787 41,243534 41,396135
41,495485 41,860645 42,153669 42,45296 42,762866 42,946746 42,899504 42,869474 42,839465 43,070798 43,467049 43,914759
44,178247 44,593522 44,834327 45,130233 45,45517 45,714264 45,814835 45,814835 46,007257 46,214289 46,362174 46,626438
46,864232 47,103239 47,286941 47,372057 47,675238 47,937451 48,062088 48,268754 48,485963 48,791424 49,137843 49,403187
49,76877 50,226642 50,48782 50,790746 51,090411 51,269227 51,41278 51,345943 51,428096 51,566951 51,881509 52,161669
52,537233
Observação I – Dividir o valor a atualizar (observar o padrão monetário vigente à época) pelo fator do mês do termo inicial e multiplicar pelo fator do mês do termo final, obtendo-se o resultado na moeda vigente na data do termo final, não sendo necessário efetuar qualquer conversão. Esclarecendo que, nesta tabela, não estão incluídos os juros moratórios, apenas a correção monetária.
Padrões monetários a considerar: Cr$ (cruzeiro): de out./1964 a jan./1967
NCz$ (cruzado novo): de jan./1989 a fev./1990
NCr$ (cruzeiro novo): de fev./1967 a maio/1970
Cr$ (cruzeiro): de mar./1990 a jul./1993
Cr$ (cruzeiro): de jun./1970 a fev./1986
CR$ (cruzeiro real): de ago./1993 a jun./1994
Cz$ (cruzado): de mar./1986 a dez./1988
R$ (real): de jul./1994 em diante
Exemplo: Atualização até dezembro de 20134do valor de Cz$ 1.000,00, fixado em janeiro 1988. Cz$ 1.000,00 : 596,94 (jan./1988) x 52,537233 (janeiro/2014) = R$ R$ 88,01
Out./1964 a fev./1986: ORTN Mar./1986 e mar./1987 a jan./1989: OTN Abr./1986 a fev./1987: OTN pro rata Fev./1989: 42,72% (conforme STJ, índice de jan./1989
Abr./1989 a mar./1991: IPC do IBGE (de mar./1989 a fev./1991) Abr./1991 a jul./1994: INPC do IBGE (de mar./1991 a jun./1994) Ago./1994 a jul./1995: IPC-r do IBGE (de jul./1994 a jun./1995) Mar./1989: 10,14% (conforme STJ, índice de fev./1989)
Ago./1995 em diante: INPC do IBGE (de jul./1995 em diante), sendo que, com relação à aplicação da deflação, a matéria ficará sub judice) Observação III – Aplicação do índice de 10,14%, relativo ao mês de fevereiro de 1989, ao invés de 23,60%, em cumprimento ao decidido no Processo nº G-36.676/2002. Fonte: DJe, TJSP, Administrativo, 09.12.2013, p. 4. * Aplicável aos cálculos judiciais, exceto para aqueles com normas específicas estabelecidas por lei ou com decisão transitada em julgado, que estabelece critérios e índices diferentes.
Janeiro/2014 – Ed. 202
Observação II – Os fatores de atualização monetária foram compostos pela aplicação dos seguintes índices:
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