Editorial J – Número 17 - Outubro/Novembro de 2014

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OUTUBRO/NOVEMBRO 2014 • NÚMERO 17 • FAMECOS/PUCRS • WWW.PUCRS.BR/FAMECOS/EDITORIALJ

Corte sem limites

+ eleições Frederico Martins (6º sem.)

Cidade que já foi conhecida por sua arborização, Porto Alegre controla precariamente a remoção e a compensação de árvores em função de obras. Betina Carcuchinski (4º sem.)

Sartori chega ao Piratini O que a sociedade gaúcha espera do próximo governador do Estado PÁGINA 3

Por que o xis conquista o paladar Receita típica do Estado seduz pela mistura e fartura de ingredientes PÁGINAS 6 A 8

PÁGINA 9


papo de redação

Jornal do Laboratório de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Avenida Ipiranga, 6.681 Porto Alegre/RS

Frederico Martins (6º sem.)

+

PUCRS Reitor Ir. Joaquim Clotet Vice-reitor Ir. Evilázio Teixeira Pró-reitora Acadêmica Mágda Rodrigues da Cunha FAMECOS Diretor João Guilherme Barone Reis e Silva Coordenador do curso de Jornalismo Fábian Chelkanoff Thier Coordenadora do Espaço Experiência Paula Puhl Coordenador do Editorial J Fabio Canatta Coordenadora de produção Ivone Cassol Projeto gráfico Luiz Adolfo Lino de Souza e Núcleo de Design Editorial/ Espaço Experiência Professores responsáveis Alexandre Elmi Fabio Canatta Flávia Quadros Ivone Cassol Marcelo Träsel Marco Villalobos Rogério Fraga Tércio Saccol Vitor Necchi Alunos editores Caroline Ferraz, Júlia Bernardi, Thamíris Mondin, Thiago Valença, Victor Rypl e Yasmin Luz. Diagramação Bruno Ibaldo, Kimberly Winheski e Lúcia Vieira

Alunos Ana Maria Muller, Anahis Vargas, Annie Castro, Betina Carcuchinski, Bruna Ayres, Bruna Zanatta, Bruno Ibaldo, Camilla Pereira, Cândida Schaedler, Carolina Michaelsen, Carolina Teixeira, Carolina Zorzetto, Cássia Oliveira, Cinthia Aquino, Cláudia dos Anjos, Constance Laux, Cristiane Luckow, Daniela Flor, Douglas Abreu, Eduarda Endler Lopes, Flávia Carboni, Frederico Martins, Gabriel Gonçalves, Gabriel Raimundi, Georgia Ubatuba, Gustavo Fagundes, Guilherme Mercado, Isadora Marcante, Jéssica Moraes, Jéssica Wolf, João Paulo Dorneles, João Paulo Wandscheer, João Pedro Arroque Lopes, Jorge Sant’ana, Júlia Bernardi, Júlia de Quevedo, Júlia Silveira, Juliane Guez, Karine Flores, Kelly Moreira, Leonardo Ferri, Lucas de Oliveira, Lúcia Vieira, Luísa Dal Mas, Luiza Meira, Martha Menezes, Mauro Plastina, Milena Haas, Muriel Porfírio, Otávio Antunes, Paola Pasquali, Patrícia Lapuente, Pedro Henrique Tavares, Pedro Gomes, Raphael Seabra, Raquel Baracho, Rebeca Kuhn, Roberto Kralik, Rodrigo Luz, Rodrigo Mello, Sofia Schuck, Taína Cíceri, Thiago Rocha, Vanessa Padilha, Vitor Laitano, Vitória Fonseca, William Anthony e Yanlin Costa

POR Camilla Pereira (6º sem.)

CONTEÚDOS DO EDITORIAL J

FamecosCast É uma webradio com programação diária de reportagens, debates, entrevistas, colunas e noticiários ustream.tv/channel/famecos-cast.

Twitter, Flickr e Facebook Por meio de perfis, notícias e imagens são compartilhadas. Pelo Twitter, no @editorialj. No Facebook, pelo facebook.com/editorialj. No Flickr, flickr.com/editorialj.

Editorial J na TV Telejornal semanal, com pautas temáticas e reportagens sobre assuntos diversos. As edições estão disponíveis em youtube.com/ editorialj.

IMPRESSÃO Gráfica Epecê - PUCRS

Laboratório convergente da Famecos www.pucrs.br/famecos/editorialj

Em busca do voto A

s eleições nos colocaram num ritmo de hard news que poucos eventos no país estabelecem em qualquer veículo de comunicação. Acredito que, assim como eu, os 35 alunos que se voluntariaram para trabalhar na cobertura do Editorial J nos dois turnos do pleito não se arrependeram. Participamos da festa da democracia pela primeira vez como comunicadores: contamos o que vimos no Estado, desde a Vó Ema, eleitora de 81 anos do município de Joia, no Noroeste, até entrevistas com os candidatos Tarso Genro e José Ivo Sartori. Durante a apuração do segundo turno, transmitimos um programa por duas horas e meia, no YouTube, analisando o pleito e discutindo com especialistas. Os repórteres foram às ruas: registraram o domingo eleitoral das suas sessões, dos comitês dos candidatos e das esquinas lotadas de santinhos, em imagens, tweets com a #VotoJ e relatos. Acompanharam, junto da grande imprensa, o voto da presidenta Dilma. Nossos boletins em áudio foram veiculados

na FM Cultura, o conteúdo do Twitter foi replicado pelo Coletiva.net e nossos textos, publicados no Sul21, em parceria com a Famecos. Na redação, os professores criaram um mutirão para a edição de conteúdo. Um revezamento de tarefas e uma correria que todos passamos com um sorriso no rosto. Ficamos na faculdade das oito da manhã às oito da noite. Acompanhamos a apuração enquanto alguns dos nossos repórteres estavam nos comitês de Tarso e de Sartori, enviando relatos. Foram 36 textos publicados no site do Editorial J, 14 áudios postados no mixcloud do J, duas horas e meia de programação na Famecos Cast e duas horas e meia de programação no youtube, realizada em parceria com a produtora Cuentos Y Circo, que oferecu a estrtura. Dias como esse são decisivos para futuros jornalistas: uma amostra do que a profissão pode ser. É meter a cara, escrever com a letra feia e correr com o gravador na mão porque o candidato está partindo e não poderíamos deixar passar. Dias como esse são provocações. Testes. Diferentemente das prova teóricas, eleições ensinam conhecimentos práticos valiosos.

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Alcance da cobertura

2.500 visualizações da página do Editorial J

35

alunos participaram da cobertura

272

Tweets com a #VOTOJ

60

textos publicados

909 acessos únicos

A FamecosCast, rádio web do Editorial J, ficou no ar por 2horas e 30minutos no primeiro turno (5/10). Um programa em vídeo com a mesma duração foi transmitido ao vivo pelo YouTube durante a apuração do segundo turno (26/10).


eleições 2014

O que o Rio Grande quer do próximo governador LÍ DE RE S D E C AT EGORIAS PROFISS IONAIS FALAM SOBRE AS PRINCIPA IS DE MA N DAS D E S E US S ETORE S PARA O NOVO GOVERNO DO ESTA DO

O

Rio Grande do Sul foi às urnas no dia 26 de outubro e elegeu, com 61,2% dos votos válidos, José Ivo Sartori (PMDB) como governador pelos próximos quatro anos. A vantagem de Sartori sobre Tarso Genro (PT) reforçou o histórico gaúcho de rejeição à reeleição no governo estadual. Correndo atrás de Tarso e Ana Amélia Lemos (PP) na campanha do primeiro turno, o peemedebista ficou de fora dos ataques polarizados e surpreendeu ao superar os dois adversários ainda na primeira etapa do pleito. Eleito com o discurso de corte de gastos para equilibrar as finanças públicas, o ex-prefeito de Caxias do Sul foi acusado por Tarso de inconsistência em suas propostas ao longo da campanha do segundo turno, mas manteve a aprovação dos eleitores.

O Editorial J conversou com líderes de categoriais centrais no Estado para compreender quais as suas principais demandas e expectativas para o novo governo. Os representantes dos professores, policiais militares, servidores públicos e da Central Única dos Trabalhadores (CUT) destacaram os principais pontos de atuação estadual que necessitam de maior atenção em seus respectivos setores e como vão cobrá-los do novo gestor. Para atender estas e outras urgências de investimento do Estado, o governador eleito vai enfrentar um desafio de crise financeira. A situação de constrição das finanças desenvolvida pela dívida pública tem sido o maior problema das gestões no Rio Grande do Sul há quatro décadas. Sartori assume o Piratini com a dívida em R$ 50,4 bilhões, com 93% do valor referente ao débito com a União e um projeto de renegociação encaminhado pelo governo anterior prometido para ser votado pelo Senado ainda em novembro deste ano.

+

No dia 26 de outubro, durante a apuração dos votos do segundo turno, o Editorial J transmitiu ao vivo um programa de duas horas e meia que contou com análises do especialista em política brasileira Oswaldo Biz, do economista Gusta Inácio de Moraes e do jornalista e professor Ed Wilson Araújo. Assista ao programa na íntegra em : http://bit.ly/eleicoesj

Os 35 alunos que participaram da cobertura Editorial J nos dois turnos das eleições produziram mais de 60 textos, com informações da Capital e do interior do Estado, boletins em áudio e vídeo e entrevistas com os candidatos José Ivo Sartori e Tarso Genro. Todo o conteúdo está disponível online.

Trabalhadores

Professores

Claudir Nespolo • Presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT-RS)

Enio Manica • Diretor do Centro de Professores do Estado do RS (CPERS)

O projeto do Tarso Genro no último período valorizou o piso regional e isso é muito importante para a distribuição da renda e, para nós, é um tema muito relevante. E temos o projeto do Sartori novo e pouco conhecido. Pelo que vimos dele, temos muita preocupação. As nossas pautas serão apresentadas de qualquer forma, mas sabemos que o piso regional não foi um tema tratado. O salário mínimo regional é somente uma das pautas que queremos reivindicar.

Temos uma expectativa de um governo que possibilite um diálogo produtivo, respeitoso e no qual possamos obter conquistas e avanços para a educação pública do Rio Grande do Sul. Os educadores precisam ter condições de trabalho digno, além de um bom salário. Queremos continuar essa luta, adquirindo mais recursos do governo para melhorar as condições de trabalho para professores, para que não precisem mais trabalhar em diversas escolas.

Servidores públicos

Cabos e soldados

Sergio Arnoud • Presidente da Federação Sindical de Servidores Públicos do Estado do RS (Fessergs)

Leonel Lucas • Presidente da Associação de Cabos e Soldados da Brigada Militar (ACS)

Esperamos o estabelecimento de um diálogo permanente com o governo. Lamentavelmente, nos últimos quatro anos, não tivemos essa via de diálogo facilitada. Foi muito difícil manter a conversa. Esperamos que possamos discutir os problemas do serviço com os servidores, que são a cara do Estado, aqueles que colocam o Estado para funcionar no seu dia a dia.

Quando eleitos, eles veem que a Segurança Pública tem um custo muito alto e deixam para segundo plano. Esperamos que o governo valorize o policial militar, o bombeiro militar e cumpra, principalmente, o que determina a Constituição. Que dê equipamentos para o policial: coletes, armamentos e um bom salário, já que é o pior salário do Brasil.

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Imagens: Reprodução/YouTube/Editorial J

POR Thamíris Mondin(6º sem.), Júlia Bernardi e Jéssica Moraes (4º sem.)


F A V G T H Z K A A T O F T Ç A J Y U T B H V G F A B K A D A P I Y G B

S H D H Ç G C V B Y H U O A O P A P H Rcomportamento B E MA B A S MA T MA P T Y J K U H J D G F H B T E A H E G J F I W E A T B T H Y A H U T A U T O R T R T Y A UMA S A D J K K L Y V H J D T O R T D Y F S T A Y A H U H G T B T U O A O S A G H B Y Ç G C V H F S H D B G J F T D Y G M A A B ADAP A S TAÇÕE M AS RDA BLINGUAGEM E MA P T Y MJ EKVOLUÇÕE H E H Y G K T RETFLETE G T SF DAS S OCIEDA H D HDEÇ U F MA S T U Ç G C V B Y A R B E MA R I Y F S H D A B A S MA V H J D Y J H C P A R B E J K K L A D G T B T H Y I I E V H J D Y A H U T A T UMA S A Y E K G T B T J K G T B T H D Y F S T G N V B Y H U C V B Y H U Z S A G H B B T S MA T MA S MA T M K T H Y GM K E L A D J B K L A D J B L A A S MA A H U T A U T H U T A U T U T K L A D H O A O P A P H Y R T A R T U H U T A MA P T Y J K U A B A G H Z S J K K L V G J F I W E A H T H Y G K T Y A H U T O R T R T Y A U K MA S T U A P A R V H J D T O R T R T Y F S H DW E V H G T B T U O A O P A P A R B E J K G T F S H D B G J F I W E V H J D C V B Y A R B E MA P T Y J K G T B T P A P H G T F S H D H Ç G C V B Y H U Y J K U MA P T B G J F I W E A H T H I W E A B G J F T O R T R T Y A U K M R T Y A T O R T V H J D T O R T R T Y T O R T V H J D G T B T U O A O P A P U O A O G T B T F S H D B G J F I W E B G J F F S H D A R B E MA T P Y J K MA P T A R B E G T F S H D H Ç G C V H D H Ç G T F S F S H D B G J F I W E B G J F G T F S H D H Ç G C V B Y H U Y J K U

Língua viva

P O R Gabriel Gonçalves (4º sem.)

A

s expressões cotidianas referentes às diferenças de classe, religião, raça ou gênero são caminhos pelos quais a linguagem transmite signos de valor e preconceitos. A mudança nos termos de tratamento, como no caso das pessoas com Síndrome de Down, que já foram chamadas de “mongoloides”, reflete uma tendência nas políticas públicas de inclusão, a utilização política da língua portuguesa como ferramenta de promoção de igualdade e combate à discriminação. A professora de Letras da PUCRS Vera Wannmacher Pereira afirma que a utilização política da língua faz parte das concepções que marcam o conceito de linguagem. “Quando se faz um manual, como se fosse de proteção a um ponto de vista, é uma tentativa de utilizar a língua como meio de fortalecimento daquele grupo. A língua é marcada por concepções políticas, ideológicas e filosóficas”, explica. Em setembro, a Secretaria Estadual de Políticas para Mulheres lançou o Manual do Uso Não-Sexista da Linguagem. A publicação, que expõe preconceitos camuflados na gramática e sugere alternativas que valorizem igualmente os gêneros, é o mais recente exemplo de uso político-social da língua para a promoção da inclusão. “O enfrentamento ao preconceito linguístico no formato de manual para orientar a ação pública é uma experiência relativamente recente e se manifesta de forma mais isolada no Brasil”, afirma a cientista social Jussara Prá, que participou da produção do manual. Jussara lembra que este tipo de prática já é empregada há muitos anos por organismos internacionais. Conforme o livro Vida independente, do consultor em inclusão social Romeu Kazumi Sassaki, os programas de combate à desigualdade por meio das palavras começaram na década de 1950, com o surgimento das primeiras associações de amigos e pais de pessoas com deficiências, na época tratados como “excepcionais” e “defeituosos”. Apenas na década de 1980 a palavra “deficiente” passou a ser empregada. Após resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) sugerindo a nova nomenclatura, em 1981 foi acrescentado o substantivo “pessoa” antes do termo. Na opinião de

Jussara, o uso de um vocabulário no âmbito do gênero nas políticas públicas é essencial. “Uma das formas mais sutis de transmitir essa discriminação é através da língua, pois esta nada mais é do que o reflexo de valores, do pensamento, da sociedade que a cria e utiliza. Todas as palavras têm uma leitura de gênero”, explica. As mudanças em nomenclaturas e pronomes de tratamentos podem ser rápidas ou geracionais e são motivo de gafes públicas, como o episódio em que a presidenta Dilma Rousseff foi vaiada durante um discurso em que chamou as “pessoas com deficiência” de “portadores de deficiência”, em uma convenção sobre o tema, em 2012. Primeira mulher a governar o Brasil, Dilma também protagonizou uma discussão de inclusão pela gramática ao adotar o termo “presidenta”, em vez de presidente, como um signo para o empoderamento feminino. Segundo os especialistas, o português tem se flexibilizado com mais intensidade por causa de movimentos de inclusão que, para a professora Vera, reflete o ritmo e o avanço de pautas e movimentos sociais no Brasil. Inicialmente denominada como comunidade GLS (Gays, Lésbicas e Simpatizantes), a comunidade LGBT mudou sua sigla em 2008, visando à inclusão de todos os seus componentes: Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis. A alteração do termo ocorreu de maneira política, em votação na 1º Conferência Nacional GLBT. “Todos os comportamentos sociais estão mudando rapidamente. Há uma simultaneidade de mudanças sociais, políticas, comportamentais, e a linguagem é claro que acompanha tudo isso”, enfatiza Vera. A professora lembra a recente polêmica envolvendo a declaração do presidenciável Levy Fidelix sobre união homoafetiva: “Há dois anos, aquilo não soaria tão terrível. Mas, como tudo anda muito rápido, a fala dele causou muitíssima estranheza. Estão ocorrendo mudanças de concepções muito rápidas”. No dia a dia de Lucia Fonseca, coordenadora do Centro Integrado de Desenvolvimento (CID), que trabalha desde 1994 com crianças com deficiência, a interferência das nomenclaturas é visível. “No caso das pessoas deficientes, vejo que as formas têm mudado mais, sim. Hoje as pessoas têm mais cuidado para saber o que está se usando em termos de nomenclatura”, observa.

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Y A H U R P I Y G B K A D A Y A T J U Y H B J B H Y A H U R P I Y G I A

R T A R T U B A G H Z S T H Y G K T K MA S T U T Y F S H D A P A R B E W E V H J D J K G T B T C V B Y H U A S MA T M K L A D J B H U T A U T J K K L Y V Y A H U H G Ç G C V H F A B A S MA M B E MA B B J D Y J K T B T H Y A V MA S A D G Y F S T A E U O A O P D B G J F I T MA G C Y U H D H Ç G R T A R T U B A G H Z S T H Y G K T K MA S T U T Y F S H D A P A R B E W E P H J D J K G T B T C V B Y H U W E V H J D B A G H Z S


jornalismo

“Trabalho de apuração fica mais escasso” SOC I ÓLO G O D O MI N I Q U E WOLTON ACRE DITA QUE A INTERNET É UM AVA NÇO, MAS M E CAN I ZO U T RA B A L H O DA IMPRE NS A E DIMINUIU QUA LIDA DE DA INFORMA ÇÃ O Guilherme Almeida (5º sem.) P O R Pedro Henrique Tavares (8º sem.) Para ele, não há dúvida: o jornalismo passa por uma profunda crise. O sociólogo Dominique Wolton, sobretudo um humanista, acredita que a perda de relações interpessoais no campo da comunicação é uma das principais responsáveis pelo fenômeno. E os meios digitais têm grande influência no processo. “Hoje, o jornalista, tanto na internet, na televisão, no rádio e nas redes sociais, pode distribuir informação de maneira muito dinâmica. Tão rápido que a qualidade do trabalho é inferior”, destaca. Em visita à Faculdade de Comunicação Social da PUCRS para o Seminário Cooperação e Internacionalização em Comunicação, que comemorou os 20 anos do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social, o diretor do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS, na sigla em francês) concedeu uma entrevista exclusiva ao Editorial J.

jornalística e parar de pensar que a internet é o paraíso. Ela é o paraíso e o lixo. A segunda envolve o código de ética entre os jornalistas, dentro dos países e no mundo inteiro, para produzir informações confiáveis e evitar concorrência, que acontece de maneira monstruosa. E a terceira batalha: com a popularização da internet, o trabalho do jornalista consiste em correr cada vez mais. Não pode ser assim. É preciso verificar quais informações são confiáveis, o resto é mentira.

Editorial J - E quanto à relação das redes sociais com as mídias tradicionais? Ela não é benéfica? Wolton - As novas tecnologias trazem um risco para a televisão. A TV não é apenas uma técnica, mas uma cultura, um hábito familiar que atravessa as gerações. Hoje ela está sendo ofuscada pela internet, redes sociais e transmissões online. Isso é também um efeito político. O rádio é o rádio, a televisão é a televisão e a internet é a internet. Mas hoje em dia, isso é grave, porque o mundo tecnológico tem acabado com os meios traEditorial J - Há, de fato, uma crise dicionais. Olhe o exemplo do livro, que agora mundial do jornalismo? é substituído pela leitura no taDominique Wolton - O blet. E falta uma reação política jornalismo está em crise por e intelectual a este fenômeno, três razões: primeiro, a técnica A TV não porque acham que é normal. tem evoluído rapidamente. Atualmente, o mundo tem sido Hoje, o jornalista, tanto na é apenas representado por empresas internet, na televisão, no rádio uma como Google, Apple, Facebook. e nas redes sociais, pode disMeios como o livro, teatro e tribuir informação de maneira técnica, televisão, por exemplo, têm muito dinâmica. Tão rápido mas uma sido esquecidos, porque a inque a qualidade do trabalho ternet tem ofuscado tudo isso. é inferior. Em segundo lugar, cultura” É, sobretudo, um forte poder existe a concorrência entre os Wolton econômico dos meios digitais. meios de comunicação, como O Google, por exemplo, é muito rádio, internet, televisão e poderoso, e os jovens estão contentes redes sociais. E os jornalistas com essa situação. É perigoso, é ridículo. são obrigados a, cada vez mais rápido, evitar que a empresa concorrente noticie primeiro. Editorial J - Em pleno século 21, é Portanto, com uma técnica poderosa, rápipossível que opiniões possam coexisda, que obriga a trabalhar com cada vez mais tir, como o senhor escreveu em Inforvelocidade, o verdadeiro trabalho jornalístimar não é comunicar? co, de apuração, fica mais escasso. Em terWolton - Estamos em um tempo de ceiro lugar, que acontece em todos os países, crise econômica muito forte. Ao mesmo é a popularização da política, e o jornalista tempo, no entanto, a geração mais jovem é não pode deixar isso passar batido. mais aberta a ideias, com mais tolerância, e também possui uma visão mais utópica. Editorial J - Existem formas de reUm caso para exemplificar: atualmente, verter esta situação? apesar de a aceitação dos homossexuais ser Wolton - São três batalhas: a primeira maior, a homofobia ainda é muito presente. é resistir às mudanças constantes na técnica

Para Wolton, humanidade ainda sofre com intolerância Apesar de o combate ser cada vez mais forte, a intolerância também cresce bastante. Por isso, a juventude tem se engajado mais neste embate. No Brasil, por exemplo, é de senso comum pensar que os jovens só se interessam por banalidades, como futebol e festas. Mas as manifestações de julho de 2013 mostraram o contrário. Eles foram às ruas para

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dizer que existe um forte ideal político pelo qual a sociedade precisa lutar. Mostraram que entendem a necessidade de reforma políticas intensas no país. E isso também acontece na França. É evidente que o grande fluxo de informação, principalmenrte virtual, contribui para que estes fenômenos se desenvolvam.


porto alegre

Controle sobre corte d Porto Alegre não sabe as árvores que corta. Ao buscar informações consolidadas sobre corte e podas, o Editorial J encontrou dificuldades. Os dados obtidos apontam que pelo menos 1.282 árvores foram cortadas somente neste ano. Elas deveriam ser compensadas em 7.331 mudas. As consequências dos cortes, muitas vezes em decorrência de obras públicas e privadas, chegam até a população, como é o caso de Heinrich Schubert, 86 anos, que perdeu parte de sua casa em função das intervenções na Rua Anita Garibaldi

P O R Julia Bernardi (4º sem.) e Sofia Schuck (2º sem.)

do Mundo e removeram 632 árvores até o momento . No Gasômetro, 115 árvores de espécies exóticas foram retiradas “ ocês fazem um relana Avenida Edvaldo Pereira Paiva. tório anual ou mensal Conforme a lei de compensação, sobre as árvores que 400 mudas deveriam substituí-las. foram removidas ou Na trincheira da Anita Garibaldi, plantadas em Porto Alegre?” Após ocorreram 120 cortes no mês de juum minuto pensativo, o supervisor lho, entre a Rua Pedro Chaves Bardo Meio Ambiente da Secretacelos e a Alameda Vicente de Carvaria Municipal do Meio Ambiente lho, e 258 devem ser plantadas. Na (Smam), Mauro Gomes de Moura, Cristóvão Colombo, estudos técniresponde ao Editorial J: “Não cos indicam que 132 sofrerão algum temos feito, mas deveríamos fazer tipo de intervenção em decorrência pelo menos uma vez por ano para da obra, sendo 113 remoções, 11 o Conselho Nacional do Meio Amtransplantes e oito podas. Ao todo, biente [Conama]”. Cada município 537 mudas deverão ser plantadas precisa, em reuniões trimestrais do para compensar. A ampliação do Conama, apresentar um relatório Hospital de Clínicas é com as consequências a que vai gerar o maior ambientais de projetos corte, com 284 remopúblicos e privados, ções. A previsão é que pois é competência do Os 2,5 mil mudas sejam conselho acompanhar números plantadas até o prazo remoções e compenfinal de dois anos. sações da vegetação de comPorto Alegre é a em função de invespensação quarta capital mais timentos e mudanças arborizada do Brasil, urbanas. Moura jussão muito segundo estudo de tifica não ter dados absurdos.” 2012 do Instituto Brapara apresentar, pois sileiro de Geografia e os poucos funcionáMoura Estatística (IBGE), com rios disponíveis aca82,9% da área coberta por bam fazendo somente árvores, porém, em razão da a parte operacional. quantidade de remoções, está na Atualmente,16 fiscais atuam contramão da sustentabilidade. pela Smam. Na análise de Moura, A lei de compensação é de 1983 é um contingente pequeno para e determina que, para cada árvore controlar e fiscalizar diariamente cortada, outras sejam plantadas, todo o território da Capital – cada de modo a minimizar os prejuízos um deles ficaria responsável por 31 ambientais. O número de mudas km², o equivalente a 125 campos de substitutas depende da altura e da futebol. Porto Alegre tem 1,2 milhão espécie da árvore removida. Se uma de árvores, sendo 664 tombadas por está em risco de queda e em más lei, portanto, não podem ser retiracondições, sua supressão não entra das do seu hábitat. Esse é um sisna lei de compensação, de modo a tema para preservação de espécies, apenas ser transplantada ou trocada e os critérios para tombamento são por outra em seu lugar. Além disso, localização, beleza, raridade, idade no decreto atual, a compensação ou condição fitossanitária. precisa ser feita no mesmo local do A duplicação da Avenida Beicorte, no entorno (mesmo bairro) ou ra-Rio próximo à Usina do Gasôpode ser convertido em dinheiro, se metro, o alargamento da Rua Anita for comprovada a impossibilidade Garibaldi, a construção da trincheide plantio na mesma região. ra da Avenida Cristóvão Colombo e Moura explica que a lei é inviáa ampliação do Hospital de Clínicas vel. “Em uma avenida, por exemplo, são quatro grandes obras que se se tiro uma árvore, tenho que planiniciaram em 2014 na Capital e entar nove árvores no local. Se, daqui a volveram o corte de árvores no seu três anos, a prefeitura resolve duplientorno. As três primeiras fazem car a avenida, e aí o que acontece? parte das obras de mobilidade e Tu precisas retirar aquelas árvores intervenção no trânsito para a Copa

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e plantar 90. E onde plantar tudo isso? No fim isso acaba em um número absurdo”, enfatizou. A secretaria não concorda com o decreto em vigência, e por isso desde 2013 está com um projeto de lei tramitando na Câmara de Vereadores, prevendo alterações nas regras. É um projeto complementar da lei orgânica de Porto Alegre, definindo assim novas diretrizes para a política de remoções de árvores. O projeto propõe a troca de bio-

diversidade por biodiversidade, o que se aproxima da possibilidade de manter ecossistemas preservados. Para isso, a Smam seria, caso o projeto seja aprovado, responsabilizada por proteger as áreas arborizadas, criar novas Unidades de Conservação e ampliar as já existentes. Atualmente, Porto Alegre tem quatro Unidades de Conservação (UC): Reserva do Lami, Morro do Osso, Morro São Pedro e Parque Saint´Hilaire. Com a nova legislação, a arbo-

+ 2 OBRAS PRIVADAS A Zona Sul é o local da Capital com maior número de intervenções por obras privadas.

650

ÁRVORES REMOVIDAS

3.636 PRECISAM SER COMPENSADAS

632

FORAM REMOVIDAS

3.695 PRECISAM SER COMPENSADAS

1 OBRAS PÚBLICAS Ampliação do Hospital de Clínicias, trincheiras da Rua Anita Garibaldi e da Cristóvão Colombo e duplicação da Avenida Beira-rio próximo ao Gasômetro.

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de árvores é precário

0

rização seria uma obrigação orçamentária e não mais compensatória. “Não achamos que se troca diversidade por plantio de árvores em vias públicas”, defendeu Moura. Além disso, ele citou o custo de instalação e de manutenção das mudas como um obstáculo. No caso de obras públicas, segundo Moura, a própria empresa terceirizada é a responsável por plantar as mudas, e a Smam controla, seguindo o que está previsto

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nos decretos. Ele explicou, ainda, que o capital financeiro é o fator que determina o tempo para o plantio. O engenheiro responsável pela obra da Cristóvão Colombo, Ciro Matte, discorda. Ele disse à equipe do Editorial J que a responsabilidade não é da construtora e que caberia à Smam realizar o plantio. Matte apresentou documentos que mostram a quantidade de árvores a serem plantadas, sem especificar quem deverá realizar a compensa-

ção. “Um responsabiliza o outro e no fim ninguém faz nada”, confirmou. A fiscal da Smam Fernanda Borges confirma a informação da empresa contratada, contrariando a própria secretaria.“A realidade é que um joga a responsabilidade para o outro. Vocês jornalistas são importantes para investigar se realmente as árvores prometidas estão sendo plantadas. Nós só estamos fazendo nosso trabalho, também queremos que as replantem”, afirma um dos

Arte: Kimberly Winheski (6º sem.)

3 ÁRVORES EM RISCO

150 JÁ FORAM SUBSTITUÍDAS

Praças passaram por análise e mais da metade dos vegetais apresentou necessidade de corte. ESTÃO EM RISCO

38 NÃO PRECISAM SER REMANEJADAS

39

73

JÁ FORAM PODADAS

encarregados da obra, Rony Oliveibilidades são muito reduzidas, e os ra. O técnico em edificação Thiago números compensatórios muito abCorrea afirmou que o compromisso surdos”, complementa o supervisor de compensar as 537 mudas é da da Smam. prefeitura. Ele explicou também que A questão do corte privado, saas árvores pintadas de vermelho são lienta Moura, é um tema que pouco aquelas que estão com ação na Justipreocupa, pois o modelo adotado há ça e, portanto, ainda não podem ser um ano tem funcionado muito bem retiradas. “Nos chamam de assassie não houve verificação de nenhunos de árvores, mas nós só estamos ma fraude. O telefone 156 é o canal fazendo nosso trabalho”, reclamou para que o proprietário informe Correa. sobre o motivo do corte e o projeto A direção da empresa encarreseja avaliado. Após isso, biólogos e gada pelas obras na Anita Garibaldi engenheiros agrônomos cadastraafirmou que a obrigação é das terceidos vão até os locais para validar os rizadas. Porém, como cortes. Então, o dono a obra é pública, a predo local pode realizar a feitura fica responsáação, sem um controle Confira a galeria de vel pela contratação presencial dos fiscais. fotos no site do Edida mesma, além de Mesmo assim, a secretorial J sua fiscalização. A Setaria fica com o relató-

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cretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) informou que cabe à Smam responder pelos cortes e reposições. “As empresas responsáveis contratam terceirizados para fazer a compensação. Caso verifiquemos que as mudas não estão sendo plantadas, a empresa paga uma multa”, ressaltou Moura. Anunciada como uma saída para desafogar o setor de emergência, a obra de ampliação do Hospital de Clínicas causou polêmica em função da necessidade de erguer a estrutura sobre uma área urbanizada às margens da Avenida Protásio Alves. O debate foi travado entre ambientalistas e engenheiros favoráveis ao projeto. Foram necessárias aproximadamente 284 remoções, representando de 10% a 15% da vegetação existente na instituição. A construção do novo complexo está a cargo da empresa Consórcio Tratenge-Engeform, que deve plantar em torno de 2,5 mil mudas na região. “A questão é que não há lugar para todo esse plantio. Nós vamos ter que negociar com o Ministério Público Federal, pois infelizmente não há como”, lamentou Moura. Além disso, há muitas restrições: não se pode plantar na frente de garagem, nem em frente de prédio tombado. Se embaixo passar uma rede fluvial, canalização da Sulgás ou se a calçada for pequena, também não é possível. “Ou seja, as possi-

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rio de pedido para que, se o Ministério Público for questionar o corte, possa existir comprovação. Outro tema ligado à gestão das árvores na cidade envolve as que estão caindo e as que necessitam de cuidado, também a cargo da Smam. São os mesmos 16 fiscais que estão encarregados de controlar a cidade. Com cinco zonais espalhadas pelo território da Capital, é feito o mapeamento das exigências de corte. Para isso, é fundamental o uso de equipamentos especifícios para analisar a parte interna. “Esse exame deve custar em torno de R$ 300 a R$ 400 por árvore, por isso que não fazemos muito”, avalia o supervisor. Recentemente fizeram o levantamento em 150 e em torno de 30% delas tiveram de ser trocadas. Dessas, 38 já foram removidas, 73 podadas e 39 não têm prioridade de remanejo. O supervisor muda de assunto quando questionado novamente se haveria um controle maior sobre a arborização em Porto Alegre e a responsabilidade de plantio em áreas públicas. “O que a cidade tem que saber é que tudo tem um custo. A cidade quer árvore, nós também queremos. Mas isso, é claro, com alto custo”, acrescentou.

SEGUE >>


porto alegre

Uma vida derrubada

Fotos: Betina Carcuchinski (4º sem.)

P O R Pedro Silva (4º sem.)

de parte da casa cinquentenária ser derrubada. A fachada é hoje um cenário de lama, canos expostos e sobras do muro. m visita às obras de ampliação Dentro do terreno, o resto de casa guarda do espaço para o trânsito na pertences e lembranças. Os fundos ainda Rua Anita Garibaldi, em Porto preservam vestígidos do que um dia foi Alegre, surge um personagem um jardim. singular, que convive com o lamaçal e o Para Schubert, o apoio familiar foi essenagito comum de uma construção do porte cial durante todo o processo. Ele afirma que como a que está sendo feita naquele ponainda não recebeu a indenização. Admite to da cidade. Pelo corredor improvisado pensar que pode não ver o dinheiro em vida. da entrada do terreno, o homem de 86 Seu advogado informou-o de que a quantia anos se aproxima do portão gradeado e, estava depositada em juízo e que ainda decom esforço, se apoia na caixa de correio penderia de um longo processo até que fosse para manter em pé. O peso da idade é liberada. evidente, e a exaustão pela intervenção O processo, desde o começo, tramitou da obra no seu lar, também. Heinrich dentro da normalidade jurídica, afirma Schubert, morador da Anita há quase 50 a procuradora do município Cláudia de anos, reclama do corte de árvores que Aguiar Barcellos. Escalada pela Prefeitura ele mesmo havia plantado décadas atrás. de Porto Alegre para comentar o caso do “Evidente que fico chateado por derrubaidoso, ela acompanhou de perto o andarem tanta árvore, mas o pior foi minha mento, desde a entrega da intimação até casa, né?’’, lamenta. Para que a obra se a derrubada da casa. “A indenização está concretizasse e seguisse o plano original, dentro da lei”, garante Cláudia. A procua casa de Schubert foi quase completaradora reconhece a calma com que Schumente derrubada. bert recebeu e tratou todas as questões. Ele aponta, em meio à sujeira e aos Apesar do desgosto pessoal, escombros, um pequeno peo idoso não transpareceu daço de muro. Ao lado dele, revolta. gal hos se c o s c o m po uca s Além da questão sentiflores apodrecidas, de cores Primeiro mental da derrubada da casa, avermelhadas, sinalizam a foi minha outras dificuldades surgiram derrubada recente. O ponna rotina de Schubert. Sair to marcava o início de seu esposa. de casa para ir ao mercado, terreno. O morador hoje Agora, por exemplo, algo que podevive nos fundos da sua proria ser considerado simples, priedade, em um pequeno isso.” é um ação complicada em galpão construído pelo filho Heinrich meio aos materiais de conse pelo genro, separado em Schubert trução, máquinas e buracos, três peças: cozinha, quarto e que demandam esforço para a banheiro. mobilidade afetada pelos seus 85 Schubert soube pela prianos. Ele fica emocionado quando lembra meira vez sobre a possível obra por boatos a morte da esposa, 20 anos atrás, e comde vizinhos. A intervenção se confirmou para a situação atual como aquela grande em meados de 2012, quando recebeu a tristeza em sua vida. “Primeiro foi minha notificação da prefeitura. Contrariado, esposa. Agora isso’’, lamenta. preveniu-se com a família e planejou a Nesse caso de desapropriação com paparte dos fundos para o pior. Preparou-se gamento mediante títulos da dívida públipara o momento da desapropriação, mesca, conforme o artigo 182 da Constituição mo que ainda resistisse contra a ideia. A Federal, inciso terceiro, a obrigação cabe partir da confirmação, a vizinhança mobiao município e é garantida por ele. O pralizou-se, tendo diversas vezes impedido as zo para efetuar o depósito da indenização máquinas de iniciarem a obra. é de até dez anos, em parcelas anuais, A insatisfação motivou os moradores “iguais e sucessivas, assegurados o valor da região a se unirem e reagirem com real da indenização e os juros legais”. mobilização, incluindo sessões de cinema Por isso a preocupação de Schubert com ao ar livre, cuja temática era a mobilidade a espera e a possibilidade de não receber pública, e tentativas de deter as escavaem vida, diante de sua idade avançada. O deiras que chegavam para o começo dos prazo é o mesmo no caso de o indenizado trabalhos. Um esforço em vão. Schubert ser idoso, com a diferença de que tramita aguentou quase dois anos de pressão. Em com preferência para pessoas com idade maio deste ano, recebeu um ultimato: superior a 60 anos, estipulada no artigo retirou suas coisas da parte da frente da 71 do Estatuto do Idoso. casa e, no dia 20 do mesmo mês, viu gran-

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Schubert perdeu o pátio arborizado e parte da casa

Vizinhança se mobilizou para tentar parar o trabalho das máquinas

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gastronomia

Tradição do exagero C ON S AG RA DO P E LO PA L A DAR GAÚCH O COMO O LANCH E MA IS POPULA R DA CULINÁ RIA LO CAL , O XI S C O MO O RIO GRANDE CONH E CE NÃO S E ENCONTRA EM OUTRO LUGA R Yanlin Costa (3º sem.)

POR Camilla Pereira (6ª sem.)

X

is é gaúcho. Não se sabe direito de onde vem, mas se sabe que é daqui. Uns especulam ser uma versão local e muito exagerada do cheeseburger norte-americano. Mais que um lanche, é um ritual que toma várias formas, como a família unida dividindo um xis, uma turma que voltou faminta do futebol ou alguém procurando boa refeição. Aquele emaranhado de sabores prensados entre os pães mais simples do mercado faz a alegria da gauchada diariamente. Uma das características únicas do xis é a prensa. Todo xis deve ser prensado. É regra! Algo tão tradicional quanto é a maionese. No 14 Bis Lanches, ponto habitual na Zona Norte da Capital, a maionese é de fabricação própria, e os clientes querem levar para casa, de pote! A vigilância sanitária não permite, mas a tentativa é livre. A atração principal do lugar leva o nome da lancheria, recheado com alface, tomate, milho, ervilha, bife de hambúrguer, batata frita, queijo e o famoso complemento. No Gelson Lanches, o campeão de vendas é o Top Gelson com filé mignon, bacon, azeitona, palmito, milho, ervilha, cebola, tomate, alface, salsa, maionese feita na cozinha do Gelson, mostarda, ketchup, ovo e queijo. Tudo entre dois pães bruscamente prensados. O xis faz parte da cultura gaúcha tanto quanto o churrasco. Tão comum quanto o pedido por uma costela gorda, são as expressões “vamos lá comer um xis?” e “vamos pedir um xis, aí não precisa jantar”. É uma iguaria gastronômica que, seguindo o exagero – marca registrada da culinária gaúcha – extrapola em tamanhos, molhos e recheios. Jorge Fernandes, atendente de caixa do 14 Bis, acredita que xis é famoso por ser um lanche rápido e fácil. “De uns dez anos para cá, tenho notado que todo mundo come com pressa. Xis é um lanche rápido e gostoso, sem a burocracia do restaurante de ter que sentar, esperar e pedir. Com dez ou 15 minutos, tu compras, come e já tá indo embora”, observa. A gerente da Tia Zefa Lanches, Darilene Pires, acha que o clima é o culpado, pois “Xis faz bastante sucesso aqui no Rio Grande do Sul porque é um estado frio”. A cozinheira do Gelson, Claudete Silva, garante que a refeição deve muito aos jovens. “É comida de gurizada, é lanche que eles consomem como refeição, e é isso que faz a fama dele”, argumenta. O xis não é só comida, é também o lugar. O Gelson, por exemplo, é uma lancheria dentro do Clube Tristezense, na Zona Sul de Porto Alegre, e parada obrigatória para os frequentadores das quadras de futebol. Quem

Xis do Gelson, famoso pelo tamanho incomum, é um dos mais tradicionais da Capital passa meia hora no local vai reparar que em pelo menos uma das mesas está um time de guris suados comendo depois do jogo. Na Capital, a forma mais clássica era vendida em trailers, por comodidade de quem faz, pois não é preciso pagar aluguel e é possível vender em qualquer lugar. Na Tia Zefa, o trailer significa tradição. Durante 20 anos, ela vendeu xis dentro de um que ficava estacionado na Rua Barão do Amazonas, esquina com a Rua La Plata. Em 1998, realocou o veículo para um terreno na mesma rua, onde está até hoje. Foi montado um galpão ao redor do trailer, e um toldo cobre uma área com mesas, cadeiras e televisão. Apesar disso, a cozinha da Tia Zefa ainda é dentro do trailer. Darilene, nora da pioneira que empresta nome ao estabelecimento, conta que os clientes exigiram melhorias com o passar do tempo. “A Tia Zefa colocou toldos, mesas e cadeiras porque os clientes pediram mais conforto, mas ela sempre quis que continuássemos com o trailer”. Tia Zefa já passou dos 80 anos e não se envolve mais com questões administrativas da lanchonete. O estabelecimento é administrado pelo filho e pela nora, mas a opinião dela ainda tem peso.

e do desafio: “Quem comer dois xis inteiros O 14 Bis, localizado na Avenida Plínio não paga a despesa”. Brasil Milano, preza pela simplicidade. O No regulamento da tarefa árdua, consta freguês se sente numa daquelas sorveterias a exigência de que o comensal cumpra o típicas do Litoral, com mesas e bancos fixos feito em uma hora, de forma ininterrupta e repletas de famílias em busca de lanche baindividual. A cozinheira Claudete garante rato e rápido. Não há cardápio, mas todos os que, em seis anos de trabalho no estabelecipratos oferecidos estão na parede próxima mento, presenciou um único “guri corajoso” ao caixa, sem frescura. que cumpriu o desafio. “Eu me Jorge Fernandes, que trasentia mal por ele, de tanta balha há 15 anos no local, relacomida que era. Mas ele comeu ta orgulhoso que uma família Xis faz tudo e não pagou”, recorda. gaúcha leva o xis do 14 Bis para parte da “Tomara que tenha passado o Rio de Janeiro, de avião. O bem depois.” pai encomenda para a filha, cultura Quem não é gaúcho custa a que transporta vários lanches gaúcha entender. A estudante paulista para a capital fluminense semBárbara Reis, ao conhecê-lo, pre que visita a cidade. “O pai como o o classificou como “obsceno” manda vir daqui porque lá no churrasco e preferiu voltar para o Big Rio não tem nada nem pareciMac. O cinegrafista Alexandre do com o que a gente faz aqui Flores é gaúcho e, durante viano Sul”, conta orgulhoso. gem a São Paulo, peregrinou em Xis também é culinária busca de um xis. “Lá, só tem esses rio-grandense por causa de é hambúrgueres com quase nada dentro, que gastronomia do exagero. No Gelson Lannão matam a fome e custam a mesma coisa ches, duas pessoas costumam comer meio que um xis gaúcho. Não adianta, não tem em xis. Cada unidade do Gelson pesa cerca de outro lugar”, reconhece. 2,2 quilos. A fama do lugar vem do excesso

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eleições 2014

Preconceito sem espaço P O R Q U E A T E MÁTICA LGBT S E D E S TACOU NO DEB ATE DA DISPUTA À P RE S I DÊ N C I A TANTO QUANTO TE MAS TRAD ICIONA IS COMO ECONOMIA Fotos: Maiara Rubim (4º sem.)/Arquivo – 2/10/2014 P O R Bruna Ayres (6º sem.)

T

emáticas pautadas pelo movimento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) ganharam destaque nos debates realizados no primeiro turno da eleição presidencial, refletindo uma movimentação já percebida nas ruas e nas redes sociais. Assuntos tradicionalmente abordados em campanhas, como questões econômicas e sociais, acabaram não tendo a mesma visibilidade de outros pleitos. O cientista político Juliano Corbellini avalia que a força da luta LGBT conseguiu o espaço que buscava. “Isso é o reflexo do que está em pauta na sociedade mediante o extraordinário avanço do movimento na luta por direitos civis. A sociedade vai amadurecendo, e debates mais contemporâneos começam a ganhar espaço”, observa. A luta em prol do respeito à diversidade sexual começou no Brasil na década de 1970. Mesmo com cerca de 40 anos de mobilização, esta eleição mostrou que ainda há muito a se conquistar na garantia desses direitos, conforme ficou evidenciado no debate promovido pela Rede Record no dia 28 de setembro. Na ocasião, uma declaração do candidato à Presidência Levy Fidelix (PRTB) causou polêmica e indignação, mas também recebeu apoio. Ao responder a uma pergunta da candidata Luciana Genro (PSOL) sobre o número de mortes na comunidade LGBT e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, Fidelix afirmou: “Tenho 62 anos e, pelo que eu vi na minha vida, dois iguais não fazem filho. E digo mais: aparelho excretor não reproduz”. Ele ainda comparou homossexuais a pedófilos e afirmou que jamais apoiará a união homoafetiva. “Temos 200 milhões de habitantes no Brasil. Se estimularmos isso, vamos reduzir para 100 milhões. Vamos ter coragem, somos maioria! Vamos enfrentar essa minoria”, bradou. Para Sandro Ka, diretor do grupo Somos – Comunicação, Saúde e Sexualidade, o maior motivo para o tema ter ganhado espaço no período que antecedeu ao pleito realizado no dia 5 de outubro é o tom de polêmica. “É arriscado para algumas campanhas tocar no assunto, então a maioria dos candidatos pouco se posiciona ou fala sobre isso apenas quando o clima é favorável, após muito tempo de observação. Na vida privada dos candidatos, alguns até tem essas questões mais claras, mas, na campanha, não querem perder votos para esses assuntos”, pondera. O assessor de imprensa do PRTB no Rio Grande do Sul, Tomás Sá Pereira, ressalva que a posição de Fidelix no debate não é una-

Protesto em Porto Alegre contra declarações homofóbicas do candidato Fidelix OUTUBRO/NOVEMBRO DE 2014 • PÁGINA 10


que prometeu tomar providências sobre a nimidade no PRTB. “Ele exerceu o direito de declaração dada pelo candidato. “Fiz uma falar o que pensa. Ele não é todo o partido, é firme defesa do casamento civil igualitário e o presidente. Não encontraremos a mesma de todas as formas de família durante minha ideia em todos os nossos militantes. São intervenção no debate. É muito perigoso que pensamentos particulares dele”, relativiza. um candidato à Presidência expresse, em A linha adotada por Fidelix é a mesma rede nacional, esse tipo de discurso de ódio, percebida em líderes políticos e religiosos que serve de legitimação para os criminosos vinculados às igrejas pentecostais, como os atacarem fisicamente e verbalmente a popupastores Everaldo, também candidato à Prelação LGBT todos os dias”, acusa. sidência pelo PSC, e Silas Malafaia, líder do Indignados perante o discurso, Luciana programa Vitória em Cristo, ligado à Asseme o deputado federal Jean Wyllys (PSOL) rebleia de Deus. Este último esteve envolvido presentaram contra Fidelix no Tribunal Suem outra polêmica, relacionada à candidata perior Eleitoral (TSE), por incitação ao ódio. Marina Silva (PSB), que alterou o seu proNo dia 9 de outubro, a Defensoria Pública grama de governo após declarações que Made São Paulo ingressou com uma ação civil lafaia publicou no Twitter em 29 de agosto. pública por danos morais contra Fidelix e Ao cobrar uma posição da candidata acerca seu partido, o PRTB. O órgão concordou que do texto originalmente publicado em relação sua declaração incitou o ódio contra a coaos direitos LGBTs, o pastor ameaçou que, munidade LGBT e pede a indenização de R$ caso ela não voltasse atrás, faria “a mais dura 1 milhão – que serão revertidos a ações de fala” em relação a um presidenciável. incentivo à igualdade. Para o Núcleo EspeEm menos de 24 horas, Marina Silva cializado de Combate à Discriminação, Raaderiu à pressão e mudou o plano, que pascismo e Preconceito, “este discurso de ódio sou de “apoiar propostas em defesa do caé incompatível com o respeito à dignidade samento civil igualitário”, para uma versão da pessoa humana”. Fora a indenização, mais genérica, que dizia “garantir os direitos é pedido que os processados custeiem um oriundos da união civil entre pessoas do programa que promova os direitos LGBT, mesmo sexo”. Isso gerou revolta em eleitocom a mesma duração de tempo de sua fala e res simpáticos às demandas da comunidade na mesma faixa de horário da programação. LGBT, ao mesmo tempo em que motivou Caso não haja o pagamento, o órgão estipula outras manifestações de Malafaia nas redes a multa de R$ 500 mil a cada dia de atraso. sociais, afirmando que estava satisfeito e A jornalista e pesquisadora de sexua“não estamos aqui para engolir agenda gay”, lidade Fernanda Nascimento percebe que publicou o pastor no Twitter. uma pressão histórica obrigou os candidatos A menos de uma semana para a votação a colocarem esse tema em pauta. “Isto foi do primeiro turno, a declaração de Fidelix imposto pelo crescimento da demanda. O – que, após o debate, viu o número de seavanço da medicina, do Judiciário e o fato de guidores de sua página no Facebook crescer a mídia abordar mais o tema contribuíram 1.500%, somando mais de 40 mil – ganhou para esse fenômeno”. Fernanda lembra que espaço dentro e fora das redes sociais em a luta LGBT é mais ampla e também envolve todo o país, com comentários que atacam e fatores como a criminalização da homofobia defendem o candidato. e a necessidade de abordar o tema nas escoLuciana Genro ressalta que sua candilas, preparando os professores para discutir datura era “a única com coragem de pautar o tema em aula. esse tema em rede nacional e “O que Levy falou foi tão em todos os debates, exigindo chocante que surpreendeu as posicionamento dos demais pessoas. Ninguém esperava candidatos”. Ela critica MaSociedade aquele discurso com tanto ódio rina, que “rifou os direitos e bobagem. Muitos candidatos LGBTs em menos de 24 horas, espera são preconceituosos e evitam após quatro tuítes do Malamais tratar disso, mas ninguém fafaia”. Sobre Dilma Rousseff, lou daquela maneira”, observa lembra que a candidata vetou clareza ao Fernanda. o programa Escola sem Homose tratar Para Sandro Ka, existem fobia por pressão da bancada discursos que vão “conforme fundamentalista. “Aécio mal do tema. a onda”, dependendo das cirtocou no tema”, conclui. cunstâncias. “Eles pensam o que O atraso civilizatório do vão ganhar com tal posicionamento. país, para ela, é o maior moO Levy acabou sendo o mais franco dos tivo para temas que envolvam candidatos que fazem isso, de acordo com diretos LGBTs estejam se sobressaindo. suas convicções. Luciana não é a única que “Enquanto em muitos países o casamento abraçou a causa, mas a sua campanha sempre civil igualitário e o direito à livre identidade teve esse posicionamento marcado”, avalia. de gênero já são assegurados pelo Estado, Fernanda sustenta que a homofobia já no Brasil, esses temas ainda não foram enestá estigmatizada na sociedade, mas afircarados pelo Congresso Nacional. O governo ma que isso está mudando. “Vivemos uma Dilma tem um papel fundamental na omiscultura machista, sexista e racista. Para dessão da garantia desses direitos, já que nunca construir isso demora, mas as pessoas estão mobilizou sua base para apoiar o projeto do colocando essa questão em pauta.” casamento civil igualitário e a Lei João Nery Depois das declarações dos candidatos [que facilita a obtenção de identidade social nos debates, a sociedade espera mais clareza por transgêneros]”, ressalta. ao se tratar do tema – tanto os simpáticos Nas redes sociais, a candidata recebeu à causa, como aqueles que são contra. As críticas por conta de sua resposta à declamanifestações acerca do assunto cobravam ração de Fidelix. Os internautas cobraram um posicionamento mais definido para o mais rigidez de Luciana diante do comensegundo turno de eleição presidencial, em tário. “Durante o debate, nem sempre é 26 de outubro, quando Dilma Rousseff, do simples responder com a mesma forma que PT, derrotou Aécio Neves, do PSDB. se faria vendo de fora”, explica Luciana,

Manifestantes expressaram contrariedade ao discurso de ódio

+ Ideias vagas Os candidatos ao segundo turno da disputa presidencial tinham propostas vagas quanto à temática LGBT, na visão de especialistas no assunto. Tanto Aécio Neves (PSDB) quanto Dilma Rousseff (PT) não propuseram medidas inovadoras, avalia Sandro Ka, da ONG Somos. “As do tucano reafirmam ações já implementadas nas gestões petistas, e as de Dilma prometem dar prioridade à agenda, o que não aconteceu integralmente em seu mandato”, diz. Ele salienta que, durante a gestão da petista, houve avanços, mas também “inúmeros retrocessos e deslizes, como virar moeda de troca em negociações de apoio político”. Ka lembra que ações ligadas ao casamento gay e à adoção já são realidade, independentemente da ação do Executivo. Questões ainda em discussão, como a criminalização da homofobia, apontam para a necessidade de articulação entre setores do Legislativo com apoio do Executivo, defende. “O que é essencial que esteja presente na pauta do próximo presidente”, projeta Ka.

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Aécio Neves (PSDB)

A prioridade do capítulo sobre direitos humanos era assegurar a paz, a igualdade e a segurança nos “setores mais vulneráveis da sociedade”, que inclui a comunidade LGBT. Ampliar a participação de ativistas nos debates e promover a igualdade de direitos da comunidade seriam algumas das prioridades, além de ampliar o Programa Brasil sem Homofobia. Incluir a descriminação por orientação sexual e identidade de gênero às já previstas em lei.

Dilma Rousseff (PT)

A candidata prometia prioridade à pauta. Segundo a coordenação da campanha, ela apoia a criminalização da homofobia e a legalização do casamento civil igualitário. Questões como investimento na prevenção e tratamento de aids e o Plano Nacional de Educação (que pretende conscientizar os jovens) não envolvem somente a comunidade LGBT, mas são algumas das propostas da presidente reeleita.


Pedro Scott (3º sem.)

Ritual sustentável P ROJ ETO VI S A MINIMIZ AR IMPACTO CAUS ADO POR RESÍDUOS P ROVE N I ENTE S DE OFE RE NDAS RE LIGIOS AS NO GUA ÍB A

P O R Bruna Zanatta (4º sem.)

Q

uem frequenta a Praia de Ipanema, um dos mais conhecidos pontos turísticos na Zona Sul de Porto Alegre, já se acostumou com a presença de oferendas, que se espalham pela areia e calçada. Pipoca, flores e carcaças de galinhas são as mais frequentes. Através desses presentes, as religiões afro-brasileiras manifestam a ligação com as divindades. Algumas dessas oferendas, porém, não são tão inofensivas. Espelhos, cacos de garrafas de vidro, vasos de barro, pentes e até facas são deixadas às margens do lago Guaíba. Esses objetos ame-

açam a segurança de pescadores, de banhistas, de animais e dos próprios religiosos, que utilizam o local para os ritos. Joice Ferreira faz parte da diretoria da Federação Afro-Umbandista e Espiritualista do Rio Grande do Sul (Fauers) e conta que, durante algumas celebrações realizadas dentro do Guaíba, em Ipanema, é possível sentir a presença desses objetos no fundo do lago. Segundo ela, alguns religiosos inclusive já se machucaram. Pensando na segurança das pessoas e na preservação da natureza, a Fauers lançou, em 2008, o primeiro volume da Cartilha pela Natureza – Porque ela é o altar de todos nós. O projeto busca a conscientização e a preservação do ambiente, nos terreiros e nas comunidades, reconhecendo a na-

tureza como fonte vital de energia sagrada – o axé, como entendem os representantes das religiões. A oferenda ecológica deve ser confeccionada por material biodegradável. São orientações simples como trocar bandejas de plástico por folhas de bananeira, optar por velas de sebo e gordura animal (velas não devem ser acendidas perto de árvores) e não deixar garrafas e copos de vidro no ambiente, entre outras. A iniciativa ainda conta com uma parceira especial. Perto de datas importantes, como a Festa de Iemanjá, no dia 2 de fevereiro, a Fauers leva material até um presídio, onde os detentos confeccionam barcos de papel machê utilizados na celebração, que reúne milhares de pessoas na praia

de Cidreira, no litoral gaúcho. No dia do ritual, é possível trocar, no estande da federação, o barquinho de madeira por um barco 100% ecológico e que não irá agredir a natureza. A madeira leva cerca de 15 anos para ser decomposta no ambiente, o papel, não mais do que seis meses. Conforme a diretora, o projeto foi bem aceito e, aos poucos, está provocando mudanças no modo das pessoas presentearem os orixás. “Cultuamos a natureza, mas o plástico não faz parte da natureza. Não podemos sujar nosso altar”, pondera. Para divulgar o trabalho, a entidade utiliza rádio, redes sociais e também investe bastante na orientação e na divulgação durante os eventos promovidos pela comunidade.

A cartilha, porém, não menciona o uso de objetos cortantes ou mesmo o sacrifício de animais em rituais. O que é ofertado faz parte do fundamento de cada vertente e de cada religioso. “Não interferimos no que vai na oferenda, mas como vai”, explica. Nesses casos, é aconselhado que, se possível, dentro da fundamentação do ritual, que se enterrem animais sacrificados e objetos perigosos. Cada orixá (guardião espiritual) recebe uma oferta diferente, que varia também conforme a vertente da religião de matriz africana (são mais de 15 diferentes no Brasil). Na Umbanda, os 11 Orixás são presenteados, em sua maioria, com alimentos: milho torrado, batata, canjica, quindins, costela de porco.


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