EBO 2008

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© 2008 da Superintendência de Educação Cristã da Igreja Evangélica Assembléia de Deus em Curitiba Av. Cândido de Abreu, 367 - Centro Cívico 80530-000 Curitiba PR

Presidente da Assembleia de Deus em Curitiba Pr. José Pimentel de Carvalho Superintendente de Educação Cristã Pr. Aristides Vieira Coordenador da EBO Pr. Manoel Marques Secretário de Educação Cristã João Tadeu Costa Preparação dos Originais Judson Canto Correção Gráfica Henrique Pesch Projeto Gráfico e Capa Edson Silva - 41 9615-7884 Impressão e Acabamento Layer Graf - Studio Gráfico e Editora Ltda


SUMÁRIO Palavra do Diretor e Fundador da EBO Pr. José Pimentel de Carvalho ....................................................05 Palavra da Superintendência de Educação Cristã Pr. Aristides Vieira / Pr. Manoel Marques......................................09 Escatologia: A Segunda Vinda de Nosso senhor Jesus Cristo Pr. Antonio Gilberto.......................................................................13 Teologia Pastoral: A Família do Pastor na Ótica Ministerial Pr. Wagner Tadeu dos Santos Gaby.............................................45 Doutrinas Bíblicas e Usos e Costumes Pr. José Alves................................................................................61 Teologia Sistemática: Os Dons Espirituais Pr. Ciro Sanches Zibordi...............................................................81 Missiologia: Missão Urbana Pr. Robson José Brito....................................................................97 Teologia Sistemática II: Angelologia Ev. Eliel Gaby..............................................................................115 A Igreja e a Legislação - Uma Abordagem das Questões Jurídicas Atuais Ev. Renato Hora..........................................................................129



Pr. JosĂŠ Pimentel de Carvalho Palavra do Diretor e Fundador da E B O

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Palavra do Diretor e Fundador da EBO

Um dos aspectos mais destacados do ministério de Cristo na terra

foi o ensino. O povo se admirava de sua capacidade de ensinar, porque ele “os ensinava com autoridade e não como os escribas” (Mt 7.29). Até os seus adversários o reconheciam como Mestre (Lc 20.28). Antes de subir ao céu, após encerrar sua missão nesta terra, ele ordenou aos discípulos: “Ide, ensinai todas as nações...” (Mt 28.19). A mesma recomendação foi feita depois pelos apóstolos aos demais obreiros (1 Tm 4.13). Portanto, o ensino bíblico é inseparável da missão da igreja, tanto que o ministro deve ser “apto para ensinar” (2 Tm 2.24), assim “retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina” (Tt 1.9). O fato de o ministro ser capaz de ensinar, contudo, não é o bastante. O mestre também precisa aprender. Foi a consciência dessa necessidade que nos levou a fundar a EBO de Curitiba 46 anos atrás. A idéia é oferecer a pastores, pregadores e a todos os obreiros envolvidos com o ensino da Palavra a oportunidade de um aprimoramento em seu ministério. Por isso, caro servo do Senhor, seja bem-vindo à nossa escola, e que as matérias ministradas nestes dias possam dar novo ânimo ao seu ministério!

Pr. José Pimentel de Carvalho Presidente da Assembléia de Deus em Curitiba

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Pr. Aristides Vieira

Pr. Manoel Marques Superintendente e Coordenador da E B O

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Palavra da Superintendência Educação Cristã

de

Sentimo-nos

felizes por, mais uma vez, podermos dar as boasvindas aos amados irmãos e ministros do Senhor para a 46a Escola Bíblica de Obreiros de Curitiba. A exemplo do que ocorre a cada edição da EBO, preparamos para este ano uma série de palestras de tão excelente conteúdo que nos seria impossível destacar a mais importante. Usos e costumes, igreja e legislação, missão urbana e temas teológicos fascinantes como escatologia, dons espirituais e angelologia fazem parte dessa edição da EBO, além de um assunto de vital importância, por vezes esquecidos em eventos desse tipo: a família do pastor. Estamos certos de que cada participante, ao final dessa EBO, terá o seu ministério enriquecido, para benefício de sua igreja e para glória do Reino de Deus.

Pr. Aristides Vieira — Superintendente Pr. Manoel Marques — Coordenador

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Pr. Antonio Gilberto ESCATOLOGIA

Autor

de diversos livros, entre eles o Manual de Escola Dominical e a Bíblia através dos Séculos. É também editor da edição brasileira da Bíblia de Estudos Pentecostal.

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A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

Aquele que testifica estas coisas diz: Certamente, cedo venho. Amém! Ora, vem, Senhor Jesus!

Apocalipse 22.20

Introdução

Neste estudo, iremos analisar: • a vinda de Jesus, sua abrangência e os eventos dela decorrentes no céu e na terra; • o crente e o tribunal de Cristo; • o julgamento das nações e outros acontecimentos que terão lugar após a vinda de Cristo, como o Milênio e os novos céus e a nova terra; • os propósitos da vinda de Jesus; • os sinais precursores da vinda de Jesus.

I. A

vinda de Jesus, sua abrangência e sua série de eventos no céu e na terra

1. A vinda de Jesus é a principal doutrina escatológica A vinda de Jesus abrange, em resumo: 1) os seus sinais precursores preditos na Bíblia; 2) o arrebatamento da igreja; 3) o julgamento da igreja; 4) a Grande Tribulação, sobre Israel e os gentios; (5) as bodas do Cordeiro; 6) a aparição pessoal de Jesus nos céus, com poder e grande glória às nações da terra etc. 2. Quando ocorrerá a vinda de Jesus a) Ela ocorrerá a qualquer momento (Hb 10.37; Ap 3.11; 22.12,20). b) Atualmente, por toda parte há falsos profetas, especuladores, “animadores” de cultos, artistas “da fé”, racionalistas, filósofos cristãos, pensadores, romancistas, atores, teatrólogos, videntes, futurólogos, magos, adivinhos e médiuns, cada qual se apresentando como dono da verdade concernente ao futuro. Realmente, todo ser humano anseia conhecer o futuro. Mas nós, a igreja do Senhor, temos a infalível e inerrante Palavra de Deus, a qual precisamos estudar cada vez mais, sob a ação e unção do Espírito Santo que a inspirou. 17


A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

3. Como virá Jesus a) A vinda de Jesus é, acima de tudo, um “mistério” (1Co 15.51). b) Ela não consiste em um ato único. c) Ela ocorrerá num determinado espaço de tempo. Ver Daniel 9.27; Apocalipse 11.2,3 + 12.6 + 13.5. d) Considerar que a primeira vinda de Jesus (quando ele nasceu em Belém de Judá) abrangeu um período de mais de 30 anos. e) Primeiro ocorrerá o arrebatamento da igreja. No arrebatamento, Jesus virá para levar a sua igreja para o céu. O arrebatamento é a retirada instantânea e sobrenatural, deste mundo, de milhões e milhões de crentes salvos, de todas as partes da terra, que serão levados ao encontro de Jesus nos ares. Algumas referências-chave sobre o arrebatamento da igreja: • 1Tessalonicenses 4.15-17: aqui está escrito que “seremos arrebatados” (v. 17). Num instante, os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro. No momento seguinte, os vivos serão transformados, e todos subiremos ao encontro do Senhor, nos ares. Ler também 1Coríntios 15.51,52. • João 14.3: “... e vos levarei também para mim mesmo”. • Lucas 21.36: “... dignos de evitar todas estas coisas que hão de acontecer”. Ler também v. 25-35 + Isaías 57.1b. Nesse primeiro ato da vinda de Jesus, o arrebatamento: • Ele virá num momento, num instante (1Co 15.51,52). • Ele virá só até os ares (1Ts 4.16,17). Cf. Sl 36.5. • Ele virá em secreto; virá somente para os salvos (1Ts 5.2; Mt 25.1-10). • É a retirada da família de Deus deste mundo (Ef 2.19).

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A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

f) Como estar preparado para a vinda de Jesus, no arrebatamento da igreja: • Ser nascido de novo, isto é, ser salvo (Jo 3.5; 1Co 15.23b); • Ter “azeite” na vasilha (Mt 25.8; Jo 14.17; Lc 12.35-37); • Pertencer à igreja de Deus (Ap 22.17; 1Co 12.13,27); • Viver em santidade (Hb 12.14; 1Ts 5.23b); • Viver em obediência a Cristo (Ap 22.17, “quem ouve”; Jo 5.24). g) Depois virá a segunda fase da vinda de Jesus: • Ele virá para livrar Israel de ser aniquilado pelos exércitos do Anticristo e, em seguida, julgar as nações. • É a “revelação” de Jesus em glória, majestade e poder a Israel e às nações da terra (Ap 1.1,7; 6.1217; 19.11-21; At 1.9-11; Zc 14.2ss; Jl 3.9-15; Hc 3.3-18). • Antes de Jesus aparecer nos céus para julgar as nações, haverá sinais sobrenaturais de sua vinda, no sol, na lua, nas estrelas, na terra, no mar, no ar (Lc 21.25-27; Mt 24.30). • A aparição de Jesus às nações será algo majestoso e assombroso, além de qualquer mentalização humana, pois: Ele virá publicamente (Ap 1.7; Zc 12.10; Mt 24.30; 26.64). Ele virá lentamente, assim como para o céu subiu (At 1.9-12). Ele virá gloriosamente, em todos os sentidos (Mt 24.31,32; Dn 7.13,14). Ele virá visivelmente sobre Jerusalém, sendo também visto em todo o mundo (Zc 14.4,5; Is 52.8; Mt 24.30; Tt 2.13; Ap 1.7). Cf. nesta última referência o “sim” e o “amém”. 19


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h) Segundo a Bíblia, na vinda de Jesus ocorrerá primeiro o arrebatamento da igreja, depois a manifestação de Jesus em glória, a Israel e às nações rebeladas contra Deus, sob o governo do Anticristo. Três evidências bíblicas: • Jesus vindo PARA os seus (Jo 14.3) e depois vindo COM os seus (Cl 3.4; Jd 14; 1Ts 3.13; Ap 19.7 + 14). Para vir COM os seus, Jesus virá antes PARA os seus. • Jesus vindo até as nuvens para buscar os seus (1Ts 4.17) e depois vindo à terra, sobre o monte das Oliveiras (Zc 14.4). • Jesus vindo NUM MOMENTO (1Co 15.52) e depois vindo LENTAMENTE e para demorar (Mt 24.30; 25.31; Ap 1.7). 4. O que ocorrerá na terra à vinda de Jesus para julgar as nações a) Haverá antes uma apostasia total entre a cristandade (2Ts 2.3-8; Lc 18.8) — 2Tessalonicenses 2.3 fala de “a” apostasia. b) Estará ocorrendo na terra a hegemonia mundial de uma confederação de nações. Será a consolidação maciça e o auge da atual União Européia de nações. No dia 23 de maio de 1957, um grupo de nações européias assinou um tratado em Roma, que sem dúvida alguma foi o primeiro passo para o cumprimento da antiga profecia de Daniel sobre a existência de uma futura confederação de nações como sendo a última forma de expressão do pode gentílico mundial distanciado de Deus. A referida profecia está em Daniel cap. 2, e repetida no cap. 7 do mesmo livro. Em Apocalipse esta profecia é também vista a partir do cap. 13. O Tratado de Roma teve sua vigência a partir de 1.º de abril de 1958. O seu objetivo fundamental é a unificação da Europa, mediante a chamada União Européia, ora em andamento. Os seis primeiros membros fundadores são: Itália, França, Alemanha, Holanda, Bélgica, e Luxemburgo. Novos membros vêm sendo admitidos desde então. Essa coalizão de nações, segundo a profecia de

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A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

Daniel, situa-se na área geográfica do antigo Império Romano (Dn 2.33,41-44; 7.7,8,24,25; Ap 13.3,7; 17.12,13). Não se trata de uma restauração literal e total do antigo Império Romano, tal qual existiu nos dias do Novo Testamento, mas de uma forma de expressão dele, pois conforme a palavra profética em Dn 2.34, “a pedra” feriu a estátua nos pés; não nas suas duas pernas. As duas pernas da estátua profética representam o Império Romano dividido em dois em 395 d.C.: o Ocidental e o Oriental. O Império Romano Ocidental teve sua sede em Roma, e caiu em 476 d.C. O Império Romano Oriental teve sua sede em Constantinopla (a antiga Bizâncio), e caiu em 1453 d.C. Foi nessa condição sob duas pernas que o Império Romano deixou de existir. Sob a forma de dez dedos (= dez reinos [Dn 2.34,42]) o Império Romano nunca existiu. Isso aguarda cumprimento profético, o que agora está tendo lugar, como acabamos de expor.1

c) Outros fatos que ocorrerão na terra nos tempos da vinda de Jesus para julgar as nações, segundo as Escrituras: • Surgimento do Anticristo no cenário mundial, principalmente quanto a Israel. O Anticristo é denominado “a besta” (Ap 13.1,2; ver também 2Ts 2.3,4,8,9; 1Jo 4.3; Dn 9.26,27; 7.25). • Surgimento de outra “besta”: o Falso Profeta, o qual estabelecerá uma superigreja falsa mundial, que será destruída por juízo de Deus (Ap 17). O Falso Profeta agirá como um servidor da primeira besta; uma espécie de ministro da religião do Anticristo. Ver Apocalipse 13.8-17; 16.13. • Surgimento, na terra, da Grande Tribulação, entre o arrebatamento da igreja e a “revelação” de Jesus (Ap 6—18; Mt 24.21, ARA; Mc 13.19, ARA). A Grande Tribulação será um período de manifestação da santa e justa ira divina sobre a humanidade rebelada contra seu Criador e Sustentador; pecadora contra a vontade revelada de Deus; desviada do reto caminho traçado por Deus; incrédula por escolha e por prazer; adversária de Deus, da fé e dos santos. Antonio Gilberto, O calendário da profecia (Rio de Janeiro: CPAD, 1985), P. 45-6.

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A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

Ver mais sobre a Grande Tribulação em Apocalipse 6.16,17; 15.1; 16.1; Mateus 3.7; 1Tessalonicenses 1.10. • Ocorrerá na terra o juízo sobre o povo de Israel — os judeus — para seu arrependimento e conversão ao Senhor (Jr 30.7; Zc 13.7-9; Rm 11.26 + 9.27; Am 9.911; Lc 13.34,35). • Ocorrerá na terra a campanha militar de Armagedom — o maior conflito armado de todos os tempos, de caráter sobrenatural (Ap 16.12-16; 19.19; 2Ts 2.3,4). • Ocorrerá o julgamento das nações, precedido (conforme já explanado) da manifestação de Jesus Cristo visivelmente, com poder e grande glória (Mt 24.30; 25.31-46; Ap 19.11-21; Jl 3.2,11,12; Zc 14.1216; Sl 96.13). Todos os povos da terra desviaram-se de Deus desde o princípio, afundando-se cada vez mais na incredulidade, no pecado e na mais vil idolatria (Gn 6.5; Sl 53.1-3; Rm 1.18-32; 3.10-18). No julgamento das nações, ocorrerá a separação ordenada por Deus, entre o “trigo” do Senhor e o “joio” do maligno; entre os “bodes” e as “ovelhas” (Mt 13.26-30; 25.31-34,40,41,46; Lc 17.34-36). (Uma separação bem maior e de outra natureza já terá ocorrido no arrebatamento da igreja.) 5. O que ocorrerá no céu à vinda de Jesus Um resumo deste tópico: a) Ocorrerá nos céus o arrebatamento — ou rapto — da igreja, conforme já explanado. O verbo traduzido por “arrebatar” (1Ts 4.17, “seremos arrebatados”) trata de um ato de demonstração de força divina sobrenatural + rapidez + saída (deste mundo). Outros exemplos de uso do mesmo verbo (no original), que o leitor deve examinar e refletir: Mateus 11.12; João 6.15; 10.12; Atos 8.39; 23.10. b) Ocorrerá o julgamento e recompensa das obras dos salvos no “tribunal de Cristo” (2Co 5.10; Rm 14.10; 1Co 3.12,13; Ap 14.13). c) Ocorrerão no céu, para a igreja, as “bodas do Cordeiro” (Ap 19.7-9; Lc 22.29,30 etc.) 22


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d) Ocorrerá no céu a “revelação” de Cristo, isto é, sua manifestação visível e gloriosa às nações da terra, com poder e majestade, para julgá-las e depois instaurar seu reino milenial.

II. O Crente e o tribunal de Cristo

O “tribunal de Cristo” é, em suma, o julgamento e recompensa das obras do crente (2Co 5.10; Rm 14.10). O tribunal de Cristo terá lugar após o arrebatamento da igreja, certamente nos páramos celestiais. O crente jamais será julgado, como filho de Deus pela fé em Cristo (Jo 1.12,13), mas certamente o será como servo de Deus. “Filho de Deus” decorre da fé em Deus; “servo de Deus” decorre do amor a Deus. Quem serve pouco a Deus é porque o ama pouco; é próprio do amor servir. Filho de Deus há um só tipo; servo de Deus os há de vários tipos: • • • • •

servo bom; servo mau; servo inútil; servo cego (Is 42.19); servo prudente.

Ler Mateus 25.21,23,26,30. 1. Introdução ao assunto do tribunal de Cristo a) Efésios 2.10: “Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas”. b) Romanos 14.7: “Porque nenhum de nós vive para si e nenhum morre para si”. c) Deus, na outorga de sua Lei ao seu povo Israel, o primeiro assunto legislado é o do servo (Êx 21.1ss). Ler também Deuteronômio 15.12-17; Salmos 40.6-8; Hebreus 10.7,8. d) O tribunal de Cristo, para a igreja, é o dia do galardão prometido por Deus ao seu povo, por sua graça (2Cr 15.7; Hb 6.10; Ap 22.12). e) É o dia da pesagem de nossas obras na justa balança de Deus (1Sm 2.3). 23


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Lembremo-nos de que os padrões de Deus para julgar não são do mesmo quilate dos nossos padrões humanos. Deus julga o ato, mas também os motivos que levam ao ato: • Mateus 5.27: o ato do adultério; v. 28: os motivos que levaram ao ato (“já em seu coração cometeu...”). • 1João 3.15: o ato: homicídio; o motivo do ato: odiar o irmão. • 1Samuel 15.23: o pecado de rebelião contra Deus equiparado ao de feitiçaria; o pecado de hostilizar os outros, igualado ao de idolatria. Naquele dia, nossas obras, nosso trabalho, nosso serviço e nosso viver aqui e agora serão testados “pelo fogo” do justo julgamento de Deus (1Co 3.13; Rm 2.16). f) “Eu sei as tuas obras”: sete vezes (e não seis) Jesus faz essa declaração às igrejas em Apocalipse 2.2,9,13,19; 3.1,8,15. É muito solene isso, vindo da parte do Senhor! g) Apocalipse 14.13: é também muito solene o que vai aqui declarado pelo Espírito Santo: “Bem-aventurados os mortos que, desde agora, morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem dos seus trabalhos, e as suas obras os sigam”. Daí, é lucro o crente morrer “no Senhor” (Fp 1.21). 2. O que será julgado do crente no tribunal de Cristo No tribunal de Cristo, estarão em julgamento: 1) as nossas obras, isto é, nosso trabalho realizado para Deus; 2) o uso que fizemos de nosso tempo; 3) o uso de nossa liberdade cristã — como foi esse uso; 4) o uso de nossos talentos e dons recebidos de Deus; 5) nossa fidelidade ao Senhor, à sua Palavra, à sua doutrina. Ler Romanos 14.10,12; 2.16; 2Coríntios 5.10. a) Referências sobre o julgamento do crente, da igreja: 1João 4.17 “no Dia do Juízo”; 2Coríntios 5.10; Romanos 14.10,12; 1Coríntios 3.13-15; 4.5; Lucas 14.14; Apocalipse 14.13; Eclesiastes 12.14; Mateus 16.27; 25.14-30; Lucas 19.11-24; Efésios 6.8; 2Timóteo 4.8; Apocalipse 22.12. b) O crente não é salvo por suas boas obras, mas será recompensado por elas, pela graça de Deus. 24


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“Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão” (1Co 3.14). Sim, uma das razões por que Jesus vem é para dar a devida retribuição aos seus (Ap 22.12; Lc 10.35b). c) Sem exceção, todos os crentes serão julgados quanto às suas obras, seu trabalho para Deus, seu testemunho como cristão. Eu e tu também seremos julgados: • Mateus 25.19: “Veio o senhor daqueles servos e ajustou contas com eles”. • Lucas 16.2: “Presta contas da tua mordomia”. d) O estudo do crente sobre o tribunal de Cristo deve estimular o crente: • à santidade, a viver uma vida santa; • trabalhar com mais dedicação para Jesus enquanto é dia (Jo 9.4); • a trabalhar bem para o Senhor, cuidando primeiro da QUALIDADE de seu trabalho, e não simplesmente da QUANTIDADE de seu trabalho (cf. Mt 20.12). 3. Os critérios do julgamento do crente no tribunal de Cristo Esses critérios serão segundo a Bíblia. Elementos ou itens de nossa parte que serão submetidos a julgamento: a) O uso de nossa LIBERDADE cristã (Tg 2.12; Gl 5.13; Ec 11.9b) — O crente é livre para fazer ou não a vontade de Deus; porém ele responderá por essa liberdade perante o Senhor. b) A nossa FIDELIDADE a Deus (1Co 4.2; Mt 25.19,21,23; 24.25) — Somos realmente fiéis: 1) a Deus e no seu trabalho, que ele nos confiou? 2) à Palavra de Deus? 3) à igreja? 4) aos irmãos, individualmente e em grupo? 5) aos nossos tratos feitos? 6) em nossa vida funcional, como profissionais, empregados, patrões? 7) no lar: na vida doméstica, como marido, mulher, filhos? c) A QUALIDADE de nosso trabalho feito para Deus (Mt 20.116) — No ensino de Jesus, por meio dessa parábola, vemos que muitos crentes, até mesmo obreiros, trabalharão a vida 25


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toda (v. 12), porém naquele dia receberão a mesma recompensa de quem trabalhou pouco tempo. Daí, qual é: 1) a qualidade espiritual da tua pregação? 2) a qualidade do teu testemunho cristão? 3) a qualidade do teu ensino na igreja? 4) a qualidade da tua administração das coisas do Senhor? 5) a qualidade da tua vida cristã? 6) a qualidade da tua adoração e de teu louvor ao Senhor? d) O TRATAMENTO que damos ao irmãos na fé (Rm 14.10; Tg 5.9; Mt 10.41,42; Cl 3.25) — Como tratamos os irmãos, conservos na fé em Cristo? Como os consideramos? Tenhamos cuidado nesse particular, uma vez que a Graça é mais exigente que a Lei (cf. 1Jo 3.15; Mt 5.28). e) Os MOTIVOS ÍNTIMOS que no coração geram os atos (Rm 2.16; 1Co 4.5) — Nossos atos, sendo bons, mas com motivos errados, egoístas, indignos, injustos, maldosos, antibíblicos; enfim, pecaminosos, serão julgados. Deus conhece os corações. “Os fins justificam os meios.” Isso é condenável diante de Deus. Ver 2Reis 17.32,33; 2Crônicas 33.17. f) O TEMPO que tivemos nesta vida, vamos prestar contas dele — O tempo é criação de Deus, e é Deus quem no-lo concede. Ver Eclesiastes 9.10; 3.15b; Salmos 90.12; João 9.4b; Efésios 5.16; Gálatas 6.10. 4. Galardões que serão concedidos naquele dia pelo Senhor (= posições, honrarias, dotações; cf., e.g., 1Co 15.41,42) a) A coroa da VIDA (Tg 1.12; Ap 2.10) — Fiéis na provação. b) A coroa de VITÓRIA (1Co 9.24-27) — Vencedores do mundo, do pecado, da carne, do Diabo etc. c) A cora de GLÓRIA (1Pe 5.2-4) — Apascentadores. d) A coroa da JUSTIÇA (2Tm 4.7,8) — Fiéis até o fim. e) A coroa de ALEGRIA (Fp 4.1; 1Ts 2.19,20) — Ganhadores de almas. Ler Apocalipse 3.11; 22.12.

III. O Julgamento das nações e outros acontecimentos após a vinda de Cristo Um resumo desses assuntos, fatos e eventos que terão lugar após a vida de 26


Jesus, segundo as Sagradas

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Escrituras:

1. O julgamento das nações (Mt 25.31-46; Zc 14.2-10; Ap 19.11-21; Jl 3.11,12; Sl 96.13; 98.9) (Este assunto é também abordado em outros pontos deste estudo.) O estudante da Bíblia deve considerar aqui o termo “nações” no contexto profético escatológico da Bíblia, e não primeiramente à luz do contexto da ONU quanto às nações da atualidade. 2. O reino milenial de Cristo sobre a terra (Ap 5.10; 11.15; 20.4-6) Este assunto é tratado com mais detalhes no apêndice sobre as doutrinas escatológicas, mais adiante, neste estudo. a) Durante o Milênio (um período de mil anos), Satanás estará aprisionado no abismo (Ap 20.1-3). b) O final do Milênio (Ap 20.7,8; cf. 1Co 15.24,25). 3. O julgamento de Satanás e seus agentes (Ap 20.10; Mt 25.41) a) Satanás estará preso durante o Milênio, porém será solto no seu final, para julgamento e destino eterno (Mt 25.41; 2Pe 2.4; Jd 6; Mt 8.29). b) O prelúdio de seu julgamento (Ap 12.7-9; 20.7-9). c) Nesse julgamento de Satanás, serão também julgados os ímpios e rebeldes subversivos, seus súditos, oriundos do final do Milênio (Ap 20.8,9). 4. O julgamento final dos ímpios falecidos (Ap 20.11-15) a) Os ímpios falecidos de todas as épocas. Ver também Daniel 12.2; Mateus 10.28. b) Também o julgamento da Morte e do Hades (Ap 20.14). c) Também (possivelmente) o julgamento dos não-salvos vivos nascidos no Milênio (Ap 20.15; o “livro da vida” é aí mencionado). 5. Os novos céus e a nova terra (Ap 21.1,5; 2Pe 3.10-13; Hb 12.26,27; Is 65.17) a) A renovação e purificação dos céus e da terra por fogo divino, purificador, sobrenatural. 27


A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

É a remoção, por Deus, de todo o pecado e suas conseqüências sobre a terra, de todo mal, de toda impureza (cf. Gn 3.17; Dt 28.15; Gl 3.13; Nm 35.33; Ap 22.3). b) Será o pleno cumprimento da Palavra de Deus, conforme João 1.29: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. Nesse tempo, haverá perfeita harmonia nos céus e na terra (Cl 1.20, ARA). É como diz o hino sacro: “Nesse tempo, céu e terra/ Hão de ser a mesma grei”. c) Uma nova ordem mundial, divina e perfeita. Dessa nova criação e nova forma de vida, nada se sabe agora! 6. A nova Jerusalém de Deus João viu, após o Milênio, “a Santa Cidade, a nova Jerusalém, que de Deus descia do céu”, isto é, pairava acima da nova terra (Ap 21.2,10). 7. A perfeita eternidade sem fim, para os salvos (1Co 15.28b; Ap 22.3,5b) A eternidade de bem-aventurança e glória com Deus!

IV. Os propósitos da vinda de Jesus

Alguns propósitos por que Jesus virá, segundo as Escrituras: 1. Jesus virá para levar sua igreja para si (Jo 14.3; 1Ts 4.17b; cf. Jo 17.24). 2. Jesus virá para consumar a salvação do crente (Rm 8.23; 13.11; 1Pe 1.5; Hb 9.28). a) No passado, em nossa conversão, fomos salvos da condenação do pecado. b) No presente, em nossa vida cristã diária, estamos sendo salvos do domínio do pecado. c) No futuro, brevemente, quando Jesus vier, seremos salvos da presença do pecado. (Neste contexto, o pecado vem primeiro como estado, seguido do pecado como ato; é o estado que dá origem ao ato.) A consumação de nossa salvação à vinda de Jesus será sua plenitude no crente (Hb 9.28). 28


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3. Jesus virá para ser glorificado nos seus (2Ts 1.10). Afirma esta referência: a) “...quando vier para ser glorificado nos seus santos”; b) “...e para se fazer admirável, naquele Dia, em todos os que crêem”. 4. Jesus virá para glorificar sua igreja (Cl 3.4; Rm 8.17; Ef 5.26,27). Diz o v. 27 da última referência: “... igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível”. 5. Jesus virá para revelar-nos mistérios que hoje nos deixam perplexos (1Co 4.5; Rm 2.16). 6. Jesus virá para aniquilar as nações em guerra contra ele, enganadas e instigadas pelo Anticristo, em Armagedom, e julgá-las (Ap 16.12-16; 19.17-21; Mt 25.31-46; 26.64; Jl 3.2,12; Zc 14.2-10). 7. Jesus virá para estabelecer seu reino milenial de justiça e paz aqui na terra (Mt 6.10; Ap 5.10; 20.2-7; 1Co 15.25-28; Sl 72.8,11; 138.4,5; 98.9). Ver também Ezequiel 40—47. 8. Jesus virá para restaurar todas as coisas, tal como eram no princípio, quando foram por Deus criadas perfeitas (2Pe 3.10-13; Ap 21.1,5; Ef 1.10; Cl 1.20; Ec 1.4 [lit.]). a) Mateus 29.28 (lit.): “... quando, na regeneração...”. b) Atos 3.21: “... até aos tempos da restauração [lit.] de tudo...”. c) Romanos 8.19-22: libertar e abençoar a criação é um dos motivos por que Jesus virá. 9. Jesus virá para aprisionar e julgar Satanás e seus agentes (Ap 20.1,2,10; Mt 25.31; Is 14.15). Ele julgará também os anjos decaídos (1Co 6.3; 2Pe 2.4b; Jd 6). 10. Jesus virá para julgar e recompensar a todos (Sl 62.12; Ec 3.17; 12.14; Jr 17.10; Mt 16.27; Rm 2.6-12; Jl 3.1,2,12; At 17.30; Jo 5.28,29). a) Julgamento concernente aos salvos (2Co 5.10; Rm 14.10; 1Co 3.13-15; Lc 14.14; Cl 3.24,25; Ef 6.8; Ap 2.23; 14.13; 22.12). b) Julgamento concernente aos perdidos (Mt 25.31,32,34,41,46; Ap 20.12,13; 2Ts 1.7-9). 29


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11. Jesus virá para reinar eternamente com os seus (Ap 22.5; Jo 17.24; 1Ts 4.17).

V. Sinais precursores da vinda de Jesus

Jesus está voltando! Aleluia! Houve sinais precursores preditos da primeira vinda de Jesus — seu primeiro advento a este mundo, como: • o sinal de sua estrela (Nm 24.17; Mt 2.2); • o sinal de seu arauto (Is 40.3; Ml 3.1; Mc 1.2-4); • o sinal de sua cidade natal (Mq 5.2; Mt 2.4-6; Lc 2.4,11,15). Há também sinais precursores preditos, da segunda vinda de Jesus. Vejamos alguns desses sinais, segundo as Sagradas Escrituras: 1. O derramamento do Espírito Santo sobre a igreja em todo o mundo a) Joel 2.28,29: “Derramarei o meu Espírito sobre toda a carne”, disse o Senhor. Isso fala de grande abundância do Espírito. b) Atos 2.17: “E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, que do meu Espírito derramarei sobre toda a carne...”. Esse derramamento do Espírito Santo é para hoje; é para agora; é para aqui; é para todos os salvos. 2. A restauração da nação de Israel (Lc 21.29-32) a) É o sinal da “figueira brotando”, do qual Jesus falou (v. 29a). b) O retorno dos judeus à Terra Santa está incluso nesse sinal (Is 11.12; 27.12; Ez 37.1-10; Am 9.14,15). 3. A multiplicação da ciência e da tecnologia (Dn 12.4) a) Nestes últimos 100 anos, são tantos os inventos científicos, em todos os campos imagináveis, e tão avançada sua tecnologia que causam pasmo, surpresa e deslumbramento a todos que disso tomam conhecimento. b) Observe-se que esse sinal fala de multiplicação da ciência; 30


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não multiplicação da sabedoria, a qual continua em decréscimo nestes tempo do fim, entre o povo em geral, de todas as idades. 4. O progresso e a projeção internacional das nações do Oriente a) Lucas 21.29: “todas as árvores” é uma metáfora das nações do mundo bíblico. b) Apocalipse 16.12: “o caminho dos reis do Oriente”. c) Jeremias 48.47; 49.6,39: a elevação de “Moabe”; de “Amom”; de “Elão”. 5. A multiplicação de guerras, guerrilhas, terremotos, sinistros, catástrofes e pestes entre as nações (Mt 24.6-8; Lc 21.11) Terrorismo internacional. Atentados. Guerras civis. O conflito árabeisraelense. Violência urbana organizada. Pestes (como a AIDS) etc. 6. Os conflitos da massa trabalhista e suas reivindicações por “direitos humanos” (Tg 5.1-4) a) As gestões, cobranças, reivindicações e protestos das massas visam apenas aos “direitos do povo”; não se fala em “deveres do povo”. b) Observe-se o sentido literal de Lao/ dicéia, em Apocalipse 3.14. (Ela foi a última das sete igrejas do Apocalipse: isso é sintomático.) c) Nesses tais “direitos humanos”, há muito de abusivo, lesivo, injusto, errado e antibíblico para o cristão. 7. A proliferação do satanismo, quase sempre camuflado, e seus efeitos malignos (1Tm 4.1; Mt 24.11; Ap 21.8; 22.15) a) Falsas seitas; falsas doutrinas; falso louvor e adoração. Exemplo: A Nova Era, uma religião filosófica e ocultista. Ler 1João 2.18; 4.3. b) Doutrinas falsas dentro da igreja (2Pe 2.1,2; At 20.28-31; 2Tm 4.3). A falsificação dos dons espirituais. c) Falsos mestres dentro da igreja (2Pe 2.1). Isso torna seu falso ensino mais sutil, mais atraente e mais convincente, pelo fato de serem mestres. 31


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8. A multiplicação do hedonismo como filosofia de vida na atual sociedade (Lc 17.26-30) O hedonismo afirma que a felicidade humana está somente no prazer e que não importa o meio, o modo ou como obter tal prazer. 9. A falsa segurança entre as nações (1Ts 5.1,3) Esse é outro sinal da volta de Cristo. “Quando disserem: Há paz e segurança...” (v. 3). São os homens que declaram isso, não Deus. É, portanto, falsa paz. 10. A crescente incredulidade do povo em geral, mascarada no religionismo (Lc 18.8; 2Tm 3.1,5; 2Ts 2.3) Esse é outro sinal da volta de Cristo. a) 2Timóteo 3.1,5: “... tendo aparência de piedade”. Isso só pode ocorrer na igreja, na vida religiosa das pessoas. b) 2Tessalonicenses 2.3: “... sem que antes venha a apostasia”. Apostasia é o abandono da fé em Deus, o que só pode ocorrer na igreja.

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Apêndice 1 AS DOUTRINAS ESCATOLÓGICAS Introdução às doutrinas escatológicas

As doutrinas escatológicas dão-nos uma visão geral das coisas futuras, segundo a revelação divina — a Bíblia. Essas doutrinas são as mais difíceis das Sagradas Escrituras. Devem ser estudadas por último, pelo estudante da Bíblia, uma vez que pressupõem um prévio e abalizado conhecimento, pelo crente, dos demais grupos gerais de doutrina da Bíblia: as doutrinas da salvação e as doutrinas da fé cristã. A doutrina central e principal da escatologia é a vinda de Jesus.

I. As principais doutrinas escatológicas 1. A doutrina da morte e do estado intermediário dos salvos e perdidos (Hb 9.27; Rm 5.12; Gn 3.19) a) O estado dos salvos que morrem hoje (2Co 5.8; Fp 3.21; Sl 116.15; Ap 14.13; Lc 16.22). b) A morte para quem morre em Cristo é lucro (Fp 1.21; 1Ts 4.16). c) O estado dos perdidos que morrem hoje (Hb 9.27; Lc 16.22-25,28; Mt 10.28). d) A morte como agente hoje (cf. 1Co 15.55-57) e futuramente (1Co 15.26). e) Biblicamente, “morte” não significa extinção do ser humano, mas separação: • Separação entre o corpo e a alma — morte física. • Separação entre o homem e Deus, nesta vida — morte espiritual. • Separação eterna entre o homem e Deus, na outra vida — morte eterna, também chamada na Bíblia “segunda morte”. 2. A doutrina da vinda de Jesus Sua abrangência e os acontecimentos a ela relacionados, no céu e na terra. 33


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a) A vinda de Jesus é a principal e também a central doutrina escatológica. b) Principais referências bíblicas sobre a vinda de Jesus: João 14.3; Mateus 24.21,22,29,30; 25.31,32; 1Coríntios 15.51,52; 1Tessalonicenses 4.14-17; Apocalipse 1.7; 19.7-9,11-16; 2Coríntios 5.10; Romanos 14.10-12).

A doutrina da vinda de Jesus aparece esboçada neste estudo, na parte que antecede os apêndices. 3. A doutrina da ressurreição dos salvos e dos perdidos

a) A ressurreição dos mortos consiste na ressurreição do corpo, é evidente. É apenas o corpo que morre no ser humano. b) São duas as ressurreições: a dos justos e a dos injustos, havendo um intervalo de mil anos entre elas (Ap 20.5,6). Ver João 5.28,29; Daniel 12.2; Atos 24.15; Filipenses 3.11, “dos mortos” (= “de entre os mortos”). 1Coríntios 15 é o grande capítulo da ressurreição. c) A ressurreição dos justos será gloriosa e dar-se-á por grupos, segundo a Bíblia. Os grupos, “cada um por sua ordem” (1Co 15.23): • 1Coríntios 15.20,23 + Mateus 27.50-53: os justos que ressuscitaram quando Jesus morreu no Calvário são as “primícias” da ressurreição. As “primícias” prenunciam a colheita geral. Ver o tipo no Antigo Testamento em Levítico 23.912. • 1Tessalonicenses 4.16; 1Coríntios 15.52: os santos ressuscitados no momento do arrebatamento da igreja. É a colheita geral, precedida das “primícias”. • Apocalipse 20.5,6; Levítico 23.22: “as espigas caídas da tua sega” são os respigos da colheita, segundo o tipo patente do Antigo Testamento. (A história da igreja está escrita de antemão nos tipos proféticos de Lv 23.) • As passagens utilizadas como “prova” do chamado “sono da alma” dos mortos (ensinado pelos adventistas e outros mais) tratam apenas da morte do corpo físico, o corpo morto (Sl 6.5; 13.3; 115.17; 146.3,4; Ec 9.5,6; Mt 9.24; Jo 11.11-14; At 7.60; 1Co 15.51; 1Ts 4.13,14; 5.10). 34


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4. A doutrina acerca do Anticristo É também uma doutrina escatológica. a) A manifestação e atuação do Anticristo e sua carreira macabra terão lugar durante a Grande Tribulação, mas seu espírito já há muito está agindo na terra (1Jo 4.3; 2.18,22). b) Referências ao Anticristo: Apocalipse 13.1-8; 19.19,20; 20.10; Daniel 7.8,20,21,24,25; 2Tessalonicenses 2.3-9; Daniel 8.9-12,23,25; 9.26,27; 11.36-45. 5. A doutrina da Grande Tribulação sobre Israel e as demais nações da terra (os gentios) Ler Marcos 13.19, ARA; Mateus 24.21, ARA; Daniel 12.1; Jeremias 30.17; Ezequiel 20.34-38; Salmos 2; 50.4; Romanos 10.21; 11.20,27; Apocalipse 7.14. Sobre a Grande Tribulação, ver mais às páginas 20 a 22. Ela é também mencionada em outros pontos deste estudo. 6. A doutrina do reino milenial de Cristo sobre a terra — o Milênio a) Mateus 6.10: “Venha o teu reino” é a oração ensinada por Jesus, para inspiração de seu povo continuamente. Em sua plenitude, esse reino é o Milênio de Cristo sobre a terra, por mil anos. O Milênio é um reino teocrático. b) Efésios 1.10: a “dispensação da plenitude dos tempos”. É o esplendoroso reinado de Cristo aqui, com justiça e paz. c) Referências ao Milênio: Apocalipse 5.10; 11.15; 20.4-6; Salmos 72.8,11; 138.4,5; Isaías 32.15-18; Ezequiel 36.27; Zacarias 9.10; 14.9,10; Daniel 2.35,44; 2Samuel 7.12,13; Lucas 1.32,33; Atos 15.14-16; Amós 9.11,12; 1Coríntios 15.24,25; Isaías 11.4-9; 60.20-22. d) A sede do reino milenial: Jerusalém (Sl 2.6; Is 2.3; 24.23; Jr 3.17). e) A glória divina será visível aqui, no Milênio (Is 4.5; 24.23; 40.5; 66.18; cf. 1Co 2.9). Isso é algo incompreensível para nós hoje, principalmente o “homem natural” (1Co 2.14). 35


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f) No Milênio, como bem diz o hino sacro, serão sobremaneira exaltados: 1) “O nome do senhor há de ser exaltado”; 2) “A força do Senhor há de ser exaltada”; 3) “O Reino do Senhor há de ser exaltado”; 4) “A glória do Senhor há de ser exaltada”. Cf. Filipenses 2.10,11; Apocalipse 11.15-19. g) O esplendoroso Milênio ainda não será um estado perfeito. Em Apocalipse 20.2-7, ele é citado por nome somente seis vezes, e não sete vezes! 7. A doutrina dos juízos ou julgamentos divinos a) O juízo das obras do crente: • É o tribunal de Cristo, após o arrebatamento da igreja (2Co 5.10; Rm 14.12; 2.16; Ec 12.14). • O crente jamais será julgado como filho de Deus, mas o será como servo de Deus. • Critérios de Deus nesse julgamento: ver página 23. • Resultado desse juízo para o crente: recompensa divina ou perda da recompensa, parcial ou total. b) O juízo de Israel: • Referências a esse juízo: Daniel 12.1; Ezequiel 20.3344; Zacarias 13.7—14.2; Apocalipse 6.1—16.21. • O juízo divino sobre Israel ocorrerá durante a Grande Tribulação, sob os sete “selos”, as sete “trombetas” e as sete “taças”, conforme relatado no livro de Apocalipse. • Esse juízo visa, em primeiro lugar, levá-lo ao arrependimento de seus pecados, mas também às nações da terra, cada vez mais ímpias. • Resultado desse juízo: Israel se voltará para Deus, contrito, arrependido e aceitando a Jesus como o seu prometido Messias Salvador, à época de sua vinda para julgar as nações (Rm 9.27; 11.25,26; Mt 23.37-39; Zc 12.10-14; 13.1). Ver mais sobre o juízo de Israel em Isaías 10.22; Lucas 21.24; Jeremias 30.4-24; Deuteronômio 4.30; 31.29; Sofonias 3.13; 1Tessalonicenses 2.14-16; 2Tessalonicenses 2.4. 36


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c) O juízo das nações viventes aqui na terra à vinda de Jesus (Mt 25.31-46; Ap 19.11-21; Jl 3.11,12; Zc 14.2-10; Sl 96.13; 98.9). • Nesse juízo, as nações comparecerão certamente mediante seus representantes, se bem que Deus é ilimitado e tudo pode. • Nações serão poupadas para ingressarem no Milênio, e nações serão aniquiladas. Muitos indivíduos ímpios serão lançados diretamente no inferno por ocasião desse julgamento, conforme a justiça e a soberania divinas (Mt 25.41,46; cf. Is 24.5,6) • Quanto ao julgamento de Israel como povo e nação, ver Isaías 1.27 (hb. goel); 59.20 (hb. goel). d) O juízo de Satanás e suas hostes — anjos decaídos e demônios (1Co 6.3; 2Pe 2.4; Jd 6; Ap 20.10; Mt 25.41; 8.28,29). • O resultado desse juízo para eles é seu estado eterno no inferno. • Esse juízo ocorrerá após a soltura e revolta de Satanás, em seguida ao Milênio (Ap 20.7-10). e) O juízo dos ímpios mortos e também o da Morte (Ap 20.11-15; 21.4; 1Co 15.26). • Esse juízo divino é também chamado Juízo Final e juízo do Grande Trono Branco. • Resultado desse juízo: a ida dos ímpios para o inferno, para sempre e eternamente (2Ts 1.9; Mt 25.41,46). • Na Bíblia, são vários os termos originais traduzidos em português por “inferno”. O estudante da Bíblia precisa estudar isso atentamente e com temor de Deus. 8. A doutrina do perfeito estado eterno (Ap 21 e 22) a) Lucas 20.35: aqui Jesus faz menção dessa era perfeita — “mundo vindouro” (lit. aion). b) A maldição que pesa sobre a terra será removida (Gn 3.17; Ap 22.3). 37


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c) Efésios 2.7: “... para mostrar nos séculos vindouros as abundantes riquezas da sua graça”. d) A igreja do Senhor estará então em estado de glória e felicidade eterna com Deus (Mt 13.43; Cl 3.4; Ef 5.27; 1Pe 5.1b). e) Só então conheceremos e viveremos essas maravilhas, que agora não são conhecidas, mas reveladas. 9. A doutrina das dispensações e alianças da Bíblia a) Dispensação é o modo de Deus revelar-se ao homem; de tratar com o homem; de testar o estado espiritual de seu povo, em determinado espaço de tempo. É uma fase de prova moral. A dispensação está mais ligada ao elemento tempo. O termo original equivalente a dispensação acha-se em 1Coríntios 9.17; Efésios 1.10; 3.2,9; Colossenses 1.25. b) Aliança é um pacto ou concerto estabelecido entre Deus e o homem. A aliança está mais ligada ao elemento pessoa. O termo original equivalente a “aliança” ou “concerto” aparece em passagens como Mateus 26.28; Lucas 1.72; 1Coríntios 11.25; Hebreus 13.20 etc. A doutrina das dispensações e alianças diz respeito às eras bíblicas (= “séculos”), aos tempos bíblicos e aos dias bíblicos. Cf. as expressões: “ao Rei dos séculos” (1Tm 1.17, gr.); “séculos vindouros” (Ef 2.7). Cf. também o termo “dia” em 2Pedro 3.7,8,10,12,18. c) No relacionamento de Deus com o homem, no ciclo da história humana, a Bíblia trata de sete dispensações e oito alianças entre Deus e o homem.

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Apêndice 2 A IGREJA NÃO PASSARÁ PELA GRANDE TRIBULAÇÃO I. A promessa de Deus à sua igreja é de guardá-la da “ira futura”, conforme Apocalipse 6.15-17. Outras referências: Mateus 3.7; Lucas 3.7; Romanos 5.9; 1Tessalonicenses 5.9. Apocalipse 3.10 diz: “E te guardarei da hora da tentação que há de vir sobre todo o mundo”, não “na hora da tentação”.

II. Nenhuma passagem do Novo Testamento sobre a Grande Tribulação inclui a igreja como participante dela. 1. Lucas 21.35,36: “... para que sejais havidos por dignos de evitar todas essas coisas que hão de acontecer”. (“Essas coisas”, que são sofrimentos, estão nos v. 25-35.) 2. 2Tessalonicenses 2.1-11: nessa passagem profética sobre a manifestação do Anticristo neste mundo, nos tempos da Tribulação, a igreja não é mencionada. III. Nas manifestações do Espírito Santo na igreja, por meio dos dons espirituais, não se sabe de uma única mensagem profética advertindo a igreja para aguardar a Grande Tribulação, e sim para se preparar e aguardar o arrebatamento dos santos. IV. Figuras bíblicas apontando para a igreja arrebatada antes da Grande Tribulação: 1. Enoque, filho de Jarede Foi arrebatado antes do Dilúvio destruidor. O Dilúvio foi um juízo divino sobre os terríveis e impenitentes pecadores antediluvianos (Gn 5.24; Hb 11.5). 2. Ló, sobrinho de Abraão Foi milagrosamente retirado de Sodoma por Deus, mediante seus anjos, antes de a cidade ser destruída (Gn 19.1-25; 2Pe 2.7-9; Jd 7; Lc 17.32). 39


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3. José, filho de Jacó Obteve uma esposa gentílica antes de o juízo divino abater-se sobre o Egito (Gn 41.45,54). 4. Elias, o profeta Foi trasladado para o céu antes de o juízo sobrevir ao reino de Israel, que a seguir foi levado em cativeiro (2Rs 2.11).

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Apêndice 3 HAVERÁ SALVAÇÃO DURANTE A GRANDE TRIBULAÇÃO? Procura-se até agora quem forjou o falso ensino de que não haverá salvação durante o período da Grande Tribulação. I. Atos 2.19-21 Cenas da Grande Tribulação nos v. 19-21; a salvação é mencionada no v. 21 (“será salvo”). Ver a profecia original em Joel 2.32. II. Apocalipse 6.1-11 Cenas da Grande Tribulação nos v. 1-8; os salvos durante aqueles dias nos v. 10,11. III. Apocalipse 7.1-8 Israelitas salvos durante a Grande Tribulação — “os servos do nosso Deus” (v. 3). Ver também Apocalipse 14.1-5. IV. Apocalipse 7.9-17 Multidão de gentios salvos durante a Grande Tribulação: “Estes são os que vieram de grande tribulação, lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do Cordeiro” (v. 14). V. Apocalipse 15.2-5 Mais pessoas salvas durante a Grande Tribulação (a qual é descrita em Ap 6—18). VI. Apocalipse 20.4 Aqui vemos salvos que foram martirizados durante a Grande Tribulação. Esses mártires são do período de hegemonia da Besta, mencionada no versículo em questão. Ora, a Besta é uma personagem do tempo da Tribulação. VII. Conclusão Haverá salvação, sim, durante a Grande Tribulação, mas as condições espirituais serão terrivelmente adversas e difíceis, em todos os sentidos, e 41


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não como hoje, estando aqui e agora a igreja e, acima de tudo, as graciosas, poderosas e múltiplas ministrações do Espírito Santo para salvar o pecador e conservá-lo firme na fé até sua vitória final. Durante a Grande Tribulação, tremendas trevas espirituais e poderes malignos envolverão o mundo. Haverá também oposição e perseguição contra os santos, como nunca houve, pois a Grande Tribulação é o domínio do Anticristo. Haverá, sim, salvos dentre os judeus e gentios durante a Grande Tribulação, apesar de proibições, sofrimentos, perseguições e morte.

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Apêndice 4 POSIÇÕES DE CERTOS TEÓLOGOS ACERCA DA VINDA DE JESUS, TENDO EM VISTA A GRANDE TRIBULAÇÃO E O MILÊNIO I. Quanto à Grande Tribulação

Alguns desses teólogos são de escolas humanistas e liberais de interpretação da Bíblia (como se a Palavra de Deus dependesse de veredito humano!). 1. A posição pré-tribulacionista Isto é, que afirma que Jesus virá antes da Grande Tribulação. Esse posicionamento vem das Sagradas Escrituras. É isto que a Bíblia ensina; deve ser acatado e mantido. 2. A posição midi-tribulacionista Isto é, que afirma que Jesus virá na metade da Grande Tribulação. Esse posicionamento contradiz a analogia geral das Escrituras quanto à vinda de Jesus. Essa posição deve ser rejeitada. 3. A posição pós-tribulacionista Isto é, que afirma que Jesus virá após a Grande Tribulação. Esse posicionamento é ainda mais contraditório que o anterior, ante as Sagradas Escrituras.

II. Quanto ao Milênio

Há também pelo menos três escolas humanas de pensamento teológico: 1. O pré-milenismo Ensina que Jesus vem antes do Milênio, para instaurá-lo. Essa posição vem das Sagradas Escrituras; é isso que a Bíblia ensina claramente. 2. O pós-milenismo Ensina que Jesus vem após o Milênio. Essa posição contradiz a analogia geral das Sagradas Escrituras sobre o assunto em pauta. 43


A Segunda Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo / Pr. Antonio Gilberto

3. O amilenismo Ensina que não haverá Milênio nenhum, que não há nada claro e definido sobre o assunto. Essa posição vem de homens sem qualquer compromisso com Deus, com a Palavra de Deus ou com a igreja de Deus. O caso deles é querer submeter a Palavra de Deus ao seu raciocínio.

CONCLUSÃO SOBRE A ESCATOLOGIA BÍBLICA CENTRADA NA VINDA DE JESUS Verdades bíblicas fundamentais sobre a vinda de Jesus: I. João 14.3 A vinda de Jesus é uma promessa garantida por ele mesmo, como vemos neste versículo. Ver também João 21.22; 1Coríntios 11.23,25; Apocalipse 3.11. II. Tito 2.13 A vinda de Jesus é uma esperança feliz: Feliz porque é uma esperança viva (1Pe 1.3). Feliz porque é uma esperança com salvação (Rm 8.24). III. 1João 3.2 A vinda de Jesus é uma realidade concreta. Ler Atos 1.9-12: assim como foi real a cena relatada nessa passagem — a ascensão de Jesus —, será também real a sua volta. Nem toda realidade é concreta; quanto à vinda de Jesus, ela é uma realidade concreta. IV. 2Timóteo 4.8 A vinda de Jesus é um acontecimento para ser analisado, não apenas para ser aguardado. Quem ama espera com paciência, não esquece e é fiel. V. 1Tessalonicenses 5.23 “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo.” 44


Pr. Wagner T. dos S. Gaby TEOLOGIA PASTORAL

Pastor Vice-Presidente da Assembléia

de Deus em Curitiba, Major Capelão do Exército Brasileiro, Advogado,Bacharel em Teologia, Escritor, Membro da Academia Brasileira Evangélica de Letras e Membro da Casa de Letras Emílio Conde da CGADB.

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A Família do Pastor na Ótica Ministerial / Pr. Wagner Tadeu dos Santos Gaby

INTRODUÇÃO

Nenhuma atividade na vida exige tanta identificação da família com o líder quanto ser pastor. Se alguém é advogado, exerce sua função sem que a família seja envolvida diretamente; se é engenheiro, a família não é solicitada a participar da atividade do pai; se é médico, a família também não se envolve diretamente na profissão; enfim, se é comerciante, industrial, professor, militar, piloto, geralmente a família é mantida a distância das atividades do dia-a-dia do pai. Se alguém é pastor, no entanto, a família é solicitada a envolver-se de uma forma ou de outra nas atividades dele. O pastor muitas vezes tem tempo para a igreja, mas para sua família somente se sobrar (Ct 1.6). Contudo, mais importante que o ministério é a família: Deus  Família  Igreja (ministério) É preferível manter a família unida e bem servida que servir ao Senhor com uma família fragmentada, desunida e carente de equilíbrio relacional e espiritual. O apóstolo Paulo, escrevendo a Timóteo, declara: “Se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente” (1 Tm 5.8). A responsabilidade para com a família é um dever cristão. O pastor, por sua vez, deve atentar bem para essa responsabilidade.

I. A

família do responsabilidades

pastor

em

face

de

suas

múltiplas

1. A igreja espera que o pastor conduza seu lar como padrão para todos os crentes (Tt 2.7), independentemente de suas obrigações e responsabilidades ministeriais. 2. O lar do pastor deve ser um modelo para o lar dos membros de sua igreja. 3. A ordem, a paz, a harmonia, o trabalho e santidade devem imperar no lar do pastor. 4. O lar do pastor deve ser um verdadeiro santuário, onde os filhos cultuam a Deus, onde a esposa louva a Deus com sua vida plena de ideais, onde o pastor se acerca de Deus como a Fonte perene de seu ministério e se deleita em seu poder e em sua graça. 49


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II. A família do pastor e os limites impostos pela sociedade 1. O que se espera da esposa do pastor As igrejas esperam muito da esposa do pastor. Muitas vezes, situamna em contextos que não lhe permitem agir com liberdade, criando situações em que lhe é impossível sentir-se à vontade ou segura. a) Esperam que ela seja uma pastora auxiliar — Via de regra, Deus chamou o marido para o pastorado, e exige isso dele, não dela. A esposa do pastor não tem a chamada para servir à igreja como extensão do ministério do marido. Não podemos nos esquecer de que ela foi chamada para ser uma ajudadora idônea do marido, e não da igreja! Quando um pastor é convidado a assumir uma igreja e seu salário é definido, não existe nenhum documento, nenhuma cláusula que estabeleça um salário para a esposa. Conseqüentemente, a igreja tem de reconhecer que suas exigências devem ser feitas ao pastor, e não à esposa dele. A igreja pode exigir do pastor visitas pastorais, melhoria na administração, maior empenho na pregação, mais dedicação ao ensino. Entretanto, não pode exigir nada da esposa. A esposa do pastor não é pastora auxiliar, e sim outro membro da igreja. Portanto, ela precisa ser vista dessa forma. Todavia, há esposas de pastores chamadas e capacitadas por Deus para prestar um grande auxílio ao ministério do marido na obra do Senhor. b) Esperam que ela seja uma santa — Alguns membros da igreja parecem não perceber que, mesmo sendo a esposa do pastor, ela é um ser humano como qualquer outro: • • • •

experimenta desgosto; fica irada; às vezes se comporta de maneira censurável; necessita de muita compreensão e amor.

O status de esposa de pastor nem sempre a coloca em lugar de privilégio e honra, mas na maioria das vezes essa condição a priva do direito de sua identidade, de sua individualidade. 50


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A esposa do pastor não é uma estátua de gesso numa vitrine. Por essa razão, “não deve agir com hipocrisia para satisfazer uma igreja insatisfeita e sem consideração”. c) Esperam que ela nunca se queixe — As pressões sobre o pastor, fatalmente refletirão na esposa. As pressões ministeriais produzem tensões, ansiedades e depressão. Os membros da igreja podem ver o sorriso disfarçado nos lábios de seu pastor, mas é a esposa que vê suas lágrimas e escuta suas queixas. Se o marido dedica quase todo o tempo à igreja e suas famílias, é compreensível que ela exija tempo para si e para seus filhos. Muitos pastores cometem esta falta: descuidam-se da esposa e dos filhos, dedicando todo o seu tempo e atenção ao ministério. Vejamos o que diz o texto sagrado: “... me puseram por guarda de vinhas; a vinha que me pertence não guardei” (Ct 1.6). Poderíamos fazer a seguinte paráfrase desse texto: “Puseram-me para cuidar dos membros da igreja, e de minha própria família descuidei”. 2. O que se espera dos filhos do pastor Na igreja, qualquer criança pode brincar, rir, ir diversas vezes ao sanitário, fazer travessuras... mas os filhos do pastor não podem. Sempre aparece um diácono ranzinza para dizer: “Você é filho do pastor, tem que dar bom exemplo!” As igrejas em geral exigem demasiado dos filhos do pastor. Houve tempo em que o pastor não se atrevia a enviar os filhos para a universidade, por temer as murmurações. A família do pastor é vulnerável aos ataques, aos ciúmes, às críticas e às murmurações. Muitas igrejas gostariam de ver os filhos do pastor como anjos, querubins ou figuras de ornamentação.

III. A família do pastor e seus questionamentos 1. A esposa: o conceito que ela tem de si mesma A esposa do pastor não pode ser ninguém mais que ela mesma. Antes de tudo, tem de buscar a felicidade de sua família e a estabilidade de seu casamento. 51


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a) A esposa inativa — É muito comum em algumas igrejas alguém dizer: “A esposa do pastor é inativa”; “Ela não faz nada”; “Ela não ajuda o marido”. As outras irmãs da igreja podem continuar caladas, não ensinar na escola dominical, não pregar, não atuar como dirigente do círculo de oração, não reger ou cantar no coral... e ninguém comentará nada. Mas quando se trata da esposa do pastor, não há boca que resista permanecer calada. Mesmo que ela não ocupe cargo na igreja, não deve ser criticada, porque o mais importante é sua presença, seu apoio, sua contribuição para o trabalho do marido e sua cooperação na igreja. Entretanto, até onde for possível, ela deve acompanhar o marido a certos lugares, em reuniões, nas visitas pastorais. Se ela não fizer isso, outra irmã o fará. Isso poderá ser motivo de ciúmes e murmurações. b) A esposa ativa — Mesmo não recebendo salário nem ofertas, ela sente o peso do ministério que o marido e se esforça para ajudá-lo. Por isso, ajuda-o a levar a carga. Uma esposa assim garantirá o ministério do marido por muitos anos. Ela não busca recompensa, mas o bom êxito do marido e o triunfo do evangelho. Esse tipo de esposa: • • • • •

prega; ensina; dirige; aconselha; faz visitas a lares, hospitais e presídios.

O mais importante é reconhecer seu lugar e não explorar o privilégio que lhe foi concedido de ser a “primeiradama da igreja”. A esposa sábia e prudente busca servir, e não ser servida. Na ausência do marido, ela sabe trabalhar mantendo a humildade e a consideração para com os demais líderes da igreja. 52


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c) A esposa demasiado ativa Esse tipo de esposa quer fazer tudo e controlar tudo. Esse comportamento é desaconselhável porque dessa maneira ela fará sombra às pessoas que desejam exercer outros ministérios na igreja. Muitas vezes ela coloca em dificuldade a autoridade de seu marido, comprometendo o ministério do pastor. A participação excessiva da esposa do pastor pode contribuir para o distanciamento entre a congregação e seu marido, levando a igreja a reagir contra ela. (O texto a seguir foi adaptado do livro Mulher sem nome, de Nancy Gonçalves Dusilek [São Paulo: Vida, s.d.]). Em casos extremos, por causa das atitudes da esposa para salvar o casamento, o pastor se vê forçado a renunciar ao cargo. Muitos livros e artigos têm sido escrito sobre os pastores: seu ministério; preparação; sucessos; fracassos; esgotamento; relacionamento com a congregação; deveres familiares. Mas a esposa do pastor, que de maneira indireta recebe metade das pressões que recaem sobre o marido, não recebe o reconhecimento nem a atenção que merece. As esposas de pastores são verdadeiras “heroínas anônimas”! Uma das atitudes mais difundidas no meio evangélico é apresentar o pastor fulano de tal e sua esposa. Até quando o casal é designado para missões e são feitas as famosas despedidas, fala-se sempre em “nosso querido pastor Fulano de Tal e sua esposa”. A esposa de pastor parece, realmente, uma pessoa a quem esqueceram de dar um nome quando ela nasceu nessa nova família — a dos pastores. É raro pronunciarem seu nome. Mesmo quando ela vai falar ou cantar, alguns irmãos, em sua displicência inocente, apresentam a oradora ou solista dizendo de quem ela é esposa, falando sobre seus estudos, o que irá falar ou cantar, mas não dizem seu nome. É uma mulher sem identidade própria. Vive como uma sombra do marido. 2. Os filhos Os filhos de pastor estão sujeitos a sofrer com: a) omissão dos pais (marcas indeléveis); 53


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b) tratamento inadequado; c) expectativas irreais.

IV. A família do pastor e seus direitos socioafetivos

O pastor, na condição de marido e pai, dá testemunho de sua fé assistindo sua família — esposa e filhos. É sua responsabilidade satisfazer as necessidades de seus entes queridos. 1. Necessidades espirituais a) O pastor tem de ser sacerdote no templo, diante da congregação, e em casa, para os filhos e a esposa. b) Sua família tem de constatar que o marido e pai que mora com eles é tão espiritual quanto o que pastoreia a igreja. c) O pastor como chefe de família deve ajudar a suprir as necessidades espirituais da esposa e principalmente dos filhos. 2. Necessidades sociais O pastor: a) deve se interessar pela vida social dos filhos; b) deve participar de suas atividades, como o primeiro dia de aula, um dia de visita à escola, alguma atividade da qual o filho participe ou quando ele for receber um diploma; c) deve sair de férias com a família para se divertir com ela (lazer). 3. Necessidades psicológicas a) Os filhos passam por situações emocionais, experimentam mudanças biológicas e psicológicas. b) Os filhos necessitam de que os pais os acompanhem nesses momentos de pressões juvenis e os auxiliem quando se sentirem sufocados pelas outras pressões da vida. 4. Necessidades econômicas Muitos pastores têm os piores salários da sociedade. Por amor ao ministério, não trabalham em outra coisa e não têm uma igreja que os possa ajudar de maneira digna (1 Tm 5.17,18). Por esse motivo, a família passa por dificuldades econômicas. Muitas vezes, o pastor não tem dinheiro para a roupa dos filhos. Todo pai deve ser o provedor de sua família. 54


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V. A

família do pastor e seus direitos como membros da igreja

No exercício do ministério pastoral, o pastor é o líder da igreja. Entretanto, seu ministério ficará mais completo se sua esposa e filhos puderem ajudá-lo. Sua família não deve ter privilégios, mas também não pode ser discriminada.

VI. O pastor e seu débito para com a família

Enquanto outros maridos e pais dedicam mais tempo às suas famílias, a família do pastor sofre por falta de atenção e de amor (graças a Deus que nem todos procedem dessa maneira!). O pastor que também é marido e pai às vezes se envolve tanto nas exigências do ministério que ignora os apelos de atenção que seus filhos lhe fazem. O pastor muitas vezes tem tempo para a igreja, mas não para a família!

VII. Como a igreja deve encarar a família do pastor 1. O que a esposa do pastor espera da igreja A esposa do pastor vem para a igreja trazendo muitas esperanças no coração. Muitas esposas de pastores sentem-se satisfeitas com a congregação; outras jamais se sentirão satisfeitas. a) A esperança da consideração — Todo ser humano gosta de consideração. Porém, deve ser estabelecida uma linha divisória entre as considerações verdadeiras e os privilégios. Entre as expectativas legítimas, podemos listar: • A esposa do pastor deve ser digna de consideração. • Os membros da igreja não devem tomar-lhe o tempo do marido com coisas triviais, que não levam a nada. Há membros da igreja que vivem incomodando o pastor, pedindo-lhe que faça coisas que eles mesmos poderiam fazer. Há muito abuso nesse particular, conseqüência de distorções 55


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no entendimento do ministério pastoral. Há irmãos que transformam o pastor em motorista de táxi, agente imobiliário, motorista de ambulância e vários outros ofícios. A igreja deve respeitar o tempo que o pastor dedica à sua esposa e à sua família. • Há igrejas que não pagam salário ao pastor nem lhe dão nenhum tipo de auxílio. A Palavra de Deus, porém, é bastante clara nesse aspecto (1 Tm 5.18). Nesse caso, a esposa do pastor necessita de bem mais consideração. Infelizmente, algumas esposas de pastores alimentam expectativas ilegítimas, como as que reivindicam privilégios para si por conta de seu status quo. b) A esperança de felicidade — Certa irmã costumava dizer: “Nunca me passou pela mente que ao me tornar esposa de pastor eu fosse ser enterrada viva”. É dever da igreja empenhar-se para que o pastor e sua esposa se sintam felizes. Não existe coisa pior que alguém realizar um trabalho desgostoso, incomodado e de má vontade. O pastor necessita de férias, e a igreja deve permitir que ele as goze. Também não se deve esperar o Dia do Pastor para sentar o casal no púlpito, dedicar-lhes alguns hinos, um programa improvisado e dar-lhe alguns presentes. Um pastor, certa vez, fez a seguinte declaração, em tom de desabafo: “Como esses irmãos são hipócritas! Dãome alguns presentes naquele dia e no restante do ano só dão desgosto, a mim e à minha esposa”! c) A esperança do amor — É grande o número de igrejas que amam seu pastor, mas relutam em aceitar a esposa dele. Os mais indelicados dizem: “Pastor, amo o irmão no Senhor, mas não engulo sua esposa nem com água”. Tais pessoas não fazem idéia de quanto estão ferindo os sentimentos de um homem de Deus. O amor para com a esposa do pastor deve ser genuíno, não fingido nem aparente. 56


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De igual forma, espera-se que a esposa do pastor seja amorosa como uma verdadeira serva de Deus. Ela deve ser uma mulher: • agradável; • que inspire confiança; • com quem as pessoas tenham prazer em conversar. Ela nunca deve ser: • • • • • •

problemática; antipática; de caráter agressivo; malcriada; respondona; a causadora dos problemas.

d) A esperança de compreensão — Qualquer pessoa pode faltar a um culto. Quando essa pessoa falta, seu nome é mencionado e a igreja ora por ela. Mas se a esposa do pastor falta a uma reunião ou a um culto de adoração, não falta quem murmure por sua ausência. Se o marido anuncia que ela está enferma, os crentes devem visitá-la ou ligar para ela. Isso ajuda a demonstrar que ela faz muita falta à igreja. e) A esperança de sinceridade — Rara é a igreja, por mais “espiritual” que seja, que não murmure às escondidas do pastor, de sua esposa e de sua família. O tema de muitas fofocas é “ela”. A maioria dos que falam dela não a conhece. A esposa do pastor espera encontrar crentes sinceros na igreja. f) A esperança de amizade — A esposa do pastor deseja ter amizades sinceras na igreja. Contudo, há muitos crentes que buscam sua amizade para interrogar, especular e intrometerse em assuntos do pastor. A posição da esposa do pastor é muito delicada: não lhe é permitido ter a língua “afiada” nem revelar os segredos do marido. Daí a necessidade de escolher suas amigas com cuidado e com muita sabedoria. 57


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Ela precisa ter cuidado com: • • • •

o que diz; quando diz; como diz; diante de quem diz.

2. Os filhos do pastor carecem do amor da congregação a) Os membros da igreja devem ser menos exigentes com os filhos do pastor. Isso não significa que tenham de ser excessivamente tolerantes, mas que os tratem da mesma forma em que gostariam fossem tratados os próprios filhos. b) A igreja deve tratá-los com consideração e apreço. c) As pressões que o pastor recebe em seu ministério podem recair sobre os filhos. d) Em vez de tentar transformar os filhos do pastor em criançasmodelo, a igreja deve proporcionar-lhes alegrias e incentivos.

Conclusão

Caro companheiro de ministério, sua família é um bem inalienável! Lembre-se desta advertência: família não se terceiriza, se investe. “Se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente” (1 Tm 5.8). Não esqueça o principal Conta a lenda que certa vez uma mulher pobre, com uma criança no colo, ao passar diante de uma caverna escutou uma voz misteriosa, que lá de dentro dizia: — Entre e apanhe tudo que você desejar, mas não esqueça o principal. Lembre-se, porém, de uma coisa: depois que você sair, a porta se fechará para sempre! Portanto, aproveite a oportunidade, mas não esqueça o principal. A mulher entrou na caverna e lá encontrou muitas riquezas. Fascinada pelo ouro e pelas jóias, pôs a criança no chão e começou a juntar ansiosamente tudo que podia em seu avental. A voz misteriosa, então, falou novamente: — Você só tem oito minutos. Esgotado o tempo, a mulher, carregada de ouro e de pedras preciosas, correu para fora da caverna, e a porta se fechou. Lembrou-se ela, então, de que a criança ficara lá dentro e que a porta estava fechada para sempre! 58


A Família do Pastor na Ótica Ministerial / Pr. Wagner Tadeu dos Santos Gaby

A riqueza durou pouco, mas o desespero foi para a vida inteira. O mesmo pode acontecer conosco. Temos muitos anos para viver neste mundo, e uma voz sempre nos adverte: “Não esqueça o principal!”. E o principal são os valores espirituais, a oração, a vigilância, a família, os amigos, a vida! Mas a ganância, a riqueza e os prazeres nos fascinam tanto que o principal vai ficando sempre de lado. Assim, esgotamos nosso tempo aqui e deixamos de lado o essencial: os tesouros da alma. Que jamais nos esqueçamos de que a vida neste mundo passa rápido e que a morte pode chegar inesperadamente. E, quando a porta dessa vida se fechar para nós, de nada valerão as lamentações. Portanto... que jamais esqueçamos o principal!

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Pr. José Alves Doutrinas Bíblicas Presidente

da Igreja Assembléia de Deus em Paranaguá PR, Bacharel em Teologia, Pedagogo e pós-graduado em Didática do Ensino Superior e Metodologia Científica, escritor de vários livros teológicos. Tem exercido o ministério eclesiástico desde a sua chamada há 35 anos, pastoreando várias igrejas no Paraná, bem como exercendo cargo executivos nas Convenções Estadual e Nacional. 61



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Doutrinas Bíblicas, Usos e Costumes / Pr. José Alves

Introdução

A palavra “doutrina” significa “ensino”. Vem do latim doctrina, cuja forma verbal é docere, “ensinar”. O termo tem sentido geral, podendo referir-se a qualquer tipo de ensino, como também pode indicar um assunto específico, por exemplo: “doutrina da Salvação”; “doutrina dos anjos”. Segundo os melhores dicionários, doutrina é o complexo de ensinamentos de uma escola filosófica, científica ou religiosa; disciplina ou matéria a ser ensinada. O termo “doutrina”, portanto, pode aludir aos ensinamentos de Cristo ou ao sistema de ensino cristão. São os rudimentos da fé cristã. É método, disciplina, ensino, instrução. As doutrinas da Bíblia estão relacionadas em grande escala, de modo que às vezes é difícil estudá-las em ordem cronológica. Contudo, na apostila que você tem em mãos queremos dar um vislumbre de algumas dessas doutrinas. Esperamos que cada aluno tenha uma leve compreensão do assunto que vamos estudar nesta EBO. Estudaremos também a distinção entre doutrina e costumes, visto que um número considerável de pessoas confunde os termos, como se ambos fossem equivalentes. Não há como questionar a destinação existente entre esses conceitos, aplicados ao dia-a-dia da vida da igreja. O assunto “Doutrina, usos e costumes”, apresentado nesta apostila, está de acordo com as orientações dadas pelas Assembléias de Deus no Brasil, para o modus vivendi, isto é, a conduta dos crentes na sociedade em que vivemos, uma vez que em outros países não são seguidas as mesmas regras ensinadas em nosso país. Uma breve relação de doutrinas analisadas nesse estudo, em número de dez: • • • • • • • • • •

Doutrina das Escrituras; Doutrina de Deus; Doutrina de Jesus Cristo; Doutrina do Espírito Santo; Doutrina do homem; Doutrina do pecado; Doutrina da salvação; Doutrina da igreja; Doutrina dos anjos; Doutrina das últimas coisas.

Abordaremos também questões relativas a princípios, usos, moda, regras e costumes. 65


Doutrinas Bíblicas, Usos e Costumes / Pr. José Alves

Doutrinas no conceito bíblico Doutrina é o conjunto de ensinamentos que serve de base no tratamento de Deus com o homem, numa determinada dispensação. As doutrinas têm bases no próprio texto bíblico e em geral não são encontradas num único versículo, mas são parte do contexto doutrinário da dispensação em que vivemos. A doutrina varia com as dispensações. Varia também entre o os judeus e os gentios, como na guarda da Lei. Exemplo: o sábado — na graça, não somos obrigados à guarda de dias quaisquer (1 Co 14.5-7; Cl 2.16). Quanto à origem, a doutrina pode ser: • De Deus: quando contidas na Bíblia Sagrada e em perfeita harmonia com o contexto doutrinário da dispensação vigente. • Dos homens: a doutrina dos fariseus, por exemplo (Mt 16.12; Mc 7.7; Ef 4.14). • De demônios: falsas doutrinas que vêm sorrateiramente, urdidas de enganos e vãs sutilezas (2 Ts 2.3; 1 Tm 4.1; Jd 4,8,10-13,17-19).

I. Doutrina da inspiração das Escrituras

Inspiração é a influência do Espírito de Deus sobre a mente dos escritores da Bíblia, que registraram por escrito uma revelação divina progressiva, suficiente quando tomada de seu conjunto e interpretada pelo mesmo Espírito que os inspirou a dirigir cada inquiridor a Cristo e à salvação. 1. A inspiração das Escrituras não é um fenômeno da natureza nem um capricho psicológico, e sim o efeito da operação interior do Espírito divino (2 Tm 3.16,17). 2. A inspiração das Escrituras não é uma influência sobre o corpo, mas sobre a mente do escritor. Deus garante seu fim, não por meio da comunicação exterior ou mecânica, mas despertando os poderes racionais do homem. 3. Os escritos humanos inspirados são registro de uma revelação (2 Pe 1.20,21). 4. Tanto a revelação quanto os registros são progressivos. Nenhum deles é completo no seu início. 5. Os escritos bíblicos devem ser considerados em conjunto. Deve-se ver cada parte em conexão com a que a precede e com a que se segue (texto e contexto). 6. Para conhecermos a verdade, o mesmo Espírito que fez as revelações originais deve interpretar seu registro. 66


Doutrinas Bíblicas, Usos e Costumes / Pr. José Alves

7. Assim empregados e interpretados, esses escritos são suficientes, em qualidade e em quantidade, para seu propósito religioso. A inspiração das Escrituras não tem por fim fornecer um modelo de história ou de fatos da ciência, mas conduzir-nos a Cristo e à Salvação (Rm 15.4). 8. A inspiração deve ser definida não por seu método, mas por seu resultado. 9. A inspiração pode incluir a revelação, a comunicação direta da verdade de Deus que o homem não poderia atingir por força própria. 10. A inspiração pode qualificar o pronunciamento oral da verdade, a liderança sábia e atos ousados.

II. Doutrina de Deus (teologia)

Quando falamos em doutrina de Deus, estamos nos referindo ao estudo de Deus em sua pessoalidade, nome, natureza, atributos, verdade, amor e santidade. A palavra “Deus” tem muitos sentidos. No mundo pagão, qualquer coisa que alguém considere ser de máxima importância em sua vida, cujo poder julgue ser grandíssimo é um “deus”. É possível alguém ter muitos deuses (ídolos; o deus deste século). Quando o cristão fala em Deus, quer dizer o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó, o Deus Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o “Deus da Bíblia”. Deus tem diferentes nomes na Bíblia. É chamado “Senhor”, “TodoPoderoso”, “Senhor Deus”, “Criador”, “Pai celestial”, “aquele que nos fez”. O nome é uma das mais fortes evidências da personalidade de um ser. Um dos nomes mais importantes pelos quais Deus se tem feito conhecer em seu relacionamento com o homem é Jeová. Foi por esse nome e suas várias combinações que ele se revelou nos dias do Antigo Testamento. Tudo que o nome Jesus significa para nós Jeová significa para o antigo Israel. O nome Jeová, combinado com determinadas palavras, forma o compostos desses nomes santos, como segue: • • • • • • • •

EU SOU (Êx 3.14). Jeová Jireh: “O Senhor proverá” (Gn 22.8). Jeová Nissi: “O Senhor é nossa bandeira” (Êx 17.15). Jeová Rafah: “O Senhor que te sara” (Êx 15.26). Jeová Shalom: “O Senhor é nossa paz” (Jz 6.24). Jeová Raah: “O Senhor é meu Pastor” (Sl 23.1). Jeová Tsidkênu: “O Senhor justiça nossa” (Jr 23.6). Jeová Sabaoth: “O Senhor dos Exércitos” (Is 51.15). 67


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• Jeová Shamá: “O Senhor está presente” (Ez 48.35). • Jeová Elion: “O Senhor Altíssimo” (Sl 7.17). • Jeová Macadeshém: “O Senhor que vos santifica” (Êx 31.13). 1. A personalidade de Deus A personalidade de Deus pode ser provada não só pelo que ele é, mas também pelo que ele faz e pelos sentimentos que lhe são comuns. A declaração de que Deus é Espírito ou Pessoa diz-nos o máximo que a Palavra de Deus nos quer dar a conhecer da natureza divina. Esse conhecimento importantíssimo deixa evidente a diferença entre sua natureza e seus atributos. A palavra “pessoa”, quando se refere a Deus, não tem o mesmo sentido quando aplicada ao homem (homem = antropologia; Deus = antromorfismo). As Escrituras representam a Deus como um Ser pessoal. Pessoalidade significa poder de autoconsciência e autodeterminação. A determinação de Deus não é causada por motivos: ele mesmo é a causa. E autoconsciência é mais que consciência, mais que determinação, mais que conhecimento. Conhecemos a personalidade de Deus pelas características e propriedades que lhe são atribuídas e pelas relações que ele mantém com o Universo e com os homens. Deus é imutável. Ele permanece o mesmo quanto ao seu caráter, seu inalterável amor pela justiça. 2. Atributos absolutos ou imanentes de Deus Dentre os atributos imanentes de Deus, os mais conhecidos são: a) Deus é Espírito (Jo 4.24); b) Deus é infinito (Sl 147.5); c) Deus é eterno (Sl 90.2); d) Deus é imutável (Ml 3.6; Hb 6.18; 13.8); e) Deus é onisciente (1 Sm 16.7; 1 Rs 8.39; Sl 139.12); f) Deus é onipresente (Sl 139.1-16); g) Deus é onipotente (Sl 90.1); h) Deus é onividente (Gn 16.13); i) Deus é soberano (1 Tm 6.15; Cl 1.16); j) Deus é juiz (Gn 18.25; Jz 11.27); k) Deus é Salvador e Redentor (Jó 19.25; Sl 19.14; Is 41.14); l) Deus é Pai (Mt 6.9). 68


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3. Atributos morais de Deus Os atributos morais de Deus dizem a respeito a determinados elementos do caráter divinos, por meio dos quais ele se dá a conhecer ao seu povo, levando-o a uma plena identificação com ele. Os mais conhecidos atributos morais de Deus são: a) A veracidade de Deus (Nm 23.19); b) A justiça de Deus (Dt 32.4); c) A graça de Deus (Tt 2.11); d) A bondade de Deus (Sl 25.8; Mc 10.18); e) O amor de Deus (Jo 3.16; 1 Jo 4.8); f) A misericórdia de Deus (Sl 103.8); g) A longanimidade de Deus (2 Pe 3.15); h) A santidade de Deus (1 Pe 1.16). João apresenta três atributos característicos de Deus, quando diz que Deus é “Espírito” (Jo 4.24), “luz” (1 Jo 1.5) e “amor” (1 Jo 4.8 [ARA]). Ele não diz: “um espírito, uma luz, um amor”. Deus é Espírito porque o espírito é essencial à vida, à energia, ao amor e ao pensamento. Em uma palavra, essencial à pessoa.

III. Doutrina de Cristo (cristologia) 1. Planos eternos da criação e a cristologia Diversas são as relações entre as doutrinas incluídas na cristologia e o plano eterno de Deus. a) A encarnação do Verbo (Jo 1.1-3,14). b) A ordem ou posição lógica que a redenção e o pecado guardam entre si nos decretos de Deus (Rm 5.10; 1 Co 7.18,19; Ef 2.4,5). c) A encarnação, como parte da criação, teria ocorrido ainda que o pecado não tivesse sobrevivido (Ef 1.22,23; Hb 2.9,10). Todo o teor do Novo Testamento mostra que a encarnação teve por fim restabelecer as relações entre o homem e Deus, interrompidas pelo pecado. 69


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2. A pessoa de Cristo As Escrituras provam a humanidade de Cristo, a sua divindade e a perfeita união dessas duas naturezas em uma só pessoa. O nome Jesus é a forma grega do nome hebraico Jehoshua (Josué), do qual a forma regular nos livros históricos pós-exílicos é Jeshua (Jesus). O nome Cristo é o equivalente neotestamentário de Messias, que significa “ungido”. O título “Filho do Homem” era uma autodesignação, mais comumente usada por Jesus. Ele usou esse título mais de 40 vezes. a) A humanidade de Cristo — É claro seu registro nas Escrituras (Gn 3.15). • “Uma virgem conceberá, e dará à luz um filho” (Is 7.14). • “Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai” (Lc 1.32). • Na genealogia de Jesus, Davi, Abraão e Adão são seus antepassados (Lc 3.23-38). • Cristo, “nascido de mulher” (Gl 4.4). • Cristo “nasceu da descendência de Davi segundo a carne” (Rm 1.3). • Cristo Jesus, homem (1 Tm 2.5). • Cristo nasceu e cresceu da infância à varonilidade (Lc 2.7,39,52). b) A divindade de Cristo — É positiva e abundantemente ensinada nas Escrituras: • “... e o Verbo era Deus” (Jo 1.1). • “Deus bendito eternamente” (Rm 9.5). • A “glória do grande Deus e nosso Senhor Jesus Cristo” (Tt 2.13). • “Do Filho, diz: Ó Deus, o teu trono subsiste pelos séculos dos séculos” (Hb 1.8). • “Este [seu Filho Jesus Cristo] é o verdadeiro Deus” (1 Jo 5.20). • Jesus é a “forma de Deus” (Fp 2.6). • Jesus é o Unigênito de Deus (Jo 1.18).

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3. Atributos de Cristo a) Cristo é onipresente; b) Cristo é onipotente; c) Cristo é onisciente; d) Cristo é onividente. 4. Ofícios de Cristo a) Cristo como Profeta (Dt 18.15-19; Lc 4.16-19; At 3.22). b) Cristo como Sacerdote (Hb 3.1; 4.14; 5.5; 6.20; 7.26; 9.23,24; 10.1). c) Cristo como Rei (Ap 19.16).

IV. Doutrina do Espírito Santo (pneumatologia) O Espírito Santo é a terceira pessoa da Trindade.

1. Ele pode entristecer-se (Ef 4.30). 2. Ele é capaz de sentir ciúmes (Tg 4.5; “ciúmes” aqui vem daquele que ama, exige atenção exclusiva, adoração e fidelidade; não ardor, nem paixão, nem ira, e sim zelo). 3. Ele é capaz de sentir conosco as agonias de nossa existência (Rm 8.26,27). 4. Ele tem vontade (1 Co 12.11). 5. Ele ama (Rm 15.30). 6. Ele comissiona missionários (At 13.1-3). 7. Pode-se mentir ao Espírito Santo (At 5.3,5).

V. Doutrina do homem (antropologia) 1. O homem em seu estado original (Gn 1.26-28; 2.7). 2. Os dois elementos da natureza do homem (Gn 2.7; 1 Co 15.42-44). 3. O corpo é o elemento material do homem. 4. A alma é o elemento imaterial do homem. 5. O homem foi feito coroa da criação. 6. Deus dotou o homem com o livre-arbítrio e deu-lhe poder sobre todas as coisas criadas. O homem, porém, escolheu o que era mau aos olhos do Criador. 7. O homem pecou e arrastou a raça humana para esse abismo sem fim (Rm 5.12; Ef 2.3). 71


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VI. Doutrina do pecado (hamartiologia) 1. Conseqüências para a raça humana a) A herança da corrupção moral de Adão (1 Rs 8.46). b) Não há um justo na presença de Deus (Sl 143.2; Ec 7.20). c) O homem já é formado em iniqüidade (Sl 51.5). d) O pecado deixou o homem em situação deplorável (Is 1.6). e) O pecado destrói a vida humana. 2. Solução para o pecado do homem a) Cristo é a solução. b) O sangue de Cristo nos purifica de todo pecado. c) O amor de Deus nos tira da maldição do pecado. d) Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores. e) Os perdoados, agora, pertencem à família de Deus.

VII. Doutrina da salvação (soteriologia)

A doutrina da salvação é uma das mais ricas de toda a Bíblia Sagrada. É o grande dom de Deus aos homens (Ef 2.8,9; Tt 2.11). 1. Os três aspectos da salvação a) Justificação (Sl 103.12; Mq 7.18,19; Rm 3.23-26; 8.33). b) Regeneração (Jo 3.3). c) Santificação (Jo 17.17; 1 Ts 4.3; Hb 12.14). 2. Os três aspectos da santificação a) Santificação posicional (Rm 1.7; Hb 10.10; 1 Pe 1.2-4). b) Santificação progressiva (1 Co 7.1; Ap 22.11). c) Santificação absoluta (Rm 8.22,23).

IX. Doutrina da igreja (eclesiologia)

Tendo consumado a maravilhosa obra da redenção, Jesus criou a igreja para comunicá-la ao mundo. Foi essa a providência que julgo apta para distribuir com os pecadores o tesouro da salvação que lhes adquiriu com seu sacrifício. Jesus disse: “Edificarei a minha igreja” (Mt 16.16-18). 72


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1. A natureza da igreja A igreja provém da palavra grega Ekklesia e significa “reunião”, “assembléia”. É usada por Cristo tanto para indicar uma reunião ocasional de crentes para o culto (Mt 18.19,20) quanto para nomear a instituição que ele criou. a) A igreja é um organismo universal: ela é o Corpo de Cristo (Ef 4.12). b) A igreja é a Noiva de Cristo. c) A igreja é uma organização local. Essa organização é formada pelos ministros: diáconos, presbíteros, evangelistas, pastores e líderes em geral. 2. A natureza do corpo da igreja a) Religioso — Diferente da família e do Estado, cuja finalidade se restringe aos interesses temporais do homem (Jo 18.36). b) Espiritual — Para cumprir sua missão religiosa, ela só pode utilizar meios espirituais (2 Co 10.4,5). c) Ministerial — A autoridade dos ministros da igreja não é soberana nem independente, mas ministerial (Mt 20.25-28).

IX. Doutrina dos anjos (angelologia) 1. Os anjos e sua natureza a) São seres criados (Sl 148.2-5; Cl 1.16; 1 Pe 3.22). b) São seres imortais (Hb 1.14). c) São assexuados (Mt 22.30). d) Não morrem (Lc 20.36). e) São agentes pessoais, isto é, inteligentes e voluntários (2 Sm 14.20; Ap 12.12). f) Possuem inteligência e poder sobre-humanos, com limites fixados (Sl 103. 20; Mt 24.36; 2 Ts 1.7; 2 Pe 2.11). f) Os santos, embora sendo menor que os anjos, hão de julgálos (1 Co 6.3). 2. Os anjos e sua classificação a) O arcanjo Miguel (Dn 10.13; 12.1; Jd 9; Ap 12.7). 73


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b) Serafins, que significa “ardente” (Is 6.2). c) Querubins: guardavam o caminho para a árvore da vida (Gn 3.24); uma representação deles foi colocada na arca da aliança, no Santo dos Santos (Êx 25.18ss; 2 Cr 3.7-14). d) Gabriel, o mensageiro de Deus (Lc 1.19,26). e) Anjo do Senhor (Sl 37.4). f) Anjos caídos (2 Pe 2.4; Jd 6).

X. Doutrina das últimas coisas (escatologia) 1. Arrebatamento da igreja. 2. A Grande Tribulação. 3. O julgamento da igreja no tribunal de Cristo. 4. O julgamento das nações. 5. O estabelecimento do reino milenar. 6. O governo de Cristo. 7. O Juízo Final.

XI. Princípios, usos, modas, regras e costumes

Vivemos num mundo de constantes mudanças: na área social, econômica, familiar, religiosa e também no campo doutrinário. As inversões de valores têm se constituído uma incessante guerra espiritual, a qual mata mais que qualquer outro conflito sangrento que esteja acontecendo no mundo hoje. Por isso, queridos alunos, obreiros do Senhor, vamos estudar a Palavra de Deus com temor e tremor, para não sermos cúmplices da morte de alguém. Vamos ensinar a Palavra de Deus conforme ela é, sem acrescentar nem diminuir nada do que nela está escrito. A grande maioria dos cristãos está vivendo ao sabor de experiência místicas supersticiosas. Pior: nem sequer procuram investigar se o que estão experimentando consubstancia a verdade plena das Escrituras Sagradas [...] Por essas e por outras razões muito mais fortes é que precisamos tomar iniciativa de reler, reinvestigar, reanalisar e reinterpretar, ponto a ponto, todas as doutrinas bíblicas esposadas pelas Assembléias de Deus no Brasil, a fim de termos uma visão mais comprometida com a coerência e com a autenticidade das Sagradas Escrituras.1 1

Conselho de Doutrina da CGADB, Manual de doutrina das Assembléias de Deus no Brasil (Rio de Janeiro: CPAD, 2000), p. 7.

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Textos bíblicos • “No princípio, criou Deus os céus e a terra” (Gn 1.1). • “Com efeito, quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido, tendes, novamente, necessidade de alguém que vos ensine, de novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus...” (Hb 5.12 [ARA]). • “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina; persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem” (1 Tm 4.16). • “... não defraudando; antes, mostrando toda a boa lealdade, para que, em tudo, sejam ornamento da doutrina de Deus, nosso Salvador” (Tt 2.10). • “As quais coisas todas perecem pelo uso, segundo os preceitos e doutrinas dos homens” (Cl 2.22). • “Não vos enganeis: as más conversações corrompem os bons costumes” (1 Co 15.33). • “Para todo propósito há tempo e modo; porquanto o mal do homem é grande sobre ele” (Ec 8.6). • “É mandamento sobre mandamento, mandamento e mais mandamento, regra sobre regra, regra e mais regra: um pouco aqui, um pouco ali” (Is 28.10). 1. Princípio a) Definição — Ato de principiar. Causa primária. Origem. Razão fundamental. Elemento que predomina na constituição de um corpo organizado. Exemplo: “No princípio, criou Deus os céus e a terra” (Gn 1.1). b) Princípio nos parâmetros bíblicos — São bases estabelecidas por Deus para a orientação da sociedade humana, dentro das quais o homem é aceito e se relaciona com seu Criador (Rm 5.1,10; 2 Co 5.18). c) Identificação dos princípios — Os princípios: • Não mudam com os tempos ou dispensações. • Não mudam com o espaço, de lugar para lugar (Jó 28.24-26; Pv 8.29; Jr 5.22). • Não mudam com a cultura do povo (Jr 13. 23).

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2. Usos Definição: a) O uso é o emprego freqüente de alguma coisa. Ato ou efeito de usar. b) Costume, praxe (Jo 19.40; Cl 2.22). c) O uso aparece de quando em quando (Lv 19.19; Ez 44.17-19). d) O uso muda de pessoa para pessoa. e) O uso difere entre o homem e a mulher, especialmente no trajar (Dt 22.5). 3. Modas Definição: a) Moda é uso, hábito, capricho, fantasia, maneira e costumes. b) A moda vem e passa. (Cuidado: as influências ficam, e aí está o perigo!) c) É o uso passageiro que regula a forma de se vestir, calçar, pentear etc., porém tudo sem exagero (Gn 37.3; Mt 3.4). d) A moda é o estilo galante de alguém se trajar — com modéstia (2 Sm 13.18). e) Deus castiga os que usam traje estranho (Sf 1.8). f) O modo ideal de a mulher se trajar (1 Tm 2.9; 1 Pe 3.3,4). g) A moda está dentro do fenômeno social ou da cultura de um povo (e.g., os índios; os escoceses). h) Não constitui pecado a pessoa se vestir bem: o erro está no exagero. i) A moda sempre procura a imitação de alguma coisa, mas devemos ser o exemplo dos fiéis (1 Tm 4.12; Tt 2.7). j) Precisamos conservar o modelo da sã Palavra (2 Tm 1.13). k) O cristão precisa ser o “ornamento da doutrina de Deus” (Tt 2.10).

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4. Normas a) Definição • Norma é regra, conjunto de princípios que norteiam vida de uma pessoa. A Palavra de Deus é nossa única regra de fé e prática. Ela norteia nossa vida. • Normas são regras, preceitos, lei (Is 28.10,13). • Normas, no conceito bíblico, constituem-se da observação de tudo que é verdadeiro, honesto, justo, amável e de boa fama (Sl 119.5; Fp 4.8). b) Cuidados a serem observados • A Bíblia, a Palavra de Deus, já está completa, nada deve ser exigido além do que nela está escrito (Ap 22.18,19). • Precisamos evitar cair no formalismo e também no fanatismo: ambos são igualmente perigosos (Js 1.7). • Evitar extremismos (Sl 28.1; Mt 15.9; Cl 2.20-23). • Texto para reflexão: 1 Timóteo 4.6. 5. Costumes A palavra “costume”, provém do latim con (“totalmente”) e suescere (“acostumar-se com”) e indica algo a que alguém fica acostumado. O termo grego correspondente é étho, de onde vem a palavra “ética”, ou seja, a conduta costumeira de um povo. Costume é uma questão meramente humana. Os cristãos não estão comprometidos com essas coisas passageiras. a) Definição • Costume é prática habitual de proceder. • Costume, na orientação bíblica, são linhas recomendáveis de comportamento. • O bom costume requer um bom testemunho do cristão perante a sociedade. • Devemos cuidar de nosso testemunho público (Fp 2.15; 4.8). • Os costumes não estão comprometidos com a salvação. • A conduta do cristão tem influência no testemunho, e não nos costumes (Mt 5.13-16; Fp 1.10,11). 77


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b) Características Quanto aos costumes • Os costumes mudam com o tempo ou dispensações (Lc 2.42; 4.16-20). • Mudam com o espaço, de lugar para lugar (At 16.21; 21.21). • Mudam com a cultura de cada povo (Lv 18.30; 2 Rs 17.33; Jr 10.3). • Os costumes mudam com a administração dos líderes das igrejas (At 15.1-5,28-33). • Os costumes mudam com a denominação religiosa. • “As más conversações corrompem os bons costumes” (1 Co 15.33). • “A doutrina gera bons costumes, mas bons costumes não geram doutrina” (Antonio Gilberto). c) Os bons costumes quanto ao vestir • O cristão deve se vestir com decência, decoro e dignidade (1 Tm 2.9,10). • O cristão deve trajar-se com discrição, sem exagero (Pv 11.22). • O cristão precisa ter bom gosto, usar cores agradáveis, não chamativas (1 Pe 3.3-5). • O cristão deve evitar exagero, desproporção, esnobismo e uso de coisas que estão fora de seu meio social. • Para meditação: Provérbios 4.18-27; 1 Coríntios 7.35; 1 Timóteo 2.9,10. d) Cuidando bem do corpo e do asseio — Porém não é permitido: • Maquiagem com pinturas exuberantes, pintar em volta dos olhos (2 Rs 9.30; Is 59.2; Ez 23.40). • Uso de jóias extravagantes ou de bijuterias desproporcionais. • Uso de bigode exagerado e cavanhaque: Deus nos chamou para termos boa aparência. • O homem usar roupas de mulher e vice-versa (Dt 22.5).

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Conclusão É melhor obedecer que sacrificar. Toda boa dádiva vem do Pai das luzes. Deus nos escolheu para sermos um povo especial, de boas obras. Fomos feitos geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido para anunciar às virtudes daquele que nos chamou das trevas para a maravilhosa luz de Deus. Jesus afirmou que somos o sal da terra e a luz do mundo. Precisamos ter muito cuidado com as coisas do “não tem importância” porque podemos perder o sabor, e nossa lâmpada pode apagar-se para sempre. Que a graça de nosso Senhor Jesus Cristo esteja sobre todos nós. Amém!

Bibliografia Conselho de Doutrina da CGADB. Manual de doutrina das Assembléias de Deus no Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. Gilberto, Antonio. Doutrina e costumes (apostila). _________. Manual da escola dominical. Ed. At. Rio de Janeiro: CPAD, 1999. Manford, G. Gutzke. Manual de doutrina. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1970. Oliveira, Raimundo. As grandes doutrinas da Bíblia. 7. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2003. Oliveira, Raimundo. Doutrina, costumes e tradição. Rio de Janeiro: 1987 (apostila) Silva, José Alves. Coletânea de usos e costumes. 2. ed. Paranaguá: [s.n.] 2001. _________. Princípios, doutrinas, costumes e casamento misto. Paranaguá: 1995 (apostila). Strong, Augustus H. Teologia sistemática. São Paulo: Teológica, 2002. Teixeira, Alfredo Borges. Dogmática evangélica. 2. ed. São Paulo: Pendão Real, 1976.

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Pr.Ciro Sanches Zibordi Teologia SistemĂĄtica Pregador do Evangelho de Cris-

to; pastor na AssemblĂŠia de Deus em Cordovil, Rio de Janeiro; e articulista. Autor dos Livros Perguntas Intrigantes que os Jovens Costumam Fazer, Adolescentes S/A , Erros que os Pregadores Devem Evitar, Evangelhos que Paulo Jamais Pregaria, Mais Erros que os Pregadores devem Evitar. Todos editados pela CPAD. 81



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Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes.

1 Coríntios 12.1

Segui a caridade e procurai com zelo os dons espirituais, mas principalmente o de profetizar. 1 Coríntios 14.1 Não extingais o Espírito. Não desprezeis as profecias.

1 Tessalonicenses 5.19,20

Introdução

Neste estudo, analisaremos os dons espirituais quanto aos principais aspectos, classificação e finalidade. Destacaremos o uso dos dons de línguas e profecia na igreja, os dons de inspiração e o mau uso dos dons de poder.

I. Considerações iniciais sobre os dons Os termos gregos originais dõrea e charisma significam: “presente, dom espiritual ou sobrenatural da parte de Deus” (Jo 4.10; At 2.38; 8.20; 10.45; 11.17; Rm 5.15,17; 2 Co 9.15; Ef 3.7; 4;7; Hb 6.4). Também significa “dom da graça ou envolvendo a graça [charis] por parte de Deus como Doador”. Charisma é usado com várias acepções nas páginas do Novo Testamento: 1. Dotações gratuitas ao pecador (Rm 5.15,16; 6.23; 11.19). 2. Aquilo que é dado por meio de instrução humana (Rm 1.11). 3. “Dom” natural da continência (1 Co 7.7). 4. Libertações graciosas concedidas em resposta às orações (2 Co 1.11). 5. Dotações aos crentes mediante a operação do Espírito Santo nas igrejas (Rm 12.6; 1 Co 1.7; 12.4,9,28,30,31; 1 Tm 4.14; 2 Tm 1.6; 1 Pe 4.10).

II. O que são os dons espirituais 1. Os dons espirituais representam a manifestação do Espírito Santo na igreja. Eles manifestam a glória divina, edificam os crentes e 85


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atraem os pecadores. A expressão “dons espirituais” (gr. pneumatikon; lit. “espiritualidades”) não aparece em 1 Coríntios 12.1 e 14.1,12, mas está baseada no contexto dessas passagens (1 Co 12.4,9,28,30,31). 2. Os dons do Espírito Santo são capacidades, dotações sobrenaturais concedidas pelo Espírito Santo com o propósito de edificar a igreja. Por meio desses recursos, o Senhor revela poder e sabedoria aos seus servos. 3. “Dons”, em 1 Coríntios 12.31, é charisma. Já em 1 Coríntios 14.1 é pneumatikon. Apesar disso, os termos são intercambiáveis, à luz do contexto. 4. Há distinção entre os dons espirituais e o dom do Espírito, isto é, o batismo com o Espírito Santo (At 2.38; 10.45). Os primeiros são as capacidades sobrenaturais concedidas pelo Espírito Santo; o segundo é um revestimento de poder do Espírito. Deve-se distinguir ainda os dons espirituais como manifestações esporádicas e como ministérios específicos (1 Co 12.6-11; 12.28; Ef 4.11).

III. Seis aspectos bíblicos dos dons espirituais 1. Finalidade Os dons são dados para o que for útil (1 Co 12.7). 2. Atualidade Eles são para hoje, para todos os que buscam a Deus (At 2.39; Rm 11.29; 1 Co 14.1). 3. Importância Não podemos ignorá-los (1 Co 12.1; 1 Ts 5.19,20). 4. Recebimento Quem já fala em línguas, como evidência do batismo no Espírito, deve buscar os demais dons (1 Co 14.1,12,13). 5. Doador É o Senhor quem nos concede os dons espirituais, “segundo a graça que nos é dada” (Rm 12.6). 6. Uso Os dons, que são para a edificação do povo de Deus (1 Co 14.26), 86


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não devem ser mal utilizados. O mau uso deles resulta em heresias e modismos injustificáveis. Deve, pois, haver decência e ordem no culto pentecostal (1 Co 14.40).

IV. Classificação dos dons espirituais 1. Dons de elocução — dons verbais a) Profecia — É uma mensagem divina, momentânea e sobrenatural, para a igreja e por meio dela (1 Co 14.4,5,22). b) Variedade de línguas — É uma mensagem divina, sobrenatural, em línguas jamais estudadas ou aprendidas por quem as pronuncia. Tal mensagem precisa de interpretação, a menos que o Senhor queira falar com uma pessoa no idioma dela (At 2.7-13). c) Interpretação das línguas — Capacidade sobrenatural de interpretar línguas desconhecidas. 2. Dons de inspiração — dons de saber a) Palavra da sabedoria — Capacidade sobrenatural para falar, agir e “saber” em várias circunstâncias. b) Palavra da ciência — Capacidade sobrenatural para conhecer as profundezas e os mistérios de Deus (1 Co 2.9,10). c) Discernimento dos espíritos — Capacidade sobrenatural para discernir a natureza, o caráter e a origem dos espíritos. O termo original denota pluralidade: “discernimentos”. 3. Dons de poder a) Fé — Capacidade sobrenatural para crer em Deus. b) Operação de maravilhas — Capacidade sobrenatural para a realização de atos que vão além da capacidade humana. c) Dons de curar — Capacidade sobrenatural por meio da qual o Senhor cura enfermos e doentes. 4. Outras categorias de dons Eis alguns deles: governar (apóstolos, pastores etc.), exortar, repartir, presidir, exercer misericórdia, socorrer (Rm 12.7,8; 1 Co 12.28; Ef 4.11). 87


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V. Finalidades dos dons espirituais 1. Unidade da igreja Ver Efésios 1.22,23; 1 Coríntios 12.12. É antibíblico criar um trabalho ou um ministério especial em torno de determinado dom, como profecia, curas, maravilhas. Cada um deve empregar, na igreja, o talento e os dons como os receberam do Senhor, para edificação dos santos. 2. Edificação do crente em particular Ver Romanos 12.3,6; 1 Coríntios 12.31; 14.1,39. 3. Convencimento dos incrédulos Ver Atos 2.5-12,37-39; 3.10,11; 4.13; 5.24; 1 Coríntios 14.24. 4. Proclamação do evangelho Ver Marcos 16.15-20; Lucas 24.49; Atos 1.8; 1 Tessalonicenses 1.5-8.

VI. As línguas estranhas 1. Falar noutras línguas é uma das manifestações do Espírito. As línguas podem ser humanas ou angelicais (1Co 13.1), mas estranhas ao que as pronuncia. É o Espírito Santo quem dá as línguas ao crente, de forma sobrenatural. 2. A promessa do batismo com o Espírito Santo, com a evidência de falar noutras línguas, é mencionada em toda a Bíblia (Is 28.11,12; 44.3; Jl 2.28,29 com At 2.14-17; Mt 3.11; Lc 24.49; At 1.8). 3. O cumprimento dessa promessa começou no dia de Pentecostes (At 2.1-4), mas há relatos históricos de que essa evidência ocorreu na vida dos crentes da igreja primitiva (At 4.31; 8.15-17; 10.44-48; 19.1-7), bem como nas de outros cristãos, como Agostinho, Irineu e Matinho Lutero. 4. A promessa do batismo com o Espírito, com a evidência de falar noutras línguas, é para hoje (At 2.39; 11.15; Hb 13.8). Estamos na dispensação do Espírito (2 Co 3.8). 5. Algumas utilidades das línguas estranhas: 88


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a) Evidência inicial do batismo com o Espírito Santo (At 2.1-8; 9.18; 10.44-46; 19.6; 1 Co 14.18). b) Edificação do crente (1 Co 14.4). c) Oração em espírito ou “pelo Espírito [gr. pneumati]” (1 Co 14.2,14-16; Ef 6.18; Rm 8.26). d) Mensagem profética (dom de variedade de línguas), em conexão com o dom de interpretação das línguas. Nem todos possuem esse dom (1 Co 12.29,30), mas quem o possui se dirige à igreja em línguas estranhas. Caso não haja interpretação, deve calarse (1 Co 14.5,13,27,28). 6. O uso das línguas estranhas no culto, segundo a Bíblia: a) Autocontrole — O crente, quando fala em línguas que não são mensagens proféticas, deve se controlar, pois não fala aos homens, e sim a Deus (1 Co 14.2), edificando a si mesmo (1 Co 14.4,19). É errado falar em línguas só para mostrar aos outros que é pentecostal. Todos podem e devem falar em línguas (1 Co 14.5,39), mas sem exageros (1 Co 14.8,9). b) Ordem — Quando um irmão estiver sendo usado em profecia ou expondo a Palavra de Deus, não deve outro falar em línguas em tom alto, pois isso gera confusão e desordem (1 Co 14.33). Há momento de falar “de Deus” (audivelmente) e momento de falar “com Deus” (em tom baixo). No culto, deve haver duas ou três mensagens proféticas, uma depois da outra, com ordem (1 Co 14.29-31). c) Decência — No culto, deve haver ordem e decência: “Façase tudo decentemente e com ordem” (1 Co 14.40). Decência diz respeito à conformidade com os padrões morais e éticos do cristão e envolve dignidade, correção, decoro, modéstia, honradez, honestidade. d) Harmonia — O dom de variedade de línguas só é útil em conexão com o de interpretação das línguas. Quem fala em línguas deve se calar, caso não haja intérprete (1 Co 14.13,28).

VII. O dom de profecia 1. O que é o dom de profecia? 89


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a) É uma habilidade sobrenatural para transmitir a mensagem de Deus por inspiração direta do Espírito Santo (1 Co 14.30; 2 Pe 1.21). É uma mensagem momentânea e sobrenatural, cuja função precípua é a edificação da igreja (1 Co 14.4). b) Nos tempos do Antigo Testamento, os profetas eram intermediários entre Deus e o povo (1 Sm 3.20; 8.21,22; 9.6,9,18-20). Esse tipo de ministério profético durou até João Batista (Lc 16.16). c) Hoje, o profeta não é mais uma espécie de mediador. E ninguém precisa consultar profetas diretamente, e sim ao Senhor (Ef 2.13; 1 Tm 2.5; Gl 6.16; Fp 4.6; Hb 10.19-22). 2. Distinções entre o ministério de profeta e o dom de profecia Tanto o portador desse dom quanto o ministro são chamados “profeta” (1 Co 14.29; Ef 4.11), mas há diferenças entre ambos: a) Na concessão — O dom de profecia é concedido a quem buscá-lo (1 Co 14.1,5,24,31); o ministério de profeta depende de chamada divina (Mc 3.13; Ef 4.11). b) No uso — O dom de profecia é uma inspiração momentânea, sobrenatural (1 Co 14.30); o ministério de profeta está relacionado com a pregação da Palavra de Deus (At 11.27,28; 13.1; 15.32). 3. O dom de profecia, uma realidade na igreja primitiva Em Atos 21.8-10, vemos claramente tanto o dom de profecia quanto o ministério de profeta (cf. At 19.6; 21.9; 1 Co 14). 4. Por que vemos poucas manifestações desse dom em nossos dias? a) Ignorância — Pouco se fala nas igrejas acerca desse dom, como ocorria em Éfeso (At 19.2,3). b) Substituição — Coisas supérfluas têm ocupado o lugar que deveria ser destinado à manifestação do Espírito no culto (1 Co 14.26). c) Apatia espiritual — Em muitas igrejas, não tem havido lugar para o Espírito operar (1 Ts 5.19). d) Receio — Muitos líderes, preocupados com as “meninices”, têm desprezado as profecias (1 Ts 5.20), esquecendo-se de 90


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que devem ensinar os “meninos” quanto ao uso correto desse dom (1 Co 14.22-24,28-30; cf. 13.11). 5. Como julgar a profecia a) Segundo a reta justiça (Jo 7.24). b) Por meio da Palavra de Deus (Jo 17.17; At 17.11; Hb 5.12-14). c) Mediante a sintonia do Corpo com a Cabeça (Nm 9.15-22; Jo 10.4,5,27; 1 Co 2.16; Ef 4.14,15; 1 Jo 2.20,27). d) Pelo dom de discernir os espíritos (At 13.6-11; 16.1-18; 1 Co 12.10,11). e) Pelo bom senso (At 9.10,11; 1 Co 14.33). f) Pelo cumprimento da predição (Dt 18.21,22; Jr 28.9; Ez 33.33), se bem que isso não é suficiente para autenticá-la (Dt 13.1-3; Jo 14.23a). g) Com base na vida do profeta (2 Tm 2.20,21; Gl 5.22). Ele tem uma vida de oração e devoção a Deus? Ele honra a Cristo em tudo, não recebendo glória dos homens? Demonstra amar e seguir a Palavra do Senhor? Ama os pecadores e deseja vê-los salvos? Detesta o mal e ama a justiça? Prega contra o pecado, defende o evangelho de Cristo e conduz a igreja à santificação? Repudia a avareza, ou ama sordidamente o dinheiro?

VIII. Funções do dom de profecia 1. Edificação A Igreja é comparada a um edifício, e o Senhor Jesus é o seu fundamento (1 Co 3.10,12,14; Ef 2.22). Somos pedras desse edifício (1 Pe 2.5), e a profecia é um dos meios pelos quais somos edificados (1 Co 14.3,4,12,17). 2. Exortação Por meio da profecia, o crente é incentivado, despertado e fortalecido na fé (1 Co 14.3). 3. Consolação O Senhor utiliza-se desse dom para consolar o crente com palavras semelhantes às de Deuteronômio 31.8 e Isaías 41.10; 45.1-3.

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4. Sinal para os incrédulos Esse dom é de grande valia para convencer os descrentes (1 Co 14.20,22-25). 5. Não tem autoridade canônica As profecias e as línguas interpretadas não alteram nem contradizem o que está escrito na Bíblia (Pv 30.6; Sl 119.142,160; Jo 17.17; 1 Tm 4.9; 2 Pe 1.21; Ap 22.18,19). 6. Não é prioritário para o governo da igreja As finalidades principais dos dons de elocução são edificar, exortar e consolar (1 Co 14.3), e não dirigir a igreja, haja vista termos a Palavra de Deus (Sl 119.105). O Espírito nos dirige por meio dos dons espirituais (At 13.1-3; 16.6-10), mas o ministério da igreja não deve se subordinar a “profetas” (At 11.28-30; 15.14-30; Ap 2.20-22). 7. Não tem função mediadora É uma prática antibíblica consultar profetas em nossos dias, pedindo respostas quanto a casamentos, viagens, negócios etc. Os dons em apreço devem ser usados “na igreja” (1 Co 14.3,13,26,28).

IX. Os dons de inspiração

São dons que revelam a sabedoria de Deus de maneira sobrenatural, concedendo aos seus portadores habilidade para compreender a essência e o propósito das coisas, além de discernimento de circunstâncias, relacionamentos, intenções, atitudes etc. 1. Palavra da sabedoria Não resulta de esforço humano: é um dom de Deus, uma manifestação de sabedoria sobrenatural, pelo Espírito. Na prática, é uma habilidade pela qual aplicamos o conhecimento, sendo necessário para o governo da igreja, o pastoreio, a administração, a liderança etc., (1 Co 2.4-7; cf. Gn 41.38,39; Êx 4.12,15; Dt 34.9; 1 Rs 3.8,9; 4.29,30; Lc 12.11,12; At 4.13; 6.6,10; 1 Co 2.13). 2. Palavra da ciência É um dom pelo qual se manifesta a ciência (ou conhecimento) sobrenatural, pelo Espírito Santo, possibilitando conhecimento de fatos, causas, ensinamentos etc. (Êx 31.3; Dn 1.4; 1 Rs 7.14; At 20.23). 92


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3. Discernimento de espíritos É um dom de conhecer, de maneira sobrenatural, pelo Espírito, por quem somos protegidos, de todo engano do Inimigo e dos homens (At 16.7 com 1 Ts 2.16,17; 1 Tm 4.1; Tt 1.10). Por meio desse dom, podemos discernir: a) Fonte de inspiração — Pode ser: divina (At 15.32; 1 Co 14.3); humana (Ez 13.2,3); diabólica (1 Rs 22.19-24; Jr 23.13; Ap 2.20-24). b) Espíritos — Dos quais provêm falsas doutrinas e fenômenos que geram confusão (At 16.16-18; 2 Co 11.4; Gl 1.8; 2 Ts 2.9; 1 Tm 4.1; 1 Jo 4.1). c) Outros — Confissões falsas (At 5.1-11); trapaças (2 Rs 5.26,27); propósitos escusos (At 8.18-24) etc.

X. Os dons de poder e o mau uso deles 1. Definição Os dons de poder são operações extraordinárias realizadas pelo Espírito Santo. O Senhor cura e faz prodígios hoje, pois não mudou (Hb 13.8). Mas somente Ele faz milagres de fato (Êx 3.20; 7.3,4; Jl 2.30; Hb 2.4), com as seguintes finalidades: a) Autenticar, confirmar e comprovar a pregação do evangelho (Mc 16.15-20; cf. Dt 29.3; Hc 2.4). b) Manifestar a glória do Senhor e levar o povo a crer mais e mais em Jesus, dando cumprimento à Palavra profética (Êx 8.16-19; Mt 8.17; Jo 2.11; 9.1-25; At 3.1-16; 9.36-43; 13.6-12; 14.8-13). c) Desfazer as obras do Diabo (1 Jo 3.8; cf. Lc 13.16). d) Honrar os verdadeiros servos de Deus (Nm 16.28-32). 2. Existem falsos milagres? a) Certos fenômenos causam muita divergência no meio do povo de Deus. Não são obras divinas como curas, ressurreições e batismos com o Espírito Santo (Mc 16.15-20). São manifestações exóticas, estranhas, aberrantes, que geram muita confusão. b) Os propagadores desses fenômenos não são pessoas santas e humildes, mas avarentas, antiéticas, ameaçadoras, interesseiras e propagadoras de heresias. 93


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c) Aprendamos com o Senhor Jesus (Mt 11.29; 1 Jo 2.6), que jamais fez propaganda dos autênticos milagres que realizava. d) Os sinais e prodígios podem ter três origens: • Divina (Êx 7.3,4; Jó 9.10; Sl 96.3; At 10.38). • Humana, no caso de artes mágicas, ilusionismo, simulações, truques. • Diabólica, mediante sinais e prodígios de mentira (Mt 24.24; 2 Ts 2.9-11; 1 Jo 2.18; Ap 13.11-18). Não há dúvidas de que o Diabo pode realizar sinais de mentira para enganar aqueles que carecem de discernimento espiritual (Êx 7.11,12; 8.18,19; Mt 7.22; 2 Co 11.13-15). 3. Devemos julgar os sinais, prodígios e maravilhas? a) Somente a Palavra de Deus dispensa qualquer comentário (Sl 18.30; 19.7; 119.140; 2 Sm 22.31; Pv 30.5). b) Todas as manifestações devem ser examinadas. Quais são os seus propósitos? Resultam elas em maior glória a Deus e em vidas mais santas? Atraem os perdidos a Cristo? Ou deixam os crentes cada vez mais confusos e sem desejo de estudar as Escrituras? 4. Passagens bíblicas que não apóiam os fenômenos da atualidade a) Isaías 43.19 — Os milagreiros chamam os seus sinais “coisa nova”. Mas a profecia contida nesse versículo é específica: “Eis que farei uma coisa nova, e, agora, sairá à luz; porventura, não a sabereis? Eis que porei um caminho no deserto e rios, no ermo”. b) João 14.12 — Essa passagem, que é a preferida dos milagreiros, não apóia qualquer manifestação exótica. As obras “maiores” dizem respeito à quantidade, e não à qualidade delas. São maiores não em seu valor intrínseco ou em sua glória, mas no objetivo. Os discípulos do Senhor fariam as obras de Deus numa escala mais ampla. Refere-se, sobretudo, a milhões de almas salvas (Jo 10.16; 11.52; 12.32), e não fenômenos que confundem o povo de Deus. c) Atos 13.40,41 — Nessa passagem, a “obra tal que não 94


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crereis se alguém vo-la contar” é uma profecia relacionada com o reino de Judá, devastado pela Babilônia em 586 a.C. (cf. Hc 1.5). d) 1 Coríntios 1.25 — A expressão “loucura de Deus” é empregada em conexão com outra — “fraqueza de Deus” — para enfatizar quanto o Senhor é superior a cada um de nós. e) 1 Coríntios 2.9 — As “coisas” mencionadas nesse versículo não são milagres, e sim as glórias indizíveis do evangelho, desfrutadas em parte na terra (Rm 8.18; 1 Pe 5.1). f) 2 Coríntios 3.6 — A letra que “mata” não é a Palavra de Deus, viva e eficaz (Hb 4.12), e sim a lei mosaica (2 Co 3.7), haja vista sermos vivificados pela graça de Deus. 5. Fenômenos milagreiros no mundo Muitos fenômenos propagados por milagreiros têm ocorrido também entre muçulmanos, hindus, espíritas de várias ramificações e católicos romanos. Deus tolera a ocorrência de falsos sinais no meio de seu povo, a fim de provar o nosso amor para com Ele (Dt 13.1-4; Mt 11.11; Jo 10.41).

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Bibliografia Arrington, French L.; Stronstad, Roger, ed. Comentário Bíblico Pentecostal. Tradução por Luís Aron de Macedo e Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.

Bíblia. Português. Bíblia de Estudo Pentecostal. Revista e corrigida — edição de 1995. Rio de Janeiro: CPAD, 1995. Notas e estudos por Donald C. Stamps.

Bícego, Valdir. Lições Bíblicas, CPAD, 1.º trim. 1998. Gilberto, Antonio. Verdades Pentecostais. Rio de Janeiro: CPAD, s.d. Horton, Stanley M. A doutrina do Espírito Santo. Rio de Janeiro: CPAD, 2004. Vine, W. E. et alii. Dicionário Vine: o significado exegético e expositivo das palavras do Antigo e do Novo Testamento. Tradução por Luís Aron de Macedo. 6. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. Zibordi, Ciro Sanches. Erros que os pregadores devem evitar. 8. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. _______. Evangelhos que Paulo jamais pregaria. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. _______. Mais erros que os pregadores devem evitar. Rio de Janeiro: CPAD, 2007. _______. Blog do Ciro. Disponível em <cirozibordi.blogspot.com>.

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Pr.Robson JosĂŠ Brito Missiologia

Presidente

da AD de MaringĂĄ, escritor; articulista da CPAD; conferencista, bacharel em Direito e Teologia, Licenciado em Letras e Mestre em Teologia.

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Missão Urbana /Pr. Robson José Brito

Despedaça, Senhor, e divide a sua língua, pois tenho visto violência e contenda na cidade. De dia e de noite andam ao redor dela, sobre os seus muros; iniqüidade e malícia estão no meio dela. Maldade há lá dentro; astúcia e engano não se apartam das suas ruas.

Salmos 55.9-11

Introdução A cidade também é campo missionário Essa poesia de Davi, destinada ao regente do coro para instrumentos de cordas, nos faz entender que as angústias urbanas não são um problema exclusivo de nosso tempo. O escritor do salmo desabafa: “Tenho visto violência e contenda na cidade. De dia e de noite andam ao redor dela, sobre os seus muros; iniqüidade e malícia estão no meio dela. Maldade há lá dentro; astúcia e engano não se apartam das suas ruas”. O salmista clama a Deus contra os conchavos de seus opositores, pois vê contenda, violência e pancadaria na cidade. Os marginais, de dia e de noite, andam em volta da cidade, pelas muralhas, enchendo-a de crimes e de maldade. A vida urbana do salmista é de aflição, e por toda parte ele vê destruição. As ruas estão cheias de exploração e de desonestidade. O escritor do salmo 55 parece sofrer a mesma angústia de muitas pessoas que vivem hoje nas cidades de nosso país e do mundo. As cidades tornaram-se verdadeiros campos missionários. Neste estudo, analisaremos as características da vida urbana, as agruras citadinas tal como enfrentadas pelo autor do salmo 55, bem como de que forma cada membro da igreja deve enfrentá-las e de que modo a igreja deve cumprir sua missão urbana.

I. Características da vida urbana 1. Coração dorido (v. 4a). 2. Terrores de morte (v. 4b). 3. Medo, fobias (v. 5). 4. Desejo de fugir da realidade (v. 6-8). 5. Violência (v. 9). 6. Marginalidade (v. 10a). 101


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7. Obras da carne em excesso: iniqüidade, malícia, maldade, astúcia e engano (v.10b,11). 8. Traição (v. 12-14,20,21). 9. Morte prematura (v. 23b).

II. O

enfrentamento da angústia urbana por parte do salmista

1. Imprecação (v. 9a,15,19b,23a). 2. Oração (v. 1,2,16-19a). 3. Aconselhamento ao aflito para que este lance seu cuidado sobre o Senhor (v. 22). 4. Confiança em Deus (v. 23b).

III. O

enfrentamento da angústia urbana por parte da

igreja

Como a igreja deve enfrentar as vicissitudes da vida urbana? 1. Ação centrífuga Consiste no preparo espiritual, emocional e estrutural da igreja para capacitar seus membros a enfrentarem as lutas pessoais sem que se desviem ou enfraqueçam na fé. Nessa perspectiva, a igreja edifica a si própria. Se agir corretamente na dimensão centrífuga de sua tarefa na terra, ela se voltará naturalmente para o aspecto vertical de sua missão e, portanto, irá adorar ao Senhor em espírito e em verdade. 2. Ação centrípeta Consiste na busca pela capacitação do Espírito, para que mesmo em meio às lutas urbanas a igreja empreenda ações conjuntas e interdependentes, como resgatar vidas para o Reino de Deus, integrando-as à família de Deus e levando-as à maturidade cristã, de modo que honrem a Deus com a própria vida. Portanto, Deus está nos dizendo que a angústia da cidade não é algo novo e que precisamos enfrentar o problema, no poder do Espírito Santo. Cuidemos de nos identificar com as almas urbanas que clamam por socorro. Vamos agir como Jesus agia. Ele ia ao encontro das pessoas. É necessário que passemos a ver a cidade como campo missionário. Para isso, o primeiro passo é amar a cidade, como Jesus amava. O segundo é estudar a missão da igreja para a cidade. O terceiro é treinar o povo de Deus para que sejamos todos missionários urbanos. 102


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Questionário

1. Quais as características da cidade do escritor do salmo 55 que mais se assemelham às marcas da cidade para a qual Deus enviou você? 2. É certo fazer imprecação a Deus contra quem se opõe a nós, como faz o escritor do salmo 55?

Reflexão

1. Quais as necessidades das pessoas do seu bairro? 2. O que você pode fazer especificamente por essas pessoas? 3. Como despertar o povo de Deus para a incumbência de sermos missionários urbanos?

IV. O conceito de missão

Vamos aqui distinguir “missões” de “missão”, dando também uma idéia básica do que seja missão urbana. Leia Mateus 28.18-20. 1. Significado genérico dos termos “missão” e “missões” a) O sentido semântico da palavra “missão” — Missão é a incumbência que alguém deve executar a pedido ou por ordem de uma autoridade; encargo; dever a cumprir; obrigação. b) “Missão” versus “missões” — Quando falamos em missões, referimo-nos à proclamação do Evangelho em todo o mundo, o que é geralmente chamada a Grande Comissão, a qual consiste nas últimas instruções de Jesus aos seus discípulos e se encontra registrada nos quatro evangelhos (Mt 28.18-20; Mc 16.15,16; Lc 24.46-49; Jo 20.21,22), bem como no livro de Atos (1.8). Por meio da Grande Comissão, o Senhor Jesus revela seu desejo de que todos os povos, em todas as épocas, ouçam o Evangelho. Só assim as famílias da terra serão benditas (Gn 12.3). A clareza dos textos referidos não deixa dúvidas de que na mente de cada cristão obediente a Jesus deve haver um profundo sentimento de paixão pelas almas. A evangelização do mundo é a vontade e o plano inquestionáveis do Senhor. Uma simples leitura — mesmo superficial — do Novo Testamento é o bastante para nos fazer enxergar esse fato. Quando falamos de “missão urbana”, estamos falando da Grande Comissão aplicada à realidade das cidades. 103


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Tudo que é expresso no plural tem forma genérica, difusa, tão ampla que se torna indecifrável. Quando os crentes ouvem falar em “missões”, pensam de imediato em tribos indígenas, em lugares quase inacessíveis da Índia ou da África. Pensam sempre em algo distante, impraticável para eles, uma tarefa para crentes seletos, corajosos e sofredores que encaram o desafio de sair de suas fronteiras geográficas para fazer, de modo heróico e até sobre-humano, a obra de Deus. A missão da igreja não é somente enviar missionários pelo mundo? Não, não apenas. Nós somos a igreja. Somos o templo do Espírito Santo. Temos uma missão que é intransferível. Missões é a missão dos missionários e da igreja na condição de estrutura e organização. Missões são importantíssimas, não podemos deixar de cumpri-las, mas elas não substituem nem satisfazem a missão minha e sua, da igreja local, da congregação! 2. Significado específico da palavra “missão” Embora a palavra “missões” não seja encontrada nas Escrituras, a idéia está inserida em toda a Bíblia Sagrada, de Gênesis a Apocalipse. A palavra “missão” vem do latim mitto e significa “enviar”. No Novo Testamento, vemos o próprio Jesus empregando outra palavra com o mesmo significado: “apóstolo” (do grego apostello). De maneira simples, podemos afirmar que “missão” significa “enviar”. 3. A missão da igreja segundo os manuais de teologia sistemática A maioria dos teólogos sistemáticos descreve a missão da igreja por meio de quatro verbos muito relevantes: “adorar”, “evangelizar”, “edificar” e “servir”. 4. O perigo do conceito de missão visto estritamente pela teologia sistemática Um requisito básico para se ter uma visão bíblica da missão é vê-la como Deus a vê. Nesse sentido, a visão deve estar com os líderes. Mas se estes não têm uma visão afinada com o Senhor, será transmitido ao povo de Deus um conceito equivocado. É nocivo entender a igreja não como povo de Deus, mas apenas como instituição. Igreja é gente: somos nós! Outro grave problema é separar a igreja de sua missão como se a missão fosse simplesmente uma atividade da igreja. Na verdade, a missão diz respeito à natureza da igreja. Missão é a essência da igreja. 104


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Quando estudam a Bíblia ou a própria teologia, os líderes geralmente se apegam muito à teologia sistemática. É certo que esse ramo da teologia tem sido uma bênção para os líderes cristãos. Entretanto, corremos o risco de imaginar que, na vida, as coisas estarão sempre sistematizadas também. Na ação da igreja e na ação pastoral, os problemas, desafios e lutas não aparecem separados — teologia, eclesiologia, cristologia, pneumatologia, escatologia etc. Na verdade, quando os desafios aparecem para nós no ministério, na obra de Deus, eles coexistem, estão entrelaçados, emaranhados, não separados, distintos. É prejudicial ver a realidade assim:

Teologia

Cristologia

Pneumatologia

Escatologia

Adorar

Evangelizar

Edificar

Bíblia

Contexto

Missão

etc.

Servir

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Melhor seria vê-la assim:

Teologia

Cristologia

Pneumatologia

Escatologia

Evangelizar

Adorar

Bíblia

Contexto

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Missão

Servir

Edificar


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Questionário

1. Que significa a palavra missão? 2. Qual a diferença entre “missões” e “missão”? 3. Qual a relação entre a Grande Comissão e nossa cidade? 4. Qual o perigo de nos apegarmos unicamente à teologia sistemática no que diz respeito à missão da igreja? 5. O que é missão urbana?

Reflexão

1. Qual o nível de comprometimento que você tem com a missão? Você tem assumido sua missão? 2. Como você tem colaborado com Deus na missão em sua cidade?

V. Missão urbana: um chamado para a cidade

Analisaremos aqui o conceito de cidade e suas implicações para uma missão de Deus destinada a ela. Leia Lucas 8.1; João 10.16; Atos 20.20; Tito 1.5a. 1. As cidades: objeto da missão urbana a) O adjetivo “urbano”­ — Vem do latim urbanos, que é relativo ao termo urbes, isto é, “cidade”. Outra expressão correlata é o termo em português “civilizado”, que vem do latim civitas, “cidade”, que traz o sentido de “civilizado”. b) O que é uma cidade? — Podemos conceituar cidade como a aglomeração humana de certa importância, localizada numa área geográfica circunscrita e que tem numerosas casas, próximas entre si, destinadas à moradia e/ ou a atividades culturais, mercantis, industriais, financeiras e outras não relacionadas com a exploração direta do solo. c) A cidade na Bíblia Sagrada — Nos tempos bíblicos, segundo Champlin, citando Unger1, cidade era o agrupamento de pessoas circundado por uma muralha (se não tivesse essa proteção, seria apenas uma aldeia). Apesar da grande ênfase ao campo e à vida rural, na Bíblia Sagrada, em função do estilo de viver pastoril dos patriarcas e da própria nação de Israel, a idéia de cidade aparece 1.149 vezes na versão Almeida Revista e Corrigida. Logo, podemos dizer que a Bíblia é um livro urbano, ou seja, a maior parte de seus acontecimentos está relacionada com as 1Russel Norman CHAMPLIN & João Marques BENTES, Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia (São Paulo: Hagnos, s.d.), v. 1

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cidades. E o livro de Apocalipse culmina não falando do céu, mas de uma cidade, “a nova Jerusalém, que de Deus descia do céu”. d) O conceito de cidade para nós, no Brasil, hoje — Podemos considerar a expressão “cidade”, na divisão territorial de nosso país, como sendo uma sede de município, qualquer que seja o número de habitantes. e) A urbanização é um fenômeno global — A população mundial já atingiu a cifra de 6,5 bilhões pessoas e cerca de metade dessa população mora em cidades. f) A urbanização brasileira — O Brasil deixou de ser um país essencialmente rural no fim da década de 1960, quando a população urbana chegou a 55,92%. Segundo censo do IBGE do ano 2000, o país contava no final do milênio com 81,23% de seus habitantes morando em áreas urbanas. 2. O conceito de missão urbana Missão urbana é a revelação que Deus faz de si mesmo como aquele que ama as cidades e quer salvá-las, em Cristo Jesus, pela sua graça e por meio da fé, tendo seu povo como sua manifestação na cidade, uma vez que cada membro da igreja participa da natureza divina. Quando a igreja faz missão, é o próprio Deus efetivamente fazendo. E é um privilégio para o povo de Deus que vive na cidade alcançar seus concidadãos.

VI. Entraves à obra de missão na cidade 1. Encarar a cidade como algo eminentemente demoníaco Associar mentalmente o paraíso perdido por Adão com a vida no campo que parte de nós conheceu no passado, com todas as coisas boas que a vida campestre proporcionava, leva-nos a não amar a cidade como Cristo ama. Como fazer missão num lugar que não amamos? As estruturas de poder que mantêm a cidade jazem no maligno e produzem opressão e toda sorte de pecado. Isso induz os crentes a ver a cidade como um lugar de angústia, um lugar “mal”, a não olhar com bons olhos a cidade, a não amá-la como Deus ama! A própria correria do dia-a-dia urbano e a luta pela sobrevivência na cidade nos fazem esquecer de que a cidade precisa de salvação.

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2. Falta de um conceito correto de missão por parte dos crentes Pelo fato de haverem incorporado um conceito deturpado de missão, os crentes pensam na obra de Deus de modo reducionista. Pensar em missão somente como missões gera pensamentos equivocados. Dentre outros, destaquemos nove pensamentos muito simplistas que levam os crentes a não entender a missão/ obra de Deus como ele quer que entendamos, por causa de paradigmas negativos nessa área. Esses pensamentos impedem que atuemos na missão como o Senhor deseja: a) “Missão é Missões.” b) “Não sou chamado para a missão.” c) “Entreguei folhetos, portanto já fiz missão.” d) “Se não transmitir imediatamente os usos e costumes humanos de minha igreja, não farei um trabalho missionário completo.” e) “Não posso me envolver com o mundo, porque o mundo é mau.” f) “Missão é uma atividade da igreja” (como instituição). g) “Não estou preparado para fazer missão.” h) “Missão é só ganhar almas.” i) “Minha missão é somente ajudar o trabalho da igreja” (instituição).

Questionário

1. O que é uma cidade, do ponto de vista atual e do ponto de vista bíblico? 2. A urbanização, do ponto de vista global, desafia a igreja em quais aspectos? 3. O que pode impedir que amemos as cidades como Cristo as ama? 4. O que é um paradigma negativo? E quanto à missão na cidade, qual paradigma você acha mais prejudicial à ação da igreja? Por quê? 5. Como você refutaria a idéia de alguém que diz: “Não sou chamado para a missão”?

Reflexão

1. Qual paradigma negativo exposto acima, quanto à missão urbana, você tem sido tentado a seguir para não fazer o que Deus quer que você faça em sua cidade? O que você faz para vencer isso? 2. Qual o paradigma negativo mais presente na congregação onde você 109


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serve a Deus? Você tem idéia como isso pode ser quebrado? 3. Você tem chorado por sua cidade, como Jesus chorou por Jerusalém?

VII. As cidades na Bíblia

Ao observar como Deus tratou as cidades na Bíblia, poderemos entender, por analogia, como Deus irá tratar com nossas cidades, usando-nos na missão urbana. Leia Atos 19. 1. Algumas cidades mencionadas na Bíblia Há muitas cidades famosas na Bíblia Sagrada, das quais podemos citar: Enoque; Babel; cidade-estado de Ur dos Caldeus; Sodoma e Gomorra; Betel; Nínive; Babilônia; Jericó; Sarepta: Jerusalém; Belém; Nazaré; Betânia; Cafarnaum; Roma; Atenas; Decápolis; Sicar; Tiro; Damasco; Antioquia da Síria; Chipre; Antioquia da Pisídia; Icônio; Listra; Derbe; Trôade; Filipos; Tessalônica; Beréia; Corinto; Frígia; Éfeso; Mileto; Tiro; Cesaréia; Malta. 2. Problemas das cidades de hoje Os problemas das cidades de hoje não são novos, mas Deus continua agindo com a mesma graça e compaixão, pois o Pai ama as cidades. a) Nossas cidades não são diferentes de Babel (Gn 11.4). Deus quer congregá-las em torno de sua glorificação como no Pentecostes (At 2.8-13). b) Nossas cidades hoje não são diferentes de Sodoma e Gomorra (Gn 13.13; 14.2,12,21; 18.20; 19.4; Jr 23.14; Is 13.19) — A ação de Deus hoje: em vez de destruir as cidades pecadoras de nosso tempo com fogo e enxofre, o Senhor quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade (1 Tm 2.4). Devemos odiar o pecado, mas amar os pecadores. c) Nossas cidades são como Nínive — Nelas imperam a malícia e a arrogância (Jn 1.2; Sf 2.13-15). A ação de Deus hoje: ele quer que seu povo pregue a mensagem de arrependimento (Jn 4.11). d) Nossas cidades, especialmente na periferia, são semelhantes às dezenas de cidades da Galiléia. — Nelas habitavam estrangeiros, pobres, marginalizados, doentes. Muitos não podiam entrar na sinagoga e nem no Templo. Deus, em Cristo, veio para essa gente e quer salvar as cidades de hoje (Is 61.1; Mt 4.16). e) Nossas cidades são como Jerusalém — Praticam uma religião 110


Missão Urbana /Pr. Robson José Brito

hipócrita e violenta contra os profetas de Deus (Mc 7.1-13; At 21.30-32; 22.24; 23.12). O Senhor Jesus chorou sobre Jerusalém. E nós, choramos sobre nossa cidade? f) Nossas cidades são como Samaria e Filipos — A feitiçaria reina, e querem até corromper os servos de Deus (At 8.9-11; 16.16-18). A ação de Deus diante disso é: aniquilamento do poder das trevas; abertura do coração das pessoas, fazendo-as nascer de novo; expulsão de demônios; operação de milagres; línguas estranhas. Houve até um tremor de terra para salvação de um funcionário público. g) Nossas cidades são como Antioquia da Pisídia — Sua liderança e as estruturas de poder humano investem contra a pregação do Evangelho (At 13.50). A ação de Deus: proclamação da Palavra por uma grande extensão territorial; enchimento do povo com alegria e com o Espírito Santo. O resultado disso tudo é muita glorificação da Palavra. h) Nossas cidades são como Icônio — Alguns são atiçados contra nós por causa do nome de Jesus (At 14.2-5). A ação de Deus: grande número de conversões. i) Nossas cidades são como Tessalônica — Há gente vadia e perversa nas ruas (At 17.5). A ação de Deus: levantou uma igreja naquela cidade cuja fé era prática, o trabalho abundante e o testemunho exemplar. E o povo, apesar do sofrimento, era alegre no Espírito. A fama da igreja dessa cidade e seu avivamento foram notórios (1 Ts 1.2-10). j) Nossas cidades são como a cosmopolita Corinto — São cheias de prostituição, resistência, blasfêmia e violência (At 18.6,12,17; 1 Co 5.9; 6.18; 2 Co 12.21). Deus diz a Paulo que não tema e pregue a Palavra (At 18.9,10). À igreja de Corinto nenhum dom faltava (1 Co 1.7). k) Nossas cidades são como a cidade de Éfeso — Além da feitiçaria, existe nelas farta produção literária e artística a serviço de Satanás (At 19.19,24). A ação de Deus foi levar a Palavra a crescer. Com isso, a indústria da idolatria teve prejuízo grave, e muitos livros de bruxaria foram queimados. l) Nossas cidades têm autoridades corruptas, como Félix — Essas autoridades só cumprem suas obrigações se alguém lhes der propina. Félix agiu assim com o apóstolo Paulo, em Cesaréia (At 24.26). A ação de Deus foi maravilhosa: usou essa cidade 111


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como lugar de refúgio, a fim de que Paulo pudesse escapar do linchamento, como queriam os judeus de Jerusalém. Em Cesaréia, ele pôde se defender e pregar para Festo, para o rei Agripa e para a esposa deste, Berenice. Assim, a vocação para qual Deus chamou Paulo (pregar para a elite política) pôde ser cumprida. Assim, vemos que os problemas típicos do ambiente urbano não são exclusivos das cidades atuais. Como disse o professor de Eclesiastes, não há nada novo debaixo do céu. O que mais nos comove, porém, é o fato de a resposta da missão de Deus para com os habitantes das cidades citadas acima ser sua Igreja na terra. A missão urbana é a resposta de Deus para os conflitos das cidades contemporâneas.

Questionário 1. Qual a semelhança de nossas cidades atuais com Babel (Gn 11.4)? 2. Qual a diferença da forma em que Deus agiu com Babel para sua maneira de agir em Jerusalém no dia de Pentecostes (At 2.8-13)? Qual a implicação disso para nossos dias? 3. Os problemas das cidades de hoje não são novos, mas Deus continua agindo com a mesma graça e compaixão, pois o Pai ama as cidades. Como essa ação é efetivada atualmente? 4. As ações de Deus nas cidades citadas acima são de juízo ou de compaixão? Qual a implicação dessa verdade? 5. O que significa não separar Bíblia e missão do contexto em que estamos inseridos na cidade que o Senhor nos colocou?

Reflexão 1. Você é um discípulo ou um mero crente? 2. O que você irá fazer para despertar os membros de sua igreja, para que entendam que Deus não os chamou simplesmente para ser crentes? 3. Como Deus vê sua cidade? O que você fará para ver sua cidade como Deus vê? 4. Estas aulas foram importantes para você? Por quê? 5. A partir dessas aulas, que compromisso você está disposto a assumir em relação à sua cidade? 112


Missão Urbana /Pr. Robson José Brito

Conclusão Cada pessoa que compõe o povo de Deus deve viver não como mero crente (membro “de banco”), mas ser discípulo. O povo de Deus deve desenvolver uma espiritualidade que aprofunde sua comunhão com o Pai, a fim de ter o mesmo comportamento que Deus tem em relação à cidade. Devemos contextualizar o trabalho do povo de Deus de acordo com a realidade da cidade em que Deus nos colocou. Todos os que compõem o povo de Deus, especialmente os líderes, devem ser “analistas de almas urbanas”2 nessa realidade pós-moderna na qual vivemos. É preciso assimilar que a missão urbana compõe a missão de Deus na terra. A missão urbana a que Deus nos comissiona exige que os líderes e o povo de Deus não separem Bíblia e missão do contexto em que estamos inseridos na cidade que o Senhor nos colocou.

2

Jorge Henrique Barro, O pastor urbano (Londrina: Descoberta), p. 73.

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Ev. Eliel Gaby Angelologia

Evangelista

da Assembléia de Deus em Curitiba, Engenheiro de Produção e Bacharel em Teologia.

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Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

Introdução Geral Conceito teológico: doutrina acerca das coisas divinas. Divisão dos assuntos bíblicos: • • • • •

No Antigo Testamento: preparação para o advento de Cristo. Nos Evangelhos: manifestação de Jesus Cristo. Em Atos: propagação da mensagem de Cristo. Nas Epístolas: doutrina. Em Apocalipse: consumação de todas as coisas.

Doutrina: conjunto de princípios que servem de base a um sistema religioso, político ou filosófico. Normalmente, a teologia sistemática divide-se da seguinte forma: • • • • • • • • •

Teologia própria: o estudo de Deus. Hamartiologia: o pecado. Soteriologia: a salvação. Pneumatologia: os espíritos/ Paracletologia: o estudo do Espírito Santo. Escatologia: últimas coisas. Angelologia: os anjos. Antropologia: os homens. Cristologia: Jesus Cristo. Bibliologia: a Bíblia.

Anjos Conceito: tratado acerca dos anjos; crença na intervenção dos anjos. A palavra vem do vocábulo hebraico malakh e significa “aquele que leva a mensagem”, “anunciador”; “enviado”; “mandado”; “remetido”. Os anjos são mensageiros a serviço de Deus. Na tradução do Antigo Testamento, o termo malakh foi vertido para o grego como aggelos, que tem a mesma significação do hebraico. Jerônimo, ao traduzir as Escrituras para o latim, usou o termo aggelos para especificar os entes angélicos e nuntios para designar os mensageiros humanos. Encontramos 108 referências aos anjos no Antigo Testamento e 175 no Novo Testamento. 119


Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

1. A criação dos anjos Os anjos foram criados por Deus (Ne 9.6; Cl 1.16), todos bons e santos (Gn 1.31). A época de sua criação foi anterior à criação do mundo (cf. Jó 38.7). A Bíblia não dá uma resposta explícita sobre esse tempo. 2. A natureza dos anjos Em Hebreus 1.14, somos informados de que eles são seres espirituais criados. a) Criaturas — Como já vimos, os anjos foram criados por Deus. E, como criaturas, não aceitam adoração (Ap 19.10; 22.8,9). É terminantemente proibido adorá-los (Cl 2.18). O respeito aos anjos era profundo no judaísmo, a ponto de o fato de alguém ver um anjo ser considerado uma experiência tão grande quanto ver o próprio Deus (Gn 16.13; 31.13; Êx 3.4; Jz 6.14; 13.22). Talvez alguns desses casos tenham sido teofanias. A teologia judaica posterior encarava os anjos como mediadores entre Deus e os homens (Ez 40.3; Zc 3), e essa posição tão elevada naturalmente fez com que alguns os adorassem. Exemplos: cristandade (Cl 2.18); gnosticismo. Todavia, a prática não era aceitável para os verdadeiros cristãos (Ap 19.10). b) Celestes — Possuem um corpo diferente do nosso. Portanto, não estão sujeitos às barreiras físicas como nós: • São dotados de incomparável poder e inimaginável agilidade; deslocam-se de uma lado para outro com hipervelocidade (Dn 9.21). • Há diferença entre corpo espiritual e celestial (1 Co 15.40). c) Imortais — Embora imortais, não são eternos: foram criados (Ne 9.6; Cl 1.16). Jesus falou acerca da imortalidade dos anjos (Lc 20.34-36). d) Numerosos — São contados em multidões, miríades e legiões (Dt 33.2; 1 Rs 22.19; 2 Rs 6.17; Jó 25.3; Sl 68.17; Dn 7.10; Mt 26.53; Lc 2.13; Hb 12.22; Jd 6; Ap 5.11). 120


Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

• Legião: corpo da milícia antiga romana, composta de cavalaria e infantaria; multidão; corpo de um exército. • Miríade: número de 10 mil; quantidade indeterminada. • Multidão: grande número de pessoas. e) Assexuados — Não podem propagar sua espécie. Desde que foram criados, mantêm o mesmo número (Lc 20.34,35). As testemunhas-de-jeová afirmam que os filhos de Deus mencionados em Gênesis 6.2 são anjos — inverídico! f) Sábios — Não são oniscientes, porém possuem mais sabedoria que os sábios humanos. Em 2 Samuel 14.17, a sabedoria de Davi é comparada à de um anjo (utopia). g) Poderosos — São “magníficos em poder” (Sl 103.20). 3. A função dos anjos Basicamente, possuem duas funções: uma ordinária e uma extraordinária.

a) Ordinária — Louvar continuamente o nome de Deus (Is 6.3). b) Extraordinária — Zelar pelo bem-estar daqueles que hão de herdar a vida eterna (Hb 1.14). c) Outras — São várias, porém, suas atribuições: • Anunciar e alertar (Gn 18.9,10; Jz 2.1-4; Lc 1.13,30; 2.8-15; Ap 1.1). • Guiar e instruir (Gn 24.7; 28.12-15; Êx 14.19; 23.20; Nm 20.16; At 7.38,53; Gl 3.19). • Interpretar visões (Dn 7.16; Zc 1.9,19; Ap 17.7). • Guardar e defender, o que explica os anjos guardiães e seus serviços (Gn 32.24; Êx 14.19; Nm 22; 2 Rs 6.17; 1 Cr 12.22; Sl 34.7; 91.11; Dn 3.28; 6.22; 10.13—11.1; Mt 18.10; Ap 2 e 3 — aqui a igreja é assessorada, guiada, guardada e instruída por agentes angelicais especiais). • Ministrar aos necessitados (Gn 21.17; Êx 3.7; 1 Rs 19.5-7; Mt 28.2; Mc 1.13; Lc 22.43; At 5.19; 12.6-11). • Ajudar o ser humano a chegar ao seu destino (Hb 1.14). 121


Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

• Assessorar no julgamento, tanto o temporal quanto o escatológico (Mt 16.27; 25.31; Lc 9.26; 12.8,9; Mc 13.27; At 12.23). • Adoração celeste, agora e no estado eterno (Is 6.3; Lc 2.13; Ap 19.1-3). 4. O caráter dos anjos a) Obedientes — Eles obedecem às ordens de Deus sem o menor questionamento ou vacilação (1 Pe 3.22). b) Reverentes — A mais elevada função angelical é adorar ao Todo-Poderoso (Ne 9.6). c) Santos — Em razão de seu caráter elevado e sem mácula (Ap 14.10). d) Mansos — Não guardam rancor nem alimentam ressentimentos pessoais contra seus opositores. Também não os injuriam nem lhes lançam impropérios, mas os combatem com o poderoso nome do Senhor (Jd 9). 5. Os anjos podem pecar? Segundo Agostinho, os anjos que não acompanharam Lúcifer na grande rebelião foram galardoados por Deus com a perseverança. Vários teólogos são partidários desse pensamento. Os que não se rebelaram contra o Senhor tornaram-se imunes ao pecado e jamais poderão cair em semelhante erro. No entanto, conservam o livre-arbítrio. 6. Classificação dos anjos Encontramos uma classificação angelical em Colossenses 1.16 e Efésios 1.21. Tradicionalmente, os seres angelicais são assim classificados: • • • • • • • 122

Anjo do Senhor; arcanjo Miguel; anjo Gabriel; querubins; serafins; anjos eleitos; anjos das nações.


Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

a) Arcanjo Miguel — Existe apenas um arcanjo (Dn 10.13,21; 12.1; Lc 1.19; 1 Ts 4.16; Jd 9; Ap 12.7). (No livro apócrifo de Tobias aparece o arcanjo Rafael.) O termo “arcanjo” indica um anjo de ordem superior, o primeiro dentre os anjos. Em Ezequiel 28, constatamos que Lúcifer era um arcanjo, “cabeça de todos os anjos”. O nome Miguel significa “o que é semelhante a Deus”. Seu nome aparece quatro vezes na Bíblia (Dn 10.13; 12.1; Jd 9; Ap 12.7). Seu ministério está relacionado com o povo de Israel, na qualidade de guerreiro, e com a ressurreição dos mortos. Ele é uma espécie de ministro da Guerra e protege o povo de Deus em especial (Dn 10.1; 12.1). b) Anjo Gabriel — Apesar de sua importância, ele não é identificado como arcanjo. O nome Gabriel significa “herói de Deus”, “homem de Deus”, “Deus é grande”. Esse anjo é uma espécie de porta-voz de Deus, e a ele foram confiadas as mensagens mais relevantes com relação ao Reino de Deus: • Daniel 8.16-27 (1.ª menção): trazendo boas novas a Daniel. • Daniel 9.21 (2.ª menção): incumbido de revelar as sete semanas e de explicar-lhe o significado. • Lucas 1.11-19 (3.ª menção): anunciando o nascimento de João Batista a Zacarias. • Lucas 1.30-33 (4.ª menção): anunciando o nascimento de Jesus a Maria. c) Querubins — Pertencem à categoria mais elevada de anjos, e o termo está relacionado a “guardar” ou “cobrir”. Em razão de sua posição como guardas à porta do jardim do Éden (Gn 3.23,24), sobre o lugar expiatório da arca da aliança (Êx 25.17-20) e como criaturas viventes (Ez 1; Ap 4.6-8), o ministério dos querubins é sem dúvida vindicar a santidade de Deus. Comparando Ezequiel 1.10 com Apocalipse 4.7, observamos que são os querubins que lideram os seres na adoração a Deus. 123


Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

Em Ezequiel 10.14, representam uma perfeição de criaturas: força de leão, inteligência de homem, rapidez de águia, serviço semelhante ao prestado pelo boi. O querubim representa a glória de Deus — a glória, a justiça e a santidade de Deus guardavam o jardim. Outras referências a querubins: Êxodo 25.20; 2 Samuel 22.11; Salmos 80.1; 99.1; Isaías 37.16; Ezequiel 9.3; 10.10; Apocalipse 4.4,9; 11.19. d) Serafins — O termo “serafim” (seraphim, plural no hebraico) significa “nobres” ou “afogueados”. Em português, porém, costuma-se dizer tanto “serafim” (singular) quanto “serafins” (plural). São anjos que possuem seis asas. Com base em Isaías 6.7,8, entendemos que os serafins preparam os homens a fim de que estes recebam o toque divino e estejam habilitados para a obra de Deus. e) Anjos eleitos — São provavelmente aqueles que permaneceram fiéis a Deus durante a rebelião de Satanás (1 Tm 5.21). f) Anjos das nações — Cada nação tem seu anjo protetor, o qual se interessa pelo bem-estar dela (Dn 10.13,20). g) Tronos — Do grego thronoi (lit. “tronos”), indica qualquer espécie de trono, físico ou simbólico, qualquer forma de reino ou de governo. Corresponde a “todo principado, e poder, e potestade, e domínio” (Ef 1.21; Paulo aqui não procura listálos na ordem de sua suposta autoridade). Champlin aproxima os “tronos” dos elevados espíritos que ocupam os tronos que circundam o trono de Deus.1 h) Dominações ou soberanias — Do grego kuriotes, significa “senhorios”, “domínios”. Seu poder abrange vastas esferas, as quais governam. i) Principados — Do grego archai. Os vocábulos “principados” e “potestades” são empregados para indicar seres espirituais bons e malignos. Champlin supõe um governo de reinos, províncias ou governantes sobre nações.2 j) Potestades — Do grego eksousia, significa “autoridade”, “portador de autoridade”, “oficial”, “governante”. Indicam seres espirituais bons (Ef 3.10) e malignos (Ef 3.12; Cl 2.15). 1 Russel Norman Champlin & João Marques Bentes, Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia (São Paulo: Hagnos, s.d.), v. 5. 2 Idem, ibidem.

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k) Anjo do Senhor — Trata-se de uma teofania (gr. Théos, “Deus” + phainei, “aparecer”). É a manifestação visível de Deus, na forma que ele quiser, porém difere da manifestação divina permanente em Jesus Cristo (encarnação, Jo 1). A expressão “anjo do Senhor” encontra-se mais de 50 vezes na Bíblia. Quase todos os casos de teofania são encontrados no Antigo Testamento, embora existam casos de teofania no Novo Testamento, aqui relacionados: • Mateus 3.16,17: voz celeste e pomba no batismo de Jesus. • Mateus 17.5: voz ouvida durante a transfiguração. • João 12.28: voz do céu na semana da Paixão. • Atos 2.2,3: Espírito Santo. • Atos 9.3: aparição de uma luz a Paulo. Ao contrário dos outros anjos, o anjo do Senhor aceita adoração e tem poder para comutar pecados (Êx 23.20-23). Outras referências ao anjo do Senhor (Antigo Testamento): Gênesis 16.7; 18.1,2; 19.10; 32.24,30; 48.15,16; Êxodo 3.2; 32.34; 33.14,15; Números 22.31; Juízes 13.3,13; 1 Reis 19.5-7; Isaías 63.9; Daniel 8.15,16; Miquéias 3.11; Zacarias 1.9; 2.3. 7. O conhecimento dos anjos Os anjos possuem conhecimento maior que os seres humanos, porém somente Deus é onisciente. a) Sabem alguns acontecimentos futuros quando informados por Deus (Lc 1.13-16) e do plano de Deus para o mundo (Ap 17 e 18). b) Às vezes, sabem os motivos e os propósitos de pessoas sem que isso lhes seja informado (Mt 28.25). c) Usam seu conhecimento para o nosso bem. d) Não sabem: • O dia nem a hora da segunda vinda de Cristo (Mt 24.36). • Algumas coisas, que não compreendem plenamente, como os sofrimentos de Cristo e nossa salvação (1 Pe 1.12). 125


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8. Pensamentos acerca da angelologia a) Escolástica — Na divisão da história da filosofia grega, a escolástica é demonstrada da seguinte forma: • Período pré-socrático: escola jônica; escola itálica; escola eleática; escola atomística; escola sofista. • Período socrático: Sócrates; Platão; Aristóteles; escolástica. • Período pós-socrático: acadêmicos e peripatéticos (academia antiga; academia nova; terceira academia); Epicuro; Zenão e o estoicismo; ecletismo e ceticismo. Algumas preocupações do escolasticismo referente aos anjos: • Quantos anjos poderiam permanecer na ponta de uma agulha? • Um anjo pode estar em dois lugares ao mesmo tempo? • Os anjos da guarda vigiam as crianças desde o nascimento, depois de batizadas ou já desde o embrião? As discussões divagavam, e a essência da função dos anjos não era estudada. b) Saduceus — Seita judaica (fim do século II a.C. até o século I d.C.). Eram, na maioria, sacerdotes e ricos aristocratas. • Negavam a existência do mundo espiritual (At 23.8). • Não criam na ressurreição dos mortos nem na vida futura (Mt 22.23). • Aceitavam como canônicos apenas os livros de Moisés. c) Racionalismo — Vê a crença nos anjos como uma forma de politeísmo que teve sua evolução no judaísmo. d) Materialismo — Nega a existência de um mundo espiritual, por isso nega também a existência dos anjos. 126


Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

9. Os “filhos de Deus” O capítulo 6 de Gênesis começa descrevendo as terríveis condições a que chegara a raça humana e que foram a causa do Dilúvio. Paulo César Lima3 apresenta seis interpretações para a expressão “filhos de Deus” nessa passagem: a) Descendentes de Adão — Essa teoria admite a origem da raça humana em dois pontos distintos: criação direta de Deus e criação evolucionista (protoplasma/ macaco/ homem). As mulheres seriam seres intermediários entre o homem e o macaco. Esse pensamento divide-se ainda em duas partes: • Teísta: admite a criação da matéria por Deus. • Ateísta: nega a existência de Deus e sua criação. Em resumo, as “filhas dos homens” seriam produto da evolução, e os “filhos de Deus”, os descendentes de Adão e Eva. b) Anjos — Segundo alguns manuscritos da Septuaginta, a palavra “anjos” aparece no lugar de “filhos de Deus”. c) Homens em geral — Closem explicava que por essa expressão devemos entender “homens em geral”, que assim se designa por terem sido feitos à imagem e semelhança de Deus. O pecado, segundo Closem, não residia no fato do matrimônio, e sim na desordem em que viviam e que degenerou na poligamia. d) Magnatas ou príncipes — A versão de Símaco traduz a expressão “filhos de Deus” por “magnatas” ou “príncipes”. Fazem o mesmo os targuns de Onkelos e de Jônatas. e) Homens piedosos — Seriam homens que, pelo voto de castidade se consagraram a Deus. Isso vai contra a cultura judaica. Era uma bênção e uma alegria ter muitos filhos. A idéia de que o estado de solteiro era mais agradável surgiu muitos séculos depois, com o catolicismo romano. f) Descendentes de Sete — Ou seja, a linhagem piedosa e obediente a Deus. As “filhas dos homens” seriam da descendência de Caim. Devemos adotar essa teoria pelas seguintes razões:

3 Os temas mais difíceis da Bíblia (Rio de Janeiro: CPAD, 1982), p. 133.

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Teologia Sistemática II: Anjos / Ev. Eliel Gaby

• Adão gerou Sete à sua imagem e semelhança, transmitindo-lhe uma dignidade que recebera do Criador (Gn 5.3). • Essa afinidade com Deus, especialmente realçada no texto, deve ter perdurado entre os setitas, pois o escritor os apresenta como dotados de notável piedade (cf. Dt 14.1; Sl 73.15; Os 1.10). • As “filhas dos homens” representam a linhagem dos cainitas (Gn 4.1-24; 6.1-4). • Encontramos nas Escrituras proibições de casamentos entre pessoas de condições espirituais diferentes, o que impossibilita o relacionamento das “filhas dos homens” com os anjos (Dt 7.3; Ed 10; Ne 13 etc.).

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Ev. Renato Hora A Igreja e a Legislação

Assessor

da Presidência da IEADC, ex-coordenador da UMADC, advogado, professor universitário, pós-graduado em Direito Processual Civil, pós-graduado em Direito Tributário.

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A Igreja e a Legislação /Ev. Renato Hora introdução

Neste sintetizado estudo, formatado com características de um singelo esboço daquilo que pretendemos expor no desenvolver das aulas a serem ministradas, apresentamos alguns aspectos importantes sobre a vida da igreja do ponto de vista da legislação, abrangendo especificamente os seguintes temas: • A igreja no ordenamento jurídico, na Constituição da República Federativa do Brasil (ou simplesmente Constituição Federal) e no Código Civil brasileiro; • A igreja e seu estatuto; • O ministro de confissão religiosa; • O púlpito e seus reflexos jurídicos; • Considerações jurídicas sobre a disciplina de membros; • A igreja e o problema da poluição sonora; • A prestação de serviço voluntário.

I. A igreja no ordenamento jurídico 1. Na Constituição Federal As raízes jurídicas que dão existência à igreja encontram-se no rico solo constitucional, mais precisamente no inciso VI do artigo 5.º, do qual colecionamos o seguinte dispositivo: É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias

Já o artigo 19, do mesmo diploma, estabelece uma condição de neutralidade aos entes da federação, no tocante às questões de ordem religiosa, apresentando o Brasil como um Estado laico, senão vejamos: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

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A Igreja e a Legislação /Ev. Renato Hora

Apenas a título de realce histórico, vale lembrar que a prestigiada “independência religiosa”, que nada mais é senão a separação entre o Estado e a igreja, ocorreu com o surgimento da República Federativa do Brasil, proclamada em 15 de novembro de 1889. O Decreto n.º 119-A, de 8 de janeiro de 1890, revelado como ato institucional regulador da vida da igreja no Brasil, acabou por extinguir o padroado e estabeleceu a plena liberdade de culto e de religião, entre outras garantias, como se observa de seu artigo 3.º: A liberdade aqui instituída abrange não só os indivíduos nos atos individuais, senão também as igrejas, associações e institutos em que se acharem agremiados; cabendo a todos o pleno direito de se constituírem e viverem coletivamente, segundo o seu credo e a sua disciplina, sem a intervenção do poder público.

No mesmo esteio, as constituições de 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, a Emenda de n.º 1, de 1969, e a Carta Magna atualmente em vigor, acabaram por absorver as imposições inauguradas pelo citado decreto. 2. No Código Civil brasileiro No plano infraconstitucional, localizamos a igreja no rol de pessoas jurídicas de direito privado, segundo expressa previsão do Código Civil brasileiro, in verbis: Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: [...] IV – as organizações religiosas.

Revela-se, pois, pelas prescrições do Código Civil brasileiro, a natureza jurídica da igreja (organização religiosa), como também a sua personalidade (pessoa jurídica de direito privado). É de salutar importância destacar que as organizações religiosas (igrejas) distinguem-se substancialmente das associações civis, visto que possuem liberdade para a sua constituição, segundo atos constitutivos que lhes são próprios e autônomos.

II. A igreja e seu Estatuto

A igreja, uma vez constituída em consonância com a legislação vigente, apresenta o seu estatuto como a lei social a ser respeitada pelo conjunto de membros a ela pertencente. 134


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Ora, a força jurídica do estatuto é tão prestigiada que nem mesmo o Estado poderá a ele se opor. Pelo contrário: deverá respeitá-lo e assegurar-lhe cabal cumprimento. Eis o disposto do parágrafo 1.º, do artigo 44 do Código Civil brasileiro: São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento.1

É no estatuto que encontraremos o local da sede da organização religiosa, o foro, os fins, o modo de governo eclesiástico, a metodologia das eleições internas, a forma em que se darão as assembléias gerais, a responsabilidade dos administradores, os direitos e deveres dos membros, o critério, a graduação e o processamento das penalidades, a destinação patrimonial em caso de dissolução, entre outros. Portanto, é o estatuto a lei responsável pela regulamentação das condutas e comportamentos no âmbito da organização religiosa.

III. O ministro de confissão religiosa

Inexiste na legislação pátria regulamentação da atividade pastoral, porquanto decorre unicamente da concepção eclesiástica de cada organização religiosa. A lei não fixa parâmetros, requisitos, condições ou normas de qualquer natureza para que determinada pessoa obtenha tão nobre ofício. Nem poderia ser diferente! Somente a igreja, na condição de organismo espiritual, está apta a identificar os verdadeiros vocacionados, visto tratar-se de uma natural conseqüência do exercício da crença, que, como já visto, é uma garantia da Constituição Federal (artigo 5.º, inciso VI). No entanto, para fins de enquadramento perante o INSS, quis a Lei 8.212 de 1991, em seu artigo 12, inciso V, alínea “c”, com redação dada pela lei 10.403 de 2002, considerá-lo como “contribuinte individual”. Mesmo não se constituindo os valores despendidos ao Ministro uma remuneração direta ou indireta (Art. 22, § 13º), em razão de que seu trabalho destina-se à assistência espiritual e à divulgação da fé, o que não pode ser avaliável economicamente, o legislador o enquadrou como um contribuinte, com alíquota de contribuição previdenciária de 20%(vinte por cento) sobre os valores por si percebidos (Art. 21). A responsabilidade pelo recolhimento da correspondente contribuição cabe exclusivamente ao segurado (ministro de confissão religiosa). 1

Grifo do autor.

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Outrossim, é de salutar importância destacar que o ministro não faça jus aos direitos garantidos pela CLT, visto que não é considerado empregado da organização religiosa, por não se enquadrar nas disposições do art. 3° do referido diploma. O Ministério do Trabalho no CBO – Classificação Brasileira de Ocupações, referências 2631-05, 2631-10 e 2631-15, define: “Ministro de Confissão Religiosa são homens ou mulheres que consagram sua vida ao serviço de Deus e do próximo, com ou sem ordenação, dedicando-se ao anúncio de suas respectivas doutrinas e crenças, à celebração dos cultos próprios, à organização das comunidades e à promoção de observância das normas estabelecidas, desde que devidamente aprovados para o exercício de suas funções pela autoridade religiosa competente. Realizam liturgias, celebrações, cultos e ritos; dirigem e administram comunidades; formam pessoas segundo preceitos religiosos das diferentes tradições; orientam pessoas; realizam ação social junto à comunidade; pesquisam a doutrina religiosa; transmitem ensinamentos religiosos; praticam vida contemplativa e meditativa; preservam a tradição, e, para isso, é essencial o exercício contínuo de competências pessoais específicas.” Como conseqüência, torna-se oportuna a preciosa lição do Dr. Gilberto Garcia: Ainda que o pastor não seja legalmente empregado da igreja, Jesus ensinou que nossa justiça deve exceder a dos escribas e fariseus. Significa que, embora a igreja não possua obrigações legais com o obreiro, mantém com este um compromisso moral e espiritual de sustento condigno.2

IV. O púlpito e seus reflexos jurídicos

O púlpito é um local merecedor dos mais respeitosos sentimentos, visto que dali é propagada a Palavra de Deus e seus riquíssimos valores espirituais, morais e sociais. Entretanto, a utilização do púlpito, dissociada dos fins a que se destina a organização religiosa, poderá transformar-se em sério problema jurídico. Considerações pessoais em tom discriminatório, preconceituoso, calunioso, injurioso ou difamatório são exemplos tradicionais de ilicitudes (Código Civil brasileiro, artigo 186). Ademais, tudo que for realizado visando à obtenção de resultados desconexos com os fins sociais da igreja constituir-se-á verdadeiro ilícito, ex vi do artigo 187 do Código Civil brasileiro:

2

O direito nosso de cada dia (São Paulo: Vida, s.d.) p. 89.

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Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.3

Conseqüentemente, promessas inalcançáveis ou infundadas com vistas à obtenção de recursos econômicos, bem como induções políticopartidárias e outras incontáveis condutas não ligadas aos verdadeiros objetivos estatutários poderão causar amargos dissabores judiciais. É oportuno lembrar que a verbalização de algo considerado ilícito acabará por comprometer não só o responsável pela fala, mas também a própria organização, em conseqüência da solidariedade que se opera (Código Civil brasileiro, artigo 932, inciso III). Vejamos um exemplo jurisprudencial: Dano moral. Indenização. Ofensa à honra veiculada por pastor durante transmissão radiofônica por emissora religiosa. Responsabilidade solidária da igreja e de seu pregador — Processo 598/96 — 34.ª Vara Cível Central da Capital — SP — Juiz de Direito CARLOS HENRIQUE ABRÃO.

Finalmente, cabe o conselho: havendo excessos por parte de determinado orador, com repercussões jurídicas, é de salutar importância que o responsável pela congregação esclareça aos ouvintes que se trata de posicionamento pessoal, não compartilhando a igreja da mesma concepção, de modo a evitar sua co-responsabilidade e da denominação da qual faz parte.

V. Considerações jurídicas sobre a disciplina de membros

A disciplina, aqui entendida como uma das formas de penalizar um membro que infringiu norma(s) interna(s), é plena e inequivocamente aceita do ponto de vista jurídico, desde que prevista tal possibilidade no correspondente estatuto. É de bom alvitre destacar que a disciplina deve ter por fundamento a prática de uma conduta expressamente vedada pelas disposições estatutárias, que de tal decorra dita penalidade. Ademais, evidencia-se a necessidade de que o procedimento observe rigorosamente o rito estatutariamente estabelecido, já que este contou anteriormente com a aprovação dos membros da organização, o que se fez por meio de ato interno soberano, qual seja: a Assembléia Geral. Também não há como duvidar de que o ato disciplinar seja um imediato reflexo do zelo da organização pela conduta de seus fiéis. Portanto, além de lícito, é moralmente aceito. 3

Grifos do autor.

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Vejamos esta jurisprudência: ... não se pode perder de vista que as igrejas também têm o direito de zelar pela conduta exemplar de seus fiéis. E, no caso dos autos, havia, no mínimo, fundada suspeita de adultério, eis que, segundo consta, o fato foi confirmado pelo próprio marido traído. Do exposto, resta claro que a ré não foi responsável diretamente pelo abalo moral sofrido pelo autor.4

Ao membro acusado deverá ser dado amplo direito de contraditar as provas contra ele apresentadas, como também de amplamente defenderse através dos meios, recursos e produção das provas que dispuser, desde que lícitas e possíveis. É o que prevê o inciso LV do artigo 5.º da Constituição Federal: Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Frise-se que a aplicação da exigência acima tem sido objeto de profundas divergências jurídicas, principalmente em função das excepcionais garantias constitucionais e legais de que gozam as organizações religiosas. No entanto, por cautela, torna-se recomendável sua adoção. Outra ponta de preocupação está na publicidade da disciplina. Todo cuidado deverá ser observado para não expor o membro à situação de vexame, constrangimento ou humilhação, pois, caso contrário, poderá existir abalo moral e, por conseqüência, reparação pelas vias judiciais. A discrição é uma inevitável recomendação que se faz necessário consignar (vide artigo 17 do Código Civil brasileiro).

VI. A igreja e o problema da poluição sonora

O assunto em tela é tratado pela Lei 9.605, de 1998, que “dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”. A poluição sonora encontra tratamento no artigo 54 da referida lei, conforme vemos:

Lex, JTJ, v. 191, p. 90.

4

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Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: Pena — reclusão, de um ano a quatro anos, e multa.

A responsabilidade penal pela conduta acima identificada está prevista no artigo 2.º da mencionada lei, através do qual vislumbramos a possibilidade de incriminação do operador de som, do dirigente local e do presidente da instituição religiosa. Vale registrar que a fixação dos citados “níveis” (limites de decibéis) caberá à legislação municipal, sendo que a sua aferição, segundo o que defendemos, deverá ser feita fora dos limites físicos do templo, mais precisamente onde reside ou por onde passa quem se diz lesado pela conduta da instituição. O tratamento acústico dos templos é medida aconselhável.

VII. A prestação de serviço voluntário

O trabalho voluntário está regulamentado pela Lei 9.608, de 1998, que no parágrafo único do artigo 1.º dispõe: O serviço voluntário não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista previdenciária ou afim.

Não podemos deixar de considerar que entre o voluntariado e a relação empregatícia poderá existir um limite muito tênue. O voluntariado requer trabalho esporádico (não pode ser habitual), sem relação de subordinação (não existe patrão), tampouco vínculo econômico (não há remuneração). É conseqüência da liberalidade do ser humano! Para serviços de tal natureza é imprescindível o Termo de adesão de prestação de serviço voluntário, por meio do qual seja formalizada a relação entre a instituição e o voluntário, em conformidade com as disposições da lei acima em comento (artigo 2.º). Finalmente: Art. 3.º O prestador do serviço voluntário poderá ser ressarcido pelas despesas que comprovadamente realizar no desempenho das atividades voluntárias.

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Por derradeiro, é de importância ímpar ressaltar os riscos jurídicos de serviços denominados de mutirão, especialmente quando a execução implica perigo ao servidor, como freqüentemente ocorre na construção de templos. Sugerimos a contratação de mão-de-obra especializada, devidamente fiscalizada, assessorada e acompanhada por quem legalmente possui tal incumbência.

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