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A inovação em tempos de pandemia
from Infopharma nº4
by editorialmic
A ADOÇÃO DE MEDICAMENTOS GENÉRICOS E BIOSSIMILARES, PARA ALÉM DE GARANTIR MAIOR EQUIDADE DE ACESSO À SAÚDE, PERMITE ALOCAR RECURSOS PARA O FINANCIAMENTO DE MAIS CUIDADOS E NOVAS TECNOLOGIAS DE SAÚDE.
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Autor: Maria do Carmo Neves, Presidente da APOGEN
Provavelmente enfrentamos a crise das nossas vidas. Temos vivido tempos difíceis: preocupações com a nossa saúde e dos nossos familiares, dificuldade em aceder aos cuidados de saúde, o confinamento, constrangimentos financeiros, a perda de emprego e a incerteza sobre o futuro.
Somos confrontados com um aumento significativo das desigualdades sociais, o país enfrenta uma recessão e o poder de compra das famílias está fortemente comprometido.
O sistema de saúde, que já enfrentava uma forte pressão devido ao envelhecimento da população, com o consequente aumento da prevalência das doenças crónicas e o investimento em terapêuticas inovadoras mais dispendiosas, está agora fortemente sobrecarregado devido à pandemia COVID-19 e à falta de acesso, em tempo útil, dos doentes com outras patologias, igualmente importantes, a consultas, exames e cirurgias. A pandemia expôs a necessidade de reforçar os serviços de saúde e realçou a importância da saúde para a economia nacional e mundial. O desafio que se coloca ao sistema de saúde, e em particular ao SNS, é ciclópico porque para além dos casos COVID-19, o sistema vai ser confrontado com casos mais graves – em todas as patologias – que vão necessitar de um maior investimento em profissionais de saúde, serviços e recursos terapêuticos.
É neste contexto que os medicamentos genéricos e biossimilares têm um papel crucial: o valor gerado pela sua adoção, para além de garantir uma maior equidade de acesso à saúde, permite alocar recursos para o financiamento de mais cuidados e novas tecnologias de saúde que contribuem para a qualidade de vida dos cidadãos e para a sustentabilidade do SNS.
Todavia, sem medidas que apoiem os medicamentos genéricos e biossimilares, há fortes probabilidades destes medicamentos saírem de alguns mercados, nomeadamente de Portugal, ou que não haja concorrência em futuros medicamentos biológicos, medicamentos órfãos ou terapêuticas personalizadas.
Uma série de vulnerabilidades, já identificadas, tomaram maiores proporções devido à pandemia. Nomeadamente, a consolidação dos produtores de matérias-primas e das plataformas industriais fora do espaço europeu, que conduziu a um aumento significativo dos custos de produção versus a redução contínua dos preços dos medicamentos genéricos e biossimilares, originando dificuldades no acesso e aumento do número de ruturas.
De acordo com um estudo realizado pela Comissão Técnica de Fármaco-Economia da APOGEN, os novos medicamentos genéricos que foram lançados nos últimos 5 anos, no seguimento da perda de patente dos seus produtos de referência, permitiram um aumento da acessibilidade em 27%, enquanto o preço médio dessas moléculas desceu de forma consistente apresentando uma redução final
de 60%. Estes números refletem o grande paradigma dos medicamentos genéricos e biossimilares – geram valor enquanto promovem mais acesso.
De acordo com o contador de poupança disponível no site da APOGEN, em 2020, as poupanças geradas pelos medicamentos genéricos dispensados nas farmácias ultrapassaram os 462 milhões de euros. Entre 2011 e 2020 estes medicamentos geraram uma poupança de 4.291 milhões de euros para o Estado e os utentes.
Torna-se assim necessário fomentar o desenvolvimento de políticas de mercado competitivas e igualmente sustentáveis, em detrimento da aplicação de medidas de contenção de custos e de políticas fiscais que ignoram a contribuição ativa e estrutural dos medicamentos genéricos e biossimilares para a sustentabilidade e a preservação do SNS. Medidas que contribuem unicamente para a contenção de custos, sem incorporar o valor gerado pelos medicamentos que já perderam patente, têm um efeito negativo na sua disponibilidade pelo que é urgente rever o mecanismo de preço e comparticipação dos medicamentos genéricos de modo a garantir o acesso e a sustentabilidade de toda a cadeia de valor do medicamento.
Portugal tem hoje, mais do que nunca, de criar condições de previsibilidade e de sustentabilidade do setor para garantir um fornecimento continuado de medicamentos de elevada qualidade mais custo-efetivos que geram valor para os doentes, o Estado e a economia.
Em teletrabalho ou nas unidades fabris os mais de 3.000 trabalhadores que em Portugal produzem e comercializam os medicamentos genéricos e biossimilares têm laborado incansavelmente para fazer chegar os medicamentos a quem deles mais precisa. Sabemos que num tempo de crise sanitária, económica e social o papel dos medicamentos genéricos e biossimilares é ainda mais determinante para o acesso dos cidadãos às terapêuticas e para a preservação do SNS.
A APOGEN, enquanto representante do setor, vai continuar a trabalhar com todas as partes interessadas na promoção de mais acesso para mais e melhor saúde e na defesa de um ambiente propício à introdução e manutenção das terapêuticas mais custo-efetivas a bem dos cidadãos, do SNS e da economia. •
Dispensa em Proximidade: Uma das chaves para a equidade no acesso ao tratamento
A DISPENSA EM PROXIMIDADE REPRESENTA UM GANHO SOCIAL IMPRESSIONANTE, AO QUAL SE JUNTA UMA MELHOR ADESÃO À TERAPÊUTICA E A UMA AGILIZAÇÃO E VALORIZAÇÃO DO TRABALHO DE TODOS OS CLÍNICOS ENVOLVIDOS.
Autor: Nuno Lopes, Presidente da Associação Portuguesa de Hemofilia
Achave para uma vida plena para as pessoas com hemofilia passa pela gestão regrada e constante da terapêutica em regime profilático ajustado a cada indivíduo. Esta profilaxia é administrada pelo próprio ou pelos cuidadores (pais). Quase 90% dos pacientes com hemofilia têm o tratamento no conforto do seu domicílio, sabem como e quando administrá-lo. Os medicamentos para esta patologia são de dispensa hospitalar, e as pessoas com hemofilia ou os cuidadores têm de se deslocar às unidades hospitalares onde são seguidas para levantarem a terapêutica. Isto tem implicado visitas mensais ou de três em três semanas aos hospitais, com impacto no dia a dia de cada um, afetando muitas vezes o decorrer normal de uma jornada de trabalho quando, por exemplo, a pessoa tem de fazer algumas centenas de quilómetros até ao hospital.
Só em contexto pandémico começaram a surgir modelos de dispensa em proximidade da terapêutica. Dos cinco Centros de Referência para o tratamento da Hemofilia existentes em Portugal, os hospitais de Santa Maria e São José em Lisboa, o CHUC de Coimbra e o Santo António do Porto desenvolveram todos protocolos de dispensa em proximidade; nas farmácias comunitárias (CHUC); diretamente no domicílio (Santa Maria, São José e Santo António). O São João do Porto é o único Centro de Referência que continua a obrigar pacientes ou pais a deslocarem-se à farmácia do hospital. De outras unidades hospitalares espalhadas pelo país, e que também servem as pessoas com Hemofilia, não se conhecem protocolos. As disparidades no acesso à terapêutica são por isso tão inegáveis quanto o é o impacto das mesmas na vida destas pessoas. Esta situação não é aceitável, pois é consensual que o acesso melhorado à terapêutica tem influência positiva na adesão à profilaxia e, por arrasto, no seu sucesso, e que é este sucesso que permite a tal vida plena.
A APH reclama há anos que todas as unidades hospitalares desenvolvam, e mantenham e aperfeiçoem no período pós-pandémico, protocolos de dispensa em proximidade que contemplem sempre as duas opções (farmácia e domicílio) e não apenas uma delas. Os resultados do protocolo do CHUC, que envia a terapêutica apenas para as farmácias de proximidade, reportam mesmo assim 180 mil horas e 1,6 milhões de quilómetros poupados às pessoas que o hospital serviu em 2020. Isto representa um ganho social impressionante, ao qual se junta uma melhor adesão à terapêutica e a uma agilização e valorização do trabalho de todos os clínicos envolvidos.
O sucesso do protocolo do CHUC realça o que é possível fazer, mas também o que falta fazer para que o paciente/utente esteja realmente no centro da missão do SNS. O papel que têm as associações de doentes, e as que representam os profissionais de saúde, passa por isso também por lutar pela tal equidade no acesso aos tratamentos. •