Porto Dentistas OMD nº32 enero 2017

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omd | 67 Deontológico

O doente é normalmente uma pessoa que sofre de algum tipo de distúrbio ou patologia, encontrando-se em estado vulnerável, inferiorizado e precisando de ajuda e atenção por parte de um médico. Por sua vez, compete ao médico ouvi-lo e dispensar-lhe o tempo de consulta suficiente para que se sinta à vontade de maneira a poder transmitir as suas dúvidas e angústias. Desta forma, estabelece-se uma relação médico-doente, onde há uma interação entre os dois, um normalmente debilitado e inferiorizado e outro detentor do conhecimento da ciência médica e portanto capaz, espera-se, em encontrar a solução para os problemas do primeiro.

OPINIÃO

Relação médico-doente No XXV Congresso da OMD, o Conselho Deontológico e de Disciplina realizou um fórum sobre “A relação entre o profissional de saúde e o utente”, convidando para esse fim os representantes dos conselhos de disciplina das várias ordens profissionais da saúde. O tema do fórum foi relacionado com uma recente notícia que a Organización Médica Colegial de España, congénere da Ordem dos Médicos, com o apoio de médicos e organizações similares de vários países, está a preparar uma candidatura para classificação pela UNESCO da relação médico-doente a Património Imaterial da Humanidade, pela necessidade de se criarem mecanismos de preservação e de proteção desta relação, porque hoje assiste-se a tentativas deliberadas para perturbá-la. Um bom exemplo destas tentativas é a substituição da denominação “doente” por “cliente”. A palavra “cliente” tem sido desde sempre associada à atividade comercial, definindo-se então um consumidor como uma pessoa que procura adquirir um bem ou um serviço. A sua adoção nos serviços de saúde cria inevitavelmente a equiparação deste serviço a uma aquisição de bens materiais, onde são criadas necessidades, que despertam vontades ou desejos na sua aquisição, descentrando o objeto essencial da atividade médica que é a saúde do doente.

Antes de avançar no tema, quero no entanto realçar que podem coexistir indivíduos que procurem um médico (dentista) sem estarem, efetivamente, doentes. No entanto, a necessidade de conhecerem o seu estado de saúde oral ou dar solução às suas insatisfações, levam a que procurem a opinião de um médico, com quem pretendem estabelecer uma relação de confiança. Este tipo de interação vai, como se compreende, muito para além de uma simples prestação de serviços, sendo difícil de entender a equiparação de doente a cliente. O ponto central da consulta médica está na necessidade de o médico ouvir o doente e identificar qual o motivo principal da consulta. Terá que interpretar a forma como o doente se expressa, qual a sua narrativa. Muitas vezes o doente tem já um conjunto de ideias prévias sobre o seu problema de saúde, desde a causa às consequências, da gravidade e quais os tratamentos possíveis, podendo até ter já consultado outros médicos. Hoje o acesso à informação médica através da internet está facilitado e é generalizado, apesar que nem toda a informação disponível é credível, coexistindo também muita desinformação. Perante as dúvidas legitimamente levantadas pelos doentes durante a consulta médica, compete ao médico esclarecer de forma cabal, clara e competente essas mesmas dúvidas. O médico não deve temer, portanto, a informação que o doente possa ter, pois está sempre perante uma assimetria de conhecimentos entre os dois, altamente desfavorável para o doente. Terá sim, a responsabilidade de identificar a informação errónea que o doente possua e através de um diálogo afável, comunicando de forma franca e aberta, reconhecendo os seus medos,


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