LIVRO SAGRADO DE UMBANDA E NAÇÕES
Com mais de quatro mil anos de existência, deixa de ser somente uma religião e passa também a ser uma filosofia de vida.
LIVRO SAGRADO DE UMBANDA E NAÇÕES Com mais de quatro mil anos de existência, deixa de ser somente uma religião e passa também a ser uma filosofia de vida.
Dr. Heleno Felix torres Ph.D.
Copyright Heleno Felix Torres Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma e por qualquer meio mecânico ou eletrônico, inclusive através de fotocópias e de gravações, sem a expressa permissão do autor. Todo o conteúdo desta obra é de inteira responsabilidade do autor. Editora Schoba Rua Melvin Jones, 223 - Vila Roma - Salto - São Paulo - Brasil CEP 13321-441 Fone/Fax: +55 (11) 4029.0326 | 4021.9545 E-mail: atendimento@editoraschoba.com.br www.editoraschoba.com.br
CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ T645L Torres, Heleno Felix Livro sagrado de umbanda e nações : com mais de quatro mil anos de existência, deixa de ser somente uma religião e passa também a ser uma filosofia de vida. / Heleno Felix Torres. - Salto, SP : Schoba, 2012. 416 p. : il. ; 23 cm Inclui bibliografia ISBN 978-85-8013-197-0 1. Umbanda 2. Cultos afro-brasileiros. I. Título. 12-7920. CDD: 299.672 CDU: 299.6 26.10.12 05.11.12
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AG R A D E C I M E N TO S
C
omecei muito cedo na religião e pude presenciar de tudo um pouco, tendo a felicidade de descobrir o caminho correto, pelo qual optei. Apesar de minha infância e de minha adolescência terem sido marcadas por diversos fatos difíceis, posso salientar que, se cheguei aonde cheguei, foi com o apoio e o amparo das minhas entidades, às quais sou profundamente grato e às quais dedico o maior apreço e todo o zelo que posso ter. Também agradeço ao meu irmão mais velho, um grande companheiro que tive o privilégio de trazer para a religião, que está do meu lado sempre que preciso, numa cumplicidade mútua. À minha mãe, durona, teimosa, intransigente, mas que me criou com pulso firme e com muito amor, da forma que ela sabia dar e que assim reconheço. Entretanto, o que mais admiro nela não é este fato, mas, sim, o de ter dedicado toda a sua vida a mim e a meus irmãos. Pude perceber a força de uma grande mulher, que lutou e venceu. Vivendo um casamento totalmente fracassado, ao qual se entregou, tendo quatro filhos homens, criou-os praticamente sozinha e, mesmo assim, deu a eles o que de melhor pode ser dado a uma pessoa: amor, carinho, caráter, hombridade, honestidade. Enfrentou câncer, cegueira por catarata, histerectomia,
oito derrames e cinco pontes de safena. Hoje, cansada pela vida, andando e enxergando com dificuldade, aos setenta e dois anos, que não lhe pesam tanto quanto as marcas que a vida lhe deixou, jamais abandonou o zelo de mãe, preocupada com seus filhos e netos. Não bastasse tudo isso, está sempre pronta para uma nova mudança, com forças para continuar em frente. Ouvi, durante toda a minha vida, apenas um elogio vindo de sua boca, o que me deixou extasiado, não por ela ter me elogiado, mas pela satisfação de saber que tenho ao meu lado a mãe que qualquer pessoa gostaria de ter. A ela, meu amor mais puro, o mais intenso que um filho dedica a uma verdadeira mamãe. À minha ex-esposa, minha companheira durante anos e que se tornou uma grande amiga e parceira, com quem posso contar a todo o momento e a quem também agradeço por ter me dado um filho lindo, maravilhoso, pelo qual tenho a maior admiração, que aos 15 anos já é um ser humano adorável. Os dois, mãe e filho, são padrinhos do meu segundo filho. À minha esposa, a quem eu dedico o meu amor mais pleno, que está nesta jornada ao meu lado independentemente do que ou de quem tente atrapalhar, simplesmente vivendo um dia de cada vez, enfrentando as tempestades e trabalhando arduamente nas calmarias. Mais ainda por ter-me presenteado com um lindo filho, que tem um ano de idade. Aos meus filhos, que são a minha vida. Tal como tive o privilégio de acompanhar cada momento da vida do primeiro, até agora, espero que os Orixás me concedam a mesma oportunidade com o segundo. Aos mais de quatrocentos filhos de santo que tenho na religião, aos mais de dois mil netos e bisnetos, pois não tenho nem ideia de quantos possam ser, dedico a todos este livro. Lembrando sempre que a vida é maravilhosa, e, por mais dura que pareça, ao viver o presente plenamente estamos fazendo o
nosso futuro, pois escrevemos a nossa história independentemente daquilo por que passamos e dos caminhamos que trilhamos. Ter fé naquilo em que muitas vezes nem conseguimos acreditar nos fortalece para viver com harmonia e paz, compreendendo as diferenças e as semelhanças, sabendo respeitar a individualidade de cada um, independentemente de quem o outro é e do que faz, perdoando mesmo que pareça impossível de ser perdoado, relevando o que é incontestavelmente doloroso, lembrando sempre que somos irmãos, independentemente de raça, cor ou credo, que aquilo que Olorum nos deu não foi feito para outros nos tirarem e que ninguém ou nada nesse mundo pode tirar a fé que existe dentro de nós, mas sim ajudar no seu fortalecimento. Assim, lutando arduamente por dias melhores e sem esperar que eles cheguem, faremos com que a nossa luta traga mais para perto os momentos que desejamos ter. Só aprendemos a gostar da vida quando aprendemos a viver dia a dia, momento a momento, sem levar junto o peso do passado nem a incerteza do futuro, pois a nós foi dado o presente e nele deveremos sempre estar. É dessa forma que construiremos o dia de amanhã e teremos a satisfação de apreciar tudo que Olorum pôs ao nosso redor para engrandecer nosso dia e apreciar nosso momento. A vida turbulenta que o ser humano leva, a ganância incessante por ter mais e mais, o consumismo desenfreado, a aparência acima de tudo, a inveja, a cobiça, matando-nos uns aos outros, roubando, tudo isso nos obriga a parar e refletir: onde estão o caráter, a honra, a honestidade a humildade, o amor, a fé? Estes são atributos indispensáveis e cada ser humano deve cultivá-los dentro e ao redor de si, lembrando-se, sempre, de passar aos seus filhos, de sangue ou de fé. É nossa única oportunidade de ter um mundo mais justo e melhor.
Sumário
PREFÁCIO............................................................................14
Parte i introdução à religião 1 . A m e di u ni dade.................... ............................. 19 2 . Qu em pode tr ab al h ar na religião ?.................... 21 3 . A f o rç a dos or i x ás........................................... 25 4 . D em ô n i os, el es ex i stem ?................................... 29 PARTE II CONCEITOS DE UMBANDA 1 . U m pe qu eno tr aço da h i stória . . ........................ 33 2 . O s f u n dam entos.. ............................................. 35 3 . A s s et e l i nh as da Um b anda.. ............................. 37 4 . O c u lto Um b andi sta . . .......... ............................. 41 5 . A dedi cação do m édi u m de U mba n d a ................. 47 6 . O s p o n tos na Um b anda........ ............................. 49 7 . O P reto Vel h o na cu ltu r a bra sile ira e n a U mba nda......................... ........................... 135 8 . O s ( a s ) cab oclos(as)........................................ 139 9 . E xu e p om b a gi r a . . ............... ........................... 143 1 0 . R e i n o das encru z i l h adas... ........................... 153 1 1 . R e i n o dos cru zei ros..................................... 155 1 2 . R e i n o das m atas.. .......................................... 157
13. R ei n o da k alu nga pequ ena (cemité rio ) .......... 159 14. R ei n o da s al m as........................................... 161 15. R ei n o da li r a............................................... 163 16. R ei n o da p r ai a........................ ..................... 165 17. O u t r a s d enom i nações de pom ba gira ............. 167 PARTE III OS RITUAIS UMBANDISTAS 1. Os r i to s i n i ci ai s............................................ 171 2. O bat i s mo . ................................ ..................... 175 3. O p r i mei ro am aci ........................................... 177 4. A d oaç ão de coroa......................................... 179 5. A d ef u maç ão.................................................. 181 6. O e n c e r r a m ento de ano............ ..................... 185 7. A s p rot eçõ es ao congá................................... 187 8. Os ba n h o s e suas apl i cações...... ..................... 189 PARTE IV OS INSTRUMENTOS 1. Os a s s en ta m entos..................... ..................... 197 2. A s va s i l h a s dos or i x ás.................................... 199 3. O pi l ão .. . . . . ............................... ..................... 201 4. A bi g o r n a . . ............................... ..................... 203 5. A va s s o u r a de x apanã . . .................................... 205 6. A s s e t e va r as de m ar m elo, as sete e spa d a s d e s ão j o rg e o u de santa r i ta.. ................................ 207 7. O bú z i o . . . . . ............................... ..................... 209
PARTE V A RELIGIÃO 1 . A re l i gi ão . . ......................... ........................... 211 2 . M a n da m entos da u m b anda.............................. 217 3 . A m i s t i f i cação............................................... 221 4 . Qu i m banda.................................................... 223 5 . O des t ino........................... ........................... 225 6 . A exi s t ênci a h u m ana dentro d a d o u t r i n a rel i gi osa............................................ 227 PARTE VI OS ORIXÁS E SEUS ARQUÉTIPOS 1 . O s o r i xás . . .......................... ........................... 235 2 . O s a rquéti pos..................... ........................... 257 3 . A s e rva s u ti l i z adas par a os o rixá s . . ................. 267 4 . A lg u m a s das ervas u ti l i z adas n a umba n d a , p o r fa l a n ge............................ ........................... 269 5 . Pa rt es do cor po associ adas ao s o rixá s............ 273 6 . A s f ru tas dos or i x ás.. ..................................... 277 7 . O r i xá s e suas of erendas de fre n te : n aç ão c a bi nda........................ ........................... 281 8 . O f e re n das di ver sas............. ........................... 287 PARTE VII A INFLUÊNCIA Yorubá: MITOS, LENDAS, COSTUMES 1 . O s mi to s e as l endas no f olclo re a frica n o ..... 321 2 . O c r i a dor, na acepção dos yo rubá s................. 329 3 . A re p resentação de m u ndo.. ........................... 335
4. Or í. . . . . . . . . . . .................................................... 337 5. Bo r í . . . . . . . . . . .................................................... 339 6. E ledá . . . . . . . . ............................... ..................... 341 7. I n i c i aç ão ( cu m pr i r ob r i gação para se u o ri xá – fa ze r ch ão) . . ......................................... 343 8. H i s tó r i a d o b atu qu e / nação.......................... 345 9. C re n ç a s .. . . ................................ ..................... 351 10. O r i xá s . . . . ............................... ..................... 353 11. Te m p lo s . . . .................................................... 355 12. R i t ua i s . . . ................................ ..................... 357 13. E g u n.. . . . . . ................................ ..................... 361 14. Sac e rd ó c i o.................................................. 363 15. D i c i o n á r io yoru b á....................................... 365 PARTE VIII AS ORAÇÕES 1. A s o r açõ e s . . ................................................... 391 2. Ou t r a s p reces e or ações.. ............................... 397 3. P rec e ao s o r i x ás....................... ..................... 401 REFERÊNCIAS.....................................................................408
PREFテ,IO
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A
pós um longo estudo sobre os assuntos que envolvem as religiões espíritas como Umbanda, Quimbanda e Nação e consciente do número cada vez maior de pessoas que a elas se voltam para resolver seus mais variados problemas, sejam eles emocionais, financeiros, de saúde ou profissionais, percebi a necessidade de trazer às mãos dos médiuns e dos interessados um livro que reunisse um conjunto de conhecimentos como forma de ajudar na solução de tais males. Inseri neste trabalho fatos que considero de suma importância, obtidos através da experiência e da vivência, de Babalorixás, de Ialorixás e entidades, a fim de facilitar o desenvolvimento espiritual dos médiuns que ingressam na religião à procura de melhor entendimento daquilo que acontece com eles. Não tem este livro a pretensão de se colocar como única verdade acerca da doutrina, mas, sim, de possibilitar o acesso aos que verdadeiramente por ela se interessam ou dela necessitam. Entrego ao leitor uma obra fruto de cuidadosa e extensa pesquisa, realizada em vários centros espíritas e com base na minha própria vivência como Babalorixá durante mais de trinta anos, ajudando pessoas e buscando sempre aperfeiçoar ainda mais a
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forma do correto proceder na religião. Árduo, este percurso me propiciou inúmeras aprendizagens, principalmente relacionadas à vivência humana e a seus atributos como ser social. Não é atribuição minha julgar as atitudes das pessoas, mas posso salientar que, na maioria dos casos, as pessoas são de um egoísmo e de um egocentrismo inexplicáveis, e, mesmo buscando a espiritualidade, seguem arraigadas ao materialismo de forma injustificável. É bom salientar que dinheiro é muito importante, mas não é fruto divino, como muitos pensam. E, para aqueles que desejam praticar a religião umbandista somente por dinheiro, esclareço que escolheram o caminho errado. É bem verdade que ela proporciona às pessoas um bem-estar social, para que abram espaço em suas vidas para a espiritualidade, redistribuindo de forma organizada uma série de fatores que os levam a uma conduta mais adequada e mais equilibrada, permitindo que dessa forma encontrem a paz e a felicidade em cada momento. Entretanto, quero deixar bem claro ao leitor que, para ter sucesso, é indispensável que as pessoas envolvidas tenham fé naquilo que estão fazendo e pedindo. Pelo tanto de carinho com que esta obra foi idealizada é que peço aos que dela se utilizarem que o façam com o fim de ajudar quantos precisem, certificando-se desta forma da sua evolução, tanto pessoal quanto espiritual.
Parte i introdução à religião
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1. A mediunidade
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mediunidade é a sensibilidade que as pessoas têm para manifestação de outro plano, é o contato com vidas passadas, com aqueles que já partiram, com o que já aconteceu e com o que acontece hoje, como também uma maneira pela qual acontecem as previsões de futuro. Entretanto, a mediunidade não é somente isso. É também um alto grau de elevação espiritual e mental no qual os médiuns tornam-se suscetíveis a tudo que os cerca, racional ou irracionalmente. Todos a possuem. A diferença está no fato de que alguns a desenvolvem e outros não, sendo que tal desenvolvimento não é obrigatório, tampouco acarretará algum mal a quem optar pelo não desenvolvimento. Ao contrário, sendo uma pessoa de fé inquebrantável, crente em Deus, possuidora de grande paz espiritual, serena, não se impõe a necessidade de entrar numa corrente a fim de desenvolver-se, pois tal pessoa já é dona de um espírito elevado. Contudo, ao optar pelo desenvolvimento da sua mediunidade, atenção: nem todos os centros religiosos têm capacidade para ajudar realmente um médium; muitas vezes acabam atrapalhando. A lista de proibições é longa, e representantes de muitos cen-
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tros se aproveitam da boa vontade de seus médiuns, chantageiam, ameaçam ou exigem valores absurdos para aprontar seus filhos ou para realizar trabalhos. Importa saber é que nada nesse mundo é de graça, e, no que diz respeito à espiritualidade, é muito melhor pagar antes do que depois. Tenha a certeza de que nenhuma das pessoas que se enquadrarem na descrição acima poderá ajudá-lo nessa árdua tarefa. Por tudo o que aqui foi esclarecido, só se pode aconselhar, pela experiência, que o médium tenha muito cuidado, não se tornando um fanático. Vá devagar, sem pressa. Procure conhecer bem o centro que frequenta e os seus participantes. O período de um ano pode ser curto se servir para ter a certeza de que esse é o seu lugar. Use o seu coração, mas deixe a cabeça funcionar e tenha calma. Que Oxalá o (a) abençoe.
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2. QU E M P O D E T R A B A L H A R N A R E L I G I ÃO ?
Estou apto a realizar este trabalho? Não sou Babalorixá nem Ialorixá. Se eu fizer este trabalho, dará resultado? Posso pegar alguma carga negativa enquanto estou fazendo o trabalho? Para obter pleno sucesso, devo procurar um pai de santo ou uma mãe de santo?
E
stas são perguntas que muitos se fazem ao ler sobre trabalhos, despachos, ebós e outros trabalhos. No entanto, é importante saber que ninguém se torna Babalorixá ou Ialorixá da noite para o dia. São necessários anos de doutrina, desenvolvimento e de prática da religião. Assim, é sempre bom procurar alguém preparado para tal função. Sabendo, porém, da exploração existente em torno do assunto e do mau uso que fazem da religião umbandista, justifica-se mais uma vez este livro, para que qualquer pessoa necessitada de ajuda e que não tenha um centro para ser socorrida possa ser beneficiada ou beneficiar a outras. Também é necessário ser um mestre religioso para fazer um
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trabalho. É necessário ainda ter perseverança, firmeza, sensatez e correção. Para que não fique nenhuma dúvida: jamais uma pessoa comum vai ter a força de um Babalorixá ou de uma Ialorixá, e, se a pessoa que deseja fazer alguma coisa não é pronta, como se diz na religião, pode sim pegar cargas enquanto trabalha, além de atrapalhar bem mais a vida dela e a de outras pessoas. Para que isso não ocorra, a pessoa deverá preparar-se muito bem antes. Use a sua força interior, pois todo o ser humano a tem. Procure centrar-se. O que se quer dizer com isso é: você precisa estar em perfeita harmonia consigo, livre de qualquer angústia, anseio ou mau pensamento, principalmente na hora em que estiver realizando o trabalho. Faça com muita força, muita devoção, energia e com muita, muita fé. Procedendo dessa maneira, evitam-se riscos desnecessários. Respondendo mais pontualmente às perguntas feitas no início, está bastante claro que, se alguém que não é pronto na religião fizer um trabalho, com certeza vai acarretar algum tipo de prejuízo a si mesmo, pois, para executar com sucesso qualquer tipo de trabalho, até mesmo os filhos de santo, que são prontos na religião, levam anos para fazer corretamente – imagine um leigo. O risco é grande de pegar uma carga negativa, tanto no momento em que o trabalho está sendo feito quanto no momento da entrega, visto que geralmente os eguns espreitam lugares de oferenda em busca de sobras de energia. Existem pessoas capazes de se autodoutrinar e que conseguem chegar até suas entidades sem ajuda de ninguém, mas estas são extremamente raras (talvez uma em um milhão, sendo muito otimista). Essas são pessoas iluminadas, que trazem consigo uma marca espiritual diferenciada das demais, pois se autodoutrinarão através de suas entidades porque a pureza de seu coração é tamanha que Olorum permite. São pessoas livres da inveja, da mágoa, do remor-
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so, são generosas ao extremo e com um equilíbrio fantástico. Enfim, são abençoadas1.
1. Nota do autor – Neste trabalho, mesmo quando não vier expressa a designação Babalorixá ou Ialorixá, entenda-se assim, já que ambos podem presidir os trabalhos em uma casa de religião.
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3. A F O RÇ A D O S O R I X Á S
I
mprescindível para quem trabalha com a religião afro-brasileira ou é apenas simpatizante é conhecer a força, as características de cada Orixá e seus arquétipos, pois tudo gira em torno deles, nada se faz sem eles. Os rituais sagrados da religião deverão ser os mesmos e devem ser praticados da mesma forma e com as mesmas características, pois a religião vem para praticar o bem, sua raiz é só uma e não há como inventar, mesmo sofrendo modificações ao longo dos tempos. Cada centro tem sua doutrina, uns mais rígidos, outros mais amenos, porém a raiz obrigatoriamente deverá ser a mesma. Por isso, é importante saber alguma coisa sobre essa religião antes de vincular-se a ela. É necessário familiarizar-se com alguns itens importantes que servirão para evitar erros e para evitar que seus iniciados e mestres prejudiquem a si próprios ou a outros. O Orixá é energia pura e nunca teve encarnação, é a maior força depois de Olorum, uma energia que toma conta do ser, querendo o indivíduo ou não. Sua dominação se estende sobre a água, o ar, a terra, o fogo; eles são os senhores do universo. Jamais algo lhes passa despercebido, desde uma grande e imensa criação até a remoção de um grão de areia; todos os seres foram, são e serão
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sempre governados por estas entidades de luz, nada se podendo comparar a esta força, nada podendo sequer se aproximar dessa supremacia. É desta infinita energia que se desprende uma pequena parte, uma mínima fração e que permite aos médiuns recebê-la na forma de suas entidades. Sendo assim, muitos poderiam perguntar-se como é possível que cada pessoa receba seus Orixás em diferentes partes do mundo, e ao mesmo tempo, se os Orixás são energia pura? Exatamente por ser a energia sagrada do deus supremo e, por consequência, ser infinita e inexaurível é que ela pode dividir-se em tantas frações e ainda assim manter-se única e inteira. Iniciar-se na religião umbandista para buscar um aprontamento, tornar-se um Babalorixá ou uma Ialorixá representa tornar-se o guardião da força dos Orixás. Por esta razão, o tempo mínimo para se aprontar na religião é de sete anos. Somente com a autorização do Orixá e sob a sua lei é que a pessoa é doutrinada conforme a sua regência. Esta exigência se dá para que se impeçam os vícios de conduta, como, por exemplo, o invejar, o julgar as pessoas, o ter pena de si próprio, o lamentar-se, enfim, livrar-se do seu orgulho, arrogância, prepotência e egoísmo. Neste momento começa uma luta para dar ênfase à sua autoestima e, dessa forma, a pessoa começa a entender de maneira clara o certo e o errado. Quando termina essa fase, pode-se dizer que a pessoa está em equilíbrio e, sendo assim, não mais é necessário viver de mentiras, podendo conduzir sua vida de forma verdadeira. Então começa a doutrina dos Orixás, pois, livre da interferência externa, esta energia jamais será deturpada. Essa deturpação relatada se refere à maneira pela qual as pessoas transformam e transferem a energia boa que as cerca em uma energia negativa. É aí que começam os vícios de conduta, transformando totalmente suas vidas: começam a seguir fora do seu
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caminho e ficam sempre em busca de algo externo para compensar a falta que sentem desta energia boa, tornando-se obcecadas. Algumas o fazem por dinheiro, achando que desta forma serão felizes, outras em busca de um amor, acreditando que isto resolverá todos os problemas e as tornará pessoas realizadas. Claro que isso é irreal, pois a deturpação de uma energia tem de ser corrigida para que se possa encontrar a verdadeira paz interior. Entretanto, a força dos Orixás não se restringe apenas a isso, mas a tudo e a todos. Veja que as pessoas regidas por Orixás cuja prevalência é sobre as águas são pessoas mais amenas, mais regradas e muito emotivas, enquanto as pessoas regidas por Orixás cuja predominância é a terra mostram-se pessoas bem menos sensíveis, mais duras, mais embrutecidas, porém de muita perseverança; as pessoas regidas por entidades cuja influência maior é o fogo têm um senso de justiça muito grande e uma conduta muito firme em sua vida; há ainda as pessoas regidas por Orixás que têm predominância sobre o ar e estas são mais espontâneas, não se prendem a quase nada, vivem uma vida bem mais livre. Em suma, a melhor forma de conduzir a sua vida de forma regrada é conhecer a sua espiritualidade e equilibrar os sentidos e as emoções, é transformar toda a energia dos Orixás em algo positivo, sem jamais deturpá-la. Esta é a razão pela qual se faz muito importante aprender sobre essa religião maravilhosa, que já foi muito difamada e discriminada. Felizmente, nos dias de hoje, as pessoas começam a se dar conta de que a vida é muito boa para ser vivida, e que para viver bem é preciso estar centrado, equilibrado, o que as faz ir em busca de algo que realmente resolva e reoriente sua vida, precisamente o que a religião umbandista faz, usando a força dos Orixás.
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4. D E M Ô N I O S , E L E S E X I S T E M ?
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m velho ditado espanhol diz: “Yo no creo em brujas, pero que las hay, las hay.” Esta frase encerra uma crença de milhares de anos, encarnada nas mais diversas formas. O que é um demônio? De que forma ele se alimenta? Como surge? Como se livrar dele? Estas são perguntas que muitas pessoas se fazem, o que justifica sua presença neste livro. Um demônio é uma força negativa de proporções enormes, que destrói qualquer coisa com vida ou energia. Ele tem o poder do caos, da desgraça, da desarmonia, da desunião. Causa guerras, sujeira. Assim como Belzebu é o Senhor das moscas, da putrefação, da poluição, o demônio vem somente para a destruição. Surge do interior humano: o homem o cria, o venera e o alimenta através de pensamentos e ações, a cada vez que deseja ou pratica o mal a outros, deixando aflorar o sentimento de inveja, ciúme, rancor. O ato de falar dos outros, mesmo sem maldade aparente, na forma de comentários, já representa um julgamento, uma condenação. Esbravejar, falar palavrões, usar alguém, aproveitando-se de sua boa vontade, desenvolver vícios que prejudicam a saúde, ver alguém precisando de ajuda e não ser capaz de estender a mão, todos estes atos alimentam demônios. É o que os
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fortalece e os atrai. Livrar-se deles, destruí-los, realmente não é uma tarefa fácil ou simples, mas ainda assim não é preciso ser um super-homem nem um panormal. O que é preciso é praticar aquilo que Jesus nos ensinou: fazer o bem sem olhar a quem; ter pureza de pensamentos; ajudar os semelhantes sem esperar recompensas; perdoar de coração; não julgar para não ser julgado. São ações como estas que farão os demônios irem embora. Defumar o ambiente onde se trabalha e, se possível, também a sua casa é importante. Tomar banho de ervas regularmente, lavar a casa com elas, pois as ervas representam uma das maiores forças do planeta. Ter, em algum lugar da casa e do trabalho, pedras, cristais, mensageiros de brisa, aromatizantes, flores, tudo isso ajuda a concentrar energia positiva. Enfim, tornar o lar e o local de trabalho ambientes agradáveis, puros e tranquilos.
PARTE II CONCEITOS DE UMBANDA