Vidas e viagens à volta do Vale do Tua

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História da Vida Quotidiana das Populações Maria Otilia Pereira Lage



VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

• Maria Otilia Pereira Lage


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

PROJETO FOZTUA coordenadores ANNE MCCANTS (MIT, EUA) EDUARDO BEIRA (IN+, Portugal) JOSÉ M. CORDEIRO (U. Minho, Portugal) PAULO B. LOURENÇO (U. Minho, Portugal) www.foztua.com EQUIPE memTUA ESCOLAS Eduardo Beira (coordenador) Albano Viseu João Luis Teixeira Maria Leonor Fernandes Otilia Lage

ISBN: 978-153-01704-8-7 Fevereiro 2016 Design gráfico, paginação e capa por Ana Prudente Editado e impresso por Inovatec (Portugal) Lda. (V. N. Gaia, Portugal) Impressão da capa e encadernação por Minerva – Artes Gráficas, Lda. (Vila do Conde, Portugal)

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Maria Otilia Pereira Lage

AGRADECIMENTOS São devidos agradecimentos públicos, entre outros, às comunidades escolares do vale do Tua, nas pessoas de seus diretores, professores e alunos, que acolheram desde a primeira hora, com todo o entusiasmo, os desafios do projeto MemTua 2 –Escolas, segunda fase do Projeto interdisciplinar e internacional História e Memórias do vale do Tua, coordenado pelo programa MIT Portugal, pela Universidade do Minho, patrocinado pela EDP. Agradece-se também vivamente o profissionalismo e incentivos do coordenador e equipas pluridisciplinares de coordenação do projeto, toda a exigente abrangência dos trabalhos realizados em estreita cooperação e solidariedade. Para os indivíduos em concreto e população em geral de todas as comunidades participantes do vale do Tua, que abraçaram, como sua, a parte fundamental deste projeto, localmente tornado mais visível nas numerosas e muito esclarecedoras entrevistas que pronta e generosamente concederam, a nossa especial gratidão pelo seu contributo indispensável aos bons resultados do trabalho em que se envolveram naturalmente e sem o qual não teria sido possível muito do conhecimento que se conseguiu alcançar e, agora, assim divulgar.

5



ÍNDICE

005

AGRADECIMENTOS

009

INTRODUÇÃO

013

PARTE I - MEMÓRIAS E VIVÊNCIAS DA LINHA E COMBOIO DO TUA

013 042

Cap. 1 –Horizonte e universo de atores sociais (entrevistas) Cap. 2– Mapeamento de memórias e materiais de memória (Análise de conteúdo)

071

PARTE II – MUDANÇAS NO MUNDO INTERIOR TRANSMONTANO

071 107 109 117 122 129 133 138

Cap.3 – Vida quotidiana das populações (testemunhos) Cap.4 – Entre o escutar e o olhar (fontes orais / audiovisuais e documentário) 4.1. A linha do Tua: significado histórico e social 4.2. Viagens de comboio, percursos e motivações 4.3. Migrações e Emigração 4.4. Memórias da Guerra Colonial Portuguesa em África 4.5. Homem e Ambiente (O rio Tua) Cap.5 – Nostalgias e utopias (pertenças e identidades continuadas)

145

CONSIDERAÇÕES FINAIS

148

BIBLIOGRAFIA



INTRODUÇÃO

O presente livro relata Vidas e viagens à volta do vale do Tua das populações desta sub- região transmontana, a partir de um conjunto numeroso e diversificado de narrativas orais recolhidas em entrevistas realizadas em 2015, por jovens alunos do Ensino Secundário e Profissional dos agrupamentos escolares dos cinco concelhos da zona, junto de entrevistados mais ou menos idosos selecionados em muitas localidades ribeirinhas. Este trabalho de pesquisa, centrado na relação escolas-comunidades envolventes, inscreve-se no âmbito do projeto MemTua 2 Escolas promovido, numa segunda fase, pelo Projeto Internacional e Interdisciplinar FozTua MIT / U.Minho (2010-2013), com a finalidade principal de envolvimento de estudantes e docentes na recolha de memórias e história oral da linha e comboio do Tua, atualmente desativados. A recente construção da barragem do Tua, associada à crescente desertificação e envelhecimento populacional local, contribuiu para impulsionar a urgência de preservação de memórias, vivências e história do Tua, objetivo central deste projeto, cuja realização se revelou bem sucedida. Daí que se tenha concluído pela conveniência e oportunidade da sua mais ampla divulgação, a par da devolução dos seus principais resultados aos diferentes atores institucionais e individuais envolvidos. O provérbio popular africano e árabe “cada velho que morre é uma biblioteca que desaparece”, filosofia antiga de sabedoria comum a outras comunidades rurais de forte expressão oral de todo o mundo, tornou-se no axioma programático deste trabalho de terreno de profunda cumplicidade entre a curiosidade dos jovens e os saberes dos mais velhos, fruto da passagem lenta do tempo, da propensão para a reflexão, do gosto de recordar, da arte de suscitar e narrar histórias e memórias guardadas que,em breve síntese, se tornam agora públicas. 9


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As bibliotecas que os velhos representam podem não desaparecer com a sua morte. Sabe-se, por tantas experiências sucedidas que basta haver continuadores para que as memórias e vivências se não interrompam no esquecimento, se perpetuem em ideias construídas e se difundam, num movimento contínuo e com inovação, recriando histórias das populações anónimas, referência, património e influência da nossa cultura e da nossa história. Dessas experiências de um mundo rural que no decurso do tempo se foi tornando híbrido, e de tempos mudados na abertura a outros mundos pelo caminho-de-ferro centenário do Tua, se constroem as narrativas dos indivíduos e das populações nativas do vale do Tua e se faz este livro que nos fala de histórias de vida e das transformações operadas ao longo da história. Ao procurar as possibilidades de, enquanto é tempo, acordar tempos idos e vozes longínquas que se vão imprimindo nas palavras soltas, os alunos das escolas do vale do Tua colheram sistematicamente testemunhos de um passado cujo legado se pode perpetuar por sucessivas gerações. Esta matéria, em parte aqui condensada, é fruto de um trabalho coletivo e cooperante entre diferentes gerações. Foi alicerçado em depoimentos de primeira mão, fornecidos por testemunhas presenciais, gravados em vídeo e registados em texto. Com a recolha organizada desses testemunhos orais que relatam episódios, práticas, rotinas, costumes, medos e crenças, romarias, festas e lazeres, saúde e alimentação, vivências do dia-a-dia, atividades e trabalhos, recordações, memórias, valores, perceções, afetos e relações mais ou menos “naturais” com o ambiente envolvente de que se entreteceram e entretecem os quotidianos das pessoas comuns das pequenas cidades, vilas, aldeias e lugares que se foram desenvolvendo ao longo do rio Tua e na proximidade da sua linha férrea nos últimos 60 anos, fica-se em presença de um acervo considerável de fontes orais sobre as quais se pode construir a história da vida quotidiana contemporânea desta micro-espacialidade territorial. São traços e inscrições dessa densidade existencial humana, construída numa espácio-temporalidade própria, que dão corpo à diversidade complementar de vidas e viagens de comboio nas linhas férreas do Tua e do Douro, à volta e a partir do vale do Tua, que aqui podemos conhecer. Permite-nos também este livro reconhecer, a partir do viver, trabalhar, pensar e sentir das populações locais, as interdependências que coexistem na relação entre homem, ambiente e técnica e aprender a interpretá-las em proveito 10


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dos tradicionais híbridos de natureza e cultura, em risco de desaparecerem. Abre-nos igualmente perspetivas para a salvaguarda da biodiversidade e da variedade de paisagens ainda hoje observáveis e que justificam se venha a instaurar aí uma rede eco-tecnológica coerente 001, suscetível de criar nichos que se estendam ao conjunto do vale do Tua, onde a ferrovia sublinhou a sinuosidade do rio, ligando e servindo a efervescência de vida nas suas margens, sem se restringir apenas a algumas zonas naturais.

001  Apud RHEINBERGER, H-J – Itérations. Paris: Diaphanes, 2013, p. 50.

11



PARTE I - MEMÓRIAS E VIVÊNCIAS DA LINHA E COMBOIO DO TUA

CAPÍTULO 1 – HORIZONTE E UNIVERSO DE ATORES SOCIAIS (ENTREVISTAS)

A área territorial-administrativa localizada no Baixo Tua entre os distritos de Bragança e Vila Real, adiante cartograficamente representada, define o horizonte e o espaço de intervenção regional e local do projeto MemTua 2 Escolas (2ª fase do projeto internacional FozTua) implementado intensiva e sistematicamente em trabalho de campo, no decurso do ano letivo 2014-2015, por cerca de 200 alunos e docentes das escolas secundárias e profissionais dos cinco concelhos do vale do Tua. Parte significativa do trabalho interdisciplinar curricular e extra-curricular subjacente a este projeto dinâmico desenvolvido em parceria informal escolacomunidade, traduziu-se, designadamente, na produção final de 150 entrevistas registadas em diferentes suportes. Os materiais de memória e história oral da região do Tua assim recolhidos constituem um manancial significativo de informação sobre a história oral e a vida quotidiana das comunidades locais. São também um considerável acervo de conteúdos audiovisuais suscetíveis de futura utilização pública no quadro de potencial promoção turística regional que venha a ser implementada por uma política de desenvolvimento sócio-cultural sustentado. Está regulamentarmente previsto que cada um dos cinco municípios - Alijó, Carrazeda de Ansiães, Mirandela, Murça e Vila Flor - abrangidos pelo vale do Tua, venha a ser porta de entrada no Parque Natural Regional do vale do 13


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Tua002. Este estender-se-á por 25 mil hectares, sendo expectado como fator de desenvolvimento turístico nesta região de Trás-os-Montes confinante com o Douro, embora continue por resolver o plano de mobilidade quotidiana e turística desejado pelas populações ribeirinhas. Gerido pela Agência de Desenvolvimento Regional do vale do Tua, este processo, num valor estimado de 70 milhões de euros, integra-se no âmbito das externalidades da construção da barragem em Foz Tua pela EDP, cuja albufeira vai submergir 18 quilómetros da centenária ferrovia. Aliás, as problemáticas aqui enunciadas, quer a da construção da barragem, suas potencialidades e contrapartidas locais, quer a da escassez de mobilidades derivadas do encerramento da linha férrea do Tua, foram tema recorrente de considerações de denúncia e justeza por parte de muitos dos entrevistados.

vale do Tua – rio Tua, afluente da margem direita do rio Douro Foto Henri Richard

Localização dos concelhos vale do Tua face ao rio Tua 002  O regulamento do Parque criado oficialmente foi publicado em Dário da República a 24 de Set. de 2013.

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Áreas concelhias do vale do Tua

Concelho de Alijó

Concelho de Carrazeda de Ansiães

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Concelho de Mirandela

Concelho de Murça

16


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Concelho de Vila Flor

O trabalho de preparação e pesquisa, supervisionado pela equipa coordenadora do projeto, através de reuniões regulares e frequentes de escola e / ou gerais, com a direção e docentes dos estabelecimentos escolares, foi realizado local e presencialmente numa vasta rede de localidades dos cinco concelhos atrás mapeados, junto de um universo representativo de entrevistados ou informantes privilegiados, por um número alargado de alunos do ensino secundário e profissional das sete escolas envolvidas no projeto. A compilação e organização geral dos dados e elementos de informação mais importantes relativos ao conjunto das entrevistas resultantes desse trabalho, encontram-se descritas na tabela nº1, que adiante se apresenta. Os conteúdos extraídos das transcrições das entrevistas e sintetizados na coluna da indexação, bem como as fontes orais também incidentes sobretudo em dimensões relevantes da história local / regional recente do vale, linha e comboio do Tua, encontram-se registadas em diferentes suportes e organizadas em duas bases de dados, textual e audiovisual, respetivamente, no “Google drive” e no “Google youtube”, digitalmente compiladas. Importa referir, quanto ao planeamento prévio das entrevistas, que o mes-

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mo partiu da análise de guidelines “como fazer e transcrever entrevistas”. Foram elaborados, no início do trabalho, pela equipa coordenadora do projeto, para apoio aos docentes e alunos responsáveis pela implementação e execução do mesmo. As entrevistas eram semi-diretivas ou semi-estruturadas, o que permitia colocar perguntas não previstas no guião e, assim, elucidar algumas respostas dos entrevistados e incluir, se necessário, outras questões. Esses guiões foram depois usados pelos alunos entrevistadores, no seu trabalho de campo, obedeceram a uma reformulação do modelo de guião fornecido, das questões–tipo enunciadas sobre a temática central definida e a uma reestruturação adaptada aos entrevistados e contextos socioculturais e ambientais respetivos. Os potenciais entrevistados foram contactados antes da realização da entrevista para que pudessem tomar consciência das finalidades da mesma e da importância da sua participação. Estes contactos revestiram-se de grande utilidade pois possibilitaram ainda ajustes recíprocos sobre condições e termos gerais a ter em conta na situação de entrevista, contribuíram para uma maior motivação, preparação e adesão dos entrevistados e, consequentemente, para o sucesso das entrevistas que no final se registou. Nesta fase, que compreendeu também a seleção dos atores e destinatários do estudo, no âmbito de cada escola, foram estabelecidos os respetivos objetivos, os tempos previsíveis de duração média das entrevistas (5 a 15min.), com registo audio-visual e textual, para gravação digital dos conteúdos e posterior tratamento, data hora e local de realização, encontrando-se equacionadas hipóteses sobre informações a prestar aos entrevistados e eventuais interessados acerca da razão e fins do estudo, anonimato a salvaguardar, e normas gerais para condução adequada das entrevistas de modo informal, em tom cordial. Na etapa de enquadramento e realização das entrevistas orientadoras do processo e dotadas da necessária flexibilidade para permitir abertura ao discurso dos entrevistados, mas prevendo simultaneamente algum controlo para que se não desviassem do assunto principal, estas obedeceram a um conjunto de perguntas-tipo, encadeadas e sequenciais, mas cuja ordem era suscetível de permuta. As transcrições das entrevistas, que registam as ideias chave da conversação, são acompanhadas de uma ficha técnica com a indicação do fator lugartempo, considerações relativamente ao tipo de entrevista, link do registo vídeo respetivo e dados biográficos de identificação dos entrevistados, os quais, na fase de compilação e organização de dados, se mantêm no anonimato, para evitar a sua identificação por terceiros. As entrevistas decorreram numa situação de modus vivendi interaccional 18


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(Goffman, 1985:18) suficientemente harmoniosa, cordial e em condições agradáveis de intercomunicação temporária. Essa harmonia foi possível porque os participantes colocaram acima dos seus próprios desejos e interesses individuais os dos seus interlocutores, prestando-se e prestando-lhes toda a atenção na abordagem dos temas e questões enunciadas nas perguntas dos entrevistadores e respostas dos entrevistados. Prevista a gravação videográfica de todas as entrevistas, com a duração média de 10 a 15min.de filme por entrevista individual e 60 a 75 min., nos poucos casos, de entrevistas coletivas, foi possível realizá-la nesses termos, na sua grande generalidade, excetuando um número muito reduzido de situações em que os entrevistados se não prestaram a essa modalidade de registo, por timidez, inexperiência e outros tipos de receio suficientemente explicitados e devidamente acatados pelos entrevistadores. A tabela seguinte compila e apresenta os dados essenciais do conjunto das entrevistas e das linhas gerais meramente indicativas do processo escolar da sua realização. TABELA Nº1 - ENTREVISTAS DAS ESCOLAS NO / DO VALE DO TUA AGRUPAMENTO / ESCOLA SECUNDÁRIA CONCELHO DE ALIJÓ 10.º Ano A Entrevistador

1AV

Entrevistado

JM

Género

Indexação Serões na aldeia / trabalhos diários / ocupação das crianças / emigração / enfermeira / Moçambique / doenças africanas / padeira / S. Mamede Riba Tua

F

10.º Ano B Entrevistador

1LR

Entrevistado

AL

Género

M

Indexação Pesca com chumbeira na barragem da Valeira, Douro / barco a remos / venda de peixe / guarda venatória / restaurante Calça Curta-Tua / funcionário da Cockburn Smith- Vinho do Porto

19


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2MS

PS

M

Caldas de Carlão / viagens de comboio inesquecíveis / paisagem / empresário de terraplanagem / areia do rio / linhas do Douro e do Tua

3DS

AA

M

Agricultura / serviços públicos / emigração Suiça / viagens de comboio Tua-Pinhão por doença e em lazer / funcionário da escola

4MS

JP

M

Linha do Tua / Pesca - hobby e tradição familiar / Tua, rio de elite / fauna piscícola do Tua – boga, enguia, escalo, espécies exóticas / materiais de pesca / lontras / amante da natureza e sossego / memórias

5LC

AJ

M

Guerra Colonial (1971) / enfermeiro militar da Força Aérea / Luanda

6JB

JB

M

Viagens de comboio em trabalho e passeio / cultura da vinha / trabalhos manuais e mecanizados

7LC

AC

M

Brincadeiras de férias no rio Douro / Pesca / amanho do peixe / venda de peixe / pescador profissional / calor estival

8DG

AG

M

viagens pedestres de S.Lourenço a Brunheda povoações da linha do Tua

9CM

FR

M

Guerra Colonial / militar Angola / memorias da guerra e da vida em Àfrica

10 H M

JM

M

Guerra colonial portuguesa em África / excombatente na Guiné (1967-69)

M

Memórias de infância da linha e do rio Tua(anos 1960) / Safres-povoação ribeirinha do Tua / sonho de viagens / amor-ódio à solidão do rio Tua

11 H M

JL

20


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11.º Ano C Entrevistador

1FC

2JG

Entrevistado

AP

FQ

Género

Indexação (tópicos) Ferroviário da CP / movimento dos comboios do Tua / obras na linha / peripécias de trabalho / militar em África / Guerra Colonial / S.Lourenço – lua de mel / Brunheda-neve / Cachão-aguardente / crítica ao encerramento da linha

M

M

Amieiro / Chefe de estação / linha do Tua-via mais importante do Nordeste Transmontano / caminho-de-ferro fator de desenvolvimento / construção da linha do Tua / II Guerra Mundiallenha verde / paragens comboios / galegos

3HN

OF

M

Utente da linha do Tua - estudante em Bragança (anos 1960) / viagens de comboio Tua a Bragança – 6h / atraso dos comboios em horários / familiares emigrados

4AV

NA

F

Acidentes 2007 e 2008 linha do Tua / bombeira / buscas de pessoas mortas e vivas / turistas ingleses / hospital de campanha 12.º Ano B

Entrevistador

Entrevistado

Género

Indexação (tópicos)

1CF

JR

M

Utente da linha do Douro / pesca no rio Tua / laranjais de S. Mamede de Riba Tua / emigração África / máquinas de carvão comboio do Tua / nostalgia da linha do Tua

2AC

MR

M

Passeios e aventuras de infância no rio Tua / Guerra Colonial / morosidade dos comboios do Tua e Douro

3FS

MV

M

comboio do Tua / Rega das laranjeiras no Tua / Mexilhões no rio Tua / Pesca rio Tua

21


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4SG

AE

M

Recordação de infância linha do Tua / transportes - comboio a vapor e burro / linha do Tua até anos 1980 comparável a IC5

5AP

P da R

M

Infância ligada ao rio Tua / rio mais importante que a linha do Tua / linha do Tua prejudica centralidade de S. Mamede de RibaTua / alcunhas / professor e investigador local

6AR

JM

F

Viagens de comboio do Tua / Barcas de passagem no Douro / Símbolo de boa viagem

7AC

AE

M

Utente frequente do comboio do Tua como estudante e militar / Ribeirinha – apeadeiro da linha do Tua / habitante e residente do vale do Tua

8AC

M MP

F

Rios Douro e Tua influência na agricultura + evoluida / comboio muito usado há 50 anos / episódio de travessia do rio Douro

9CF

AP

M

Comboio a carvão / pitoresco da viagem / linha do Douro / viagens de comboio longas / vivências de colégio interno e vida militar

10 C F

JP

M

Guerra Colonial / mobilização para Guiné / acidente na Madeira / vivências no mato África / emigração Alemanha

11 CF

LC

F

Viagem no comboio do Douro ida a médico / episódio ficcionado de queda da ponte do rio Tua / venda de pão nas povoações da linha do Tua / alcunha “seus olhos de comboio”

22


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CPTT 2.º ano Entrevistador

Entrevistado

Género

Indexação (tópicos)

1CA

EM

F

Viagem de infância no comboio do Tua / viagem maravilhosa a Mirandela / peixes

2CA

J de A

M

Guerra Colonial / Guiné

CPTT 3.º ano Entrevistador

Entrevistado

género

AS

EA

F.

Indexação (tópicos) viagem de infância na linha do Douro. Memória de abandono e solidão de órfãos

AGRUPAMENTO / ESCOLA SECUNDÁRIA CARRAZEDA DE ANSIÃES 12º Ano – TGPSI Entrevistador

Entrevistado

Género Indexaçao (tópicos)

1CV

DC/DA/AF /LG

M/F

2FC

JMM

M

Agulheiro / apeadeiro Tralhariz

3DV

L CV

M

Viagens de comboio de soldados

4FP

FM

F

Operária fabril / viagens de comboiotrabalho

5RM

VL

M

Operário da CP

6V A

GM

F

Viagem comboio / linha Tua vida quotidiana / paisagem

7DL

GMT

F

Movimento e fecho linha Tua / acidentes / importância social da linha do Tua

Movº defesa da linha Tua / Emigração / Moleiros / cheias rio Tua / pessoal ferroviário / 25 de Abril / descarrilamentos

23


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8ST

MG

F

Correio / comunicações

11º Ano – B Entrevistador

Entrevistado

Género

Indexação (tópicos)

1 CV

JR

M

Chefe de estação / mezinhas / comunicações / correio / feiras / ambiente comboios / Guerra Colonial / quotidiano

2DV

CV

M

Viagens lentas de comboio TuaBragança / filho de ferroviário

3AM

AM

F

Lenda de fonte no rio Tua

3AM

LP

F

Linha do Douro

4ML

LCA

M

Viagem de infância na linha do Douro

5MB

M de J

M

Chefe de lanço na linha do Tua / descarrilamentos / crítica à gestão da linha Tua / trabalhos ferroviários

6AM

IT

F

Peixeira / viagens comboio estudos Bragança

7CA

HM

M

Episódio viagem comboio

8EA

JM

M

Trabalhador ferroviário / acidente / estação do Tua

9FF

JF

M

Emigração Suíça / viagem comboio de soldados

10 P A

AS

M

Movimento estação do Tua / viagem de comboio / trabalho na aldeia do Tua – quintas e comboios

24


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11 A C. L

LC

M

Importância da linha do Tua / escoamento de produtos agrícolas / turismo / evolução transportes / paisagem / natureza / fotografia

12 A T

AT

M

Viagem lazer comboio Tua / potencial turístico da linha Tua / crítica a barragem

13 J B

MF

F

Termas de S. Lourenço / I Guerra Mundial / Pneumónica / futuro da linha do Tua

14 M R

FM

F

História local / cultura popular / Cachão / desenvolvimento e caminho-deferro / racionamento / II Guerra / família ferroviários / comunicações

15 O

RP

M

Denúncia do encerramento da linha / Turismo / viagem de comboio do Tua

16 T M

RM

F

Movimento na aldeia do Tua / Linha mais valia para o Tua / Turismo / Linhas Tua e Douro

17 D L

FA

M

Maquinista da linha do Tua / carreira ferroviária / família de ferroviários / denunciado encerramento da linha e extinção de benefícios / regulamentos dos comboios / máquinas

18 D A

JA

M

Emigração França / viagem de comboio tropa / Moçambique / caminho-de-ferro e desenvolvimento Trás-os-Montes

19 A A

LC

F

Canção popular / quotidiano no vale e comboio Tua

25


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20 A

N / Identfº

?

Ambiência das viagens no comboio do Tua

11.º Ano A Entrevistador

Entrevistado

Género

Indexação (tópicos)

1CC

AC

F

Memórias de viagem de comboio na infância

2JS

AM

F

Prejuízos em propriedades construção da barragem do Tua

3JM

JE

M

Viagem de comboio de jovem apaixonado em passeio escolar / beleza da paisagem

4RM

JM

M

Ambiente do comboio / viagem como militar

5JG

CQ

F

Família de ferroviários do Tua / estação do Tua

6TM

JM

F

Anos 1940 / Manutenção da linha do Tua

10.º Ano B Entrevistador

Entrevistado

Género

1AC

ER

F

Movimento na estação do Tua

2EP

MMA

F

Emigração / trabalhos agrícolas / correio / contrabando / condições de vida

3FS

AMS

F

Viagem de comboio compras

4IS

MLM

F

Viagens de comboio a Mirandela / paisagens

26

Indexação (tópicos)


Maria Otilia Pereira Lage

5MA

MA

M

Trabalhador ferroviário / lendas / crííica ao fecho da linha do Tua

6RP

FL

F

Incêndios provocados por comboio a vapor / ambiente comboios / natureza

7TC

LJ

M

Revisor / carreira ferroviário

8 TA

LA

M

Serviço de taxista / filme antigo de Bragança

9LL

MRL

F

Viagem genérica de comboio / Linha do Douro

10 F M

LG

M

Trabalhador da CP

10.º Ano A Entrevistador

Entrevistado

Género

Indexação (tópicos)

1AM

MP

M

Mecânico de comboios / viagem de comboio Tua

2AM

MC

F

Contrabando / feiras / rezas / doenças / aventuras de viagem de comboio / tristeza por encerramento da linha do Tua / Pereiros-fregª ribeirinha Tua

3AP

JS

M

Viagem de comboio de lazer / paisagem / feiras de Mirandela / comboios a vapor e diesel / derrocadas

4CS

IA

M

Viagem de comboio para ir para a tropa

5DR

IL

F

Emigração Angola – Carrazeda e Mirandela / comboio favoreceu região

27


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

6MC

AC

M

Transportes ferroviários / adubos / Grémio e Cooperativa Carrazeda / serviços públicos / defesa da barragem do Tua / produtos agrícolas / história da linha do Tua

7FG

MA

F

Codeçais-freguesia ribeirinha do Tua / comboios – generalidades

8FM

DI

F

Ambiente e utilidade do comboio do Tua / Termas de S.Lourenço / padeira no Tua e abastecimento de pão a povoações da linha / crítica à barragem

9JM

FB

F

Viagem de comboio de lazer

M

Maquinista linha Tua 1972-2000 / movimento de mercadorias e passageiros / solidariedade ferroviária / turismo / circulação de comboios / crítica ao fecho da linha do Tua

10 L M

F dos A

11 M M

JM

M

Emigração França / transporte carros de bois / tempos difíceis / epidemias de pessoas e vinhas do Douro / vida quotidiana

12 P C

CC

F

Emigração Angola / Guerra Colonial / fotos antigas

13 T S

JR

M

Evolução de transportes / natureza virgem / Chefe de estação do Tua / categorias da carreira ferroviária

14 V L

MBeJB

M/F

28

Termas S. Lourenço / linha do Tua turística / acidentes / paisagem e fruticultura vale do Tua


Maria Otilia Pereira Lage

15 V B

AR

M

Crítica ao encerramento da linha / interioridade / viagem de comboio ida a médico

16 R S. F

R S. F

M

Linha do Tua: 2 troços Mirandela -Bragança

ESCOLA PROFISSIONAL CARRAZEDA DE ANSIÃES 12ºAno Entrevistador

1Y

2

Entrevistado

Género

0016ACCC

M

00025 Y

M

Indexação (tópicos) Maquinista 78 anos linhas do Sabor, Tua, Corgo e Douro / viagens / profissão / história de vida / saúde / ordenados / dias de feira de Moncorvo / táxis e autocarros / encerramento das linhas de via reduzida / acidente / vida das pessoas História de vida / pastor / 10 irmãos / 3.ª classe / minas de volfrâmio / ferro, estanho e volfrâmio- trabalho nas minas / a pedra era muito dura / contrabando / os odres com azeite da Brunheda a S. Lourenço / emigração / importância do Tua / a pesca.

AGRUPAMENTO / ESCOLA SECUNDÁRIA CONCELHO DE MIRANDELA 12.º Ano A Entrevistador

Entrevistado

Género

1NS

AJL

M

Indexação (tópicos) Agricultor / emigração / crítica ao fecho da linha / negócio de gado / anos 1960-ambiente de época 29


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

2NSeSL

AF

M

Ferroviário - Sapec / Cachão / Guerra colonial / comboio do Tua e transporte de mercadorias

3FP

AR

M

Eletricista CP / comboio do Tua / engenheiros

4DR

FT

M

Emigração / construção da linha do Tua até Bragança

6NA

LM

M

Passageiro / viagem comum de comboio

7NP

NM

M

Maquinista da linha do Tua / transporte de mercadorias / crítica fecho da linha

8PS

FD

F

Utente linha do Tua / Viagem de comboio / Feiras / Guerra Colonial

M

Motorista / viagens de comboio Douro e Tua anos 1949 e 1950 - estudos no seminário e operação ciúrgica / bom ambiente e respeito no comboio pouco confortável / transporte de mercadorias (batatas, alheiras, adubo, encomendas) e passageiros ricos e pobres / feiras / emigrante em Angola de 1958-1974

M

Carpinteiro e funcionário público em Angola / emigração Angola / viagem de comboio em trabalho / ambiente do comboio, festivo, de conversa, cantares e tocadores de gaita de beiços e realejo / apeadeiros / muitos passageiros / saudades das viagens / feiras de gado / viagens Mirandela-Tua máquina a vapor e avarias

M/F

Linha do Tua / Frechas / comboio lento e muitas paragens / Mirandela / viagens divertidas de comboio Vilarinho das AzenhasCachão-Frechas-Mirandela- Macedo-Bragança / muitos passageiros / paisagem espetacular / Emigração para França / termas S.Vicente / festas / feiras – Mirandela, Macedo, Chacimcomplexo do Cachão / Guerra Colonial – Guine e Angola / peixes do rio / saudades do comboio e da linha em movimento.

9 M LAV

10 A L G V

11 A L G V

ANR

FAC

M dos S e F S

30


Maria Otilia Pereira Lage

12 M B

PMAFM

F

Mirandela / comboio / linha do Tua / professora, filha de ferroviário / regalias de ferroviários e familiares / ambiente fantástico nas viagens de comboio – jogos, cantares, leituras, paixões… - e nas estações de caminho-de-ferro / idas de comboio de muita gente a feiras e festas / militares / estudantes / grande movimento Vilarinho, Cachão, Romeu, Cortiços, Frechas.

13 P C

HDPF

F

Operária no Cachão - emigração a “contratas” França, Suiça, Andorra, Espanha – doméstica. Viagem de comboio de Frechas a Mirandela – estudos, feiras- saúde e visitas a familiares / ambiente de música no comboio- realejo, concertina / grande movimento de passageiros entre Cachão e Amieiro / Guerra colonial – Guiné e Angola / festas de santos populares.

14 D S

MOP

F

Linha do Tua / comboio / Mirandela / Emigrante, empregada do estado, Moçambique e Angola / viagens de comboio Mirandela – Porto – saúde / Guerra Colonial - Angola

M

Linha do Tua / comboio do Tua / Mirandela. Viagens de comboio visita a familiares e emigração - Brunheda- São Lourenço -TuaRégua- Santa Marta Penaguião / feiras / muito movimento de passageiros e mercadorias / emigrante em Moçambique e Angola / colonos / memórias da guerra em Angola como vítima / viagem de comboio e barco de Mirandela a Angola

15 F P

HGS

10.º Ano B Entrevistador

Entrevistado

Género

1MF

M.J

M

Indexação (tópicos) Mudanças no mercado / feira de Mirandela / melhoria de vida.

31


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

2MR

MS

M

viagens de comboio; comboio cheio; memórias da linha; Brunheda; o rio; paisagem; recordações; agricultura; porquê e como foi construída a linha; desenvolvimento da região; transporte de produtos e movimento das populações; declínio da linha

ESCOLA PROFISSIONAL DE MÚSICA MIRANDELA 12.º Ano A Entrevistador Entrevistado Género Indexação (tópicos) 1 A&L

2 A&L

3M

AV e JEB

A-RFST

XeY

M

Associação de Socorros Mútuos dos Artistas Mirandelenses / orquestras / conjuntos / incêndio / bailes também no Cine-Teatro Mirandelense

M

Música popular / fundação do rancho folclórico S.Tiago de Mirandela em 1963 numa marcha de Carnaval / repertório músical / cegadas / folclore local / Pauliteiros / projetos: bombos, banda, samba…

M

festa de Castedo / história de vida / recordações de festas religiosas e as vindimas / as concertinas e ferrinhos / as lagaradas / Fui ao Douro à Vindima / buscar água ao rio Tua / linha do Tua / viagem para o Porto / S. Lourenço / ocupação do tempo nas viagens / bailes em S. Lourenço / feiras / festas / saudação aos patrões / festa de encerramento das vindimas / grupo folclórico /

4M

AJSP

M

Cantoneiro Municipal Alijó / Memórias do transporte de vinhos para S.Mamede / vinho / a linha férrea / Castedo do Douro / festas de antigamente / canções no trabalho / história de vida / utilização do comboio / a linha do Tua / recordações do transporte de uvas / a pisa das uvas / cantiga das feiticeiras / jogos no lagar / rancho folclórico do Castedo /

5M

R

M

1 entrada; 2 modinha

32


Maria Otilia Pereira Lage

6JM e FS

7JM e FS

8N e G

E

FCS

FM

M

Arraiais e festas da cidade de Mirandela e das aldeias / história de vida e linha do Tua / viagens / música na viagem / banda de Mirandela e Moncorvo / paisagem

M

Maestro da banda de Valpaços / Memórias da linha; viagens lentas; actividades ao longo da viagem; arraiais e romarias; as bandas; projecto EDP para a Orquestra Nova Geração; ambiente das bandasrepertório

M

Padeiro / música / festas antigas / linha do Tua / ceifas do trigo e centeio / minas da Panasqueira / Guerra Colonial / recordações das viagens de comboio / conversas / memórias / A pomba (canção) / horários do comboio / importância da linha / as feiras e as tascas / canções no trabalho / rancho de Murça /

9NJeA

AMM

M

Assentador na CP, trabalhador no Metro de Mirandela / A neve em 1956 e o comboio / as oficinas de reparação da CP em Mirandela / trabalhou em Sortes, Mirandela, Ovar, Salselas, Pocinho, emigrou, doença, encerramento da linha Bragança -Mirandela, razões do acidente na linha, vida na linha.

10 TR

C

F

arraiais; viagens na linha do Tua; duração da viagem; ambiente; horários.

F

Recordações da música em arraiais; viagem ao Tua; viagem para o Porto - viagens demoradas; canção de Mirandela; carruagens de madeira; falta do comboio para algumas populações; feiras; saudades desse tempo.

11TR

12JA

Y

FB

Viagens no comboio linha do Tua (Cachão); nova visão sobre o vale do Tua; serviço militar; comboio lento e muito cheio; confiança na máquina e no maquinista; ligação no Tua; viagem até ao Porto; ambiente a bordo; convívio; circulação do correio e de notícias; o problema da bitola; acidentes na linha; desdobramentos; trabalhos agrícolas; a espera no Tua; o futuro do vale do Tua; a via rodoviária ganhou à ferroviária; a barragem.

33


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

ESCOLA PROFISSIONAL CONCELHO DE MURÇA 12ºAno Entrevistador

Entrevistado

Género

Indexação (tópicos)

1Y

JCR

M

Empresas de camionagem Boais & Rodrigues / Cabanelas / Rodonorte; mercadorias e passageiros / importância dos transportes rodoviários e declínio do comboio

2A

JAB

M

Angola / Rodésia / Afr.Sul / história de vida / fábrica de vigas de Murça / dificuldades de se instalar em Murça

3Y

X

M

Pescador ; roubo de material do comboio / pesca.

F

Memórias de uma professora do 1.º ciclo sobre a escola primária; o seminário; experiência do contacto com os alunos; tempos diferentes dos de hoje; estratégias para ensinar os alunos; a escola de Jou; a telescola.

M

O antes e o agora de Murça; mais amizade; agora, mais individualismo; atividades; tempos difíceis; aprendeu a arte de alfaiate porque os estudos eram para as famílias mais poderosas; Guerra Colonial; cobrador da água e luz - impacto devido a falta de poder de compra; dificuldades de transportes

4MVI

5JM

MV

JAM

AGRUPAMENTO / ESCOLA SECUNDÁRIA CONCELHO DE VILA FLOR 10.º Ano B Entrevistador Entrevistado Género

Indexação (tópicos)

1MAeSA

Felgueira povoação desabitada / viagem de comboio - estudos no seminário de Vinhais (Bragança) / crítica encerramento linha do Tua

MAeA

M

34


Maria Otilia Pereira Lage

2JG

MG

M

Eletricista / viagem comboio como militar / comunicações / quotidiano agrícola / linha do Douro e linha do Tua

3FSeMF

F

M

Linha do Douro e linha do Tua vistas por utente nonagenário

4ESeP de J

GB

F

Acidentes da linha do Tua / barrancos / a favor da barragem

5 S, R e M

X

?

Obs: Sem conteúdo

6SM

J.

F

Viagens de comboio ida a médico / S. Lourenço / roubos no comboio / boas e más memórias / funcionária da escola

7TN

IA

F

Vida quotidiana / viagem de comboio ida a médico

8JCeTC

A

M

Viagens de comboio como militar / a favor da linha e denúncia do encerramento 11.º Ano A

Entrevistador Entrevistado Género

Indexação (tópicos)

1AF

EA

F

Viagem de comboio de férias / comboio transporte económico / combate ao isolamento / paisagem e rio / turismo / crítica fecho da linha e desinvestimento

2BT

AT

M

Viagem como militar / ida a pé para o Tua / vida difícil no vale do Tua / contrabando de azeite

3BM

RF

M

Anos 1950 / 60 – fracas comunicações / viagem de comboio como militar em Bragança / comboio único meio de transporte

4CC

AC

M

Experiência da linha do Tua / feiras / quotidiano no vale do tua / agricultor e construtor civil / a favor da linha / transporte de mercadorias e passageiros

35


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

5DT

G

M

Mercadorias transportadas na linha do Tua / denuncia da atual falta de transporte das populações

6DF

A

M

Peripécias de viagem de comboio Tua agradável e bonita / turismo

7MP

C P e AA

M/M

Passageiros da linha do Tua em criança e militar / transporte da região / Cachão / serralheiro / trabalhador da CP

8RA

DC

M

Viagem de comboio como estudante / soldados / património ferroviário / nostalgia do movimento ferroviário

9RP

E

F

Guerra Colonial / África / rádio / cultura popular / quotidiano / linhas do Tua e Douro 11.º Ano B

Entrevistador Entrevistado Género

Indexação (tópicos)

1AN

JG

M

Viagem de Bragança a Tua =8h / paisagem bonita / regedor

2AG

HR

F

Migrante transmontana Lisboa / viagem de comboio em férias / 1º beijo ao namorado / a favor da linha e da barragem do Tua

3BG

PC

F

Viagem de comboio em família na linha do tua e do Douro / bom ambiente no comboio

4CM

A de S

F

Movimento quotidiano de passageiros no comboio / comunicações

5DP

FP

M

Viagem de comboio Tua como militar / viagens divertidas / comboio lento / crítica à barragem do Tua / defesa da preservação da linha do Tua

6IM

MM

F

movimento do comboio do Tua

36


Maria Otilia Pereira Lage

7LM

MOT

F

Viagens de comboio linhas do Douro e Tua como estudante / canção infantil / Magistério Primário Bragança / Movimento Nacional Feminino / Casa Africana –Vila Flor

8RM

JL

M

Crítica à falta de comboios / problemas na CP / horários comboios incompatíveis / comboios diários

9SP

FeFP

F/M

Viagens de comboio em grupo e lazer / vantagens do comboio / colónias de férias filhos de ferroviários / movimento da estação do Tua

10 D G

TG

F

Viagem em comboio misto / estação de Abreiro / feiras / quotidiano / anos 1980

Uma abordagem quantitativa da precedente tabela descritiva do corpus de entrevistas permitiu a elaboração deste quadro síntese numérico complementar que destaca algumas variáveis mais significativas que se ilustram nos gráficos seguintes. QUADRO SÍNTESE - CORPUS DE ENTREVISTAS Turmas Entrevistadores Entrevistados Entrevistas (10º-12º) (alunos 16-20 anos) (60 - 95 anos)

Género MF

Concelho

Escolas

Alijó

Agrup. Secund.

6

30

30

30

23

7

Carrazeda

Agrup. Secund.

5

60

60

68

39

29

Profissional

1

3

4

3

2

1

Secundário

2

15

10

16

11

5

Profissional

1

12

12

12

10

2

Murça

Profissional

1

5

5

5

5

1

Vila Flor

Agrup. Secund.

3

27

33

30

17

13

Totais globais:

7

19

152

154

162

107

58

Mirandela

Fonte: Tabela de dados das entrevistas MemTua (2015) 37


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

Gráfico 1 – Entrevistas no horzonte de escolas

80 60 40 20 0

60

Se or Fl

aur ç M

M

Vi la

Pr

Pr aira

3

of

c and el ira M

27

8 1

c

7 1

1

Se

of Ca

Ca

rra

rra

ze

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da -

Pr

Se

ec -S ó lij A

Escolas

15

3 1

nd el

5

c

6

of

30

Turmas

Gráfico 2 –Universo de entrevistados Vila Flor - Sec

33

Murça - Prof

8

Mirandela - Prof

7 10

Mirandela - Sec 4

Carrazeda - Prof

60

Carrazeda - Sec 30

Alijó - Sec 0

20

40

37+63 18+42+2107318

60

Grafico 3 - Universo de entrevistados por género Masculino 102

Feminino 60

Grafico 4 - Universo de entrevistados por escola

38

Alijó Agrup. Sec. 30 Carrazeda Agrup. Sec. 68 Carrazeda Profissional 3 Mirandela Sec. 16 Mirandela Profissional 12 Murça Profissional 5 Vila Flor Agrup. Sec. 30


Maria Otilia Pereira Lage

Finalmente, importa sublinhar que a produção de entrevistas, cujo resultado final, em linhas gerais e sua organização base se acabou de introduzir, supôs uma relação interativa escola / desenvolvimento curricular – comunidade / transmissão de vivências e memórias orais, a qual significou para a maior parte dos alunos intervenientes, a sua primeira experiência de trabalho de campo ou de terreno. Todos os protagonistas envolvidos participaram empenhadamente apresentando uma generalizada e boa adesão, profícuo trabalho de cooperação pedagógica e cultural, revelando um cuidado especial bem sucedido, quer na seleção dos informantes privilegiados, transmissores de memórias da linha e comboio do Tua, quer na aplicação de um conjunto de regras, procedimentos e orientações técnicas recomendadas para o trabalho de campo que decorreu de modo faseado e bem integrado na organização curricular. Foram entrevistados em cenários de interior e exterior de diversas localidades dos cinco concelhos, mais de centena e meia de informantes privilegiados, homens e mulheres numa escala etária média de 60-95 anos, de origens e condições sociais diferentes: ferroviários (maquinistas, manobradores, chefes de estação, agulheiros, chefes de lanço, revisores, operários, mecânicos, eletricistas…), descendentes e familiares de ferroviários, operários, agricultores, comerciantes, empregados de serviços, funcionários públicos, enfermeiros, bombeiros, utentes do caminho-de-ferro, sobretudo da linha do Tua mas também alguns da linha do Douro que delas se serviram em diferentes épocas e com motivações variadas. Apesar de esses comboios serem ainda lentos e incómodos, tornaram-se reconhecidamente essenciais para quem ia estudar, cumprir o serviço militar, consultar o médico, frequentar termas, visitar familiares, comprar e vender produtos nas feiras, participar em festas e em romarias, passear, vender pão e peixe, prestar serviços locais vários nesta região de Trás-os-Montes e Alto Douro... Estamos já a entrar aqui noutra matéria de interesse - os conteúdos das entrevistas - a qual supõe diferente tipo de estudo que requer uma metódica categorização e sistemática análise de conteúdo que serão objeto do próximo capítulo. Antes, porém, importa dar conta da perceção final dos resultados principais do trabalho de campo descrito, colhidos num conjunto de últimas entrevistas aplicadas por amostragem a alguns dos seus protagonistas, a título 39


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

de follow-up desta etapa importante do projeto. Recorremos para tal a uma breve apreciação global de um conjunto de cinco entrevistas finais realizadas em novembro de 2015 pela equipa coordenadora do projeto, a alguns alunos entrevistadores, indivíduos entrevistados e docentes que acompanharam diretamente este processo, indicados pelos diretores e coordenadores de cada escola, que permite tirar as inferências sobre o que significou para os jovens esta experiência de trabalho no terreno. Uma conclusão inequívoca foi por todos partilhada: a de que as condições de vida atuais, na região do vale do Tua, são completa e irrevogavelmente diferentes para muito melhor das que caracterizavam a situação local e regional no tempo dos entrevistados idosos, na sua generalidade familiares, vizinhos e amigos. No decurso da preparação e realização das entrevistas, o processo de aprendizagem revelou-se mais flexível, com aquisição de novos e mais conhecimentos, permitiu conciliar o estudo com o trabalho fora da escola, o que foi algo de diferente e inovador, e permitiu abrir outras potencialidades futuras no envolvimento com a comunidade. O tempo dedicado à aprendizagem em situação de entrevista compensou e ampliou o tempo despendido no ensino presencial e estudo formal. Os professores e as pessoas entrevistadas disponibilizaram-se para poder haver trabalho individual e de grupo e funcionaram como guias, orientadores e bons aliados na situação de entrevista, tornando a comunicação atrativa e estimulante, e no estudo e trabalho posteriormente feitos em que puderam aprender sempre mais qualquer coisa. Os alunos conseguiram adquirir alguns conhecimentos académicos das matérias que investigaram com os entrevistados, obter melhor domínio de técnicas de registo escrito, audiovisual e informático e desenvolver novas competências úteis para a sua formação geral, educação escolar e preparação para a vida: maior sociabilidade, motivação e diálogo; saber perguntar, saber ouvir, saber como imprimir ordem e disciplina na conversação, autodisciplina, concentração, auto-análise e perseverança. Outras vantagens foram ainda registadas: aprender a fazer uma boa gestão do tempo e das deslocações de acordo com as necessidades as possibilidades a importância da conversa face-a-face para aprender. O poder interagir no momento com outra pessoa que está a transmitir determinado conhecimento acaba por ser uma comunicação muito mais rica e 40


Maria Otilia Pereira Lage

pode-se aprender mais, até sobre outras coisas, porque o fluxo do pensamento é inesperado e pode conduzir a outros caminhos e a outras ideias. Supera-se a distância física através de imagem e som e tem-se melhor perceção sobre a história e condições de vida quotidiana e de trabalho das populações locais noutros tempos, o que é interessante e abre novas perspetivas de conhecimento e saber concretos.

41


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

CAPÍTULO 2 – MAPEAMENTO DE MEMÓRIAS E MATERIAIS DE MEMÓRIA (ANÁLISE DE CONTEÚDO)

Ilustração 1- Temas abordados

As entrevistas fazem-se eco de uma grande quantidade e boa qualidade de informação sobre uma gama de assuntos recorrentes ou meramente ocasionais e cobrem uma diversidade de temas e categorias listadas na grelha de categorização e análise de conteúdo que adiante se apresenta e a qual foi definida a partir da indexação das ideias chave do corpus de entrevistas. A mesma responde ao principal objetivo do estudo: pesquisa, recolha, produção e registo de documentação pertinente e fiável sobre a história recente da vida quotidiana da região transmontana do Tua em confluência com a zona norte do Douro, vivências e memórias do vale, rio, linha férrea e comboio do Tua, e ainda dos impactos locais de acontecimentos históricos nacionais (Emigração, Guerra Colonial, etc.) e internacionais (I e II Guerra Mundial).

42


Maria Otilia Pereira Lage

Análise de conteúdo e categorização da informação do repositório de entrevistas Os conteúdos de cada uma e do conjunto das entrevistas, organizados em grandes temas, categorias e unidades de contexto são a base em que incide a interpretação e análise aqui delineadas. A análise de conteúdo é uma metodologia de investigação qualitativa que visa dissecar nos textos produzidos no contexto da pesquisa efetuada, dados e informações explícitas que permitam identificar indicadores e fazer inferências. Pode definir-se pelo uso de “um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que procura obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção / receção (variáveis inferidas) destas mensagens” (Bardin,2009, p. 44). No caso vertente, após o visionamento metódico de cada vídeo registo de entrevista e leitura atenta das transcrições respetivas, procedeu-se, com critérios previamente definidos pela equipa, a uma classificação global formal e de conteúdo de cada um e de todos os vídeos e correspondentes entrevistas transcritas. Os quadros de classificação síntese assim produzidos por três elementos da equipa coordenadora do projeto foram cotejados entre si, tendo-se verificado uma acentuada coerência e relativa sintonia nos resultados apurados. Posteriormente, e a partir da indexação temática da informação mais relevante assim recolhida, passou-se então à operação intelectual de codificar (salientar, classificar, agregar e categorizar) trechos das entrevistas, que se apresentam na tabela seguinte (tabela nº2). Nas colunas iniciais, respeitantes ao tema, categoria e sub-categoria, foram agregados oito grandes temas abordados nas entrevistas e correspondentes sub-temas e facetas mais características de cada uma das entrevistas. Na coluna relativa aos indicadores, inscrevem-se as profissões dos entrevistados que se depreendem das narrativas e, na última coluna, unidade de contexto, registam-se as indicações geográficas que contextualizam a localização das entrevistas e dos entrevistados. Omitem-se aqui nas unidades de registo e de contexto as citações de fragmentos correspondentes de entrevistas por estas se encontrarem já seletivamente transcritas em capítulo anterior, opção que permite uma leitura das mesmas menos fragmentada, mais percetível e englobante no seu conjunto. 43


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

A primeira dificuldade na codificação e categorização das entrevistas apresentou-se na definição das categorias e sub-categorias, apesar de se ter considerado oportuno e recomendável elaborar uma grelha de categorização definida, a priori, a partir da indexação inicialmente feita. Atendendo a que nos encontramos perante entrevistas realizadas por entrevistadores pouco experimentados e como exercício / atividade inserido / a no âmbito de unidades curriculares como o Português, a História, a Geografia ou a Informática, não nos é possível aferir completamente da pertinência e adequabilidade da sua elaboração, finalidade ou ligação com os objetivos do tipo de trabalho mais amplo a que se destinam. Assim, esta nossa análise configura-se também, até certo ponto, como um exercício algo académico e limitado. O que nos leva a interrogar-nos: a que nível de interpretações deve chegar a nossa análise? onde se deve parar? até que ponto a linguagem documental que se escolhe para fazer a indexação dos conteúdos das entrevistas, nos permite representá-los na forma mais explícita e fiável? É certo que para o investigador este tipo de análises e interpretações nunca se pode dar por suficientemente completo e acabado. As zonas de sombra são muitas e inquietam tanto quanto o sentido escondido e as deduções feitas, ainda que de modo fundamentado, e a análise acaba sempre por ser condicionada pelas possibilidades práticas em que decorreu a realização concreta das entrevistas. No entanto, e apesar dessas dificuldades e limitações, a análise de conteúdo assente neste exercício de demonstração e compreensão das fontes orais e materiais de memória recolhidos no corpus de entrevistas é fundamental para agregar e representar devidamente a informação base de construção de novos e mais abrangentes conhecimentos sobre a história recente do vale do Tua e das suas populações. Os diagramas de temas principais abordados, as categorias em que se podem subdividir, e os indicadores socioprofissionais respetivos, que se apresentam neste capítulo, construídos a partir da representação intelectual das informações agregadas na tabela de categorização dos conteúdos essenciais das entrevistas, possibilitam entradas diversas mas complementares, na compreensão dos traços distintivos e dimensões genericamente caracterizadoras dessa história recente das populações do vale do Tua que assim se pretende ainda captar.

44


Maria Otilia Pereira Lage

Ilustração 2 - Categorias Categorização das entrevistas Categorias

Indicadores soció-profissionais

Sub-categorias

Unidades de Contexto

LINHA DO TUA (norte do Douro) FUNCIONAMENTO

Linhas do Tua e Douro

Alijó / Caldas de Carlão

FUNCIONAMENTO

S.Lourenço / Brunheda Viagens pedestres

Alijó

FUNCIONAMENTO

Linha do Tua: troços Tua a Mirandela e Mirandela a Bragança

Ferroviário da CP

Carrazeda de Ansiães

Ferroviário- Sapec / Cachão / Guerra colonial / comboio Ferroviário - SAPEC do Tua e transporte de mercadorias

Mirandela

Memórias de infância da linha e do rio Tua / Sonho de viagens jornalista / bibliotecário amor-ódio solidão do rio Tua (1960)

Alijó - Safres

MOVIMENTO

peripécias da vida e trabalho Ferroviário da CP / obras na linha / movimento S.Lourenço / Brunheda comboios / Cachão

Alijó

CONSTRUÇÃO

Linha via desenvolvimento Transmontano / galegos / tração a vapor / II Guerra Mundial – lenha verde / paragens comboio

FUNCIONAMENTO MOVIMENTO

FUNCIONAMENTO PAISAGEM

45

Chefe de estação na linha do Tua

Alijó-Amieiro


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

CONSTRUÇÃO

Construção da linha do Tua até Bragança

Emigrante

Mirandela

ENCERRAMENTO

Críticas ao fecho linha

Ferroviário da CP

Alijó

ENCERRAMENTO

máquinas de carvão comboio do Tua nostalgia linha Tua

Utente da linha do Douro

Alijó

ENCERRAMENTO

Movimento defesa da linha Tua / pessoal ferroviário

Ferroviário da CP

Carrazeda de Ansiães

ENCERRAMENTO

Denúncia do encerramento da linha / Turismo das viagens de comboio

Agricultor

Carrazeda de Ansiães

ENCERRAMENTO

Crítica do encerramento da linha / interioridade

Agricultor

Carrazeda de Ansiães

ENCERRAMENTO

Crítica ao fecho da linha negócio de gado / anos 1960-ambiente de época

Agricultor e negociante de gado

Mirandela

ENCERRAMENTO

Transporte de mercadorias / crítica ao fecho da linha

Maquinista da linha do Tua

Mirandela

ENCERRAMENTO

Linha do Tua / transporte produtos / Guerra Colonial / crítica ao fecho da linha / acidentes

Maquinista da CP

Mirandela

ENCERRAMENTO

as oficinas de reparação da CP em Mirandela / Assentador na CP e encerramento da linha trabalhador do Metro Bragança-Mirandela, razões de Mirandela do acidente na linha, vida na linha,

Mirandela

ENCERRAMENTO

Felgueira povoação desabitada / viagem de comboio-estudos no seminário de Vinhais (Bragança) / crítica ao fecho da linha do Tua

Agricultor

Vila Flor

ACIDENTES

Acidentes 2007-2008 / buscas / hospital de campanha / turistas ingleses

Bombeira

S. Mamede - Alijó

ACIDENTES

A neve em 1956 e o comboio Assentador na CP e / razões do acidente na linha, trabalhador do Metro vida na linha, de Mirandela

ACIDENTES

Descarrilamentos

Ferroviário da CP

46

Mirandela Carrazeda de Ansiães


Maria Otilia Pereira Lage

ACIDENTES

Descarrilamentos / crítica à Chefe de lanço na linha gestão linha Tua / trabalhos do Tua ferroviários

Carrazeda de Ansiães

ACIDENTES

Termas S. Lourenço / linha do Tua turística / acidentes / paisagem e frutos vale do Tua

Agricultor

Carrazeda de Ansiães

ACIDENTES

Viagens de comboio e ambiente / estações / produtos / feiras / comboios c / 27 vagõesdescarrilamentos

Proprietário de padaria

Mirandela

ACIDENTES

Descarrilamentos - linha muito acidentada; o frio no inverno; estações mais movimentadas: Mirandela, Romeu, Cachão, Frechas / Serralheiro soldador inauguração da linha TuaMirandela; a paisagem e o rio; as feiras / praça de Mirandela farta; emigração; festas;

Mirandela

ACIDENTES

Acidentes da linha do Tua / barrancos / a favor da barragem

Doméstica

Vila Flor

FUNCIONAMENTO

Recordação de infância linha do Tua / comboio a vapor e burro / linha do Tua até anos 1980 comparável a IC5

Agricultor

Alijó

Infância ligada ao rio Tua / Rio mais importante que a linha do Tua / Linha e prejuízo para antiga centralidade de S. Mamede de RibaTua

Professor e investigador local

Alijó- Escola secundária S.Mamede de Riba Tua

FUNCIONAMENTO

MOVIMENTO MOVIMENTO

Comboio muito usado há 50 anos Viagem / produtos transportados

Trabalhador do Douro Alijó - Rio Douro e Tua Maquinista da CP

47

Mirandela


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

MOVIMENTO

Movimento de passageiros e mercadorias do comboio do Tua

Agricultor

Vila Flor

FUNCIONAMENTO

Agulheiro / apeadeiro Tralhariz

Ferroviário da CP

Carrazeda de Ansiães

FUNCIONAMENTO

Apeadeiros Tralhão e Valdez.

Trabalhadora rural

Carrazeda de Ansiães

PAISAGEM

Paisagens do vale do Tua - íngremes, beleza natural excelente, encostas Assistente operacional inclinadas e rochosas, escola secundária despenhadeiros, acidentes automotora.

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

PAISAGEM

jovem apaixonado em passeio escolar na linha do Tua / beleza da paisagem

Carrazeda de Ansiães

Estudante

Estações / apeadeiros: Tua, Tralhariz, S. Lourenço, FUNCIONAMENTO Assistente operacional Brunheda, Codeçais, escola secundária Abreiro, Ribeirinha, Cachão, Frechas e Mirandela.

FUNCIONAMENTO

FUNCIONAMENTO MOVIMENTO

Crítica à falta de comboios e problemas da CP / Trabalhador ferroviário horários incompatíveis entre comboios diários Máquinas a vapor e Diesel, motores eléctricos / locomotivas históricas / automotoras Alans, Xepas, etc. / tripulação comboio / horários / formação profissional ferroviária / estações e apeadeiros linha Tua

Maquinista da linha do Tua

História Local / cultura popular / desenvolvimento FUNCIONAMENTO Funcionária dos CTT e linha do Tua / Cachão / (Posto publico dos racionamento / família de MOVIMENTO Correios) ferroviários / comunicaçõescorreio, telefone

48

Carrazeda de Ansiães -Lavandeira

Vila Flor

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

Carrazeda de Ansiães


Maria Otilia Pereira Lage

Importância da linha FUNCIONAMENTO do Tua / escoamento de MOVIMENTO produtos agrícolas / turismo TURISMO / transportes / paisagem / NATUREZA natureza

Fotojornalista

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

FUNCIONAMENTO NATUREZA

Evolução de transportes / natureza virgem

Chefe de estação do Tua

Carrazeda de Ansiães Coleja

FUNCIONAMENTO NATUREZA TURISMO

Termas S. Lourenço / linha do Tua turística / acidentes / paisagem e frutos linha do Tua

Proprietário rural

Carrazeda de Ansiães

Movimento estação do Tua / trabalho na aldeia do Tua – quintas e comboios

Trabalhador rural

Carrazeda de Ansiães – Foz Tua

MOVIMENTO

MOVIMENTO

MOVIMENTO TURISMO NATUREZA

ENCERRAMENTO

Transporte de adubos produtos agrícolas / serviços Funcionário público públicos / defesa barragem Grémio da Lavoura e do Tua / história da linha Cooperativa Agrícola do Tua

Carrazeda de Ansiães

Grande movimento de mercadorias e passageiros / turismo / circulação de Maquinista linha Tua comboios / crítica a fecho da linha do Tua

Carrazeda de Ansiães

viagens / história de vida / saúde / ordenados / dias de Maquinista das linhas feira de Moncorvo / táxis e Carrazeda de Ansiães e do Sabor, Tua, Corgo e autocarros / fecho das linhas Carviçais Douro / de via reduzida / acidente / vida das pessoas

ENCERRAMENTO

Viagem de comboio como militar / a favor da linha e crítica ao fecho da mesma

Funcionário público

Vila Flor

ENCERRAMENTO

Viagem de comboio de férias / comboio transporte económico / combate ao isolamento / paisagem e rio / turismo / crítica fecho da linha e desinvestimento

Funcionária pública

Vila Flor

49


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

Experiência da linha do Tua / feiras / quotidiano no vale Agricultor e construtor ENCERRAMENTO do tua / a favor da linha e civil contra o fecho / transporte de mercadorias e passageiros

Vila Flor

ENCERRAMENTO

Mercadorias transportadas na linha do Tua / denúncia da atual falta de transporte das populações

Agricultor

Vila Flor

ENCERRAMENTO

Viagem de comboio Tua como militar / viagens divertidas / comboio lento / crítica à barragem do Tua / defesa da preservação da linha do Tua

Funcionário

Vila Flor

CONSTRUÇÃO MOVIMENTO

viagens de comboio; comboio cheio memórias da linha; Brunheda; o comboio juntou as pessoas; o rio e a paisagem; agricultura; porquê e como foi construída a linha; desenvolvimento da região; transporte de produtos e movimento das populações.

Funcionário

Mirandela

VIAGENS DE COMBOIO MOTIVAÇÃO Lazer / Trabalho TRAJECTO MOTIVAÇÃO Lazer MOTIVAÇÃO Lazer MOTIVAÇÃO Trabalho MOTIVAÇÃO Lazer / trabalho

Viagens inesquecíveis / paisagem / areia do rio Passeios de família TuaPinhão / Agricultura Serviço público

Empresário de terraplanagem

Alijó / Caldas de Carlão

Funcionário de escola Alijó- Escola Secundária

Viagens de comboio em grupo e lazer / colónias de férias para filhos de ferroviários / movimento da estação do Tua

Funcionários

Vila Flor

cultura da vinha trabalhos manuais e mecanizados

Proprietário rural

Alijó

Férias no Douro Faina da pesca amanho e Pescador profissional venda do peixe 7calor estival

50

Alijó-Régua


Maria Otilia Pereira Lage

MOTIVAÇÃO Saúde TRAJECTO

TRAJECTO

Idas ao médico Tua-Pinhão

Funcionário de escola Alijó- Escola secundária

Viagens de comboio do Tua / Barcas de passagem Trabalhador do Douro no Douro / Símbolo de boa viagem

Alijó

Utente habitual da linha do Tua como estudante em Bragança (anos 1960) / viagens de Tua a Bragança – 6h / atraso dos comboios

Professor

Alijó- Escola secundária

MOTIVAÇÃO Estudos

viagens no comboio do Tua quando aluna em Bragança

Peixeira

Carrazeda de Ansiães – Foz Tua

MOTIVAÇÃO Estudos

Viagens lentas de comboio do Tua a Bragança

Passageiro da linha do Tua

Carrazeda de Ansiães – Foz Tua

MOTIVAÇÃO

viajar de comboio para estudar no Seminário / produtos transportados

Funcionário público

Mirandela

viagens de comboio- estudos no seminário de Vinhais (Bragança)

Funcionário

Vila Flor

Viagem de comboio como estudante / património ferroviário / nostalgia do movimento ferroviário

Funcionário público

Vila Flor

Viagens de comboio linhas do Douro e Tua como estudante / canção infantil / Magistério Primário Bragança / Movimento Nacional Feminino / Casa Africana –Vila Flor

Professora

Vila Flor

viagem morosa de comboio na linha do Douro

Utente da linha do Douro

Alijó

Utente assíduo do comboio do Tua como estudante e militar / Ribeirinha – apeadeiro da linha do Tua / natural e residente o vale do Tua

Professor

Vilas Boas Alijó - Escola secundária

MOTIVAÇÃO Estudos

Estudos MOTIVAÇÃO Estudos MOTIVAÇÃO Estudos

MOTIVAÇÃO Estudos

MOTIVAÇÃO Passeio MOTIVAÇÃO Estudos Vida militar

51


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

MOTIVAÇÃO Trabalho

viagem comum de comboio

MOTIVAÇÃO Trabalho

Viagens nas linhas do Douro Funcionário reformado e Tua de idoso de 92 anos

Vila Flor

MOTIVAÇÃO Trabalho

Migrante transmontana Lisboa / viagem de comboio em férias / 1º beijo ao namorado / a favor da linha e da barragem do Tua

Empregada

Vila Flor

Comboio a carvão / pitoresco da viagem / linha do Douro / viagens de comboio longas / vivências de colégio interno e militar

Professor

Alijó- Escola secundária Douro

MOTIVAÇÃO Saúde

Viagem no comboio do Douro ida a médico / episódio ficcionado de queda da ponte do rio Tua / venda de pão nas povoações da linha do Tua / alcunha “seus olhos de comboio”

Padeiro

Alijó- Douro

MOTIVAÇÃO Saúde

Viagens de comboio ida a médico / S. Lourenço / roubos no comboio / boas e más memórias

Funcionária pública

Vila Flor

MOTIVAÇÃO Saúde

Vida quotidiana / viagem de comboio ida a médico

Doméstica

Vila Flor

Viagem maravilhosa de infância no comboio do Tua até Mirandela

Funcionária publica

Alijó

MOTIVAÇÃO Estudos Vida militar

MOTIVAÇÃO Passeio TRAJECTO

TRAJECTO

Passageiro da linha do Tua

Recordação triste de viagem na linha do Douro Empregada doméstica - abandono e solidão de irmãos órfãos

Mirandela

Alijó

MOTIVAÇÃO Serviço militar

Viagens de comboio durante a tropa

Militar

Carrazeda de Ansiães

MOTIVAÇÃO Serviço militar

Ambiente alegre do comboio / viagens como militar

Militar

Carrazeda de Ansiães

52


Maria Otilia Pereira Lage

MOTIVAÇÃO Serviço militar

viagem comboio como militar / comunicações / quotidiano agrícola / linhas Douro e Tua

Eletricista

Vila Flor

MOTIVAÇÃO Visita a familiares

Utilização do comboio para ver a avó a Sta Marta de Penaguião; medo de andar de comboio; transporte de mercadorias; classes das carruagens saudade da viagem; feiras, produtos vendidos e comprados

Emigrante

Mirandela

MOTIVAÇÃO Visita a familiares

Viagem de comboio em família na linha do Tua e do Douro / bom ambiente no comboio

Doméstica

Vila Flor

TRAJECTO

Apeadeiros Tralhão e Valdez. Viagens de comboio amigas, agradáveis e alegres.

Trabalhadora rural

Carrazeda de Ansiães

TRAJECTO

Viagens frequentes de comboio a Mirandela / belas paisagens

Doméstica

Carrazeda de Ansiães

TRAJECTO

Viagem de Bragança a Tua =8h / paisagem bonita / antigo regedor

Agricultor

Vila Flor

MOTIVAÇÃO Passeio turístico

Ambiente alegre e convivial Assistente operacional no comboio do Tua / canções da escola secundária populares

Carrazeda de Ansiães / Lavandeira

MOTIVAÇÃO Passeio turístico

Viagem lazer comboio Tua / potencial turístico da linha Tua / crítica à barragem

Funcionário público

Carrazeda de Ansiães

MOTIVAÇÃO Serviço militar

carruagens cheias e assentos em madeira… quem tinha dinheiro, ia em primeira classe que era bom, em segunda… paciência!

Trabalhador rural

Carrazeda de Ansiães

MOTIVAÇÃO Trabalho Feiras

Trabalho em Bragança e feiras de Mirandela e Macedo - comboio único transporte

Funcionário

Carrazeda de Ansiães

53


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

TRAJECTO

Tua, Brunheda, Codeçais, Mirandela, Macedo, Grijó, Rossas, Remisquedo, Mosca e Bragança.

Agricultor

Carrazeda de Ansiães

MOTIVAÇÃO Feiras

Utente linha do Tua / Viagem de comboio -feiras / Guerra Colonial

Trabalhador rural

Mirandela

MOTIVAÇÃO Feiras

Viagem em comboio misto / estação de Abreiro / feiras / quotidiano / anos 1980

Doméstica

Vila Flor

MOTIVAÇÃO Serviço militar

comboio do Tua era o meio transporte - ambiente espetacular

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

MOTIVAÇÃO Trabalho Feiras

MOTIVAÇÃO Compras

comboios das feiras de Mirandela, Macedo e Bragança! dias já estipulados, era preciso Maquinista da linha aumentar mais as carruagens do Tua e as composições superlotadas para suportar passageiros.

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

Viagem de comboio para ir fazer compras

Doméstica

Carrazeda de Ansiães

aventuras de viagem de comboio- Feiras / tristeza - encerramento da linha do Tua / Vida quotidianarezas / doenças / contrabando

Proprietária rural

Carrazeda de Ansiães Pereiros

EPISÓDIOS

Narrativa de um episódio vivido em viagem no comboio do Tua

Passageiro habitual do comboio do Tua

Carrazeda de Ansiães

EPISÓDIOS

Memórias de viagem de comboio na infância

Doméstica

Carrazeda de Ansiães

EPISÓDIOS

Viagem de comboio de jovem apaixonado em passeio escolar / beleza da paisagem

Estudante

Carrazeda de Ansiães

EPISÓDIOS

Comboios do Tua e viagens generalidades

Trabalhador rural

Carrazeda de Ansiães -Codeçais

MOTIVAÇÃO Feiras

54


Maria Otilia Pereira Lage

Peripécias de viagem de comboio Tua agradável e bonita / turismo

Agricultor

Vila Flor

Viagem de comboio de lazer e feiras de Mirandela / comboios a vapor e diesel / paisagem / derrocadas

Passageiro da linha do Tua

Carrazeda de Ansiães

Viagens de comboio para ir para a tropa

Trabalhador rural

Carrazeda de Ansiães

Passageiro da linha do Tua em criança e militar / meio transporte da região / Cachão /

Serralheiro da CP

Vila Flor

MOTIVAÇÃO Lazer

Viagem de comboio de lazer e passeios

Doméstica

Carrazeda de Ansiães

MOTIVAÇÃO Trabalho

Ambiente e utilidade do comboio do Tua / venda e abastecimento de pão a povoações da linha / crítica à barragem

Padeira

Carrazeda de Ansiães Foz-Tua

MOTIVAÇÃO Saúde

Crítica ao encerramento da linha / interioridade / viagem de comboio ida a médico

Agricultor

Carrazeda de Ansiães

AMBIENTE DO COMBOIO

Viajar de comboio para Barca de Alva - músicas, conversas, produtos transportados;

Passageiro

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

Viajar na linha do Tua; músicas, conversas, a estação de Mirandela; produtos transportados; feiras na Régua; produção local;

Passageiro

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

Linha do Tua; viagem de comboio; ambiente a bordo; trabalho Cachão e emigração; as feiras: pai pastor; produtos vendidos; emigração;

Passageiro

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

Ambiente alegre do comboio / viagens como militar

Militar

Carrazeda de Ansiães

EPISÓDIOS

MOTIVAÇÃO Feiras

MOTIVAÇÃO Serviço militar MOTIVAÇÃO Serviço militar

55


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

AMBIENTE DO COMBOIO

Viagens / conversas / músicas / apeadeiro S.Sebastião / feiras / emigração / guerra Moçambique / festas

Emigrante

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

Lenda do Romeu ou da Senhora de Jerusalém do Romeu; Mirandela antigamente; história de Empregada doméstica vida; alegria no comboio e muita gente; o comboio apitava e marcava a vida local; as feiras de Mirandela.

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

viagens de comboio; comboio cheio memórias da linha; Brunheda; o comboio juntou as pessoas; o rio e a paisagem; agricultura; porquê e como foi construída a linha; desenvolvimento da região; transporte de produtos e movimento das populações; declínio

Funcionário

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

viagens na linha do Tua, duração, ambiente, horários e recordações desse tempo e dos arraiais

Doméstica

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

Recordações da música em arraiais; viagem ao Tua e para o Porto / bronquite; viagens demoradas; passagem do tempo bom ambiente; um dia no Tua; canção de Mirandela; Carruagens de madeira; falta do comboio para algumas populações; as feiras; saudades desse tempo;

Doméstica

Mirandela

AMBIENTE DO COMBOIO

Viagem de comboio em família na linha do Tua e do Douro / bom ambiente no comboio

Doméstica

Vila Flor

56


Maria Otilia Pereira Lage

AMBIENTE DO COMBOIO

Viagem de comboio Tua como militar / viagens divertidas / comboio lento / crítica à barragem do Tua / defesa da preservação da linha do Tua

Funcionário

Vila Flor

EMIGRAÇÃO ocupação infantil Trabalhos diários doméstico LOCAL DE DESTINO Enfermeira / padeira e no campo / África-Moçambique serões na aldeia / agricultura

Alijó / S.Mamede

Emigrou para Moçambique onde trabalhou num jardim LOCAL DE DESTINO / ambiente do comboio África-Moçambique e produtos transportados / produções de Angola e Moçambique

Emigrante

Mirandela

emigração para Moçambique: MirandelaLOCAL DE DESTINO Tua –Porto-Lisboa / África-Moçambique produção na região / Guerra Colonial;

Emigrante

Mirandela

Viagem de comboio e LOCAL DE DESTINO emigração de familiares para Funcionário público Suíça a Suiça

Alijó - Escola secundária

LOCAL DE DESTINO Europa

familiares emigrados

Professor

Alijó - Escola secundária

LOCAL DE DESTINO África

Viagens no comboio do Douro

Passageiro da linha do Douro

Alijó

LOCAL DE DESTINO Alemanha

Emigração Alemanha

Alijó

LOCAL DE DESTINO Emigração – narrativa de Assistente operacional França episódio viagem de comboio Escola secundária

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

Metia o saco debaixo da cabeça para não me LOCAL DE DESTINO roubarem França Migrações para as vindimas no Douro

Descendente de colonos em África e emigrante

Carrazeda de Ansiães

Emigração Suíça / viagem LOCAL DE DESTINO de comboio como emigrante Suíça e militar

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

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VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

LOCAL DE DESTINO Europa

Emigração / trabalhos agrícolas / correio / condições de vida

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

Emigração Angola – viagens LOCAL DE DESTINO entre Carrazeda e Mirandela Angola / comboio favoreceu região

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

Emigração França / transporte carros de bois / LOCAL DE DESTINO tempos difíceis / epidemias França de pessoas e vinhas do Douro / vida quotidiana

Emigrante Proprietário rural

Carrazeda de Ansiães

Emigrante

Mirandela

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

LOCAL DE DESTINO França

Depois de uma vida de pobreza emigrou para França;

LOCAL DE DESTINO Emigração Angola / Guerra Angola Colonial / fotos antigas LOCAL DE DESTINO África

Viajar de comboio-ambiente feliz / emigração e Guerra Colonial;

LOCAL DE DESTINO Moçambique

Viagens / conversas, músicas, feiras, festas / emigração / guerra Moçambique

Emigrante

Mirandela

LOCAL DE DESTINO Alemanha

o marido emigrou para a Alemanha

Empregada doméstica

Mirandela

feiras com mais poder de compra: o que se comprava e o que se vendia / festas / LOCAL DE DESTINO bandas de música / rádio / Brasil história de vida / doença / agricultura / 4.ª classe, os estudos de antes / emigração Brasil

Emigrante

Mirandela

Os trabalhos agrícolas; o DDT: emigrou para Angola; a guerra; a independência de Angola; Unita contra o MPLA

Emigrante

Murça

LOCAL DE DESTINO Angola

58

Emigrante

Mirandela


Maria Otilia Pereira Lage

LOCAL DE DESTINO Africa

Angola / Rodésia / África do Sul / história de vida / fábrica de vigas de Murça / dificuldades de se instalar em Murça

Empresário exemigrante

Murça

GUERRA COLONIAL MORBILDADE doenças africanas

Raiva, cólera, tétano

Enfermeira / padeira

Alijó / S. Mamede

VIDA MILITAR COLÓNIAS Angola-Luanda

Força aérea (1971)

Enfermeiro militar

Alijó

COLÓNIAS Angola

Memórias guerra e vida em África

Trabalhador rural

Alijó

COLÓNIAS Guiné COMBATES

Mato (1967-69)

Trabalhador rural

Alijó

COLÓNIAS África

Ex-militar em África

Ferroviário da CP

Alijó

COLÓNIAS África

Ex-militar na Guerra Colonial

Passageiro da linha do Douro

Alijó

COLÓNIAS Guiné

Mobilização para Guiné / acidente na Madeira / vivências no mato

Trabalhador rural

Alijó

COLÓNIAS Guiné

Mobilização para a Guiné

Trabalhador rural

Alijó

COLÓNIAS Africa

Militar na Guerra Colonial em África e emigração Angola

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

COLÓNIAS Africa

Militar na Guerra Colonial Ferroviário da SAPEC

Mirandela

COLÓNIAS Africa

Viajar de comboio- ambiente a bordo / emigração / Guerra Colonial;

Emigrante

Mirandela

COLÓNIAS Moçambique

Guerra colonial em Moçambique

Emigrante

Mirandela

RIOS TUA e DOURO-PESCA… Venda de peixe Vinho do Porto

Barco a remos Chumbeira Trabalhador da Alijó / Douro / barragem Guarda venatória Cockburn’s / pescador Valeira

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VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

Hobby tradição familiar

Fauna piscícola rio Tua “de elite”- boga, enguia, escalo, espécies exóticas, lontra / materiais de pesca / contacto com a natureza

Professor

Alijó- Escola secundária S. Mamede Riba Tua

Faina da pesca

Atividade na pesca e venda de peixe

Pescador

Alijó-Régua

Hobby

pesca no rio Tua / laranjais Passageiro da linha do de S. Mamede no rio Tua Douro

Alijó

Aventuras de infância no rio Tua

Passeios e aventuras de infância no rio Tua

Pasageiro da linha do Douro

Alijó

Hobby Trabalho

Rega das laranjeiras com motor no rio Tua / pesca rio Tua / Mexilhões

Proprietário rural

Alijó

influência dos rios Douro e Tua na agricultura hoje + Trabalhador do Douro evoluída Cheias do rio Tua

Moleiros vale do Tua

Ferroviário da CP

Alijó – rio Douro Carrazeda de Ansiães

COMUNICAÇÕES

CORREIO

Correio transportado pelo comboio em sacas de serapilheira individuais por Assistente operacional aldeia onde era distribuído pelos regedores

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

CORREIO

A distribuição do correio era feita pelo comboio e havia uma mulher daqui da aldeia que ia ao S. Lourenço, todos os dias, ao meio dia, buscar o correio e depois fazia distribuição pelo povo.

Trabalhadora rural

Carrazeda de Ansiães Pombal

Emigração / trabalhos agrícolas / correio / condições de vida

Emigrante

Carrazeda de Ansiães

Movimento quotidiano de passageiros no comboio / comunicações

Doméstica

Vila Flor

CORREIO TELEFONE CORREIO

60


Maria Otilia Pereira Lage

Só havia um telefone em cada aldeia (telefone público) todos os habitantes usavam esse telefone. Os donos da casa é que Assistente operacional atendiam e davam as notícias,boas ou más, às pessoas para quem telefonavam..

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

RÁDIO

Ouvia-se música, noticiários, novelas na casa de uma prima…muita gente se juntava lá para ouvir a novela “Simplesmente Maria”… ouviam a novela comentavam e conversavam de outras coisas - era um sítio de distração para toda a gente.

Operacional de enfermagem

Carrazeda de Ansiães Zedes

CORREIOS TELEFONES

História local

Funcionária dos CTT

Carrazeda de Ansiães

CORREIO TELEFONES

comunicações / correiocentral de ligações telefónicas / quotidiano de aldeias ribeirinhas

Chefe de estação do Tua

Carrazeda de Ansiães Coleja

TELEFONE

FERROVIÁRIOS

FUNÇÕES

Técnicas de grande responsabilidade Agulheiro.

Carrazeda de Ansiães

Operárias Obras na linha

Ferroviário da CP.

Alijó

CARREIRA

Administrativas e técnicas

Chefe de estação na linha do Tua

Alijó-Amieiro

CARREIRA

Técnicas solidariedade ferroviária

Maquinista na linha do Tua

Carrazeda de Ansiães Lavandeira

FUNÇÕES

Operárias e técnicas

Ferroviário da estação do Tua

Carrazeda de Ansiães Foz-Tua

CARREIRA

Dava entrada aos comboios, formava-os e fazia manobras, durante 40 anos.

61


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

FUNÇÕES

Operárias e técnicas / lendas / crítica ao fecho da linha Trabalhador ferroviário do Tua

CARREIRA

Operárias e técnicas Carrazeda de Ansiães Chefe de lanço na linha descarrilamentos atribuídos Foz-Tua do Tua a má gestão da linha Tua Operárias Manutenção da Carrazeda de Ansiães linha do Tua nos anos 1940 Foz-Tua

FUNÇÕES CARREIRA

Administrativas e contabilistas

Revisor

Carrazeda de Ansiães

Carrazeda de Ansiães Codeçais

Apoio familiar local REPRODUÇAÕ Movimento na aldeia do Doméstica familiar de PROFISSIONAL VIA Tua. linha mais valia para o ferroviários do Tua FAMILIAR Tua. Turismo. linhas Tua e Douro

Carrazeda de AnsiãesFoz-Tua

REPRODUÇÃO PROFISSIONAL VIA FAMILIAR

Família de ferroviários do Tua / estação do Tua

Doméstica

Carrazeda de Ansiães Foz-Tua

REPRODUÇÃO PROFISSIONAL VIA FAMILIAR

Grande movimento na estação do Tua

Funcionário

Carrazeda de Ansiães Foz-Tua

CARREIRA

Técnicas e administrativas

Chefe de estação no Tua

Carrazeda de Ansiães Coleja

FUNÇÕES CARREIRA

Técnicas

Fogueiro Trabalhador da CP

Carrazeda de Ansiães Pombal

FUNÇÕES CARREIRA

Técnicas

Mecânico de comboios Carrazeda de Ansiães na linha do Tua Foz-Tua

FUNÇÕES

Técnicas

Ferroviário da SAPEC

Mirandela

FUNÇÕES CARREIRA

Técnicas Linhas do Sabor, Tua, Corgo e Douro

Maquinista

Carrazeda de Ansiães e Carviçais

FUNÇÕES

Técnicas

Eletricista da CP nos comboios do Tua

Mirandela

FUNÇÕES

Técnicas Serralheiro ferroviário da CP

Serralheiro

Vila Flor

Agricultor

Carrazeda de Ansiães

OUTROS AMBIENTE / NATUREZA

Incêndios provocados por comboio a vapor / ambiente, natureza e comboios

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Maria Otilia Pereira Lage

II GUERRA MUNDIAL

Memórias do Contrabando / Racionamento / Ano da fome

I GUERRA MUNDIAL Memórias da pneumónica

Proprietária rural

Carrazeda de Ansiães São Lourenço

Proprietário rural

Alijó

CULTURA POPULAR

Lenda do Romeu ou da Senhora de Jerusalém do Romeu; festa de Vila Verdinho.

Empregada doméstica

Mirandela

CULTURA POPULAR

Lenda de fonte no rio Tua

Doméstica

Carrazeda de Ansiães

Associação de Socorros Mútuos dos Artistas Mirandelenses / orquestras e conjuntos / bailes no Cine Teatro Mirandelense

Músico

Mirandela

Música / fundação do rancho folclórico de S.Tiago em 1963 numa marcha de Carnaval / repertório / as CULTURA POPULAR cegadas e as influências sobre o folclore local / os Pauliteiros / a adesão a vários projetos: bombos, banda, samba…

Animador cultural

Mirandela

banda de música na festa de Castedo / recordações de festas religiosas e vindimas / as concertinas e ferrinhos / as lagaradas / Fui ao Douro CULTURA POPULAR à Vindima / buscar água ao rio Tua / linha do Tua / ocupação do tempo nas viagens / feiras / festas / festa das vindimas / grupo folclórico e repertório

Chefe de banda

Mirandela

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VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

Memórias do transporte de vinhos para S. Mamede e linha férrea / Castedo do Douro / festas de antigamente / canções no trabalho / história de vida / utilização do comboio / a CULTURA POPULAR Cantoneiro Municipal linha do Tua / recordações do transporte de uvas e da pisa / cantiga das feiticeiras / jogos no lagar / rancho folclórico do Castedo / 14 pares / deslocações / Fui ao Douro à Vindima

Mirandela

Arraiais e festas da cidade e das aldeias / história de vida e linha do Tua / música na CULTURA POPULAR viagem de comboio / banda de Mirandela e Moncorvo / paisagem / pagava ¼ de bilhete

Mirandela

Agricultor

Memórias da linha; viagens lentas; atividades ao longo da viagem; arraiais e Maestro da Banda de CULTURA POPULAR romarias; as bandas; projeto Valpaços EDP para a Orquestra Nova Geração; ambiente das bandas; repertório

Mirandela

festas antigas / linha do Tua / ceifas do trigo e centeio / minas da Panasqueira / Guerra Colonial / recordações das viagens de comboio, conversas CULTURA POPULAR / memórias e música A pomba (canção) / horários do comboio / importância da linha / as feiras e as tascas / canções no trabalho / rancho de Murça / repertório / impacto dos conjuntos

Padeiro

Mirandela

Familiares na Guerra Colonial em África / rádio / CULTURA POPULAR cultura popular / quotidiano / linhas do Tua e Douro

Doméstica

Vila Flor

Proprietária rural

Carrazeda de Ansiães São Lourenço

TERMAS S.LOURENÇO

Saúde e distração

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Maria Otilia Pereira Lage

TERMAS S.LOURENÇO

Bailes em S. Lourenço

Animador cultural

Mirandela

LINHA DO DOURO

Viagens na linha do Douro

Passageiro habitual da linha do Douro

Carrazeda de Ansiães

LINHA DO DOURO

Viagem em criança na linha do Douro

Doméstica

Carrazeda de Ansiães

LINHA DO DOURO

Viagem genérica no comboio do Douro

BARRAGEM DO TUA

Prejuízos em propriedades devido a construção da barragem do Tua

Proprietário rural

Carrazeda de Ansiães

BARRAGEM DO TUA

barragens da região e do Tua;

Engenheiro

Mirandela

ACESSIBILIDADES

Serviço de ligação a estação ferroviária por taxi / filme antigo de Bragança

Taxista

Carrazeda de Ansiães

minas de volfrâmio ferro e estanho / trabalho nas minas MINÈRIOS / MINAS / / contrabando / os odres VOLFRÂMIO com azeite / da Brunheda a S.Lourenço / emigração importância do Tua / a pesca.

Pastor

Carrazeda de Ansiães Brunheda

Corriam as feiras de Trás-osMontes a vender produtos -feiras trabalhosas: carro próprio / família no ultramar / o namoro / as festas - o realejo; a viola; animais vendidos na feira; as pontes VIDA QUOTIDIANA de Mirandela / as cheias de antigamente / viagem de comboio a Codeçais, Macedo e Mirandela à festa de N.ª S.ª do Amparo / de burro até apanhar o comboio / ponte do Romeu; vida de outros tempos

Feirantes

Mirandela

65


VIDAS E VIAGENS À VOLTA DO VALE DO TUA: História da Vida Quotidiana das Populações

Condições de vida / pobreza / andava descalça / viagem de comboio para Mogadouro e Bragança / preço dos VIDA QUOTIDIANA bilhetes; ambiente no comboio; feira de Mirandela; Guerra Colonial; produção de Algosinho; história de vida; festas na aldeia;

Emigrante

Mirandela

Arraiais, bailes, festas; na época da apanha da azeitona bailaricos e celebração; viajou no comboio linha do Tua (Cachão); nova visão sobre o vale do Tua e seu futuro; comboios lentos e muito cheios; confiança na máquina e no maquinista; VIDA QUOTIDIANA ligação ferroviária no Tua; ambiente de convívio nas carruagens; circulação do correio e de notícias; o problema da bitola estreita; acidentes na linha; desdobramentos; trabalhos agrícolas; a espera no Tua; a via rodoviária ganhou à ferroviária.

Engenheiro

Mirandela

o antes e o agora de Murça- amizade versus individualismo, atividades diferentes, tempos difíceis / arte de alfaiate, estudos só para famílias mais poderosas / a Guerra VIDA QUOTIDIANA Cobrador municipal Colonial / cobrador da água e eletricidade - leituras e cobranças / impacto da luz e água devido ao fraco poder de compra / dificuldades de transportes - corria o concelho e os cães atacavam;

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Murça


Maria Otilia Pereira Lage

Memórias de professora do 1.º ciclo sobre a escola primária; o seminário: meio VIDA QUOTIDIANA de estudos para rapazes / tempos diferentes dos de hoje / estratégias para ensinar os alunos; a telescola

Professora

Murça

Madrasta que lhe ensinou a costura e aprendizagem em Vila Nova: fazer vestidos, camisas, calças, ceroulas, VIDA QUOTIDIANA bordados… / máquinas Oliva e Singer / trabalho manual e alimentação antes e agora / andava de égua e de burra, deslocações demoradas /

Costureira

Murça

Empresas de camionagem Boais & Rodrigues / Cabanelas / Rodonorte; VIDA QUOTIDIANA mercadorias e passageiros / importância dos transportes rodoviários suplantou os comboios

Motorista

Murça

Acidente de moto / roubo de VIDA QUOTIDIANA material do comboio / pesca / novos meios de transporte

Pescador

Murça

VIDA QUOTIDIANA

Viagem como militar / ida a pé para o Tua / vida difícil no vale do Tua / contrabando de azeite

Agricultor

Vila Flor

VIDA QUOTIDIANA

Anos 1950 / 60 – fracas comunicações / viagem de comboio como militar em Bragança / comboio único meio de transporte

Agricultor

Vila Flor

Experiência da linha do Tua / feiras / quotidiano no vale agricultor e construtor VIDA QUOTIDIANA do tua / a favor da linha e civil / contra o fecho / transporte de mercadorias e passageiros

Vila Flor

A representação em linguagem documental dos principais elementos de informação que o repositório de fontes orais analisado possibilitou fazer, completa-se com a ilustração diagramática dos indicadores socioprofissionais dos 67


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entrevistados, elaborada a partir da agregação dos dados da penúltima coluna da tabela, a qual permite assim uma perceção mais explícita dos “níveis sócioculturais”, diferenciados mas interconexos, que subjazem ao universo representativo de informantes privilegiados, mantendo-se salvaguardada também a individualidade dos grupos sociais envolvidos. Fica-se assim em presença de uma outra dimensão analítica de relevo para a abordagem socio-histórica da vida quotidiana das populações que se fará mais adiante em capítulo próprio.

Ilustração 3 – indicadores socioprofissionais

Por fim, tendo em vista que uma análise qualitativa como a que se empreendeu, pretende apreender “algo a partir do que os sujeitos da investigação lhe confiam” (Amado, 2000), pode fazer-se agora uma breve e sintética interpretação dos dados e elementos de informação ilustrados nos três diagramas apresentados e codificados na tabela anterior ou quadro sinóptico construído a partir dos objetivos traçados, das perguntas lançadas pelos entrevistadores e de recortes de informação dos discursos dos entrevistados. Esta interpretação possibilita uma apreciação e análise sintéticas dos grandes temas contemplados que se encontram documentados em curtos vídeos ( 5 a 8 min. ) construídos a partir de imagens editadas de registos videográficos selecionados em função da qualidade de informação e representatividade. No seu conjunto, coerentemente organizado, compõem o documentário videográfico que é material acompanhante do presente livro. Fio condutor da análise de conteúdo aqui ensaiada, a organização prévia em grandes temas isolados no acervo vasto e diferenciado da informação recolhida, exige então uma última e sintética apreciação. Relativamente ao tema dominante – a LINHA DO TUA003 - é possível 003  Ligação ferroviária em via estreita, com 134Km (Tua-Mirandela-Bragança), afluente da linha do Douro

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Maria Otilia Pereira Lage

estabelecer um número apreciável de inferências a partir das quais se pode destacar: - a assunção da linha férrea do Tua como sinónimo de desenvolvimento local / regional, tendo como vantagens ser temporalmente flexível ao longo de mais de um século de existência, e ter facilitado quer a deslocação e movimentos de pessoas, quer o escoamento de produtos agrícolas e seus derivados, para além do acesso proporcionado a bens, mercadorias e novidades. No que se refere ao segundo tema também dominante - VIAGENS DE COMBOIO - a perceção geral é de uma imagem francamente positiva e, consequentemente, uma valorização da beleza da paisagem, da facilidade de acessos em todas as atividades diárias, da sociabilidade e solidariedade experimentadas, das conversas, jogos, cantares e afetos vivenciados, pese embora a morosidade dos trajetos, as lentas velocidades, os atrasos de horário, o desconforto material das carruagens, as paragens súbitas e a sujidade dos corpos provocadas pelo uso de combustíveis, como a lenha e o carvão e o antigo funcionamento a vapor. Infere-se de todas as descrições um sentimento vivo de nostalgia, saudades do movimento geral trazido pelo caminho-de-ferro nesses tempos de juventude e sentimentos ambivalentes em relação às viagens idas com o fim da linha e do comboio. Quanto ao terceiro tema – EMIGRAÇÃO - fenómeno recorrente na história da região, com múltiplos destinos predominantemente na África e na Europa mas também no Brasil, as inferências mais evidentes são: o desenvolvimento trazido pela abertura da via ferroviária, circulação do comboio do Tua e sua ligação com outras linhas de bitola estreita do Nordeste e a via férrea do Douro; a melhoria das condições de vida e novo futuro para os filhos com a maior facilidade de estudos; o retorno parcial ou permanente de pequenos proprietários ao trabalho agrícola como ocupação temporária, por falta de braços para a lavoura; a reconhecida valorização social resultante e que lhe anda em regra associada. Em relação ao quarto tema - GUERRA COLONIAL PORTUGUESA (1961 -1974) – a perceção que se colhe nas narrativas de vivências diretas de muitos dos entrevistados, na generalidade homens com idades atuais próximas dos 75 anos, é a de que este acontecimento histórico de enormes repercussões em Portugal e nas ex-colónias portuguesas em África ( Angola, Moçambique e Guiné, Cabo Verde e S.Tomé e Príncipe) deixou profundas e dolorosas marcas nestes indivíduos, suas famílias e, em geral, nas populações da região do Tua. 69


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Sobre o quinto tema - PESCA NOS RIOS TUA e DOURO –torna-se evidente enquanto atividade comum de populações ribeirinhas, passada de pais e avós para filhos e netos, quer como atividade lúdica e de convívio com a natureza e fauna local, quer como meio de trabalho diário e de pequenos negócios de amanho e venda de peixe. Associada à evidência da pesca e sua prática com diferentes modalidades e técnicas, é também sublinhada a influência decisiva dos rios na vida das populações quer como recurso vital da água com os sistemas de rega essenciais à agricultura, atividade dominante da região, quer como via de comunicação ancestral entre povoações e populações. Quanto ao sexto tema – COMUNICAÇÕES – objeto constante de perguntas simples e diretas dos entrevistados, as respostas são genericamente lacónicas com exceção de referências ocasionais à leitura em voz alta das cartas no largo da aldeia, ou na varanda de uma casa, à chegada e partida regular do correio em sacos transportados por mulheres a pé ou de burro, até às estações e apeadeiros do comboio onde seguia em malas seladas na carruagem-correio. Há ainda alusão aos pequenos postos públicos de telefones em pequenas tabernas, casas particulares e lojas de pequeno comércio e, mais rara e tardiamente, a postos públicos em estações centrais de correio nas vilas sede de concelho, funcionando com cavilhas e pedido de ligação à central da estação ferroviária de Foz Tua que assegurava as ligações telefónicas em rede ao nível regional e nacional. Em relação ao sétimo tema – FERROVIÁRIOS – deduzem-se das respostas imediatas e considerações indiretas, referências regulares à garantia de emprego local na CP, às melhores condições de segurança, remuneração e progressão profissional, regalias e privilégios para os próprios e famílias quanto à utilização dos comboios e consciencialização de um estatuto social mais elevado e diferenciado do trabalho rural. É também generalizada a perceção da grande mobilidade de colocação nos caminhos-de- ferro a nível nacional, a representações social de que ser ferroviário se transmitia de pais a filhos e o facto de a classe dos ferroviários formar uma grande família unida e solidária com um futuro de vida garantido sem precisar de emigrar ou procurar outras profissões. Puderam ainda ser detetados outros temas e assuntos de referência ocasional que se compilaram num oitavo grupo designado por OUTROS e cuja descrição sintética se encontra identificada na tabela anterior.

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PARTE II - MUDANÇAS NO MUNDO INTERIOR TRANSMONTANO

CAPÍTULO 3 – VIDA QUOTIDIANA DAS POPULAÇÕES (TESTEMUNHOS)

“As pessoas querem compreender a sua vida quotidiana, suas dificuldades, suas contradições, as tensões e os problemas que se lhes impõem. Em consequência exigem uma ciência das medições que traduza as estruturas sociais em comportamentos individuais ou microssociais” (Franco Ferrarotti, 1982:127)

É difícil isolar a vida quotidiana da realidade social de que faz parte, o que nos leva desde logo a perguntar se será possível concetualizar “o quotidiano” a partir das vulgares perceções do senso comum. Mas esse será quanto a nós, na perspetiva da socio-história, um dos caminhos a seguir, se atendermos à via proposta pela corrente sociológica da etnometodologia (Harolf Garfinkel). Segundo esta corrente sociológica, os métodos a utilizar na apreensão do real social devem encontrar-se enraizados nos detalhes empíricos, no próprio sentido da vida quotidiana,004 destacando-se o significado subjacente às relações sociais do mundo do “sentido comum” conduzido por uma observação considerada “naturalística” na medida em que respeita os pontos de vista e a linguagem corrente da gente que habita esse mundo. Porém, numa perspetiva algo diferente 004  Richard Harvey Brown – “Ordre et Révolution dans les Formes Normales du Discours et de la Conduite”, in Cahiers Internationaux de Sociologie, vol.LXVIII,1980,p.69.

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da sociologia da vida quotidiana, há que situar o quotidiano no «histórico-original-significativo» e não apenas no “quotidiano-banal-insignificante”005 Nesse sentido, tomamos a sério os atores sociais, alvo das entrevistas realizadas e atrás organizadas e estudadas no âmbito da reflexão de Franco Ferraroti (sociólogo italiano e autor clássico do método biográfico- histórias de vida) citado em epígrafe, procurando agora recentrar a nossa atenção na análise das maneiras de viver, pensar e agir das populações anónimas do vale do Tua, na história recente. Tentamos então apreender e esboçar traços de um sujeito coletivo histórico através da síntese de comportamentos, atitudes e vivências quotidianas, valores e princípios generalizados nesta micro-territorialidade socio-histórica, sem obnubilar os “níveis sócio-culturais”, diferenciados e interconexos (Roger Chartier) que lhe subjazem e salvaguardando a individualidade dos grupos sociais através do enfoque dado aos testemunhos de uma diversidade representativa de histórias de vida, recordações e impressões do viver quotidiano e do que por esta via se nos documenta. Para além do espaço-tempo que se tem vindo a caracterizar e aqui melhor se ilustrará através das impressões de muitos dos seus naturais e residentes voz coletiva mais próxima e melhor inserida natural e culturalmente neste ambiente local e regional, contemplam-se outras dimensões da história recente da região marcada no séc XX pela linha férrea do Tua: acontecimentos, fenómenos, atos e episódios individuais e públicos; atividades económicas (agricultura, pesca, feiras…) e modos de vida profissional e social; possibilidades de ensino, saúde, alimentação e higiene; conceções sobre a relação homem-natureza-técnica; motivações e trajetos de viagens de comboio, meios e modalidades de comunicações; práticas e saberes tradicionais; mobilidades geográficas e sociais, designadamente as do pessoal ferroviário; representações e funções sociais, antigas e novas mentalidades e manifestações da cultura religiosa e popular (festas, crenças e rezas, bandas de música, folclore…) Seguindo um princípio diacrónico e pluriperspetivado de organização dos testemunhos mais impressivos, no arco temporal coincidente com o funcionamento da linha férrea do Tua, com enfoque principal a partir dos anos 1940, esboçam-se alguns desses “vectores definidores”006 da vida quotidiana das po005  Jose Machado Pais “Paradigmas sociológicos na análise da vida quotidiana” in Análise Social, vol. XXII(90) 1986-1º, 7-57. 006  POLÓNIA, Amélia – Reflexões sobre alguns aspectos da vida quotidiana no séc XVI. Disponivel em http:/ler. letras.up.pt/uploads/ficheiros/6357.pdf, consultado em 20 de Novembro de 2015.

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Maria Otilia Pereira Lage

pulações neste microcosmo transmontano do vale do Tua e norte do Douro na fronteira com a zona planáltica, considerado em termos geoclimáticos, Terra Quente contrastante com a Terra Fria. Outrora, nos finais dos anos 1930 e década de 1940, os tempos difíceis da guerra e do pós-guerra e o quotidiano desta região em muitos dos vetores definidores considerados, são delineados neste vivo e polifacetado relato feminino de notável expressividade e densidade informativa de conteúdos:007 (…) Acontece que o meu pai era ferroviário e os meus tios e primos. Eu nasci numa estação de caminho-de-ferro, nasci no Cachão. [ Sobre as viagens de comboio] Fiz imensas... Imensas viagens, porque eu fui criada à beira do comboio e devo dizer-lhe que, no tempo da guerra, o comboio circulava a lenha. Quero dizer, o comboio era a vapor e só andava quando a caldeira fervesse. Como as lenhas eram muito procuradas, nessa ocasião e eram verdes, às vezes o comboio parava no meio da linha até aquecerem a caldeira, até a caldeira ferver e depois continuava a andar mais um bocado. Se realmente conseguiam manter a temperatura e o comboio andar continuamente, muito bem. Se não, meia volta e estava parado em qualquer canto. [Impressões do convívio dentro do comboio, lembranças do que se falava, de vivências difíceis e dos passageiros soldados], Ah, era excelente, era excelente. As pessoas… Havia três classes: primeira, segunda e terceira. Na primeira classe iam os senhores ricos, nobres e mais afamados. Na segunda classe iam as pessoas que nem eram pobres nem eram ricas, seria a classe média, de antigamente, que existia. E na terceira classe iam os pobres. Os assuntos das pessoas… Falava-se, quero dizer, no tempo em que eu era miúda era a guerra. Dominava a guerra de 39. Eram os problemas da guerra, eram os problemas do racionamento dos alimentos… Era, enfim, uma gama de coisas. Havia muita necessidade, normalmente as pessoas andavam descalças, vestidas com um vestido assim todo riscado, quer de verão quer de inverno, era o agasalho que tinham e a 007  Entrevista MR / FCSNCM- 11º B-14- Esc.Sec. C.A. Tipo de entrevista individual relevante quer pelo desempenho da entrevistadora e guião usado, quer pelo testemunho significativo desta informante com a idade de 77 anos, aposentada do CTT onde trabalhou 52 anos como telefonista nacional e internacional e técnica principal de gestão. Pode entender-se a transcrição feita desta entrevista, designadamente ao nível das questões síntese que introduzem as falas, como leit-motiv para as restantes transcrições neste capitulo.

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maioria das pessoas, salvo raras exceções, era assim a vivência delas… Ah, sim, sim, sim, viajavam muitos soldados no comboio. E posteriormente também, tínhamos um exército muito forte. Até mesmo quando foi para o ultramar, quando rebentou em 61. [Nessa altura de grande crise social e política, eram muitas as dificuldades relacionadas com os cuidados de saúde, medicamentos, higiene, educação…] Em tudo… Quero dizer, estávamos em tudo muito limitados. O racionamento existia, existia. Eu nunca fui para o racionamento. Nesse aspeto fui uma pessoa privilegiada, eu e a minha família, mas as pessoas (…) davam-lhes uma senha e com a senha traziam um quarto de pão, cada uma; por exemplo, para um agregado familiar às vezes de 10 ou 12 pessoas. Estava tudo racionado, porque os alimentos iam para ajudar os alemães… [Sobre a emigração…] Não. Eu não emigrei nem tenho familiares emigrados, ah!mas isso era o “vulgar de lineu”. Há imensas pessoas que conheço aqui na aldeia e aqui nos arredores que emigraram para outros destinos. [Acerca das dificuldades de deslocação, à época] As mercadorias chegavam através de carros de bois ou de cavalos. Quero dizer, era tudo transportado em carros de bois ou cavalos. E dirigiam-se aos caminhos de ferro, portanto, às estações dos caminhos-de-ferro, que era onde havia o escoamento. Quem escoava, nessa ocasião, os produtos era o caminho-de-ferro. O caminho-de-ferro foi um grande desenvolvimento para a sociedade. [Recordações dos primeiros telefones à manivela e das centrais] Ora bem… antigamente era morse. Era por morse que se transmitiam os telegramas. Era tudo através do morse. Depois, mais tarde, é que realmente veio o telégrafo e já era noutra modalidade. Daí, quando eu fui para os correios já não existia o morse. Já existia uma modalidade em que se transmite atualmente… Não, isso era outra coisa. Estou eu a falar nos telegramas e nos telefones. Havia um quadro e nesse quadro havia um x de linhas. Por exemplo, estavam centradas as linhas de Mirandela, as linhas de Bragança, as linhas de Lisboa, as linhas do Porto, “terrataratata”… E consoante as pessoas metiam a cavilha e davam à chave, que era uma chave manual… Iam procurar o destino para onde as pessoas queriam falar: Lisboa, Mirandela… E a gente dizia “eu que74


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ro uma chamada para Pombal de Ansiães” e elas então de Mirandela é que ligavam ao Pombal. Quero dizer, havia um centro principal e daí passavam ramificações para o local… Ai, havia várias funcionárias. Éramos muitas. Era o quadro maior do correio, era o de telefonistas, porque era um serviço permanente, dia e noite. [Memórias sobre outras formas de comunicação: caixeiros viajantes, vendedores ambulantes…] Também tenho. Tenho, porque… efetivamente isso era um facto. Até pelos caldeireiros que nos traziam as notícias. Os caldeireiros eram pessoas que se dirigiam às localidades para fazer trabalhos. Por exemplo, para soldar uma panela, para soldar uma sertã, porque tudo se aproveitava, não se desperdiçava como agora. E então eles chegavam, já se conheciam, aquilo já era usual, as pessoas frequentarem as aldeias, e diziam “ó tio Zé, então o que se passa?” “olha, em tal parte sucedeu-se isto assim. Em tal parte aconteceu que um homem matou a mulher. Olha, em tal parte ‘terratata’… Quero dizer, a gente ia… a comunicação era assim diretamente pelas próprias pessoas que visitavam os locais. Era assim transmitido, porque nem havia televisão, nem havia… começava a haver rádios, mas havia um, se calhar, em 100 pessoas ou 200 e as pessoas não tinham acesso a meios de comunicação. [Feiras movimentadas, lugares de compra e venda e espaços de convívio] sim muito… perfeitamente. Quero dizer, no dia da feira era um dia de festa. As pessoas iam para a feira, lidavam com todos os feirantes que eventualmente aparecessem e com todas as pessoas que vinham dos concelhos e das zonas à volta e criavam-se amizades e convivia-se e discutiam-se os problemas que cada um tinha na ocasião e era um centro de cultura e de lazer e, efetivamente, de desenvolvimento. A feira era um desenvolvimento! [E as vindimas e a apanha da azeitona?] As vindimas eram uma loucura. Essencialmente a vindima, era uma loucura. Era uma loucura, porque era tudo feito manual e as coisas eram transportadas através de cavalos ou burros ou carros de bois e, portanto, requeria muita mãode-obra e, requerendo muita mão-de-obra, as pessoas preparavam-se durante todo o ano para fazerem a vindima, porque era uma festa, onde normalmente as pessoas que remetiam aos trabalhadores davam-lhes de almoçar. Sempre almoçavam. A hora do almoço era uma alegria. 75


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Era uma festa: cantavam, dançavam, as pessoas eram muito alegres. Agora as pessoas são tristes… [Prática da torna jeira…] Antigamente o dinheiro era muito escasso. Pronto, o dinheiro havia pouquíssimo e então as pessoas não iam ganhar dinheiro. Por exemplo, eu ia para a vindima do meu vizinho ou do meu familiar e o meu vizinho ia-me tornar a jeira, ia para a minha. Quero dizer, era uma troca direta de trabalho e não uma troca de dinheiro, porque o dinheiro era praticamente inexistente. […] [Linha do Tua cheia de curvas e contracurvas, estreita e perigosa] Tenho imensas histórias, porque pronto, quando os pais são ferroviários, há sempre coisas que afetam os filhos. Eu recordo-me, por exemplo, de uma ocasião, dia de consoada, tínhamos a mesa posta para se fazer a consoada e vinha de Bragança para Mirandela o comboio que chegou à estação do Azibo e descarrilou. Vinha lá um irmão do meu pai, que era meu tio e padrinho que era o maquinista e o meu pai vinha no freio. De maneira que o meu pai ainda se magoou, nessa ocasião não tivemos consoada nem tivemos nada, porque pronto, ficou toda a gente muito aflita, nem se comeu nem se bebeu nem nada. Só se chorava e não tínhamos mais alternativa. E ainda tenho outra que essa ainda me marcou mais. Foi quando realmente o meu tio Lourenço, que era meu tio e padrinho, descarrilou aqui no termo do Pombal no túnel das Fragas Más. A máquina descarrilou, virou-se para cima e o meu tio disse para o fogueiro “salve-se quem puder”. De maneira que entretanto a máquina deu uma reviravolta e virou-se para baixo. O meu tio saltou, partiu as duas pernas, esteve muito tempo internado e muito doente e o fogueiro, infelizmente, morreu agarrado à máquina. Ainda lá hoje estão os rodados da máquina, conforme desceu a máquina pelas fragas abaixo.” […] [Linha do Tua - despachos de produtos regionais, projecção das alheiras de Mirandela] …Quero dizer, a alheira de Mirandela foi inventada por uma senhora chamada Adelina Romôa. Em Mirandela toda a gente fazia alheiras, assim como em toda a zona transmontana, só que as daquela senhora eram especiais, tinham um paladar diferente e pelo paladar e pela qualidade começaram a cativar as pessoas de Mirandela. Aquilo foi crescendo, crescendo, crescendo e entretanto surgiram mais pessoas também a segurar no mesmo ramo. E de maneira que foi 76


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crescendo de tal maneira que atingiu uma dimensão nacional, porque efetivamente, na minha época, quando eu era miúda, aquilo era praticamente só local. […] [Camionagem, autocarros e táxis… o comboio perdeu importância?] Sem dúvida, sem dúvida. Mirandela já tinha, já tinha uma carreira diária para Alfândega da Fé, uma para a Torre Dona Chama, uma para Valpaços, uma para Murça… de maneira que, pelo menos que me recorde, já havia diariamente esse meio de transporte… Não, ali o comboio continuava com a mesma importância. A importância do comboio é decadente, mais num passado recente, porque ali não havia linhas para haver interligação e havia já umas estradas, embora fossem térreas e rudimentares, mas já havia estradas, e estradas de macadame. [Vida económica e social em Trás-os-Montes, noutros tempos… almocreves e barcas de passagem nas travessias dos rios… memórias?] Então não tenho! Quando a gente ia para qualquer lado tinha de atravessar o rio, tínhamos de chamar o barqueiro. A gente chegava à beira do rio: se o barqueiro lá estava, o barqueiro transportava logo a gente, a título de 10 tostões ou coisa parecida; se efetivamente o barqueiro lá não estava, a gente começava da margem oposta do rio “ó barqueiro, ó barqueiro, ó barqueiro!” e ele às vezes estava a dormir e tudo, mas lá acordava e lá vinha o barqueiro buscar a gente. Lá atravessávamos o rio, lá lhe pagávamos aquilo que ele nos exigia e andávamos assim, de barco em barco. Quando atravessávamos o rio era sempre, era de barco, não havia pontes. Só em 1940 é que se fez a ponte do Tua. [Estórias de viagens de comboio… os ferroviários eram uma família] Olhe, era miúda, estava no Cachão. Estava no Cachão, era pequenina, e gostava de brincar… Nós adorávamos brincar nas carruagens de primeira. Conseguíamos iludir os ferroviários e escapávamo-nos para lá. Eu e outras meninas e outros meninos, mais ou menos pequenitos da minha idade. Então adorávamos estar lá sentados naquelas almofadas fofinhas das carruagens de primeira, porque na nossa casa nós não tínhamos almofadas. Tínhamos lá um banco de pau ou uma coisa assim do género e, na ocasião, não se falava praticamente em almofadas. Nós ali sentíamo-nos umas princesas, faz de conta que aquilo era uma casa principesca e nós adorávamos aquilo e também adorávamos viajar. Olhe, devo-lhe dizer que quando eu era menina andava 77


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muito no comboio, pois eu tinha o comboio ao pé de mim e andava no comboio sem bilhete, sem nada. E o que acontece é que usavam as meninas umas boinas, mas eu ia para a janela cantar, porque os miúdos o que sabem era cantar às janelas dos comboios. Ia para a janela cantar e um dia a boina, com o vento, voou-me. Eu começo numa gritaria infernal, até que o revisor disse assim “ó garota, tu que tens?”, porque toda a gente nos conhecia do Tua a Bragança. “a minha boina, a minha boina” “não chores, que eu quando vier no comboio daqui a um bocado mando-o afrouxar e vou-te lá buscar a boina. Tu não chores”. Como de facto, lá me consolou como pôde e lá me levou a boina. Lá me levou a boina para cima. Lá afrouxou o comboio e lá me levou a boina, porque aquilo era uma família. Quero dizer, os ferroviários eram uma família. As pessoas tinham muita consideração umas pelas outras, era tudo muito amigo… Olhe, as viagens eram sempre muito engraçadas. Nós saíamos, eu, o meu pai e a minha mãe e às vezes o meu irmão. Outras vezes, como o meu irmão era mais novo, ficava com os meus tios. E então, logo de manhã… Não. De véspera, a gente fazia uma merenda avantajada, juntava-se tudo num cabaz, pronto. Era boa galinha, era bom peixe, era bom queijo, era bom tudo, mas uma merenda avantajada e um garrafão de 5 litros de vinho. De maneira que nós saíamos às 8 da manhã e só chegávamos ao Porto, a S. Bento, por volta das 10 da noite. Durante o dia comia-se a merenda toda, cantava-se, dançava-se, bailava-se, arranjavam-se amizades pelo comboio e quando chegávamos ao Porto era de noite e a merenda estava comida. [Canções populares, rezas, orações e lenga lengas] Ai então não me lembra, então não lembro... Aquela cantiga da oliveira da serra: “ó oliveira da serra, o vento leva a flor, oioai só a mim ninguém me leva, oioai lá pró pé do meu amor”. E assim canções de lavoura… Isso a gente passava a vida a rezar a todos os santos e a todas as coisas, a implorar a graça divina. Nós eramos todos muito religiosos, até admira como se perdeu tanto… Tanta fé, porque efetivamente a gente passava toda a vida a rezar, a implorar a graça divina. Logo de manhã, a gente levantava-se e a primeira coisa que fazia era pôr as mãos e pedia a bênção ao pai e à mãe. Logo de manhã, a gente levantava-se da cama e a primeira coisa que se fazia era pôr as mãos e dizer para o pai “bom 78


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dia meu pai, deite-me a sua divina bênção”. Então o pai dava-nos a mão a beijar, passava-nos a mão pela cabeça e dizia “Deus te abençoe, filha”. De maneira que, a partir daquele momento, começava uma oração, uma oração a título de qualquer coisa que a mãe entendesse, ou o pai ou que nós já estivessemos mentalizados para isso, mas rezava-se muito… “Santo anjo do Senhor, meu zeloso guardador, pois a ti me confiou a piedade divina, hoje e sempre me guarda, rege e ilumina. Ámen”. Logo de manhã a gente rezava isto ao Anjo da Guarda. [Volfrâmio contrabando e dificuldades da vida] Quero dizer, a vivência das pessoas era com muita dificuldade, as pessoas tinham dificuldade de toda a ordem… O calçado delas… era descalços. As pessoas andavam descalças e sem agasalhos e sem nada. Tinham muita dificuldade, não havia dinheiro. Foi no tempo da guerra e logo a seguir ao pós-guerra, mas o volfrâmio trouxe benefícios a muitos lugares, sobretudo nos locais onde ele foi bem explorado. Nós temos aqui um caso concreto que é o Amedo, onde as pessoas atingiram um nível de vida superior a qualquer uma outra localidade e não havia por aqui na área, ninguém que tivesse uma nível de vida assim, porque o volfrâmio… pronto, havia contrabando e ele era muito bem pago e, sendo muito bem pago, as pessoas enriqueceram. As pessoas, inclusivamente no Amedo nem sequer comiam pão nem trigo nem nada, o pão deles era bolachas. Comiam bolachas e boas carnes e… Quero dizer, viviam acima no nível das outras pessoas, precisamente por causa do volfrâmio. (…) Hoje, infelizmente, a coisa retrocedeu. As aldeias estão piores do que nunca, que não têm nada absolutamente. Nem têm pessoas, nem têm nada absolutamente. Tudo fechou: fecharam as padarias, fecharam os lagares de azeite, fecharam os alambiques, fechou todo o comércio, todo e qualquer tipo de comércio, fecharam as alfaiatarias, fecharam os sapateiros, fechou tudo. Quero dizer, desapareceu tudo e o que é verdade é que hoje as aldeias estão reduzidas a um mínimo de pessoas, estão praticamente desertas e não há nadinha, nadinha que realmente uma pessoa possa dizer “é por este ou por aquele motivo que nós vamos valorizar a aldeia”, porque desapareceu tudo. Mas ainda por volta dos anos 1950 e 1960 e já mesmo na primeira metade dos anos 1970, viver nesta região e no vale do Tua continuava a ser muito 79


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confinado e bastante diferente do que é hoje: as condições de vida eram de pobreza, a alimentação parca e do que a terra dava, as deslocações difíceis e demoradas; muitos andavam ainda descalços, transitando por caminhos íngremes e atalhos de terra batida, a pé ou com a ajuda de éguas e burras, acossados por cães vadios. Iam fazer as vindimas, a apanha da azeitona e outros trabalhos agrícolas, comprar e vender gado, animais e mercadorias de produção própria nas feiras regulares de Mirandela, Carrazeda, Macedo e até da Régua. Distraiam-se nas festas de aldeia animadas de arraiais e bailaricos tocados à viola, realejo e concertina deslocando-se também mais longe para cumprir promessas aos santos de sua devoção nas afamadas romarias da região como a Senhora da Assunção (Vilas Boas-Alijó) e a Senhora do Amparo (Mirandela). Ou então, produtos, mercadorias e passageiros circulavam ainda geralmente em cavalos e carros de bois para irem apanhar os comboios lentos e superlotados nas numerosas estações e apeadeiros da linha do Tua, então ainda principal via e meio de transporte, em que o preço dos bilhetes rondando os tostões, ainda era caro porque o dinheiro era pouco. São assim muito numerosos os que recordam com saudade as viagens de comboio alegres e animadas e lamentam, denunciando, a sua paragem e o encerramento da linha, cuja história nos momentos altos de funcionamento e grande movimento de pessoas e bens relembram com nostalgia, vaticinandolhe os mais otimistas, um melhor futuro no almejado turismo da região. As novas estradas, mais rápidas e largas vias de acesso, trouxeram o aumento das empresas de camionagem de Mirandela, Alijó, e especialmente Murça (Boais & Rodrigues / Cabanelas / Rodonorte, etc.), concelho do vale do Tua que faz a transição entre os distritos de Bragança e Vila Real, acabando os transportes rodoviários por suplantar as ligações ferroviárias e contribuir para votá-las à ruína e ao esquecimento, situação repudiada pela maioria dos antigos ferroviários e da população local e regional. Os cuidados de higiene encontravam-se limitados, as doenças eram endémicas e frequentes enquanto que o acesso à saúde se via longínquo e assaz dificultado… tínhamos de andar 12 quilómetros a pé com as nossas crianças ao colo, quando íamos com eles ao médico…008. Valia aos doentes a possibilidade das viagens de comboio para Mirandela, Bragança, Pinhão, Régua, Porto e Lisboa, recorrentemente lembradas, assim como se encontrava bastante re008  Entrevista DR / IR – 10º A-05- Esc. Sec.. C.A.

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duzido o ingresso dos mais jovens no ensino e educação, dada a exiguidade de escolas, distâncias a percorrer e meios económicos para suportar gastos com os estudos. Aprendiam desde cedo, com madrastas e padrinhos, as artes e os ofícios de costureira, alfaiate, e outros trabalhos manuais tradicionais. A maioria dos jovens e crianças, feita a 3ª ou a 4ª classe… a telescola surgiria mais tarde… iam trabalhar no campo com os pais e os avós, ou não fosse a agricultura o destino inseguro e mal pago de que apenas escapavam os que conseguiam empregar-se na CP, seguiam a carreira ferroviária, os que iam estudar para os seminários de Vinhais e Bragança, ou os que uma vez regressados do serviço militar obrigatório ou da Guerra Colonial, migravam para as vilas e cidades ou emigravam para África, Brasil e países ricos da Europa. Muitas foram as famílias que daqui partiram para as ex-colónias portuguesas em África, para aí se estabelecerem e trabalharem como colonos009 recordando mais tarde, quando regressados a Portugal em 1975, após o processo de independência das ex-colónias portuguesas, o peso das heranças coloniais. “…Moçambique é um país espetacular, um país lindíssimo. Tem uma capital que era a antiga Lourenço Marques que hoje é Maputo, uma cidade moderna, avenidas largas, praias lindíssimas, um clima que nem se fala e eu estive lá até aos dez anos. Notei quando cheguei a Portugal, que Moçambique era muito mais desenvolvido que Portugal. Nós lá em Moçambique… eu já tinha casa de banho em casa, coisa que quando cheguei a Portugal aqui ainda não existia. Em 1974 cá não tínhamos casas de banho. Lá, já havia luz, iluminação em todas as zonas. Aqui, também ainda havia falta de eletricidade, em algumas aldeias… Moçambique estava muito mais desenvolvido que Portugal. No que toca à cultura...Pronto vou falar do que se cultivava. Os meus pais tinham 009  A colonização coletiva, fenómeno de fluxo migratório dirigido para África, designadamente incentivado pelo Estado Colonial português no sec XX, em especial com a política dos colonatos entre 1945 e 1970, seria feita com famílias de colonos recrutadas na metrópole e oriundas dos meios rurais de todas as províncias do continente e das ilhas adjacentes. Ao chegarem às zonas de colonização, (Angola e Moçambique) serlhe-iam entregues casais agrícolas (casa rural, terreno com 100 hectares desbravado e semeado num quarto da sua área, alfaias e ferramentas agrícolas, o gado necessário ao trabalho agrícola e ao estabelecimento da exploração pecuária, um pequeno fundo de exploração em dinheiro para as despesas do primeiro ano). A casa e dependências agrícolas, as despesas de irrigação e desbravamento de 25 hectares de terreno e as alfaias e ferramentas agrícolas seriam concedidas pelo Estado a título gratuito. Tudo o resto deveria ser reembolsado. A posse plena dos terrenos ocorria após a amortização total dos valores adiantados pelo Estado.

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as machambas… Chamavam-se as machambas onde cultivavam o arroz, aquilo eram hectares e hectares de arroz! Era através disso que as pessoas viviam, lá, na minha zona, na zona do Limpopo. Cultivava-se o arroz para se vender e fazia-se dinheiro daí. Recordações…andei lá na escola até à 3ª classe. Já vim fazer a 4ª classe a Portugal. …”(EntrevªDA / JÁ, 11º-B, 18- Esc.Sec.CA) Como se pode deduzir, o sistema de colonato nas colónias portuguesas em África, consistiu em aldeias construídas por colonos portugueses em regiões rurais, com o apoio do governo colonial português, para ocupação efetiva do território através do desenvolvimento agrícola. Mas, entretanto, nos anos 1960, desencadeia-se a Guerra Colonial contra os povos das ex-colónias portuguesas em África em luta pela sua emancipação e independência que se prolonga até 1974 e logo depois a Emigração, primeiro clandestina e depois oficializada, para a Europa do pós-guerra, acontecimentos cujos efeitos se fazem sentir fortemente na demografia e na agricultura da região com fortes repercussões na vida quotidiana das populações que aqui se mantem, deixando recordações e memórias que permanecem ainda vivas e são recorrentes em diversos testemunhos diretos e indiretos: “ fui para a tropa e, em 1970, fui para Moçambique, estive lá 2 anos e vinte e sete meses… Recordações? Sim más e boas… Ora bem, … fiz um poema quando já cá estava, dedicado a África. África, porque… dei-lhe o título ‘’África Meu Amor’’… quem lá vai, adora aquilo e eu escrevi isto assim: ‘’ Vi-te na praia em Setembro amei-te na praia em janeiro a chuva caía de verão o sol tostava de inverno. Afaguei teus seios redondos capim de mata macio tuas pernas de pau santo como leoas em pleno cio. Teus olhos raiados de bruma mapas de rios generosos Limpopo, Zambeze, Rovuma aqui mansos, além ruidosos. Mas as paixões esmorecem pelo Nissa ou pelo Nango 82


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teus lábios doces e cálidos dizem-me Django, Django.’’ Este Django, Django significa amor em dialeto Maconde que é uma província de Cabo Delgado, uma tribo que lá existe… Não, não tive nenhuma madrinha de guerra porque já era casado quando fui para a tropa e já tinha um filho, portanto a correspondência que trocava era com a minha mulher. As madrinhas de guerra, nesse tempo, serviam para nos acompanhar e pelo menos para poder trocar correspondência, normalmente depois daria em namorico, mas não foi o meu caso… Sim mas muitas vezes escrevi aerogramas, escrevi montes deles… à noite, nas horas vagas, era o nosso passatempo, era escrever para toda a gente e era em aerograma, pois… Era uma folha azul ou esverdeada que tinha várias partes e conseguíamos escrever em todas as dobras, tinha uma maneira própria de se dobrar e utilizávamos todos os bocadinhos para escrever.” ( EntrevªCV / JAR – 11º Ano B-01, Esc-Sec.C.A.) O fenómeno da emigração, permanência histórica em Trás-os-Montes desde o sec. XIX, acentuou-se, desde finais de 1960 e anos 1970, com destino aos países mais ricos e desenvolvidos da Europa, mais drasticamente em alguns concelhos do vale do Tua, como Carrazeda de Ansiães. “(…) Já emigrei para França e, curioso, que fiz a viagem de comboio. Demorei cerca de um dia e uma noite. Tivemos que fazer várias mudanças e passei a noite no comboio, a dormir. Metia o saco debaixo da cabeça por causa de não mo irem roubar, a mala e algumas coisas… e foi a viagem sempre de comboio também. (…) Mas as condições de vida lá eram muito superiores, obviamente, não é? Não tem comparação. França é um país muito superior a Portugal e os emigrantes procuravam sempre melhores vidas, não é? Melhores futuros, melhores vidas para os filhos, claro. (…) (Entrevª. DA / JA - 11º Ano B - 18, Esc Sec C.A.) Eram, por essa altura, e já antes, em menor escala, também frequentes 83


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as migrações internas, designadamente de mão-de-obra rural, das terras da Frieira para as da Ribeira para a faina das vindimas, a apanha da azeitona e outros trabalhos rurais. Também os trabalhadores do Alentejo vinham para aqui, no verão, ocupar-se das ceifas e malhadas. Daqui, também iam para fora da região, com destino a localidades mais desenvolvidas e cidades como Porto, Lisboa e arredores. “(…) Então, acho muito bem que outras pessoas viessem e venham para cá trabalhar. Se não havia aqui mão-de-obra, havia que ir buscar mão-de-obra fora. E, nesse sentido, eles faziam o trabalho, aprendiam as nossas tradições, as nossas culturas, e nós com eles também aprendíamos! Aprendíamos as culturas deles também e troca de ideias. Acho muito bem!” (Entrevª. DA / JA - 11º Ano B - 18, Esc Sec C.A.) Mas, na verdade, as migrações internas de trabalhadores sazonais que particularmente de 1940 a 1960 se deslocavam para esta região para trabalhar na faina agrícola, bem como a emigração de naturais para várias partes do mundo, foram um fenómeno de mobilidade aqui bem marcante ao longo de todo o século XX. Alguns feirantes e pequenos negociantes mais remediados corriam as feiras “trabalhosas” de Trás-os-Montes, vendendo bugigangas infantis perecíveis e baratas, produtos e ferramentas agrícolas, gado e animais. Outros dedicavamse ao contrabando de azeite e demais produtos de primeira necessidade, com o racionamento do Ano da Fome (1941) e dos tempos da Guerra, já lembrados. É voz corrente nestes testemunhos, coloridos de episódios concretos e simples que nestas terras a vida era quase exclusivamente de sobrevivência diária: “antigamente, as pessoas viviam com grandes dificuldades mas viviase… criavam-se coelhos, criavam-se galinhas, criavam-se porcos… e com o que davam os campos.” Eram tempos danados “Olha, uma vez o Américo andava na tropa, na marinha, e veio cá passar o Natal, que morreu a avó, a mãe do pai, e ele veio logo ao funeral. Caiu uma nevada muito grande, e eles tinham de se apresentar no quartel ao outro dia do Natal… e não podiam ir. Mas havia mais um rapaz e uma rapariga que andavam a estudar lá para baixo e tinham que ir também apanhar o comboio… e então ele que fez? Arranjou umas galochas… a nevada era tão grande, tão grande, tão grande, que ele arranjou umas galochas e ia na frente com as galochas a abrir caminho e os outros depois punham os pés onde ele punha as galochas. Até ao São Lourenço foram assim.” (Entª.A A / L C – 11-B, nº19, Esc.Sec. C.A.) 84


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Se o clima de extremos marcado por invernos agrestes e verões secos e tórridos vai sendo mencionado, aqui e ali, os trabalhos e os dias na terra, os seus frutos, a pesca e a rega das terras do rio Tua, por alguns considerado “de elite”, são frequentemente recordados pelos informantes privilegiados em imagens e estórias da vida quotidiana das pequenas povoações: “Lembro-me de uma história engraçada… nuns terrenos onde havia pomares… havia uma história de um senhor de S. Mamede que ia regar as laranjas com a esposa e ligava o motor. Colocava as mangas no rio e o motor estava na propriedade, um pouco mais acima. O senhor ligava o motor, ia ver se o “absorvo” (mecanismo de absorção) estava de facto no rio e virava-se para a esposa e perguntava “ó Ana! Já bota?” e a esposa respondia “Não! Só bufa!”. (risos) Pois está claro, a água ainda não tinha chegado à propriedade… Outra, por exemplo, em que eu não queria acreditar… o meu padrinho, que já faleceu, dizia que havia mexilhão num local chamado “A Barca”. Eu não queria acreditar! Como gosto de pescar e tenho ido pescar algumas vezes para o rio, constatei que, de facto, cheguei a ver mexilhão no rio Tua. Portanto era uma história que eu não considerava que fosse verdade e afinal era mesmo!” (Entª. FJMS / MJV - Agrpº-Esc. Sec.A.) As recordações de infância prevalecem, indiciando quase sempre o que mudou entre os tempos de antigamente e os de hoje, tendo muitas vezes por protagonistas centrais o mundo rural e o rio Tua com um curso de 40km, afluente da margem direita do Douro e resultante da junção, a 4 kms do norte de Mirandela, do Rabaçal e do Tuela, dois rios que nascem em Espanha e entram em Portugal pelo concelho de Vinhais . “Claro que guardo memórias. É normal… Quando eramos miúdos, juntávamo-nos em grupos e íamos tomar banho no rio e, depois tínhamos as nossas aventuras no caminho. Era na altura dos figos, havia uvas e… sabe como é, éramos miúdos e a tentação de ir buscar aqui e ali era grande… No fundo, não fazíamos aquilo por mal... Não havia outra coisa e era assim que nós nos divertíamos. Depois íamos ao rio, tomávamos banho, estávamos lá, quase, a tarde inteira, e no regresso 85


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lá passávamos outra vez onde havia uvas ou figos e comíamos. Naquele tempo era assim… Era diferente… Hoje há fruta em qualquer lado. É difícil alguém ir mexer na fruta. Também ninguém diz nada e naquele tempo até havia situações que eram um bocado… As pessoas dos prédios punham guardas a guardar as uvas e os figos. Emparedavam as vinhas para se não ir para o pé das uvas. Mas nós… uma pessoa nova arranjava sempre maneira de enganar os guardas…”(Entª. AAAC / MALR - Agrpº-Esc.Sec.A.) O ambiente natural e cultural do homem nesta região de fauna e flora abundante e variada, é naturalmente marcado em quase todos os concelhos do vale, pelo rio Tua, nuns mais que noutros, em função da maior ou menor proximidade fluvial de seus territórios. Assim, a pesca no Tua, como passatempo tradicional ou atividade complementar da agricultura, é também referenciada através da abundância de espécies piscícolas, das práticas e técnicas desta atividade secular, da alusão à fauna abundante e própria das margens do rio, da narrativa pitoresca de estórias, episódios marcantes e facécias picarescas, desfiadas ao sabor da imaginação popular e da identidade cultural e lúdica do povo da região. “A pesca é o meu hobby desde os 9 anos (…) Costumo dizer que o bichinho começou com o meu falecido avô que era uma pessoa “doente” pela pesca, e foi nessa altura que comecei a pescar e até aos dias de hoje, todo o tempo livre que tenho é passado no rio (…) Eu costumo pescar no rio Tua (…). Já pesquei em muitos rios, conheço muitos rios. O meu rio de elite é o rio Tua. O rio Tua tinha uma série de espécies que eram autóctones deste rio: era a boga, era o barbo, era o escalo, era a enguia… Hoje em dia, com os tempo modernos, não se passa isso. Há uma série de espécies que foram extintas, e presentemente, abunda o barbo e há as espécies exóticas que é o achigã e o lúcio (…) Sou um amante também da natureza, e eu estando ali, costumo dizer que estou com Deus, porque é um sítio onde me sinto bem. E como sou um amante da natureza, eu estar ali estou relaxado, não me apercebo que o tempo passa, nem penso em mais nada… é pelo prazer de estar em contacto com a natureza. (…) A pesca hoje em dia está muito evoluída. Eu comecei com uma cana-da-índia e hoje tenho canas de carbono. As pescas 86


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são completamente diferentes, e cada espécie é diferente (…) é um rol grande de coisas. (…) Temos de estar preparados para cada espécie, temos de ter o material adequado. A mim o importante, às vezes não é pescar, é o sentir-me bem, estar em contacto com a natureza, com uma série de animais que habitam nas margens e que se vêem no rio… é isso o que me dá gosto, o gosto pela pesca e pelo rio. (…) Sim, tenho muitas, centenas de experiências. Tenho boas e tenho más. …vou começar pela má. Foi no rio Tua. Morreu um colega meu, que estava comigo à pesca, afogado. Isso foi uma experiência má, que eu durante alguns tempos até deixei de ir à pesca, mas superei e voltei a ir porque o gosto pelo rio é muito grande. Experiências boas tenho muitas. Acho que todas as vezes que vou para a pesca tenho uma experiência nova porque todos os dias é diferente. (…) Sempre gostei muito da pesca e sempre gostei muito de aprender e aprender com os mais velhos. Eu tenho amigos que têm oitenta anos que ainda hoje pescam comigo, pescam há muitos anos comigo. E eu, um dos gostos que tenho, é juntar-me a esses amigos e discutirmos as peripécias do dia-a-dia (…) porque o dia-a-dia é sempre diferente: hoje acontece-me a mim uma coisa, ao meu colega acontece outra, é sempre diferente. Mas tenho várias peripécias que não tenho tempo para contar porque são tão engraçadas (…). O convívio com as pessoas no rio faz de nós… não sei… pessoas com mais sinceridade (…) parece que nem temos problemas quando estamos naquele sítio porque o bem-estar é enorme e o prazer de estarmos com os nossos amigos, o convívio é tão bom que nós até nos esquecemos. Agora uma peripécia boa na pesca foi o ter pescado um candeeiro de sala, um lustre de sala [risos]. Eu brinco, os colegas dizem “És pecador, és aldrabão”. Mas não é assim, aconteceu mesmo. E eu às vezes também brinco e digo -lhes assim “Enganais-vos, não é aldrabice. Até trazia as lâmpadas acesas”. Mas é uma das peripécias que acontece muito no rio. Eu estava a pescar e ficou preso e puxei, puxei e saiu-me um candeeiro de sala. (…) Ainda tenho outra (…) O rio Tua é abundante em fauna. Existem as lontras (…) e quase diariamente, quando vou à pesca, tenho convívio com elas. Vejo-as (…) às vezes têm crias. Então, uma vez vi uma lontra que trazia qualquer coisa pendurada numa orelha e eu fiquei [expressão de espanto] e disse “O que é que ela traz na orelha?”. E então 87


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andei dias a apreciar e um dia que ela se aproximou de mim, eu tentei atrai-la com peixe para ao pé de mim, e então a lontra trazia um brinco, eu dizia que era um brinco e não era. Era uma rapala. (…) Uma rapala é um isco artificial com que se pesca o achigã. E então a lontra trazia uma rapala pendurada na orelha.” (Entª. MEMS / JARP - Agrpº-Esc. Sec.A.) Enquanto que os naturais e habitantes sobretudo de Murça e Alijó se encontraram sempre mais ligados ao rio Tua do que à sua linha férrea, outros, especialmente os das mais numerosas povoações ribeirinhas de Carrazeda e Mirandela não se esquecem de evocar, dentre as diversas memórias que guardam da vida quotidiana, o flagelo histórico das cheias deste rio que arrasaram pontes, arrastaram colheitas, gentes e animais. A vida quotidiana foi sendo nesta sub-região transmontana durante mais de 100 anos (desde 1887 até 2008) regularmente ritmada e animada pela linha férrea de via estreita. Os comboios do Tua, impregnam ainda hoje, com as admiráveis paisagens e vegetação fértil do vale do Tua contrastante com as culturas e a arborização das arribas planálticas, o imaginário coletivo das populações deste micro e polifacetado mosaico regional e seus visitantes. “(…) É assim, a linha do Tua… como o vale do Tua, fazem parte da nossa identidade! É evidente, eu não seria contra a construção da barragem se não destruísse toda aquela paisagem, se não destruísse a linha e …desde o momento em que a sobrevivência das pessoas da região não estivesse em causa. (…) A linha na sua totalidade, de Tua a Bragança, tinha no total 134km, salvo erro, portanto, iniciava-se no Tua servia ali algumas aldeias daqui do nosso concelho de Carrazeda, nomeadamente, Castanheiro, Tralhariz e a Brunheda, …para mim esse é o percurso mais bonito, é uma ‘’garganta escavada’’, toda ela escavada pelo rio e depois da Brunheda até Mirandela, …a paisagem começa a ficar mais plana, estamos a entrar no planalto de Mirandela, portanto a paisagem muda drasticamente, toda ela mais plana, vegetação totalmente diferente. Enquanto a vegetação da nossa garganta que vos falei há bocado, toda ela, as espécies que predominam são o pinheiro, o sobreiro, carrasco e o carvalho, para cima já vemos a oliveira, algumas vinhas, aliás bastantes vinhas, e 88


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terras de cereal. A partir da Brunheda, temos Ribeirinha, depois temos Abreiro é uma estação curiosa, …fica do outro lado do rio… Abreiro, portanto depois por ai acima vamos encontrar Frechas, Mirandela, depois de Mirandela o Romeu que é uma estação também muito bonita que serve toda a propriedade de Clemente Menéres que foi uma pessoa também influente na construção da linha do tua… a propriedade dele tem 5 mil hectares, imaginem a facilidade que a linha lhe trouxe para escoar os produtos, o azeite, o vinho e a cortiça; depois temos Macedo de Cavaleiros, temos o Azibo depois temos mais uma série de estações, que agora não me recordo, até Bragança. (…) (Entª. AL / LC – 11º B, 11-Esc.Sec.C.A.) A paisagem que os passageiros mais calados e contemplativos apreciavam calmamente das janelas do comboio em lenta velocidade, era deslumbrante, via-se o rio Tua, viam-se muitos montes, muitas terras de cultivo, viam-se campos de lúpulo, era uma espécie que servia para fazer a cerveja. (Entª.E / A – 11-B, nº20 - Esc.Sec. C.A.) A linha do Tua servia as populações do vale do Tua e fazia a ligação diária entre Tua – Bragança. Quem viajava muito nesta linha, em comboios de passageiros mas também e frequentemente, em comboios mistos de passageiros e mercadorias, eram os habitantes de Bragança, Mirandela e aldeias vizinhas, que precisavam de se deslocar ao resto do país e até para o estrangeiro, pois havia ligação com a linha do Douro (Porto a Barca de Alva). Viajavam também estudantes e muitos militares. O comboio era o transporte mais usado na época. Para além de meio indispensável de transporte foi uma via central e difusora de comunicação diária essencial, pois era também pela linha e no comboio que invariavelmente seguia o correio, mais usado do que os serviços de telefone ainda raros, tendo habitualmente as cartas de ser escritas por favor e lidas em voz alta no largo da aldeia. As muitas e impressivas memórias que subsistem destas ainda parcas e rudimentares telecomunicações010 existentes na 010  Numa nota muito sucinta da história das telecomunicações em Portugal, assinala-se que enquanto o telégrafo surgiu bastante cedo, em 1847, com Fontes Pereira de Melo, o telefone aparece em 1876, vindo a estabelecer-se em todo o país, a partir de 1904, um conjunto de redes telefónicas mais modernas, embora o telefone móvel só apareça, bem mais tarde, já na década de 1960. A comunicação por telex e cabo submarino conheceu grande expansão com os CTT e a Rádio Marconi (fundada em 1925). A 1 de Agosto de 1935 é inaugurada oficialmente a Emissora Nacional de Radiodifusão, EN, que marca o início da profissionalização da Rádio. A

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região somam-se às recordações das novelas de entretenimento da rádio, de escuta caseira rotineira e da televisão a preto e branco, uma por cada casa mais abastada da aldeia ou único café da vila. Coabitam com a grande incidência de analfabetismo predominante entre a população sobretudo feminina, e que continuava a registar-se nos anos 1960, época também dos constantes aerogramas dos soldados portugueses em África para familiares e madrinhas de guerra. “(…) Só havia um telefone em cada aldeia (telefone público) todos os habitantes usavam esse telefone. Não havia nenhum funcionário para atender os telefonemas. Os donos da casa é que atendiam e davam conhecimento às pessoas para quem telefonavam. Notícias boas ou más, não se telefonava por qualquer coisa. (…) O correio também vinha pelo comboio, em sacos de serapilheira individuais para cada aldeia. Havia uma pessoa encarregada de ir buscar o saco e que o levava a casa do regedor (não havia juntas de freguesia). Este senhor é que abria o saco e distribuía a correspondência (cartas ou postais) a casa dos seus destinatários. Mais tarde é que começou a haver carteiros que se deslocavam em motorizadas de aldeia em aldeia.” (Entrevª VA / GJAM- 12ºAnoTGPSI-23, Esc Sec CA) Protagonistas principais da linha do Tua, desde início considerada fator de progresso e desenvolvimento regional, foram necessariamente os ferroviários, muitos deles naturais de aldeias e povoações à beira da linha e amantes das máquinas, desde que começaram até que abandonaram, em idade de reforma, a profissão que quase todos escolheram e seguiram por proximidade da ferrovia ou reduzida oferta de trabalho para além da agricultura e também por influência familiar, já que tantos deles eram netos, filhos, sobrinhos, primos, afilhados e amigos de ferroviários. O testemunho seguinte011 que releva a forte presença da dimensão técnica, introduz-nos na história e ambiente da linha do Tua e na vida dos ferroviários que, como já se sublinhou, se veem como “ verdadeira família”. “Sim desde pequeno que gostava das máquinas, porque o meu pai também já era ferroviário e vivíamos ali num sítio perto do caminhotelevisão só surgirá, mais tarde, a preto e branco, a 4 de Setembro de 1956 e, a cores, apenas em 1960. 011  (Entª.DL / FA– 11-B, nº18, Esc.Sec. C.A.). Entrevista tipo, de maquinista da linha do Tua, idade de 68 anos, que trabalhou muito tempo com material circulante histórico, atualmente património ferroviário.

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de-ferro, já havia familiares, mais anteriores a nós, já ferroviários que era o caso de um tio meu que era chefe de armazém em Vila Real, já na altura, e pronto também era a profissão que se adequava mais depressa naquele tempo e onde se ganhava mais algum. (…) Nós éramos fogueiros ou maquinistas não éramos condutores, condutores era outra categoria, chamava-lhe a categoria dos Strangers. Iam a guarda-freio, iam a condutores ou a revisores conforme o caso; nos maquinistas era… a gente ia a fogueiro e, depois passado um tempo se tivessem boas habilitações, íamos a uma formação de escola de maquinistas, tínhamos uma junta médica, tínhamos psicotécnicos, muita coisa, para ir a maquinista não era assim tão facilmente. (…) Sim, trabalhei na linha do Tua com as máquinas a vapor, trabalhei também na Régua, Régua-Chaves, trabalhei na linha do Douro também a vapor. Mas em Mirandela, na linha do Tua, trabalhei a vapor, com automotoras ALANS que eram muito boas automotoras. No tempo, andavam sempre superlotadas, sempre superlotadas. Depois trabalhei também com as automotoras ALANS e depois acabou as de vapor e vieram as máquinas diesel. A máquina diesel era uma máquina espetacular, boas, boas de verdade, era uma maravilha trabalhar com aquilo! (…) Para mim, as que gostei mais de trabalhar foi as máquinas a vapor… davam mais respeito às pessoas que trabalhavam com elas e à categoria. Depois, já a diesel, já era uma máquina que qualquer um sabe trabalhar com elas (…) Como tripulantes havia maquinista e fogueiro, isto na máquina a vapor… O fogueiro era meter carvão à máquina para produzir vapor para rebocarmos as carruagens ou vagões, conforme o caso, não é?. E na tripulação do comboio havia o condutor, o guarda-freio e o revisor e esses viajavam nas carruagens e no vagão próprio… chamavam-lhe DF, onde ia o condutor (…) Os horários eram estipulados com base no serviço; tanto podiam ser de noite ou de tarde, como de madrugada, havia muitos de madrugada. Tivemos uma altura que vieram umas automotoras “Joborlavas”, foi a coisa pior que podiam ter comprado cá para a linha do Tua. Até lhe puseram o nome os próprios passageiros, puseram os nomes das “Xepas”, vê lá o que elas se embalavam… e tínhamos um serviço, chegávamos a Bragança à meia noite e qualquer coisa. (…) 91


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As refeições na máquina a vapor através de uma panela de pressão, que ainda tenho ali, está bem estimada e... fazia-se uma sopa a vapor que não chegava a lume era só o próprio vapor da caldeira da locomotiva a vapor. ligava-se um “tubozinho” e não havia ninguém que se negasse a comer uma sopa feita a vapor! (…) No Tua só havia máquinas a vapor e automotora Alan, mas a automotora Alan… chamava-se assim porque veio da Holanda… andavam lá os meus colegas mais antigos… conforme se ia abichando, uns saiam, outros entravam, e… só havia a vapor, mas aquilo era uma maravilha e havia ali muita, muita gente, muita gente, muito transporte. Ali no Tua havia castanhas, batata … adubos… era um movimento tremente para a linha do Tua, umas para cima outras para baixo. A própria carne com que se fazem as alheiras de Mirandela passava toda pelos comboios, os coelhos, grades de coelhos, havia muito movimento, muito, a linha da Tua não deu prejuízos… Só benefícios, olha, mal, estão agora os que ficam ao longo da linha, alguns nem têm para onde se deslocar (…) Pronto, o Tua é a estação de transbordo, o Tua chamava-se estação de transbordo. Era a estação onde parava a linha do Tua de mercadorias ou para uma via larga do Douro, ou para uma via estreita do Tua; depois havia, logo a seguir ao Tua, Tralhariz apeadeiro, havia logo a seguir Castanheiro que também era um apeadeiro, depois havia a seguir Santa Luzia já era estação, depois havia S. Lourenço que, antigamente ainda, também ainda chegou a ser estação; depois havia oTtralhã,o apeadeiro, depois havia a Brunheda, estaçã; Codeçais, estação; Abreiro, estação; Vilarinho, estação; Ribeirinha, estação; Cachã, estação; Frechas e, depois, havia o Alcalino latadas e a seguir era a estação de Mirandela; depois, a seguir, a estação S. Sebastião apeadeiro; Carvalhais, estação; Vilar da Ledra, apeadeiro; Avantos, apeadeiro e Romeu, estação. Depois do Romeu, havia Cortiços, também estação; depois, Grijó, estação, que depois passou a apeadeiro. Em Macedo, era uma estação que dava muito: Macedo de Cavaleiros tinha muito movimento; depois, havia Castelão,s apeadeiro; havia Azibo, estação. Aí até havia uma toma de água em cortiça, sim, como em Cortiços uma toma de água para as máquinas a vapor e Azibo; depois, Azibo também dava bastante, porque aqueles agricultores descarregavam ali o milho, o trigo era tudo… havia lá um linha de resguardo que levava 92


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três ou quatro vagões, já se pode ver o que ali dava, não é!?... (…) E também da linha do Douro… vinha muita coisa, no caso do adubo, e outras coisas que vinham para a região de Trás -os –Monte; depois, a seguir ao Azibo, havia Salselas, apeadeiro; Valdrez, apeadeiro e Sanda,s estação; Sandas também dava bastante, também tinha lá uma linha de resguarde para lá deixar vagões, e pronto, depois havia Valdrez, havia Chãos, havia Fermentãos, havia também Vila Franca que era mais cá abaixo, depois era Salsas que aí tínhamos outra toma de água para as máquinas a vapor, depois de Salsas tínhamos Rossas, depois de Rossas tínhamos Sorte,s estação; depois, Remisquedo, apeadeiro, depois Rebordãos, apeadeiro e Mosca,estação e,depois, aseguir a Mosca, era Bragança… (…) ..nós até tínhamos um comboio que saía de manhã do Tua, às cinco e picos da manhã, cinco e dez ou assim uma coisa, e começava, principalmente aos dias de feira, nos outros dias também, mas principalmente nos dias de feira, as pessoas que viviam junto às estações começavam logo a chegar… em Sta. Luzia, já começavam a carregar os cabazes da laranja, fruta, daquilo que tinham e daquilo que colhiam, não é! E quando chegavam iam para as feiras de Mirandela… Macedo e Bragança. (…) …A linha do Tua tinha muito passageiro turístico. Eu recordo-me de uma vez um senhor, que era corregedor em Oeiras, pediu-me para o deixar viajar na máquina entre Mirandela e o Tua, embora a gente fosse proibido mas os superiores toleravam… e angariavam-se turistas e quando chegou ao Tua ele disse-me “muita obrigado senhor F. mas vou-lhe dizer uma coisa, já fui a diversos lugares paisagísticos mas a paisagem mais bonita que conheço é do Tua a Mirandela”. …Em paisagem, a mais bonita era do Cachão ao Tua, ou Mirandela-Tua, para Bragança também tinha uma paisagem, no começo bonita… por cima do Romeu, onde chamávamos nós o rio esquerdo, começavam a avistar-se aquelas serras no alto de Rossas, que davam além para Duas Igrejas, quase se via lá o topo de Miranda… às vezes, no alto de Rossas, víamos o fumo das máquinas a vapor. (…) …o comboio da linha do Tua transportava milhares de toneladas de adubo, milhares, milhares entre Tua e Bragança; faziam-se comboios especiais de Mirandela a Macedo, Mirandela a Rossas, com comboios 93


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só de adubo, era o transporte só de mercadorias, os comboios normais não chegavam para esgotar o adubo que dava para Bragança, Macedo, Rossas e mais. (…) Mal, achei mal, achei mal. [o encerramento da linha em 2008]012 Porque quem desenvolveu as nossas regiões, neste caso Trás-os-Montes e outras, foi o comboio, foi o comboio, não foi o carro, os carros nunca desenvolveram nada e mais… agora, atualmente, como já disse, havia milhares de toneladas de adubo para Bragança, agora não vai nada e temos outro assunto mais importante… enquanto uma máquina a diesel, não falamos na máquina a vapor, rebocava 300 / 400 toneladas de adubo, agora uma “semi-trailer” leva 10 ou 12 para fazer aquela mesma percentagem de peso de reboque. Neste caso, para rebocar é preciso sei lá quantas “semi-trailers”, isso vem prejudicar o nosso ambiente enquanto que na máquina a diesel era só um motor a libertar gás para a atmosfera agora é preciso dez, vinte, trinta “semi-trailers” o que prejudica o nosso sistema de saúde. (…) A aldeia de Foz Tua onde se localiza a estação ferroviária do Tua que faz a ligação entre a linha do Tua e a do Douro é, também nessa medida, uma povoação charneira do vale do Tua desde sempre muito movimentada e com uma população, sobretudo durante o século XX, maioritariamente de ferroviários e familiares descendentes de ferroviários. Em épocas anteriores ao caminhode-ferro era já um importante e bem conhecido porto fluvial por onde circulavam e se faziam as trocas comerciais entre o norte e o sul do país, de todas as mercadorias e produtos do mercado de importação ou até de exportação internacional como o Vinho do Porto. A esse movimento intenso, e comunicações diárias, se refere a seguinte narrativa de uma avó Tuense a sua neta, na qual se traça um impressivo quadro da vida quotidiana do Tua. Fala dos comboios, das linhas férreas, das mercadorias e passageiros, da aldeia e da estação, com grande minúcia e vivacidade e, ainda, como faz questão de referir, com muito carinho e estima por todos terem sido e continuarem a ser grande parte da sua vida. Marcaram-na e lhe deixaram-lhe memórias e lembranças 012  que ele não atribui aos acidentes que sempre houve e há em todo o lado e não fecham os transportes por isso, mas sim ao que chama “a economia”, e a um novo regulamento geral de segurança R.E.S. implementado em 1970 na linhas férreas de via estreita que desguarneceu as estações, reduziu o apoio à circulação e ainda tece consequências negativas nos serviços prestados aos passageiros.

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intemporais que jamais esquecerá e que, também, diz, não deixará esquecer. (…) Eu tenho 57 anos, nasci a 27 de Janeiro de 1957. Fiz a minha escola no Tua, onde os comboios passavam diariamente. Havia a passagem de nível com guarda porque era frequente passarem 10 ou 12 comboios por dia. O comboio fazia-nos chegar tudo. Fazia-nos chegar a água, porque a nossa água era imprópria para beber e só tínhamos a do rio. O peixe, que vinha do Porto, era descarregado ali, que depois era transportado pelo comboio de Mirandela até Bragança. Levava tudo; eram levados e vinham produtos como cereal, adubo, peixe, sacos de nozes… Vinha tudo… Vinha e ia, o comboio trazia e levava. Havia, então, comboios com cerca de 20, ou até mais, vagões, que todos os dias eram transbordados com pessoal para a outra linha de Mirandela. Nós quando precisávamos de ir para o médico, íamos no comboio. O comboio tinha um vagão próprio, onde a gente ia na maca e fazíamos a viagem do Tua ao Porto, e outras pessoas que vinham ao Tua de Carrazeda e ali apanhavam o tal vagão que as transportava ao hospital do Porto. (…) Sim havia vários produtos e materiais que vinham e iam no comboio. Para Carrazeda, os cereais, Mirandela… Faziam um comboio que chegava a levar cerca de 14 ou 15 vagões, que devido à linha ser “a pique” punham uma máquina à frente a puxar e outra atrás a empurrar, onde a linha subia mais. Quando a linha deixava de subir, a máquina voltava para trás pois o comboio já conseguia prosseguir com a carga que lhe meteram. Antigamente, o comboio era puxado a carvão, carvão e água, acendiam o carvão e levavam uma máquina que transportava o fogueiro e o maquinista, que eram eles que conduziam o comboio. Atrás levava sempre a última carruagem, onde iam as coisas de mais valor, encomendas, onde iam, também, dois senhores a tomar conta dessas coisas de valor que se levavam. E nos vagões ia o cereal, o adubo… Ia o carvão para Mirandela, porque o carvão era transportado para a estação de Mirandela e para Bragança, porque o comboio ia do Tua a Bragança. Antigamente, onde eram transportados os militares e os militares saíam de Bragança e faziam duas horas de comboio para chegar ao Tua. Depois no Tua, apanhavam o direto que os levava ao Porto, Lisboa e por aí… Entroncamento… Eram distribuídos os soldados por onde tinham de sair. 95


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(…) Antigamente, íamos de comboio para a colónia de férias todos os anos. Tínhamos direito a ir por o meu pai ser trabalhador da CP, que era a companhia dos comboios. E tínhamos, então, direito a ir para uma colónia de férias. Ia uma carruagem, onde se levavam cerca de 100, ou até mais, meninos, não consigo estimar agora… E nessa carruagem íamos para uma colónia de férias que era em Mangualde. Iamos naquela carruagem reservada, que era só para nós, chegávamos ao Entroncamento e mudávamos de comboio porque era outra linha. Até chegarmos a Mangualde. Todos os anos fazia essas viagens. E também quando queria ir ao médico. Agora já por volta dos anos 60, a gente já ia à Régua, ao Pinhão… Eu aprendi a costura, com 10 aninhos, no Pinhão e ia no comboio todos os dias. Levava um lanchezinho. E ia no comboio das 9h e vinha à noite, no das 5h. E era lá que a gente aprendia a fazer alguma coisa porque na nossa aldeia não havia nada. Só era mesmo os ferroviários. (…) Sim, ainda me lembro de pagar 25 tostões para o Pinhão, 10 escudos para a Régua… Ficava mais barato se tirássemos o bilhete de ida e volta, porque tínhamos de voltar no mesmo dia. Naquela altura, havia cerca de 12 comboios, uns para cá, outros para lá… Quase a todas as horas havia comboio. Do Porto ao Pocinho, do Pocinho à Barca d’Alva. Ainda me lembro que, o primeiro comboio que foi do Pocinho a Mogadouro pois é lá que acaba a linha, foi levado pelo meu avô. Lembra-me de ouvir a minha mãe e a minha avó falarem sobre o meu avô andar por lá durante 4,5 dias que demoravam a fazer a viagem naquelas máquinas a carvão. Eles todos vestidos de preto, o maquinista, o fogueiro, de chapéu preto. Eles faziam a comida dentro das próprias máquinas que eles conduziam, tinha uma panela a vapor, metiam ali os alimentos e faziam as sopas, coziam as carnes nessas panelas dentro da máquina, faziam o comer para eles. (…) Antigamente, o comboio era um bem para toda a gente porque movimentava muitas pessoas. Havia cerca de 4 autocarros por dia, de Vila Flor ao Tua, que levavam as pessoas até à estação para apanharem o comboio ali e irem até ao Porto. (…) Lembrei-me agora, que o comboio nos fazia chegar também o correio. Havia um vagão vermelho, dizia CTT’s, e esse vagão trazia o correio. E eu naquela altura, que ainda era miúda, ia buscar a mala do 96


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correio à estação, da estação dos comboios levava à estação dos CTT’s e à noite, vinha o comboio de regresso com a mesma carruagem e nós íamos à estação do Tua levar o correio das aldeias que ali era composto por uma senhora que estava encarregada dessa mesma função, na distribuição de encomendas. Até, portanto, o correio nos era trazido pelo comboio. (Entrev.ª SP / FP-11º ano-B nº9,Esc Sec. VFLAG) O pessoal ferroviário da CP com condições de vida e mobilidade social superiores à das populações rurais era, ao longo das suas carreiras, várias vezes deslocados entre diferentes linhas e estações, como se pode intuir do seguinte testemunho, a vários títulos paradigmático, de uma professora filha de ferroviário. A nível de serviços públicos de gestão e fornecimento de água e eletricidade às populações, indicadores importantes do seu nível médio de vida, são exemplo paradigmático os seguintes excertos de entrevista feita a um ex-militar da Guerra Colonial Portuguesa em Moçambique, depois leitor e cobrador destes serviços básicos, porta a porta, num dos concelhos do vale do Tua, pertencente ao distrito de Vila Real. “ (…) JAM: A comparação entre a Murça do passado, onde nasci há 70 anos, e a do presente é muito pela positiva. Em relação ao passado, atualmente é muito positivo. Embora a nossa vila não seja das mais desenvolvidas da região, mas é muito positiva em relação à minha geração, à minha juventude, nesse tempo. Não havia as condições que há hoje, nem havia comparação. (…) As relações entre as famílias, sim, eram muito mais amigáveis. Havia mais humildade e amizade entre as pessoas. Hoje há mais individualismo, mais egoísmo. Penso que é assim que se passa. (…) Eu sou de origem de uma família muito humilde. O meu pai era jornaleiro e faleceu com 47 anos e eu tinha 6 anos de idade. Ficamos 3 filhos a ser criados pela minha mãe, também já falecida. E, eram tempos difíceis, como deve compreender. Eu era o mais novo dos três e fui dos que tive mais mimo, apesar das dificuldades que havia na vida que nem sequer cheguei a trabalhar no campo. Assim que fiz o 2.º grau da instrução primária, fui para a arte de alfaiate, com 11 anos. A nossa universidade era essa nessa altura e uns iam para sapateiros, outro para barbeiros, outros para a arte de alfaiate. Eram as profissões 97


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que existiam na altura, porque os estudos eram só para os filhos daquelas famílias mais poderosas. Nesse tempo, era assim. Portanto, daí fiz a minha universidade de alfaiate até aos 10-20 anos, quando fui para o serviço militar.Fui mobilizado para as colónias, província ultramarina de Moçambique, e lá fiz o meu tempo de tropa, como tinha obrigação na altura. Andei lá 26 meses, em Moçambique. (…) Exacto, vivi a Guerra de África, embora não fosse um dos mais sacrificados, porque eu tinha uma especialidade no serviço militar que… não podíamos até andar pelo mato, sempre em aquartelamentos, porque era transmissões. Daí fiz o serviço militar, regressei à base, no espaço de um ano casei, e voltei. Gostei da vida lá e voltei, confiante que teria melhores oportunidades. Em má hora, porque na altura tínhamos a mentalidade que os governos de então nos incutiam de que aquilo era nosso. Em 1975 deu-se o que se deu lá, porque cá já se tinha dado o 25 de Abril em 74. E tivemos de regressar como pudemos: uns par um lado, outros para outro, mas à força. E quando cheguei cá, concorri para uma vaga de leitor / cobrador de eletricidade e água, em 1975, porque nessa altura a elctricidade ainda era explorada pelos Municípios, e tive a sorte de apanhar uma colocação. Só depois, em 1979, é que o nosso município cedeu esse trabalho à ctual EDP. Portanto, nesses 5 anos fiz os serviços de eletricidade como leitor / cobrador, e a água também: fazíamos as duas coisas ao mesmo tempo. E aí me mantive até 2002, que fui aposentado. (…) Nesses anos, em 75, ainda não havia eletricidade para todas as habitações. Era um número muito reduzido, em relação ao que é hoje. Na água, é exatamente a mesma coisa. Portanto, era um número muito reduzido. Se houvesse aí 200 consumidores na nossa vila (Murça) e englobando até o concelho, seria muito. Atualmente não, atualmente não tem comparação… Nesse tempo não havia a facilidade de transportes que há hoje. Como cobrador, eu tive de adquirir uma motorizada, coisa em que nunca tinha andado, embora já tivesse a carta de condução de automóvel. Agora, de motorizada, não. Possibilidades para comprar automóvel, não tinha. Os serviços nessa altura eram escassos, as condições eram escassas nos municípios. E, então, andei sete anos de motorizada a fazer o serviço de cobrança de eletricidade e água no meu concelho. Deslocava-me todos os dias para as aldeias nesse ser98


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viço. Mais tarde, depois, começaram a distribuir uma viatura, embora essa viatura não chegasse para as encomendas, porque havia sempre serviço para ela. Outros vinham e queriam a mesma coisa. E andamos, assim. A coisa lá foi andando e penso que atualmente e já estou aposentado há 13 anos as condições já estão muito melhores. Mesmo a nível de instalações não tem comparação. Aliás, a informática veio dar outras condições ao pessoal. Mas era o que havia, na altura. (…) Fazíamos muitos quilómetros, quer dizer, o nosso concelho não é muito grande, mas a minha deslocação maior era ali para a Terra Fria, para a zona da Carva. São 22 a 23 Km e era a distância maior. Mas tínhamos de a correr todos os meses. (…) A agente batia à porta dos consumidores e tinha que estar sempre com 4 olhos, porque, às tantas, era ferrado. É rara a casa na aldeia que não tenha um cão. Esse serviço era um bocado ingrato, porque era feito porta a porta e, consoante as condições do tempo, tínhamos de aguentar isso tudo: chuva, vento, frio, sol. Tínhamos de aguentar, mas era um serviço externo porta a porta e tinha de ser assim. Mas, como não há nada sem sacrifício, lá se ia aguentado, porque eu estava muito bem em Moçambique mas tive de voltar. Tive a sorte, além do meu esforço, de apanhar trabalho. (…) Íamos fazer a cobrança do recibo da água, correspondente sempre ao mês anterior, e trazíamos a leitura para ser lançada para o mês seguinte. Não havia informática nenhuma, era tudo manual e era tudo por continhas de cabeça. Havia livros de registo enormes para registar os consumidores e as contas de cada um. Mais tarde, em 1979, apareceu uma empresa a oferecer serviços já com informática e os recibos já iam com os cadernos de leituras já iam para essa empresa, era em Midões, e de lá já vinham feitos por computador e nós cá era só separá-los e partirmos para as aldeias para as cobrar. (…). Sobre o serviço que tive e de que hoje estou aposentado, devido a ele, é que não tem comparação com as condições de trabalho dessa altura para as de hoje. A nível dos consumidores, era um número muito reduzido em relação ao que é hoje; atualmente, a nossa vila [Murça] já não tem falhas de abastecimento, em qualquer lado, seja ponto alto, seja ponto baixa da vila. Nesse tempo, não. Quando batíamos à porta para cobrar uma coisa de que as pessoas durante o mês se tinham andado a queixar com faltas de água, principalmente nos pontos mais altos, quem suportava as reclamações 99


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era o pobre do funcionário que batia à porta com o recibo. Era isso. (Entrevª JM / JAM –Esc. Profis. de Murça) Nos anos 1980, já as mobilidades geográficas e sociais, um dos vetores diferenciadores da região, se acentuavam como se depreende também do depoimento desta informante, criada e educada no mundo dos comboios, em Mirandela, localidade central na Linha do Tua. O comboio beneficiou muito, económica e socialmente, esta cidade, a qual se destacou, do ponto de vista industrial e urbano, do resto da região do vale do Tua, que permaneceu por largos anos rural e interior: “A primeira vez que eu utilizei o comboio foi por motivos profissionais do meu pai, que era ferroviário, tivemos necessidade de ir viver para o Barreiro e a minha mãe estava grávida… já mais tarde, eu fui estudar e como o meio que me transportava era o comboio, eu fazia viagens semanais de comboio, nós arranjávamos grupos de amigas e no comboio fazíamos festas, jogávamos às cartas, comíamos, metíamonos com os revisores, era um espetáculo… jogavam muito às cartas no comboio, viravam-se faziam grupos, jogavam á sueca, jogavam á bisca, havia pessoas que liam os jornais já na altura, levavam os jornais para ler e outras liam revistas. Nós, como éramos um grupo essencialmente de raparigas, cantávamos músicas e às vezes também jogávamos umas batotas mas cantávamos sobretudo músicas, outras vezes estudávamos e maquilhávamo-nos… cantávamos músicas aos revisores, aos tropas associadas um bocado às cores; uma delas, era aquela ‘’vestido de azul’’ porque a farda do ferroviário era tipicamente azul, ainda hoje se mantém e nós cantávamos sempre esta música ‘’ele não passa cartão, ele não me aperta a mão, mas todas lá no liceu, estão apaixonadas como eu, azul, ele fica tão bem, de azul (...)’’ e outras claro. Falando especificamente da linha do Tua, que foi onde eu vivi mais anos, eu vivi até ao dia em que me casei, com um angolano, na estação de Mirandela, onde neste momento são os escritórios do metro, era o meu quarto e o quarto dos meus pais, aquelas duas portas que são viradas para a AGAR, e lembro-me às sextas-feiras havia sempre muita gente porque vinham muitos tropas no comboio da meia noite, ao domingo ia muita gente porque os tropas também iam embora de novo para os quartéis. Aos dias de feira também vinha sempre muita gente, nós tínhamos três feiras mensais, e nesses dias vinha muita gente de 100


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comboio porque o comboio na altura era o único meio que as pessoas tinham para se transportar, não havia autocarros com a facilidade que há hoje. Por isso lembra-me, que entrava muita gente no Tua, entrava muita gente no Vilarinho entrava muita gente no Cachão, em Frechas, depois em Macedo, naquela linha, no Romeu, vinha muita gente também do Romeu. Na altura eram também os estudantes, vinham mais de comboio, não vinham tanto de autocarro, muitos estudantes destas aldeias todas, vinham estudar para Mirandela, nós já tínhamos escola preparatória, secundária, tínhamos a escola industrial, hoje temos a escola agrícola de Carvalhais… Eram estudantes, tropas, muitos tropas porque havia comboio até de manhã, pessoas das aldeias… Eu nunca paguei bilhete de comboio porque o meu pai era ferroviário, tinha o privilégio de me deslocar para onde quisesse porque eu nunca pagava bilhete… ia muitas vezes de comboio aos armazéns da Régua, porque na Régua, naquela parte que agora está recuperada que é uma parte que tem restaurantes, eram os armazéns dos ferroviários, os ferroviários iam ai abastecer-se para o mês, compravam roupa, compravam o que queriam mais barato, e quando eu utilizava o comboio para ir a feiras era aí, depois também utilizava o comboio para ir de férias, para ir para a praia, quando íamos a Bragança ao médico também íamos de comboio, usávamos o comboio porque na altura ia-se muito ao hospital de Bragança, também não havia aqui muitas especialidades, estamos a falar há 45 anos… Sinto muitas saudades, porque eu adoro o comboio, cresci no comboio, vim para Mirandela com 3 anos, vivi sempre na estação, a estação era a minha casa, o meu número de telefone era o telefone da estação, nós não tínhamos telefone em casa, o telefone era o da estação, tínhamos também uma cozinha de inverno do outro lado da linha, do lado da estação. Na altura da festa da Nossa Senhora do Amparo, a estação era um dormitório, era fantástico, porque as pessoas vinham das aldeias, vinham para assistir ao fogo e depois dormiam na estação, traziam o cobertor, dormiam ali, era fantástico. Na altura havia muito pão, as farinhas, as rações, os enchidos, embora os enchidos não tivessem o marketing que têm hoje em dia, hoje Mirandela é sobretudo conhecida pela alheira e também pelo azeite, na altura havia muito a produção mesmo das próprias rações de animais, 101


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havia cá muitas lojas que vendiam animais, também tínhamos ali uma fábrica ao pé da estação que era, não me lembra bem agora o nome, mas também produzia farinhas, tínhamos a moagem Mirandelense que era aonde vai ser o museu do azeite, por isso é que também ia muita farinha para baixo, mesmo a própria roupa, vinha muita roupa através dos comboios, era o principal meio de transporte, era o comboio, era o comboio que nos ligava praticamente, a Bragança, ao Porto, era o comboio que nos ligava, não eram os autocarros como hoje em dia… …apaixonei-me por um Angolano, mas de Angola só conheço o que ouço falar ao meu marido… é um saudosista e tem saudades, diz que Angola era muito diferente daqui de Portugal, era mais quente, muitos frutos tropicais, mais liberdade também… O meu marido quando veio também ainda era novinho, tinha cerca de 10 ou 11 anos… o que ele adorava em Angola era meter-se numa piscina, de vez em quando o pai apanhava-o lá e não gostava, e de irem muito ao cinema, porque o pai dele acho que também era responsável lá pelo cinema e eles iam muito ao cinema e coisas do género, brincarem muito com os miúdos, com os ‘’pretos’’ que ele relacionava-se muito bem com eles aliás, até lhe chamavam depois o ‘’Rui Preto’’. (Entrvª MBP / PMAFM – 12ºAno-12, Esc. Sec. Mirag) Uma grande maioria dos naturais e residentes nas povoações ribeirinhas ou que bordejam a linha do Tua, entre Foz Tua Mirandela e Bragança foram passageiros mais ou menos assíduos dos comboios do Tua, tendo todos eles muitas recordações para contar. As viagens no comboio do Tua que deixaram muitas e boas memórias, continuam a ser recorrentemente recordadas: O ambiente era muito bom, muito agradável. As pessoas cumprimentavam-se umas às outras, à medida que iam entrando no comboio, pois todas se conheciam desta ou daquela aldeia. Falavam de tudo, desde os acontecimentos bons ou maus, alegres ou tristes, nascimentos, casamentos ou falecimentos; dos trabalhos campestres; das pragas das culturas. Quais os pesticidas que deveriam aplicar para combaterem as pragas da vinha, da oliveira e produtos hortícolas (batateira, feijoeiro, 102


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tomateiro, couves, etc.) Falavam dos doentes, dos que estavam internados no hospital (Mirandela) e iam mesmo visitá-los. Era uma sociedade unida, saudável e prestável. (Entª.VA / GJAM - Turma: TGPSI Nº23Esc.Sec. C.A.) Mas havia também o reverso da medalha, nas recordações das condições concretas em que ocorriam as viagens no tempo dos comboios a vapor e das máquinas a carvão “Na linha do Tua havia problemas com os fumos. “A gente” não podia (…) espreitar pela janela porque estava sujeito a levar com o fumo da locomotiva, ou mesmo brasas em fogo (porque nas locomotivas a caldeira era aquecida a carvão) (…) e, muitas vezes, nos túneis (…) os carvões ainda quentes na locomotiva batiam-nos na cara e aleijava, portanto, era necessário tomar algumas precauções.” (Entª. AIAN / OF - Agrpº-Esc.Sec.A.) No entanto, perduram no imaginário popular as canções alusivas às memoráveis viagens do comboio do Tua e seus passageiros regulares: “Lá vai o comboio lá vai a apitar, lá vai o meu amor para a vida militar” Ou então, para além de canções como esta, alusivas aos primeiros tempos de circulação do comboio, registadas em idêntica versão no Cancioneiro Popular Transmontano, existem outras, improvisadas pelo povo, por influência da tradição e da sobrvivência difícil: “Era militar… e militante… Comer e beber E chegar ao fim do mês À espera do sobrante! Também os trabalhos agrícolas e os amores de juventude eram temas das letras de canções do povo cantadas nas viagens de horas longas nos comboios ronceiros ou nos trabalhos da lavoura e nas idas a pé ou de burro para as festas de estio. 103


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“AH! Numa vindima onde andava um rancho muito bom que cantava muito bem, aprendi estes versos: Ora tristes são desejos dos teus beijos, que eu deles tenho esperança. Quem tanto sofre e sofreu como sofres tu e eu, deve amar só por vingança. Escrevi para memória, a minha história que mal se poderá ver, o que inundou a escrita foi o pranto da desdita na hora triste de escrever. E o que inundou a escrita foi o pranto da desdita na hora triste de escrever. Na solidão da demência dor imensa eu suportei penando assim, ó mulher que tanto choras vem passar as tristes horas no balsedo ao pé de mim. Ó mulher que tanto choras vem passar as tristes no balsedo ao pé de mim.” A música de bandas como as de Mirandela e Moncorvo, e mais tarde dos conjuntos, animava bailaricos e arraiais das antigas romarias e festas religiosas do Cabeço, de Castedo do Douro, de Vilaverdinho, das Senhoras do Amparo e da Assunção, enquanto as cantigas ao desafio e outras canções acompanhadas de ferrinhos e concertina, aliviavam o trabalho das cegadas do trigo e do centeio, das vindimas e lagaradas, deixando até hoje, recordações saudosas nas gentes do vale do Tua e do Douro: “Fui ao Douro à Vindima / buscar água ao rio Tua (…)”. Entreteciam ainda o tempo fora do trabalho, preenchendo-o, os ranchos folclóricos de Mirandela e de Murça ou as lendas de mouras, pontes, poços e caminhos, da Senhora de Jerusalém do Romeu ou da Fonte do rio Tua, as lenga-lengas, as rezas e outras manifestações de literatura popular com reportórios de valores e princípios de vida como se pode ver por este singelo hino à liberdade, ao amor, à natureza, ao sol e à própria música: “Talvez por muito amar a liberdade, te invejo a liberdade, a vida livre dos pardais, mas prende-me aos teus olhos por piedade que, eu juro-te, da prisão não sair mais. Não posso ouvir fado sem vibrar e não domino em mim a febre de um cantar, mas dá-me um beijo teu e livremente verás que eu fico assim calada eternamente. 104


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Baixinho murmurei muito em segredo, mas fui psi… mas sempre fui medrosa até mais não. Mas para que sejas meu não tenho medo, nem mesmo de perder a salvação. Não posso ouvir fado sem vibrar e não duvido em mim a febre de um cantar, mas dá-me um beijo teu e livremente verás que eu fico assim calada eternamente. Adoro a luz do sol que me alumia por graça e singular mercê do Deus, mas fecha-me no quarto, noite e dia, que eu troco a luz do sol pelos olhos teus. Não posso ouvir o fado sem vibrar e não domino em mim a febre de um cantar, mas dá-me um beijo teu e livremente verás que eu fico assim calada eternamente.” (Entª.A A / L C – 11-B, nº19, Esc.Sec. C.A.) Associadas à oralidade, a crenças e a medos, ao riso espontâneo, ao mundo profano e a diferentes formas de religiosidade que atravessam estas e outras manifestações da cultura popular e pública das povoações diferenciadas do vale do Tua, aqui documentadas e assim melhor conhecidas, designadamente em relação a facetas mais íntimas do quotidiano, surgem ligadas a um movimento secular de persistências que se vão moldando, num choque surdo de mentalidades, a mudanças e transformações intransponíveis do mundo contemporâneo onde deixam traços e rastro. Foi, porém, da história recente da Vida Quotidiana das Populações desta região que nos tentamos aproximar, através de uma exposição limitada e abrangente que privilegia a realidade enfática das vozes autóctones a que interessa devolver visibilidade. A utilização de fontes orais a que recorremos permitiu esboçar uma história interpretativa a partir de uma matéria-prima (impressões, opiniões, sentimentos, crenças) que muito raramente se encontra e se consegue extrair de outras fontes tradicionalmente utilizadas. Permitiu uma maior aproximação às facetas do quotidiano, mais ligadas à vida doméstica e aos modos de viver mais íntimos, assim como à realidade de grupos sociais à margem dos poderes (políticos, elites dirigentes, grupos de pressão, associações etc.) Atendendo, por fim, a que as fontes orais usadas se assumem, neste trabalho, também como fontes audiovisuais, dada a multiplicidade de suportes 105


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de seu registo, é ainda possível que uma análise crítica a este último tipo de fontes possa contribuir não só para uma original aproximação à vida quotidiana, como ao mesmo tempo, potenciar a subversão do quotidiano entendido no sentido de uma (re)invenção do mesmo. A análise crítica das fontes audiovisuais pode levar-nos a entendê-las sobretudo como fontes de inspiração que podem contribuir para estabelecer condições para a subversão do quotidiano, analisando-o criticamente e pondo em causa algumas das mensagens dos conteúdos documentais usados na sua descrição.013 Esta é, no entanto, uma outra dimensão de que nos ocuparemos no próximo capítulo.

013  PAIS, José Machado – “ Fontes documentais em sociologia da vida quotidiana” Análise Social Vol XX(83) 1984-4º, 507-519.

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CAPÍTULO 4 –ENTRE O ESCUTAR E O OLHAR (fontes orais / audiovisuais e vídeo documentário) A pesquisa e análises interpretativas até aqui feitas das memórias e quotidianos do vale e da linha do Tua através dos seus protagonistas mais diretos, das suas vivências e dos pontos de vista dos próprios atores sobre as histórias de vida, mediante a escuta ativa, registo textual e gravação audiovisual dos seus depoimentos, testemunhos, narrativas, assim transformados em fontes documentais, aproximam a história oral, a história local e regional e a história da vida quotidiana do documentário vídeo interativo, ao nível de muitas e complexas relações analíticas e metodológicas. O uso do vídeo para gravação das entrevistas e preservação do material bruto em arquivos que podem ser consultados por outros investigadores e interessados, bem como a produção de filmes de pesquisa por historiadores ou técnicos de comunicação audiovisual, ampliou o campo da reflexão sobre certas especificidades da inter-relação entre vídeo e história, suscitando a problematização das fontes e seus suportes. O uso do vídeo em história requer especial cuidado de modo a evitar-se ceder à imediaticidade da presença e à força afetiva dos depoimentos, tornando necessária a interpretação do próprio acontecimento que é a produção do vídeo. Também “nas situações de entrevista “conhecimento e ideias tornam-se realidade à medida que, e porque, se fala”; assim, “o sentido se constrói na própria narrativa” (ALBERTI, 2004: 79). Tal implica reconhecer que esses testemunhos atuam no enquadramento de memórias e constroem narrativas ao organizar os eventos do passado num sentido produzido no próprio momento

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da narração. Ao incluir o vídeo, acrescenta-se uma nova camada de significação a esses testemunhos que tampouco pode ser desconsiderada.”014 Por outro lado, para além de outras questões que se colocam ao historiador, os desafios da escrita historiográfica que se baseia em suportes audiovisuais, como é aqui o caso, estão para além da transcrição dos depoimentos orais gravados em situação de entrevista e seu uso pelos historiadores que assim transformam os testemunhos em fontes orais, ou melhor, audiovisuais. Escapa-lhe em regra a complexidade da situação do encontro e momento da entrevista, a performance do entrevistado e as características da oralidade que acabam por perder-se na passagem do registo oral para o escrito e do encontro para a sua descrição textual. Um trabalho como este que se suporta em depoimentos audio-visuais tem então de considerar a dimensão performática do testemunho, atendendo à imagem como parte da informação e dando importância, quer às questões levantadas, quer ao conteúdo das respostas e depoimentos, quer à forma como se fala.015 Logo, numa perspetiva transdisciplinar, torna-se necessária “a ampliação do diálogo entre conhecimento histórico e produção audiovisual, através do trabalho em parceria de historiadores e profissionais de cinema. Um trabalho no qual cada um colabora com o seu conhecimento e experiência numa produção coletiva que congrega as competências individuais.” (MAUAD, 2010: 146). Este conjunto introdutório de reflexões sobre a relação entre imagens e testemunhos, sem que nenhum seja acessório, como se procurou que acontecesse no projeto desenvolvido e neste trabalho de apresentação escrita, levam-nos a optar no presente capítulo pela reprodução possível de situações de conversa ou entrevista, tentando manter a relação dialógica entre questões e testemunhos. Concentramo-nos nestes, de modo a realçar a força imagética da palavra e a fazer surgir algo que não é repetível, particularmente sobre vidas e viagens à volta do vale do Tua – a temática central de observação. Esta estratégia não substitui de modo algum o visionamento do documentário vídeo que acom014  MAGER, Juliana Muylaert - Entre o olhar e a escuta: documentário e vídeo-história. XXVII Simpósio Nacional de História. “ Conhecimento Historico e diálogo social. Natal, 2013. Disponivel em http://www. snh2013.anpuh.org/resources/anais/27/1371069921_ARQUIVO_Texto_Anpuh2013JulianaMuylaert.pdf. Consultao em 25 de Novembro de 2015. 015  Ob cit.

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panha este livro e para o qual necessariamente se remete. Nesse vídeo. que retoma, selecionados e editados, curtos vídeo-clips produzidos em situação de entrevista / encontro, se mostra, pelo método biográfico e de histórias de vida, de que forma elementos fundamentais da história contemporânea do vale e linha do Tua, se mantêm presentes e vivos no pensamento das populações anónimas da região.

4.1. A linha do Tua: significado histórico e social Começamos por introduzir, apoiando-nos em Abade de Baçal, um dos maiores eruditos transmontanos, o contexto histórico e social dos primeiros tempos da linha do Tua016a par do profundo impacto económico-social e cultural que teve na região transmontana: “Compreende-se que, dada a carestia dos transportes, então nos pré--históricos carros-matos, o longo percurso de Romeu ao Pinhão, não consentia o preparo da cortiça em pranchas, de muito mais fácil venda nos países do Oriente Europeu e até nas Repúblicas da Prata, e por isso apenas rolhas se manufacturavam na fábrica. O rompimento da linha férrea do Tua a Mirandela, pronta para a circulação a 29 de Setembro de 1887, no que Clemente Menéres empregou grandes diligências, trouxe espíritos novos a esta indústria, e nesse mesmo ano a fábrica de rolhas de Jerusalém do Romeu foi mudada para o Porto para o extinto convento de Monchique, arrematado em 1872 por Clemente Menéres, onde perdura, se bem que em Mirandela mantém ainda uma fábrica de rolhas dos aparos das pranchas com vinte e quatro máquinas de quadrar cortiça, de fazer rolhas e de contar, 016  Mais conhecido por Abade de Baçal, o grande investigador, historiador e sábio Padre Francisco Manuel Alves, natural e pároco da aldeia de Baçal, Bragança, (1865-1947) refere-se nalguns volumes da sua monumental obra Memórias Arqueológico-Históricas do distrito de Bragança (1910 e anos subsequentes) à linha do Tua, referindo entre outras informações que foi diretor dos trabalhos da linha do Tua o eng. Manuel F. da Costa Serrão (Serrão, 1890). Nos motivos aduzidos para a sua construção assinala o transporte de adubos para o planalto mirandês e o escoamento de produções cerealíferas, à época, muito significativa (nota 137 a tomo IX, p.660-809). O troço da linha do Tua entre Mirandela e Bragança foi encerrado em 15.12.1991 e o de Foz Tua a Mirandela em 2007, com exceção do curto trajeto entre Cachão e a Escola Agrícola de Carvalhais que se manteve servido pelo metro urbano de Mirandela.

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que dá actividade a vinte famílias. As propriedades do Quadraçal têm vinte e três guardas florestais em diversos locais e compreendem passante de quinhentos mil sobreiros.017 (…) …a construção em 1903 do apeadeiro da Ribeirinha, na linha do Tua, obra de grande utilidade e importância para muitas povoações dos concelhos de Villa Flor e Mirandela… E que diremos do Caminho de Ferro de Bragança? Todos sabem que Abílio Beça votou a esse empreendimento as suas melhores energias e que no parlamento, na imprensa, em conversas particulares ou públicas, em gloriosa teimosia de fanático, calculando, combinando, aplanando, instando, reclamando, impondo-se, congraçando estes, interessando aqueles, preparou uma atmosfera de corrente favorável, vendo enfim coroada de bom êxito a fremente aspiração que por tantos anos o enlevará.” 018 Deixou ecos na região, até hoje, este pensamento pioneiro do governador civil bragançano Abílio Beça que se bateu pelo prolongamento da ferrovia entre Mirandela e Bragança, bem como a corrente de opinião encabeçada pelo Abade de Baçal, também favorável ao funcionamento da linha férrea do Tua, de relevante importância para o desenvolvimento agro-industrial de empreendimentos notáveis que destaca como o de Clemente Menéres, em Jerusalém do Romeu. Essa continuidade histórica torna-se visível e atualmente mais impactante em palavras e imagens que evocam aspetos da construção, inauguração, funcionamento e movimento da linha do Tua, melhoramento técnico e decisivo fator de progresso do interior rural transmontano, como pode ver-se na narrativa de um dos seus antigos ferroviários e passageiros, entrevista que se transcreve: 017  ALVES, Francisco Manuel (Abade de Baçal) - Memórias Arqueológico- Históricas do distrito de Bragança ( 1909-1947). Tomo II, p.478-479. O autor remete ainda para o tomo V desta sua obra onde desenvolve esta informação transcrita, nestes termos” No tomo V desta obra, ao tratar dos bragançanos ilustres, daremos completas notícias biográficas de Clemente Menéres, em razão das suas benemerências em prol da indústria e da instrução na nossa terra; bem como de seu filho, conselheiro Alfredo Menéres, que igualmente o merece pelos mesmos títulos e pela importante monografia sobre Carvalhais, em via de conclusão (1023). (Sobre a obra agrícola de Clemente Menéres, ver o largo e bem delineado artigo com lúcidas fotogravuras de João Inácio Pimentel, in Portugal Agrícola, Dezembro de 1902. 018  Ibidem, Tomo III p. 420 e Tomo VII p. 43-44.

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“[Q: Como se chama?] R: J.R. V. [Q: Em que ano nasceu?] JR: 12 de Agosto de 1936 em Mirandela [Q: Quando casou? Teve filhos? ] JR: Casei em 1959. Tive dois [Q: Qual foi a sua profissão?] JR: ferroviário [Q: Conte-me um bocadinho da sua história.] JR: Conto: Eu tive uma mocidade digna de mim, porque era um rapaz vivido, cheio de amor à terra, às pessoas e à vida e fui um moço como qualquer garoto que na pujança da vida tem tudo a seu favor. Fui um bom nadador no rio Tua. Fui para trolha, andei a trabalhar com um familiar meu para se ganhar alguma coisa. Fui no ano doloroso da última guerra mundial. Durante o período da guerra passei não com fome, mas com vontade de se comer mais. Até que esse conflito terminou, lancei-me para serralheiro de gripa que era e, depois, fui para a vida militar de 1957 a 1959. No princípio da vida militar, como andava de namorito, em Dezembro de 1959 casei. Depois, tive a oportunidade de ir para os caminhos-de-ferro, de fazer exame, colocaram-me em Campanhã, onde passei um tempo difícil, porque aquilo era duro, ganhava-se pouco, ficavam dois meses para a empesa e só ao cabo deste tempo se começava a receber. Claro que tive de vir a Mirandela buscar ajuda para a mulher fazer de comer. Tive sempre uma liberdade constante e gastava muito dinheiro em jornais, diário. E lia os jornais, porque nas carruagens ficavam sempre jornais que as pessoas ali deixavam ficar, no comboio de Lisboa para o Porto ficavam sempre jornais. Então, as mulheres da limpeza pegavam nos jornais e metiam-nos nos cacifos. Conheci aquela malta toda e todos os dias passei a ter acesso a esses jornais. [Q: Que fazia concretamente no seu trabalho na via ferroviária?] JR: Como ferroviário era soldador, trabalhava na oficina, mas, por vezes, acompanhava os comboios, porque havia as máquinas e o serralheiro ia com o eletricista ao encontro da máquina. Reparava-se a avaria e voltava-se à base. Tínhamos os descarrilamentos, porque às vezes os comboios descarrilavam, e como havia sempre um piquete na oficina, tinha que acompanhar o serviço de socorro e levava-se máquinas e punha-se os vagões na linha e tinha de se por de pé o comboio e recolocado na via. E aquilo levava muito tempo e a gente passava lá dois ou três dias, duas ou três noites para resolver os descarrilamentos. E assim fazíamos. Cá (Oficinas de Reparações da CP, em Mirandela) 111


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para além de trabalhar nos ferroviários, eu tinha o condão de serralheiro de lima que aproveita na oficina do André. Eu ia ali fazer horas das 5 da tarde, logo que saía da Oficina, até à meia-noite. Ganhava mais umas coroas. Qual a razão de procurar esse extra? É que o meu filho já andava a estudar e eu tinha de pagar os estudos. E andei assim uns anitos valentes, até que se juntou alguma coisa para o resto da nossa vida, pra ele tirar o curso. Hoje está formado, está bem na vida e assim vamos vivendo. [Q: Lembra-se da 1.ª vez que andou de comboio?] JR: isso foi por volta de 1947, altura em que acompanhei uma avó minha de Mirandela a Macedo de Cavaleiros. Eu ia todo encantado, debruçado na janela a ver a paisagem. O ar a bater na cara. Esta verdura, aquele monte, figueiras, nogueiras… Então, quando cheguei a Macedo de Cavaleiros, perguntei à minha avó: - Então, avó, quando voltamos a andar de comboio. - Ó filho, agora, só quando regressarmos a Mirandela – respondeu-me ela. [Q: Nessa viagem alguma vez sentiu medo?] JR: Sim, porque o trajecto de Mirandela ao Tua era muito acidentado. A linha estava muito pertinho ao rio e o comboio balançava muito e à mais pequenina coisa, pumba!, virava-se e caía para o rio. Nunca me aconteceu nada, mas ajudava a colocar o comboio na via e fui muitas vezes ao Tua. Mas, maquinistas, fogueiros e guarda-freios ficaram lá sepultados. E tínhamos de os retirar e aquilo metia dó. [Q: Como era o ambiente vivido no comboio?] JR: o ambiente era engraçado e mesmo o comboio a balouçar era engraçado. Uns cantavam, outros assobiavam, outros falavam muito. E então, quando chegava a altura da distância de uma terra à outra, havia quem levava aquelas merendas. E, depois, a gente comia a merenda deste e daquele. E, no nosso caso, como ferroviários, quando íamos para os descarrilamentos, havia um vagão que ainda hoje existe onde se fazia lá o comer para os ferroviários que iam dar apoio ao descarrilamento: uns trabalhavam e outros iam fazer o comer; outros serviam a comida, outros iam buscar água… Era bom, quando era no Verão. No inverno era mais aborrecido, porque caíam grandes nevões, de Mirandela para cima, para Bragança. Era o vento que se apanhava e era o frio. Mas, enfim… vivia-se bem… Então, quanto ao ambiente dos comboios era uma alegria. 112


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[Q: Falou-me que cantavam músicas. Que género de músicas cantavam?] JR: havia canções populares que as pessoas gostavam imenso de cantar. Mas o tempo voa e a memória esquece muitas coisas. Eram canções que a alma do nosso povo cantava e eu gostava de as ouvir. [Q: Tirando essa viagem com a sua avó, houve alguma viagem que o tivesse marcado?] JR: Uma vez, próximo de S.Lourenço, um comboio descarrilou. Mas, o maquinista ficou de tal modo entalado que ficou sem uma perna. E custou-me muito ver aquelas imagens e, então, aquela alegria que havia passa a tristeza. Enfim, há muitos casos que havia para lamentar… [Q: Qual era o destino da maior parte das viagens que o senhor realizou?] JR: Quanto ao serviço da CP, era Mirandela – Tua; Mirandela- Bragança; Bragança – Mirandela ou Tua – Mirandela. Quanto a viagens concretas (como passageiro), era para o Porto, para Lisboa… Enfim havia aquelas viagens memoráveis. Passava-se em estações que a gente não conhecia, tinha todo o ambiente de transporte e vivia-se aquele ambiente, longe que eu sei lá. [Q: Em que apeadeiros havia mais movimento?] JR: Mirandela, Romeu, Cachão, Frechas, entrava mais gente, porque havia mais artigos para levar para as estações para serem transportados para fora. [Q: Quais eram os produtos que eram transportados, na altura?] JR: eram as nozes, os figos, as castanhas, as batatas e todo o género comestível saído da terra. E, mais tarde, havia as célebres alheiras, começaram a ser transportadas de Mirandela para fora: para o Porto, para Lisboa, por aí fora… e a cortiça que enchia os vagões, bem atada com cordas… Enfim, era uma maravilha ver os comboios a apitar: pi-pi, e a gente a espreitar e a ver aqueles comboios carregadinhos de tudo. Vinham da Bragança para Mirandela; do Tua para Mirandela e traziam as coisas do Porto. Daqui para baixo iam para ser vendidos. [Q: Lembra-se do que se contava sobre o início da construção da linha o Tua?] JR: A construção, quando eu vim a este mundo já ela estava feita. Agora, a renovação já eu existia da primeira vez e da segunda vez, aqui há uns anitos, dá a impressão que limparam a cara à linha para fecharem o troço a meio. Mas sei lá, em 26 de Abril de 1883 foi aberto o concurso para a construção da linha férrea para a região transmontana, entre a estação do Tua, na linha do Douro, e a cidade de 113


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Bragança. O 1.º troço entre a estação do Tua e Mirandela, numa extensão de 54,100 km demorou cerca de dois (?) anos a construir e foi considerado um dos mais difíceis e também um dos mais notáveis trabalhos da arte ferroviária portuguesa. Foi inaugurado em 29 de Setembro de 1887 com a presença do ministro das obras públicas, Barjona de Freitas, e da família real, do rei D.Luís, D.Maria e os príncipes. [Q: Sente saudade dessas viagens?] JR: Sim, há sempre saudades. A paisagem da nossa célebre linha, que embora meta medo ver, é sempre majestosa de ver. O rio a correr tranquilo, outras vezes violento, quando era inverno, e na primavera e no verão eram as flores, era a verdura dos campos. Enfim, era saudável e eram viagens de sonho. [Q: Ia às feiras de comboio?] JR: Ia à feira das Cantarinhas em Bragança ou de outros produtos. Ia-se sempre às feiras, onde se juntava muita gente, quer em Mirandela, quer em Bragança ou em Macedo… [Q: Que produtos eram vendidos nas feiras?] JR: Tudo: gado, cabras, ovelhas, cavalos, burros, a feira funcionava junto ao rio, do lado da Nossa Senhora do Amparo. E na praça do mercado havia produtos hortícolas. A nossa praça aqui, mesma a antiga, era farta. Havia de tudo, não faltava nada. [Q: E os bilhetes eram muito caros?] JR: eu não posso dizer, porque quando saía com a família, pagava menos, quando fui para os caminhos-de-ferro tinha passe e não pagava nada, mas, na altura, quem pagava ficava-lhe daqui a Lisboa à volta de 220 escudos. [Q: Alguma vez teve de emigrar?] JR: Olhe, eu quis realmente emigrar, porque dava.me a impressão que ganhávamos pouco e começou a haver aquela abertura para o estrangeiro, para França, para a Suíça, para a Alemanha, e os outros rapazes da terra, quase tudo emigrou, e deu-me na cabeça de querer emigrar. Mas houve alguém que me sugeriu que podia emigrar, mas que não deixasse os caminhos-de-ferro. Que aguentasse mais alguns tempitos. Pois, por azar, nunca mais ninguém mais me falou no assuntou, nem eu me interessei por isso. [Q: tem algum familiar que tenha emigrado?] JR: tenho uma irmã que esteve 10 ou 15 anos em França. Tenho cunhados e compadres que estiveram na Suíça muito bem e uns cunhados que estão na Alemanha muito bem. Têm as suas casas e se estivessem aqui a trabalhar não se tinha nada. E não tiveram dificuldade em emigrar. 114


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[Q: Algum desses familiares teve dificuldade em emigrar?] JR: eu acho que não tiveram dificuldade. [Q: qual era o meio de transporte utilizado?] JR: O meio de transporte era a fuga, ou a pé, por aqui e por acolá, ou acompanhado por alguém que lhe ensinava o caminho e que os levava ao destino. Enfim, havia de tudo. Mais tarde, foram encaminhados pela camionagem e já tinham tudo. Quando tiveram autorização para passar as fronteiras. Mas a princípio tiveram muitas dificuldades e alguns até foram presos e foram repatriados, isto é, mandados para as suas terras. [Q: Participou na guerra de Angola?] JR: não. Tive vontade de ir, mas como já estava nos caminhos-de-ferro e tinha trabalho. Mas morreu lá muita mocidade. [Q: Lembra-se de festas que havia nessa altura?] JR: havia a grande romaria de N.ª Senhora do Amparo, o S. Pedro, o S. Paulo e o S. João, em Mirandela. havia em Valpaços que a gente ia lá de transporte terrestre, havia também em bragança que ainda hoje há. Alcançava o comboio e não pagava nada… A festa do Cabeço de N.ª Senhora da Assunção também é uma festa religiosa de se lhe torar o chapéu. E havia outras festinhas de família. [Q: Como era o ambiente do comboio, nessas alturas de festa?] JR: era um ambiente de festa. Quando se ia para a festa, havia aquela alegria e expressão transmontana de dizer: “vou para a festa!” Quando vinham da festa, vinham com aquela expressão e afirmavam: “olha, venho cansado, porque venho da festa.” Mas era sempre um ambiente saudável. [Q: Quais eram os assuntos mais relevantes de que se falava no comboio?] JR: sobre tudo o que se via e a nossa vista alcançava e era bonito: é bonita a paisagem! É bonito este rio! É bonita aquela cidade ou aquela vila! Eu também vim fazer as minhas compras e as vendas. Agora vou tratar do pessoal para as ceifas dos cereais, o trigo e o centeio, enfim, de toda a colheita que havia nessas alturas que era de admirar e de louvar. [Q: Tem alguma memória dessas viagens que queira partilhar?] JR: A viagem corria sempre bem quando viajei com a minha mulher. Um problema, quando um dia viajei com a minha mulher e com o meu filho de Lisboa, do Cartaxo para Mirandela. eu saio para ir à casa-de-banho 115


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e em cima de uma prateleira que tinha um produto para a gente lavar as mãos, estava uma bolsa de cabedal. Fechei a porta da casa de banho com o fecho, abri a bolsa que tinha documentos de um tipo da PIDE que estava a trabalhar para os lados de Castelo Branco e umas maçarocas bem boas em notas francesas, americanas, da África do Sul… Eu deixei lá o saco e fui dizer ao revisor o que tinha acontecido na casa de banho. Então, lá fomos os dois, tiramos aquilo e fomos ver dentro do comboio a quem pertencia aquilo. Nas carruagens havia alguns guardas a guardar e fomos a uma das carruagens aonde iam as autoridades. O revisor falou-lhes no assunto, eles abriram a bolsa, vimos aquelas notas e eles reconheceram o dono a quem pertencia a tal bolsa. Correram a carruagem e chamaram o indivíduo e ele já estava na casa de banho a saber da bolsa. Disseram-lhe que fui eu a encontra-la e ele disse.me: olhe, a quantia que está aqui dava bem para fazer uma casa. Uma pessoa se ficasse com aquilo e fosse descoberta era logo preso e ia para a rua. Foi um acontecimento digno de realce, da minha parte… Quanto a momentos mais trágicos, foi ajudar pessoas que tiveram, por qualquer circunstância, um pequeno problema no comboio, de Mirandela ao Tua, que havia descarrilamentos e socorria-se as pessoas que ficavam traumatizadas da memória. E são acontecimentos que marcam a vida de uma pessoa. [Q: Terminamos aqui a entrevista. Muito obrigada pelas informações que me transmitiu]” (Entrevª / JRV – 12º Ano – A, nº18-Esc. Sec Mirandela). É possível concluir que a linha do Tua se configurou histórica e socialmente como uma rede tecnológica que permitiu salvaguardar a biodiversidade, as culturas autóctones e a beleza das paisagens da região, ainda hoje observáveis. Assim, parece não ter constituído uma verdadeira ameaça à natureza-cultura, como atualmente acontece com a propagação das redes tecnológicas, mesmo quando as suas máquinas antigas a lenha e carvão provocavam incêndios ocasionais nas matas das encostas. Pode ainda afirmar-se que a história mais que centenária da linha do Tua permitiu revelar o que a natureza sempre foi para os homens: um artefacto do

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seu modo de vida e um recurso indispensável à preservação da sua existência.019

4.2. Viagens de comboio, percursos e motivações Este tema que foi já bastante evocado, e se interrelaciona diretamente com a história da linha do Tua, em especial a sua última etapa, de desmantelamento parcial e encerramento, é aqui retomado, designadamente à luz do declínio e quase desaparecimento destas viagens de saudade repetida pelo vale do Tua, “ecossistema único… praticamente virgem”, rés ao rio, ora “caudaloso” ora “rodeado de uma paisagem extraordinária”, que se podem escalonar entre dois extremos. Encerramento da linha e desaparecimento dessas viagens de comboio – “relógio e encontro de pessoas” - são, por fim, objeto de denúncia pública, em justeza e justiça social, evidente no seguinte depoimento de um neto de ferroviário, chefe da pequena estação da Brunheda (CA), onde se deixa ainda entrever uma história de vida de “chamamento às origens”: [Q: Como se chama, quando nasceu e onde vive?] MC – Nasci em 1948 e neste momento, vivo na cidade do Porto e já vivi na Brunheda. [Q: pode-nos contar a sua primeira e última viagem de comboio, se faz o favor?] MC: eu teria, talvez, quatro anos. Vim do Porto para a Brunheda e recordo-me que o comboio vinha completamente cheio. Vinha acompanhado por uma tia minha que vinha para a Brunheda também na altura. Foi muito difícil a viagem, porque foi muito demorada e, ao mesmo tempo, sem grandes condições. Recordo-me que vim todo o caminho sentado em sacos de batatas. Isto na linha do Douro. Depois, mudámos na estação do Tua para a linha do Tua e o comboio a vapor era bastante interessante. A linha era extremamente bonita, era o chamado belo, horrível” e o comboio também vinha completamente cheio. Além das batatas, ainda vinham galinhas lá, juntamente connosco. Não havia grandes condições, mas o que é certo é que vínhamos e o comboio vinha completamente cheio. A viagem, por uma lado foi agradável, mas era difícil de se fazer… A minha última viagem foi, talvez, em 2007, já no Metro, antes de ter encerrado. E foi da Brunheda até 019  RHEINBERGER, H.-J – Itérations, ob. cit., 51

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ao Tua. Embora o Metro fosse cheio, já não completamente com pessoas locais, mas com pessoas que vinham passear e que gostavam da linha…. Recordo-me de ter chegado ao Tua e de estar lá imensa gente que queria vir até Mirandela, mas que não coube num só metro e teve de ficar lá. Isto em 2007. [Q: Que lembranças tem sobre o vale do Tua daqueles tempos?] MC: Eu gostava de voltar um bocadinho atrás e de recordar que o meu avô materno foi um dos primeiros chefes da estação da Brunheda. Brunheda era uma estação de 1.ª classe, atendendo ao movimento e às condições que tinha. Além da estação, tinha um armazém, cais, posto de correio, tinha o chefe, os ajudantes, os carregadores… tinha muita gente… Recordo-me da estação da Brunheda, quando tinha eu 10 anos, em que viviam praticamente cerca de 40 pessoas, só mesmo ali na estação… Nesta estação, todo o trânsito do vinho do Porto, de outras mercadorias, do azeite, batatas, - havia ali as grandes quintas da Ferreirinha e outras - era feito em pipas para o Porto. Os comboios que vinham de baixo traziam as mercadorias, principalmente o sal, o arroz, as massas, tudo aquilo que não era produzido em Trás-os-Montes. E traziam sempre muita gente… As recordações que eu tenho foram sempre absolutamente agradáveis, quer do rio, quer da linha, quer das pessoas. O comboio para nós era praticamente, além de um relógio, porque quando vinha aquele comboio sabíamos as horas que eram. O comboio trazia pessoas, o comboio trazia uma vida e o comboio, ao fim e ao cabo, juntava as pessoas, o que era extremamente agradável… Quanto ao rio, o rio também, embora bastante caudaloso, em determinadas alturas, mas era rodeado de uma paisagem extraordinária e de um ecossistema único. Quem conhece bem aquele vale, principalmente da Brunheda para baixo, pode verificar que é um dos vales talvez mais bonitos do Mundo. Um vale praticamente virgem… As recordações que eu tenho são sempre agradáveis quer da maneira como fui sempre tratado na Brunheda, estação, quer da maneira como o comboio e o rio fizeram parte do meu crescimento e do meu desenvolvimento e do meu chamamento às origens. [Q: naquela época, que tipo de agricultura era praticado?] MC: Nas margens do Tua, estou a falar mais daquela parte da Brunheda para baixo, era mais uma pequena agricultura da horta, de subsistên118


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cia, e, depois, o olival, as vinhas, (o vinho foi sempre o grande motor do desenvolvimento desta região), a amêndoa e alguns frutos, nomeadamente as laranjas. [Q: Pelo entusiasmo com que fala sobre a linha, qual a importância que ela teve para o desenvolvimento de Trás-os-Montes?] MC: Essa é uma pergunta fundamental a fazer sobre a linha. Porque é que a linha foi construída? Recordo que estávamos ainda no século XIX, em finais deste século, 1880, em que havia grande dificuldade para as pessoas chegarem dos grandes centros até Trás-os-Montes, quer por Mirandela, quer por Macedo, quer a Bragança. Ainda se vinha por diligência. Esta era uma zona extremamente importante e extremamente rica também, e com pessoas com uma grande dedicação à terra, uma grande dedicação a Trás-os-Montes. Tudo fizeram para que o caminho-de-ferro, que estava numa fase inicial da sua implementação em Portugal (a linha do Douro já chegava até ao Tua), tudo fizeram para que fosse construída uma linha desde o Tua até Bragança. Pessoas extremamente importantes neste processo, como a Câmara Municipal de Mirandela, o comendador Abílio Bessa que foi, na altura, governador civil de Bragança, e o próprio Clemente Menéres que tinha ficado rendido nas coisas desta região e na sua produção, quer de vinho, quer da cortiça e do próprio azeite. Foram então envidados uns certos esforços e, finalmente, o rei acedeu a que fosse construída a linha… Para verificarem a capacidade das pessoas e dos transmontanos, em termos de realização de grandes obras como esta, a linha foi começada a ser construída no ano de 1885 e em 1887 a linha chegava do Tua até Mirandela. Quer dizer, em dois ou três anos foi construído o troço mais difícil de toda a linha do Tua. Este troço, podemos referir, que tinha 54 km, e nele foram construídos 7 túneis, 3 viadutos, 5 pontes, 15 estações, numa zona extremamente difícil. As pessoas realizaram o trabalho à mão, com pás e picaretas e a dinamite. As pessoas eram largadas por cordas de cerca de 100 metros, faziam os buracos na rocha e punham a dinamite e, depois, eram puxadas. E foi assim que a linha foi construída até Mirandela… Depois, após algumas peripécias, a linha chegou a Bragança… O desenvolvimento foi realmente grande para toda esta região, porque tudo aquilo que podia ser transportado para as outras zonas do 119


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país, passou a ser exportado. Mas eram imensas estações de caminhode-ferro com pessoas, pois nessas estações existia o chefe, o subchefe, os filhos do chefe, os carregadores,… quer dizer, cada estação era praticamente uma cidade, pois vieram muitas pessoas que levaram o desenvolvimento, na época, a toda esta região. Estes comboios transportavam tudo aquilo que eram bens de produção de Trás-os-Montes, nos chamados despachos, e traziam o correio. A grande maioria das estações tinha o seu posto de correio onde, depois, as pessoas iam entregar as cartas, a correspondência que o comboio transportava. Daí toda a importância da linha nesta zona ribeirinha, assim como no desenvolvimento de Trás-os-Montes. A partir de uma determinada altura, a pouco e pouco os horários dos comboios começaram a andar desencontrados. Era importante que as pessoas chegassem a Bragança, principalmente os estudantes, a tempo de irem para os seus empregos e estes de irem para as aulas. Que os comboios permitissem que as pessoas chegassem ao Tua a tempo de apanhar os comboios que iam para o Porto ou para Barca d’ Alva, na altura. E tudo isto começou a andar desfasado. Cada vez havia menos pessoas, cada vez havia também menos possibilidades de transportar coisas nos comboios, terminaram com o correio, terminaram com os despachos. E, a pouco e pouco, as pessoas foram diminuindo. À medida que as pessoas foram diminuindo no transporte ferroviário, foram também justificando o declínio da própria linha com a diminuição do número de pessoas. Terá sido o n.º de pessoas que levou ao declínio do comboio ou terá sido o declínio do comboio que levou à diminuição do n.º de pessoas? É uma questão que eu coloco e deixo em aberto e à consideração de cada um. O que é certo é que chegados a esta fase, gostaria de recordar que em 1991 é encerrado o troço entre Mirandela e Macedo de Cavaleiros, duas cidades extremamente importantes transmontanas que ficaram sem o comboio. E em finais de 1991, é encerrada a linha do Tua de Bragança para Mirandela. Os transmontanos reagiram, sequestraram os autocarros e fizeram uma série de manifestações pela defesa do seu comboio. Foi-lhes prometido que a linha do Tua não encerraria, pelos principais responsáveis deste país, mesmo o presidente da república, ao então primeiro-ministro, tudo isto está documentado. Mas, apesar des120


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sas promessas todas, no dia 14 de Outubro de 1992, as carruagens, as máquinas, pela calada da noite, são roubadas da estação de Bragança e são transportadas em camiões, não se sabia muito bem para onde. O troço entre Mirandela e o Tua, funcionou até que se pensou em encerrar esta linha. Houve depois vários acidentes e, curiosamente, a linha do Tua nunca tinha tido qualquer acidente praticamente nos seus 120 anos de existência e em três ou 4 anos teve 4 acidentes. Razões, não sou eu que as vou transmitir. Entretanto, em 2008, a situação da linha do Tua é suspensa, depois do último acidente, e é encerrada de acordo com o Plano Estratégico dos Transportes executado para os anos de 2011 a 2015. Com a futura barragem de Foz Tua, 16 km de linha férrea ficam submersos e fica cortada assim a possibilidade de ligação efectiva à rede ferroviária nacional. Se isto trouxe desenvolvimento ou não, não sei. Gostaria de terminar com estes números que podem significar alguma coisa para algumas pessoas: em 1991, circulavam na linha do Tua cerca de 180 mil pessoas e mais recentemente ainda circulavam cerca de 50 mil e neste momento não circula nenhuma. Já agora perguntava se, neste momento, com o encerramento total da linha do Tua as pessoas consideram que há maior desenvolvimento em Trás-os-Montes, há maior desenvolvimento no Tua, há maior desenvolvimento em Mirandela, há maior desenvolvimento em Macedo ou há maior desenvolvimento em Bragança. Se as pessoas se sentem mais felizes e satisfeitas com o desenvolvimento das suas terras.” (Entrevª MR / MC – 10ºano B- GPSI nº 28, esc. Sec Mirandela). Este testemunho descritivo, civicamente reflexivo e crítico, dá conta da rutura e controvérsia suscitadas pelo encerramento da linha Férrea e pelo fim das viagens de comboio de múltiplas motivações e variados trajetos, recordadas com saudosismo nostálgico. Nessa medida, interpela e interpela-nos numa retórica, só aparentemente dubitativa, sobre o que se poderá entender por desenvolvimento local futuro desta região do vale do Tua, cuja vitalidade endógena e exógena, se foi vendo sustida e denunciada.

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5.3. Migrações e Emigração Volta-se ainda e sempre à preservação de traços. Traços de fenómenos e acontecimentos históricos, movimentos incessantes das populações que enraízam as paisagens locais na história dos homens e, mutatis mutandis, ancoram sempre esses atos e seus protagonistas, no ambiente natural-cultural local e regional. As migrações internas pendulares de mão-de-obra excedente sobretudo agrícola, com a procura de melhoria de vida num horizonte de melhores ofertas de trabalho, sempre se processaram na região, em todas as direções, no interior, de dentro para fora e vice-versa. O depoimento indicia claramente esse fenómeno e facetas da história de vida de um dos seus protagonistas, padeiro de profissão com acentuada vocação músical. [(N): Bom dia, senhor Fernando. Meu nome é Nicola. Sou aluno da Esproarte / Escola Profissional de Artes de Mirandela. Frequento o Curso de Cordas do 10.º ano – violoncelo.] (F): E eu toco concertina. (…) [Q: Gostaria de começar a nossa conversas perguntando-lhe que profissão exerceu ou exerce ainda hoje.] F: a última que exerci foi a de padeiro, tinha a padaria e agora estou reformado. Estou reformado por invalidez vai para dezassete anos. Estou reformado desde 65 ou 66. [Q: Cresceu aqui em Martim, desde sempre?]F: Sim, embora tivesse saído para outros trabalhos. [Q: tem recordações de algumas práticas sociais ou culturais que incluíssem a música, neste local?] F: Se havia cá música? [Q: Sim, se havia cá arraiais, festivais, tipo missas, trabalhos agrícolas como as colheitas…] F: antigamente era o realejo, ou uma viola, 4 latas a bater e fazia-se aí um bailarico com as raparigas. Ou um giradiscos que os houve aí. E houve agora o modernismo dos instrumentos músicais, dos conjuntos, grupos e essa coisa toda. [Q: Mas, o senhor tocava?] F: não. Eu comecei a aprender a tocar concertina com 62 anos, junto do indivíduo que dá aulas. Mas aprendi de ouvido, não foi por música. [Q: Em relação à linha do Tua, alguma vez utilizou o comboio para viajar?] F: Comecei a utilizar o comboio em 1965 / 66 ia já para as ceifas do centeio, do trigo, por aí para cima, até Macedo, Bragança, Miranda do Douro, por aí. E outras, pois ainda estive a trabalhar nas Minas da Panasqueira. Outras, fazia-as da Brunheda para a Régua e 122


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na Régua apanhava outra ligação. E a última que fiz, foi talvez o despedir do comboio, pois mais pouco tempo durou, foi quando parto para a guerra do ultramar. Fui entrar na Brunheda e daí parti. [Q: O senhor utilizava o comboio de mês a mês ou todas as semanas?] F: Não. No tempo das ceifas, era uma vez para cima e outra para baixo. E passava um mês por lá. E para baixo era quando vinha cá em algumas saídas. Utilizava o comboio em serviço, em trabalhos. (…) [Q: tem recordações dessa viagem?] F: Tenho. Essas viagens aqui do comboio eram bonitas e divertidas, porque as paisagens eram bonitas e continuam a ser. É preciso é cultiva-las e tratar destas lindas paisagens que nós temos. Agora, pelos vistos, querem afogar a linha, pois o comboio já está encerrado. Já o afundaram… [Q: e tem fotografias?] F: não, porque as fotografias não se usavam no meu tempo e os dinheiros não davam para mais. (…) [Q: As viagens demoravam muito tempo. Então, como é que as pessoas ocupavam o tempo?] F: sentados e a conversar uns com os outros. Cada um tinha a sua conversa. Uns clamavam a vida que tinham. Já se sabe que nesse tempo era como era. (…) ( Entrevª N. e G / F.M - MIRES 10º. V. 08 EsProarte - Esc.Prof.M.M.) Facilitado também pelas possibilidades de deslocação abertas pela linha do Tua, foi igualmente o fenómeno da intensa emigração, legal ou clandestina, de milhares de indivíduos e famílias inteiras transmontanas, que ocorreu em diferentes períodos, sobretudo desde 1900 a 1975, e nas mais variadas direções. Para além de outros destinos, como os EUA, o Canadá, a África do Sul, a Rodésia ou a Suíça, dirigiam-se sobretudo a países industrializados da Europa, como a França, a Alemanha e a Inglaterra. Estes três últimos, mais afetados pela II Guerra Mundial, procuravam desde a década de 1950, reconstruir as suas economias, necessitando para isso de muita mão-de-obra. Tal situação atraiu fortemente a população portuguesa sobretudo a do norte do país, mais densamente povoado e menos desenvolvido, até pouco depois de 1973, ano a partir do qual a Europa entrou, com a subida vertiginosa do preço do petróleo, numa grave crise económica e aumento de desemprego, que se prolongou até à década 1980. Esse novo ciclo de emigração para a Europa dos anos 1960 e inícios dos anos 1970 que foi também intensamente protagonizado pelas populações da 123


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região do vale do Tua, aqui continua a ser ainda hoje vivenciado de múltiplas formas como se depreende de numerosas histórias de vida registadas. Porém, já anteriormente, entre 1900 e 1950, mas com uma redução drástica nos anos 1930, se havia feito sentir também nesta região transmontana um outro grande fluxo de emigrantes, ciclo transatlântico, em direção sobretudo às Américas (Brasil e EUA) com matizes diferentes do que caracterizou o do ciclo europeu subsequente. Dele se conservam ainda traços e memórias, mas, naturalmente, hoje, com mais débil expressão e menor predominância nas narrativas recolhidas onde são constantes as menções a diferentes modalidades de emigração para a Europa, como a que aqui se deixa ilustrada. [Q.: -Estamos aqui a entrevistar o senhor…] JJM: -JJM vivo em Campelos, conheço a linha do Tua e a do Douro, de Porto a Barca D’Alva. Fui diversas vezes ao estrangeiro onde passava por Salamanca e pela linha do Douro e do Tua. Também fui diversas vezes ao Cachão, conhecia um bocadinho de tudo. Cruzei-me com soldados, discutíamos diversas coisas. [Q: Muito bem…] JJM: Estou com setenta e sete anos, nasci em 1937, já com 77 anos feitos. [Q: Portanto, já viajou muitas vezes através da linha do Tua. Descreva o comboio da altura, como era o comboio?] JJM: O comboio não era tão sofisticado como agora, os comboios são agora mais sofisticados e mais modernos. Antigamente não havia aquecimento como há hoje. A gente passava muito frio, é diferente da vida de agora. (…) Histórias da Vida há diversas. As coisas mais marcantes que eu tive foi o trabalho, passei a vida a trabalhar, agricultura. Andei sempre com a palha à cinta, quer dizer que andei por muitos lados. No trabalho não havia apoio do Estado. Não havia quem nos ajudasse. O trabalho era perdido (não valia a pena, pois o que se recebia não era proporcional ao esforço e trabalho). Ficávamos à espera do ano seguinte, que fosse melhor. [Q: Sabendo que emigrou, há algo que possa dizer sobre esse tempo?] JJM: Posso dizer um bocadinho. Eu emigrei clandestinamente, a assalto como os coelhos, fui oito dias em viagem para França, por camiões, a pé, passei por muros, pontes, ribeiros… Cheguei a França por comboio. De Espanha até Hendaia (fronteira). E daí até ao meu des124


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tino. Fui trabalhar para uma casa de materiais de construção, blocos, tijolos, foi um bocado duro. Foi um momento muito marcante na minha vida. (…) (Entrevª MM / JM, 10º Ano – A nº11, Esc. EB 2-3 / S C.A.) Este relato refere explicitamente a emigração clandestina ou “a salto”, facto social de muitas repercussões na economia e sociedade do nosso país e com grande incidência nas regiões de Trás-os-Montes, Minho e Beiras. Tratava-se, como se percebe pela descrição, da saída do país de quem ia trabalhar para o estrangeiro sem passaporte de emigrante, atravessando a fronteira mediante o pagamento de um valor em dinheiro a redes de passadores. Embora já viesse em crescendo desde o início dos anos 1950, mas sobretudo a partir de 1957, verificou-se com maior intensidade de 1961 em diante, em particular para França, onde as autoridades facilitavam a entrada e a legalização dos portugueses. A sucessão de fluxos migratórios ao longo do último século é também uma recorrência histórica no vale do Tua. Afetou um grande número de indivíduos e famílias e interferiu consideravelmente na sua vida económico-social e cultural, como se pode depreender da seguinte entrevista. [Q: Boa tarde. Podia dizer-me o seu nome e idade?] MAS… tenho 84 anos. [Q: Sempre viveu aqui, na aldeia da Brunheda?] MAS: Não. Já estive na Alemanha, já estive na África a trabalhar e corri mais uns países, já não me lembra bem. [Q: O senhor foi pastor?] MAS: Fui. Já se passou. [Q: Mas foi pastor durante alguns anos, na sua infância?] MAS: Quando era mais novo trabalhava no campo. [Q: Quantos irmãos tinha, senhor M.?] MAS: Agora já não me lembro bem. Parece-me que nós éramos 12, pai e mãe. [Q: E foi à escola?] MAS: Andei até à 3:ª. A 4.ª não a fiz, porque não podia deixar de trabalhar por causa dos meus irmãos. Éramos muitos. (…) [Q: Quando foi pastor, dormiu algumas vezes fora de casa?] MAS: No terreno? Muita vez. Em casa dormi muito pouco, porque o meu pai não nos queria lá, por causa da cria. Porque a cria está melhor ao ar 125


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livre e não criam tantas doenças. O gado e mesmo as cabras. [Q: Lembra-se de haver aqui na Brunheda minas de volfrâmio?] MAS: Vê lá em cima, por cima daquele pinheiro mais cerrado, havia lá minas. No princípio, havia minas como daqui para além e havia lá quase toda a qualidade de minério. Era o volfrâmio, era o estanho, ferro, e mais coisas. E havia sujidade que era a frita (contrafacção de minérios através de certãs ao lume) sénica (arsénico), [Q: Quem explorava essas minas?] MAS: Pessoas que vinham de fora alugavam o terreno e tiravam o minério. E pagavam aos donos do terreno, portanto era ao meu pai. E outras vezes era de meias. [Q: O trabalho nas minas era muito duro?]MAS: oh! Se era muito duro! Era duro de toda a maneira. A gente não está à vontade e depois a pedra é muito dura, mesmo muito dura. E, depois, quase só a fogo. E depois de muito trabalhado. [Q: E quanto é que pagavam? Era ao dia ou à hora?] MAS: Não, o que tiravam era de meias, metade para mim e metade para eles. Naquela altura já se vendia o minério a 60 escudos e mais o kg. Foi no tempo que andou a Guerra. Eu fui para a Alemanha com uma contrata, quando foi das emigrações, aqui há uns anitos atrás. E havia uma dúzia de casas, onde se iam a recolher, aonde tinham as camas, onde comiam, bebiam. À frente, havia a espécie de uma cuba, alta e forte, de alumínio. Eu quis saber o que era aquilo e o que mandava em nós respondeu: aquilo é do alumínio, mas aquilo não era de alumínio, era de aço ou sei lá... E havia uma casa, rés-do-chão, onde de vez em quando ia lá um carro ou dois, ou eram engenheiros e levantavam o zinco e punham-se a espreitar por cima. Parecia uma cuba inox que era onde derretiam o material. Ao pé de mim, estava lá um cabo onde tinham cortado o cabo da corrente que era grosso. Aquilo metia-me confusão. Eles diziam que era uma fábrica de alumínio, mas não era. Eu pus-me a espreitar por cima e vi umas caixas. Ora eu sabia os dias em que eles lá iam, três vezes por semana. Um dia ponho-me a espreitar por cima e vi que havia umas caixas que deviam ter alguma coisa. Então, fui por baixo, aquilo tinha uma fechadura velha, e não consegui ver. Por cima, levanto aqueles zincos, se calhar do princípio do minério, a parede era feita em lousa, subo e vou ver. Era estanho, volfrâmio e mais coisas e havia lá 126


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umas cervejitas. Eu tinha tanta sede. Eu bem via que eles bebiam, pois demoravam-se muito tempo. Lá entrei e bebi cerveja e parei pois eles podiam dar conta. Ainda estive na Alemanha 6 meses e meio. [Q: Porque é que deixaram de explorar estas minas?] MAS: Porque no tempo da guerra dava muito dinheiro, porque precisavam do material. Depois, deixaram de as explorar porque também parou a guerra. E deixaram de explorar, porque já não precisavam. [Q: Na altura da sua infância, havia muito contrabando de vinho e azeite?] MAS: Havia. Às vezes da Brunheda e de muitos lados levavam o azeite numas burras, nuns odres que era de quando matavam aqueles chibos grandes. Depois, tinham cuidado e só lhe abriam um rasgãozito. Depois, limpavam-no por dentro e ficava aquilo à moda de um saco. Depois cosia-se bem cosido aquilo e do lado do pescoço lá ficava aquele buraquito. Enchia-se de azeite. O resto já estava cosido. Apertava-se aquilo com um baraço ou dois e lá ia aquilo para o Tua. De Brunheda a S.Lourenço e, depois, lá iam. Os chibos já tinham idade, eram duros e curtiam-nos, era bem cosidinho com linha sapateira, apertava-se muito bem apertado do lado onde tinham o pescoço e carregavam-se dois ou três em cima de uma burra boa. Nós chegamos a ter mulas e machos, mas as mulas eram muito más. Às vezes já estavam carreadas, atiravam uma parelha de coices e atiravam com a carga ao chão. [Q: Ainda se lembra, quando emigrou para Angola?] MAS: Lembro e lembro-me daquelas mocinhas novas. Quando as apanhava assim e elas gostavam do branco e eu não desgostava das pretas… Passamos tempos bons (…) [Q: Havia muita emigração. Ia muita gente para fora, naquela altura?] MAS: Primeiro era para a África…, eu emigrei para a Alemanha… [Q: Foi para Angola antes ou depois de casar?] MAS: Fui antes de casar e numa altura boa. Se estivesse casado, já ela não me deixava ir assim à vontade. E depois eu lá lhe mandei uma procuração para casar. E lá está… [Q: Porque é que optou por ir para Angola?] MAS: Outros também iam e sempre era outra vida. Cá em Portugal o que é que tinham? Fui para Angola com um contrato. Davam-nos um terreno não sei com que área. Davam-nos aquilo, marcavam, punham-nos lá a água e nós fabricávamos… 127


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[Q: E como eram esses tempos em Angola?] MAS: Era bom. Só que viam-se mais pretas do que brancas… [Q: E porque regressou à Brunheda?] MAS: Regressei por causa da guerra. Angola foi entregue, porque fomos obrigados, nós os brancos, e os engenheiros disseram-nos: vocês safem-se. Pagaram-nos também a viagem para cá (…) [Q: Qual é a importância do rio Tua para a Brunheda?] MAS: O rio faz falta à Brunheda. Dantes, tínhamos aqui comboio. Tínhamos ligações para Mirandela sem custar nada. E, agora? A gente ia e vinha e agora já não dá para, nem para vir… [Q: também foi pescador. Pode-nos contar alguma história das suas pescarias?] MAS: Ali em baixo, numa noite, matei cerca de 50 quilos de peixe. Vê aquele larguinho lá em baixo? E vê a água? (aponta para o rio), foi lá. Está lá uma fraga grande, mas aquilo é muito fundo e vi-me lá à rasca. Numa altura, fui lá eu e outro que ainda era mais maluco do que eu. Ele é que me seduziu e me disse: vamos, vamos à fraga de (…) que há lá muito peixe e grande. Eu disse-lhe que tinha medo aquilo, porque aquilo era muito fundo. Lá viemos. Saltei para o rio e o peixe começou a juntar-se no fundo. Um mineiro tinha-me dado um bocadito de dinamite (eu não devia dizer isto, porque daqui a pouco sou preso e não posso negar e a culpa é do meu primo)… Deitei lá a bomba. [Q: Sabe onde se encontra a locomotiva…?] MAS: Ali na tal caseta (apeadeiro), por baixo da Brunheda, o comboio que vinha de Bragança carregado de centeio, chega ali e descarrilou. Ainda uma porrada de sacas até à beira do rio. A Companhia ainda recuperou alguns. Ainda tiraram dois vagões, parece-me que eram três, e um ficou lá no fundo, no rio. E os outros dois lá os tiraram com um guindaste. Mas eu não sabia de nada. Eu tenho um cunhado, irmão da minha mulher, que, às vezes, não tem nada de bom. Também é atraganado e parece que nem é família de jeito. Numa altura disse-me para virmos para aqui aos peixes, lá vamos ali ao p´ra baixo, mas eu não sabia a ideia dele. E diz ele assim: - Ó senhor Manuel, vamos ali para baixo que há lá um sítio bom. O peixe estava a picar de um lado e do outro e atirei a bomba no sítio em que os peixes picavam mais. Eu não sabia eu estava lá o vagão. Mas ele já se não despiu. Ele disse-me: - Ó compadre, tem tempo de os tirar, porque aí há muito peixe e se lá ficar algum, há-de chegar bem 128


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para nós. E se vier outros por trás, ainda vai chegar para ele. Eu lá me deitei, mas ele não se despiu. Quando, às tantas, eu mergulhei e lá ia para um sítio que estava cheio da ferrugem do vagão. Olho para o lado do direito e vejo as janelas. Então é que eu tremi. E vi que estava dentro do vagão. Vim para trás para não me atrapalhar, com jeitinho, eu era capaz de lá ficar e de não dar com a entrada do vagão. Entrar, entrei, agora sair? E, então, lá saí. (…) deu-me a ideia de lhe dar… [Q: ficou triste, quando soube que vinha a barragem e a linha do Tua deixava de funcionar?] MAS: Não, porque para mim já não tem importância nenhuma. [Q: Mas acha que afectou aqui a população, Brunheda e arredores?] MAS: Não. Já estavam a contar… [Q: conhece alguma lenda sobre o rio Tua?] MAS: Não… Mas se lhes fosse a contar sobre as minas ou sobre o rio não saíamos daqui… (Entrevª Y / MAS - Esc.Profis. C.A.) Este testemunho, que curiosamente termina relevando os recursos naturais da região, transcreveu-se quase na íntegra, dada a vivacidade da própria linguagem émica usada e a natureza concreta e descritiva de múltiplas pistas de ancoragem histórica nos contextos espácio-temporais em que decorreu a trajetória biográfica do informante. Apresenta ainda a particularidade de desvendar nexos importantes na diacronia da história local entre a exploração do volfrâmio na época da II Guerra Mundial e a posterior emigração para a Alemanha. Faz também alusão à relação histórica com colónias portuguesas em África, quer pela via da emigração, em sistema de colonato, quer pela alusão à Guerra Colonial.

4.4. Memórias da Guerra Colonial Portuguesa em África Pela linha do Tua passaram ao longo dos anos milhares de soldados transmontanos. Desde as várias gerações que foram cumprir o serviço militar obrigatório nos quartéis espalhados por todo o território nacional, até às centenas de incorporados que partiram, muitos deles sem regresso, para participarem na I Guerra Mundial (1914-18). Mas o maior número fica do lado dos que foram obrigados a combater na Guerra Colonial em África, que o governo ditatorial 129


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português aí manteve durante 13 anos (1961-1974) contra os movimentos de libertação e independência do domínio colonial, dos povos de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.020 São acontecimentos de períodos dolorosos e inquietantes da vida de todas as localidades do país que nunca serão esquecidos e que deixaram muitas marcas históricas, memórias e feridas físicas, psicológicas e culturais que perduram vivas e ainda bastante sentidas nas populações e em quase todas as famílias desta região do vale do Tua e seu imaginário individual, familiar e coletivo, como em Portugal inteiro e nos novos países africanos. Transcrevem-se dois relatos impressivos, selecionados entre muitos outros, registados por ex-militares naturais do vale do Tua, sobre a Guerra Colonial. Testemunho 1: [(…) Q: Fez serviço militar?] F: fiz serviço militar e fui para a guerra para Moçambique. Entrei para a tropa em 1968 e parti dia 4 de Janeiro de 1969 para Moçambique. Depois, estive lá quase 10 anos. Acabei a vida militar porque fiquei ferido por uma bomba e fiquei no hospital, quando a companhia veio embora. Depois, fiquei lá na vida civil. Vim em 1977. [Q: usou o comboio para ir para lá, certo?] F: Sim, sim. (…) [Q: tem alguma memória de alguma experiência caricata, engraçada, que queira contar, que se tenha passado numa viagem?] F: sim. Quando parti da Brunheda, foi a minha mulher, que tínhamos casado há pouco tempo, e um irmão meu, tocávamos o macho pois era pianinha, a pé andante, até lá para me levar a mala. E era a despedida para o Ultramar. E lá estávamos no cochichinho, a conversar, nisto o gaijo deu dois berros, o comboio, aproximou-se e começou toda a gente a entrar à pressa. Ela ficou assim a olhar: já te vais embora e eu fico cá. Eu parti e ela ficou. Essa história foi um bocadito triste. Uma despida, vá. [Q: o ambiente no comboio era sempre animado?] F: Em geral as viagens que eu fazia eram animadas. No tempo das ceifas, era o próprio pessoal que cantava e fazíamos as nossas palhaçadas. 020  A partir de fontes do Estado-Maior das Forças Armadas pode contabilizar-se que morreram na Guerra Colonial em África 8831 militares portugueses. Estima-se que houve cerca de 30.000 feridos evacuados, mais de 100.000 doentes e feridos, dos quais resultaram perto de 14.000 deficientes físicos, e aproximadamente 140.000 afetados por outras doenças, designadamente síndrome de stress pós- traumático.

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[Q: Conhece alguma canção ou alguma ladainha?] F: tínhamos algumas cantigas que se cantavam no Rancho Folclórico que se formou aqui em Martim. Algumas, até as tenho aí. Mas eu a cantar sou fraco, Nas as sei assim de cor, mas a minha mulher pode-me chegar o livro com as letras, o meu caderno diário da minha vida. Tenho muitos versos, muitas quadras. (a esposa chegou-lhe o caderno e acrescentou) Ela canta melhor que eu que sou um parolo a cantar. (cantou: A Pomba caiu ao Mar e Marcha de Martim). Agora quadras e sobre a vida do Ultramar tenho para aqui muitas. (Leu a seguinte: Muito mais tinha a escrever / lindas palavras para te cantar / desfizeste o meu coração / Não me voltas a abraçar. [Q: Lembra-se dos horários do comboio?] F: acho que havia um comboio de manhã, outro à tarde. Acho que era por volta das 11 h. o que vinha de baixo ia ficar a Mirandela ou a Bragança, não sei dizer. O que vinha de cima ia ficar além (Tua). Havia comboio e havia automotora. Cruzavam um com o outro: um levava, outro trazia. [Q: nessa altura, as carruagens eram muito diferentes de hoje. Ainda se lembra como eram antigamente, por dentro? ]F: A carruagem tinha pouco estilo: bancos em madeira, tudo em madeira, forrada em madeira. As janelas os vidros eram preciso puxar para um lado e para o outro. Meu amigo, era o transporte daquela época. Mas, quanto a mim, fazem mal em fechar a linha, porque é uma viagem bonita. Pronto. [Q Acha que a linha do Tua foi importante para a divulgação da zona de Trás-os-Montes?] F: Foi. Naquele tempo, era o único meio de transporte para se chegar a Lisboa ou a qualquer ponto do país, ao resto do país. [Q: Tinha medo de viajar no comboio?] F: Não. Achava típico, bonito. [Q: Quando não podia utilizar o comboio como fazia para se deslocar?] F: havia muito tempo a pé e de espera. Tínhamos de ir a Murça apanhar a carreira, quantas vezes a pé, porque os transportes daqui até Murça… Já eu tinha os meus 10 anos, quando veio aqui o 1.º carro, ainda por terra batida. O alcatrão, quando fizeram a estrada, só foi por volta dos 70, já eu estava no Ultramar. Portanto, isto é novo, praticamente. Portanto, ia-se apanhar a carreira em Murça para Vila Real e em Vila Real, umas vezes ia-se pela Régua, outras vezes apanhava-se 131


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outro e ia-se para o Porto. Era sempre a sair de uns e ir para os outros. Só mais tarde fizeram a linha directa de carreira para ir de a Lisboa. (Entrevª N. e G / F.M - MIRES 10º. V. 08 EsProarte - Esc.Prof.M.M.) Testemunho 2: Q: Como se chama? FR: FFMR Q: Em que ano nasceu? FR:1948. Q: Onde nasceu? FR: - Pópulo. Q: Onde vive? FR: Sanfins do Douro. Q: Foi tropa? F.R. Fui. Q: Em que ano? F.R. De 1969 a 1973. Q: E onde esteve? F.R. Estive quase um ano cá em Portugal e depois fui para Angola: no Leste de Angola, no Cazombo… [Q: E tem alguma história dessa época que nos possa contar?] FR: Há, sim! Uma das piores noites foi antes de chegarmos ao local onde “a gente” passou dezoito meses. Ao ir para lá para o Leste, de Luanda até Nova Lisboa de autocarro; depois de Nova Lisboa fomos de comboio até Teixeira de Sousa; de Teixeira de Sousa fomos em camiões de carga, uma coluna de mantimentos lá para o pessoal, para aquelas sanzalas. Então pelo caminho um dos camiões tombou (…) ficou tombado de lado. Tivemos de lá dormir a noite, um pelotão… ninguém conhecia aquilo. Só seis ou sete pessoas ali. Só tínhamos a G3, mais nada, e as munições que levávamos connosco. Durante a noite, havia lá um bichito no mato que acendia, dava uma luzita. Durante o tempo que estive de reforço, de vez em quando aquilo acendia, e eu só me “coisava” que eram os “turras” [guerrilheiros dos movimentos independentistas africanos no período da Guerra Colonial portuguesa] toca a apontar para lá a arma. Mas depois aquilo apagava-se, de repente, daí a pouco, outro do outro lado. “A gente” passou assim a noite. Depois o resto da noite, tivemos de dormir em cima do camião. O camião tinha uns taipais “muita” altos, estava tombado de lado e tínhamos de dormir lá. Foi horrível mesmo com as dores de costas. Quando foi de manhã, ao outro dia de manhã, vamos para matabichar, para comer a ração de combate, quando vamos “encertar” [= encetar] a ração de combate (…) em vez do comandante deixar lá a ração de combate, deixou uma caixa de papéis da secretaria. Viramo-nos “pró’” ajudante, “pró’” preto, “Ó pá, tu tens de nos arranjar de comer que nós estamos cheios de fome e tal.” O preto lá foi por aí adiante (…) quando “às tantas” apareceu-nos com 132


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uma “saca” de mangas (…) aquilo sabia a resina, assim “verdasco”, sei lá. Sabia a resina, mas nós comemos logo todas. Depois era um calor (…) para refrescar havia um lago de água, metíamo-nos assim na água com roupa e tudo. Passados dez minutos, estávamos outra vez já secos. E assim se passou a noite e o dia. Quando “às tantas lá apareceu outro pelotão de pessoal para nós sermos rendidos para o quartel. Mas aquilo foi uma noite horrível. O comandante de vez em quando dizia “Isto é perigoso”, “Aqui é preciso muito cuidado” e “a gente” ia com um medo “do caraças”. (Entrevª CM / FR - 10º Ano- B – Curso C-H: LH Esc. EB / S- A.) Como em vários casos aconteceu, alguns dos portugueses desta região, bem como de outras, sobretudo do norte do país, após terminada a comissão em África, prolongaram aí a sua estadia, retomando a anterior situação civil, já com emprego assegurado. Muitos, porém, dos que ainda o puderam fazer, regressaram à sua terra natal, logo a abandonando, como emigrantes, em busca de melhores condições de vida, a eles se juntando outros que, pela emigração, se eximiram à partida para a Guerra Colonial.

4.5. O Homem e o Ambiente (Travessia do rio Tua ) As populações locais desta região sempre souberam conviver com o rio Tua, recurso natural de numerosas povoações ribeirinhas que nele iam buscar a água para as regas de seus campos ou as espécies piscícolas, complemento alimentar diário, ao mesmo tempo que aprendiam a viver com as cheias inesperadas. No rio Tua encontraram sobretudo, mais do que um obstáculo desafiador, um meio eficaz de comunicação tornado possível pela capacidade técnica inventiva de que também deram provas como se mostra. Os meios técnicos elementares mas funcionais de travessia do rio Tua inventados pelos saberes leigos dos homens, desde as barcas de passagem com sua gestão rudimentar e eficaz, até este engenhoso teleférico artesanal da aldeia do Amieiro (Alijó)-Estação de Santa Luzia (Carrazeda de Ansiães), permitem-nos ver e compreender, numa perspetiva de ecologia simétrica, “como a cultura é sempre já um artefacto da natureza”, a qual sempre foi “para os 133


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homens um artefacto do seu modo de vida, um recurso indispensável à preservação da sua existência”. 021

Antigo teleférico do Amieiro Estação de Santa Luzia ligação entre as margens do rio Tua (1962-1985)

A este título, é exemplar a história local das técnicas leigas que permitiram durante muito tempo as travessias de gentes e produtos entre as terras das margens do rio Tua, as quais,embora estreitas, se revelaram frequentes vezes intransponíveis. Contava o antigo barqueiro João Casimiro, pai do último barqueiro conhecido do rio Tua, que quando se deu a maior cheia deste rio (1909), o seu pai esteve três meses sem fazer nenhuma viagem. Mesmo assim, era preciso guardar o barco de noite e de dia, dormindo por ali (ainda não havia casa do barqueiro) porque tinha que laçar ou deslaçar a corda que prendia o barco quando o rio baixava ou subia a corrente das suas águas. Que se saiba, o último barqueiro (01 / 06 / 1983-1985), que teve já de fazer testes e exames no local sobre as normas de segurança, com técnicos dos serviços hidráulicos, foi António Casimiro, descendente dessa família que prestou durante muitos anos este importante serviço social de comunicação. Sucedeu no ofício a seu pai, João Casimiro, aí barqueiro (com carta de arrais n.º 16 de 1958), de 1954 até 1983, o qual por sua vez já sucedera também ao pai, Abel Joaquim, arrais até 1954. Nesta zona do Tua foram ainda anteriormente barqueiros, Manoel Maria Morais (1937), João Maria, António Tomai e Ismael Augusto, entre outros, todos já falecidos. 022 021  RHEINBERGER, H.-J – Itérations, ob. cit., 51. 022  Apud Noticia digital em Correio Transmontano, consultada em 10 de Novembro de 2015

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Com licenças, já mais tarde passadas pela junta de freguesia023, por conta da qual se exercia este oficio ou mester, os arrais e barqueiros trabalhavam de sol a sol porque era preciso assistir os comboios, passar os trabalhadores agrícolas e as colheitas, pessoas e animais de outras freguesias e os ferroviários que iam e vinham, para e do seu trabalho. Embora até meados dos anos 1980, ainda, funcionasse regularmente, durante o Verão, este barco de passagem no rio Tua, ligando a povoação do Amieiro, na sua margem esquerda, à pequena e perigosa estação de Santa Luzia da linha do Tua, na margem direita, acontecia porém que antigamente, e sobretudo no Inverno e ocasiões de elevada subida do caudal do rio, as aldeias ribeirinhas ficassem isoladas e delas apenas se podia sair, a cavalo ou a pé. Surgiu então este Teleférico do Amieiro, concebido por Amândio Pinto, a partir do sistema que permitia a passagem do correio dessa zona nos períodos de cheia fluvial. Era basicamente uma caixa cúbica feita de madeira e metal (1,5 m. x 2 m. x 2 m.), com quatro rodas na parte superior que rolavam em dois cabos de aço atados nas duas margens do rio. Ao centro tinha um terceiro cabo por onde as pessoas puxavam para se fazerem transportar. A invenção do teleférico, inaugurado em 21-05-1962 e em funcionamento desde 08-09-1964 até 08-09-1985, foi de grande importância económica, social e cultural, embora tenha servido, principalmente, as pequenas comunidades de Safres, S. Mamede, Franzilhal e Carlão, do concelho de Alijó e as de Pombal de Ansiães, Paradela e Pinhal do Norte, do concelho limítrofe de Carrazeda. O interregno de dois anos que se verificou desde a data da sua inauguração até ao início de funcionamento, correspondeu à fase de legalização, testes e experimentação deste aparelho técnico que se pretendeu, desde a sua origem, não fosse um meio de transporte clandestino. O processo da sua construção obedeceu a um projeto encomendado pela junta de freguesia e foi técnica e funcionalmente aprovado.024 Durante 21 anos, usaram diariamente o teleférico cerca de 40 pessoas, muitas colheitas agrícolas e toda a variedade de gado e animais. Permitiu que os muitos ferroviários da CP, naturais do Amieiro, cerca de 30% da sua popu023  As Juntas de Freguesia, unidade mais pequena da divisão administrativa portuguesa, substituíram em 1916, as Juntas de Paróquia, autonomizando-se totalmente da antiga estrutura eclesiástica. 024  Pela 1.ª Direção Hidráulica do Douro Sul, sob o registo n.º 859 de 11-09-1964.

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lação ativa, fossem trabalhar todos os dias sem correrem o risco de perder os seus empregos, que numerosas pessoas da aldeia (50% dos residentes) se deslocassem para ir trabalhar no Complexo Agro-Industrial do Cachão, então em franca laboração, ou ainda para irem ao médico a Mirandela como era sua preferência habitual. Por fim, também possibilitou que a grande produção local de azeitona fosse escoada sem se estragar, na espera, dentro dos sacos que levariam mais tempo a descer o rio. A travessia era feita com a ajuda e vigilância do barqueiro, contratado, todos os anos,025 por 10.000$00 / mês (atualmente, 50 euros mensais) sendo a utilização do barco e do teleférico arrematados em leilão organizado pela autarquia no dia de Natal.026 Mas só quando já estava prestes a ser desativado, durante os anos 1980, após ter funcionado sem contratempos ou avarias de relevo e servido, perfeitamente, as necessidades básicas locais, foi objeto de sugestivas reportagens televisas e jornalísticas de primeira página027 que o consideraram “arte de prestidigitador”, “engenho à “transmontana” em “Portugal no país das maravilhas”, numa ótica simplista mediática de preconceito vulgar do centro face à periferia. Este móbil técnico de união das populações das duas margens do rio Tua permitiu e favoreceu uma coabitação equilibrada entre tecnologias artesanais anteriores, como as dos barqueiros e arrais que fizeram durante séculos a travessia do rio e tecnologias mais modernas, como a ferrovia, que acabaria por suplantar em larga medida aquelas, evidenciando que “a natureza é todavia a missão prioritária da tecnologia, e a tecnologia uma missão ecológica.”028 Foram culturas camponesas centenárias do vale do Tua, como esta, que criou, com engenho e arte, este meio técnico de comunicação funcional, que se crê ter sido único no país e é hoje tido como património histórico local. Também as culturas rurais do peni-planalto das terras frias de Bragança, servidas igualmente pela linha do Tua, marcaram até aos nossos dias a paisagem da região, ao ponto de o seu quase desaparecimento nos poder atualmente confundir com a própria natureza. E, como se tem vindo a observar, essas culturas eram e 025  Até 1983, ano a partir do qual a Junta de Freguesia do Amieiro passou a encarregar-se desses contratos, ficando as avenças para sua receita própria. 026  Em 25-12-1983 o barqueiro arrematou a travessia por 8.350$00. 027  Por exemplo, “Jornal de Noticias”, Fev. de 1985, texto de Alípio Ferreira e fotos de Américo Diegues 028  RHEINBERGER, H.-J – Itérations, ob. cit., 51.

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foram duráveis e organizadas de modo a assegurar a longo termo as condições de regeneração dos recursos naturais. No entanto, e daí a importância de lembrá-lo, como o intuíram numerosos informantes privilegiados, tais naturezas / culturas regionais, embora duráveis, têm-se vindo a extinguir como muitos dos recursos existentes e equilíbrios locais, considerados supérfluos com a globalização progressiva da agricultura.

Página de jornal diário de 1985

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CAPÍTULO 5 – NOSTALGIAS E UTOPIAS (pertenças identitárias e identidades continuadas) Numa visão global analítica do repositório de entrevistas em que assenta este livro, parece-nos poder intuir-se que se o sentimento de pertença fundamental dos mais idosos se baseia na “nostalgia” do tempo perdido, o dos mais jovens não pode deixar de inclinar-se prioritariamente para as “utopias” do futuro. Os relatos biográficos das entrevistas revelam também como as histórias individuais se confundem frequentemente com as histórias familiares, e permitem compreender como a partir de enredos antigos se criam histórias novas. Por sua vez, os atores sociais parecem viver numa interseção de pertenças, num continuum de negociações e resistências que emergem da interpenetração do global com o local. Nessa medida, desafiam-nos a perceber quais os fatores mais importantes dos seus processos identitários e de integração na sociedade concreta onde vivem e de cujo passado recente tentaram aproximar-se e aproximar-nos, privilegiando fatores de inclusão comunitária na vida quotidiana do vale do Tua, designadamente através de ligações e solidariedades fortes assentes em redes familiares e sociais. Nesse enquadramento lato, procuram-se apreender alguns fundamentos do processo identitário das populações transmontanas ancoradas na espácio-temporalidade do vale do Tua já esboçada nos anteriores capítulos, através da identificação das principais pertenças identitárias e identidades continuadas que foi possível intuir da análise dos numerosos encontros / entrevistas realizados entre os mais idosos, entrevistados, e os jovens entrevistadores seus descendentes.

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Por “identidades continuadas” compreendem-se as identificações que derivam de uma associação conjunta a unidades sociais primárias já extintas ou em processo de extinção, as quais servem para descrever o processo através do qual os indivíduos constroem a sua identificação pessoal a partir da pertença a uma unidade social primária. (CABRAL2003:120-121). Porém, reconhecer as redes de solidariedade primárias só é identificável na relação entre o dizer e o fazer que se estabelece através de atividades localizadas ancoradas. O reconhecimento de um “núcleo duro” de relações resistentes e estáveis entre pessoas e coisas “passa pela ancoragem das relações sociais, pelo vínculo indissociável que se estabelece entre as identificações sociais das pessoas e a sua biografia pessoal e familiar, nomeadamente as associações com lugares, acontecimentos, pessoas e objetos. (NUNES,1992b: 451) 029 Podemos então perceber melhor como indivíduos e populações do vale do Tua foram construindo processos de identificação próprios, quer a partir de laços sociais, familiares e de vizinhança ao longo de gerações, quer a partir de diferenças e semelhanças vivenciais, sociais e culturais. Tais processos podem ser detetados numa longa diacronia que os próprios atores situam na relação que estabelecem entre os dias de hoje e os tempos de antigamente, associação sempre presente, positiva ou negativamente, nos discursos e representações sociais dos entrevistados. Nestes se podem ainda identificar elementos sociais e traços culturais reconstituídos em vivências e memórias da linha Férrea e comboios do Tua, com sentimentos de fortes pertenças, afinidades e saudosa nostalgia que são estruturantes dos processos de identificação destas comunidades transmontanas, na espácio-temporalidade considerada. Os processos de construção identitária podem aqui ser concebidos como um fator agregador a nível sócio-cultural e cívico, na medida em que a reificação de certas características do contexto local ou regional de origem pode ajudar na integração dos autóctones nos lugares da sua vivência habitual. Neste sentido, é pertinente prestar atenção aos moldes em que se processa esta interação que pode ser entendida como um fator diferenciador e / ou de ligação a pertenças comunitárias locais, regionais, sociais, interculturais, etc. Deste modo poderão funcionar como um duplo mecanismo de inclusão ao mesmo tempo próximo 029  Apud PORTUGAL, Sílvia – Famílias e redes sociais: ligações fortes na produção de bem-estar. Coimbra: Almedina, 2013. Disponivel em https://books.google.pt/ books?id=L0rBAwAAQBAJ&pg=PT131&lpg=PT131&dq=identidades+continuadas&source=bl&ots, Consultado em 28 de Novembro de 2015

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dos grupos de origem mas também dos objetivos institucionais alvo. A sua contribuição específica e a inter-relação possível de ser estabelecida com as políticas públicas e privadas de desenvolvimento e integração de recursos autónomos desta região é o que se poderá vir a perceber melhor com esta análise. É nesta perspetiva que se tenta refletir sobre o atual discurso público, localmente ancorado, em relação ao passado, presente e futuro do vale do Tua, e de que se considera ser importante o seguinte excerto selecionado de entrevista com um dirigente autárquico da região: (FFTB): Bom, eu sou eng.º civil, inscrito na ordem dos engenheiros e trabalhei muitos anos na Direcção Geral dos Serviços Hidráulicos, depois passou a Direcção Geral dos Recursos Naturais e, mais recentemente, a INA, Instituto Nacional da Água. Era a autoridade nacional da água. Trabalhei em várias obras e também na região. Cheguei a ser o representante comunitário responsável pelo núcleo do norte. Trabalhei em todas as obras relacionadas com o aproveitamento hidráulico no Azibo, em Alijó, Alfandega da Fé, Mogadouro… Enfim, foi este o meu trabalho e o meu contributo, antes de vir para a Câmara. Quero lembrar que já estou na CM de VF há 21, quase 22 anos. Portanto, já deixei de exercer essas funções há muito tempo. Estive 5 mandatos como vice-presidente e agora estou no meu 1.º mandato como presidente. (…) Sim, nasci no concelho de Vila Flor, cresci no concelho de Vila Flor, vivo no concelho de Vila Flor. Só me ausentei do concelho de Vila Flor, para fazer os meus estudos e para o cumprimento do serviço militar obrigatório. Fundamentalmente, vivi sempre numa aldeia do concelho de Vila Flor que é Santa Comba da Vilariça. (…) Primeiro, quero dizer duas coisas, fazendo uma observação. Eu também tenho sentimentos grandes sobre a linha do Tua, porque viajei muito na linha do Tua, desde muito novo: eu com 9 anos fui para o Porto estudar e estive lá dois anos. Portanto, frequentei muito a linha do Tua. Era essa a 1.ª alternativa para as pessoas todas desta zona que iam para o Porto ou para Lisboa. Apanhei o comboio muitas vezes no Cachão, fundamentalmente no Cachão, e fazia o percurso do Cachão até ao Tua. Depois, usei o comboio, quando fui estudar para Bragança e usei também o comboio em sentido contrário para o regresso de Bragança. E, mais tarde, quando estava a desempenhar funções do serviço 140


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municipal obrigatório, aí, sim, quase todas as semanas eu usava, de uma forma ou de outra, a linha do Tua. E, mais tarde [antes], quando estudei em Coimbra, também usava a linha do Tua. Portanto, tenho memórias da linha do Tua e esta a primeira nota. E a segunda nota tem a ver – e por isso eu estou satisfeito e sinto-me bem comigo próprio por me teres convidado, porque eu sou dos poucos que estive, participei, viajei e tenho memórias e sentimentos sobre a linha do Tua, mas também tenho, agora, uma nova visão sobre o vale do Tua, e é essa que eu estou disposto a discutir contigo. (…) Recordações, tenho, porque tenho memória de que quando estava a cumprir o serviço militar obrigatório o comboio ia muito cheio. Era difícil arranjar lugar e no Verão era muito calor. O comboio não andava absolutamente nada. Nas viagens à noite, no inverno e nos dias de chuva, era tormentosa a viagem. Todo o vale é muito lindo e muito escarpado. Os túneis são fantásticos, mas sempre com uma pontinha de receio, porque a qualquer momento sentíamos que podia vir dali uma desabada e caírem pedras e haver ali um problema. Porque o comboio bailava muito, mas a velocidade também era reduzida. Portanto, nós tínhamos confiança na máquina e no maquinista e, depois, era o que acontecesse. Graças a Deus nunca aconteceu nada. (…) Até determinada altura, a linha do Tua, era a primeira alternativa para quem ia para o Porto ou para Lisboa. E era também a primeira alternativa para trazer a correspondência do correio. Eu lembro-me de ver as malas do correio no comboio. E o correio vinha até ao Cachão e alguém contratado pelos correios ia de Santa Comba buscar o correio ao Cachão e o levava para Santa Comba e lá havia posto e era distribuído. Mas o comboio também era de mercadorias. Eu ainda sou do tempo em que o comboio tinha mercadorias. Mas há sempre estrangulamento, porque a linha é de via estreita e não tinha a mesma bitola que a linha do Douro. Havia sempre um processo de transferência de mercadorias e de pessoas que sempre foi um obstáculo para que aquilo funcionasse bem e fosse uma alternativa de futuro. Esse é que foi o grande problema daquela linha. Agora, era também um veículo que trazia também comunicações, trazia jornais. Trazia toda a correspondência e levava. Era, realmente, até determinada altura, a primeira alternativa da comunicação. (…) 141


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Eu não sei se queres que te fale um pouco sobre o futuro do vale do Tua. Quero só dizer-te uma coisa: é que a linha do Tua entrou, efectivamente, num processo de degradação: falta de assistência, ocorreram 4 acidentes. A linha do Tua nunca se impôs como uma alternativa, nem ao turismo da região, nem como alternativa à circulação das pessoas. E nunca se impôs, porque apareceram outras vias que lhe ganharam esse terreno, que foram as rodovias. Portanto, o transporte rodoviário conseguiu ganhar ao ferroviário, por falta de investimento, por falta de atualização dos meios e dos horários. E ganhou-lhe as pessoas. E o processo de degradação foi muito acelerado. Aliás, em 1992, o governo da altura fechou o troço de linha a 18 de Dezembro de 1992 entre Mirandela e Bragança. E, portanto, a linha ficou reduzida a menos de metade. A linha ia do Tua a Bragança e grande parte da linha ficou desactivada. A linha entre Mirandela e o Tua continuou sempre a funcionar mas houve 4 acidentes. Entretanto, o governo da altura enceta um processo de construção de barragens e a barragem do Tua é decidida de construir se as 5 Câmaras que estão numa margem e na outra do rio, que são Murça, Alijó, Carrazeda, Vila Flor e Mirandela, vêem aqui uma oportunidade. Ou seja, a barragem pode ser a oportunidade de futuro, porque vai ter que ser, porque o governo decidiu construí-la. Portanto, o que estamos nós agora a fazer todos desde alguns anos a esta parte: conseguimos que o Ministério do Ambiente na Declaração de Impacto Ambiental consagrasse medidas de compensação para compensar a região pelo facto de construir a barragem do Tua. São várias medidas e elas estão publicadas. E eu destaco fundamentalmente estas: uma, ligada ao empreendedorismo; outra, ligada à criação de um Parque Natural do vale do Tua que, durante 75 anos, vai receber 3% do valor de facturação daquela barragem; tem outra ligada ao Património e por causa disso é que estamos aqui: à Memória do Tua e também ao Património dos 5 concelhos, não só do Tua, mas também de outras zonas, de património classificado, de reclassificação desse património; e tem ainda outra medida que tem a ver com a mobilidade. É um projecto de mobilidade turística que vai permitir que um utente, um interessado, um turista ou passageiro possa chegar ao Tua e do Tua possa circular até Mirandela. E, como? De barco, até à Brunheda; e, depois da Brunheda, de comboio, por via-férrea, chegar até Mirandela. Este é um projecto 142


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interessantíssimo em que os autarcas estão empenhados, em colaboração com a EDP. Esperamos que o governo, no próximo quadro comunitário de apoio, nos permita alavancar o dinheiro que já está cativado para este projecto. O dinheiro que já está cativado para este projecto pelo promotor que é a EDP são 10 milhões de euros. Nós precisávamos cerca de 25… (…) (Entrev.ªJA / FB – 11º ano EsproArte-Esc.Prof. M.) Pudemos observar que as pertenças, “identidades continuadas” e afinidades sociais e culturais das populações do vale do Tua, identificadas diferencial e globalmente no universo comunitário e social analisado, se foram construindo em torno de solidariedades primárias para com o rio, o vale e as suas gentes, em diferentes gerações. Verificou-se especialmente em torno de vivências quotidianas comuns e afins, lembranças de acontecimentos locais e extra-locais com repercussões mais notórias na vida e na história desta unidade territorial, espácio-temporalmente conformada, e das relações de maior ou menor proximidade com a linha férrea do Tua, das memórias semelhantes ou distintas de viagem nos seus comboios, de idênticas motivações funcionais e perceções, em regra positivas e agradáveis e manifestações partilhadas de denúncia do encerramento e desmantelamento da linha, com a consequente interrupção da continuidade de mobilidades físicas e geográficas por essa via. De idêntico processo de identificação nos dá conta a primeira parte do anterior excerto de entrevista, embora expresso num registo diferenciado do da maioria dos testemunhos, quanto à sua própria natureza e ao prognóstico de desenvolvimento local futuro, pelo entrevistado, protagonista na política autárquica de administração local e em estruturas institucionais de gestão global do vale e recém-criado Parque Natural Regional do vale do Tua. Dada a sua qualidade de cidadão eleito para o exercício de funções municipais, o seu depoimento requer um protocolo de abordagem que desde logo leve em conta o que partilha com os outros depoimentos de carácter testemunhal, sem no entanto se ignorar que se trata de um ator social diretamente implicado na ação de transformação e que, dele é, por isso, em maior ou menor grau, parte ativa. Nesta perspetiva, esta entrevista representativa de uma voz pública institucional adquire pela natureza das coisas e dos factos um carácter programático que as restantes, voz da população anónima envolvente não possuem, nem mesmo as que se fazem eco de opiniões públicas de oposição a desenvolvimentos atuais. 143


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Embora este testemunho seja de um registo diferente, marcado pelo lugar da enunciação que não deixa de conformar os seus enunciados, trata-se também, neste caso, a vários títulos igualmente representativo, de uma outra forma de afirmação do processo de identificação das populações do vale do Tua, o qual é por outro lado diferenciado em função de caraterísticas próprias de cada um dos seus cinco concelhos conforme o grau maior ou menor da sua proximidade e implicação histórica na e da linha do Tua.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Terminamos aqui, provisoriamente, como tudo na vida, na história e no conhecimento sempre inacabado, a singular viagem para que vos convida este livro, metáfora de iniciação a antigos saberes técnicos e leigos, esquecidos ou perdidos, que se pretendeu desocultar, recorrendo ao método biográfico das histórias de vida. Trata-se de uma metodologia apropriada das ciências sociais para este estudo que se traduziu na produção de fontes orais para a micro-história local e regional do vale e linha férrea do Tua, inscrita numa escala translocal e arco temporal centenário da nossa contemporaneidade. Esse percurso, que se traduziu numa transformação de conhecimentos a partir da organização, análise e interpretação de materiais e conteúdos produzidos, assenta numa pluralidade e diferença de vozes e imagens de mais de 150 jovens e outros tantos adultos, mais ou menos idosos, que estabeleceram entre si e à volta do vale do Tua, uma original e produtiva interação social e cultural. Através da realização e transcrição de mais de 150 entrevistas semi-estruturadas e respetivas gravações em vídeo-clips030, foram esses atores sociais recolhendo e transmitindo, interativamente, testemunhos, depoimentos, narrativas de viagens e singulares histórias de vida quotidiana, caracterizadas pela multiplicidade de vivências, memórias, perceções e representações sociais ilustrativas do universo populacional das comunidades desta micro-territorialidade transmontana em observação e estudo, constituída por cinco municípios contíguos mas diferentes, embora ligados por an030  Ver listagem respetiva em anexo 1, produzida e organizada pela referida equipa técnica de audiovisual e cinema deste projeto.

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tigos laços histórico-culturais e ambientais que se mantêm fortes e atuais. Tenta-se assim devolver às comunidades envolventes do vale do Tua a sua história social recente, contada com toda a vivacidade pelos seus atores principais, partilhando-a com investigadores, estudiosos interessados, outros leitores e públicos em geral e sujeitando, simultaneamente, o trabalho de pesquisa, investigação e ação que lhe subjaz, ao escrutínio crítico do público. O objetivo principal deste livro e do vídeo documentário que o acompanha, produzido por uma equipa técnica especializada de audiovisual e cinema, de apoio ao projeto, foi, como se julga ter conseguido, fazer a divulgação destes mais visíveis resultados do Projeto Mem Tua 2 Escolas, um projeto que se considera de investigação-ação pelo modo como decorreu, em estreita articulação universidade-escola-comunidade, com concretização na quase totalidade dos agrupamentos escolares e escolas dos concelhos de Alijó, Carrazeda de Ansiães, Mirandela, Murça e Vila Flor, durante o ano letivo 2014-2015 em que se realizaram três reuniões de coordenação geral para diagnóstico, balanço e perspetivação de atividades em diferentes locais do vale do Tua e reuniões mensais de monitorização e acompanhamento em todas as unidades escolares. Coordenado e apoiado, a nível global, por uma equipa de cinco investigadores que regularmente se deslocava às escolas para articular a ação com as pequenas equipas de docentes e diretores constituídas a nível de cada escola, este projeto assentou localmente num bem organizado trabalho escolar colaborativo, motivou e envolveu numerosos professores e alunos dos anos terminais do ensino secundário e profissional, tendo sido integrado, numa perspetiva multidisciplinar, no processo e organização pedagógica e curricular pela coordenação proativa e dinâmica genericamente conseguida. Implicou e permitiu ainda, para além de um trabalho pedagógico cooperativo que se refletiu positivamente no funcionamento escolar e no processo de ensino-aprendizagem031, a realização consequente de um trabalho de campo motivador, quer para os indivíduos da população local entrevistados, quer para os jovens alunos entrevistadores, muitos dos quais se viram nessa condição pela primeira vez, tendo tido nesta metodologia de pesquisa e modalidade de investigação no campo das ciências sociais, a sua primeira iniciação e aprendizagem prática, apoiadas no terreno por professores experientes em técnicas de entrevista, meios audiovisuais e informáticos. 031  Ver relatórios das escolas em anexo 2

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Ficam assim delineadas as duas linhas mestras que orientaram o presente livro e documentário vídeo: dar conta de um estimulante trabalho de projeto realizado e interpretado transversalmente no campo da história e da etnometodologia e construir a partir de e com ele, uma aproximação científica transdisciplinar ao património histórico, social e cultural vivo que é o vale do Tua, a norte do Douro do Nordeste Transmontano. Assim se procura dar a conhecer mais amplamente este espaço, possibilitando fruí-lo, de viva voz, com a população, sua parte integrante, cerne de qualquer processo de patrimonialização e musealização.

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