Memorial

Page 1

MEMORIAL Minha formação acadêmica foi muito diversificada e bem distante de uma trajetória em linha reta. Após terminar o 2º Grau no Colégio André Maurois, da época da Professora Henriette Amado, afastei-me da formação escolar durante 5 anos por envolvimento em atividades políticas. Esse engajamento me proporcionou uma certa base marxista, visão ampla dos problemas da sociedade e do meu país, sólido sentimento de responsabilidade social e marcas pessoais que permaneceram para sempre. Em 1975, já com 23 anos, entrei para a Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal Fluminense, que abandonei 2 anos depois, porque ela era incompatível com a necessidade de trabalhar. Na época, vivia de tradução e de redação. Passei, então, para a Faculdade de Jornalismo, também na UFF, em 1977. Nesse período, dava aulas de inglês na Escola Dinâmica de Ensino Moderno (EDEM), escola experimental privada. Decidi, portanto, interromper o jornalismo e fazer a Complementação Pedagógica de Inglês, na Universidade Santa Úrsula, para regularizar meu registro profissional. Foi aí que o trabalho conveniente começou a virar paixão por educação. Pedi transferência do Jornalismo na UFF para Letras (Português-Inglês) na Universidade Santa Úrsulo (USU), da qual era vizinha e, em 1981, completei os créditos que faltavam. Neste período, continuei lecionando na EDEM e trabalhei também em outras escolas privadas: no Instituto Souza Leão, na Escola Ativa e no CEAT. Aprender a ser professora em escolas alternativas foi mais valioso que o curso universitário: adquiri a prática da discussão, a preferência pelo trabalho coletivo, a busca contínua pela superação de limites e uma visão de que a lei não deve ser tratada como um limite, mas como uma base comum a partir da qual se podem desenvolver projetos diversos, inovadores e produtivos. Esse aprendizado foi simultâneo a outro tão intenso quanto: a atividade sindical da minha categoria. Em 1983, passei a ser professora do Estado, fato marcante na minha trajetória. Eu queria servir ao público, às classes populares, dando continuidade ao meu engajamento social e político. Levei um susto com o descaso do Estado em relação à escola pública e com a passividade dos


professores diante deste fato. Esse foi o ano do Encontro de Mendes, promovido no início do 1º Governo Leonel Brizola, em que os professores do Estado e do Município do Rio de Janeiro foram chamados a discutir as propostas de educação para o governo que entrava. Como já trabalhara com Darcy Ribeiro, ao reencontrá-lo nesse período, terminei aceitando o desafio de participar de um projeto de formação de professores, como diretora da escola de 1o grau. Essa proposta, Complexo Educacional de São Gonçalo, envolvia, além da escola que dirigi, a Faculdade de Formação de Professores, na época da FAPERJ, para a qual prestei concurso e onde trabalho desde 2003. Ser diretora de uma escola pública do porte daquela, numa área popular, envolvida num projeto inovador e ambicioso, com poucos recursos para sua realização, deixou-me diante de uma realidade crua, como jamais me defrontara antes. Minha necessidade de entendê-la, discuti-la, degluti-la, levoume a procurar o mestrado. Minha dissertação, apresentada em 1990 ao Instituto de Estudos Avançados em Educação da Fundação Getúlio Vargas, foi um estudo de caso do desenvolvimento dessa experiência e da resistência dos professores a um projeto de mudança1. Ao sair da direção da escola, em 1986, passei a assessora do diretor geral do Departamento de Educação da Secretaria Estadual de Educação, posição em que pude perceber as dificuldades de reorientação de um sistema educacional tão complexo. Essas experiências foram minha etapa inicial de trabalho, agora já longo, com a escola pública de horário integral. Discuti o projeto nas duas primeiras fases do encontro de Mendes; continuei a discuti-lo e tentei implantá-lo parcialmente enquanto estive no Complexo Educacional de São Gonçalo; continuei envolvida

com ele

de muitas

formas

enquanto estive

no

Departamento de Educação; e debrucei-me sobre ele novamente durante a dissertação de mestrado, período em que fui bolsista primeiro do CNPq e depois da FAPERJ. Em 1991, quando a Professora Maria Yedda Linhares reassumiu a Secretaria de Educação do Estado, fui chamada para compor a equipe 1

Uma síntese da dissertação foi publicada em artigo no vol. 216 da RBEP em 2006, do ponto de vista de escola de 1º. Grau. Pelo ponto de vista da universidade, publiquei um artigo em 2012 sobre esta experiência de formação de professores, no vol. 233 da RBEP.


organizadora do Seminário Alfabetização e Maioridade Social e a publicação do livro que dele se originou. Logo após, com a criação da Secretaria de Estado Extraordinária de Programas Especiais, cuja maior incumbência era recuperar os antigos CIEPs e implantar todos os que ainda estavam por terminar, fui nomeada diretora da Diretoria dos Centros de Demonstração, responsável pela seleção, capacitação inicial e em serviço de todos os professores dos CIEPs de 1ª a 4ª série do Estado, e membro do Conselho Diretor do 2º Programa Especial de Educação. Outro período de muito trabalho, desafios, inovações, tensão, confronto e realizações. Tive oportunidade de refletir sobre esse período na elaboração da Revista Carta nº 15, publicação temática do Gabinete do Senador Darcy Ribeiro, em que escrevi, juntamente com membros da equipe que implantou o 2º Programa Especial de Educação, artigos sobre a proposta pedagógica dos CIEPs e a capacitação de seus profissionais, além da avaliação externa de 1993 e 1994 realizada em todos os CIEPs do Estado. Ainda em 1995, buscando um espaço de discussão para aprofundar as experiências vivenciadas no período, fui aprovada para o doutorado em educação na UFRJ, que comecei no ano seguinte. De 1992 a 1997, trabalhei como professora do Colégio Pedro II e, nesse último ano, no Colégio Estadual Souza Aguiar. Licenciada e com bolsa da CAPES pude concentrar-me no doutorado e na produção acadêmica. Após a morte de Darcy Ribeiro, escrevi sobre ele na Revista Edem Mais e no Dicionário de Educadores do Brasil. Apresentei o trabalho Em tempo: a escola de horário integral na ANPEd em 1998

pela primeira vez. A partir daí,

desenvolvi várias atividades de caráter acadêmico, dando palestras, cursos, entrevistas. De 1998 a 2006, prestei serviço à Fundação Darcy Ribeiro, que, em convênio com a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, produziu material pedagógico para a formação de professores e ofereceu cursos de aperfeiçoamento para diretores, coordenadores e professores de escola de horário integral. Nesse contexto, fui palestrante em mesas redondas, escrevi artigo para o curso de 2001 e participei da organização da publicação de coletânea de artigos para o mesmo curso.


Defendi minha tese de doutorado em educação pela UFRJ, em setembro de 2001: Escola Pública de Horário Integral: demanda expressa pela representação social. O objetivo da tese foi verificar se há demanda para a escola pública de horário integral, através da representação social que alunos, pais, professores e funcionários têm dela e confrontar essa representação com a literatura produzida sobre essa escola nos últimos 18 anos. A conclusão confirmou a demanda, mas revelou que a representação social que a justifica opõe professores/funcionários, centrados na necessidade que a população tem dela, a pais/alunos que, sem desconhecer a necessidade, privilegiam o gostar como motivação para a demanda pela escola de horário integral. Artigo que sintetiza a tese foi publicado em 2004 no vol. 27 da Revista Brasileira de Educação. Fiz concurso para a Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro em 2001, logo após meu doutoramento. Como tirei 2º. Lugar, só assumi a matrícula em 2003, quando me aposentei de minha matrícula da educação básica no Estado. Enquanto isso, continuei trabalhando como professora do Estado e como consultora na Fundação Darcy Ribeiro. No início de 2003, fui chamada a trabalhar como professora do Mestrado em Educação da Universidade Estácio de Sá, onde permaneci até 2009. Além de orientar diversos mestrandos e exercer a docência

continuamente,

fui

coordenadora

da

linha

de

pesquisa

Representações Sociais e práticas educativas e coordenadora adjunta do Mestrado em Educação. Neste período minha produção acadêmica destacou mais as representações sociais que a temática da escola de tempo integral. Com o início das atividades do Mestrado em Educação da FFP/UERJ – Processos formativos e desigualdades sociais – desliguei-me da Universidade Estácio de Sá, passando a trabalhar exclusivamente na FFP, exercendo a função de coordenadora adjunta do mestrado, no biênio 2009-2010, além da docência na graduação e no mestrado e a orientação de graduandos e mestrandos. Entre 2008 e 2010, participei de pesquisa financiada pelo MEC / SECAD, realizada por 4 universidades públicas brasileiras, para mapear as


experiências de jornada ampliada nos municípios brasileiros.2 Esta atividade de pesquisa, feita junto à Unirio, paralela ao meu trabalho com políticas públicas na UERJ, redirecionou minha produção acadêmica para a temática da ampliação da jornada escolar, seja através de pesquisas com escolas de tempo integral ou com atividades complementares como o projeto federal Mais Educação. Em 2011, fui contemplada com o Prodocência da UERJ para fazer pósdoutorado na Universidade Complutense de Madri, com supervisão de Mariano Enguita, para o qual obtive bolsa do CNPq. Lá pesquisei a discussão europeia, particularmente na Espanha, sobre a organização da jornada escolar. De volta, a segunda parte do pós-doutorado foi realizada na Universidade do Estado do Ceará, com supervisão de Sofia Lerche Vieira. Lá, com auxílio do Edital de Ciências Humanas do CNPq, pesquisei três municípios com diferentes experiências de ampliação da jornada escolar – Sobral, Maracanaú e Eusébio. O Ceará foi escolhido por ter tido contato, durante a pesquisa do MEC, com Russas, constatando o avançado processo de municipalização no Estado, colocando a política de ampliação da jornada sob responsabilidade municipal. No meu retorno às atividades regulares na UERJ, já como Procientista, tive pesquisa aprovada pela FAPERJ em 2012, para avaliar o impacto que a ampliação da jornada possibilita em municípios do Estado do Rio de Janeiro. Além disso, estou organizando publicação de coletânea sobre o tema da ampliação da jornada escolar, reunindo traduções de textos internacionais significativos contatados no período do pós-doutorado com sua discussão sobre a relação possível com a realidade brasileira por autoras nossas relacionadas ao tema.

2

Os relatórios da pesquisa quantitativa e qualitativa podem ser lidos no portal do MEC no endereço: http://portal.mec.gov .br/index.php?option=com_content&view=article&id=16727&Itemid=1119


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.