Editorial J - Especial 50 anos do Golpe - Abril/Maio de 2014

Page 1

CADERNO ESPECIAL - 50 ANOS DO GOLPE DE 1964

ABRIL/MAIO 2014 • FAMECOS/PUCRS WWW.PUCRS.BR/FAMECOS/EDITORIAL J

O

vazio acima traduz o silêncio que imperou no Brasil durante os anos de chumbo. Entre 1964 e 1985, militares governaram o país a partir de um golpe contra o governo de João Goulart em 1º de abril, impondo um período de violência, censura e arbitrariedade. Cinquenta anos depois, os brasileiros ainda buscam a verdade e têm o direito de entender os desdobramentos de duas décadas que esvaziaram de sentido a vida de muitos. O Editorial J mergulhou em algumas histórias daqueles tempos de medo e sobressaltos, mas também de resistência. Neste caderno especial de oito páginas, o leitor conhecerá como a repressão montou um aparato de vigilância e perseguição no Interior do Rio Grande do Sul, Estado-chave para o regime conter

qualquer possibilidade de reação aos golpistas. O sistema criou filiais do temido Dops em dez municípios gaúchos. Também mostramos como a mídia, de uma maneira geral, aliouse aos militares e civis que urdiram a derrubada de Jango. Por meio de editoriais e coberturas parciais dos acontecimentos, a imprensa agiu como aliada dos grupos que traçaram o objetivo de afastar do poder o governo legitimamente eleito. Mesmo com o clima político asfixiado pela censura, houve indignação e mobilizações para mostrar que alguma coisa de errado atormentava a normalidade política. Fotógrafos usaram as paredes de prédios nas ruas do centro da Capital para compartilhar imagens vetadas ou que poderiam soar provocativas - um movimento de reação àqueles anos de vazio e silêncio.


A cronologia segundo o @golpe1964 Um perfil criado pelo Editorial J no Twitter recontou episódios do golpe. Nas próximas páginas, o jornal publica uma seleção dos principais posts:

#

Março, 13 - Comício das Reformas, na Praça da República, no Rio de Janeiro, com a presença do presidente João Goulart.

#

Março, 31 - Gen. Mourão dá início ao golpe em Juiz de Fora (MG), horas antes do combinado. As tropas se dirigem ao Rio de Janeiro.

O Interior perseguido C OM O O B J ET I VO DE CRIAR UMA TE IA DE VIGILÂNCIA, DEZ CIDA DES GA ÚCHAS T I N H A M F I L I A I S DO TE MIDO D OPS, QUE E RAM CONHECIDAS COMO SOPS Guilherme Almeida: (5º sem.)

P O R Bruna Zanatta (3º sem.) e Júlia Bernardi (3º sem.)

M

uitos preferem esquecer o ano de 1964. Porém, com oito décadas de vida, Valdetar Antônio Dorneles ainda lembra de tudo. Com o apoio de Leonel Brizola, então exilado no Uruguai, Dorneles convocou um grupo de rebeldes na primeira guerrilha rural contra o governo militar, na cidade de Três Passos, a 470 km da Capital. A operação, que contava com 20 homens, acabou fracassando. Seus militantes foram cruelmente torturados, e o grupo ficou 11 meses sem qualquer comunicação, encarcerado. Preso por quatro anos, cumpriu pena em cinco prisões e carrega na pele cicatrizes daquele tempo de lutas. O militante é uma das tantas vítimas da repressão no interior do Rio Grande do Sul, Estado que recebeu atenção especial dos militares, pela resistência à tentativa de golpe de 1961, no movimento que ficou conhecido como Campanha da Legalidade. Já nessa época, segundo a historiadora Caroline Bauer, foram criadas as Seções de Ordem Política e Social (Sops), que funcionavam como uma espécie de filial do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), e agiam dentro das delegacias regionais de cada cidade, vigiando de perto a atuação de possíveis rebeldes no Interior. Essa comunicação, porém, não era exclusividade do sistema de repressão gaúcho. “O diálogo entre o Dops, nas capitais, e as delegacias regionais, no Interior, acontecia em todo o território nacional, porém, no Rio Grande do Sul acontecia através de um departamento especial”,

2

Dorneles começou a ser perseguido com a atuação no Grupo dos 11 explica Caroline. Esses braços operacionais elaboravam relatórios diários sobre a movimentação política, ainda que nada de anormal tivesse ocorrido na região. Ao fim do dia, um resumo de todas as ocorrências era encaminhado ao Dops, na Capital. Todos os movimentos articulados pela sociedade estavam sob vigilância. Em debates ou discussões nas escolas, os professores e organizadores eram minuciosamente

ABRIL/MAIO DE 2014

observados, para saber se agiam ou pensavam contra ou a favor do regime militar. Essa era, em suma, a principal função do Sops. Caroline ressalta que a filial tinha a função de vigiar maior até do que a de reprimir. Segundo a dissertação de mestrado de Vanessa Lieberknecht, dois fatores eram mencionados com frequência nos documentos: a preocupação com a padronização da informação, para que se pudesse operar de forma mais eficiente e sem erros;

e a diferenciação entre informe e informação. Os informes eram produzidos a partir de fatos concretos ocorridos na região, acusando um indivíduo específico. Já as informações não tinham uma comprovação efetiva do fato. Era preciso confirmação, por parte do delegado para que a informação (Código INFE) se tornasse um informe (Código INFO). A produção desses informes garantia o controle da população e a repressão.Toda essa vigilância, para a

historiadora Evelise Zimmer Neves, se devia, principalmente ao fato de que, na década de 1960, a maioria (55%) da população brasileira estava longe dos grandes centros urbanos. No Rio Grande do Sul, essa porcentagem era ainda maior, 62% dos gaúchos estavam na zona rural. “A presença [da repressão] no interior era indispensável”, conclui Evelise. No total, dez Sops foram distribuídos de maneira estratégica pelo Estado, nas cidades de Alegrete, Cachoeira do Sul, Caxias do Sul, Cruz Alta, Erechim, Lajeado, Lagoa Vermelha, Osório, Rio Grande e Santo Ângelo.

Três Passos, onde Dorneles vivia com a família, estava sob acompanhamento do Sops de Santo Ângelo. Mais velho de oito irmãos, ele ingressou na vida política com a Legalidade e a defesa da posse de João Goulart, após a renúncia de Jânio Quadros. Na época, era professor e, pelas cidades onde passou lecionando, sempre buscou mobilizar a população em prol de melhorias, como escolas, times de futebol, igrejas e até reforma agrária. Sua família, respeitada e influente, sempre esteve engajada na política e, por essa razão, eram vigiados de perto. Em um domingo de abril de 1964, o primeiro mês da ditadura militar (1964-1985), instaurada no Brasil em 31 de março daquele ano, a casa de Dorneles foi invadida por 41 militares. “Fizeram uma limpa na minha casa. Não fiquei nem com a faca de cozinha. Levaram tudo”, conta. Levaram também seu pai, Euzébio Teixeira Dornelles, preso, acusado de participar do Grupo dos 11 e solto na mesma noite. Na cozinha, abaixo da


Março, 31 - Juscelino avisa a Jango sobre as ações em Minas Gerais. O Presidente não acredita.

#

tregado o movimento. Dorneles pistola fixada na parede que foi ficou encarregado de mobilizar levada pelos soldados, estava os colonos. No total, 23 homens, uma pasta contendo documenentre eles, seu pai, Euzébio Teitos e atas referentes aos grupos. xeira Dornelles, e seu irmão A casa foi revirada, mas a pasta Abrão Antonio Dornelles, deificou ali. Dias depois, Dorneles, xaram suas casas para fazerem temendo que mais famílias fosparte da primeira guerrilha. Ao sem prejudicadas, retirou-a do se despedir da mãe e dos irmãos, local e ateou fogo. Hoje, ele se o alerta: “Se disserem que eu arrepende: “Eu podia ter só enmorri, não acreditem”. terrado aquela pasta. Aquilo era documento histórico”. O Grupo dos 11 era formado por colonos de uma região, que A Guerrilha de Três Passos se comprometiam a garantir a começou em 25 de março de legalidade constitucional e a con1965. Os rebeldes tomaram o cretização das reformas agrária presídio e o destacamento da e urbana. Apesar de terem sido Brigada Militar de Três Passos, idealizados por Brizola, não chelevando armas, munição e fardas. garam a ter uma coordenação Deixaram a cidade sem comunigeral e centralizada. Para alguns cação telefônica, cortando os fios setores sociais – militares, inteda rede e ainda invadiram a Rágrantes de partidos como PSD e dio Difusora, onde Odilon Vieira UDN e a maioria da Igreja CatóBruhn transmitiu lica –, essas organipara toda a popuzações eram vistas lação um manifesto como subversivas e contra a ditadura integradas ao “moDali militar: “As armas vimento comunista em dianque derrubaram internacional”. Em nossos presidensua tese, Evelise te, para o tes e governadores conta que, em alExército, hoje se levantam gumas paróquias para reestruturar a no interior do Eséramos codemocracia desse tado, os filhos dos munistas.” país”, explicaram. integrantes desses No caminhão grupos não eram Valdetar Mercedes ano nem batizados. Dorneles 1939, o grupo pasSegundo a edisava por cidades peção de 10 de abril dindo apoio e realizando de 1965 da extinta saques. Escondiam-se no mato. revista Manchete, o número de Quando o Exército os encontrou, Grupo dos 11 chegou a 24 mil, eles já estavam no Paraná, na ciem Santa Catarina e Rio Grandade de Leônidas Marques (PR). de do Sul. A partir do Golpe As ordens do coronel eram de de 1964, a perseguição a quem que não atirassem em ninguém estivesse ligado a esses comanpara matar. Ao verem o grupo dos só aumentou. “Na verdade, diminuir de 20 para 10 integrana acusação de pertencer a essa tes, resolveram se entregar, mas organização foi um amplo guaracabaram caindo em uma emda-chuva sob o qual os novos boscada. O grupo foi capturado e donos do poder – civis e militapreso no Quartel General de Foz res – enquadraram toda sorte de do Iguaçu (PR), quartel mais próinimigo político”, avalia Evelise. ximo da região, apenas dois dias Mais tarde, a maior parte dos depois do começo da guerrilha. indiciados foi absolvida por No Paraná, começou aquela absoluta falta de provas. Ainda que Dorneles considera a fase assim, naquele momento, para mais dura de sua vida. Nos interDorneles, o cenário mudou. “De rogatórios, negou que tivessem ali em diante, para o exército, tido o apoio de Brizola, e tomou éramos comunistas”, lembra. a responsabilidade da guerrilha No Uruguai, Brizola enviou para si quando o coronel Jefo coronel Jefferson Cardim de ferson pensou em se matar. Ele Alencar Osório e Albery Vieira pagou caro por sua astúcia. Por dos Santos que, mais tarde, seria quatro anos, oscilou por prisões acusado de ter se infiltrado e en-

Março, 31 - Gen. Ladário é recebido por Jango, que lhe entrega o comando do III Exército e o ordena se deslocar para o Sul do país.

entre Porto Alegre e cidades do Paraná até ser liberto, em 1968. Ele lembra das sessões de tortura pelas quais passou: “Enrolavam uma linha de pescar nos nossos dedos, ‘tu conhece Fulano?’ ‘Não’, e puxavam aquela linha. A linha corta até o osso”. Em Foz do Iguaçu, passou 51 dias em uma sala com 48 homens e apenas um banheiro. O pior momento veio em Porto Alegre. Na sede do 18º Regimento de Infantaria, que funcionava na Avenida Padre Cacique, onde hoje se localiza a Fundação de Atendimento Socioeducativo do Rio Grande do Sul (Fase), Dorneles passou cinco dias sem saber se era dia ou noite. “O pior castigo que tive, não foi o pau, não foi a corda, nem o enforcamento. Nada me abalou tanto quanto aqueles cinco dias. Desligado do mundo, não se ouvia nada”, lembra.

#

Março, 31 - Gen. Kruel apela para Jango se libertar do cerco das forças populares. O presidente se nega.

A conexão da vigília

Informe diário produzido por Delegacias Regionais para o Sops de Lagoa Vermelha

Alguns não conseguiram resristir tanto. Dorneles conta com pesar, que o ex-sargento da Brigada Militar Albery Vieira dos Santos entregou o grupo. Homem da confiança de Brizola, Santos teria atuado dentro do movimento, como agente do governo militar, e, mais tarde, em interrogatório, entregou todo o esquema da Guerrilha de Três Passos, conforme trechos do seu depoimento que relatam que “dotado de privilegiada memória, menciona grande número de pessoas que estão ligadas ao esquema contrarrevolucionário de Leonel Brizola”. Segundo Dorneles, “muita gente inocente apanhou por causa dele”. O irmão de Albery, José Soares dos Santos, foi uma vítima fatal da repressão, morrendo de forma violenta em 1977, também em Foz do Iguaçu. Ao que tudo indica, uma ação de queima de arquivo. O Dops deixou de existir em 1982, e junto com ele, o Sops. Cinquenta anos depois, hoje advogado, casado, pai de três filhos, Dorneles ainda mora em Três Passos e reafirma seu compromisso com o Brasil: “Se a pátria for ultrajada e precisar de um voluntário, eu saio outra vez”.

Solicitação do Dops pedindo informação para o Sops de Lagoa Vermelha

Informe do fim da ditadura ainda acusa presença do Grupo dos 11 na região

ABRIL/MAIO DE 2014

3


A cronologia segundo o @golpe1964 Março, 31 - Jango recebe um bilhete do Ministro da Justiça, Abelardo Jurema, lhe informando da movimentação das tropas em Minas.

#

Março, 31 - Gov. Carlos Lacerda é informado que o Ministro da Justiça, Abelardo Jurema, ordenou um ataque ao Palácio da Guanabara.

#

Março, 31 - Gen. Zerbini intercepta o Esquadrão Motorizado. O General Aluísio diz que foi forçado a aderir à manobra do Gen. Kruel.

#

Conspiração imp

Os 50 anos do golpe que instalou a ditadura militar no Brasil espalham uma sensação de constrangimento pela imprensa brasileira. Nos idos de 1964, os grandes grupos midiáticos assumiram um objetivo claro: derrubar o presidente João Goulart. O Editorial J buscou registros que ilustram a posição dos jornais da época e mostram como a imprensa integrou o conjunto de forças dominantes do país que, temerosas pela postura reformista de Jango, ajudaram a consolidar o golpe de Estado.

P O R Thamiris Mondin (5º sem.)

A

atuação da imprensa nos últimos dias do governo de João Goulart antes do golpe militar de 1964 alinhavou o discurso fervoroso das classes conservadoras brasileiras, que enxergavam uma ameaça nas reformas de base propostas pelo presidente. A mídia nacional da época concentrava suas forças nos periódicos impressos, que detinham grande influência sobre a sociedade civil. O esforço pela neutralidade, ainda que superficial, só viria depois. Com as redações pouco profissionalizadas, a opinião naquele período não ficava restrita aos editoriais: as páginas também pingavam ideologia. A tensão da Guerra Fria e a campanha anticomunista davam o tom da conjuntura histórica de 1964. A imprensa destacava o suposto perigo de uma “cubanização” do Brasil a partir das ideias de transformação social do governo federal. “A mídia da época representava os interesses das camadas mais ricas da população e cumpriu esse papel de reagir às reformas de base de Jango como quem reage diante do medo de perder seus privilégios. Uma mídia de classe, ideologicamente marcada e que se deixou envolver naquela trama da Guerra Fria, acreditando ou fingindo acreditar que o Brasil estava à beira de uma revolução comunista”, explica o historiador e jornalista Juremir Machado da Silva, autor do livro

2

1

4

ABRIL/MAIO DE 2014

1964:golpe midiático-civil-militar . Dos jornais do eixo central do país surgia um discurso replicado por todo o Brasil. Os opositores declarados do governo Jango eram essencialmente os diários paulistas Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo e os cariocas O Globo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Tribuna da Imprensa, este de Carlos Lacerda, então governador do Estado da Guanabara e inimigo político de Getúlio Vargas, de quem Jango foi ministro do Trabalho e herdou o posicionamento reformista. Os editoriais do Correio da Manhã de 31 de março e 1 de abril de 1964, intitulados de “Basta!” e “Fora!”, foram o marco da atuação da imprensa na construção do golpe. Com um discuro imperativo, clamavam pela saída do presidente. As propostas de Jango, apesar do viés social, propunham movimentação econômica e consequente manutenção do sistema capitalista. Mesmo assim, ele era diariamente associado aos ideais soviéticos. Destacado como imprudente e ignorante, o presidente, que era um social democrata, foi pintado nos jornais como uma personalidade fraca e influenciada pela aproximação com o comunismo. Estas acusações sustentaram a ideia do contragolpe, que legitimava a intenção de derrubar um governante

eleito democraticamente em nome da preservação da legalidade. Uma esquizofrenia política hoje tão evidente, que deixa dúvidas sobre a ingenuidade dos jornalistas que participaram do golpe. Entre os intelectuais que emprestaram suas palavras para vociferar contra Jango, a maioria purgou o arrependimento quase imediato após o golpe. Muitos, no entanto, se mantiverem fiéis Editorial do Cor ao regime militar, de 31 de março que ainda apareceria um marco da aç na imprensa como uma revolução legalista ou um contragolpe, mesmo depois de 1965, quando os militares não respeitaram o que seria o final do mandato de Jango e permaneceram no poder. “O Correio da Manhã reconheceu imediatamente que havia uma ditadura e tentou combatê-la mas

3


#

Março, 31 - Gen. Assis Brasil, chefe da Casa Militar, pede informações ao Gen. Zerbini, que acredita não possuir forças para enfrentar o II Exército.

#

Março, 31 - Kruel emite proclamação de que o II Exército aderiu ao golpe para “salvar a pátria, livrando-a do jugo vermelho”.

#

Abril, 1 - Gen. Morais Âncora sugere ao presidente deixar o Rio de Janeiro por falta de segurança.

pressa nos jornais

ainda assim, sempre que falava do Jango, falava mal. O jornal do Brasil falava mal do Jango e gostava do regime. O Globo também. A Tribuna da Imprensa se arrependeu porque acreditava que, com a queda do Jango, o governo iria para o colo de Carlos Lacerda, e não foi”, eclarece Juremir. Passados 50 anos, os grandes veículos tentam espiar a culpa, destacando princirreio da Manhã palmente o período da censura, mas o de 1964 foi estrago foi irremeção golpista diável. No Rio Grande do Sul, o Diário de Notícias, um braço dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, estampava nos seus editoriais a insatisfação com João Goulart e, especialmente, com o decreto da Superintendência de Política Agrária (SUPRA), um passo decisivo para a

implantação da reforma agrária. A campanha de desmoralização do governo federal condizia com o público do jornal, as classes que se autodenominaram “produtoras” durante a tentativa de golpe de 1961, que encontrou a resistência na campanha da Legalidade liderada por Leonel Brizola. Ruralistas tinham espaço privilegiado no Diário e acusavam Jango de populista e incoerente, um traidor, já que ele era também um produtor rural. Eles representavam na época a classe mais conservadora da sociedade, em um país predominantemente agrícola e cujo latifúndio era a expressão maior da riqueza. Embora a imprensa gaúcha não repercutisse com intensidade no cenário nacional, era essencial para as forças direitistas que o aparato midiático do Rio Grande do Sul mantivesse a opinião de seu público no caminho da campanha contra Jango, para evitar insurreições como a de 1961. “O Rio Grande do Sul sempre foi muito visado pelo regime em função do eleitorado trabalhista e pelos simpatizantes de Jango e Brizola”, explica o historiador e pesquisador de ditaduras de segurança nacional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Enrique Padrós. Apesar da atmosfera midiática predominantemente contrária ao governo Jango, houve também

4

resistência dentro da imprensa. O jornal Última Hora, do carioca Samuel Wainer, era o respiro janguista no país, em especial na sua versão gaúcha, por se tratar de um veículo com trajetória fortemente ligada à Getúlio Vargas. Sufocado pela censura, o periódico se desfez de suas sedes regionais e encerrou as atividades definitivamente em 1971. João Batista Melo Filho era redator da Agência Nacional em 1964, a agência de notícias oficial criada durante o Estado Novo como um braço do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Por se posicionar a favor do governo de João Goulart, como boa parte dos funcionários, foi demitido em 5 de março de 1964. “ Eu fui incluído entre os afastados porque esta era a minha posição, depois de ter acompanhado muito de perto o movimento da legalidade em 1961”, lembra Batista. Na época Batista também trabalhava como diretor de telejornalismo na TV Piratini. A sua demissão foi solicitada ao diretor da emissora, que recusou. Mas o nome de Batista não apareceria nos créditos do telejornal até 1977. Para ele, não é possível dissociar o golpe de Estado dos interesses da mídia da época. “Os grandes veículos eram das famílias conservadoras, passavam de geração para geração. Com as imagens das marchas da família com Deus, o papel fundamental da imprensa foi transmitir a sensação de que toda a nação estava contra o governo”, conclui.

Roteiro de ataques

1 Artigos do Diário de Notícias, de março de 1964, atacam Jango, acusando-o de entravar o desenvolvimento brasileiro. 2 Correspondente do O Estado de S.Paulo em Buenos Aires, em edição de 6 de abril de 1964, fala sobre os louvores da Argentina à participação da imprensa brasileira no Golpe. 3 Capa do O Globo, de 3 de abril de 1964, exalta a Marcha da Família, com Deus e pela Liberdade como “Marcha da Vitória”. 4 Nota do jornal O Estado de S. Paulo, de março de 1964, desqualifica João Goulart, destacando-o como inculto e ironizando seus conhecimentos políticos. 5 Notícia do O Estado de S. Paulo, de 3 de abril de 1964, anuncia o primeiro Ato Institucional.

5

ABRIL/MAIO DE 2014

5


A cronologia segundo o @golpe1964 Abril, 1 - Leonel Brizola visita o Gen. Ladário e sugere uma requisição das emissoras de rádio e TV, para fazer propaganda da Legalidade.

#

Abril, 1 - Jango informa Raul Ryff, seu assessor de imprensa, que está indo para Brasília.

#

Abril, 1 - Jango debate com seus aliados se deve permanecer em Brasília ou se deslocar para o Rio Grande do Sul.

Retratos da ditadura F OT Ó G RA F O S O RGA NIZ ARAM MOS TRA LIVRE QUE APROXIMOU REPORTAGENS DA P O P U L A Ç Ã O E E NFRE NTOU RE PRE SS ÃO DO REGIME MILITA R P O R Caroline Ferraz (5º sem.)

A

Rua da Praia já foi um local para dar voz a fotojornalistas, quando as redações se calavam em apoio à ditadura e esqueciam temáticas sociais. Por quase dez anos e com o objetivo de democratizar o acesso à arte fotográfica, um grupo de profissionais organizou a Mostra Livre de Fotografia. Para alguns fotógrafos, foi um meio de dar visibilidade ao seu trabalho. Para outros, uma forma, aberta ao público, de contestar o momento em que se vivia. Iniciou em 1976 com exposições de profissionais e, como era livre, contava até mesmo com a participação de arquivos pessoais daqueles que passavam pela Praça da Alfândega, em Porto Alegre. Já na primeira edição, em 1976, na Praça da Alfândega, a exposição foi marcada por vendaval e chuva, situação que deixou registros na memória daqueles que participaram. Mas o evento ocorreu mesmo com as fotos molhadas e as imagens no chão. No segundo ano, a Empresa Porto Alegrense de Turismo (Epatur) ofereceu uma área coberta, para evitar o problema. Quem passava pela Rua da Praia acompanhava de perto o material exposto, os quais, segundo os participantes, não tinham exclusivamente um viés de denúncia. Ricardo Chaves, o Kadão, por muito tempo editor de Fotografia de Zero Hora, fala de uma série de imagens que fez em Londres, no Speak Corner, em que há um grande número de pessoas com as mais variadas ideologias e expressam suas opiniões. Para o fotógrafo, mostrar estas fotos era uma contradição

6

Jorge Aguiar registrou agressão truculenta de policiais militares contra estudantes com a situação do Brasil. “Expus pra mostrar que em algum lugar do mundo as pessoas podiam dizer o que queriam e não eram punidas”, explica. A escolha do local não ocorreu por um motivo qualquer. Além de ser um ponto de grande circulação diária, era próximo à Companhia Jornalística Caldas Júnior, empresa em que trabalhavam boa parte dos fotógrafos que expunham seu material. Entre eles, Baru Derquin, apontado como um dos idealizadores da Mostra Livre. Junto a Baru, Juan Carlos Gomez, um uruguaio que saiu do país por causa da ditadura e foi recebido no jornal Zero Hora para trabalhar como repór-

ABRIL/MAIO DE 2014

ter fotográfico. Eles organizaram a primeira edição. A intensão de trazer os trabalhos para a Rua da Praia foi de aproximar a fotografia do público. “O que pretendíamos ali era conseguir um espaço para mostrar nosso trabalho, não apenas com cunho militar, mas de opressão social”, esclarece Gomez. Havia diversidade nas fotografias, pois elas não reportavam apenas ações dos órgãos de repressão. Seu caráter livre também deu suporte a uma pluralidade de interesses. Daniel de Andrade integrou-se à mostra na década de 1980. Ele conta que foi uma forma de dar maior visibilidade ao seu trabalho como fotojorna-

lista, uma vez que a exposição já estava consolidada. Com a colaboração da Epatur, foi criado um prêmio que elegia as melhores fotografias a cada ano. Os vencedores recebiam um valor de 10 mil cruzados. Ao mesmo tempo em que atraiu participantes, a premiação também afastou idealizadores, como Luiz Abreu. Ele participou da primeira edição e afirma que eleger a melhor fotografia não era a ideia inicial. “Não me agradou. Estava quebrando o espírito original da mostra, por que estava propondo um tema e com prêmio em dinheiro. Já não seria tão livre assim, alguns botariam lá porque queriam ganhar o prêmio da

Epatur”, explica. Abreu também participou da concepção da Mostra, a partir de um conceito “anárquico, que dentro do período e da proposta era coerente com o que a gente pensava e com o momento em que a gente vivia”. O termo livre ligado à exposição dizia respeito à igualdade entre aqueles que colocavam suas fotografias no varal. Havia consenso sobre a necessidade de tornar democrática a arte fotográfica. “A gente renegava a ideia de galeria por que era muito elitizado. Achava que o espaço verdadeiro para a foto deveria ser a rua, onde o público podia olhar”, completa Abreu.


Abril, 1 - Jango deixa Brasília rumo a Porto Alegre, usando um avião menor que o planejado.

#

Abril, 2 - Ignorando protestos dos deputados janguistas, presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, declara vaga a Presidência.

#

Acesse todos os posts com a reencenação da derrubada de João Goulart acessando www.twitter.com/ golpe1964:

Luta com imagens

+

Luiz Abreu documentou varal, que retratava temáticas variadas

Ricardo Chaves, o Kadão, expôs imagens feitas fora do país Os depoimentos do livro em www.eusoufamecos.net/editorialj/historiasparalembrar

+

Acesse o site com o conteúdo do Histórias para Lembrar

Histórias para lembrar Relatos sobre a ditadura de 1964

presos. “Eu me emociono ao A mostra na Praça da Alfalar sobre este assunto, porfândega ocorreu até meados da que teve colegas que sumiram, década de 1980. Para Eduardo foram presos, torturados e Tavares, repórter que participerderam suas vidas”, declara. pou de diversas edições, um Luiz Ávila também enfrendos motivos para que ela não tou a censura na Zero Hora, continuasse, além do diferentes jornal que foi criado em 4 de rumos que tomaram as carreiras maio de 1964, após o fechados fotógrafos organizadores, mento do diário Última Hora. está a abertura política e o fim do Ele lembra que, como boa parte regime militar. Trabalhar durandos trabalhos acabavam por te o regime militar não foi fácil não ser publicados, os repórpara os fotógrafos que iniciavam teres fotográficos expunham suas carreiras. Enquanto na rua seu material em frente à Loja repórteres se arriscavam ao tenGuaspari, na Avenida Borges tar fotografias que desafiassem o de Medeiros. na Capital. olhar dos militares, nas redações Os três fotógranem sempre estes trabalhos vifos – que mais tarde partinham a público. ciparam da Mostra Livre – Tavares, fotógrafo há 40 expunham anos, conta seus materiais que era chaali, já no fim mado de louco do período por fotógrafos considerado profissionais de maior requando copressão milimeçou, pois tar (do AI-5, ficava em cima em 1968, até da cena com 1974) como suas lentes, forma de reenquanto os sistência pooutros acomlítica. Profispanhavam de sionais com longe com tetrabalho de le-objetivas. maior viés poAlém disso, ele lítico colavam lembra que, suas fotos na em situações Coojornal destaca parede da loja, de aglomera- primeira Mostra sem assinatução de repórra, e logo se teres, como afastavam para acompanhar as nas visitas a Porto Alegre do reações do público que passava presidente-general João Figueipela rua. Eles se mantinham redo (1979-1985), os agentes de afastados, também, porque não segurança seguravam pregos tardava para que as fotografias para afugentar os jornalistas fossem retiradas por militares que tentavam se aproximar da fardados ou infiltrados entre os comitiva presidencial. transeuntes. Como Tavares, diversos Aguiar lembra que estas fotógrafos eram jovens e ainda ações não tinham data marmantêm na memória os aconcada para ocorrer, até mesmo tecimentos de um período marporque existia um medo conscado pela autocensura e pela tante de que a espionagem do censura dos militares no poder. governo pudesse descobrir e Jorge Aguiar, 58 anos, chegou levá-los presos. Outra tática a publicar materiais sem o seu usada, até mesmo para reporcrédito, pois receava a repertagens cotidianas, era nunca cussão que poderia ter a divulandar sozinho para que não gação de fotos que não fossem ocorresse de serem levados percebidas pela censura. Em para esclarecimentos no Deconversa com a reportagem do partamento de Ordem Política Editorial J, ele se comoveu ao e Social (Dops). lembrar de colegas que foram

Meio século é pouco para a história de um país, mas é muito tempo para que se corra o risco de perder a memória. Em 2014, completam-se 50 anos do golpe militar que instaurou uma ditadura no Brasil. Ela durou até 1985. Antes que a memória perca o viço, deve-se ouvir e registrar a voz de quem viveu esse período de arbítrio, quando o terrorismo de Estado se impôs. Alguns tiveram atuação no combate ou na manutenção do regime de exceção; outros, viveram o período sem envolvimento direto. Há ainda aqueles que guardam lembranças, mesmo que tenham nascido depois do fim da ditadura. A memória de um país é coletiva. Ao mesmo tempo, individual. Da singularidade de vidas, surgem narrativas que abrem caminhos para se entender um tempo. Histórias para lembrar se inscreve na perspectiva de dar voz a 31 sujeitos. O militante que combateu e foi preso. Os jornalistas que tentaram contar o que se passava. O rapaz que descobriu que sua mãe foi torturada. O filho do torturador que descreve os traumas de sua família. Há também os entusiastas, que enaltecem o regime de 1964. E quem vive diariamente com a ausência e que, décadas depois, luta para ter o direito de pelo menos sepultar o familiar desaparecido.

ABRIL/MAIO DE 2014

7


“Todos fomos afetados” P R O F E SS O R DA P U CRS LANÇOU LIVRO S OBRE AÇÃO DA MÍDIA EM 1 9 6 4 Foto: Guilherme Almeida

P O R Anselmo Loureiro (3º sem.) Jornalista e pesquisador acostumado a colecionar polêmicas, Juremir Machado da Silva comprou mais uma. Desta vez, ao lançar um livro que relaciona mídia e ditadura militar (19641985) no Brasil. Autor de 34 obras, seus dois últimos lançamentos abordam fatos ligados, de alguma forma, aos 21 anos do regime militar no país: Jango: a vida e a morte no exílio, lançado pela L&PM no ano passado, e o mais recente, 1964: golpe midiático-civil-militar, pela Sulina, sobre a forma como a imprensa brasileira apoiou o golpe. O Editorial J conversou com o Juremir sobre suas pesquisas. “Enxergamos de uma maneira muito positiva, aqueles (jornalistas) que apoiaram o golpe, como Alberto Dines, Antônio Calado e Carlos Heitor Cony. Depois, eles rapidamente se arrependeram, mas na época jornalistas e intelectuais caíram no discurso de uma ameaça comunista”, explicou. A seguir, trechos da entrevista:

J – Quais são as responsabilidades individuais do jornalista, em situações como a campanha da imprensa contra Jango? Juremir – Os jornalistas têm, como todas as pessoas, uma margem de autonomia. Quanto maior o capital simbólico, mais audiência e prestigio e mais ele é reconhecido. O principal problema da autonomia é a ideologia profissional. Em 1964, apoiaram o golpe porque acreditavam que era preciso derrubar o Jango. Não foi porque eles eram obrigados, mas sim por adesão. J – Atualmente, se houvesse uma situação no país como a de 1964, a mídia brasileira seria golpista? Juremir – É especulação, mas parece que sim. Parte de nossa imprensa gostaria de se livrar do governo petista. Não sei se a imprensa iria muito longe. Atualmente, temos um espírito democrático mais consolidado. Na época, todos eram golpistas. Toda hora havia tentativas de golpe. Nos anos 1950 foram muitas. O golpismo estava na mentalidade de todos. Hoje é muito difícil.

Editorial J – A reação da imprensa do Rio Grande do Sul foi diferente da do resto do país? Juremir Machado da Silva – A reação da imprensa gaúcha não foi diferente. O meu livro trata dos jornais de São Paulo e do Rio de Janeiro, por uma escolha metodológica. J – Houve uma mudança de postura da imprensa gaúcha em relação aos golpistas entre 1961, com a Legalidade, e 1964? Juremir – São posturas totalmente diferentes, tanto no Rio Grande do Sul quanto fora do Estado. Em 1961, era visto como despropósito, como algo ilegítimo agir contra Jango, que de alguma maneira foi considerado injustiçado. No mesmo ano, o (Leonel) Brizola era governador do Estado e cunhado do Jango. Também os periódicos apoiaram o Jango de maneira geral, com a exceção do O Globo. Três anos depois, a imprensa ficou contra o presidente deposto. Poderíamos dizer que os mais coerentes foram o jornal A Última Hora que em 1961 e 1964 estava com ele. Já a Tribuna da Imprensa e O Globo eram contrários a Jango nos dois episódios. Os demais mudaram de posição. J – Por que quase toda imprensa apoiou um movimento antidemocrático? Juremir – Creio que existiram vá-

8

que a esquerda está no poder, eles defendem a ideia de que são (os componentes da esquerda) corruptos. Na época do Getulio, Jango e agora. Sempre foi assim.

Juremir acredita que jornalistas têm espaço para autonomia rios fatores. Primeiramente, a situação da Guerra Fria. O mundo estava dividido em dois blocos. O capitalismo, influenciado pelos EUA. A passagem de Cuba para o socialismo assustava a população e a mídia da época. Também havia a influência da imprensa estadunidense. Eles criaram essa ideia de que o Brasil estava a mercê de uma ameaça comunista muito concreta. Outro fator também é o conservadorismo exacerbado dos proprietários dos jornais e dos jornalistas. Os jornalistas e os intelectuais caíram em uma ameaça comunista. J – É possível traçar algum paralelo entre o comportamento da

ABRIL/MAIO DE 2014

mídia em 1964 e hoje? Juremir – Hoje não estamos mais perto de uma ameaça comunista. Atualmente, é bem mais difícil de se criar esta ideia, embora muitos dos que se opõem ao governo Dilma Rousseff, ao lulismo e ao petismo utilizem uma retórica anticomunista como se eles (Dilma, o lulismo e o petismo) estivessem próximo de Cuba. Tentam mostrar que o PT é, no fundo, marxista e gostariam que o Brasil fosse viver um regime cubano. O que está mais próximo mesmo é o clima de combate ao governo, apesar de o sistema ser de centro-esquerda, tentando fazer crer que é a gestão mais corrupta de todos os tempos. Em 1964, também era assim. Toda vez

J – Quais as fontes que o senhor utilizou? Juremir – Os jornais da época são fontes primárias. Os livros escritos na época por jornalistas caíram no esquecimento. Documentos e bibliografia. Para esse tipo de obra, o fundamental são os periódicos.   J – Por que o senhor se interessa em pesquisar e escrever sobre o Jango e Golpe de 64? Juremir – Estamos vivendo agora os 50 anos do golpe. Esse assunto sempre mexeu como o nosso ego. O período mudou a vida de todos. Pessoas foram exiladas, assassinadas, desaparecidas, torturadas, presas. Outras perderam emprego. Foi uma transformação radical. Todos nós fomos afetados pela ditadura militar. Cresci nesse momento. Foi uma mudança tremenda na nação e que não terminou, em certo sentido, porque os torturadores não sofreram punições. As comissões da verdade ainda estão na justiça de transição. O Jango é uma figura emblemática. Se ele foi assassinado ou não, ele é o personagem importante da história.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.