Editorial J - número 5 - maio de 2012

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MAIO 2012. NÚMERO 5. FAMECOS PUCRS

A geração da cidadania viva

Sem pedir nem esperar apoio do poder público, movimentos de

jovens porto-­alegrenses promovem melhorias urbanas, fazendo da ação o seu discurso e arrecadando apoio nas redes sociais

/8 e 9

Ilustração: Lúcia Vieira

www.pucrs.br/famecos/editorialj

Um dia sai Cinco centros culturais, há muito prometidos, demoram em média oito anos do projeto à conclusão /4 e 5

Thiago Meller, o gaúcho destaque do MMA, treina dia após dia para prosperar no concorrido mundo das lutas

Foto: Eduarda Alcaraz

Os segredos do octógono

/6 e 7

Não letal, mas nem sempre

Com vocês, José Bonifácio

Pistola Taser, em uso na Capital como alternativa de “menor poder ofensivo” às armas de fogo, gera discussão após sequência de mortes /11

Boni, ícone da TV brasileira, critica qualidade de programas da Rede Globo como o BBB, que está sob comando de seu filho /3


papo de redação

Democracia, conceito tangível

O

Texto e foto: Felipe Martini

s gregos não estavam equivocados. O poder pode, sim, emanar do povo. É o que provam os jovens porto-­alegrenses que reavivaram a democracia com ações criativas e ganharam visibilidade primeiro nas redes sociais e, depois, na mídia tradicional. A pauta sobre essa “nova” forma de cidadania, os leitores podem conferir o resultado nas páginas 8 e 9, sob o título Um passo à frente do poder público, surgiu na época dos embates entre a prefeitura e o grupo Shoot the Shit, responsável pelos adesivos que convidavam a população a escrever quais ônibus passavam em cada parada. Para apresentar um panorama desse desafio ao modelo representativo, além de entrevistar os jovens que unem o conceito helênico à tecnologia, o Editorial J ouviu ainda a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), uma precursora que mostrou a força da sociedade civil organizada na década de 1970, antes da internet. Grupos internacionais foram entrevistados, o que permitiu se constatar que o desafio ao poder formal é uma tendência global. A prefeitura de Porto Alegre reconheceu que precisa se atualizar, nas palavras do diretor da Secretaria de Coordenação Política e Governança Local. A reportagem também foi produzida dentro do espírito colaborativo. Quatro repórteres dividiram as tarefas e apuraram cada ponto específico, propiciando ao leitor uma visão ampla do tema, no melhor espírito colaborativo.

expediente editorial J Laboratório convergente da Famecos www.pucrs.br/famecos/editorialj Jornal mensal da Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Avenida Ipiranga, 6681, Porto Alegre (RS). Reitor: Ir. Joaquim Clotet Vice-­reitor: Ir. Evilázio Teixeira Pró-­reitora de Graduação: Solange Medina Ketzer FAMECOS Diretora: Mágda Rodrigues da Cunha Coordenador do curso de Jornalismo: Vitor Necchi Coordenador do Espaço Experiência: Fábian Chelkanoff Thier Editor: Fabio Canatta Coordenadora de produção: Ivone Cassol Projeto gráfico: Luiz Adolfo Lino de Souza Professores responsáveis: André Pase, Caroline de Mello, Eduardo Lorea, Fabio Canatta, Flávia Quadros, Geórgia Santos, Ivone Cassol, Marcelo Träsel, Marco Villalobos, Sérgio Stosch, Rogério Fraga e Vitor Necchi. EQUIPE DE ALUNOS Editores: Cassiana Machado Martins, Eduarda Alcaraz, Eduardo Bertuol Rosin, Felipe Martini e Igor Grossmann. Repórteres: Alina Oliveira de Souza, Allan de Oliveira, Anahis Vargas, Angela Ferreira, Bruna Canani, Bruna Essig, Bruna Cabrera, Bruno Moraes, Caio Venâncio, Camila Foragi, Camila Hermes, Camila Salton, Cândida Schaedler, Carime Oliveira, Carla Simom, Carolina Matzenbacher, Caroline Corso, Caroline Rech, Carolina Teixeira, Carolini Zanini, Cassia Sirio, Cristine kist, Daniela Boldrini, Daniela Flor, Daniele Souza, Débora Ely, Dimitria Prochnow, Diogo Puhl Pereira, Emily Mayer, Fernanda Correa, Fernando Lopes, Gabriel Amaral, Gabriela Guadanin, Gabriella Monteiro, Gerson Raugust, Guilherme Tubino, Gustavo Becker, Gustavo Frota, Henrique Meneghini Dihl, Ian Linck, Janaina Marques dos Santos, Jean Pereira, Jéssica Mello da Rosa, Jéssica de Souza Barbosa, João Vitor Araújo, José Luiz Dalchiavon, Juliana Prato, Juliana Vencato, Julian Schumacher, Karine Flores, Kimberly Winheski, Laís Flores, Larissa de Bem, Larissa Lofrano, Liege Ferreira, Lúcia Feijó Vieira, Manuela Ferreira, Manoela Ribas, Marcela Ambrosini, Maria Eduarda Sinigaglia, Mariana Amaro, Mariana Caldieraro, Mariana Ramos, Mariana Soares, Martina Jung, Maya Lopes, Milena Haas, Muriel Porfiro, Muriell Krolikowski, Natacha Gomes, Priscila Vanzin, Rafaela Masoni, Rafael Grendene, Rafael Ribeiro, Ramiro Macedo, Renan Sampaio, Renata Paiva Dias, Roberto Stone, Rodrigo Sartori, Shaysi Melate, Stéfano de Souza, Tiago Rech, Thiago Netto, Vanessa Pacheco, Vinícius Velho, Virgínia Miranda, Vitória Di Giorgio, Yasmine dos Santos.

Ações urbanas de grupos como o Shoot the Shit desafiam o modelo representativo

Começo de conversa Texto: Eduardo Lorea Ilustrações: Lúcia Vieira

A

edição de maio do Editorial J estampa a primeira mostra da produção dos alunos que passaram a integrar o laboratório no início do ano letivo. Mesmo com muitos integrantes da turma de estágio à tarde ainda na fase inicial da faculdade, frequentando as disciplinas introdutórias, o grupo mostra que a experiência nasce da vontade de aprender. O jornal traz assuntos variados, dos mais “brutos”, como as dificuldades dos lutadores de MMA em progredir na cadeia do esporte, até os mais “eruditos”, como a demora na concretização dos projetos de centros culturais de Porto Alegre que habitam a pauta da mídia gaúcha há anos. Alguns talentos também começam a se revelar. Para ilustrar a reportagem sobre os centros culturais, a estudante Lúcia Vieira produziu os desenhos ao lado, retratando os projetos da nova sede da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa), da Caixa Cultural, do Auditório Araújo Vianna, da Cinemateca Capitólio e do Multipalco, do Theatro São Pedro. Lúcia, que faz curso de arte, é dona de um portfólio promissor. Outro destaque foi a construção da pauta Um passo à frente do poder público, que ganhou a manchete da edição. Coordenados pelo estudante Felipe Martini, o grupo de quatro alunos soube apurar a reportagem a muitas mãos, resultando em um trabalho que consulta fontes internacionais, precursores do terceiro setor e outras organizações que fazem história nos dias de hoje.

Impressão: Apoio Zero Hora Editora Jornalística

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bastidores  da  TV

60 anos de amor à televisão Em  passagem  por  Porto  Alegre,  o  empreendedor  JosÊ  Bonifåcio,  o  Boni,  divulga  livro  que  reúne  histórias  de  sua  vida  profissional  como  agradecimento  às  pessoas  que,  junto  com  ele,  fizeram  a  televisão  brasileira Texto:  Paloma  Poeta           Foto:  Priscila  Leal

E

ra  uma  vez  um  certo  JosĂŠ  BonifĂĄcio,  que  acabou  tendo  seu  nome  associado  ao  padrĂŁo  de  qualidade  da  televisĂŁo  brasileira.  Por  ironia  do  destino,  hoje  critica  o  conteĂşdo  que,  sob  tutela  GH RXWUR -RVp %RQLIiFLR VHX ÂżOKR YDL DR DU QD emissora  que  o  notabilizou,  a  Rede  Globo. Foi  isso  que  o  Editorial  J  ouviu  de  Boni,  apelido  de  JosĂŠ  BonifĂĄcio  de  Oliveira  Sobrinho,  durante  a  sua  passagem  por  Porto  Alegre  no  dia  12  de  abril.  O  pai  do  diretor   do  programa  Big  Brother  Brasil  veio  divulgar  o  Livro  do  Boni,  em  que  reĂşne  as  histĂłrias  de  mais  de  60  anos  de  YLGD SURÂżVVLRQDO DOpP GH SDOHVWUDU na  Associação  dos  Dirigentes  de  Vendas  e  Marketing  do  Brasil  (ADVB/RS). O  menino  de  Osasco  descobriu  cedo  o  fascĂ­nio  do  rĂĄdio.  Fez  dos  estĂşdios  seu  palco  de  descobertas,  que  depois  o  levaram  à  publicidade  e  à  TV.  O  livro  conta  algumas  das  experiĂŞncias  do,  acima  de  tudo,  empreendedor  Boni,  em  uma  obra  que  ele  diz  nĂŁo  ser  autobiogriÂżFa,  mas  â€œum  hino  de  amor  e  agradecimento  à s  pessoas  que  mudaram  a  televisĂŁo  no  Brasilâ€?. Boni  fez  histĂłria  na  televisĂŁo.  Passou  pelas  TVs  7XSL 5LR 3DXOLVWD ([FHOVLRU H SRU ÂżP pela  Globo,  onde  começou  como  chefe  de  direção  de  programação  e  produção  em  1967,  e  se  manteve  como  todo-­poderoso  por  30  anos.  O  executivo  investiu  na  teledramaturgia  e  apostou  em  autores  de  novelas,  cujos  nomes  hoje  sĂŁo  conhecidos  do  pĂşblico.  Em  sua  batalha  pela  XQLÂżFDomR GD WHOHYLVmR HP rede,  colocou  no  ar  dois  marcos:  o  Jornal  Nacional  e  o  FantĂĄstico.  Participou  tambĂŠm  da  criação  do  piloto  de  programas  como  Casseta  &  Planeta  e  A  Grande  FamĂ­lia. Dentre  os  nomes  importantes  com  quem  trabalhou,  cita  Roberto  Marinho,  fundador  da  Rede  Globo.  â€œEle  era  um  homem  extraordinĂĄrio.  Estava  sempre  calmo  e,  quanto  mais  baixinho  falava,  pior  eraâ€?,  se  diverte.  Em  sua  obra  tambĂŠm  elogia  um  Marinho  com  capacidade  de  enxergar  o  talento  nos  outros.  Se  for  assim,  Boni  tambĂŠm  Ê  um  pouco  Roberto  Marinho.  Deu  destaque  a  pessoas  como  Regina  Duarte,  Tony  Ramos,  FaustĂŁo,  JĂ´  Soares,  todos  com  histĂłrias  contadas  em  seu  livro. Dercy  Gonçalves  e  Chico  Anysio  tambĂŠm  ¿JXUDP  no  livro,  com  capĂ­tulos  dedicados  exclusivamente  a  eles.  Em  Nome  por  trĂĄs  da  Rede  Globo,  Boni  reĂşne  histĂłrias  e  experiĂŞncias  em  seu  primeiro  livro conversa  com  o  Editorial  J,  apĂłs  o  falecimento  do  amigo  em  23  de  março,  Boni  nĂŁo  escondeu  sua  admiração.  â€œHXPRU p XPD FRLVD PXLWR HVSHFtÂżFD,  e  a  perda  de  um  talento  como  o  Chico  Anysio,  um  dos  maiores  do  mundo,  Ê  muito  tristeâ€?,  lamenta.   Sobre  Dercy  Gonçalves,  Boni  nega  a  sua  morte.  Big  Brother  Brasil?  JosĂŠ  BonifĂĄcio  de  Oliveira  A  qualidade  parece  ter  se  perdido  nos  últimos  â€œPessoas  como  a  Dercy  nunca  morremâ€?,  acredita.  Ainda  Sobrinho,  o  Boni,  nĂŁo  faria.  Admite  nĂŁo  assistir  anos,  lamentou.  â€œO  mal  à  televisĂŁo  jĂĄ  foi  feito,  e  em  2012,  em  uma  homenagem  da  Rede  Globo  a  ela,  o  a  programas  de  entretenimento  desde  que  o  padrĂŁo  da  Globo  nĂŁo  existe  maisâ€?,  avalia.  Mas  ¿OKR %RQLQKR interpretou  o  pai  no  momento  em  que  foi  saiu  da  Globo,  em  2001.  Eterno  obcecado  pelo  nem  tudo  estĂĄ  perdido.  Como  ele  mesmo  pondera,  obrigado  a  demitir  a  atriz.  2 SDL DFRQVHOKRX R ÂżOKR “Faça  padrĂŁo  de  qualidade,  ele  ainda  costuma  prestar  a  Globo  segue  sendo  uma  grande  produtora.  FRP PXLWR FDULQKR SRLV HX Âż] FKRUDQGRâ€?. Exporta  novelas  e  programas  para  o  mundo  todo  e  Parece  estranho  ver  um  Boni  assim,  sensĂ­vel.  A  fama  de  atenção  a  detalhes  como  cabelo  e  luz.  SĂŁo  vĂ­cios  do  ofĂ­cio  que  o  deixam  inquieto  e  frustrado.  Na  a  prĂłpria  TV  Vanguarda  tem  seus  espaços  na  grade  durĂŁo,  que  construiu  no  passado,  percorreu  os  estĂşdios,  sua  passagem  por  Porto  Alegre,  em  palestra  na  de  programação  internacional. onde  impunha  seu  jeito  de  fazer.  Hoje,  o  executivo  Ê  uma  ADVB,  o  ex-­mandachuva  da  Rede  Globo  apontou  a  No  entanto,  a  fĂłrmula  para  salvar  o  padrĂŁo  SHVVRD PDLV WUDQTXLOD -XQWR FRP ÂżOKRV DGPLQLVWUD D decadĂŞncia  da  televisĂŁo  aberta  no  Brasil. de  qualidade  e  acabar  com  a  mesmice  que  o  79 9DQJXDUGD DÂżOLDGD da  Rede  Globo  no  interior  de  SĂŁo  Aos  76  anos,  Boni  jĂĄ  lutou  muito  por  audiĂŞncia,  incomoda  nĂŁo  Ê  tĂŁo  fĂĄcil  quanto  parece.  â€œA  Paulo. televisĂŁo  precisa  favorecer  mais  o  conteĂşdo  do  Determinado  a  seguir  escrevendo,  ele  antecipou  que  os  mas  considera  que  hĂĄ  limite  e  que  nem  tudo  deve  que  a  forma,  e  conteĂşdo  precisa  de  texto.  Mas  prĂłximos  capĂ­tulos  da  histĂłria  darĂŁo  origem  ao  â€œlivro  dois,  VHU DFHLWR QHVVD EXVFD Âł)XL FRQWUD D ÂżORVRÂżD GR vale  tudo  desde  o  dia  em  que  pisei  na  Globo.  NĂŁo  Ê  tem  que  ser  texto  de  alguĂŠm  de  fora,  sem  vĂ­ciosâ€?,  o  trĂŞs  e,  possivelmente,  retornar  à  televisĂŁo  para  começar  o  vale  tudo,  Ê  o  melhor  possĂ­velâ€?,  explica.  conclui. tudo  de  novoâ€?.

“O padrĂŁo da Globo nĂŁo existe maisâ€?

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na  prancheta

Batalha pelos centros

C

inco  projetos  ambiciosos  prometem  incrementar  as  atraçþes  de  cinema,  teatro,  dança,  exposiçþes  e  música  em  Porto  Alegre.  A  lista  inclui  a  nova  sede  da  Orquestra  Sinfônica  de  Porto  Alegre  (Ospa),  a  Cinemateca  Capitólio,  o  Auditório  Araújo  Vianna,  a  Caixa  Cultura  e  o  Multipalco,  do  Theatro  São  Pedro. Como  são  arrojados,  a  execução  Ê  demorada.  Para  passar  GD SURPHVVD j UHDOLGDGH D ¿QDOL]DomR GRV PDLV DJXDUGDGRV

centros  culturais  de  Porto  Alegre  deve  levar,  em  mÊdia,  oito  anos  cada  um.  A  lentidão  resulta  da  falta  de  recursos  e  de  entraves  burocråticos. 2 (GLWRULDO - IH] XP OHYDQWDPHQWR H FKHFRX R DQGDPHQWR dos  projetos.  As  boas  intençþes  são  bem-­vindas,  mas  para  tirar  as  ideias  do  papel  Ê  preciso  muito  mais.  A  ajuda  de  patrocinadores  privados  e  do  poder  público  Ê  fundamental  SDUD DJLOL]DU D FRQFOXVmR

Divulgação  Â

Texto:  Camila  Salton  e  Milena  Haas     Â

Ospa O  que  Ê:  a  Sala  Sinfônica  da  Ospa  deverå  contar  com  cinco  pavimentos  e  capacidade  de  1,5  mil  lugares.  O  prÊdio  terå  ainda  uma  sala  de  concertos,  Museu  da  Música,  salas  de  ensaios,  escola  de  música  e  a  sede  administrativa.

Início  do  projeto:  o  teatro  adequado  para  música  sinfônica  Ê  sonhado  desde  2008.  Depois  GH YiULDV GL¿FXOGDGHV R SURMHWR ganhou  uma  licitação.  As  obras  tiveram  início  no  dia  11  de  março  deste  ano.

Previsão  de  conclusão:  2014.

Projeto  da  nova  Sala  SinfĂ´nica  da  Ospa,  cuja  construção  iniciou-­se  em  março Foto:  Rodrigo  Conte  (divulgação)    Â

Multipalco O  que  Ê:   o  Multipalco  consiste  em  um  prĂŠdio  de  oito  andares  e  18.860  metros  quadrados.  Junto  com  o  Theatro  SĂŁo  Pedro,  deverĂĄ  formar  o  maior  complexo  cultural  da  AmĂŠrica  Latina,  ocupando  um  espaço  de  quase  20  mil  metros  quadrados  no  Centro  de  Porto  Alegre. Â

InĂ­cio  do  projeto:  a  ideia  de  construir  o  Multipalco  surgiu  em  1985.  A  liberação  de  10  lotes  para  a  implantação  do  projeto  levou  18  anos.  Em  2003,  iniciaram-­se  as  obras. PrevisĂŁo  de  conclusĂŁo:  setembro  de  2014,  caso  ocorra  a  complementação  necessĂĄria  de  recursos. Teatro  modelo  italiano,  um  dos  maiores  do  Multipalco,  segue  em  construção Â

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Foto:  VinĂ­cius  Velho      Â

Foto:  Eduarda  Alcaraz   Â

culturais da Capital Caixa  Cultural O  que  Ê:   o  projeto  prevê  a  reconstituição  da  fachada  original  do  antigo  Cine-­teatro  Imperial,  FRQVWUXtGR HP GLVSRQLELOL]DQGR um  teatro  com  capacidade  para  640  SHVVRDV

Início  do  projeto:   não  começou  ainda,  apesar  de  estar  pronto  QR SDSHO 2 YDORU WRWDO GR LQYHVWLPHQWR GHYH ¿FDU HP WRUQR GH 5 PLOK}HV VHQGR 5 PLOK}HV SDUD UHIRUPD do  prÊdio  e  o  restante  para  mobiliårio  H HTXLSDPHQWRV Previsão  de  conclusão:  QmR GLYXOJDGR

Cine  Capitólio O  que  Ê:  outro  antigo  cinema,  o  Capitólio  foi  restaurado  para  ser  um  centro  com  videoteca,  biblioteca  e  salas  PXOWLPtGLDV SDUD SURMHomR GH ¿OPHV Estes  espaços  tambÊm  poderão  receber  debates,  cursos  e  exposiçþes  sobre  a  KLVWyULD GR FLQHPD

Início  do  projeto:  o  prÊdio  começou  a  ser  restaurado  em  2004,  por  meio  de  um  convênio  entre  a  Fundação  Cinema  RS  (Fundacine)  e  a  Prefeitura  Municipal  de  Porto  Alegre,  com  apoio  da  Associação  dos  Amigos  GR &LQHPD &DSLWyOLR

Previsão  de  conclusão:  Imperial  recebeu  apenas  tela  de  proteção

ÂżQDO GH

CapitĂłlio  foi  restaurado,  mas  continua  fechado Foto:  Eduarda  Alcaraz   Â

Araújo  Vianna O  que  Ê:  o  projeto  prevê  a  colocação  de  cobertura,  ampliação  do  palco  para  270m²,  instalação  de  duas  telas  de  LED,  ar  condicionado  especial,  plateia  móvel,  SROWURQDV QRYDV H XP HOHYDGRU

Â

Início  do  projeto:  o  auditório  estå  fechado  desde  abril  de  2005  em  razão  GH SUREOHPDV QD HVWUXWXUD (P PDLR GH 2007,  a  produtora  Opus  venceu  a  licitação  para  execução  da  obra  e  em  troca  terå  direito  a  utilizar  o  espaço  durante  75%  do  DQR Previsão  de  conclusão:  6HJXQGR VHPHVWUH GH

Auditório  estå  sendo  reformado  para  receber  grandes  eventos

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esporte

Viver do MMA ĂŠ uma luta

Os  holofotes  do  octógono  garantem  interesse  pela  modalidade,  mas  Ê  difícil  arranjar  patrocínio  sem  estar  nas  competiçþes  mais  famosas

O Â

Brasil  Ê  o  paĂ­s  com  os  mais  reconhecidos  atletas  do  mundo  nas  artes  marciais  mistas,  o  MMA.  O  esporte  vive  uma  febre,  com  eventos  lotados  e  alta  audiĂŞncia  na  TV  -­  em  uma  edição  de  novembro  de  2011,  o  share  alcançado  pela  Globo  foi  de  43%,  superior  a  de  transmissĂľes  do  futebol  dominical.  Nem  por  isso,  viver  das  lutas  Ê  fĂĄcil,  como  prova  a  experiĂŞncia  dos  gaĂşchos  que  buscam  espaço  na  categoria. Praticante  das  artes  marciais  desde  os  oito  anos  de  idade,  Gustavo  Kuhn  iniciou  no  MMA  em  2009  e,  de  lĂĄ  pra  cĂĄ,  entrou  em  trĂŞs Â

competiçþes,  vencendo  todas.  Mesmo  assim,  Kuhn  percebeu  TXH D PDLRU GLÂż FXOGDGH GH todo  lutador  Ê  obter  patrocĂ­nio  VXÂż FLHQWH SDUD VH GHGLFDU exclusivamente  ao  esporte.  â€œNĂŁo  tem  como  sobreviver  apenas  do  MMA.  Ă‰  um  esporte  muito  complexo,  envolve  WUHLQRV HVSHFtÂż FRV´ FRQWD Kuhn  acredita  que  o  UFC,  sigla  do  Ultimate  Fighting  Championship,  a  organização  que  popularizou  o  octĂłgono  -­  o  ringue  em  que  sĂŁo  realizados  os  combates  -­  e  reĂşne  lutadores  SURÂż VVLRQDLV ainda  Ê  um  sonho  distante, Â

mas  se  inspira  na  força  de  vontade  dos  brasileiros. Thiago  Minu  Meller  (leia  R SHUÂż O DEDL[R ,  32  anos,  o  gaĂşcho  de  maior  destaque  no  MMA,  tem  a  mesma  opiniĂŁo.  Com  a  rotina  de  treinos  intensiva,  depende  do  salĂĄrio  de  sargento  para  se  sustentar.  â€œSe  o  ExĂŠrcito  me  pedisse,  hoje,  para  eu  parar  de  lutar,  eu  pararia,  pois  Ê  a  minha  principal  fonte  de  UHQGD´ explica.

Texto:  Eduardo  Bertuol          Fotos:  Eduarda  Alcaraz

UFC encanta o pĂşblico, mas ofusca os menores O  UFC,  mais  cĂŠlebre  competição  do  mundo  das  lutas,  pode  ser  visto  com  dois  enfoques  diferentes.  Se  a  popularidade  do  MMA  foi  multiplicada  depois  dos  investimentos  na  glamourização  do  octĂłgono,  a  supervalorização  do  campeonato  faz  parecer  que  competiçþes  perifĂŠricas  nĂŁo  tĂŞm  valor.  â€œMonopĂłlio  sempre  Ê  ruim,  mas  sĂŁo  duas  visĂľes  diferentes.  A  marca  UFC  cresceu  muito  e  nĂŁo  temos  investimentos  em  patrocĂ­nios  que  fomentem  o  esporte  como  um  todo,  hĂĄ  DSHQDV XPD HPSUHVD ID]HQGR LVVR´ DYDOLD 6LOYLR /XtV 5LFNHV VyFLR GD DFDGHPLD &RPEDW 5LGHU D SULPHLUD GH 3RUWR $OHJUH especializada  no  esporte. 2 00$ DLQGD QmR KDYLD HVWRXUDGR TXDQGR 5LFNHV H R PHVWUH Fabiano  Gonçalves  Montes  fundaram  o  empreendimento.  A  ideia  inicial  era  formar  um  ambiente  privado,  onde  o  prĂłprio  empresĂĄrio  pudesse  treinar  boxe.  PorĂŠm  a  estrutura  acabou  ¿ FDQGR DWUDHQWH SDUD RXWURV LQWHUHVVDGRV Âł&XLGDPRV WDQWR GRV GHWDOKHV TXH HX Âż TXHL FRP FL~PH GH DEULU FRPHUFLDOPHQWH R ORFDO (QWmR VHOHFLRQDPRV XP S~EOLFR HVSHFtÂż FR H FRQKHFLGR SDUD WUHLQDU´ H[SOLFD 5LFNHV Enquanto  a  academia  de  estilo  underground  inspirada  nos  anos  1950  ganhava  reconhecimento,  o  empresĂĄrio  tambĂŠm  percebia  o  crescimento  do  MMA  no  paĂ­s.  Assim,  começou  a  WUDQVIRUPDomR GD &RPEDW 5LGHU HP XP OHJtWLPR FOXEH GH OXWD FRP GLUHLWR D ULQJXH RÂż FLDO GH ER[H RQGH FDPSHRQDWRV SRGHP ser  realizados.  â€œCom  o  expansĂŁo  do  MMA,  o  Fabiano  trouxe  atletas  para  treinar  na  nossa  academia.  Desta  forma,  outros  competidores  começaram  a  aderir  aos  nossos  treinos  e  hoje  WHPRV XPD HTXLSH IRUPDGD SRU VHWH DWOHWDV´ GL] R HPSUHViULR ([ OXWDGRU GH ER[H PHVWUH )DELDQR Âł%R[HU´ *RQoDOYHV começou  a  dar  aulas  e,  hĂĄ  mais  de  10  anos,  fez  das  artes  marciais  mistas  o  rumo  preferencial Â

de  sua  carreira.  Hoje,  o  mestre  vĂŞ  o  MMA  como  uma  nova  alavanca  para  as  artes  marciais  e  acredita  que  o  crescimento  deste  tipo  de  combate  vai  ajudar  na  busca  por  todos  estilos.  â€œO  00$ YHLR SDUD Âż FDU SRLV DV GLIHUHQWHV YDOrQFLDV HQFDQWDP R telespectador.  Eu  gosto  do  boxe,  mas  tenho  que  me  render  à  PRGHUQLGDGH GR 00$ SRLV HOH QmR p XPD OXWD HVSHFtÂż FD PDV PLVWXUD WRGDV´ GHVWDFD R PHVWUH

SHUÂż O

Thiago  Minu  segue  tentando  entrar  no  UFC.  Em  2011,  esteve  perto

Nome:  Thiago  Meller ASHOLGR Minu NDVFLPHQWR  5/9/1979 LRFDO  Independência  (RS) AOWXUD  1,78m Peso:  73kg ETXLSH  Combat  Rider/MFT CDWHJRULD Peso  Leve

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CDUWHO 18  vitĂłrias,  5  derrotas,  nenhum  empate VLWyULDV 5  por  nocaute/nocaute  tĂŠcnico,  12  por  submissĂŁo,  1  por  decisĂŁo DHUURWDV  1  por  submissĂŁo,  4  por  decisĂŁo EVWLORV H JUDGXDo}HV  grau  preto  em  Muay  Thai,  faixa  preta  de  Jiu-­Jitsu  e  de  KaratĂŞ PULQFLSDLV WtWXORV Impact  Fighting  Championship  (AustrĂĄlia),  Israel  Fighting  Championship,  Shooto  Brazil  9 Â


Vencedor  de  três  competiçþes,  Gustavo  Kuhn  (D)   reclama  da  falta  de  patrocínio

De IndependĂŞncia para Las Vegas

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O  herói  Ê  encurralado  em  um  beco  sem  saída.  Ele  se  vê  obrigado  a  lutar  contra  seus  inimigos.  Em  uma  batalha  cheia  de  golpes  fascinantes,  o  mocinho  vence.  Esta  cena  pode  ser  vista  em  qualquer  ¿ OPH GH DomR estrelado  por  atores  como  Jean-­Claude  Van  Damme.  Foi  inspirado  em  combates  assim  que  Thiago  Meller,  ainda  menino  do  município  de  Independência,  no  noroeste  do  Rio  Grande  do  Sul,  despertou  seu  interesse  pelas  artes  marciais. Em  um  país  onde  o  futebol  Ê  o  esporte  Assista  ao  vídeo  sobre  PDLV DFODPDGR SHOD SRSXODomR R JDURWR o  MMA  em  Porto  Alegre  de  14  anos  escolheu  treinar  karatê.  Como  no  site  do  Editorial  J: HP VXD FLGDGH QmR KDYLD DFDGHPLD SDUD realizar  a  atividade,  Thiago  tinha  que  http://bit.ly/capamaio treinar  no  município  vizinho,  Três  de  ou Maio.  Com  o  passar  dos  anos,  o  gosto  por  http://www.pucrs.br/ outros  estilos  de  lutas  marciais  aumentou.  famecos/editorialj Em  1998,  ele  FRPHoRX D WUHLQDU MXG{ H

kickboxing.  Em  2000,  quando  estava  na  Escola  de  Sargentos  das  Armas  (ESA),  YLURX DWOHWD GH MXG{ GR ([pUFLWR 8P DQR depois  foi  morar  em  Porto  Alegre,  onde  conheceu  o  muay  tKDL H FRPHoRX o  curso  GH 'LUHLWR QD 38&56 Foi  dividindo  a  rotina  entre  o  quartel,  RV WUHLQRV H RV HVWXGRV TXH R HQWmR VDUJHQWR 7KLDJR 0HOOHU GR ž %DWDOKmR GH &RPXQLFDo}HV passou  a  lutar  Miu  Mitsu  em  2003.  Por  ser  do  noroeste  do  estado,  virou *DOR GDV 0LVV}HV e,  posteriormente,  Minu HP UHIHUrQFLD DR DQWLJR IULJRUtÂż FR de  frangos  de  mesmo  nome. Com  o  treinamento  do  mestre  Fabiano  %R[HU *RQoDOYHV 0HOOHU DOFDQoRX dez  vitĂłrias  por  nocaute  nas  lutas  que  disputou.  Percebendo  o  talento,  Fabiano  convidou  o  atleta  para  ingressar  no  MMA.  Na  sua  primeira  luta,  em  2003,  foram  necessĂĄrios  apenas  dois  rounds  para Â

vencer  o  adversĂĄrio,  Atila  Martins.  No  combate,  Thiago  Minu  aplicou  o  que  viria  a  ser  sua  especialidade,  a  â€œguilhotinaâ€?,  golpe  imobilizador. De  2003  atĂŠ  2012,  o  cartel  de  Minu UHJLVWUR GH VXDV FRPSHWLo}HV  ¿ FRX UHFKHDGR GH YLWyULDV.  Foram  18:  FLQFR SRU QRFDXWH SRU VXEPLVVmR (nove  delas  aplicando  a  guilhotina)  e  XPD SRU GHFLVmR teve  apenas  cinco  derrotas.  Depois  de  conseguir  seis  vitĂłrias  seguidas,  Minu  estava  bem  cotado SDUD GLVSXWDU R 8)&  PorĂŠm,  durante  o SHUtRGR GH QHJRFLDo}HV,  surgiram  oportunidades  de  lutar  em  dois  campeonatos  internacionais.  Azar:  Minu  saiu  derrotado  das  duas,  e  o  interesse  do  8)& HQIUDTXHFHu.  Ainda  assim,  o  sonho  persiste.  Luta  apĂłs  luta,  Minu  espera  vencer  e  convencer  de  que  Ê  capaz  de  competir  em  alto  nĂ­vel.

os  três  passos  para  chegar  ao  UFC Passo  1

Passo  2

Passo  3

Construir  um  bom  cartel

Assinar  com  empresĂĄrio  â€œquenteâ€?

Ter  triunfos  consecutivos

O  cartel  do  atleta  (registro  das  competiçþes  em  que  aparecem  os  resultados  das  lutas)  precisa  ser  repleto  de  vitórias  e  ter  pelo  menos  oito  lutas.

Nada  melhor  do  que  um  bom  negociador  que  saiba  expor  para  a  mídia  as  habilidades  de  seu  atleta,  ainda  mais  se  ele  tiver  contato  direto  com  alguns  dos  sócios  do  Ultimate  Fighter.

MAIO DE 2012 / PĂ GINA 7

O  UFC  não  contrata  lutadores  que  tenham  em  seu  cartel  derrota  nas  últimas  competiçþes.  Os  competidores  sempre  vêm  de  vitórias  consecutivas.


colaborativismo

Um passo à frente do Grupos  porto-­alegrenses  fazem  melhorias  urbanísticas  e  sociais  sem  participação  dos  governos,  gerando  questionamentos Texto:  Felipe  Martini              Fotos:  Eduarda  Alcaraz

C

abeças  jovens,  ideias  criativas  e  uma  certeza:  pensamento  global  com  ação  local  para  melhorar  a  cidade.  Ă‰  isto  que  une  os  grupos   Shoot  the  Shit,  Transvenção  Lab,  Poa  Como  Vamos  e  Engage,  trĂŞs  movimentos  e  uma  empresa  que  querem  mudar  Porto  Alegre,  promovendo  engajamento  civil  e  cidadania  com  projetos  que  buscam  o  aprofundamento  da  democracia. A  Shoot  the  Shit  nasceu  para  que  Gabriel  Gomes,  Luciano  Braga  e  Giovani  Groff  tirassem  ideias  legais  da  gaveta  para  colocĂĄ-­las  na  rua.  â€œCom  o  passar  do  tempo,  vimos  como  as  pessoas  abraçavam  os  projetos  e  delineamos  o  nosso  conceito,  que  Ê  transformar  Porto  Alegre  na  melhor  cidade  do  Brasilâ€?,  almeja  Gomes. Os  trĂŞs  jovens  publicitĂĄrios  criaram  açþes  urbanas  que  chamaram  a  atenção  da  população  e  do  poder  pĂşblico,  como  â€œPorto  Alegre,  o  paraĂ­so  do  Golfeâ€?,  um  vĂ­deo  que  mostrou  os  inĂşmeros  buracos  de  rua  da  Capital,  e  â€œQue  ônibus  passa  por  aqui?â€?,  ação  para  sinalizar  as  paradas  de  ônibus  atravĂŠs  de  adesivos.  $ ÂżORVRÂżD GR JUXSR p VLPSOHV.  â€œEu  nĂŁo  quero  derrubar  um  presidente,  apenas  quero  melhorar  a  minha  vida,  o  meu  bairro,  a  minha  cidadeâ€?,  explica  Gabriel  Gomes.  O  grupo  procura  manter  uma  reputação  associada  à  ação  rĂĄpida  e  constante.  â€œQuando  pensamos  numa  ideia,  tentamos  colocĂĄ-­la  o  mais  rĂĄpido  possĂ­vel  na  rua.  NĂłs  utilizamos  essa  tendĂŞncia  [da  colaboração]  para  viabilizar  algumas  ideias,  mas  nem  todos  nossos  os  nossos  projetos  sĂŁo  como  o  â€˜Que  ônibus  passa  aqui?’,  que  dependia  de  pessoas  para  dar  certoâ€?,  pontua  Gomes. Daniel  Caminha  Ê  uma  das  cabeças  do  NĂ´made  IND,  um  braço  do  EstĂşdio  NĂ´made  que  possibilita  projetos  autorais  em  que  o  pĂşblico  Ê  convidado  a  criar  colaborativamente  um  novo  tipo  de  relação  com  a  cidade.  â€œNosso  primeiro  projeto  experimental  foi  a  Estante  PĂşblica,  que  transformava  paradas  de  ônibus  em  estantes  de  livros.  Fomos  surpreendidos,  em  2010,  ganhando  o  prĂŞmio  da  Funarte  de  incentivo  à  criação  e  artes  visuais,  o  que  nos  permitiu  ampliar  o  projetoâ€?,  conta  Caminha. O  projeto  derivou  para  o  Transvenção  Lab,  um  espaço  para  encubar  projetos  de  inovação  social.  Este  tipo  de  conceito  Ê  um  norte  da  NĂ´made  IND.  â€œA  nossa  causa  Ê  o  trans,  unir  pessoas  de  åreas  heterogĂŞneas  para  realizar  projetos  de Â

Recente  ação  do  Shoot  the  Shit  procurou  organizar  o  tråfego  na  passarela  da  Ipiranga

melhorias  e  benefĂ­cio  social  para  a  cidadeâ€?,  destaca  Caminha.  Os  dois  anos  que  morou  em  Barcelona  inspiraram  Caminha.  â€œAprendi  que  a  cultura  Ê  maior  que  um  espetĂĄculo  de  dança  ou  um  show  de  mĂşsica,  ela  Ê  uma  ferramenta  de  inovaçãoâ€?,  argumenta. A  Engage,  que  desenvolve  softwares,  denomina-­se  uma  empresa  2.5.  â€œIsso  estĂĄ  ligado  ao  empreendedorismo  social.  A  atividade  da  empresa  Ê  ter  um  impacto  de  melhoria  socialâ€?,  explana  TomĂĄs  de  Lara,  um  dos  fundadores.  O  site  Catarse  foi  um  dos  produtos  criados  pela  empresa  e  se  baseia  em  crowdsourcing,  processo  que  trabalha  com ÂżQDQFLDPHQWR

colaborativo.  â€œO  Catarse  Ê  um  exemplo  de  empoderamento   social  muito  forte  porque  VH FRQVHJXH ÂżQDQFLDU UDSLGDPHQWH SURMHWRV criativos  atravĂŠs  de  uma  economia  afetivaâ€?,  explica  Lara.  O  empreendedor  vĂŞ  Porto  Alegre  como  uma  cidade  politizada  e  engajada.  Isso  contribuiu  para  o  surgimento  desses  coletivos  urbanos.  â€œPodemos  ver  esses  trĂŞs  movimentos  muito  bacanas  na  cidade,  cada  um  em  sua  instância:  o  Shoot  the  Shit  vai  lĂĄ  e  faz  a  Transvenção  Lab,  que  Ê  uma  prototipagem  de  projetos  e  açþes,  e  o  Poa  Como  Vamos,  que  agrega  mais  discussĂľes  teĂłricas,  polĂ­ticas  e  ¿ORVyÂżFDV´ avalia  TomĂĄs.

Gabriel  Gomes  (E)  e  Luciano  Braga  (D),  da  Shoot  the  Shit,  e  Tomås  de  Lara  (C),  da  Engage,  tambÊm  participam  do  movimento  Poa  Como  Vamos

MAIO DE 2012 / PĂ GINA 8


poder público sobre  a  fórmula  tradicional  da  democracia  representativa

A relação com a prefeitura Os  movimentos  defendem  a  ação  direta  e  conjunta  dos  cidadĂŁos  sem  a  representatividade  dos  polĂ­ticos  e  apoio  do  Estado.  Quanto  ao  papel  do  poder  pĂşblico  nesta  nova  forma  de  cidadania,  os  grupos  diferem. “Acho  que  o  governo  estĂĄ  aberto.  Eles  tĂŞm  muito  interesse  no  que  a  gente  faz,  jĂĄ  tivemos  diversas  reuniĂľes  com  o  pessoal  da  prefeitura  e  da  Empresa  Porto-­Alegrense  de  Transporte  Coletivo  (EPTC).  O  principal  problema  Ê  a  burocracia,  a  necessidade  de  aprovação,  verbas  limitadas,  Ê  um  sistema  complicadoâ€?,  analisa  Gabriel  Gomes.  Apesar  de  dialogar  com  a  prefeitura,  o  Shoot  the  Shit  opta  por  nĂŁo  apresentar  ideias  ao  governo  municipal.  â€œA  gente  prefere  fazer,  tomar  a  porrada  e  depois  YHU QR TXH YDL GDU 6H D JHQWH ÂżFDU pedindo  permissĂŁo  para  tudo,  nĂŁo  faremos  nadaâ€?,  pondera. A  falta  de  planejamento  estratĂŠgico  Ê  o  principal  empecilho  para  a  realização  de  projetos,  avalia  Daniel  Caminha.  â€œA  cidade  estĂĄ  mais  preparada  para  receber  esse  tipo  de  projeto  do  que  o  prĂłprio  poder  pĂşblicoâ€?,  sustenta.  Segundo  o  empreendedor,  os  movimentos  colaborativistas  acabam  sem  um  aliado  dentro  do  governo  que  possa  planejar  para  que  tudo  seja  lançado  e Â

mapeado.  â€œNĂŁo  sou  pessimista,  apenas  realista.  No  caso  da  prefeitura  de  Porto  Alegre,  falta  incentivo  para  criação  de  espaços  de  produção  e  difusĂŁoâ€?,  critica  o  idealizador  do  Transvenção  Lab. TomĂĄs  de  Lara  compartilha  da  mesma  ideia  e  acredita  que  a  prefeitura  ainda  Ê  muito  conservadora  e  fechada.  Para  ele,  o  poder  pĂşblico  ainda  nĂŁo  se  deu  conta  da  importância  dos  novos  movimentos  da  sociedade  civil.  â€œVivemos  em  uma  democracia,  o  governo  nĂŁo  Ê  uma  estrutura  hierĂĄrquica  fechada,  Ê  constituĂ­do  por  pessoasâ€?,  destaca  o  empresĂĄrio.  A  prefeitura  nĂŁo  discorda,  a  julgar  pela  opiniĂŁo  do  diretor  da  Secretaria  Municipal  de  Coordenação  PolĂ­tica  e  Governança  Local,  PlĂ­nio  Zalewski  Vargas.  â€œEssas  iniciativas  dizem  que  as  instituiçþes  da  democracia  devem  ser  reformuladas.  O  poder  pĂşblico  precisa  trabalhar  de  uma  forma  horizontal,  ouvir  mais  a  população,  nĂŁo  sĂł  nas  assembleias,  mas  o  que  rola  na  rede  tambĂŠmâ€?,  admite.  Ainda  assim,  Vargas  observa  que  hĂĄ  limites  para  as  intervençþes  dos  grupos.  â€œO  poder  pĂşblico  nĂŁo  pode  permitir,  por  exemplo,  que  se  vĂĄ  à  parada  de  ônibus  e  a  entorte,  se  FRORTXH Ă€RUHV SRUTXH isso  descaracteriza  aquele  mobiliĂĄrio  Daniel  Caminha,  um  dos  idealizadores  da  Estante  PĂşblica pĂşblicoâ€?,  ressalva.

Precursora, Agapan mandava cartas aos associados A  Associação  GaĂşcha  de  Proteção  ao  Ambiente  Natural  (Agapan)  Ê  pioneira  na  defesa  do  ambiente  e  exemplo  de  colaborativismo  praticado  bem  antes  da  internet.  A  associação  surgiu  em  1971,  quando,  no  Brasil,  â€œmeio  ambienteâ€?  e  â€œecologiaâ€?  eram  termos   restritos  aos  dicionĂĄrios.  Professores  universitĂĄrios  e  profissionais  preocupados  com  a  natureza  criaram  a  entidade. Na  Êpoca,  a  Agapan  era  constantemente  procurada  pelos  jornais  para  publicação  de  suas  ideias,  jĂĄ  que  o  regime  militar  permitia,  explica  o  atual  presidente,  Francisco  Milanez.  A  comunicação  entre  os  sĂłcios  e  com  outras  associaçþes  surgidas  posteriormente  era  feita  por  cartas,  jĂĄ  que  poucos  tinham  telefone. A  iniciativa  de  defender  a  natureza  se  espalhou  pelo  Estado  em  pouco  tempo,  conta  Milanez.  Em  1975,  os  ambientalistas  criticavam  a  poda  excessiva  das  årvores  em  Porto  Alegre,  promovida  pela  prefeitura  no  inverno.  No  verĂŁo  daquele  ano,  o  entĂŁo  prefeito,  Telmo  Thompson  Flores,  mandou  cortar  årvores  para  construção  de  um  viaduto  perto  do  campus  central  da  Universidade  Federal  do  Rio  Grande  do  Sul  (UFRGS),  o  que  ocorreu  em  dia  de  matrĂ­culas.  Alunos  e  integrantes  da  Agapan  impediram  o  corte,  subindo  nas  årvores.  Assim  que  desceram,  os  protestantes  foram  levados  e  fichados  no  Departamento  de  Ordem  PolĂ­tica  e  Social  (DOPS)  e  enquadrados  como  â€œperigososâ€?.  Dias  depois,  o  reitor  da  UFRGS  negociou  com  o  prefeito  para  poupar  as  plantas.   A  manifestação  foi  destaque  na  imprensa  internacional,  e  a  adesĂŁo  à s  reuniĂľes  da  associação  mudou Â

bastante.  â€œEram  de  seis  a  dez  pessoas.  Depois,  começaram  a  ficar  cheiasâ€?,  recorda  Milanez.  Foi  um  trabalho  que  começou  no  boca  a  boca  e  que,  agora,  tambĂŠm  se  adapta  à  vida  online.

Referência mundial A  entidade  se  tornou  referência  mundial  em  algumas  åreas,  como  na  luta  contra  o  uso  de  celulose.  Começou,  na  dÊcada  de  1970,  com  a  denúncia  da  poluição  da  empresa  Borregaard,  instalada  no  município  de  Guaíba.  O  trabalho  voluntårio  dos  ambientalistas  derrubou  estudos  milionårios  da  indústria,  provocando  o  fechamento  da  empresa  em  1974  -­  a  planta  foi  posteriormente  reaberta  como  outra  produtora  de  celulose. Hoje  o  colaborativismo  Ê  um  modelo  com  forte  apelo  no  equilíbrio  das  relaçþes  sociais.  Esse  tipo  de  movimento  educativo,  agora,  ganha  mais  força  nas  redes  sociais  e  traz  novos  adeptos  aos  grupos  existentes.  O  secretårio  estadual  da  Economia  Solidåria  e  Apoio  à  Micro  e  Pequena  Empresa,  Maurício  Dziedricki,  exemplifica  a  mobilização  social  citando  tambÊm  o  Orçamento  Participativo,  sistema  de  gestão  implantado  nas  administraçþes  do  PT  em  Porto  Alegre  nas  dÊcadas  de  1980  e  1990,  que  se  caracteriza  pela  participação  da  população,  organizada  em  bairros,  na  definição  das  prioridades  municipais. MAIO DE 2012 / Pà GINA 9

Conheça  grupos  internacionais  que  GHVD¿DP R SRGHU público  com  suas  intervençþes:

Boa  Mistura (Espanha) Os  jovens  espanhĂłis  ID]HP JUDÂżWHV relacionados  à  realidade  social  do  local  escolhido. Â

No  projeto  â€œLuz  nas  Vielasâ€?,  na  Vila  Brasilândia  (SP),  o  Boa  Mistura  contou  com  a  participação  dos  moradores  ao  pintar  palavras  de  inspiração  nas  ruas  (fotos  acima  e  abaixo). “Quando  trabalhamos  na  rua,  de  maneira  ilegal,  a  lei  nos  persegue  e  castiga,  por  isso,  nossa  relação  com  o  governo  Ê  um  pouco  ambĂ­gua.  Algumas  vezes  ele  te  apoia,  outras  te  condenaâ€?,  diz  Pablo  Purone,  um  dos  integrantes  do  grupo.

Get  Up!  (AustrĂĄlia) Em  suas  comunicaçþes,  o  movimento  alegamais  membros  que  todos  os  partidos  polĂ­ticos  da  AustrĂĄlia  juntos.  Suas  açþes  visam  facilitar  a  comunicação  entre  sociedade  e  governo.  As  campanhas  costumam  fazer  a  defesa  do  ambiente,  dos  direitos  humanos,  dos  animais  e  de  reformas  polĂ­ticas  e  sociais. Â


Existem diversos tipos de armas não letais. Os mais comuns são: gás lacrimogênio, spray de pimenta, bala de borracha e Taser. O uso dessas armas tem como objetivo obter o menor risco à saúde das pessoas.

segurança

A pistola em questão Depois de provocar mortes na Austrália e no Brasil, uso da arma não letal Taser gera debate Texto: Allan Kuwer Foto: Eduarda Alcaraz

A pistola Taser dispara uma descarga elétrica, que resulta em uma pane no sistema nervoso chamada de incapacitação neuromuscular. Utiliza-­se a arma em casos de suicídio, sequestro com refém ou em outras situações.

O spray de pimenta, empregado para dispersar tumultos, foi utilizado recentemente na partida entre Grêmio e Cruzeiro-­POA no Gauchão de 2012, o que resultou em polêmica.

O gás lacrimogêneo é usado para dispersar multidões ou em operações de resgate. Os efeitos do contato com o gás são reações involuntárias de lacrimação com uma forte sensação de queimadura. As balas de borracha são utilizadas para conter rebeliões ou manifestações violentas. A diferença para as armas de fogo é que as balas não perfuram a pele.

A

Demonstração do uso da arma Taser pelo professor da academia de Polícia Militar Cristiano Moraes

pistola Taser se tornou vilã, depois da morte de dois brasileiros. Apesar das fatalidades, é considerada arma não letal que imobiliza a pessoa por meio de choque elétrico. As mortes provocadas pelo uso da pistola Taser colocaram em discussão a validade do emprego deste equipamento. Em 18 de março, Roberto Laudisio Curti faleceu, em Sidney (Austrália), após receber disparos da arma elétrica. De acordo com a polícia daquele país, ele teria roubado um pacote de biscoitos em um supermercado. Uma semana depois, no dia 25 de março, em Florianópolis, Carlos Barbosa Meldola morreu ao ser atingido por três disparos da Taser. Na ocasião, ele estava na beira de uma janela tentando o suicídio quando a polícia decidiu intervir. O boletim de ocorrência registra que os agentes tentaram reanimá-­lo, mas não conseguiram.

O capitão Moraes acredita que é precipitado opinar sobre as mortes ocorridas. “As pessoas estão tirando conclusões sem ter conhecimento do laudo da necropsia”, avalia. Ele critica o conceito da expressão “armas não letais”. “Existe, sim, a possibilidade de a arma causar a morte, mas é necessária uma boa investigação que comprove. Todos equipamentos, sejam armas de choque ou dispositivos eletrônicos, nunca terão risco zero quando usadas contra alguma pessoa.” Segundo o capitão, a maioria das mortes ocasionadas com disparos da pistola está ligado ao consumo de alguma droga como cocaína, LSD ou crack. O problema p LGHQWL¿FDU VH, durante uma ação policial, alguma substância química foi consumida. “Nenhuma ocorrência Banalização de instrumento é igual a outra. Normalmente, quando os policiais chegam, a situação está fora de controle e, geralmente, A Taser é pistola privativa de forças de segurança, sendo utilizada existe um confronto com alguém que está armado”, pela Brigada Militar gaúcha e pela Guarda Municipal de Porto Alegre, pondera. além de algumas empresas privadas que têm autorização para o porte do Mesmo diante dos últimos casos, Moraes não acredita equipamento. Alguns sites de comércio eletrônico vendem as armas e spray em um suposto enfraquecimento do equipamento. de pimenta. Como a legislação brasileira proíbe essa venda, a procura por “Acredito que essa tendência mundial de uso vai este tipo de arma é maior em países vizinhos, onde a lei é mais branda. continuar, mas deve-­se ressaltar que o equipamento é O capitão Cristiano Moraes, professor na academia de Polícia Militar, uma ferramenta de trabalho e está inserido dentro de um observa que “assim como temos fuzis e granadas sendo utilizadas por contexto.” delinquentes, vamos encontrar pessoas comprando esses equipamentos”. Todos os policiais que utilizam a Taser passaram por um processo de Origem da arma capacitação. O curso consiste em 40 horas de aula dividida em quatro módulos. O mais longo, de 25 horas, trata das técnicas e práticas O nome da pistola decorre do fabricante, a Taser Industries, operacionais. Os outros três módulos são de cinco horas cada um e dos Estados Unidos. Esse dispositivo eletrônico de contenção abordam direitos humanos, legislação aplicada à função e a prestação de é distribuido para vários países pela Taser Internacional. pronto-­socorro. MAIO DE 2012 / PÁGINA 10


sustentabilidade Como surgiu

A  Univens  Ê  responsåvel  pela  confecção  de  roupas  e  sacolas

Costura solidĂĄria

Projeto  criado  em  Porto  Alegre  envolve  mais  de  700  pessoas  na  confecção  de  roupas  sustentåveis

D Â

Produtos  da  marca  Justa  Trama  circulam  por  vårios  estados

Univens produz sacola ecolĂłgica Atualmente,  28  mulheres  trabalham  na  Univens,  em  Porto  Alegre.  Destas  apenas  cinco  sĂŁo  do  grupo  original:  Isaurina  Alzira  da  Silva,  Maria  Helena  Tollens,  Edilia  Tejada,  Maria  Aparecida  Conte  Brum  e  Nelsa  Nespolo.    ,VDXULQD TXH Mi IRL WHVRXUHLUD LQWHJUDQWH GR FRQVHOKR ÂżVFDO H YLFH diretora  da  Cooperativa  Justa  Trama,  acreditava  que  o  grupo  deveria  contar,  no  mĂĄximo,  com  30  pessoas.  O  crescimento  do  serviço  a  fez  mudar  de  ideia.  â€œO  que  nĂłs  precisamos  mesmo,  e  nĂŁo  tem,  sĂŁo  mais  costureiras.  Quando  o  trabalho  aumentou,  o  grupo  diminuiuâ€?,  conta.   A  sacola  ecolĂłgica  Ê  o  produto  mais  fabricado.  Maria  Helena,  diante  da  demanda,  resolveu  levar  trabalho  para  casa.  â€œOntem  à  QRLWH Âż] $LQGD IDOWDP XPDV ´ UHODWD Âł(X HUD GRQD GH FDVD FXLGDYD GRV ÂżOKRV 4XDQGR ÂżTXHL VDEHQGR GD FRRSHUDWLYD FRUUL SDUD cĂĄ.  Gosto  de  costurar.  Aprendi  vendo  minha  mĂŁeâ€?. A  simplicidade  da  fachada  da  Univens  na  rua  Paulo  Affonso  FeijĂł,  501,  no  bairro  Sarandi,  esconde  um  ambiente  colorido.  AlĂŠm  da  grande  quantidade  de  tecidos  pendurados  e  embrulhados,  hĂĄ  moldes  de  corte  que  enchem  os  olhos.  O  pequeno  prĂŠdio  tambĂŠm  nĂŁo  indica  a  dimensĂŁo  do   projeto,  que  envolve  uma  cadeia  de  mais  de  700  produtores  de  todo  o  paĂ­s.  MAIO DE 2012 / PĂ GINA 11

O  trabalho  tambÊm  era  realizado  em  casa,  pois  o  espaço  no  salão  da  paróquia  permitia  apenas  fazer  o  corte  dos  tecidos.  Assim,  surgiu  a  Cooperativa  de  Costureiras  Unidas  Venceremos  (Univens).  Com  a  ajuda  ¿QDQFHLUD GH GXDV organizaçþes  não  governamentais  (ONGs)  espanholas,  foi  construída  a  sede.

Texto:  Cândida  Schaedler  e  JanaĂ­na  Marques         Fotos:  Luana  Nicolaiewsky         Â

istribuição  justa  de  renda  e  sustentabilidade  sĂŁo  os  principais  conceitos  de  um  projeto  gaĂşcho  que  ¿FRX HQWUH RV ÂżQDOLVWDV  do  Projeto  Generosidade  2012,  promovido  pela  Editora  Globo.  Com  base  na  economia  solidĂĄria,  forma  de  produção  focada  no  indivĂ­duo  e  nĂŁo  no  capital,  a  Cooperativa  Central  Justa  Trama,  que  surgiu  em  2005,  em  Porto  Alegre  e  se  expandiu  para  outros  estados  do  paĂ­s,  tambĂŠm  se  guia  pelas  normas  do  comĂŠrcio  justo. A  rede  de  produção  das  roupas  e  sacolas  começa  no  CearĂĄ,  com  o  plantio  de  algodĂŁo  orgânico,  cultivado  de  forma  consorciada  por  agricultores  ligados  à  Associação  de  Desenvolvimento  Educacional  e  Cultural  de  TauĂĄ  (Adec).  Depois  de  colhido,  o  algodĂŁo  segue  para  a  Cooperativa  de  Produção  TĂŞxtil  de  ParĂĄ  de  Minas  (CoopertĂŞxtil),  em  Minas  Gerais,  onde  YLUD ÂżR H WHFLGR Na  sequĂŞncia,  o  material  Ê  enviado  à  Cooperativa  Fio  Nobre,  em  Santa  Catarina,  onde  sĂŁo  fabricadas  peças  artesanais,  e  à  Cooperativa  de  Costureiras  Unidas  Venceremos  (Univens),  em  Porto  Alegre,  para  confecção  de  roupas  em  sĂŠrie.  Em  RondĂ´nia,  na  Cooperativa  AçaĂ­,  sĂŁo  coletadas  sementes  que  viram  botĂľes,  colares  e  acessĂłrios.  No  presĂ­dio  feminino   da  cidade  de  Porto  Velho  (RO),  30  detentas  montam  as  biojoias,  comercializadas  no  paĂ­s  com  o  selo  da  Justa  Trama. Devido  à s  enchentes  e  secas  que  eventualmente  prejudicam  a  produção  no  CearĂĄ,  a  Associação  dos  Produtores  Orgânicos  do  Mato  Grosso  do  Sul  (Apoms)  associou-­se,  no  ano  passado,  à  Justa  Trama,  com  o  intuito  de  garantir  o  recebimento  do  algodĂŁo  todos  os  anos.  As  sementes  para  o  plantio  foram  fornecidas  pela  prĂłpria  cooperativa  Justa  Trama  e  cultivadas  por  famĂ­lias  que  tĂŞm  apenas  o  custo  de  manutenção  da  lavoura. Sem  o  atravessador, TXH UHYHQGH D PHUFDGRULD H ÂżFD FRP uma  parte  do  lucro,  Ê  possĂ­vel  agregar  valor  a  todos  os  elos  de  produção.  A  Adec,  por  exemplo,  envia  desde  o  CearĂĄ  à  Justa  Trama  80%  do  algodĂŁo  cultivado  por  seus  associados,  o  que  garante  a  renda  dos  agricultores,  pois  nĂŁo  precisam  se  preocupar  com  a  competitividade  do  mercado. Utilizando  as  sobras  de  tecidos,  a  Cooperativa  de  Artesanato  (Inovarte),  de  Porto  Alegre,  produz  brinquedos  pedagĂłgicos  e  bonecas  de  pano.  Todos  os  produtos   sĂŁo  vendidos  no  site  da  Justa  Trama,  em  feiras  solidĂĄrias  e  em  duas  lojas  da  Capital  gaĂşcha.  TambĂŠm  sĂŁo  aceitas  encomendas  corporativas,  caso  alguma  empresa  queira  vincular  seu  nome  ao  empreendimento. Â

O  projeto  Justa  Trama  teve  inĂ­cio  como  uma  simples  cooperativa,  em  Porto  Alegre,  no  ano  de  1996.  No  bairro  Sarandi,  33  mulheres,  entre  costureiras,  donas  de  casa  e  operĂĄrias,  se  reuniram  na  Capela  Nossa  Senhora  da  Salete  para  transformar  retalhos  em  roupas. Â

Em  2005,  a  8QLYHQV ÂżUPRX convĂŞnio  com  o  FĂłrum  Social  Mundial  e  coordenou  a  confecção  de  60  mil  sacolas  ecolĂłgicas  em  parceria  com  outros  35  empreendimentos  da  regiĂŁo  Sul  e  de  SĂŁo  Paulo. Â

Site  da  Cooperativa  Central  Justa  Trama:  www. justatrama. com.br


saúde

$omR TXH YDOH XP ÀOPH ONG Médicos Sem Fronteiras comemora 40 anos e acumula histórias como a da voluntária gaúcha Maria Fernanda, que já atuou em missões no Paquistão, na Líbia e no Sudão do Sul

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Texto: Mariana Ramos e Kimberly Winheski

cena de pais que enterram filhos mortos por desnutrição com as próprias mãos é uma das mais chocantes do documentário MSF (Un)Limited, produzido pela ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF), que recentemente completou 40 anos de atividades. O filme retrata o cotidiano dos voluntários e a dramática situação dos países durante a ação dos profissionais da saúde. A atuação humanitária inspira médicos de todos os lugares do mundo. Atualmente, há cerca de 22 mil médicos vinculados ao MSF

espalhados em 65 países. Uma delas é a porto-­alegrense Maria Fernanda Oliva Detanico, 31 anos, que teve seu interesse pela ONG despertado em 1999, quando o MSF ganhou o Prêmio Nobel da Paz. Então estudante de medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ainda não podia participar da iniciativa, pois é necessário ter nível superior completo e dois anos de residência. Quando alcançou os requisitos para atuar na organização, a médica cirurgiã, especialista em trauma e aparelho digestivo, embarcou rumo a sua primeira missão no Haiti, em 2010. Fundado em 1971, na França, por

médicos e jornalistas, o grupo presta ajuda humanitária pelo mundo. O projeto atua em lugares que passaram por situações de conflitos armados, desastres naturais, fome e epidemias. A organização é sustentada, de modo geral, por doações privadas sem ligação com governos. Durante as missões, os médicos não possuem segurança armada nos hospitais ou alojamentos clínicos. Por um lado, passam confiança aos pacientes, por outro, ficam vulneráveis a sofrer qualquer tipo de ataque. Em Ruanda, por exemplo, 250 profissionais do MSF foram assassinados devido a suas etnias.

Arquivo pessoal

Experiência de vida A voluntária Maria Fernanda Oliva Detanico conta o que viveu em missões humanitárias: Editorial J: Onde você já esteve pelo MSF? Maria Fernanda: Na primeira missão, fui para o Haiti, o que me fez ter certeza de que queria continuar atuando. Voltei (para o Brasil) e depois passei três meses no Paquistão. Depois, fui para o Sudão do Sul e, na sequência, segui para a Líbia durante os conflitos. Na minha última viagem retornei ao Haiti, onde fiquei seis meses. EJ: Acontece de um médico precisar fazer alguma coisa que não seja sua especialidade? MF: Com certeza. Aprendemos a fazer de tudo um pouco quando estamos lá. Antes de viajar, a maioria dos médicos é submetida a um curso que resume todas as especialidades. Eu, por exemplo, fiz um sobre fratura exposta e atuei algumas vezes como ortopedista. Aqui no Brasil, por exemplo, somente o obstetra pode fazer cesariana, mas, durante as missões, eu fiz inúmeros partos. EJ: Existe remuneração para os médicos? MF: Existe, porém chamamos de ajuda de custo. No geral, serve para pagar as contas aqui. No local da missão, ganhamos algumas diárias que se baseiam no quanto custa viver por lá. Geralmente, o dinheiro é gasto com comida e, de vez em quando, com algo que queiramos comprar. EJ: A cultura de alguns países atrapalha? MF: Atrapalha. Entendemos e aceitamos a cultura, mas quando compromete a saúde ou o procedimento cirúrgico, é deixada de lado. Por exemplo, no Paquistão todas as mulheres usam véu, mas no bloco cirúrgico não é permitido. Fora de lá, tudo bem, até eu, mesmo sendo ocidental, procuro usar. Maria Fernanda fez inúmeros partos durante as missões

+ Assista ao documentário de 52 minutos em http://www.msf.org.br/40anos/

EJ: Nas viagens, aconteceu algo que lhe assustou? MF: Algo muito chocante foi a desnutrição. Ter visto crianças morrer de fome, na minha frente, foi horrível. É uma imagem que jamais sairá da minha mente. E, também, não quero que saia, pois isso não é normal. Não é para ter aqui, não é para ter na África, não é para ter em lugar nenhum. MAIO DE 2012 / PÁGINA 12

Cenas do documentário MSF (UN)Limited, produzido para celebrar os 40 anos da ONG


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