Marketing Político Internacional

Page 1


2

Marketing PolĂ­tico Internacional O Funcionamento Global da Propaganda PolĂ­tica


3

Congresso Brasileiro de Marketing Político – POLITICOM

Marketing Político Internacional O Funcionamento Global da Propaganda Política

Adolpho Carlos Françoso Queiroz Andréia Oliveira Rêgo (Organizadores)

Cátedra UNESCO / Metodista de Comunicação São Bernardo do Campo | SP | Brasil 2010


4

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

Conselho Diretor Wilson Roberto Zuccherato (presidente), Rosilene Gomes da Silva Rodrigues (vice-presidente), Rui Sergio Santos Simões (secretário), Augusto Campos de Rezende, Clóvis de Oliveira Paradela, Eric de Oliveira Santos, Henrique de Mesquita Barbosa Corrêa, Maria Flávia Kovalski, Nelly Azevedo Matolla, Nelson Fer, Paulo Roberto Lima Bruhn e Saulo de Tarso Cerqueira Baptista Reitor: Marcio de Moraes Pró-Reitora de Graduação: Vera Lúcia Gouvêa Stivaletti Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa: Lauri Emílio Wirth Pró-Reitora de Infra-Estrutura e Gestão de Pessoas: Elaine Lima de Oliveira Faculdade de Comunicação Paulo Rogério Tarsitano Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social Sebastião Squirra Conselho de Política Editorial Marcio de Moraes (presidente), Daniel Pansarelli, Etienne Alfred Higuet, José Marques de Melo, Luiz Renato Paranhos, Luiz Roberto Alves, Magali do Nascimento Cunha, Mário Francisco Boratti, Peri Mesquida (representante externo), Rafael Marcus Chiuzi Comissão de Livros Almir Martins Vieira, Daniel Pansarelli, José Marques de Melo, Magali do NascimentoCunha, Marcelo Módolo, Maria Angélica Santini, Rafael Marcus Chiuzi


5 O Funcionamento Global da Propaganda Ideológica Copyright © 2010 Autores Créditos Institucionais Universidade Metodista de São Paulo Reitor: Márcio de Moraes UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciências, a Cultura Diretor Geral: Koichiro Matsuura. Asistente del Director General para la División de Comunicación y Información: Abdul Waheed Khan Cátedra UNESCO de Comunicação para o Desenvolvimento Regional Equipe Executiva Diretor Titular: Prof. Dr. José Marques de Melo; Diretora Suplente: Profa. Dra. Maria Cristina Gobbi, Assistente Acadêmica: Francisca Rônia Barbosa; Estagiários: Lucas Kenji Suzuki Constante. Equipe Consultiva: Triênio 2007/2010 - Profa. Dra. Sandra Reimão – Universidade Metodista de São Paulo (São Paulo - SP); Prof. Dr. Jorge Duarte - Assessor da Secretaria de Comunicação Institucional da Presidência da República - Brasília; Sra. Lúcia Araújo - Diretora do Canal Futura, da Fundação Roberto Marinho - Rio de Janeiro; Profª. Drª. Magali Cunha – Conselheira do Conselho Mundial de Igrejas - Faculdade de Teologia - Igreja Metodista - São Bernardo do Campo - São Paulo; Profª. Drª. Margareth Born Steinberger-Elias - da Universidade Federal do ABC – Divisão de Ciências Sociais - Santo André - São Paulo e Sra. Vera Lúcia Rodrigues Diretora da empresa Vervi Comunicações - São Paulo - SP. Capa: Larissa Paes Edição: Lucas Kenji Suzuki Constante Revisão: Adolpho Queiroz / Andréia Rêgo


6 SUMÁRIO PREFÁCIO Maria Cristina Gobbi (UMESP/SP) ..........................................................................................................................8

APRESENTAÇÃO Adolpho Queiroz e Andréia Rêgo (UMESP)...................................................................................................... 10

PRIMEIRA PARTE - PROPAGANDA IDEOLÓGICA O “Efeito Condorcet” e suas conseqüências na racionalidade da transformação de vontades individuais representadas pelo voto em uma decisão coletiva.................................................................. 13

Isaac Epstein(Ex-professor da -UMESP) Propaganda política e totalitarismo.................................................................................................................... 24 Adolpho Carlos Françoso de Queiróz e Kleber Carrilho(UMESP) Uma nova face do marketing político................................................................................................................. 39

Célia Maria Retz Godoy dos Santos (UNESP) SEGUNDA PARTE – AMÉRICA Eleições presidenciais de 2004 nos Estados Unidos, uma leitura de propaganda ideológica na mídia............................................................................................................................................................................. 50 Adolpho Queiróz (UMESP), Letícia Maria Pinto da Costa (UNITAU) Comunicação virtual partidária no Brasil e no Canadá: um estudo comparativo ................................. 59 Débora Cristina Tavares (UFMT), João Carlos Picolin (Faculdade Integrada Claretiana), Ricardo Costa (Faculdade Metropolitanas Unidas). Comunicação, política e hospitalidade: campanha para eleição de Barak Obama............................... 69 Cláudia Setti Gouvea Franco(UMESP) Internet e novos padrões de financiamento das campanhas eleitorais: um estudo do pleito presidencial norte-americano em 2008.............................................................................................................. 84 Sylvia Iasulaitis(UFSCAR) Bolívia em processo eleitoral: A provável reeleição de Evo Morales....................................................... 84 Andréia Rêgo (UMESP)


7 TERCEIRA PARTE – EUROPA Dos cravos à rede: um estudo sobre o marketing político em Portugal................................................113 Adolpho Queiróz (UMESP), Roberto Gondo (USCS) Um panorama do marketing político na França: fundamentos utilizados nas ações de comunicação política no Brasil.....................................................................................................................................................122

Adolpho Queiróz (UMESP), Paulo Cezar Rosa (UMESP), Roberto Gondo (USCS) Marketing político Brasil X Itália: conceitos e perspectivas ......................................................................132

Bruna Vieira Guimarães (UMESP) Influências do fascismo na propaganda política do Brasil ........................................................................151 Adolpho Queiróz (UMESP)

QUARTA PARTE – ÁSIA E ORIENTE Propaganda na China: histórias e questões contemporâneas.................................................................159 Adolpho Queiróz (UMESP), Aline Lima (UMESP), Bruna Vieira Guimarães (UMESP) Claudemir Bertuolo (UMESP), Daniel Gonzalez (UMESP), Ingrid Gomes (UMESP), Maria Carolina Rodrigues (UMESP), Moisés Stefano Barel (UMESP), Patrícia Paixão (UMESP), Roseane Pinheiro (UMESP) O Estado de S. Paulo e a guerra do Iraque: um estudo sobre propaganda ideológica.....................169 Adolpho Queiroz (UMESP), Kleber Carrilho, Livio Sakai, Milton Pimentel Martins, Patrícia Polacow e Victor Kraide Corte Real(UMESP)


8

O desafio da pesquisa sobre comunicação política Maria Cristina GOBBI1

Dentre as principais atividades que desenvolvemos na Cátedra Unesco de Comunicação para o Desenvolvimento Regional, sediada na Universidade Metodista de São Paulo, uma que seguramente podemos mencionar é o estímulo para a pesquisa como forma a promover o intercâmbio, estimular a reflexão crítica, produzir conhecimento novo, sempre tratando de temas ligados ao contexto da comunicação na atualidade, nos mais variados cenários. E foi com esse desafio assim que nasceu o Grupo de Pesquisa sobre Marketing Político, como atividade oficial no calendário da Cátedra Unesco de Comunicação. Com o estímulo e as benções do professor José Marques de Melo, Diretor Titular da Cátedra Unesco, no ano de 2002, foi realizado o I Seminário Brasileiro de Marketing Político, sob a batuta de Adopho Queiróz, professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, da Universidade Metodista de São Paulo (Umesp). Inicialmente, com um grupo reduzido, mas não menos atuante, mestrandos, doutorados, alunos de iniciação científica, sob o comando do professor Adolpho levaram adiante o projeto de criar, no âmbito da Cátedra Unesco, a Rede Politicom de Pesquisa. Desde então, com oito anos de existência e muita produção, o grupo vem crescendo e contribuindo significativamente para os estudos de Marketing Político e da Comunicação Política, não somente em nosso País, mas as pesquisas têm alcançado âmbitos internacionais, como está demonstrado nesse volume, disponibilizado de forma gratuita para a comunidade científica. Outro desafio que se desenhou inicialmente para o grupo foi a produção de conhecimento novo. Assim, na linha de pesquisa do Programa de Pós-Graduação da Umesp, liderada pelo professor Adolpho Queiróz, nasceu o projeto "A história da propaganda política no Brasil Republicano". Os resultados, apresentado por um contingente muito participante pode ser visto através das várias dissertações de mestrado, teses de doutorado e trabalhos de iniciação científica, quer orientados pelo próprio Adolpho Queiróz, mas e também pelos discípulos desse grupo. Além dessa produção, cujos temas tratam do marketing e da propaganda política, esse grupo vem promovendo anualmente, em diversas regiões, os encontros do POLITICOM – Conferência Brasileira de Marketing Político, inserindo essa temática na agenda acadêmica de muitas instituições. Os encontros, realizados de forma voluntária, têm permitido a interação e a reflexão crítica de nossos alunos, mestres, professores e egressos, bem como ampliado o campo de discussão, incorporando cenários, contextos e diversidades regionais nos múltiplos espaços investigados, quer nos âmbitos da Pós-Graduação e/ou da Graduação. A heterogeneidade das temáticas, também, contempla múltiplas perspectivas, nos vários veículos de comunicação, como rádio, televisão, internet, jornais, revistas, dando aos resultados um ampliado leque de aplicações, em cenários variados. Assim, esses resultados ensejam o desenvolvimento de um acervo bibliográfico e documental sobre o campo, estimulado e possibilitado a divulgação desses trabalhos através de várias publicações, como livros, revistas, anais de eventos, e-books, entre outros. E um desses resultados pode ser visto nesta publicação, disponibilizada no formato de e-book. O tema “Marketing Político Internacional” é muito apropriado para o cenário atual de nosso País. As eleições estão ai. Nosso processo eleitoral, embora longe de ser perfeito, tem se mostrado em constante evolução. O que temos percebido é que o eleitor vem amadurecendo Doutora e Mestre em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo - Metodista. Diretora Suplente da Cátedra Unesco/Umesp, 1


9 sua percepção sobre a sociedade e o momento político vivido na atualidade, deixando de ser um receptor passivo de alguns movimentos, para se tornar cidadão, integrado, crítico e participante do cenário no qual está inserido. E parte significativa dessas mudanças e descobrimentos pode ser atribuída para atividades como estas que vem sendo realizadas pelo POLITICOM, no âmbito das mais variadas instituições de ensino e de pesquisa do País. Criada oficialmente em outubro de 2008, durante a VII Conferência Brasileira de Marketing Político, realizada na Faculdade "Prudente de Moraes", em Itu, no interior de São Paulo, a POLITICOM (Sociedade Brasileira dos Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing Político), tem procurado incentivar as discussões sobre propaganda e marketing político, nos mais variados espaços de reflexão, principalmente durante seus encontros anuais. Sua entusiasta diretoria tem procurado estreitar os laços com pesquisadores do Brasil, estimulando a criação de diretorias regionais espalhadas pelo país, de forma a promover a ampliação dos debates, evidenciando a comunicação como uma ferramenta para o Marketing Político. Mudança, movimento, amadurecimento, evolução, participação, crítica. São ações fundamentais para a manutenção de um estado democrático. Assim, é preciso olhar para o marketing político como uma ferramenta de conhecimento, capaz de ampliar a visão para além da simples eleição e das escolhas partidárias individuais. No Brasil o marketing político brasileiro vem evoluindo a passos largos. Cada vez mais ferramentas de análise científica, aliadas à ética e utilizada por profissionais talentosos e competentes são a marca registrada desse desenvolvimento e esse cenário está disponibilizado na primeira parte desse volume, que analisa a Propaganda Ideológica. Os outros capítulos do e-book traçam um panorama da Propaganda Política da América, Ásia e Oriente, trazendo textos atuais, possibilitando a compreensão dos múltiplos cenários onde as ferramentas do marketing e da propaganda política são utilizadas, evidenciando a importância desse conhecimento para a manutenção de um “Estado de direito”. Esse trabalho, encabeçado pelo professor Adolpho Queiróz, evidencia as transformações pelas quais os mais variados setores políticos e nas regiões mais diversas estão passando, de forma a possibilitar o entendimento sobre os múltiplos cenários políticos, demonstrando que muito mais que vontades individuais, as eleições representam uma decisão coletiva e asseguram especialmente para o Brasil, a manutenção do Estado Democrático. Boa Leitura!


10

Apresentação Adolpho QUEIROZ2 Andréia REGO

Este novo ebook que lançamos com o apoio da Cátedra UNESCO de Comunicação para o Desenvolvimento Regional da Universidade Metodista de São Paulo reúne artigos com a perspectiva de uma discussão teórica e aplicada sobre o funcionamento da máquina de propaganda política no mundo. Ele foi organizado com a participação de estudantes do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Metodista de são Paulo e contou também com a presença de colegas que estudam o tema em outras instituições de pesquisa no país. A primeira experiência que fizemos, quando lançamos o titulo pioneiro “A propaganda política no Brasil contemporâneo”, mostrando os melhores trabalhos apresentados nos Congressos Brasileiros de Marketing Político, o POLITICOM, também organizados com o apoio da Cátedra UNESCO, em 2008, conta até a presente data com mais de 2800 acessos contabilizados o que nos motivou ainda mais a este novo empreendimento intelectual. Desta vez fomos buscar nas experiências da propaganda política difundidas pelo mundo, a partir do olhar criterioso dos nossos alunos e colaboradores, para que pudéssemos ter o tema recorrente, mas com lugares/países/continentes diferenciados em sua ação e execução. O novo livro está organizado em quatro eixos importantes. No primeiro, uma discussão teórica sobre o tema da propaganda ideológica; no segundo, ações de marketing político realizadas nas Américas; no terceiro, um olhar sobre estas ações na Europa e, por fim, Ásia e Oriente Médio. Muitos destes artigos são resultados dos cursos de “Marketing político internacional”, que ministro sempre nos segundos semestres no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo e que, reunidos, passam a espelhar um pouco da produção realizada neste período. Da dimensão teórica as contribuições vieram dos colegas Isaac Epstein (Ex-professor da UMESP), Célia Reetz dos Santos (UNESP) e outro artigo que assino ao lado do meu orientando Kleber Carrilho (UMESP). Neles, os autores procuram discutir contribuições como o efeito Condorcet (Epstein), o impacto das novas tecnologias na propaganda política (Santos) e os efeitos do totalitarismo na propaganda ideológica (Queiroz e Carrilho). Depois começamos a pesquisar os efeitos da propaganda política em eleições realizadas em vários continentes e seus reflexos na mídia contemporânea do Brasil, através de jornais, revistas, rádio, televisão e a internet. Com isso são construídos os capítulos das Américas, onde se analisam os efeitos das eleições presidenciais recentes nos estados unidos, com contribuições das eleições de Barack Obama (Franco e Iasulaitis), George Bush (Queiroz e Costa), Canadá (Tavares, Picolin e Costa R.), e Bolívia, com Evo Morales (Rego). Da Europa vieram os artigos sobre a revolução dos cravos em Portugal (Queiroz e Gondo); a dimensão dos teóricos franceses para a pesquisa no campo (Queiroz, Rosa e Gondo); e as influências a partir da Itália (Queiroz e Guimarães). E, por fim, um último olhar para regiões mais distantes, como a Ásia e Oriente Médio, a partir de artigos escritos a várias mãos, sob minha orientação, mostrando a propaganda política na China e os acontecimentos sobre a Guerra midiática no Iraque. Adolpho Queiroz é pós-doutor em comunicação pela Universidade Federal Fluminense/RJ, doutor em comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo, onde atua no programa de pós-graduação em comunicação. Andréia Rego é publicitária formada pela Universidade Federal de Roraima e mestranda do programa de pós-graduação em comunicação da Universidade Metodista de São Paulo. 2


11 O que se pretende com mais esta incursão no campo da difusão virtual do conhecimento produzido, é devolver à sociedade – aos pesquisadores, leitores, jornalistas, publicitários, planejadores de campanhas eleitorais, historiadores, entre outros – as leituras, pesquisas e esforços que vimos fazendo no nosso Programa de Pós- Graduação em Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo para a produção destas referências e participar deste grande e inovador projeto que a Cátedra UNESCO de Comunicação para o Desenvolvimento Regional, em parceria com a Editora da Universidade Metodista de São Paulo vem fazendo para difundir o conhecimento produzido em sala de aula para que, de ensino e pesquisa, ele também se transforme em atividade de difusão e realimentação do processo de construção do conhecimento. A todos os autores entusiastas desta obra, à equipe técnica da Cátedra UNESCO e aos demais colaboradores que puderam tornar possível esta obra, os nossos agradecimentos, desejando-lhes boa le itura! São Bernardo do Campo, 5 de fevereiro de 2010. Prof. Dr. Adolpho Queiroz Mestranda Andréia Rego


12

PRIMEIRA PARTE _________________________________ PROPAGANDA IDEOLÓGICA


13

O “Efeito Condorcet” e suas conseqüências na racionalidade da transformação de vontades individuais representadas pelo voto em uma decisão coletiva. Isaac EPSTEIN 3 “Um costume habitual (entre os persas) é o de deliberar sobre assuntos importantes quando estão embriagados e, no dia seguinte, quando estão sóbrios, submeter a deliberação à sua reconsideração. Se aprovada novamente a decisão seria executada, senão, abandonada. As vezes, no entanto, estão sóbrios em sua primeira deliberação, mas nestes casos sempre reconsideram o assunto sob a influencia do vinho” (HERÓDOTO, (485-425 AC) Livro chamado CLIO

A legitimação da aferição da vontade de um grupo, de uma comunidade, ou mesmo da totalidade de uma população, a partir da soma das preferências individuais, articula-se intimamente à própria conceituação e um dos atributos essenciais do que se costuma chamar de “regime democrático” . Desde as normas da Carta Magna de um país, de uma província ou estado dos estados unitários ou federativos, até as regras explícitas contidas nos regimentos que regulam as tomada de decisões que determinam as ações das diversas comunidades, como as constituídas por acionistas das sociedades anônimas, sócios de um clube recreativo, conselhos universitários, assembléias de condôminos ou até mesmo pequenos grupos informais, o voto é a instância derradeira que pode dirimir de maneira aceitável, todos os conflitos com relação ao leque de decisões (e ações possíveis) a serem tomadas, senão pelo consenso, pelo menos através da vontade expressa da maioria dos capacitados a participar destas decisões. Este procedimento de se aferir a vontade coletiva através do cômputo das preferências individuais é o que se convencionou de chamar em linguagem comum de “democrático”4 A partir da teoria clássica ou aristotélica das três formas de governo, a Democráticacomo o governo de todos os cidadãos- distinta da Monarquia- como governo de um só- e a Aristocracia – como o governo dos melhores – torna-se imprescindível, no governo democrático, fundamentar e legitimar os meios de se aferir a vontade da coletividade5 Os procedimentos que orientam a coleta de opiniões individuais para a composição da decisão coletiva são variáveis histórica e culturalmente e poderiam ser tema de uma antropologia social ou da história dos povos. A noção de decisão coletiva nasce da distinção entre as decisões provenientes de um grupo e as decisões individuais. Mas de uma pessoa decide por todos (como se fosse um Isaac Epstein, ex-professor da UMESP e diretor da Cátedra UNESCO É verdade que a capacidade universal de “votar” dos eleitores pode ser discriminada ou mesmo diluída por determinados “valores” adicionados aos votos como em algumas instâncias de eleições nos colégios universitários, determinados “votos preferenciais”, etc. O próprio voto para representantes políticos, na maioria das democracias representativas, só foi estendido às mulheres no século XX. No Brasil isto ocorreu por norma da Constituição de 1934. Nestes casos conserva-se o voto como rubrica essencial do processo democrático, escamoteando-se a discriminação ou diluição por argumentos de “voto de qualidade”. 5 Devemos distinguir entre a vontade de uma comunidade ou população, a qual, na Grécia Antiga, era apurada diretamente pelo voto de todos os cidadãos livres masculinos, a partir de uma certa idade, dados na Assembléia (Agora), da distribuição de cargos que não eram representativos, mas funcionais. Para esta última distribuição Aristóteles preconizava a alocação por sorteio e não por votos. (Aristóteles, Retórica, 1365b.) 3 4


14 ditador) pode-se dizer que ocorre uma decisão coletiva, podo-se à parte a questão de se saber se a decisão desta pessoa aferiu ou não a soma ou mesmo a maioria das preferências individuais. Para Rousseau (no Contrato Social) a Assembléia na qual se reúnem todos os cidadãos é a única instância soberana e a sua decisão é a vontade geral. Mas, como o aval desta vontade geral é a unanimidade, que por sua vez é bastante rara, é necessário adotar a vontade da maioria, que, sem ser necessariamente a de todos, é estabelecida como legítima. Existem, porém, diferenças pragmáticas importantes entre as decisões individuais e as decisões coletivas aferidas através das preferências individuais. Uma delas, que é mais conhecida como efeito Condorcet (1743-1794) constitui a referência básica deste trabalho. Tal efeito quando ocorre, questiona a racionalidade do procedimento de se aferir a decisão coletiva a partir das preferências individuais. Este questionamento se justifica pela possível aparição de uma intransitividade na decisão coletiva após o cômputo das preferências individuais necessariamente transitivas. Do mesmo modo que a racionalidade da decisão do indivíduo é questionada quando este exibe uma intransitividade em suas preferências, a racionalidade da decisão coletiva também pode ser questionada quando esta exibe uma intransitividade.Em suma, como podem indivíduos transitivos em suas escalas de preferência, após as comporem, mostrar um comportamento coletivo intransitivo? Dimensões do Espaço Político O conceito de espaço político tem sido definido como a área de conflito que constitui a base ideal da relação entre eleitores e partidos, num determinado espaço e momento históricos. (BOBBIO et al, 1986:392). Como todo sistema político é caracterizado por certo número de divergências e conflitos que dividem as opiniões e atitudes da população, tais divergências constituirão os eixos das dimensões do espaço político. Nos regimes democráticos de massa, o espaço político se identifica com o espaço de competição eleitoral. O eleitor (Homo Suffragans) deve ser capaz de avaliar o partido cuja posição está mais próxima de sua própria colocação neste espaço.As dimensões deste espaço correspondem às principais linhas de conflito numa determinada sociedade e num determinado momento. A mais importante e durável dimensão na arena política tem sido, nas democracias representativas e desde há quase dois séculos, a dimensão esquerda-direita6, mas que perdeu algo de sua nitidez após o desaparecimento da União Soviética em 1990. Esta dimensão ainda que influente tem perdido relevância para outras dimensões de importância variável, em diferentes países e contextos. Assim, novas dimensões têm dividido o espaço político7. Numa democracia representativa, de um ponto de vista racional, os eleitores deveriam, primeiramente, escolher o partido cujo programa de governo mais se aproximasse a sua própria posição dentro das dimensões políticas mais relevantes naquele momento e local. A seguir nas eleições para o parlamento, dentro da oferta de candidatos no partido de sua preferência, aquele (s) de sua opção pessoal. Em verdade, o carisma pessoal, e os clientelismos podem prevalecer no momento do eleitor lançar seu voto. Numa eleição para cargos executivos com poucos A dimensão esquerdo-direita, em geral, abrange respectivamente algumas sub-dimensões como: movimentos pró e contra o aborto, contra e a favor da pena de morte, estatização e privatização, etc. Atualmente os que trabalham em campanhas eleitorais procuram determinar algumas novas sub-dimensões emergentes: partidos “verdes”, “feministas”, “ruralistas” etc 7 Em verdade como entre nós, onde a maioria dos eleitores pertencem, (economicamente, isto é definidas por sua renda) às classes D e C, a propaganda de praticamente de todos os partidos elegem sub-dimensões no espaço polític, mais próximas das necessidades básicas das pessoas com renda correlata a estas classes: saúde, transportes, combate ao desemprego, planos assistenciais de ajuda a pobreza como bolsa família, etc. 6


15 candidatos, a escolha do eleitor resulta de uma integração em sua mente das diversas posições em cada uma das dimensões. Como se prevalecesse uma dimensão única na comparação entre os candidatos. Uma dimensão única, todavia, nem sempre joga um papel decisivo numa eleição. Configurar uma dimensão capaz de integrar várias sub -dimensões em determinado em determinado espaço político pluridimensional é tarefa complexa porque, inclusive, pode ocorrer uma anomalia conhecida por “maioria cíclica” percebida desde o final do século XVIII como “Eleito Condorcet”. Efeito Condorcet O efeito, ou paradoxo de Condorcet está articulado à questão da transitividade das preferências, condição indispensável, como mencionamos, à própria racionalidade do processo de tomada de decisão.8 Se João prefere maçãs a peras: M>P e estas a laranjas P>L conclui-se que prefere maçãs a laranjas.M>L. Assim é definida a transitividade das preferências. O efeito de Condorcet denuncia uma irracionalidade (intransitividade) da decisão coletiva apurada do cômputo da soma das decisões individuais transitivas. Imaginemos, num exemplo extremamente simples, três candidatos a determinado cargo eletivo e três possíveis ordens de preferência: Eleitor 1

Eleitor 2

Eleitor 3

A>B>C

B>C>A

C>A>B

Verificamos que “A” ganha de “B” e “B” ganha de “C” por dois votos a um. A intransitividade está em que “C” também ganha de “A” por dois a um. Evidentemente neste caso os eleitores decidiram segundo escalas preferenciais distintas. (Digamos o eleitor 1 segundo a dimensão da competência, o eleitor 2, segundo a da idoneidade e o eleitor 3 segundo a da afinidade étnica. Em casos semelhantes, situação também chamada de maioria cíclica, a ordem de disputa (numa disputa dois a dois) pode alterar o resultado No caso mencionado acima, suponhamos duas disputas seqüenciais dois a dois com as três ordens de preferências: Eleitor 1 A>B>C

Eleitor 2

Eleitor 3

B>C>A

C>A>B

Resultado Final

Alternativas (AxB) B ganha

(AxB) A ganha A ganha (2x1)

Primeira

(AxB) A ganha

Segunda

(AxC) A ganha

(AxC) C ganha

(AxC )C ganha C ganha (2x1)

Terceira

(BxC) B ganha

(BxC) B ganha

(BxC ) C ganha

B ganha (2x1)

A determinação do vencedor dependerá da formatação da agenda que indicará qual a primeira disputa entre as três alternativas possíveis. Em cada caso, a votação será resolvida por

A decisão ou escolha considerada lato sensu como a possibilidade de ordenar as preferências recobre tanto a decisão individual quanto a decisão coletiva. Esta última compreende a teoria de votos 8


16 dois votos a um. Dai se constata a importância da instância encarregada de agendar a ordem das votações. 9 A intransitividade característica do efeito Condorcet pode ocorrer na decisão coletiva , mas não na individual porque a dimensão predominante no espaço de escolha pode variar de eleitor para eleitor, mas é invariável no eleitor individual. Suponhamos a dimensão tradicional do espaço político, esquerda-direita , segundo esta dimensão, três candidatos D (de direita), E (de esquerda) e C (do centro) . Podemos imaginar que, nesta dimensão, os esquerdistas teriam a ordem E>C>D e os direitistas a ordem D>C>E. Os do centro se dividiriam segundo suas inclinações entre M>D>E e M>E>D. Não será possível, no entanto, imaginar-se nesta dimensão, eleitores que tivessem as escalas de preferência: D>E>M ou E>D>M . A eventual ocorrência dessa ordem de preferência indicaria que o (s) respectivo (s) eleitor (es) teria (m) votado segundo uma dimensão diversa da dimensão esquerda-direita. Não é difícil de se verificar tal aspecto, pois o paradoxo desaparece no momento em que se impõe uma unidimensionalidade ao exemplo formulado pelo próprio Condorcet.10 Eleições em dois turnos (runoff) Quando as formas democráticas de governo procuram um meio de legitimar a alocação da posse através de sua confirmação por meio do aval da composição da vontade coletiva composta pela adição das vontades individuais, o voto livre e universal é um dos métodos mais adotados para atingir esta finalidade.Como se pode, no entanto, estabelecer regras que devam ser seguidas para se compor as preferências pessoais de cada indivíduo afim de se aferir adequada e legitimamente a preferência coletiva? A diversidade das culturas e dos contextos políticos têm conduzido a uma variação dos sistemas de votação11 Um dos meios mais simples para se aferir a preferência coletiva, por meio Principalmente em votações realizadas em pequenos comitês. Jean Antoine Caritat de Condorcet nasceu em 1743. Cedo revelou sua paixão pela matemática a qual será o eixo de sua reflexão sobre a sociedade. Pretendia mesmo construir uma teoria social exata baseado na matemática. Filósofo iluminista é eleito para a Convenmção republicana em 1791, mas sua prisão é decretada em 6 de Julho de 1893 quando redige o seu Equisse des progrés de l´esprit humain, Descoberto e preso em 26 de Março de 1794, morre neste mesmo dia na prisão Bourg-la-Reine Condorcet descobriu o efeito que leva seu nome no qual prova como é difícil extrair uma opinião coletiva a partir de opiniões individuais. O próprio Condorcet ilustrou o efeito que leva seu nome com um exemplo onde examinou o voto de 60 eleitores que exibem a seguinte preferência: (CONDORCET in RASHED,R, 1974) 23 com a preferência: A>B B>C A>C isto é A>B>C 0 “ “ A>C C>B B>C “ “ A>C>B 2 “ “ B>A A>C B>C “ “ B>A>C 17 “ “ B>C C>A B>A “ “ B>C>A 10 “ “ C>A A>B C>B “ “ C>A>B 8 “ “ C>B B>A C>A “ “ C>B>A Este escrutínio revelará que Por 33 votos contra 27 A é preferido a B Por 42 votos contra 18 B “ “ C Por 35 votos contra 25 C “ “ A Isto significa que tanto A quanto B ou C obtém a maioria dos votos. Esta contradição, que equivale ao mencionado Efeito Condorcet mostra a intransitividade da opinião coletiva expressa pela fórmula A>B>C>A 11 Historicamente estas formas apresentam um aspecto curioso. Assim, de acordo com Plutarco, (350-430 dC) A Vida de Licurgo, (Eleições em Esparta): ”Nas eleições procedia-se da seguinte forma: Algumas pessoas selecionadas da população eram encerradas num quarto, perto do lugar onde se procedia a eleição, de tal forma 9

10


17 do voto individual, é o método pluralista, no qual o candidato que recebe o maior número de votos vence. Tal sistema oferece sérios inconvenientes como se pode ver no hipotético exemplo que segue. Imaginemos uma disputa entre meia dúzia de candidatos onde um deles recebe 20% e os cinco restantes, uma quantidade menor, (em torno de 16% cada um), mas que somadas inteiram 80%. Sob o argumento que, afinal de contas, o candidato vencedor tinha cerca de 80% de votos “contra” a sua candidatura e apenas 20% de votos favoráveis, os perdedores, às vezes, têm construído uma retórica para mobilizar a opinião pública contra a legitimidade da posse do candidato eleito sob este procedimento de maioria relativa.12 O sistema de segundo turno (runoff) para superar o critério da maioria relativa é então instaurado em vários países, inclusive no Brasil, consagrado pela constituição de 1988. 13 A regra da maioria absoluta requer que o vencedor tenha mais de 50% dos votos. É, como dissemos, o sistema brasileiro vigente após a Constituição 1988 para os cargos executivos. Mas a regra majoritária somente garante maioria quando existem apenas dois candidatos. Dai a razão do segundo turno quando, numa eleição de mais de dois candidatos, nenhum conseguir mais da metade dos votos válidos (ou totais) conforme a legislação em vigor. Existe um sistema perfeito? Estudos realizados nos últimos sessenta anos revelam que resultados de difícil legitimação podem ocorrer, qualquer que seja o sistema escolhido. A legitimidade das decisões coletivas aferidas por processos democráticos depende, de modo óbvio e fundamental, de um conceito matemático simples: o conceito de maioria. Eliminando o evento pouco provável de empate, em qualquer escolha dicotômica, um dos lados, deve receber mais da metade dos votos. Quando há três (ou mais opções), e nenhum dos candidatos obtiver a maioria absoluta ( mais de 50%), recorre-se ao segundo turno. A votação com segundo turno pode ser vulnerável a algumas táticas oportunistas. Uma delas denominada de push over, que consiste em votar um candidato impopular no primeiro turno com o intuito de “empurrá-lo” para o segundo turno.Com isto se evita que o candidato realmente preferido pelo eleitor tenha que enfrentar um rival poderoso. Assim, por exemplo, se numa eleição com três candidatos com previsão de A 38%, B 41% e C 19%, a tática do eleitor de A, no primeiro turno poderia ser a de votar em C para tentar colocá-lo no segundo turno, ao invés de B. Esta prática, todavia pode se revelar contra-produtiva, pois apoiando o candidato menos preferido ( C ) ao invés do realmente escolhido (A), o resultado do primeiro turno pode acabar eliminando A, ficando a disputa do segundo turno entre B e C.Uma outra tática é a do “compromisso”. Isto ocorre quando um candidato que sabe que não pode ir ao segundo turno, retira-se do pleito antes da ocorrência do primeiro turno assegurando que um candidato de sua preferência alcance o segundo turno.Retirando candidatos um partido político pode evitar o que não eram vistas nem podiam ver ninguém, mas apenas podiam ouvir o ruído da assembléia que ocorria em lugar próximo. A decisão sobre as eleições, assim como sobre outros assuntos, eram tomadas em proporção ao volume dos gritos dos eleitores reunidos am assembléia. Os competidores não eram apresentados em conjunto, mas um após o outro passavam em silêncio diante da assembléia.Aqueles encerrados no quarto ao lado possuíam tabuinhas de escrever consigo e iam anotando, sem saber qual o candidato, o volume respectivo dos gritos da assembléia.Apenas anotavam quem passava em primeiro lugar, segundo, terceiro, quarto, etc. Aquele que tivesse recebido a aclamação mais ruidosa era declarado senador, devidamente eleito” 12 Esta constituiu uma das razões para tentar de mobilização da opinião pública que culminou com a deposição de Allende em 1972. Este havia sido eleito com cerca de 40% dos votos. No Brasil Juscelino Kubitschek foi eleito presidente em 1955 com 33.8% dos votos (Especial Veja, BRASÍLIA 50 anos, Novembro de 2009, p.77). Tanto no caso da eleição de Allende como no caso de Kubitschek os inconformados e descontentes com os resultados destas eleições utilizaram o argumento da insuficiência da maioria relativa para tentar a desestabilização estes governos apenas instalados. No Brasil uma revolta de oficiais da aeronáutica denominada revolta de Aragarças, sítio de sua eclosão, aborta, mas o golpe de Pinochet é bem sucedido. 13 O sistema do segundo turno (runoff) é utilizado em vários países: França, Afganistão, Argentina, Austria, Bulgária, Chile, Croácia, Chipre, República dominicana, Finlândia, Ghana, Guatemala, Indonésia, Polônia, Poprtugal, România, Sérvia, Eslováquia, Ucrânia, Uruguai, Zimbábue, etc.


18 desperdiçar de votos de seus simpatizantes. .Um exemplo famoso foi a eleição presidencial da França em 2002 quando havia tantos candidatos de esquerda no primeiro turno, dividindo os votos, que acabaram por colocar dois candidatos de direita para o segundo turno: Jacques Chirac, com 19.88%, dos votos e Jean-Marie Lê Pen, com 16.86%. Lionel Jospin, o candidato mais votado entre os vários da esquerda, ficou com 16.18%, sendo eliminado do segundo turno. Um outro “efeito” possível das eleições com dois turnos é o chamado “efeito Ortega”. (BOUTON, 2009). O limiar mínimo de votos pelo qual o candidato pode ser eleito diretamente no primeiro turno pode ser menor do que 50%.(O’NEIL & JEFREY, 2007). Este limiar é então é pré definido e se nenhum candidato o alcançar, os dois mais votados passam automaticamente para o segundo turno.Uma idéia corrente é que quando se abaixa o limiar para um valor menor do que 50% no primeiro turno, isto pode incentivar muitos eleitores a votar no candidato “mais viável”, mesmo que não seja o candidato de sua preferência. Se verdadeira esta possibilidade, ela reforçaria a capacidade decisória do primeiro turno porque mais votos se concentrariam nos dois preferidos. Os eleitores teriam então menos medo de desperdiçar seus votos em candidatos não viáveis.Nesta base, tem sido defendida a idéia de que um limiar menor do que 50% evitaria a necessidade de organizar um segundo turno e os inconvenientes e despesas daí decorrentes. Bouton defende a idéia contrária, de que a diminuição do limiar não faz necessariamente com que os eleitores revelem suas reais preferências no primeiro turno Bouton considera o caso em que uma maioria dividida enfrenta uma minoria unificada. Neste caso, a maioria dos eleitores prefere o Candidato A ou B ao candidato C que perderia uma disputa, dois a dois seja com A ou seja com B. C seria então um “perdedor Condorcet”14 Em seguida Bouton mostra como C, mesmo sendo o menos preferido, pode vencer quando o limiar é menor do que 50% pela razão de que a maioria, mesmo nestas condições, pode dispersar seu voto. Esta excessiva dispersão de votos é então chamada por Bouton de “efeito Ortega”, após Daniel Ortega ter vencido a eleição de 2006 para a presidência de Nicarágua. Antes das eleições, as pesquisas de intenção de voto indicavam que, devido a divisão entre as forças direitistas, Ortega ganharia no primeiro turno. A despeito desta informação os eleitores de direita efetivamente se dividiram e Ortega ganhou com 38% dos votos contra 28.3 % e 27.1% de seus dois opositores.15 De acordo com o ponto de vista tradicional, o resultado fora um acidente, pois com um limiar abaixo de 50% os eleitores de direita não deveriam ter dividido seus votos o que foi contradito no resultado efetivo das eleições. Bouton denominou ocorrências deste tipo de “Efeito Ortega” . Este efeito é então um forte argumento contra a diminuição do limiar de 50% para o resultado do primeiro turno, pois, novamente reaparecem os argumentos da falta de legitimação para um candidato que conte com menos votos do que seus opositores somados, notadamente quando estes pertencem a mesma corrente ideológica. Não obstante, em vários países o limiar é menor do que 50%16 .

Convencionou-se chamar de “Perdedor Condorcet, (Condorcet Loser), numa disputa entre vários candidatos, aquele que perde numa disputa dois a dois, com qualquer deles e “Vencedor Condorcet” aquele que, ao contrário, ganha uma disputa dois a dois com qualquer dos demais (RIKER, W,H, 1990) 14

O sistema eleitoral de Nicarágua determinava que um candidato ganharia no primeiro turno se obtivesse mais de 40% dos votos ou mais de 35% se, adicionalmente, superasse em mais de 5% seu mais próximo antagonista. 16 Como visto acima, na Nicarágua o limiar depende da margem da vitória. No Equador é de 50% mas cai para 40% se o candidato tem mais de 10% de diferença com seu antagonista mais próximo. 15


19 Modos de aferir a vontade coletiva. Vários procedimentos de votação têm sido propostos, (EPSTEIN, 1997: 273:295) inclusive com o intuito evitar o aparecimento do Efeito Condorcet. O paradoxo da intransitividade da preferência coletiva apurada através da soma de preferências individuais, preocupou matemáticos, lógicos e cientistas políticos desde o século XIX, inclusive Lewis Carrol, o autor de Alice no País das Maravilhas. No voto por aprovação, também chamado de voto alternativo, o eleitor marca na célula cada candidato que tem sua aprovação. O candidato com o maior número de votos é eleito.Nesse sistema nunca é vantagem para o eleitor reprimir o voto para sua primeira escolha, direcionando-o a outro candidato de com menor preferência (voto útil ou estratégico). Se todos os candidatos tiverem igual chance de vitória, o eleitor votará naquele que preferir. Votar em maior número de escolhas dará apoio a candidatos rejeitados, votar em menor número( digamos apenas na primeira escolha) arriscará a vitória de um candidato inaceitável. O voto de aprovação tem sido descrito como um eleitor, n votos. A descrição é adequada porque o eleitor pode votar em cada candidato aceitável. Torna, inclusive, menos freqüente a necessidade do segundo turno para garantir a legitimidade da maioria de votos.17 No sistema de votação por pontos o número de votos dados a primeira escolha é multiplicado por um coeficiente, digamos “n”, a segunda escolha por “n-1” e assim sucessivamente. No sistema de voto plural , o candidato que receber o maior número de votos é eleito, obtenha ou não, a maioria de 50% mais um de votos. Tal sistema tem o inconveniente, como vimos, de não garantir a legitimidade (maioria absoluta) ao candidato vencedor. Muitos países (um exemplo é a Bolívia), para contornar este fato, deixam a decisão final da escolha entre os mais votados, para o Congresso. Pode ainda ocorrer que em determinados casos, os resultados computados pelos vários sistemas mencionados não coincidam. Um exemplo didático pode ilustrar tal fato. Suponhamos que 27 vereadores da câmara de uma cidade devam escolher entre três alternativas para executar melhoramentos em seus municípios: “A”, construção de um posto de saúde; “B”, edificar uma escola de ensino fundamental; “C” recapear uma estrada municipal. A ordem de preferência dos 27 vereadores com relação a estas opções seria: (11 vereadores: A>B>C) ; (9 vereadores: B>C>A ); (7 vereadores: C>A>B) Deste ordenamento conclui-se que: A opção A é preferida a B por 11+7=18 votos contra 9 “

B “

A

C “

“ C “ 11+9=20 votos A

7

9+7= 16 votos “ 11

Ocorre o mencionado fenômeno da maioria cíclica onde qualquer das três opções obtém a maioria.No sistema de voto plural, o resultado seria: A= 11; B=9; C=7 com a conseqüente vitória de A. No sistema de segundo turno, A enfrentaria B com a eliminação de C. Nos votos da ordem de preferência, C>A>B, A>B são 2; nos votos da ordem C>B>A, B>A são 5. Portanto o resultado da votação seria, obedecidas as ordens de votação: O voto por aprovação ou alternativo, já mencionado, foi objeto de uma proposta que o cientista político Bolívar Lamonier, coordenador dos estudos IEA USP levou à Federação das Industrias de São Paulo. (Cf Folha de São Paulo, 19 de Agosto de 2003, I:10) 17


20 A = 11 +2 -13 votos e B= 9+5=14 com a conseqüente vitória de B. Um outro sistema, chamado de Borda, (já mencionado como o sistema de pontos) seria o de alocar pesos proporcionais à ordem de preferência. Assim, por exemplo, o primeiro lugar teria o coeficiente 3, o segundo, 2 e o terceiro, 1. A aferição, do mesmo exemplo citado acima seria: A = (11x3) + (7x2) + 13 = 56; B= (9x3)+ (13x2) + 5 =58; C= (7x3) + (7x2)+ 13= 48 Finalmente, pelo sistema da aprovação, são aferidas a primeira e a segunda opções e o resultado seria: A= 11+1+1=13 B = 9+4+1 = 14 com a vitória de B. Verificamos aqui, que quando ocorre a maioria cíclica, os resultados podem eventualmente variar conforme o sistema adotado para a aferição dos votos. Existe um sistema “melhor” ou mais adequado do que os outros? Esta problemática, essencial a um regime democrático, refere-se essencialmente à questão de se saber como podem ser estabelecidas regras a serem seguidas para se compor preferências individuais de cada elemento de um grupo, coletividade ou mesmo nação, de maneira a legitimar a decisão coletiva procedente. das opções individuais. A partir da descoberta de Condorcet, esta questão se tornara aflitiva para os cientistas sociais e políticos. A questão, não obstante, foi formulada com precisão por Keneth Arrow, ganhador do prêmio Nobel de economia em 1972. Arrow enunciou ,cinco condições18 fundamentais essenciais a todo regime democrático. Estas condições são consideradas pela maior parte dos especialistas como perfeitamente razoáveis para qualquer procedimento de tomada de decisão coletiva que se fundamenta em preferências individuais expressas por meio do voto. Arrow demonstra, todavia, que é impossível fazer prevalecer a vontade da maioria sem infringir uma das cinco condições por ele enunciadas. Este paradoxo provocou considerável impasse no seio das ciências políticas, impasse que foi considerado por alguns autores (como e economista Paul Samuelson) como equivalentes aos teoremas de inconsistência formulados por Kurt Godel que tinham abalado os fundamentos da matemática. A problemática de Arrow, tem origem no paradoxo de Condorcet. Este acreditava que o desenvolvimento científico e os procedimentos democráticos de governo promoveriam o Arrow (1963) formulou alguns axiomas em seu trabalho constituídos por cinco condições fundamentais a todo processo coerente para a determinação da vontade coletiva num regime considerado democrático. Nestes regimes, nos quais a vontade coletiva deveria representar a soma das vontades individuais, tais condições deveriam ser respeitadas. 1. Abrangência universal A constituição democrática deve ser capaz de agregar qualquer configuração possível de votos. Não sendo possível predizer todos os padrões de conflitos que podem surgir na vigência da constituição, esta não deve ser infringida quando surgem certas configurações de preferências de votos. A constituição deve, por esta razão, ter abrangência capaz de resolver todas as controvérsias possíveis. Assim, quaisquer que sejam as preferências dos membros da coletividade, o procedimento de aferição da vontade coletiva deve ter em conta uma e apenas uma ordem de preferência. 2.Unanimidade: a vontade coletiva deve estar de acordo com as preferências de seus membros. Quanto maior o número de pessoas que exprimirem uma determinada preferência, no mesmo grau, a vontade coletiva deve estar de acordo com tal preferência. 3.Determinação por pares a ordenação coletiva de um par de alternativas deve depender apenas das ordenações individuais dessas alternativas, significando que se a vontade coletiva preferir X a Y (reflexo da soma das vontades individuais) e se as preferências individuais mudarem com respeito a outros pares de alternativas, (U,V) (A,B) etc. mas se mantiver invariável com relação a X e Y, a preferência coletiva deveria respeitar esta invariância. 4. A coletividade não deve prejulgar suas escolhas. Para duas escolhas, X e Y, há necessariamente um certo número de preferências individuais possíveis que permitem à coletividade preferir X a Y. 5. Para a coletividade nenhum indivíduo prejulga suas escolhas. As escolhas da sociedade podem não ser idênticas à escolha de qualquer indivíduo isoladamente 18


21 progresso moral e material da sociedade, demonstando, ao mesmo tempo, que a vontade coletiva expressa pelo voto pode se mostrar intransitiva e conter, por isto, um elemento de irracionalidade. Condorcet estendeu a crença absoluta na razão e no progresso científico aos assuntos humanos. “Todos os erros na política e na moral são baseados em erros filosóficos e estes, por sua vez, conectados a erros científicos” (CONDORCET, 1793). Ironicamente, este filósofo iluminista, convicto da razão universal como instrumento de maioridade e liberação do homem, deduz um fator de irracionalidade no processo de transferir as vontades individuais livremente dispostas, à vontade coletiva. A indagação que permanece é a de se saber se as cinco condições de Arrow, impossíveis de serem obedecidas simultaneamente, constituem na prática e em certas circunstancias um obstáculo tangível à transferência adequada e racional do voto individual à vontade coletiva. Existe uma condição bem conhecida que evita a ocorrência do paradoxo do voto: o fenômeno da existência do chamado pico máximo apontado por Duncan Black nos anos 40 (BLACK, 1958). Esta condição ocorre usualmente quando candidaturas (em eleiçoes) e temas (em comitês) são avaliados segundo um único critério ou dimensão.. A condição de pico único e sua relação com o paradoxo do voto constituiu uma importante descoberta , pois sugere que o paradoxo do voto ocorre, na prática com menor freqüência que se poderia supor. Se os eleitores comungam um quadro de referência comum na análise de determinada questão, suas preferências se organizarão segundo um pico único não importando o quanto eles possam diferir no interior desta dimensão. A existência de uma dimensão única evita a ocorrência do paradoxo do voto. Finalmente, cumpre indagar: Qual a relação destas considerações teóricas com a problemática da organização da opinião pública em torno de partidos políticos, condição essencial das democracias representativas? As mudanças no espaço político A conclusão dos cientistas políticos, como vimos, é que a freqüência do paradoxo do voto é menor quando as escolhas operam, em sua maioria, num espaço político unidimensional ou onde diversas dimensões se aglutinam em um número bem menor. Isto tem prevalecido nas democracias representativas desde o século XIX com a tradicional dimensão liberalconservadora, ou esquerda-direita. Em verdade esta dimensão aglomerava ou ainda aglomera, como já vimos, algumas sub-dimensões: a favor ou contra o aborto, a favor ou contra a pena de morte, maior distribuição de renda, direitos das minorias, estado laico, etc. Em política internacional, o tratado de não agressão entre Stalin e Hitler de 1939 às vésperas da segunda guerra mundial começou a borrar as tradicionais diferenças entre esquerda e direita. Com o final da segunda guerra mundial e o advento das chamadas “cortina de ferro” e “guerra fria” entre os países sob influencia soviética e as chamadas democracias ocidentais, o eixo divisório da dimensão esquerda-direita parece ter se deslocado para o totalitarismo de um capitalismo de estado, com seus argumentos de promoção de maior justiça social a custa da supressão de certas liberdades individuais, de um lado e as democracias ocidentais com sua economia, pelo menos nominalmente liberal, de outro. Com isto as dimensões do espaço político começaram a se fragmentar.Com a queda do muro de Berlim e a transformação das repúblicas do Leste europeu, onde imperava o “socialismo real”, em repúblicas pluralistas, a dimensão esquerda-direita, tem perdido ainda mais sua relevância. Outras dimensões tem avançado como a do fundamentalismo religioso- estado politicamente laico, minorias étnicas em alguns países europeus, países emergentes-países industrializados, e mesmo temas mais paroquiais que passam a ser divisor de águas entre os eleitores e substituem os grandes debates ideológicos.


22 Ora, como vimos, a substituição de uma divisão privilegiada do espaço político por outras mais fragmentadas e, às vezes incomunicáveis, favorece o aparecimento do efeito Condorcet. As características do eleitor racional, cujo atributo individual é a transitividade de suas preferências pode, ao ser transferida à vontade coletiva, resultar em intransitividade quando as dimensões do espaço político se multiplicam em excesso. Uma das maneiras de evitar tal fragmentação do espaço público em múltiplas dimensões, algumas irredutíveis a um denominador comum e por isto, favorecendo o aparecimento do paradoxo da integração dos votos individuais numa legítima decisão coletiva, é a redução do número de partidos políticos.Os programas dos partidos (e é esta justamente uma de suas funções) devem privilegiar suas respectivas posições em relação a determinadas dimensões do espaço político.Em torno delas devem ser travados os debates e matizados os conflitos. Deste modo é reduzida a possibilidade da incompatibilidade entre as dimensões do espaço político, e conseqüentemente o aparecimento do efeito Condorcet. Tal problemática afeta os países de maneira diversa. Devemos lembrar que as democracias ocidentais mais estáveis concentram as opções partidárias em duas ou, no máximo três, mais importantes (Estados Unidos, Reino Unido). A própria França da Quarta República (1945-1958), devido a instabilidade política devido a sucessão muito rápida no poder das coalizões partidárias, foi levada após a volta de De Gaulle a presidência em 1958, a uma reforma constitucional (Quinta República) onde a par de um acréscimo de poderes ao presidente da república houve uma redução do número de partidos políticos. A redução do número de partidos políticos pensamos, contrariamente a alguns analistas (LESSA,1993), longe de ser danosa, tornaria os resultados mais assimiláveis ao eleitor. Se ocorre algum esvaziamento da dimensão tradicional esquerda-direita em países com sólida tradição partidária, no Brasil onde os partidos se multiplicam sem muita coerência programática, as composições e as alianças em nível nacional e, mais ainda, em nível regional, mostram a existência de múltiplas dimensões, por meio das quais o eleitor brasileiro escolhe seus candidatos. Desenhar as principais linhas de força, diretrizes e características de tais dimensões é tarefa das mais importantes da pesquisa em ciência política entre nós. Esse dado empírico, deve preceder qualquer reforma eleitoral básica, idéia que não é de hoje, (BOTÃO, 1994), pois o número de partidos políticos deve ter correlação com as principais dimensões do espaço político. Como viabilizar um sistema político representativo que possa tornar mais adequada e legítima a aferição da vontade coletiva.? Como organizar o espaço político em linhas de força de modo a evitar a emergência de fenômenos do tipo efeito Condorcet? Estas e outras indagações e questões deverão ser devidamente equacionadas para se imaginar uma forma de aferir a vontade coletiva por meio do voto individual capaz de reduzir algumas das tensões derivadas do fato de o eleitor se sentir mal representado em seus verdadeiros anseios, opiniões e atitudes. Dentro da complexidade das questões que afligem nossa sociedade, um pouco mais de racionalidade nos processos de verificação e aferição da vontade coletiva pode ser útil para justificar o sistema da democracia representativa Referências bibliográficas ARROW, K, J Social choice and individual values, John Wiley, & Sons, Inc.1963 BLACK, D The theory of commites and elections, Cambridge, Univ.Press,1958 BOBBIO, N et al. Dicionário de Política, Brasília, UnB, 1986 BOTÃO,P,R Sistema eleitoral partidário; aurgência de mudanças, IMS, 1994, (mimeo)


23 BOUTON, L “Runoff Elections and the Condorcet Loser: the Ortega Effect”, ECARES, Université Libre de Bruxelles, (mimeo) 2009. e-mail: <lbouton@ulb, ac.be> CONDORCET, M,J,N.C Esquisse d´ um tableau historique des progrés de l’esprit humain, 1793 Idem “A teoria matemática das eleições” in RASHED,R (Org) Matemáticas y Sociedad México, Fondo de Cultura Economica, 1990 EPSTEIN,I “O paradoxo de Condorcet e a crise da democracia representativa”, in Estudos Avançados, 30, Maio, Agosto de 1997) GRANGER,G,G La mathematique sociale du marquis de Condorcet. Ed.Odile Jacob 1988 LESSA, E A teoria da representação mínima, Folha de São Paulo, 3 Fev. 1995:I-3 O’NEIL, ,JEFREY, “Choosing a Runoff Election” Public Choice, 131, 2007, pp.351,364. RIKER,W,H “Heresthetic and Retoric in Spacial Model” in ENELOW,J,M & HINICH,M,J Advances in the Spacial Theory of Voting, Cambridge, Univ. Press, 1990.


24

Propaganda política e totalitarismo Adolpho QUEIROZ Kleber CARRILHO19 Desde que existem competições políticas, isto é, desde o início do mundo, a propaganda existe e desempenha o seu papel. Jean-Marie Domenach, A propaganda política

Este artigo pretende fazer uma revisão de literatura sobre os principais paradigmas da propaganda política contemporânea. Ele aborda aspectos contemporâneos disseminados a partir das visões teóricas de Jean Maria Domenach, Sergei Tchackotine, Nelson Jahr Garcia, Antonio Gramsci, Max Weber, Pizarroso Quintero, Peter Burke, Maquiavel, entre outros. 1.1 – Poder e comunicação na Antigüidade Embora a propaganda política da maneira como conhecemos hoje, tecnicamente desenvolvida com o intuito de conquistar a opinião pública ou um certo número de votos, só tenha aparecido durante o século XX, as relações entre poder e comunicação remontam os mais distantes grupos humanos organizados. O termo comunicação, pelo fato de poder ser entendido como um derivado do latim communicare, ou seja, “tornar comum, partilhar, repartir, associar, trocar opiniões, conferenciar” (RABAÇA; BARBOSA, 1987, p.151), indica que comunicar inclui a participação, a interação, na emissão e no recebimento de informações. Já durante a Antigüidade, nas aldeias, entre os clãs e as tribos, era necessário, para quem mantinha o poder nas mãos, interagir com seus governados, mostrar suas ações, legitimar a origem de seu poder, conquistá-los para as mais diversas atividades em conjunto, fossem elas guerras ou mudanças de territórios. A conquista e a manutenção do poder sempre foram os principais objetivos de qualquer grupo ou líder político. E isso jamais pôde ser feito de outra maneira senão através de um bom trabalho de comunicação, mesmo quando acompanhado pela força física coercitiva. Como o poder de todos os agrupamentos humanos na Antigüidade se baseava também na ligação com o místico e com o divino, a comunicação do poder e a comunicação religiosa andaram de mãos dadas por grande parte do tempo. O líder político era também um líder religioso, que em geral tinha o monopólio, ao lado de um pequeno grupo, da comunicação direta com as divindades. Nas teocracias do Egito, da Mesopotâmia, e mesmo entre os hebreus, herdeiros dos mesopotâmicos, a comunicação então era de primordial importância para a dominação da população. Apenas pequenos grupos, em geral os escribas e os sacerdotes, tinham acesso à comunicação escrita, e tinham a missão de passar ao restante do povo as determinações dos deuses e dos detentores do poder. Mesmo em civilizações mais distantes da formação do pensamento ocidental, como a chinesa, essa característica se repetia, demonstrando uma relação estreita entre o domínio político-religioso e a posse dos instrumentos e dos meios de comunicação. Segundo alguns autores, essa importância é tão grande que o surgimento da concepção de formação política (um Estado ainda rudimentar) estaria estreitamente ligada ao aparecimento da escrita. De acordo com CÁDIMA (1996, p.39): Adolpho Queiroz é doutor em comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo e Kleber Carrilho é mestre em comunicação e professor da Universidade Metodista de São Paulo. 19


25

Ora, sabendo-se que é com o fim do nomadismo recolector que surgem exactamente as economias produtora e de mercado, e, por acréscimo, se solidificam as sociedades em que se começa a notar a estratificação social, então concluir-se-ia que a escrita estaria também na base da própria emergência das sociedades com Estado. Por aqui se pode ir também ao encontro do que Jack Goody defende, a saber, que exactamente a variação dos modos de comunicar é tão determinante nas mudanças histórico-sociais como a dos modos de produzir. Ainda sobre essa importância da comunicação escrita no desenvolvimento do poder das civilizações da Antigüidade, o antropólogo LÉVI-STRAUSS disse que o único fenômeno que nos surge sempre e em todo o lado ligado à aparição da escrita, não só no Mediterrâneo oriental como também na China proto-histórica, e ainda nas regiões da América em que os esboços da escrita apareceram antes da conquista, é o da constituição de sociedades hierarquizadas, compostas de senhores e de escravos, sociedades essas que utilizavam uma certa parte da sua população em trabalho a favor da outra parte. E quando nos pomos a questão sobre quais teriam sido as primeiras utilizações da escrita, é óbvio que essas utilizações foram, em primeiro lugar, as que interessavam ao poder: inventários, catálogos, recenseamentos, leis e ordens (apud CÁDIMA, 1996, p.40). Pode-se afirmar então que a comunicação, a escrita e a aquisição da linguagem estão entre os principais elementos fundadores das instituições políticas e sociais, e por isso são determinantes das decisões dos detentores do poder, definindo assim o comportamento dos governados. A possibilidade de Estados maiores, com controle sobre diversas cidades, também só foi possível com uma máquina de comunicação mais desenvolvida. A possibilidade de transmitir os códigos e os desejos do poder central ficava facilitada com publicações que tinham como finalidade a manutenção do poder. Na Grécia, isso pode ser verificado tanto no domínio sobre outros povos quanto na própria organização política das pólis, ou cidades-Estado. A democracia em Atenas, por exemplo, acontecia através de uma desenvolvida estrutura de comunicação, baseada principalmente em grandes discursos, que deixaram conhecidos através dos tempos vários oradores, que eram também chamados de demagogos, aqueles que conquistavam o povo pela palavra. No momento das decisões na ágora, os defensores de diferentes idéias conquistavam os demais cidadãos pela exposição de seus argumentos, para que as escolhas se dessem da maneira mais racional possível. Era de tal importância a utilização da comunicação persuasiva que os gregos deram origem à retórica, ou o estudo das estruturas do discurso. A importância dos gregos nessa área é tão grande que, de acordo com CITELLI (2004, p.7), falar em persuasão implica, de alguma maneira, retomar certa tradição do discurso clássico – sobretudo conforme exercitado na Grécia – em


26 que podem ser lidas formulações posteriormente desenvolvidas pelos estudos de linguagem. A referência ao espaço cultural e lingüístico do mundo clássico é necessária, visto que a preocupação como domínio da expressão verbal em sua vertente oratória possuía enorme importância entre os gregos. E não poderia ser diferente, pois, praticando um certo conceito de democracia, e tendo de expor publicamente suas idéias, ao tribuno grego cabia manejar com habilidade as estratégias argumentativas com a finalidade de lograr a persuasão dos auditórios. Daí a larga tradição dos sofistas, dos retores, dos tribunos, aqueles que iam às praças públicas, aos foros, intentando inflamar multidões, alterar pontos de vista, mudar conceitos pré-formados. Demóstenes, Quintiliano e Górgias foram alguns desses nomes que ficaram conhecidos pela habilidade com que encaminhavam seus discursos de convencimento. Entre os romanos, herdeiros de grande parte das tradições dos gregos, a importância da comunicação na política também foi muito grande. Para a manutenção do poder pelo enorme território conquistado, foi desenvolvida uma espécie de boletim, onde eram publicadas as decisões do imperador, para que todo o império fosse informado. Chamavam-se acta diurna, e chegavam aos governantes de todos os pontos do mundo então conhecido. Também na política dentro de Roma, a importância dos grandes oradores era muito grande. Anteriormente, ainda no período republicano, foi um grande discurso que mudou os rumos da história: Brutus matou Júlio César, seu protetor, para salvar a República; tentava evitar a ascensão de um ditador, mesmo que este ditador fosse seu amigo. Um único discurso – o esplêndido discurso de Marco Antônio à beira do túmulo de César – mudou a imagem que seria transmitida pela História: transformou o aspirante de ditador em herói e o salvador da República em traidor (BRICKMAN, 1998, p.161). Embora essa comunicação do poder na Antigüidade não tivesse ainda os instrumentais de planejamento e pesquisa presentes nas grandes campanhas do século XX, DOMENACH (1963, p.8) diz que “desde que existem competições políticas, isto é, desde o início do mundo, a propaganda existe e desempenha seu papel. Foram, por certo, uma espécie de campanha de propaganda, aquelas movidas por Demóstenes contra Filipe ou por Cícero contra Catilina”. Ao mesmo tempo, DOMENACH também demonstra que novamente a comunicação religiosa foi responsável pela utilização do termo que hoje usamos para os mais diversos tipos de comunicação persuasiva, seja ela a política, a de venda ou a religiosa: a propaganda. A palavra que a designa é, ela também, contemporânea do fenômeno: propaganda é um dos termos que destacamos arbitrariamente das fórmulas do latim pontifical; empregada pela Igreja ao tempo da Contra-Reforma (De Propaganda Fide), é mais ou menos reservada ao vocabulário eclesiástico até irromper na língua comum, no curso do século XVIII (DOMENACH, 1963, p.10). Nota-se aí novamente a estreita relação histórica entre política e religião no desenvolvimento da comunicação persuasiva.


27 1.2 – A comunicação na concepção do Estado moderno A partir do século XV, já no final da Idade Média, quando as primeiras concepções do Estado moderno razoavelmente separadas da dominação da Igraja apareciam, a preocupação com a comunicação e com o desenvolvimento da imagem pública dos governantes também era de extrema importância. Num dos principais clássicos da Ciência Política, O Príncipe, desenvolvido no intuito de aconselhar um nobre italiano sobre a conquista e a manutenção do poder, MAQUIAVEL (1995, p.107-136) se preocupa com questões como o desenvolvimento pelo mandatário de uma imagem de cruel ou piedoso frente ao povo, de como ele deveria prometer benefícios e manter a palavra dada, além de dizer como ele deveria evitar ser desprezado ou odiado e também como saber se comportar para ser consid erado pela nobreza e pelo povo. Um desses conselhos diz: Deve um príncipe, contudo, ter grande cuidado para que jamais lhe saia da boca algo que não esteja prenhe daquelas cinco qualidades, parecendo, assim, aos que vêem e ouvem, todo piedade, todo lealdade, todo integridade, todo humanidade, todo religião. E nada mais é necessário aparentar possuir do que esta última qualidade. Os homens, em geral, julgam mais com a vista do que com o tato, eis que ver é dado a todos, sentir, a poucos. Todos vêem o que pareces ser, poucos sentes o que és; e estes poucos não ousam opor-se à opinião de muitos que contam com a majestade do Estado para a sua defesa (MAQUIAVEL, 1995, p.113). Essa preocupação com a opinião pública e com a importância de conseguir o apoio popular através de uma comunicação bem desenvolvida foi também de enorme importância na França, já entre os séculos XVII e XVIII, quando o “Rei Sol” Luís XIV, em seu grande período no trono, desenvolveu táticas bastante arrojadas. BURKE (1992) diz que ele foi o precursor do marketing político moderno. QUEIROZ (1999, p.70) ressalta que Luís XIV, para isso, foi o indutor da criação de pinturas, tapeçarias, medalhas comemorativas, moedas, livros, construção de palácios, como o de Versailles, ou monumentos, como o Arco do Triunfo, além de ter sido ator teatral, entre outras ações desenvolvidas como o objetivo de torná-lo popular perante a sociedade francesa da época. Já no final do século XVIII, durante o movimento de independência e de formação dos Estados Unidos da América, a utilização da comunicação persuasiva, principalmente através da imprensa, foi muito grande, com o intuito desenvolver uma formação política ao povo norteamericano. Vários artigos foram escritos, principalmente por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, e publicados em jornais de Nova York. Suas defesas da forma federalista, contrário à Confederação, contribuíram para a formação da Constituição dos Estados Unidos, e conquistaram a população para essa causa. Segundo LIMONGI (apud WEFFORT, 1999, p. 249), tais artigos tinham como intenção demonstrar ao povo americano que o controle dos governos deveriam estar o mais próximo possível, de preferência nos Estados. Essa foi uma das primeiras e mais importantes utilizações de veículos de comunicação de massa para a conquista de reformas políticas com o apoio popular.


28 Pode-se ainda verificar a utilização de aparatos de comunicação de massa para a conquista da população também durante a Revolução Francesa, pelos mais diversos grupos que a desenvolveram. De acordo com DOMENACH (1963, p. 20-21), os primeiros discursos de propaganda, os primeiros encarregados de propaganda (entre outros, os comissários junto aos exércitos) partiram dos clubes, das assembléias, das comissões revolucionárias; foram eles que empreenderam a primeira guerra de propaganda e a primeira propaganda de guerra. Uma nação, pela primeira vez, libertava-se e organizava-se em nome de uma doutrina subitamente considerada universal. Uma política interior e exterior, pela primeira vez, fazia-se acompanhar pela expansão de uma ideologia e, por isso mesmo, segregava a propaganda. Surgiram, então, todos os recursos da propaganda moderna: a Marselhesa, o barrete frígio, a festa da Federação, a do Ser Supremo, a rede dos clubes jacobinos, a marcha sobre Versalhes, as manifestações de massa contra as Assembléias, o cadafalso nas praças públicas, as críticas violentas de L’Ami du Peuple, as injúrias de Père Duchêne. Mais tarde, durante o século XIX, os diversos movimentos de caráter socialista usaram muito os veículos de comunicação de massa para conquistar trabalhadores de toda a Europa, o que resultaria num desenvolvimento ainda maior da propaganda no mais importante regime comunista resultante desse período, como se verá adiante. De acordo com Marx, era “preciso tornar a opressão real ainda mais dura, ajuntando-lhe a consciência da opressão, e tornar a vergonha ainda mais humilhante, dando-a publicidade” (apud DOMENACH, 1963, p.26). 1.3 – O papel da comunicação nos três tipos de dominação legítima Como já foi visto, a principal função da comunicação política, desde seus primórdios, é a legitimação do poder. Governantes sempre necessitam, de alguma maneira, demonstrar à população os motivos pelos quais ele tem o direito de mandar, coordenar e decidir os rumos de todo o grupo. No entanto, embora sempre a comunicação tenha o papel de demonstrar a legitimidade, a dominação pode se dar de maneiras distintas. No início do século XX, MAX WEBER (1970, p.57) desenvolveu uma tipificação da dominação política. De acordo ele, existem três razões internas que justificam a dominação, e, por conseguinte, existem três fundamentos da legitimidade. Num momento anterior, a autoridade do “passado eterno”, que é a “dos costumes santificados pela validez imemo rial e pelo hábito, enraizado nos homens, de respeitá-los”. Este é chamado de “poder tradicional”, que o patriarca ou o senhor das terras exercia. Neste tipo de dominação estão as teocracias, nas quais em geral há uma relação entre o governante e alguma divindade ou uma outra tradição histórica, fazendoo ser seu representante ou seu descendente direto. Para a manutenção do poder tradicional, há a necessidade da construção de relatos e histórias que legitimem essa relação, de forma que os governados acreditem e aceitem a dominação. Em segundo lugar, WEBER, M. (1970, p.57) expõe a autoridade que se funda em dons pessoais e extraordinários do indivíduo (carisma) – devoção e confiança estritamente pessoais depositadas em alguém que se singulariza por qualidad es prodigiosas,


29 por heroísmo ou por outras qualidades exemplares que dele fazem o chefe. Tal é o poder “carismático”. Este tipo de dominação era exercido na Antigüidade pelo profeta ou pelo chefe guerreiro. Além disso, grandes generais, demagogos e dirigentes de partidos políticos podem ser incluídos. A comunicação neste caso é extremamente importante para apresentar e desenvolver a imagem pública do líder carismático, fazê-lo se manter como tal, sem que o povo se decepcione ou deixe de acreditar nos seus “poderes extraordinários”. Ainda existe o terceiro tipo de dominação legítima, que é o baseado na “‘legalidade’, em razão da crença na validez de um estatuto legal e de uma ‘competência’ positiva, fundada nas regras racionalmente estabelecidas ou, em outros termos, a autoridade fundada na obediência, que reconhece obrigações conformes ao estatuto estabelecido” (WEBER, M., 1970, p.57-58). Essa é a tipo “racional-legal” de dominação, em que é importante o respeito às leis, às normas e às regras propostas e aprovadas anteriormente. É o tipo de dominação que hoje se encontra na maioria dos países ocidentais, onde o respeito a uma Constituição é a principal razão da manutenção do governo. Neste caso, a comunicação é importante para mostrar aos governados as ações dos governantes, destacando a legalidade dos seus atos. Sobre a obediência, WEBER, M. (1970, p.58) diz: É indispensável dizer que, na realidade concreta, a obediência dos súditos é condicionada por motivos extremamente poderosos, ditados pelo medo ou pela esperança – seja pelo medo de uma vingança das potências mágicas ou dos detentores do poder, seja a esperança de uma recompensa nesta terra ou em outro mundo. A obediência pode, igualmente, ser condicionada por outros interesses e muitos variados. (...) Seja como for, cada vez que se propõe interrogação acerca dos fundamentos que “legitimam” a obediência, encontram-se, sempre e sem qualquer contestação, essas três formas “puras”, que acabamos de indicar. No entanto, embora esses três tipos sejam importantes para a compreensão da dominação política, ainda segundo WEBER, M. (1970, p.58) “na realidade, só muito raramente se encontram esses tipos puros”. Na verdade, as estruturas de poder e os governantes se mantêm, em geral, graças à junção de dois ou mesmo s dos três tipos de dominação, para que todo o povo os aceite. É importante notar então que determinadas ações de comunicação política têm funções específicas de apresentar à população algumas dessas características do governante, podendo ser um resgate de tradições históricas anteriores, uma demonstração de suas qualidades “superiores” ou “extraordinárias”, revelando-o um homem ideal para o poder, ou ainda levando a crer que os aspectos racionais e legais estão sendo respeitados, constituindo um ambiente de normalidade e respeito às normas.


30 1.4 – Propaganda política nos regimes totalitários De acordo com ANTONIO GRAMSCI, citado por MARIA HELENA WEBER (2000, p.151), dois tipos de controle político são usados para que seja garantido o funcionamento de um regime: a dominação direta do conjunto da sociedade, através da força e da coerção física, e a direção exercida através do controle e dominação ideológicos. Nenhum Estado, no entanto, funciona desenvolvendo apenas ações repressivas; em algum momento, ele tem de conquistar a legitimidade e obter o consenso do conjunto da sociedade, em particular das classes subalternas. No século XX, os governos têm realizado grandes investimentos – políticos e financeiros – para criar complexas estruturas de comunicação. Essa estratégia transformou o exercício do poder ditatorial e demonstrou quão eficaz pode ser a comunicação para a política. Por isso, no estudo da propaganda política, é preciso recorrer a alguns momentos históricos fundamentais do século XX. Foi durante todo este século que se viu com ênfase a propaganda como uma das grandes armas para a manutenção dos poderes nos regimes totalitários. Historicamente, os regimes totalitários sempre têm a presença de grandes aparatos de comunicação e propaganda. Seja nos regimes de Lênin, Hitler, Stálin ou Mao Tsé-Tung, mesmo quando fundados por uma grande repressão e coerção, o papel da propaganda é fundamental para a manutenção do poder. Em uma discussão sobre totalitarismo, HELLER (2002, p. 40-41) diz: Não existe apenas um tipo de totalitarismo, e sim várias espécies de sociedades totalitárias. O sistema nazista foi apenas um dos sistemas totalitários. (...) Para mim, regime totalitário é todo aquele em que o pluralismo é privado de legalidade. É evidente que não há sociedade moderna na qual não exista pluralismo. Mas no sistema totalitário os partidos e seus líderes decidem o que deverá ou não ser ilegal. E o que excluem do domínio da legalidade é, por definição, pluralismo. Podem ser excluídas a pintura, as poesias de amor, entre outros. E, nesses regimes, a propaganda sempre foi de extrema importância, com a intenção de legitimar o poder, visando ainda à propagação de idéias do grupo que governava, a fim de que toda a população as aceitasse. A propaganda como “uma emp resa organizada para influenciar a opinião pública e dirigila” (DOMENACH, 1963, p.13) surgiu no século XX, com o intuito de amparar esses regimes. Para isso, utilizou-se de uma evolução que trouxe seu campo de ação, a massa, e os meios de ação, representada pelas técnicas recém-inventadas de informação e comunicação. DOMENACH (1963, p.13-17) traz ainda alguns fatos fundamentais para que isso fosse possível: a formação de noções de estrutura e espírito cada vez mais unificados e ainda uma revolução na demografia e no hábitat. Com isso, e mais ainda com o progresso dos meios de comunicação, a formação de grandes conglomerados urbanos, a insegurança da condição industrial, as ameaças de crise e de guerra, a que se juntavam vários fatores de unificação, como a língua e os costumes, houve uma criação de massas famintas por informação. Essas


31 massas recém-formadas eram facilmente influenciáveis, suscetíveis a reações coletivas das mais diversas. As inovações tecnológicas vinham dar uma dimensão aos três sustentáculos da propaganda: a escrita, a palavra e a imagem. O emprego deles, anteriormente limitados, pois a palavra não passava do alcance da voz humana ou de processos de impressão caros, assim como a reprodução de imagens, deu novas possibilidades à conquista das opiniões das massas. Para DOMENACH (1963, p.15), a difusão da escrita impressa no século XVIII possibilitou o emprego de panfletos, jornais, livros e até mesmo de uma enciclopédia como forma de propaganda revolucionária. Com a invenção da rotativa, os valores de impressão ficaram muito menores, com uma capacidade de tiragem muito superior a preços menores. Além disso, a utilização da publicidade comercial nos jornais fez com que houvesse maiores recursos para sua confecção, sem a necessidade de contar com ajuda governamental para realizá-los. Quanto à distribuição, as estradas de ferro, os automóveis, e logo depois os aviões, possibilitaram a chegada de exemplares nos mais diversos cantos dos países e até mesmo do mundo, levando mensagens que anteriormente eram impossíveis de chegar. Também como inovação tecnológica, houve uma grande aceleração do tráfego de informações, com o telégrafo e o telefone, que substituíram os processos antigos dos correios e dos pombos-correios. Com isso, era criado o jornal moderno, “cujo baixo preço e cuja apresentação o transformam em um instrumento popular e uma formidável potência de opinião”. Então, ao mesmo tempo em que se popularizam, os jornais (juntamente com as agências de notícias) se tornam grandes negócios, a serviço também de seus anunciantes e dos detentores do poder (DOMENACH, 1963, p.16). Também com as inovações tecnológicas, não só a escrita chegou a todos os cantos. A palavra falada, que também era limitada, libertou-se. Segundo DOMENACH (1963, p.17), enquanto oradores antigos, como Demóstenes, tinham que competir nas suas falas com o barulho do mar, a invenção do microfone pôde ampliar a voz para grandes salas e estádios. Outra invenção fez com que as vozes do poder pudessem ser ouvidas em todos os cantos do mundo: o rádio. No início do século XX, um grande número de estações de rádio se formou, e principalmente na formação do nazi-fascismo e durante a Segunda Guerra Mundial, sua utilização foi de extrema importância. Quanto à imagem, também as inovações tecnológicas fizeram com que ela fosse muito utilizada como peça de propaganda para as massas. Primeiramente, com novos processos de reprodução de gravuras, juntamente com a imprensa. Depois, com a invenção da fotografia e sua possibilidade de tiragens ilimitadas, o público passou a ter a sensação de presenciar a verdade, como se estivesse presente no momento dos acontecimentos. Ainda de acordo com DOMENACH (1963, p.18), “o cinema oferece uma imagem mais verídica e surpreendente, que se afasta da realidade apenas pela ausência do relevo”. Porém, a televisão ainda viria para realizar com a imagem a mesma mágica que o rádio realizou com o som: transmiti-la de forma instantânea à casa das pessoas. 1.4.1 – Tipos de propaganda política A partir do novo momento e das possibilidades para desenvolver a propaganda política, TCHAKHOTINE (1967) demonstra dois tipos de propaganda política: a propaganda por persuasão (racio-propaganda) e a propaganda por sugestão (senso-propaganda) (apud PICOLIN, 2001, p.20-21). Sobre a propaganda por persuasão, TCHAKHOTINE (1967, p.353) diz que


32 suas modalidades são conhecidas: jornais, discursos pelo rádio, reuniões com debates, brochuras e boletins, enfim, a propaganda pessoal ou de porta em porta, quando os propagandistas vão às portas das pessoas que lhes interessam para tentar demonstrar-lhes os fundamentos de seus programas e persuadi-las a se inscrever no partido que representam ou a votar nele. Para isso, é necessário que haja um planejamento de acordo com os grupos que se quer influenciar, além de se estabelecer objetivos a serem atingidos, formar órgãos para realizar as ações coordenadamente e controlar os resultados, verificando seus efeitos no público escolhido. Já a propaganda por sugestão é aquela utilizada de maneira mais direta em momentos de grande importância: Por meio de símbolos e ações que atuam sobre os sentidos, que causam emoções, procura-se impressionar as massas, aterrorizar os inimigos, despertar agressividade de seus próprios partidários. Além dos símbolos gráficos, plásticos e sonoros (...) são especificamente o emprego de bandeiras, uniformes, grandes manifestações, desfiles estrepitosos que caracterizam a propaganda deste tipo, empregada pelos ditadores (TCHAKOTINE, 1967, p.354). Ainda nas definições de tipos de propaganda política, pode-se encontrar a tipificação definida por MUCHIAELLI (1978), como citada também por PICOLIN (2001, p.22): • • •

Propaganda de doutrinação, de expansão e de recrutamento – é a que visa conquistar a opinião pública e ampliar o espaço da doutrina política no momento em que conquistar o poder. Propaganda de agitação – tem a intenção de explorar as reivindicações e as aspirações frustradas dos grupos sociais, conhecendo bem suas necessidades. Propaganda de integração – tem como função criar uma unidade ideológica a fim de propiciar, ao grupo ou indivíduo que está no poder, legitimidade e autoridade, integrando o cidadão ao poder, fazendo-o sentir como mais um decisor. Propaganda de subversão – é a que visa realizar uma revolução tomando por base as condições psicológicas dos elementos do corpo social.

DOMENACH (1963) também desenvolve uma divisão da propaganda política em dois tipos, a partir de dois grandes momentos da história do século XX: a Revolução Russa de 1917 e a ascensão do nazismo na década de 1930. São a propaganda de tipo leninista e a propaganda de tipo hitlerista. 1.4.2 – Propaganda leninista Para explicar a propaganda de tipo leninista, DOMENACH (1963, p.21) faz uma discussão sobre o marxismo, dizendo que ele pode ser caracterizado pelo seu poder de difusão: “trata-se de uma filosofia capaz de propagar-se entre as massas, de início porque corresponde a um certo estágio da civilização industrial, depois porque repousa em uma dialética que pode ser reduzida à sua extrema simp licidade, sem deformar-se substancialmente”. No entanto, é


33 importante lembrar que Lênin foi quem colocou em prática grande parte desta capacidade de expansão. Para Lênin, então, deveria ser importante para o sucesso da revolução a presença de agitadores no partido, com a função de sensibilizar e arrastar as massas. Passava-se depois da agitação para a educação política. DOMENACH (1963, p.22) diz ainda que “a propaganda bolchevique (ou leninista) pode ligar-se a duas expressões essenciais: a revelação política (ou denúncia) e a palavra de ordem. É aí que, de acordo PIZARROSO (1990, p.331), Domenach assinala a radical diferença entre a propaganda leninista e a propaganda hitlerista. Segundo ele, a concepção leninista da propaganda é “a tradução da tática”, mas seus slogans correspondem sempre a uma realidade. Quando Lênin diz “terra e paz”, realmente se propõe expropriar as terras dos latifundiários e assinar a paz com os alemães. Quando Goebbels afirma que a Alemanha vai ganhar a guerra em “defesa da civilização cristã”, isso não é mais do que uma fórmula destinada a mobilizar as massas que não corresponde a uma realidade (tradução minha). Vale lembrar também que, na concepção da propaganda hitlerista, não existe a presença do conteúdo de formação doutrinário e intelectual presente na propaganda leninista. Sobre a palavra de ordem neste tipo de propaganda, ela tem uma função específica, como um conceito criativo ou um slogan, em que se traduz verbalmente uma tática revolucionária. “Conceito motriz, expressa o objetivo mais importante do momento”, o mais claramente possível (DOMENACH, 1963, p.22). Como exemplo, foram criados: “Todo poder aos sovietes”, “Pão, paz e liberdade”, “Por um governo de ampla união democrática”, entre outras. Essas palavras de ordem, também, além dessas características, deveriam corresponder não só à situação política, mas também ao nível de consciência das massas, isto é, uma adaptação da mensagem às condições de percepção e compreensão do público-alvo. Este tipo de propaganda foi desenvolvido também em outras revoluções marxistas, no Europa do Leste depois da Segunda Guerra Mundial, na China de Mao Tsé-Tung, além do Vietnã e da Coréia do Norte, sempre com a preocupação de formar um “novo homem”, e não de apenas conquistá-lo para uma única ação. A escola torna-se um dos pilares dessa propaganda total. Em seguida, dos “seminários políticos”, das “escolas de aperfeiçoamento” e dos “círculos de estudos” saem, formados, centenas de milhares de “propagandistas” ou agitadores que dão cursos políticos, realizam palestras nas fábricas, nos kolkozes, nos estabelecimentos comerciais e em instituições de toda espécie. As obras de Marx, de Engels, de Lênin, de Stálin e de Mao Tse-Tung formam a base desse ensino. Tão gigantesco trabalho é escorado em inúmeras associações culturais, que enxameiam nos “recantos vermelhos” das fábricas, nas “isbás de leitura” nos campos, nas sociedades beneficentes do Exército, nos clubes esportivos e em outras agremiações (DOMENACH, 1963, p.26).


34 1.4.3 – Propaganda hitlerista Sobre a propaganda do nazismo, chamada de hitlerista, é importante compreender a sua importância para o desenvolvimento da propaganda moderna. Joseph Goebbels, o responsável pela comunicação do Terceiro Reich, transformou o que era até então entendido como propaganda. De acordo ainda com DOMENACH (1963, p.28), a propaganda hitlerista mergulha suas raízes nas mais obscuras zonas do inconsciente coletivo, ao gabar a pureza do sangue, ao glorificar os instintos elementares de violência e destruição, ao renovar por meio da cruz gamada a remotíssima mitologia solar. Ademais, emprega sucessivamente termos diversos e até contraditórios com a única preocupação de orientar multidões ante as perspectivas do momento. Vale destacar que o regime nazista foi convenceu uma grande parte da população alemã, formada por muitas pessoas cultas, de que eles eram o centro de uma raça superior, sob a liderança de Adolf Hitler. Loiros do norte, morenos do sul, eslavos do leste, descendentes de godos, hunos, alamanos teutões, celtas, todos eles pertenciam a uma mesma raça, única e superior. De acordo com BRICKMANN (1998, p.158-159), Goebbels conseguia tudo isso praticando as idéia de que “uma mentira se torna verdade se repetida mil vezes” e “é mais fácil acreditar numa grande mentira do que numa pequena”. PIZARROZO (1990, p.333) destaca que já em Mein Kampf (Minha luta), o livro de Hitler em que ele desenvolvia a idéia inicial do nazismo, havia a preocupação com o papel da propaganda: O papel que a propaganda deve realizar é o de continuar conquistando partidários para a idéia, ao passo que o objeto da organização é o de converter os melhores simpatizantes em membros ativos do Partido (...). O primeiro dever da propaganda está em conquistar homens para a organização; e o da organização, em conquistar homens para continuar a propaganda. O segundo dever da propaganda é o de acabar com a situação existente, através de uma nova doutrina; e o da organização, lutar pela conquista do poder, a fim de assegurar a partir daí o êxito final da doutrina. Para o bom funcionamento dos instrumentos de comunicação e propaganda, Hitler, já no poder, instituiu um ministério próprio para esse fim, chamado de Ministério de Cultura Popular e Propaganda. De acordo com PIZARROSO (1990, p.337), a função de Goebbels, o titular da pasta, era ser o “encarregado de tudo aquilo que se referia a ‘direção espiritual da nação’”. Embora parecendo um termo vago e muito geral, isso indicava o que a propaganda representava para os nazistas: ela era muito mais do que um instrumento; era na realidade toda a sua política. Com isso, todas as formas de comunicação passaram a ser controladas e desenvolvidas especificamente para as finalidades já previstas pela equipe do ministério. Havia seções que cuidavam da propaganda ativa, do rádio, do cinema, da imprensa e uma que cuidava da cultura do partido, com repartições de artes criativas, música e literatura. Segundo PIZARROSO (1990, p.337), foram criadas novas seções dedicadas à propaganda externa e à imprensa estrangeira, além de uma área dedicada exclusivamente ao turismo, visto também como uma grande ferramenta de comunicação persuasiva. Embora tivessem todos os meios de comunicação em suas mãos, os nazistas se destacaram na utilização da palavra falada muito mais do que da palavra escrita. O rádio foi,


35 sem dúvida, o principal desses meios, através de transmissões da palavra do Führer para toda a Alemanha. O cinema, os cartazes, a pintura, a escultura, a arquitetura, a literatura e a música também foram fundamentais para o sucesso da propaganda hitlerista, tanto internamente quanto nos outros países, preparando um possível momento de expansão do regime. De acordo com DOMENACH (1963, p.29), a propaganda nazista utilizava, para atingir seus objetivos, um condicionamento realizado em larga escala, utilizando o instinto de poder, “de início, formando os reflexos e pondo-os em funcionamento; em seguida, utilizando-os no ritmo necessário para criar o estado de inibição”. Com isso, o resultado era que entre os homens que seguiam Hitler até o fim e por ele morriam, muitos, por certo, o tinham odiado; os processos e o ritmo da propaganda, contudo, os tinham hipnotizado e arrancado de si mesmos. Condicionados até a medula, haviam perdido a possibilidade de compreender, de odiar. Não amavam nem detestavam Hitler: na verdade, fascinados por ele, tinham-se tornado autômatos em suas mãos (DOMENACH, 1963, p.32). 1.4.4 – Meios, leis e técnicas da propaganda política A partir do estudo dos dois principais tipos de propaganda política desenvolvidos durante o século XX, DOMENACH (1963, p. 33-37) demonstra seus “poderosos e inúmeros” suportes técnicos: •

O impresso – representado pelo livro que, embora caro, é importante como instrumento de base, além do panfleto, do folheto, do volante e do cartaz. Como destaque, o jornal é apontado como o principal instrumento da propaganda impressa, tanto os grandes matutinos e vespertinos como os jornais de bairro e de fábrica, distribuídos e afixados (os jornais murais). A palavra – através do rádio, como maior e mais importante veículo, pela sua alta penetração na população. Também é destacado o alto-falante, para grandes discursos e para chamar a atenção em comícios, e o canto, para traduzir palavras de ordem em melodia, como se pode ver na Marselhesa e na Internacional. A imagem – com a fotografia, a caricatura, os desenhos satíricos, os símbolos, os emblemas, é possível conquistar o receptor sem grandes esforços, com uma possibilidade de compreensão na maioria das vezes maior do que com a palavra escrita. O espetáculo – é destacado como um elemento essencial da propaganda, com encenações, manifestações de massa gigantescas, como o Congresso de Nuremberg, paradas noturnas com tochas, tocando profundamente a mitologia. Também como exemplos de espetáculos estão o teatro, o cinema e, mais recentemente, a televisão, que também possui o principal benefício do rádio, que é chegar às casas das pessoas comuns.

Depois de relatar os diversos suportes para a propaganda política, DOMENACH (1963, p.40-45) desenvolve as principais leis de seu funcionamento, suas “regras de uso”: •

Lei de simplificação e do inimigo único – a propaganda deve sempre se empenhar na busca da simplificação, dividindo a doutrina e a argumentação em


36

alguns pontos, definidos o mais claramente possível, traduzindo-os em slogans ou símbolos, para que sejam utilizados um de cada vez, atacando a cada fase um só objetivo e um só “inimigo”. Lei de ampliação e desfiguração – a ampliação exagerada de notícias, que é um processo jornalístico empregado de forma corrente pela imprensa de todos os partidos, colocando em evidência todas as informações favoráveis aos seus objetivos. As promessas, nesse caso, não devem ser pormenorizadas, mas sim desenvolvidas de modo mais surpreendente. Lei de orquestração – a repetição incansável das idéias simplificadas, através de formas diversas e em todos os meios possíveis, para que o receptor se veja cercado por elas. Também devem ser desenvolvidas versões para que todos os tipos de público compreendam plenamente o que está sendo afirmado. Lei da transfusão – a exploração, nos temas apresentados, do gosto popular, de sua mitologia, de seu complexo de preconceitos, de seus ódios, de seus amores, para que as pessoas vejam nas mensagens referências ao que elas, consciente ou inconscientemente, desejam ou concordam. Lei da unanimidade e de contágio – como as pessoas tendem a ter comportamentos e opiniões diferenciadas quando agem como indivíduos ou como membros de um grupo, deve-se preocupar para que haja na propaganda a impressão ou a ilusão de unanimidade, fazendo com que as pessoas creiam que estão ao lado da maioria de seu grupo. Isso também funciona com contágio, através de grandes manifestações populares.

1.5 – Propaganda ideológica A propaganda política, embora possa ter sua origem conhecida pelo público receptor, quando há uma assinatura do emissor da mensagem, um partido político ou um determinado homem público ou candidato, em grande parte das vezes age através da não-identificação. Neste ponto é que ideologias são transmitidas: é onde se encontra a propaganda ideológica. De acordo com a filósofa Marilena CHAUÍ (1998, p.113-115), ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (idéias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que devem valorizar e como devem valorizar, o que devem sentir e como devem sentir, o que devem fazer e como devem fazer. É importante notar que a propaganda ideológica funciona de maneira diversa da publicidade institucional, pois essas mensagens são veiculadas de maneira indireta, em veículos que tentam passar uma imagem neutra. Na propaganda de regimes totalitários, existe um condicionamento ideológico, reforçado ainda mais pelo aparelho de coerção do Estado, que controla tanto a mídia quando as próprias relações da sociedade. Segundo WEBER, M.H. (2000, p.145), a técnica principal da propaganda política autoritária visa apresentar o governo como intérprete das idéias, dos interesses, dos valores


37 populares, exaltando seus esforços para responder às aspirações do povo, que só ele pode entender e interpretar, e viabilizar seu futuro. As contradições entre Estado e sociedade são ocultadas e os interesses particulares das classes dominantes são ideologicamente transformados em interesses de toda a sociedade. E isso ocorre nos veículos de comunicação. Jornais e revistas têm na população em geral uma imagem de detentores e reprodutores da verdade dos fatos. Por isso, qualquer mensagem com intenções de convencimento e que tenha origem em algum grupo de poder pode ser caracterizada como propaganda ideológica, com a função de formar a maior parte das idéias e convicções dos indivíduos, e, com isso, orientar todo o seu comportamento social. Segundo WEBER, M.H. (2000, p.140), quando dirigida pela democracia, a comunicação expõe o governo e estabelece entendimentos com a sociedade, sendo submetida ao controle desta, das mídias e de instituições diversas. As organizações midiáticas, por sua vez, optam pelo tipo de vínculo a ser estabelecido com o governo instituído. Quando recurso do totalitarismo, a comunicação mascara, amplia, reduz e omite informações, verdades e realidades, e controla os meios de comunicação, produzindo informações e propaganda. É importante notar ainda que há uma grande profusão de termos utilizados nos estudos de comunicação política. Ainda de acordo com WEBER, M.H. (2000, p.140-141), diferentes formas de exercício retórico da política são registradas na história, como: a) propaganda político-ideológica – a serviço de ideologias, como comunismo, nazismo; b) o marketing – a serviço de partidos políticos e eleições, como a propaganda eleitoral; c) a propaganda institucional, quando vinculada à publicidade de órgãos e dirigentes governamentais. No caso do regime militar no Brasil, por exemplo, é importante notar que havia a utilização da propaganda institucional, em determinadas ações em que aparecia a assinatura e a identificação precisa do emissor da mensagem. Além disso, havia a propaganda ideológica, que, de acordo com GARCIA (1982b), não mostra o verdadeiro emissor da mensagem, e pretende convencer o receptor travestida como verdade. De acordo com GARCIA (1982b), citado também por QUEIROZ (2001, p.67-71), alguns temas são importantes para a discussão: o controle ideológico, a contrapropaganda, a difusão e os efeitos da propaganda ideológica. •

Controle ideológico – faz com que as pessoas não consigam perceber a própria realidade e não possam reconhecer a própria opinião. Como os indivíduos só podem adquirir consciência de suas reais condições de vida através da observação direta ou através de informações recebidas (através dos meios de comunicação ou do contato com outras pessoas), o controle ideológico faz com que eles só consigam compreender a complexidade de seu contexto com o filtro de meios de comunicação com fins específicos de fazê-los crer numa ideologia qualquer.


38 •

Contrapropaganda – trabalha empregando técnicas para amenizar impactos de possíveis mensagens opostas, anulando seu efeito persuasivo. Coloca-se sempre as idéias contrárias em contradição com a realidade, ou parte dela, para que os indivíduos não reconheçam nelas nenhuma verdade, mostrando-as também contrárias a valores dos indivíduos ou dos grupos sociais. Difusão – é a transmissão das idéias para os receptores pelos mais diversos meios, depois de sua codificação. Segundo QUEIROZ (2001, p.70), “é a partir da difusão que surge a possibilidade de produzir uma impressão de unanimidade tão persuasiva quanto os próprios argumentos do orador”. Efeitos da propaganda ideológica – as idéias de um determinado grupo passam a ser disseminadas para o restante da sociedade de forma persuasiva. “Depois de emitidas através dos diversos meios de comunicação, elas passam a ser retransmitidas, direta ou indiretamente, no seio das diversas instituições sociais” (GARCIA, 1982b, p.78). Assim, a ideologia impregna a todos.

Com a intenção de demonstrar à sociedade uma determinada verdade, a utilização de veículos considerados “neutros” é fundamental para o sucesso da propaganda ideológica. Por isso, a imprensa sempre foi um dos principais meios de disseminação da ideologia dos grupos no poder. Através da cooptação de jornalistas e empresários de comunicação, seja pelo oferecimento de benefícios seja pela censura, tanto os Estados totalitários quanto os aparentemente democráticos, utilizam as páginas de jornais e revista e os programas jornalísticos do rádio e da televisão com o intuito de falar ao povo por via indireta. Referências bibliográficas BRICKMANN, Carlos. A vida é um palanque: os segredos da comunicação política. São Paulo : Globo, 1998. BURKE, Peter. A fabricação do rei: a construção da imagem pública de Luís XIV. Rio de Janteiro : Zahar, 1994. CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. São Paulo : Brasiliense, 1998. CITELLI, Adilson. Linguagem e persuasão. São Paulo : Ática, 2004. DOMENACH, Jean-Marie. A propaganda política. São Paulo : Difusão Européia do Livro, 1963. GARCIA, Nelson Jahr. O que é propaganda ideológica, coleção primeiros passos, Nobel, 1982 HELLER, Agnes. Agnes Heller entrevistada por Francisco Ortega. Rio de Janeiro : EdUERJ, 2002. MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. São Paulo: Cultrix, 1995. PIZZAROSO QUINTERO, Alejandro. Historia de la propaganda. Madrid : Eudema, 1990. QUEIROZ, Adolpho. De Debret a Nizan: a construção da imagem pública dos governantes. Revista Brasileira de Ciências da Counicação. São Paulo : Intercom, vol. XXII, n. 1, p. 69-77, 1999.. TCHAKHOTINE, Serge. A mistificação das massas pela propaganda política. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1967. WEBER, Maria Helena. Comunicação e espetáculos da política. Porto Alegre : Ed. Universidade/UFRGS, 2000. WEFFORT, Francisco. Os clássicos da política: volume 1. São Paulo : Ática, 1999. WEFFORT, Francisco. Os clássicos da política: volume 2. São Paulo : Ática, 1998.


39

Uma nova face do marketing político Célia Maria Retz Godoy dos SANTOS20

A maioria das pessoas quando menciona o termo marketing está se referindo à propaganda, ou, então, a vendas. Na verdade esta é uma definição errônea ou, no mínimo reducionista do conceito. Marketing é um processo social e gerencial pelo qual indivíduos ou grupos de pessoas obtêm o que necessitam e desejam. Envolve a análise, o planejamento, a implantação e o controle de programas cuidadosamente formulados e projetados para propiciar trocas voluntárias de valores com mercados-alvo, no propósito de atingir os objetivos almejados pela organização - seja ela pública, privada, não governamental, de serviços etc. - ou pessoa. As atividades do marketing – político ou não – têm sido encaradas, por muitos, como negativas para a população, embora sejam consideradas inevitáveis numa sociedade globalizada. No senso comum, marketing político é tido como uma estratégia de manipulação e engodo da população ou do eleitorado, e é corriqueira a afirmação de que ele se utiliza de todas as formas e manobras possíveis, mesmo as eticamente contentáveis, incluindo “baixarias” para reverter as tendências ou influenciar as opiniões dos mais ingênuos e muitas vezes, apresentando o candidato como ele não é. Por outro lado, o mercado e a mídia parecem “endeusar” os profissionais da área de marketing - os bruxos das eleições - imputando-lhes um poder sobrenatural no que diz respeito à capacidade de operar mudanças nas mentes das pessoas e nas vontades e intenções dos eleitores. Já para as ciências sociais e a academia, o marketing político seria uma das formas de organizar e modelar a sociedade para um convívio melhor entre os homens. Mas afinal o que é o Marketing político? Em sintese, configura-se como um agregado de programas e ações voltados para o ambiente político, visando estreitar relações de interesse coletivo entre os cidadãos e o governo, a fim de promover o atendimento dos anseios e das necessidades de governados e governantes, para alcançar uma sociedade melhor e mais justa para todos. O marketing político envolve todas as estratégias de ação relacionadas à política. Seja na esfera privada (na área associativa, educacional, sindical), no marketing partidário (ações de comunicação dos partidos e dos candidatos e mandatários ligados a eles), no marketing eleitoral (dos partidos e candidatos com vistas às eleições), no pós-eleitoral (dos mandatários, executivos e legislativos) e ainda do marketing dos organismos estatais e da publicidade oficial das obras e dos feitos governamentais. Ninguém espera que um médico saiba quando ou se haverá uma determinada epidemia. Nem que um biólogo diga o quanto evoluirá certo animal. Mas muita gente espera que o profissional de marketing diga qual será o futuro de um político, se ele tem notoriedade suficiente para se candidatar a deputado, ou se tem chances de ser eleito prefeito ou governador. Embora não seja uma profissão de futurologia, o marketing político está alicerçado em cenários específicos e suas ações estão calcadas no planejamento. Se for assim, quando notamos as diferentes mudanças nos cenários mundiais, o que podemos esperar do marketing político? Para entender um pouco sobre este assunto, que envolve uma complexa formulação teórica, é necessário analisar suas interfaces com a sociedade, destacando quatro mudanças de paradigmas essenciais, que já estão acontecendo, para a compreensão da nova face do marketing político no mundo atual.

Doutora em Sociologia e mestre em Comunicação pela Unesp. Professora do Curso de Comunicação Social da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP e atual coordenadora do Núcleo de Opinião Unesp. Desenvolve trabalhos e estudos sobre pesquisas de opinião pública e marketing. 20


40

1 – A adaptação aos cenários e conjunturas sociais Analisando as principais dimensões da sociedade, percebemos que as várias questões de interesse coletivo não conseguem ser resolvidas por meio de caminhos radicados em interesses privados, portanto, o Estado tem sido o principal regulador dos agrupamentos humanos em todos os sistemas de governo, embora ainda não se tenha encontrado processos para criar uma sociedade harmônica, sem as grandes diferenças sociais. Do mesmo modo, um dos desafios do marketing político é a adaptação da comunicação pública às diferentes conjunturas e cenários. A questão da sociedade urbana ou pós-industrial, em que pesem as limitações, pode ser analisada a partir das dimensões: cultural, político-jurídica e econômica. A dimensão cultural é relativa às diversidades, às diferenças, às línguas, às crenças e aos valores. É aquela que confere identidade aos membros de um grupo e que corresponde à maneira como as pessoas percebem, pensam e sentem o mundo. A político-jurídica se refere às regras, às leis, às normas e à autoridade, com vistas a proporcionar a convivência pacífica entre todos na comunidade. E a dimensão econômica tem a ver com os recursos produzidos e trocados para a subsistência dos homens. É nela que se apresentam os recursos para a alimentação, moradia, saúde, educação etc. Pois bem, na história dos agrupamentos urbanos, alguns eixos norteadores têm se destacado na tentativa de compreender e gerenciar a vida em sociedade. Embora até hoje não tenhamos encontrado uma resposta, ou um sistema de organização ideal para as relações humanas, evidenciam-se mutações no quadro de valores, redimensionado pelas práticas e transformações recentes. As utopias como a liberdade, a igualdade e a fraternidade têm sido reposicionadas, indicando a valorização da experiência dos homens com diferentes regimes. Na dimensão cultural, por exemplo, o atual eixo norteador seria a liberdade: para escolher o tipo de educação, a língua, a religião, os costumes, seu modo de ser, seu jeito de se vestir. Os regimes socialistas, por exemplo, “fracassaram” em parte por que quiseram impor a igualdade na dimensão cultural o que tirou a liberdade de expressão das pessoas. Elas não podiam mais escolher sua religião, seu trabalho, houve até imposições no modo de vestir. Do mesmo modo, o marketing político também está se adaptando a esta conjuntura. A ênfase no trabalho com as diversidades culturais dos indivíduos, dando liberdade de escolha aos cidadãos sem coagir ou pressionar é prova disso. Nesta dimensão, é importante a participação dos públicos nas avaliações do personagem político e nas definições dos interesses públicos de determinada população. A Rússia e a China, mais recentemente, perceberam a importância de se respeitar as diversidades e as escolhas dos indivíduos e estão mudando o marketing político de seus governos. E as organizações privadas também já perceberam isso: cada vez mais realizam estratégias mercadológicas privilegiando os ativos positivos de seus produtos e a partir delas conseguem a adesão dos consumidores que tem liberdade de escolha com base nas informações divulgadas. Por isso, um político - após eleito - tem que fazer um programa de comunicação que divulgue seus “feitos e propostas” a todos os segmentos da população: as minorias, aos funcionários, membros do executivo, do legislativo, parceiros, associações e entidades de classe. Não se deve deixar que este “diálogo” seja feito somente pela mídia espontânea - aquela que não está vinculada às estratégias de marketing político - já que, no âmbito cultural, a comunicação de massa devido a sua abrangências e potencialidade têm se tornado uma forte fonte de poder. E na dimensão político-jurídico, o que deveria imperar? Aí, sim, deveria ser a igualdade. Direitos iguais para todos. De certa maneira, as sociedades ditas da pós-modernidade ou, como são chamadas, de primeiro mundo, estão percebendo esta necessidade e se esforçando para chegar à igualdade de direitos.


41 A primeira constituição nos moldes democráticos é de 1787, a carta de princípios dos EUA. Ela frisava a supremacia da lei e a garantia dos diretos individuais. Logo depois veio a constituição Francesa e, posteriormente, a Inglesa. No Brasil, a primeira constituição data de 1824, com a declaração de Independência, mas enquanto americanos, franceses e ingleses apreendiam a criar uma democracia, nós brasileiros vivíamos sob a tutela de Dom Pedro I e II com poderes quase absolutos. Por isso a democracia só chegou ao Brasil em 1889, um século depois da Europa e dos EUA e ainda com longas “somb ras” de períodos autoritários, pois antes da carta de 1988 foram quatro constituições e duas ditaduras – a de Getúlio e a militar. Foi com a constituição de 1988 que o Presidente da República passou a ser eleito diretamente, pois antes se elegiam os deputados e senadores que formavam o colégio eleitoral para escolher o Presidente. Também naquela época só votavam os alfabetizados e maiores de 18 anos. Portanto, mesmo prevendo-se direitos iguais, na prática, as coisas só vão se consolidando com o passar dos tempos. Por exemplo, a seguridade social que tem hoje alcance universal, ou seja, é extensiva a todos os brasileiros. Antes da Carta de 1988, só atendia aos que tinham carteira de trabalho; a lei Orgânica da Assistência Social e a emenda 29 que passou a corrigir gastos da saúde conforme a variação do PIB; a jornada de trabalho de 40 horas; o salário mínimo e suas políticas de valorização; a ampliação dos direitos e cidadania dando autonomia ao Ministério Público, entre outros. Assim, também no marketing político esta igualdade de direitos precisa ser contemplada, deve acompanhar o ritmo da conjuntura social. A inserção de canais de comunicação entre os diferentes segmentos de públicos tem que estar presente nos sistemas de governança. A questão não é ser populista ou “fingir” a defesa das minorias menos privilegiadas economicamente, mas realmente enfrentar os desafios de contemplar os direitos da população para poder conquistá-la. E como descobrir o que a população quer ou necessita? As pesquisas de opiniões mostram o caminho e garantem a eficiência da distribuição dos recursos públicos. Enquanto uns preferem a pavimentação, outros querem moradia ou apenas um campinho de futebol no bairro. As prioridades variam de segmento para segmento e ser um líder político é conseguir a harmonização de interesses e dos direitos reivindicados. Por exemplo, uma ouvidoria que realmente funcione para funcionários pode fazer grande diferença nas próximas eleições, já que estes serão os disseminadores de muitas informações sobre o governo. Nas ultimas eleições de 2008, o prefeito de Curitiba, Beto Richa, foi reeleito com 77% dos votos e, quando questionado sobre como conseguiu tal proeza ou feito com sua campanha eleitoral, afirmou categoricamente: “não foi difícil ganhar, fomos informando a população sobre tudo que fazíamos durante meu mandato, tivemos uma administração participativa e as pessoas perceberam tudo isso. É o caso da reputação e identidade, uma coisa que não se consegue do dia para a noite”. Vemos, então, a proeza do bom marketing político, daquele que se preocupa em informar e dar voz aos diferentes segmentos da comunidade. Este processo de mudanças, não altera a estrutura do sistema capitalista, mas lhe dá uma outra configuração, evidenciando uma mutação no quadro de valores que vem sendo a referencia no jeito de compreender o mundo. Chegamos ao cúmulo de ouvir do candidato a presidente dos EUA, Barack Obama, no debate do dia 7 de outubro de 2008, que uma de suas propostas para o conflito no Iraque era matar Bin Laden, já que esta foi a solução mais apontada pela população norte americana, em pesquisas de opinião recentes. E na dimensão econômica qual seria o eixo? Por mais estranho que pareça: a fraternidade. Isso significa harmonia e união entre aqueles que vivem em proximidade ou que lutam pela mesma causa. Todos nós estamos lutando pela sobrevivência, então, deveríamos pensar no outro, naqueles que irão fazer a troca conosco para o nosso sustento, permanência ou estabilidade econômica. Se não houver o outro para fazer a troca, a sociedade não subsiste. O sistema socialista “se equivocou” neste quesito, pois, adotando a igualdade como eixo norteador nesta dimensão, desmotivou o esforço, físico ou intelectual, dos indivíduos para geração de


42 recursos e riquezas. Este também foi um dos erros do capitalismo - aceitou a liberdade na economia quando o mote deveria ser a fraternidade. A teoria do pensamento econômico capitalista, que garantia a satisfação universal com base no modelo de liberdade econômica, não deu conta de manter uma sociedade sadia, ela incentiva a acumulação de capital por uma parcela minoritária, gerando profundas desigualdades sociais. A crise financeira dos EUA evidencia o início de um movimento de transformação, em que o Estado tenta interferir na estrutura da economia, com pacotes alternativos “de ajuda” pretendendo minimizar as tensões geradas pela liberdade nesta dimensão. Tal liberdade provoca as disparidades sociais, a possibilidade de dependência e da dominação de interesses. De nada adianta uns poucos indivíduos serem ricos, viverem com luxo, com muita comida, carros e objetos de ostentação se a maioria da população não tem o que comer ou onde mora: as desigualdades geram crimes, divergências e a impossibilidade de uma sociedade harmônica com igualdade de condições. O nivelamento econômico é muito importante nesta história, e é tarefa dos governantes que interferir neste processo. É o Estado como indutor de crescimento econômico, como regulador de políticas no desenho geopolítico, nacional e internacional. Vejam o caso do Rio de Janeiro, no qual as pessoas são obrigadas a viver “encarceradas” em suas casas e mesmo grades, alarmes e sistemas de proteção não dão conta de acabar com o medo de serem assaltadas ou mortas. É um paradoxo: a liberdade na economia, na prática, gera a diferença social e a restrição de direitos. Do mesmo modo, o marketing político tem que conviver com estas problemáticas e trabalhar no sentido de atender às demandas sociais também na dimensão econômica: programar suas estratégias visando a melhora da imagem da cidade, não só perante seus moradores, mas junto aos visitantes e investidores; incentivar a economia; criar postos de trabalhos (empregos) e oportunidades de negócios; ampliar a capacidade de alavancar recursos em entidad es, fundações e nas instâncias governamentais e informar sobre os ativos da localidade são objetivos de um programa político que tem embasamento nos anseios sociais contemporâneos. Nova Iorque já há muitos anos vem realizando seu marketing político com vistas a melhorar seu cenário, não apenas no aspecto visual, mas demonstrando aspectos positivos da cidade que impactam na reputação, identidade e na capacidade de gerar negócios. Do mesmo modo, a China, com o evento das Olimpíadas, tentou por meio de um elaborado marketing político agregar valores a sua imagem junto à população mundial com o objetivo de ampliar sua capacidade de negócios e turismo.

2 – A mudança de modelos e paradigmas Todos os povos do mundo estão sofrendo as pressões do imperialismo da homogeneização cultural e, ao mesmo tempo, dos conflitos étnicos, da regionalização, além da dificuldade de proteger o planeta. Os recursos que antes eram vistos como ilimitados, agora estão se apresentando com limitados. Podemos citar, por exemplo, a declaração de independência dos EUA: a maior parte dela foi escrita para comerciantes e fazendeiros com espaços e recursos naturais ilimitados, enquanto, hoje nos encontramos numa situação bem diferente. Vários modelos estão sofrendo alterações. Os paradigmas de competição e de concorrência estão mudando até mesmo nas organizações privadas. As parcerias econômicas e de negócios já acontecem rotineiramente. As vésperas de eleições, emergem parcerias políticas esdrúxulas - para ter mais de tempo na TV e poder concorrer com uma chance um pouco maior. Porém, em políticas públicas quase nunca conseguimos parcerias. Um político quando eleito faz questão de mudar tudo que seu antecessor fez, não há continuidade de ações, o que impede uma atuação mais comprometida com a população, o que evidencia que o interesse individual está acima dos coletivos. Embora alguns políticos já enxerguem isso, a maioria não tem esta


43 visão. Mas porque não enxergam o óbvio, o quão benéfica é a cooperação na política? Porque estão “presos” às velhas regras, às questões de valorização partidária, à competição em detrimento da colaboração, fatores que, muitas vezes, os encaminham para o insucesso. A falta de visão dos políticos se assemelha ao sabiá que todos os dias se arremessava contra o vidro da janela de minha casa, lutando contra seu reflexo por pensar que seu território estava sendo invadido por outro pássaro. Ficava horas a fio nesta luta incessante: quando se distanciava, via seu reflexo no vidro e, sendo uma ave territorial, imediatamente, lançava-se em defesa de seu território. Não fazia nada além do que todos os pássaros de sua espécie fazem ou fizeram por gerações e gerações. Mesmo com o choque no vidro, quando olhava a janela de perto, sentia-se satisfeito por ter conseguido espantar o seu invasor. Porém, assim que o sabiá distanciava e se sentava em seu galho, olhava para a janela e via que o pássaro tinha voltado. E, assim, iniciava novamente o mesmo esforço. Logicamente, o “outro pássaro” era tão tenaz quanto ele e sempre acaba voltando, o que do ponto de vista do sabiá requeria a repetição da tática para expulsá-lo. Isso reflete muitas de nossas dificuldades sociais de hoje. As nossas reações conhecidas, necessárias para resolver um problema, não servem mais ou são ineficazes para as novas situações. O sabiá não é tolo, também não é desprovido de intenção, aliás, tem muita vontade e tenacidade, mas ele não está preparado para as mudanças do mundo. O vidro é uma coisa que ele não conhece na natureza, vai além do seu repertório e, por isso, não sabe como lidar com a situação: utiliza velhas fórmulas para problemas novos, o que é ineficaz. E com quantas novas vidraças não nos deparamos ao longo do tempo. Trabalhar com o marketing político requer entender as mudanças de paradigmas do mundo. Muitas pessoas, políticos, organizações e até países acabam condenados à repetição, dedicando esforços e tempo na tentativa de obter um resultado que, por fim, acaba em fracasso. Como o sabiá, fazem campanhas e ações pontuais, sem estratégias duradouras. Os políticos, em grande parte, são inteligentes, têm vontade, são preparados, mas atuam com procedimentos que não funcionam na nova situação. Os eleitores ou cidadãos não querem mais ouvir promessas, balelas, campanhas enganosas, injurias aos outros candidatos. O descrédito nas promessas dos candidatos parece estar abrindo caminho para uma política mais responsável. Segundo José Artur Giannotti (2008, 7), “cada vez mais a política contemporânea se envolve numa farsa discursiva (...) O presidente Lula costuma falar o que lhe vem na veneta, mas com tanta convicção e tal capacidade de convencimento que parece ser o arauto da verdade popular”. Assim como o Lula, Nicolas Sarkozy (presidente da França), Berlusconi (premie da Itália) ou Hugo Chaves (presidente da Venezuela) também falam o que lhes passa pela cabeça, sempre tentando convencer e não necessariamente pautados pela verdade. Num discurso falacioso, usam a retórica para falar o que vão fazer de modo que possam, mais tarde, fazer o contrário. E, embora esse seja um fenômeno praticamente universal, fica cada vez mais evidente a necessidade de os políticos se mostrarem mais determinados e verdadeiros a respeito do que prometem, e consequentemente, de um marketing sob uma perspectiva mais comprometida. O marketing político tem que tomar o mesmo rumo das grandes organizações: tem que trabalhar para construir sistemas que permitam produzir em conjunto, pois estamos vivendo numa situação de extrema interdependência – o que acontece nas redondezas de nossa casa ou do outro lado do mundo nos diz respeito. A crise dos EUA, por exemplo, já está afetando os mais diversos países de maneira distinta todo o mundo. É lógico que as parcerias têm que ser reais, comprometidas, e não apenas na vigência das campanhas eleitorais como, por exemplo, o candidato a prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, que nas eleições de 2008 tentou agregar a popularidade (72%) do atual prefeito Fernando Pimentel (PT) e do Governador de Minas


44 Gerais Aécio Neves (PSDB) de 82% fazendo uma inesperada parceria com ambos, numa disputa meramente pelo poder, que dissolveu a polaridade ideológica dos partidos PT e PSDB. É importante não continuar batendo a cabeça no vidro, é preciso reinventar processos de governança. Muitos fatos novos como a globalização, a facilidade de comunicação, o novo papel da mulher na sociedade, o envelhecimento da população deram origem a um novo cidadão, um novo eleitor, um novo homem e, com isso tudo, uma nova forma de se fazer marketing político. Tal nova definição entende que as ações de um governo já instituído precisam não só atender aos anseios e às necessidades do mercado, mas ajudar a formar cidadãos e eleitores conscientes de seus diretos e deveres. Por exemplo, a fidelidade do consumidor para um determinado produto depende não só de suas qualidades, mas da credibilidade e reputação que ele goza no mercado, assim é também com a política. Hoje, ao contrário de ficar justificando e defendendo a legitimidade do marketing político tentando diferenciá-lo das técnicas de venda de um sabonete, temos que aproveitar o conhecimento e a experiência das organizações em relação aos seus consumidores para poder entender as práticas do marketing com o cidadão: as organizações estão trazendo os consumidores para participar das decisões sobre os produtos; elas têm disponibilizado canais de comunicação interativos para levantar os anseios e a satisfação dos consumidores; informam sobre os comprometimentos sociais da mesma com o meio ambiente e com a responsabilidade social; fazem divulgação dos novos produtos; esclarecem seus valores e garantias. Enfim podemos dizer que são muitas as similaridades entre o dois tipos de marketing. Podemos ainda destacar: a prioridade do planejamento estratégico; o uso intensivo de pesquisas e informações sistemáticas sobre o consumidor/eleitor e o ambiente; a adoção de linhas de comunicação baseadas em estratégias; e o desenvolvimento de técnicas de comunicação para permitir o contato direto com o consumidor/eleitor. É lógico que a diretriz ideológica do lucro é diferente nos dois tipos de marketing. O mercado tem a ênfase no lucro financeiro e o marketing político deve ter a ênfase no lucro social. Algumas organizações privadas já começaram a perceber esta mudança de paradigma e estão se utilizando do marketing para construir sistemas que permitam produzir em conjunto, com responsabilidade e transparência. Estão emergindo, em inúmeros contextos, métodos de negociação de diversos interesses, objetivos, recursos e conhecimentos num compromisso de negociar coletivamente soluções inovadoras para problemas sociais complexos, pois a perenidade destas organizações está atrelada ao seu ambiente social.

3 – Uma solução viável: a mudança de luta para jogo A terceira mudança de paradigma no cenário do marketing político tem a ver com a transformação no processo de relacionamento entre os atores políticos, o que já está acontecendo. Tem a ver com a mudança da postura: de luta para jogo. A discussão é apoiada pela teoria dos conflitos, mais especificamente, pela teoria dos jogos, que pretende esclarecer como se dão os impasses sociais e qual a melhor maneira de resolvê-los. Vejamos então: quando chamamos um indivíduo de “racional” significa que ele consegue ponderar as possíveis consequências de cada curso ou ação de sua vida e, posteriormente, pode escolher a linha de ação que prefere, com base em argumentos racionais. Mas só isso não basta: num conflito, o resultado não depende somente da linha de ação ou raciocínio escolhida pelo indivíduo, mas também, das linhas de ação que os outros indivíduos escolheram, sobre os quais ele não tem controle.


45 O mesmo aconteceu na política. Por isso, a teoria dos jogos serve para nos fazer entender a importância da racionalidade no jogo político que, diferentemente da luta, pode trazer benefícios para ambos os “jogadores”. Segundo Rapoport (1980), autor dessa teoria, são três os modos de conflitos: a luta cujo objetivo é fazer mal ao adversário, não envolvendo cálculos, nem estratégias, sendo apenas uma reação, despida de racionalidade, na qual é impossível exprimir as oposições aos oponentes por meio de palavras e as técnicas utilizadas são os golpes e as ameaças. O debate, que tem como objetivo convencer o adversário. É um confronto entre oponentes, cuja técnica utilizada é a argumentação. E o jogo, cuja técnica é o estratagema ou as estratégias e o objetivo primordial é ser mais astuto que o adversário. Neste tipo de conflito, são consideradas as potencialidades e os lances do oponente, presumindo-se que exista racionalidade entre os adversários. Num jogo de salão, por exemplo, é possível presumir todas as coisas que podem ocorrer e o limite do que pode acontecer são as regras do jogo. Veja o caso do jogo da velha, que é um tipo de jogo que tem um ponto de sela, ou seja, já é previsível a única maneira pela qual o jogo termina. Os lances - que significam a gama das escolhas possíveis - devem ser conhecidos por ambos os jogadores. Se os jogadores forem competentes, sempre haverá empate, neste jogo, por isso, talvez naco valha a pena jogar. X

X

O

O

O

X

X

O

X

Já no jogo de soma zero, aquele cujo resultado é sempre zero, ou seja, o que um ganha o outro perde, os jogadores têm interesses diametralmente opostos. Vejamos a exemplificação conforme estas matrizes. Na matriz 1, cada jogador tem duas opções (A1 e A2, e B1 e B2). Se o jogador A escolhe o lance A1 ele poderá ganhar 4, no caso de B escolher a opção B1, ou ganhar 2, se B escolher a opção B2. Se, no entanto, A quiser ganhar 5 e escolher a opção A2, corre o riso de B escolher a opção B2, que o fará perder 3. Portanto, num jogo de soma zero, o jogador tem que prever todos os lances para computar o que será melhor para ele já que o jogo não depende só dele. Neste caso, se A conseguir vencer a tentação de ganhar 5 e não escolher a opção A2, sua melhor estratégia será escolher A1 e ganhar 4 ou 2. Quanto a B, o máximo que poderá fazer, será evitar que A ganhe mais que 2, escolhendo a opção B2. Matriz 1 B1

B2

A1

4

2

A2

5

-3

Já na matriz 2, ambos os jogadores têm que resistir às tentações que aparecem no jogo. Se A escolhe A1 pensando ganhar 8, corre o risco de B escolher a opção B3 e ele perder 10 pontos. Portanto, ambos os jogadores têm que levar em conta o raciocínio do adversário e, assim, a melhor opção seria: A3 e B2, consid erando todas as correntes racionais.


46 Matriz 2 B1

B2

B3

A1

8

-5

-10

A2

0

-2

6

A3

4

-1

5

Já nos jogos nos quais as somas dos prêmios não são zero, em que ambos podem ganhar, existem duas possibilidades: a primeira é quando há informação e, então, é possível a negociação ou o conluio. A segunda possibilidade é quando não há comunicação entre os jogadores e a escolha tem que ser simétrica, procurando o equilíbrio dentro de uma racionalidade. Por exemplo, quando um casal de namorados vai planejar uma viagem. Nota-se que a soma dos interesses é boa para ambos, pois eles querem a companhia um do outro neste passeio. Se existe informação, se eles conversam, podem decidir pela praia, montanha ou cruzeiro a partir do lance preferido de cada um e encontrar a opção mais adequada, pois a soma dos interesses é boa para os dois. Na segunda possibilidade, se não existe informação ambos podem decidir por uma opção, achando que estão agradando um ao outro, o que, no entanto, pode não ocorrer. Existe ainda o jogo cuja soma dos interesses individuais representa uma desvantagem para ambos, por exemplo, o dilema do prisioneiro. Nesta hipótese, dois prisioneiros têm uma acusação grave cujo promotor não tem provas para acusá-los. As provas são apenas para uma acusação menor. Se o prisioneiro A acusar o B, ele poderá ser beneficiado por ajudar o promotor e ter a pena abrandada. No caso do A não confessar e também não acusar o B, ambos receberão uma pena leve. Mas, se B acusar A, quem levará a vantagem da pena mais leve será B. A melhor opção, racionalmente falando, seria que ambos não se confessassem, mas, prevendo a atitude do outro, diríamos que eles ficariam em um dilema. E, ainda, numa situação hipotética, cuja regra do jogo é: ganha quem tiver mais votos, os jogadores podem se comportar de diversas maneiras. Por exemplo, se o prêmio for em dinheiro (R$100,00) e se houverem três no jogo, o jogador A pode oferecer a B metade da soma para que ele vote nele, pois mesmo assim ganharia 50%. Pode ainda oferecer 30% para cada um, mas, se não há informações entre eles sobre a negociação, o jogador C poderá também fazer esta proposta ao B. Assim, percebe-se que a comunicação é muito importante para as negociações, sejam elas políticas ou não, e o processo de racionalização dos interesses deve ser aplicado não só na esfera pública, mas em todos os campos da vida em sociedade. Portanto, na teoria dos jogos, a racionalidade impera e quanto melhor for o seu adversário melhor será o jogo. Se relacionarmos esta teoria com o mercado político, pode-se perceber que, no jogo político, é preferível escolher a opção, ou seja, o lance, no qual todos ganham um pouco. Politicamente falando, o jogo de soma zero não leva a nada, enquanto que no jogo de soma diferente de zero é possível obter ganhos para toda comunidade. Deste modo, no marketing político é preciso prever todos os lances, além de conseguir resistir à tentação para escolhas de maior ganho, sem avaliar racionalmente as possíveis opções dos adversários.

4 – A vindicação de profissionalismo A obviedade da necessidade de planejamento e técnicas nas estratégias políticas muitas vezes não assegura que o marketing pós-eleitoral seja feito profissionalmente, com recursos


47 humanos capacitados. É comum “cabos eleitorais” ou parceiros políticos se intitularem “especialistas” para desenvolver campanhas ou mesmo assessorar o político eleito na execução de seu marketing. Na obra de Lewis Carroll, “Alice no País da Maravilhas”, quando a personagem Alice, está perdida e pergunta ao gato, qual estrada deve tomar, ele questiona: para onde você quer ir? E ela responde: não sei. Então, ele diz: se você não sabe aonde quer chegar, pode escolher qualquer uma das estradas. Nesta história, voltada a crianças, percebe-se que muitas vezes o óbvio, não é levado em consideração. Deste modo, o planejamento e a estruturação das atividades do marketing político têm que considerar vários pontos: • O legislador deve montar uma estrutura de informações – a partir de pesquisas - capaz de fornecer parâmetros para as decisões políticas junto aos parceiros, colaboradores e cidadãos. • Agregar valor para o eleitorado, com seus programas e projetos baseados nos anseios e expectativas da comunidade, se possível com a participação dela, também mediante pesquisas de opinião. • Manter uma estrutura de comunicação capaz de construir uma imagem positiva de seu governo e de sua pessoa (com a mídia e com os outros políticos), por meio de ouvidoria e canais ativos de comunicação. • Ter como meta de suas ações a verdade, a ética e o comprometimento com a população, escolhendo agir sempre em benefício da maioria e não por interesses particulares, e para isso perscrutar a população. • Saber expressar suas idéias utilizando a mídia - jornal, revista, rádio, televisão, cartazes, outdoor, folhetos etc. - e compartilhá-las com os cidadãos para criar um clima de aceitação e empatia. • Abrir fluxos de comunicação (formal e informal) em todas as instâncias políticas. • Identificar falhas e pontos de estrangulamento da comunicação e das demandas sociais por meio de avaliações e levantamentos. • Agir sempre com profissionalismo ao elaborar uma estratégia de comunicação, pois muitas vezes o político tem vontade, mas entrega a tarefa para uma pessoa sem qualificação para isso. Embora não seja a preocupação da maioria das pessoas, o marketing político é, muitas vezes, um assunto mal compreendido, pouco explicado e sujeito à rejeição. É entendido pela grande maioria, como forma de promover um candidato ou político. E tem despertado a curiosidade e a discussão do conteúdo ético da atividade, pois muitos autores partiam de definições como: marketing eleitoral é um serviço de “venda” e o marketing político é uma atividade de “pós-venda”, podendo ser ampliado também para “pré-venda”. Ou, então, na campanha eleitoral o objetivo é solicitar o voto, na política é manter a preferência. Por outro lado, é comum percebermos a crescente insatisfação com a centralização do processo de tomada de decisão dos serviços e dos órgãos públicos. Assim, as gestões participativas e compartilhadas (no Brasil, após 1980) e os sistemas de envolvimento direto com os públicos de interesses (a partir de pesquisa de opinião - qualitativa e quantitativa -, conselhos, reuniões grupos de colaboradores, planejamentos participativos etc.) têm gerado numerosas vantagens para as comunidades e os governantes, daí a importância de se realizar um marketing político eficaz no sentido de proporcionar: • um processo de tomada de decisões de alta qualidade para os governantes - o que possibilita a melhora em sua reputação política e, consequentemente, em sua imagem; • o desenvolvimento de capital social e mudança de comportamentos para soluções de problemas complexos da comunidade;


48 • • • • •

a repartição de recursos econômicos e inclusões de populações em programas já existentes; o compartilhamento de competências e interesses para chegar a soluções criativas; a melhor divulgação e consolidação das atividades do governante perante a população; um maior compromisso no âmbito das relações de trabalho gerando repercussões positivas na produtividade e no apoio político junto às instâncias decisórias; a ampliação e o reforço da legitimidade da autoridade perante a participação reduzindo as resistências.

E, para finalizar, vemos que, nos últimos anos, o Brasil atravessou um período de aprendizagem democrática, conhecendo a política e os seus instrumentos. Observou-se que o brasileiro, cada vez mais, toma decisões baseado na informação e que a política eleitoral do grande espetáculo esgotou a sua capacidade de produzir resultados, por isso não há mais lugar para o marketing de enganação, o desafio é mudar os paradigmas e desenvolver um marketing político com profissionalismo. Referências bibliográficas GIANNOTTI, José Artur, Folha S. Paulo, Caderno Mais, 12 de out. 2008, p.7. RAPOPORT, Anatol. Lutas, jogos e debates. Brasília, Universidade de Brasília, 1980.


49

SEGUNDA PARTE _________________________________ AMÉRICA


50

Eleições presidenciais de 2004 nos Estados Unidos, uma leitura de propaganda ideológica na mídia Adolpho QUEIROZ21, Leticia Maria Pinto da COSTA22.

Este estudo pretende demonstrar como o jornal “O Estado de S. Paulo” editou sua primeira página, entre os meses de outubro e novembro de 2004, no que diz respeito à divulgação do desempenho dos candidatos nos debates, por meio de comparações das plataformas eleitorais, destaque a personagens representativos para o processo e difusão dos argumentos favoráveis/desfavoráveis a ambos. A análise estendeu-se até uma semana após a realização das eleições em 4 de novembro de 2004, como forma de perceber as repercussões advindas do pleito que galvanizou antipatias e simpatias por todo o mundo. Além disso, discute, a partir das categorias da propaganda ideológica, de que forma as categorias de elaboração, difusão, controle ideológico e contrapropaganda funcionaram no processo de cobertura. Introdução Este estudo surgiu como decorrência do interesse e da preocupação dos pesquisadores da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) que, no segundo semestre de 2004, identificaram nas eleições presidenciais norte-americanas, uma possibilidade concreta de análise dos acontecimentos a partir da difusão de informações, comentários, fotos, infográficos e da mídia especializada. O interesse mundial pelas eleições norte-americanas, deu-se, especialmente em 2004, como decorrência dos acontecimentos pós 11 de setembro de 2002, ocasião em que os Estados Unidos sofreram intenso ataque terrorista. Os desdobramentos da tragédia que matou mais de 3 mil americanos têm acalentado até os presentes dias o discurso de um dos candidatos, George W. Bush (que veio a se reeleger), que, desde os atentados, tem atuado como “defensor da sociedade contra o terrorismo internacional”. Ao ter declarado guerra ao terror, ordenando a invasão de países como o Afeganistão e o Iraque, Bush acabou desagradando à opinião pública internacional, o que gerou um sentimento de repúdio aos Estados Unidos em muitos países. Nesse sentido, selecionamos o jornal “O Estado de São Paulo”, São Paulo/Brasil, para verificar a postura editorial adotada pelo veículo: se ele aderiu ou não à onda “anti George W. Bush”, presente, praticamente, em todo o mundo. Metodologia Do ponto de vista metodológico, adotamos dois procedimentos distintos e complementares, que seguem a linha dos estudos feitos pela disciplina “marketing político internacional” ministrada na UMESP. Analisamos as capas do jornal, com base na metodologia sobre os gêneros jornalísticos (MELO, 1985), e sobre mensuração e análise de conteúdo, segundo os paradigmas de KAISER

Adolpho Queiroz, é Doutor em Ciências da Comunicação pela UMESP,onde atua no programa de pósgraduação em comunicação ministrando a disciplina “Marketing político internacional”, onde foi elaborado este texto 22 Leticia M.P.da Costa, é doutora em comunicação pela UMESP, mestre em comunicação pela mesma universidade e atua como docente na Universidade de Taubaté,UNITAU. 21


51 (1953) 23. Para este trabalho, analisamos os seguintes gêneros jornalísticos: manchetes, textos, fotos-legenda, apenas os títulos chamando matérias e fotografias. A partir destas categorias, apresentamos um quadro comparativo, para visualizar com mais propriedade a lógica que pautou a conduta do jornal naquele período. Passamos à segunda parte da análise, verificando, a partir do material exibido, em que categorias da propaganda ideológica24 eles se enquadram. Para esta parte da leitura, utilizamonos do material teórico de autoria de Nelson Jahr Garcia, que apresenta explica as quatro dimensões da propaganda ideológica, a saber: elaboração, difusão, contrapropaganda e controle ideológico. Segundo o autor, os indivíduos realizam “a elaboração de sua ideologia para que as idéias nela contidas pareçam corresponder àqueles interesses” (1979, p. 29), o que, nesse caso, traduz-se pela própria natureza dos veículos de comunicação. A segunda dimensão, a difusão, pautamos aqui como sendo o princípio de divulgação de notícias/reportagens, fotos, sobre determinado acontecimento. A aparição do assunto na primeira página de um dos principais jornais brasileiros seria natural, tendo em vista que a realização das eleições presidenciais na principal democracia mundial, geraria reflexos diretos aos interesses políticos e comerciais entre EUA e Brasil. A terceira categoria, a contrapropaganda, mostra-nos de que forma as informações obtidas originalmente nos Estados Unidos refletiam certa tendenciosidade ou favorecimento a algum candidato. Também verificamos de que forma o próprio sistema eleitoral norte-americano assegurou-se de manter, via controle ideológico, seus principais objetivos. A partir do cruzamento destas informações, foi possível perceber a identificação do jornal com as propostas de cada candidato. Como antecedente ao processo, assistimos ao filme “Farenhait 9/11”, do americano Michel Moore, que, com um humor cáustico, coloca os ataques de 11 de setembro como pano de fundo do cenário das eleições presidenciais de 2004. Nele, um George W. Bush, aturdido, recebe, numa escola, a notícia dos ataques ao seu país, mostrandose “abobalhado” e sem quaisquer iniciativas para tomar uma posição a respeito daqueles acontecimentos. O filme de Moore e ele próprio apareceram durante o processo eleitoral como ícones críticos à atual política do Presidente George Bush. Não bastasse o impacto do filme, Moore também editou dois livros, também no Brasil, e contribuiu com a vasta listagem dos autores que foram lançados no País, às vésperas desta eleição. Cabe-nos aqui uma primeira tentativa de interrogação: o filme e todos os livros lançados no período teriam contribuído para questionar a candidatura de Bush ou aumentado o interesse pelo tipo de trabalho que ele desenvolve como presidente dos Estados Unidos? Um pouco de história O jornal “O Estado de São Paulo” nasce da luta entre republicanos e monarquistas no Brasil, para ser porta-voz dos interesses liberais no Estado e, posteriormente, no país. Desde 4 de janeiro de 1875, este tem sido um matutino cujas contribuições ao jornalismo e à sociedade, tem sido indispensáveis. Na sua trajetória de lutas, o jornal já foi empastelado pelo governo, ao tempo de Getúlio Vargas, quando deixou de circular, entre os anos de 1940/45, tendo saído sob censura e sob o controle do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) controlado pelo governo getulista. Desde 1902, com a entrada de Júlio Mesquita na empresa, o Estado de S.Paulo passou a ser controlado pela família Mesquita, que ainda hoje mantém os rumos da redação e das empresas ligadas ao Grupo Estado25. Com reelaboração de MELO (1985). Os conceitos de propaganda ideológica utilizados neste estudo têm como base as definições de GARCIA (1979). 25 O Grupo Estado é um dos principais conglomerados de mídia do Brasil. 23 24


52 O Estado de S. Paulo tem uma história considerável em contribuições sobre guerras, começando com os escritos de Euclides da Cunha, cujo trabalho de cobertura jornalística dos conflitos nos sertões nordestinos foi transformado no livro “Os Sertões”, em 1896. Depois disso, em todos os episódios de guerra ou de eleições, nacionais e internacionais, o jornal passou a ter papel determinante na construção da opinião pública brasileira. Nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, em 2004, o Estado de S.Paulo dedicou várias primeiras páginas, editoriais, notícias, reportagens em seu caderno internacional, comentários econômicos em suas páginas especializadas, comentários sobre aspectos culturais da campanha em seu Caderno 2, dedicou ainda várias fotos, infográficos,cadernos especiais para destacar as eleições presidenciais norte-americanas. De todo o material coletado nos meses de outubro e novembro de 2004, nos fixamos, para uma primeira análise dos acontecimentos neste artigo, sobre as primeiras páginas, bem como daremos alguns destaques sobre material igualmente veiculado nas edições, em página internacionais , que trataram especificamente da ação da mídia no processo eleitoral. O que foi dito nas primeiras páginas Numa análise preliminar sobre as capas do jornal O Estado de S. Paulo das edições durante o mês de outubro e a primeira semana de novembro, percebeu-se, de imediato, a importância dada ao tema “eleições americanas” pelo veículo, já que foi trazida com destaque em 12 edições. Ao lançarmos um olhar mais atento ao conteúdo dos temas tratados, percebemos outro dado relevante, que corresponde a uma das motivações dessa pesquisa : assim como inúmeros jornais em todo o mundo, O Estado de S.Paulo embarcou na corrente internacional anti -Bush. Isso pode ser verificado, conforme o que apresentamos a seguir. Verificou-se, em primeiro lugar, a existência de mais fotos do candidato John Kerry, num total de 5, em relação ao presidente-candidato, George W. Bush, que no período analisado apareceu em 3 fotos. Os títulos e textos impressos na capa, geralmente, abordaram a preferência de Kerry em relação a Bush nos debates eleitorais veiculados pela mídia americana, com chamadas favoráveis ao primeiro candidato. “Enquetes indicam vitória de Kerry no 2º debate” (edição de 10 de outubro). Essa frase deu margem a algumas observações interessantes. Partindo do pressuposto que a enquete é uma sondagem realizada junto a possíveis eleitores, sugere -se que eles preferem Kerry a Bush, no que diz respeito às idéias e à proposta de governo – que é o que se discute nos debates. O texto, que se seguia, dizia o seguinte: “(...) o democrata (...) venceu mais uma vez o presidente republicano (...). (...) Kerry saiu-se melhor que Bush por 44% a 41% na pesquisa da ABC News e por 47% a 45% na da CNN/USA Today”. Ora, quando a diferença percentual entre candidatos é mínima, por levar-se em consideração as margens de erro para mais ou para menos, o esperado era que fosse mostrada a condição de empate técnico e não de vitória de Kerry. Da forma com que foi abordado, revela-se à intenção de favorecimento ao candidato democrata. Na edição de 13 de outubro, o assunto “eleições americanas” é abordado da seguinte maneira: um box traz a foto dos dois candidatos, com Kerry à esquerda, ou seja, em primeiro lugar, se levarmos em consideração movimento do olho humano. Na foto, o seguinte texto: Kerry 45% Bush 45%. Com o título “O último e decisivo debate”, o texto mostra o empate entre eles, citando uma leve recuperação de Bush, segundo uma pesquisa divulgada pela mídia norteamericana. Três dias depois, em 16 de outubro, o jornal traz novamente o tema em sua capa, com o título favorável ao democrata: “Kerry vence debates, mas Bush abre quatro pontos”. O texto também mostra os percentuais, que, na verdade, representam claramente empate técnico entre


53 os candidatos, refletindo mais uma vez conduta do jornal em apoiar a candidatura do adversário de Bush. Na edição de 26 de outubro, uma foto de 385 cm2, traz um Kerry sorridente ao lado do democrata Bill Clinton – um dos presidentes americanos de maior popularidade internacional. A legenda da foto diz que, mesmo tendo sido submetido a uma cirurgia cardíaca, o ex-presidente entra na campanha do colega e critica a relação dos republicanos com “riqueza e poder”. Tal declaração aqui é vista como uma postura de contrapropaganda, ou seja, da intenção de neutralizar o discurso e, como conseqüência, a força de George W. Bush, candidato da situação. As chamadas de capa do dia 28 de outubro são um tanto quanto curiosas. A primeira, com maior destaque, (“EUA temem empate no colégio eleitoral”) diz que projeções feitas para a imprensa americana levavam a crer que haveria empate entre os candidatos. Logo a seguir, abaixo, uma chamada ao editorial, incitando dúvidas sobre a legitimidade do pleito norteamericano (“Eleição sob suspeita nos EUA)”. O texto revelava que denúncias chamavam a atenção para uma possível fraude a fim de favorecer o presidente Bush. Na verdade, as motivações para tal suspeita têm base na primeira eleição do presidente americano, que venceu pelos votos da Flórida, numa apuração conturbada e cercada de incertezas. No dia 29 de outubro, novamente uma chamada fazendo alusão a risco de possível fraude nas eleições americanas (“Republicanos são acusados de intimidação na Flórida”). O jornal lembrou do pleito do ano 2000, quando votos de eleitores negros do Condado de Durval, na Flórida, teriam sido excluídos da apuração – o que foi decisivo para a vitória de Bush – dizendo, sem seguida, que republicanos estariam intimidando eleitores nesta eleição, também na Flórida26. Vê-se mais uma vez, uma certa tendência do jornal a gerar desconfiança em relação à imagem de Bush, apelando para a categoria de controle ideológico. Uma foto de 348 cm2 traz, em 30 de outubro, o candidato John Kerry à frente de várias bandeiras dos EUA, com um texto mostrando a intenção do candidato em dar “um novo começo” à América. O texto ainda destaca a previsão do pesquisador John Zogby, diretor do instituto de pesquisas que leva o seu nome, de que o democrata seria o favorito das eleições. Voltando a abordar o assunto de fraude eleitoral, a edição de 31 de outubro, traz a chamada “Eleição questiona a democracia nos EUA”, com um texto que, além de pôr em dúvida a legitimidade da considerada maior democracia do mundo, informa, na seqüência, sobre vítimas no Iraque, inclusive de soldados americanos. Ou seja, a vitória de Bush significaria mais mortes e guerra – marca registrada do atual governo. Tal informação nos remete às características de elaboração, tendo em vista a relação das duas informações pelo “O Estado de S. Paulo”; e de difusão. Mais uma vez o jornal “O Estado de S. Paulo” dá a entender o apoio ao candidato democrata. Com a manchete “Boca-de-urna aposta em Kerry”, traz uma foto de cada candidato, com a de Kerry à esquerda, ou seja, em “primeiro lugar”. O texto fala sobre uma pesquisa de boca-de-urna - que dificilmente falha, pelo menos nas eleições brasileiras realizada pela renomada agência de notícias Reuters, que garantia a vitória de Kerry por 300 votos no Colégio Eleitoral americano. Aliás, essa informação é destacada em um Box com o seguinte texto: Segundo a Reuters, Kerry já tem 300 votos no colégio eleitoral; 270 é o número que garante a eleição. O texto da manchete ainda dizia o seguinte: “(...) O ânimo era maior na campanha do democrata John Kerry – o presidente George W. Bush foi descrito ontem como ´desanimado´ e ´apreensivo´. Ainda analisando essa capa, mais precisamente a foto de Kerry, nota-se uma placa escrita em inglês e português (Vote here/aqui), o que foi explicado pela legenda:” (...) a placa bilíngüe se deve à grande imigração brasileira e portuguesa “. Entendemos essa abordagem como sendo ligada à categoria de controle ideológico, na medida em que esse tipo de acaba gerando maior proximidade e simpatia pelo candidato Kerry”. Vale aqui ressaltar que, em 2004, as eleições norte-americanas foram realizadas num período de 15 dias, com a justificativa de evitar filas no dia da votação, 2 de novembro. 26


54 Contrariando as previsões, no dia seguinte, 4 de novembro, vem a manchete: “Bush, reeleito com votação recorde: ´A América falou´, com um texto evidenciando a número expressivo de eleitores registrados na eleição, com vitória folgada a Bush. Além da foto de 400 cm2, com maior destaque à bandeira americana e ao brasão da Casa Branca que ao presidente Bush, propriamente dito, o jornal também traz uma pequena foto de Kerry. Ambas legendas trazem um tom de” união “entre os dois candidatos e a promessa de Bush em conquistar os eleitores de Kerry”. O “Estado de S. Paulo” traz novamente o assunto das eleições, no dia 5 de novembro, mostrando as pretensões do presidente reeleito, reforçando o combate ao terror. Já na edição de 7 de novembro, com a chamada “Reeleição de Bush revive temor de crise” e o subtítulo “Para analistas, déficits fiscal e externo dos EUA podem gerar reflexos globais”, insinua a geração de problemas à econo mia mundial. Na seqüência, cita a morte de 34 pessoas no Iraque. Novamente, o jornal segue a corrente anti-Bush. O que foi dito noutras páginas Depois de realizarmos este estudo sobre as primeiras páginas, fixamo-nos em outras contribuições dadas pelo jo rnal , em suas páginas, para compreendermos um pouco melhor de que forma a própria cobertura foi amparada por reflexos ocorridos na mídia dos estados Unidos e do restante do mundo. Há um primeiro dado, publicado na edição de 23 de outubro, página A30, apresentando uma informação relevante. Nela se afirma que, a partir de uma pesquisa feita no site do jornal, da qual participaram 8.000 leitores, 87% preferiam ver John Kerry presidente a George. W.Bush, escolhido por apenas 13% dos leitores do jornal. Preferimos começar por esta informação porque ela, de uma certa forma, refletiu também a postura do jornal durante a cobertura. Por ter sido a eleição que mais despertou interesse não só nos eleitores norteamericanos , como em todo o mundo, preferimos fazer um roteiro cronológico sobre as repercussões deste embate na própria mídia internacional, a partir do que foi dito e publicado pelas páginas do jornal estudado. Uma primeira matéria que nos chamou a atenção foi veiculada na edição de 2 de outubro, na página A28. Assinada pelo jornalista do The Washington Post, Gleen Kessler, tem no titulo a informação “Candidatos adaptam verdades”, mostrando que apesar de terem cometido poucos erros no debate transmitido pelas televisões, Bush e Kerry abusaram de exageros. Para transmitir esta percepção, o jornalista utilizou-se dos resultados de um programa de computador WordCruncher, desenvolvido pela Brigham Young University, que procurava comparar a ênfase de cada candidato a tópicos-chave,idéias e políticas. O mesmo resultado informava que Bush tinha utilizado 6.136 palavras durante o debate ,enquanto Kerry tinha utilizado 7.215. Noutra dimensão, Bush foi quem mais falou sobre questões como a do terrorismo e do Iraque, enquanto coube a Kerry ser o campeão de críticas sobre as armas de extermínio. Outro fenômeno bastante acalentado e difundido nestas eleições foi a de que jornais, revistas e redes de televisão tomaram partido nestas eleições. O New York Times fez um editorial defendendo ostensivamente a candidatura Kerry, enquanto outros optaram estrondosamente a favor de Bush. Na sua edição de 3 de outubro, o jornal publicou na página A26, uma matéria assinada por seu correspondente Paulo Sotero, mostrando que a revista Newsweek, uma das mais prestigiosas daquele país, afirmava que Kerry havia vencido o debate na televisão, com 49% dos votos favoráveis, contra 46% de Bush. Na matéria, afirmava-se que “dos 61% que assistiram ao debate,afirmaram que Kerry foi o vencedor, enquanto apenas 19% apontaram Bush como vencedor”.


55 A partir deste embate, surgiram suspeitas de que Bush teria atuado sob comando na aparição televisiva. Não faltam insinuações de que o Presidente Republicano teria usado um ponto eletrônico, o que foi desmentido por sua assessoria na edição de 11 de outubro do jornal,página A12. A foto que sugeria algo estranho no omoplata esquerdo de Bush, teria sido apenas uma dobra que apareceu na foto e jamais um ponto eletrônico, do qual partiram orientações de seus assessores para respostas mais adequadas. A construção da imagem pública dos governantes foi tema de uma das reportagens do caderno internacional, na seqüência. Em 14 de outubro, na página A19, uma reportagem do correspondente Paulo Sotero, ao entrevistar o cientista político Larry Sabato, professor da Universidad e de Virginia, deparou-se com a seguinte percepção do pesquisador em relação à imagem pública dos candidatos, após mais um debate eleitoral : “Bush nunca teria ganhado a Casa Branca quatro anos atrás se não fossem as respostas adequadas e até populares sobre questões chave na política internacional.” E enfatizou que “nós nos tornamos uma nação crítica de teatro (político) que não se surpreende tanto com os erros factuais e promessas exageradas e frequentemente dá maior atenção ao bronzeado, à gravata, à roupa e à maquiagem dos candidatos do que aos seus argumentos”. E faltando menos três semanas para as eleições, Sabato advertiu ,que mesmo derrotado no debate ““Bush perdeu este título, mas Kerry não o agarrou ““. Outra ação interessante desenvolvida pelo correspondente do jornal O Estado de S.Paulo, Paulo Sotero, foi a de assistir ao debate entre os presidenciáveis, ao lado de jovens estudantes universitários. Seu relato, publicado na edição de 15 de outubro, na página A16, mostra que depois de viajar a cidad e de Shippensburg, na Pensilvânia, Sotero identificou um pouco o espírito dos jovens eleitores, com quem assistiu mais um debate. A primeira constatação foi a de que a maioria dos eleitores, no dia, preferiu assistir s finais de um campeonato de beisebol – esporte muito popular nos EUA – a ter que ficar assistindo ao debate na televisão. Antes do debate transmitido pela rede ABC, Bush tinha 51% das intenções de voto contra 45% de John Kerry. Depois deste debate, ambos estavam com 48% das intenções. Bush, portanto perdeu seis pontos (os três a menos dos 51% que tinha e os outros 3% que levaram Kerry dos 45 para os 48% na ocasião). Entre frases como “não concordo com todas as posições de Kerry, mas discordo profundamente de quase todas de Bush”, os universitários deram ao jornalista a impressão de que o anti-Bush era mais forte do que se imaginava. Entre os eleitores que preferiram ver a partida de beisebol, o correspondente do jornal reafirmou que este dado era “potencialmente negativo para Bush”. A edição de 18 de outubro foi ainda mais contundente na percepção da linha editorial do jornal O Estado de S.Paulo. O jornal informava que ,mesmo empatado tecnicamente com Bush, Kerry tinha conseguido apoios importantes dos principais jornais norte-americanos, numa matéria inserida na página A14, compilada a partir de informes de grandes agências de notícias como a Reuters,AP,AFP e EFE. No decorrer no texto, a reportagem afirmava que Kerry havia obtido o apoio institucional do New York Times, o maior diário norte-americano, além do Dayton Daily News (de Ohio), o Star-Tribune (de Minessota),o The Miami Herald ( Flórida), além do San Francisco Chronicle (Califórnia) e do The Boston Globe (Massachussets,terra natal de Kerry). A matéria concluia-se com a reprodução e tradução do editorial do New York Times, mostrando, entre outras questões que “a Casa Branca de Bush sempre nos deu os piores aspectos da direita” e finalizando com as seguintes observações “ tudo o que os cidadãos podem fazer é combinar suposições com esperanças,analisando o que os candidatos fizeram no passado, suas prioridades evidentes e o seu caráter em geral. Baseados nesses três elementos é que nós entusiasticamente endossamos John Kerry para presidente.” O interesse pelo tema eleitoral foi tão grande – paralelamente às eleições nos Estados Unidos, ocorriam no Brasil o segundo turno das eleições municipais – que até o circunspeto caderno “TV&Lazer”, em sua edição de 24 de outubro, ofereceu em sua capa e nas páginas 4 e


56 5, uma matéria assinada por Carol Knoploch mostrando “o debate sob as rédeas do espetáculo”, mostrando que do figurino a língua afiada dos participantes, os embates eleitorais se esmeram nas arte de seduzir o telespectador, mostrando, entre outros aspectos que “nos Estados Unidos.a disputa entre George W.Bush e John Kerry para a cadeira presidencial já rendeu três debates televisivos, o último no dia 13, aponta Kerry como vencedor. A eleição no entanto está acirrada e os institutos de pesquisa divergem sobre quem levará a melhor no dia 2 de novembro.” E comentou mais adiante que “ a influência da TV neste caso não se compara aos debates entre John Kenedy e Richard Nixon em 1960, o primeiro da história da TV. Kenedy começou a ganhar antes da transmissão ,pois pediu licença e levou uma flor a sua mulher, Jacqueline na platéia, o que deixou Nixon desconcertado. Kenedy destoou no vídeo : aparência jovial e descansada. Nixon foi destroçado : nervoso, suou muito e pegou mal sua imagem enxugando o rosto”. Na edição de 25 de outubro, o jornal apresenta como destaque uma análise da jornalista Dorrit Harazim ,que, sob o titulo, “Cuidado:tv nesta época pode fazer mal à saúde”, mostra algumas das estratégias utilizadas pelos candidatos em relação à propaganda eleitoral nas televisões dos diversos Estados norte-americanos. Lembra, por exemplo, que a própria autora assistiu, as 6:15 hs, da manhã de um domingo, na CNN, um comercial que mostrava “imagens de uma floresta com vultos em movimento, desfocados. Na medida em que a voz sombria vai alertando para o despreparo de Kerry em relação à segurança do país, os vultos vão entrando em foco. Ao final do spot de 30 segundos, eles são uma malta de lobos prontos para dar o bote no pobre telespectador que acaba de acordar.” E alertou mais adiante que “segundo um calculo recente, os dois candidatos já empanturraram o telespectador norte-americano 28.285 mil vezes com inserções negativas de 30 segundos. E haja verba de campanha. Apenas dois dos anúncios falsos de Bush, alertando para aumentos generalizados de impostos em caso de vitória de Kerry, foram veiculados mais de 9 mil vezes em 45 cidades, durante a mesma semana,a um custo de US$ 8 milhões.” A jornalista localizou também, simultaneamente à realização destas eleições presidenciais nos Estados Unidos, a realização de uma exposição, “The living room candidate”, algo traduzível como o candidato da turma do sofá, mostrando os principais momentos das campanhas eleitorais norte-americanas na televisão, realizada em Dallas, no edifício Elm Streets (o mesmo prédio de onde Lee Oswald disparou os tiros que mataram John Kenedy em 1963). A exposição mostra a evolução do processo de comunicação através da televisão, desde o aparecimento do “I like Ike”, criado para a campanha de 1953, para Dwight Eisenhower, passando pelo processo de sedução construído para que John Kenedy vencesse as eleições de 1960; chegando até as campanhas do medo, iniciadas em 64 durante a disputa entre Lyndon Johnson e Barry Goldwater, na qual uma menina ia desfolhando uma margarida e, ao final, ouvia-se o estrondo da explosão de uma bomba atômica; entre outras ações mais recentes. Ilustrada por uma foto em que um burro,fotografado numa fazenda carregando no lombo um cartaz pró Bush/Cheney’04,a edição de 28 de outubro mostra uma apreensão ao processo eleitoral, sob o titulo “projeções incluem pesadelo : o empate no colégio eleitoral”, onde o correspondente do jornal, Paulo Sotero, então enviado a Lynchburg, mostrava uma projeção feita naquela ocasião pelo Washington Post, mostrando 33 combinações capazes de levar Bush e Kerry a um empate em 11 Estados, terminando cada um deles com 269 votos. Em outros pontos desta mesma página os destaques eram para o sumiço de 60 mil cédulas eleitorais na Flórida e sobre os altos e baixos das pesquisas de intenção de votos que ,naquela edição revelavam a preferência dos eleitores por Bush (48%),um ponto apenas à frente de Kerry(47%). Na edição seguinte, de 29 de outubro, o jornal divulgava uma pesquisa feita pela revista “The Economist”, de Londres, mostrando seu desejo de mudança, embora na pesquisa


57 publicada na ocasião, Bush levava vantagem de 2%, tendo 48% de intenções de votos contra 46% do senador John Kerry. Na seqüência da cobertura, em 2 de novembro, um dos destaques do jornal foi para uma entrevista do cineasta e ativista político Michel Moore, ao jornalista da Fox Chanel, Bill O’ Reilly. Moore, anti Bush , levou um cala a boca de Reilly,pró Bush, em plena entrevista. Mas os destaques da matéria mostravam de que forma os vários canais de TV norte-americanos, seus apresentadores e jornalistas, mostravam-se a favor ou contra Bush /Kerry, fazendo um mapeamento de diversas situações. A matéria destacava a Fox como pró-Bush, assim como a CBS e a NBC, mostrando também que Kerry havia conseguido o apoio explícito de jornais como The New York Times e The Washington Post, entre outros. A edição de 4 de novembro, mostrou um levantamento parcial dos custos da campanha presidencial, mostrando que só em anúncios de televisão, os candidatos a presidente tinham gastado US$ 600 milhões,segundo levantamento feito pela TNSMI/CMAG, que acompanhou os gastos com anúncios televisivos no período de 3 de março a 28 de outubro. Depois destes gastos com tv, os serviços postais ficaram com uma fatia considerável de US$ 8 milhões, com a expedição de pelo menos 15 milhões de malas diretas a eleitores nos diversos Estados. Pelo menos 50 mil pessoas foram ouvidas em entrevistas quantitativas e qualitativas. Além disso devem ser contabilizados os gastos com viagens: Bush viajou aos 48 Estados norte-americanos e Kerry a 46 . O levantamento incluiu ainda que as principais revistas semanais dedicaram 36 capas a algum candidato neste período, com 19 capas para Kerry e 20 para Bush. Concluindo este período, vimos na edição de 5 de novembro, um destaque para a reação da imprensa na Grã-Bretanha sobre o resultado as eleições nos Estados Unidos. Sob o titulo “Como podem 59 milhões serem tão estúpidos”, o jornal Daily Mirror, o jornal britânico questionava o resultado das urnas naquele país. A matéria mostrava ainda a repercussão das eleições em outros países da Europa. Conclusões As eleições norte-americanas, na ótica da cobertura jornalística feita pelo jornal “O Estado de S.Paulo”,representaram mais um momento de identificação do jornal com as questões políticas internacionais. Fiel à sua tradição democrática, o jornal deu ao evento,um volume interessante de páginas, uma cobertura feita com olhares de correspondentes enviados ao cenário dos fatos, bem como às notas e informações enviadas por várias agências de notícias, algumas com sede nos estados unidos e outras na Europa, procurando contrastar posições. O jornal dedicou ao episódio apenas duas manchetes,justamente nos dias mais importantes 3 e 4 de novembro. Ofereceu chamadas de primeira página em praticamente todas as edições estudadas no período. Publicou fotos pequenas e grandes em várias ocasiões, mostrando uma evidência maior da presença do candidato John Kerry (que obteve 5 fotos,contra apenas 3 de Bush no período ), além de ter publicado foto-legendas e frases sobre os candidatos. Do ponto de vista das leituras sobre propaganda ideológica, foi possível perceber que houve uma ocorrência sobre difusão; seis ocorrências em que se evidenciou a contrapropaganda e quatro ocorrências onde ficaram evidentes as matérias que se identificavam com controle ideológico. Importante também identificar que, em determinada ocasião, o jornal publicou enquête feita através do site, mostrando a preferência de mais de 85% dos seus leitores com a candidatura do democrata John Kerry. Nesse sentido, apesar de uma relativa preferência do jornal sobre a candidatura Kerry,que ficou evidente na manchete de 3 de novembro, mostrando que as pesquisas de boca de urna davam a vitória a Kerry, na manhã seguinte, com o resultado oficial apontando a vitória


58 de George Bush, o jornal rendeu-se à manifestação do povo americano com a manchete “A América falou”, reconhecendo a vitória do republicano. Na medida em que o próprio noticiário evidenciou no período, que televisões, revistas, jornais, sites especializados,também apontaram suas preferências por determinados candidatos, também o jornal “O Estado de S.Paulo”,votou nas eleições americanas de 2004. Seu voto para John Kerry foi discreto. Mas o reconhecimento da vitória de Bush foi imediato. Mais uma vez percebemos, no Brasil,especialmente desta vez respaldados por pesquisa feita com seus leitores via internet, que o jornal incorporou-se aos sentimentos anti-Bush proclamados pelos quatro cantos do mundo, até chegar a publicar a manchete do Daily Mirror, da Grã-Bretanha, chamando de imbecis os 54 milhões de eleitores de George Bush, numa postura que revela que, nem sempre perder é um bom negócio. Especialmente quando esta em questão a credibilidade de um veículo. Ganhando ou perdendo esta eleição, o jornal O Estado de S.Paulo procedeu, como grande parte da imprensa mundial que, nas eleições americanas, disseram com todas as letras o lado que preferiam. Mesmo que ele não fosse o lado escolhido pela maioria dos eleitores norteamericanos. Referências bibliográficas GARCIA, Nelson Jahr, O que é propaganda ideológica, Editora Brasiliense, Coleção Primeiros Passos, 1988, MELO, José Marques de e QUEIROZ, Adolpho, Identidades da imprensa brasileira, Cátedra UNESCO,UMESP, 1998, KAYSER, J. Une semane dans lê monde. Paris, Unesco, 1953, O Estado de São Paulo, edições entre 10 de outubro a 7 de novembro de 2004, primeira página e páginas internacionais editadas no período.


59

Comunicação virtual partidária no Brasil e no Canadá: um estudo comparativo Adolpho QUEIROZ27 Débora Cristina TAVARES28 João Carlos PICOLIN Ricardo COSTA

A comunicação partidária na Internet Os partidos políticos, ao longo da história contemporânea no Brasil e em outros continentes, têm experimentado os efeitos e os impactos da comunicação virtual entre seus próprios militantes e a sociedade. Bons tempos aqueles em que a militância mantinha-se na clandestinidade, rodava jornais em mimeógrafos ou punha-se a vender exemplares das suas publicações nas portas das universidades. Quem se dispuser a ler o relato que o jornalista William Waack fez sobre a construção de uma rádio clandestina, destinada a fazer com que Luis Carlos Prestes e os seus companheiros comunistas, em meados do século XX, pudessem se comunicar para derrubar o então presidente Getúlio Vargas, e olhar os ingredientes colocados hoje à disposição dos partidos para a sua comunicação virtual e imediata, sentirá de que forma o campo evoluiu (Waack, 1997, p. 67). Hoje, o espaço virtual substituiu, em função de sua velocidade e rapidez, em grande medida, as notas oficiais dos partidos e as entrevistas coletivas. É comum ver nos telejornais, ou reproduzidas pelos jornais impressos, informações contidas nos sites dos partidos políticos brasileiros. Em casos recentes, como o da sucessão presidencial em curso, o Partido da Frente Liberal (PFL), que mantinha a candidatura de Roseana Sarney, viu sua página na Internet ser notícia e manchete em vários telejornais, quando anunciou uma decisão ou repudiou alguma atitude. Portanto, as páginas virtuais estão saindo de forma expressiva do anonimato ou do âmbito estritamente partidário, para se incorporarem às fontes de informação à mídia. Para André Lemos (1999, p. 9), a profusão de equipamentos baseados no princípio da informação, da comunicação e da miniaturização nos revela, em todos os momentos da vida cotidiana, a técnica onipresente. É essa relação íntima entre o orgânico e o eletrônico que dá ênfase às novas formas de sociabilidade daí emergentes. A simbiose crescente entre physis e tecknè nos coloca em meio a uma cyborg society, uma sociedade onde o humano e o tecnológico se constroem mutuamente.

Durante evento realizado em São Paulo, denominado Maxivoto, o consultor político norte-americano Joe Napolitan, que atua há 45 anos no mercado profissional, afirmou também que a “internet ainda não é uma ferramenta decisiva de divulgação política. Ela é boa para conseguir fundos, mobilizar, assegurar trabalho voluntário e agilizar a comunicação interna dos partidos, mas não para vencer eleições”, mostrando ainda que “nada substitui o contato pessoal do candidato com seus eleitores” (Queiroz, 2002).

27 28

Professor do Pós-Com da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) Doutora em Comunicação Social e Professora da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT


60 Quando um partido político se dispõe a abrir uma página virtual, ele pressupõe que a sua publicidade produza conversas e efeitos entre seus simpatizantes, eleitores e entre as pessoas que necessitam da difusão daquela informação; mas ao mesmo tempo está construindo uma pedagogia com o objetivo de difundir adequadamente suas crenças e valores através do seu site; busca também se abrir a eleitores de outros partidos que desejem saber suas posições a respeito de determinados assuntos, com finalidades diversas de difusão, pesquisa ou consultoria; busca igualmente influenciar pessoas e os formadores de opinião que, ao lerem, verem, ouvirem as informações no âmbito partidário, centram-se nelas como algo oficial e com isso legitimam o discurso partidário e, acima de tudo, uma página serve para manter uma presença permanente junto ao público, simpatizante ou não daquela agremiação partidária. Ou, no dizer de Lemos (1999, p. 11), a virtualização do mundo afeta de forma irreversível a sociedade deste fim de século. A cibercultura contemporânea é uma forma peculiar de relação entre a sociabilidade e as tecnologias. A tecnologia pensada como destruidora de toda e qualquer singularidade, transforma-se no seu oposto: ela potencializa singularidades ordinárias. Agora, é na troca ordinária de informações entre pessoas ordinárias que se estrutura a civilização da comunicação (comunhão, agregação). É essa frivolidade ordinária que constitui, de forma indiscutível, a singularidade contemporânea. Noutra dimensão, os estudos de Otofried Jarren mostram que a democratização da política, via Internet, poderá se ampliar, na medida em que “graças a tecnologia o cidadão teria melhores possibilidades de participar da coisa pública. Anuncia-se a chegada da ciberdemocracia e nela se aventura a possibilidade de enviar um e-mail ao Presidente dos Estados Unidos com resposta garantida” (Jarren, 1999, p. 301). Em artigo publicado sob os auspícios da fundação Konrad Adenauer, Jarren discutiu os impactos que a Internet, do ponto de vista tecnológico, trouxe para a eficácia da comunicação política, apostando que desde o seu surgimento cresceram nos países que a utilizam as preocupações com o planejamento estratégico da atividade política, assim como se intensificaram os intercâmbios entre governos/sociedade/meios de comunicação/militantes no país de origem ou internacionais, entre outros, e ainda que, graças aos computadores, a democracia passaria por um período de maior racionalidade. Discutiu-se também que, passada a euforia dos primeiros dias, a eficácia tecnológica acabou promovendo um maior grau de seletividade/interatividade em comparação com a comunicação massiva convencional; ampliou a possibilidade de comunicação multimídia; promoveu um maior grau de individualização e direcionamento das mensagens graças à possibilidade de uma comunicação assincrônica e de maior seletividade; e, por fim, que estas tarefas seriam realizadas sem que houvesse um grande nível de organização por parte dos emissores das mensagens comunicacionais. (Idem, ibid., p. 304) Mais recentemente, o semanário Meio & Mensagem, no Brasil, ao difundir as questões mais contemporâneas sobre o marketing político, em caderno especial, mostrou a Internet como uma das ferramentas importantes ao processo de difusão de idéias e conceitos partidários, firmando-se como instrumento incorporado ao Customer Relation Menagement (CRM), pois, “aliada às ferramentas de telemarketing, a grande rede pode se transformar em um importante canal de relacionamento”, segundo Angelo Perosa, da empresa A2, que monta sites que


61 sejam realmente ferramentas de CRM integrados ao telemarketing de forma que eleitores, coordenadores de campanhas, imprensa e todos que estão de alguma forma ligados ao processo possam estar se informando em tempo real do que está acontecendo, inclusive com a transmissão do programa de televisão. (Meio & Mensagem, 2002, p. 10)

Sua empresa coordenou em 2000 o site do candidato a prefeito de São Paulo, Geraldo Alckimin, que na época recebia cerca de 4000 visitas diárias, mostrando que “o site de um candidato possa ser um centro de informações para o núcleo da campanha e o dinamismo da Internet permite atualizações constantes que garantem isso”, admitiu Perosa (idem, ibid.). Segundo Cordeiro (2002), a Internet possui três características na política. A primeira está ligada com a forma de comunicação interativa que a diferencia de qualquer outro veículo de comunicação, pois é onde o cidadão pode interagir com políticos e/ou governantes sem que fique somente no papel de receptor ou espectador. A segunda característica se refere à conveniência de contato, onde o cidadão pode entrar em contato com seu candidato ou personalidade política em qualquer lugar que possua um computador conectado à Internet. A terceira e última característica aponta para o contato direto entre cidadão e personalidade política. As informações chegam de um para o outro de forma direta sem intermediação de jornalistas e de intérpretes. Nas eleições americanas de 2000, a Internet foi utilizada como uma ferramenta de propaganda política de última geração, onde os candidatos publicavam tudo o que se referia à campanha com um custo muito menor do que os tradicionais veículos de comunicação. Diferentemente da televisão, do rádio e dos meios impressos, a Internet possibilita a segmentação da mensagem do candidato para diferentes públicos com um nível muito alto de precisão (Cordeiro, 2002). Através dos bancos de dados desenvolvidos para obtenção de cadastros das pessoas que navegam pelo site, pode-se obter um perfil dos visitantes e, assim, direcionar a mensagem para públicos específicos. Por se tratar de um veículo interativo que não é imposto à pessoa, os websites produzem um maior grau de interesse e os partidos podem desenvolver a mensagem com mais profundidade, sem a preocupação de aborrecer os seus eleitores. Para possibilitar a análise da comunicação político-partidária de sites existentes no Brasil e no Canadá, realizamos uma pesquisa descritiva, de modo que pudemos observar o funcionamento dos sites dos seguintes partidos previamente escolhidos pela proximidade de suas características ideológicas. Segundo Rudio (1999, p. 71), “a pesquisa descritiva está interessada em descobrir e observar fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los, interpretá-los”, de modo que possamos conhecer sua natureza, sua composição e os processos que o constituem ou nele se realizam. Deste modo, a pesquisa descritiva nos permitiu uma observação detalhada dos sites, facilitando o apontamento das características desta comunicação digital e seus reflexos na comunicação partidária nos dois países. Este tipo de pesquisa pode aparecer sob diversas formas e, para a realização deste trabalho, desponta por meio de um estudo comparativo. Neste estudo, o tema principal se enquadra na comunicação digital dos partidos políticos do Brasil e do Canadá, seguidos das observações da apresentação dos sites, cores partidárias, logomarcas, textos, fotos, links, número de visitantes, agenda, lojas virtuais, chats e endereços. Para a obtenção de informações para esta pesquisa recorremos a técnicas variadas de coleta. Uma delas enquadra-se no âmbito da pesquisa bibliográfica, que envolve livros, artigos, bancos de dados, revistas especializadas, entre outros, de maneira que nos permitiu conceituar e compreender os aspectos da comunicação política partidária na Internet.


62 Outra forma de coleta de dados refere -se à pesquisa documental que, segundo Gil (1987, p. 73), “(...) assemelha-se muito a pesquisa bibliográfica, a única diferença entre ambas está na natureza das fontes”. Dessa forma, em contato com os responsáveis pela construção e manutenção dos sites obtivemos informações mais precisas que contribuíram para o enriquecimento da pesquisa. Foi elaborado um questionário para os responsáveis pela confecção das páginas na Internet com o intuito de conseguir informações mais específicas sobre o funcionamento, acesso e custos dos sites estudados, tendo sido obtid as informações apenas de um responsável por um site brasileiro e um por um site canadense. O desenvolvimento de um quadro comparativo é de suma importância para a apresentação dos resultados da pesquisa, como parte integrante da conclusão desta análise. Apresentamos, a seguir, as principais características encontradas nos sites dos seis partidos escolhidos para este estudo, localizados no Canadá e no Brasil. Green Party of Ontario (Partido Verde de Ontário) O Partido Verde de Ontário foi considerado oficialmente como um partido político no ano de 1983, quando voluntários conseguiram coletar cerca de 10.000 assinaturas. É um partido independente de outros partidos verdes no Canadá e de outras partes do mundo, pois possui uma filosofia própria. A base do Partido parte da premissa de que toda a vida no planeta está interconectada e os seres humanos têm a responsabilidade de proteger e preservar a natureza mundial. A partir de 1999, fortaleceu-se e conseguiu eleger 58 candidatos, contra 37 candidatos em 1995. Os “Greens” são agora o quarto maior partido da província. O movimento verde começou no Canadá na década de 1960. Três décadas mais tarde, valores como paz, amor e flores (cultuados pelos hippies) foram fator de poder para a fundação do Partido Verde, simbolizando a não-violência, a justiça social e os pensamentos ecológicos. Atualmente, existem mais de 100 partidos verdes pelo mundo e há membros de partidos verdes eleitos em dúzias de países. No momento, o Partido Verde participa nos governos de coalizão no México, Nova Zelândia, Itália, França, Alemanha e Finlândia. No Canadá, como Partido Verde federal, existem partidos em BC, Alberta, Saskatchewan, Manitoba, Ontário e Quebec e organizações planejadas do partido em Nova Escócia e New Brunswick.. O pensamento desses partidos canadenses é composto por 10 chaves de valores: cultura ecológica, justiça social, democracia na sustentação do verde, não-violência, descentralização, comunidades de bases econômicas, respeito pela diversidade, responsabilidade pessoal e global, foco no futuro e sustentabilidade. O Green Party of Ontario (GPO) tem como símbolo de sua bandeira uma flor em espiral nas cores verde e amarelo. O site do partido (www.green.ca/english/) é bem completo e oferece vários links, entre os quais podemos destacar o Goods for Greens. Este serve às pessoas e a grupos de partidos verdes que procuram itens que simbolizem o partido, tais como bonés, pins, camisetas, adesivos etc., todos com o logotipo partidário. Há também uma seção de banners. Este link é uma espécie de lojinha virtual que contém imagens, preços e especificações de todos os produtos relacionados ao Partido. Existe ainda um link onde se podem encontrar novos boletins de notícias relacionados ao partido, além de um link de contribuição partidária, no qual os 1 $200 de contribuição são reembolsados em 75%, chegando a reembolsos no valor máximo de $500 por ano. As doações políticas em Ontário têm percentuais reembolsáveis. Ainda, há um link que permite o cadastramento de voluntários para o partido através do pagamento de uma taxa de $5.00.


63 É possível também, por meio do acesso a outro link, tornar-se membro do Partido, desde que se resida no Canadá e siga os valores e crenças do partido, não podendo ser membro de outro partido federal. Partido Liberal do Canadá A origem dos partidos políticos canadenses pode ser traçada desde os primeiros dias das colônias inglesas e francesas do alto e baixo Canadá. As raízes do Partido Liberal (PL) são mais antigas do que o próprio Canadá. No ano de 1891, já haviam instalações do Partido em todas as províncias, exceto em British Columbia. Em 1893, houve a primeira convenção nacional do PL do Canadá. Cerca de 2.500 deputados de todo o país encontraram-se em Ottawa. Foi a primeira vez em que todos os liberais de todas as partes do país juntaram-se politicamente. Dentre os princípios que guiam seu crescimento estão a dignidade humana, responsabilidade, liberdade individual, dentro de uma estrutura de uma sociedade justa. O Partido adota a equalização de oportunidade para todas as pessoas, intensificação de uma única e diversa comunidade cultural, reconhecendo as duas línguas oficiais do Canadá e preservando a identidade canadense em uma sociedade global. Em outubro de 2000, o Primeiro Ministro e líder do PL, Jean Chrétien, denominou a eleição como uma escolha clara, ou seja, o povo canadense elegeu o Partido Liberal do Canadá ao seu terceiro consecutivo mandato majoritário. O símbolo da bandeira do partido é composto pelo desenho da folha de acanto (acanthus – que aparece na bandeira canadense) e a palavra “liberal”. O site do partido é bem completo (www.liberal.ca/lpc/) e oferece extensas informações sobre a sua atuação. É possível juntar-se ao Partido, tornando-se um membro defensor dos valores canadenses, liderando o país através do novo século. Esta chamada faz parte do link “Join the party”, no qual é possível afiliar-se, se maior de 14 anos, residente no Canadá, e não pertencer a outro partido político federal. É possível também efetuar doações com dedução de taxas, ou seja, a cada $100 doados, por exemplo, o custo será de $25. Isto ocorre porque as doações políticas têm percentuais reembolsáveis. O Partido oferece também a possibilidade de contato via e-mail us, com a adição de mensagens e respostas. Além disso, oferece uma série de itens de pesquisa abordando os assuntos relacionados à economia, saúde, cultura, meio ambiente, justiça, mulher, transporte, atividades rurais etc. Por meio do site do Partido podem-se encontrar ainda muitas publicações que mostram o seu significado e suas raízes tão antigas. O quartel general do Partido Liberal está situado em Ottawa. Por meio de e-mail bulletins é possível receber notícias sobre as questões que norteiam a vida canadense. O Novo Partido Democrático do Canadá (NDP) O Partido foi fundado em 1961 em uma convenção em Ottawa. Contudo, suas origens datam do movimento de reforma social no começo do século XX junto aos pioneiros ativistas sociais. Os novos democratas apontam para mudanças fundamentais. Sinalizam os recursos do governo e a forte cooperação da comunidade no avanço da sociedade em direção ao alcance dos objetivos de equalização, justiça social e democracia. A proposta primária do Partido é oferecer uma visão do Canadá, onde as pessoas estão em primeiro lugar, uma democracia clara e política socialista alternativa. A tarefa central do NDP é dar poder aos canadenses para que


64 possam falar e trabalhar pela mudança social. Além disso, oferecer um diálogo aberto e educação política, desenvolvendo ferramentas que suportem a criação de valores e alternativas políticas que possam ser implementados. Internacionalmente, a missão do Partido é a cooperação com outras organizações socialistas democráticas e outros grupos, dividindo seus valores, com a missão de construir uma comunidade global. O desafio do NDP é fazer do Canadá um exemplo para o mundo, de uma nação que tem a melhor combinação de sustentação de prosperidade com responsabilidade social, econômica e política de equalização. O Partido busca a criação de uma sociedade em que todo o indivíduo tenha a oportunidade de utilizar todo o seu potencial e a construção de uma sociedade que respeite os direitos humanos e a diversidade cultural. Uma sociedade onde todo o cidadão do mundo possa dividir sua prosperidade e capacidade de sustentação, democracia, equalização e paz. O símbolo que representa a bandeira do partido é a folha de acanto (acanthus – símbolo da bandeira canadense) e as letras NDP. Através do site do partido (www.ndp.ca/) tem-se acesso a um link contendo sua agenda (com todos os dados relativos às suas atuações, seus movimentos, encontros, entre outros). O partido é liderado por uma mulher – Alexa McDonough, e é possível observar sua postura através do seu discurso, no qual convida os canadenses a lutarem para salvar o país. Há um link direcionado àqueles que desejam se tornar membros do partido. É possível ainda, efetuar doações online. Essas doações têm percentuais reembolsáveis, variando conforme os valores doados (doações políticas têm percentuais reembolsáveis, limitado a um crédito máximo de $500 por ano). Há também um link denominado “mediacentre” contendo datas, horários e assuntos diversos, reportagens; e também outro link denominado “Mouseland a discussion group”. Mouseland é uma fábula escrita por T.C. Douglas, o primeiro líder do Novo Partido Democrático do Canadá. É uma história simples, mas com uma forte mensagem sobre as raízes da democracia e sobre o porquê da necessidade do NDP. O Mouseland é uma comunidade virtual onde os novos democratas trocam idéias e opiniões sobre a política do partido, política federal e outras questões de interesse. É um espaço livre para discussões informais, debates e diálogos. Para se juntar ao Mouseland é necessário ser membro do partido. Há também um link denominado "NDP on the issues", que trata questões relacionadas à economia, infra-estrutura, meio ambiente, recursos naturais, educação, emprego, saúde, cultura, comunidade, questões internacionais, criança, entre outros. Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) Dentre os partidos considerados de “grande porte” no Brasil, o PSDB é o mais novo. O partido foi fundado em 25 de julho de 1988, tendo sua origem em parlamentares do PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) da Assembléia Nacional Constituinte de 1988. Nos últimos 14 anos, a ascensão do PSDB foi meteórica. Além de ocupar por diversas vezes os governos de importantes estados brasileiros, como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, há praticamente 8 anos o partido está no Governo Federal. O site do Partido (www.psdb.org.br) é o mais completo entre os três partidos brasileiros estudados neste trabalho. Para fazer esta descrição, montamos uma espécie de mapa do site, a fim de identificar todo o conteúdo oferecido pelo Partido na Internet. Além da página de apresentação (home), com o logotipo (tucano) e as cores do partido (amarela e azul) sempre em destaque, o PSDB permite ao internauta uma gama de informações que vai desde o noticiário sobre a sucessão presidencial, e neste caso, com destaque para José Serra, até eventos promovidos pelo Instituto Teotônio Vilela e sua rede de comunicação.


65 Aqui destacarem alguns dos links oferecidos pelo site, entre eles as realizações do PSDB no governo. Este link oferece informações sobre ot das as ações desenvolvidas pelo Partido no comando do governo federal, além de ações previstas para este ano. Estes balanços envolvem também os governos estaduais e destacam o Ministério da Saúde, que teve como principal protagonista o pré -candidato do partido à presidência da República, José Serra. Outro destaque diz respeito ao noticiário. O link “agência tucana”, com informações de várias agências e do próprio governo, oferece informações atualizadas sem uma periodicidade definida. Entretanto, ressalta as ações do governo e o seu destaque na impressa nacional, trabalhando com textos e fotos de membros do partido. A agência tucana oferece, além das “últimas notícias”, boletins de rádio em texto e áudio, bem como o acompanhamento dos tucanos em seus respectivos estados, no Congresso e nas assembléias, através de entrevistas e artigos. Por fim, destacamos a biblioteca oferecida pelo site. São vários links: publicações (inclusive com um jornal tucano); pronunciamentos; manual de identidade (do partido); banco de vídeos, banco de sons e banco de imagens. Estes três últimos referem-se às ações do governo e material de campanha. O jingle do presidente Fernando Henrique e do pré-candidato à presidência, José Serra, estão disponíveis online, bem como outros materiais, como a logomarca do partido e de campanhas, fotos, a biografia do PSDB, entre outros. É importante ressaltar aqui que o site explora muito a imagem de membros importantes do Partido através de fotos nos vários links, além de estar em plena campanha pelo candidato José Serra. Oferece, além dos destaques feitos aqui, links para a constituição e história do Partido, apoio jurídico, agenda partidária (e eleitoral), PSDB Jovem, PSDB Mulher, Instituto Teotônio Vilela e a possibilidade de filiação online, bem como um link para contatos com o Partido (fale conosco). Partido da Frente Liberal (PFL) O Partido da Frente Liberal foi fundado no dia 24 de janeiro de 1985 e conta com nomes importantes da política nacional em seu quadro de afiliados, como Antonio Carlos Magalhães, ex-presidente do Senado Federal, Marco Maciel, por duas vezes vice-presidente da República na coligação com o PSDB e a própria Roseana Sarney, governadora do Maranhão e que esteve presente na mídia nos primeiros meses do ano como pré-candidata do partido à presidência da República. No ar há 3 anos e meio, o site do PFL (www.pfl.org.br) segue o mesmo padrão do site do PSDB. O logotipo e o número 25 estão presentes em, praticamente, todas as páginas, servindo, inclusive, de segundo plano em várias delas, como é o caso das notícias. Por outro lado, as cores azul, amarela e verde, que o identificam, estão menos presentes do que no site do PSDB. Segundo David Baker, responsável pelo site do PFL, 3 pessoas trabalham na sua manutenção, cujos custos podem chegar a R$ 3.500,00 por mês. Em entrevista concedida para este estudo, revelou ainda que cerca de 550 pessoas visitam o PFL na Internet diariamente. Da home page do partido é possível fazer uma série de links que permitem uma visão global do PFL, da sua história aos dias atuais, passando, evidentemente, pela sucessão presidencial. No período estudado, especificamente, um dos links de destaque diz respeito ao noticiário. Tudo girava em torno de Roseana Sarney, nome forte do partido no Maranhão e que ganhava destaque nacional na corrida pela presidência da República. Além de fazer muitas referências ao seu programa de governo, o site apresentava pesquisas apontando Roseana em segundo lugar e com presença garantida no segundo turno das eleições. É importante destacar que o PFL também possui uma “agência” própria, que contribui na alimentação de notícias para o site. Informações e matérias oriundas de outras agências e mídias também compõem a página


66 de notícias, como é o caso de O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo, sem um período específico de atualização. Um outro destaque do site do PFL é o Instituto Tancredo Neves de Estudos Políticos e Sociais. Criado em maio de 1985, o Instituto serve como uma assessoria do PFL, desenvolvendo estudos sobre o liberalismo contemporâneo e o pensamento político brasileiro. Além da sua relevância como órgão de assessoria ao Partido, o Instituto carrega consigo o nome de uma das maiores figuras políticas da história do país: Tancredo Neves. Além de associar o nome do político mineiro ao Instituto, também instituiu o Prêmio Luis Eduardo Magalhães, político baiano, filho de Antonio Carlos Magalhães, virtual substituto do pai e nome certo nas eleições presidenciais. Destacamos o link “a marca do PFL”. Trata-se, na verdade, de uma página onde se pode encontrar informações sobre como “confeccionar” a marca do partido, destacando suas características, aplicações e sugestões de material promocional. Por fim, é importante fazer referência ao link que o site permite com o Partido Popular da Espanha. Partido Verde (PV) Dos sites dos três partidos brasileiros pesquisados, o do PV é o mais simples e o que apresenta menos conteúdo. Além de não ter um endereço “.org”, como os outros partidos, tratase apenas de um site de caráter regional, neste caso, o Rio de Janeiro. Existe uma página nacional do Partido Verde (www.pv.org.br), mas se encontra em implantação. Optamos, então, por estudar a página do PV do Rio de Janeiro. O site parece ter sido montado exclusivamente para a eleição de 1998. Não existe qualquer atualização daquele ano para cá. Na home, aparecem alguns banners com o nome, foto e número de candidatos a deputado (Fernando Gabeira e Gilberto Teixeira, federal; Andréa Correa, estadual) e a presidente (Alfredo Sirkis), sempre ressaltando o número 43. Um fato curioso é que, além de manter os banners no ar, Fernando Gabeira nem faz mais parte do PV. Em 2001, ele se filiou ao PT (Partido dos Trabalhadores). Se, por um lado, o site não representa o estágio atual do Partido Verde, por outro, revela o perfil universal do Partido. O grande destaque do site diz respeito aos links que permitem com outros sites de partidos com a mesma filosofia do PV. Isso não se resume apenas ao Brasil, pois há acesso a links com o PV de outros estados ou cidades. Sites de partidos de outros pontos do mundo podem ser conectados, entre eles da Alemanha, Estados Unidos, França e do próprio Canadá, um dos objetos de nosso estudo. Além de possibilitar este contato com partidos de mesma linha ideológica no Brasil e no mundo, o site do PV também presta um serviço, permitindo, a partir da sua página, acessar sites de outros partidos brasileiros, independente das suas alianças, como é o caso do PSDB e PFL, que também fazem parte deste estudo, e ainda partidos de esquerda, como o PT, PCdoB e PSTU. Considerações finais No ciberespaço, a territorialidade deixou de ser importante. Poder-se-ia dizer, portanto, que a Internet não só é o motor, mas também o elemento emblemático das tendências cosmopolitas contemporâneas. Pode-se levar esta reflexão adiante e perceber algumas situações novas para o ato de votar, com o avanço da Internet e sua intersecção com a política. Tem sido possível perceber


67 com o seu advento que um número maior de pessoas tem conseguido interagir de forma mais adequada com candidatos e partidos políticos. A similaridade entre as páginas dos sites de partidos políticos brasileiros e canadenses ficou evidenciada neste estudo, que mostrou ainda algumas questões tópicas como: o Partido Verde, em tese o mais internacionalista, tem boas ações no Canadá e uma página não atualizada há anos no Brasil, embora mantenha conexões internacionais importantes; o PFL no Brasil, que remete um dos seus links para um partido ideologicamente similar – o Partido Popular da Espanha, abrindo-se igualmente para contatos internacionais. Contudo, percebe-se que faltam aos partidos, aos dirigentes partidários e até mesmo aos profissionais que têm responsabilidade de criação e difusão de idéias no ciberespaço político, mais profissionalismo e criatividade para que os sites não se transformem em "entulho". Há, todavia, quem argumente que a propaganda política via Internet possibilita atualmente uma atualização dos cidadãos aos passos e procedimentos dos atores políticos. Alguns utilizam estes espaços para fortalecer a democratização e a ação pluralista e participativa. A militância ganha em velocidade de orientação e no aperfeiçoamento das informações. Os níveis de pressão sobem alentadoramente aos representantes políticos, como forma de enquetes, pesquisas rápidas, diálogo ou incitação. Aumenta-se, assim, a visibilidade da ação política nos três níveis: executivo, legislativo e judiciário. A cobrança das ações parlamentar e executiva igualmente cresce em demanda, se enriquece em sugestões e se democratiza, mesmo que a distância. O que se vislumbra com o espaço virtual e seu tangenciamento com a política é o nascimento de um princípio pelo qual se reforçaria o conceito da democracia e, especialmente, haveria o surgimento de plebiscitos eletrônicos capazes de nortear a ação dos partidos, governos e seus representantes, no que poderíamos chamar de uma sintonia fina com a sociedade. Por fim, sugere-se que são grandes as esperanças depositadas na renovação eletrônica da democracia, pois ampliam-se as nossas expectativas segundo as quais a comunicação virtual partidária via Internet seja uma facilitadora dos cidadãos na busca de informações para tomada de decisões, visto que a renovação da sociedade civil democrática não depende da quantidade de lugares que possuam um computador com acesso direto à Internet, mas depende, em primeira instância, da qualidade da nossa formação política e das possibilidades de refletir além do horizonte dos nossos interesses particulares. Referências bibliográficas ANDRADE, M.M. Introdução à metodologia do trabalho científico. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. GIL, A.C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 1999. JARREN, O. Democracia através de Internet? In: THESING, J.; PRIESS, F. (Orgs.). Globalizacion, democracia y medios de comunicacion. Buenos Aires: Fundação Konrad Adnauer, 1999, p. 452. LEMOS, A. Bodynet e netcyborgs: sociabilidade e novas tecnologias na cultura contemporânea. In: RUBIM, A.; BENTZ, I.; PINTO, M. (Orgs). Comunicação e sociabilidade nas culturas contemporâneas. Petrópolis: Vozes/Compós, 1999. MEIO & MENSAGEM. Marketing político. São Paulo, 8 abr. 2002. MERTES, M. Internet e cultura política. In: THESING, J.; PRIESS, F. (Orgs.). Globalizacion, democracia y medios de comunicacion. Buenos Aires: Fundação Konrad Adnauer, 1999, p. 329348.


68 QUEIROZ, A. Maxivoto. PCLA, revista eletrônica, <www.metodista.br/unesco>. Acesso em: 30 maio 2002.

n.

4.

Disponível

em

QUEIROZ, A. A propaganda eleitoral via internet. Comunicação apresentada no XXIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Intercom, Manaus (AM), setembro de 2000. RICHARDSON, R.J. Pesquisa social – métodos e técnicas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1999. RUDIO, F.V. Introdução ao projeto de pesquisa científica. 26ª ed. Petrópolis: Vozes, 1999. WAACK, W. Camaradas. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.


69

Comunicação, política e hospitalidade: campanha para eleição de Barak Obama Cláudia Setti Gouvea FRANCO29

O percurso teórico para a análise da hospitalidade, na Campanha Presidencial Americana de 2008, busca em Camargo (2004) e em Grinover (2006), e outros pensadores da hospitalidade reflexões que permitam a criação de novas categorias sociais para compreender fatos e criar instrumentos mais afinados de conhecimento das relações sociais. No universo do político, a hospitalidade equilibra-se em dois paradigmas que sustentam o jogo de poder: o paradigma da inimizade, do confronto, no qual as identidades precisam se reafirmar pela diferença, e o paradigma da aliança, do aliado, do hóspede, comensal, ou seja, da convivência, da tolerância e da comensalidade (Boff, 2005). Da definição analítico-operacional de hospitalidade: [...] ato humano, exercido em contexto doméstico, público e profissional, de recepcionar, hospedar, alimentar e entreter pessoas temporariamente deslocadas de seu habitat natural [...] as práticas sociais ocorrem em determinados tempos sociais de hospitalidade e espaços sociais nos quais o processo se desenrola (CAMARGO, 2004, p. 52). A reflexão sobe hospitalidade, comunicação e política tomam por referência a segunda parte da definição analítico-operacional analisando as práticas de comunicação política de uns determinados tempos e espaços sociais. O objetivo final da hospitalidade é estabelecer o vínculo social; oferecê-la é ritualizar o oferecido, implica em sacrificar algo em favor de alguém, sacrifício que oculta algum tipo de interesse legítimo, uma vez que a hospitalidade não esteja instrumentalizada em contrato escrito ou troca comercial (CAMARGO, 2004). Entender a hospitalidade como um fenômeno de qualidade humana, o qual se manifesta tanto no plano dos indivíduos quanto na esfera social, é fundamental para a análise das diversas abordagens possíveis sobre o tema (GIDRA; DIAS, 2004, p. 129). O aspecto de expressão não escrita da hospitalidade é um processo de comunicação interpessoal, carregado de conteúdos verbais e não-verbais, os quais constituem fórmulas rituais que variam de grupo social para grupo social, que são lidas como desejo ou recusa do vínculo humano (CAMARGO, 2004, p. 31), de forma que não existe uma maneira única de a hospitalidade se expressar no plano real e objetivo. A hospitalidade não abole a perspectiva de uma retribuição futura, apenas exige que se aja como se a retribuição não fosse necessária. O aceite da hospitalidade evita o mecanismo oposto que é o da hostilidade e implica uma posição de inferioridade diante do doador, ou anfitrião, gerando uma obrigação a qual Mauss (1974) definiu como livre obrigação de retribuir (CAMARGO, 2004, p. 19-24). O equilíbrio de forças das relações acontece à medida que as trocas impulsionam alternadamente os lados envolvidos para posições de inferioridade e superioridade. A instrumentalização da hospitalidade visa ao equilíbrio das relações pessoais, de forma a evitar a hostilidade, daí a importância de adequar-se, entendendo que tais ações criam, restauram e mantêm os vínculos, no caso ações comunicaionais.. 29

Doutoranda em comunicação pela UMESP


70 Refletir sobre hospitalidade, comunicação e política é de interesse do mundo globalizado, que se preocupa com a progressiva homogeneização de hábitos e costumes e com o conseqüente esvaziamento dos rituais que regem os vínculos sociais, tão necessários para preservar identidades (CAMARGO, 2004). A comunicação de massa, que esvazia o ritual cotidiano da conversação, isola os indivíduos, segundo Camargo (2004). Transpondo essa perspectiva para o cenário político, em se tratando de estratégias de comunicação em massa, determina vários tipos de ef rramenta de comunicação. Na área de eventos; na área de comunicação visual, outdoors, distribuição de brindes de campanha e de propaganda, fato que motiva os candidatos a práticas criativas de cuidado, acolhimento das diferenças, tolerância e partilha (BOFF, 2005, p. 13). A necessidade de objetivar a comunicação com os eleitores é cada vez maior, e, no caso dos políticos, como representantes do povo, é importante que se apresentem hospitaleiros e saibam exercer a hospitalidade, seja ela pública ou privada. A dinâmica de relacionamento pessoal, chamada sociabilidade primária, baseia-se na assunção pessoal do outro e impõe-se sobre a sociabilidade secundária (CAMARGO, 2004). A preocupação em pensar hospitalidade fundadora e mantenedora de vínculos de motivação política contribui para a reflexão sobre a importância da leitura dos espaços reservados para prática da política. Nesse sentido, a análise desses espaços de hospitalidade toma como referência os indicadores de hospitalidade identificados por Grinover (2006) – acessibilidade, legibilidade e identidades. O uso do espaço, passa a ter significado a partir dos atores que dele se utilizam, lugares concretos onde se dão seus anseios, relacionam-se e consideram suas potencialidades (GRINOVER, 2005, p. 30). A adequação dos espaços à imagem hospitaleira traz implícito o resgate de valores de pertencimento e demonstra a capacidade do anfitrião expressar um microcosmo social ordenado, ressaltando tanto as qualidades e a importância do convidado quanto as suas (GRINOVER, 2005). A referência teórica descrita acima possibilita a análise desses territórios como espaços de vivência e convivência, tanto pela ótica da hospitalidade doméstica quanto da hospitalidade pública. A reflexão sobre hospitalidade é de interesse do mundo globalizado, que se preocupa com a progressiva homogeneização de hábitos e costumes e com o conseqüente esvaziamento dos rituais que regem os vínculos sociais, tão necessários para preservar identidades (CAMARGO, 2004). Dessa forma é possível entender a hospitalidade como um processo de comunicação interpessoal, carregado de conteúdos verbais e não-verbais, os quais constituem fórmulas rituais que variam de grupo social para grupo social, que são lidas como desejo ou recusa do vínculo humano (CAMARGO, 2004, p. 31), ou seja, não existe uma maneira única da hospitalidade se expressar. A preocupação em pensar hospitalidade enquanto fundadora e mantenedora de vínculos de motivação política contribui para a reflexão sobre a importância da análise dos espaços reservados para comunicação política, sejam eles novos ou tradicionais. Nesse sentido, o cenário onde se desenrolou a campanha de Obama favorece a análise dos mais diversos tipos de fontes para a pesquisa. Entendendo que a comunicação de massa esvazia o ritual cotidiano da conversação e isola os indivíduos, segundo Camargo (2004), transpor essas barreiras comunicacionais utilizando novas estratégias de comunicação, foi o tom da campanha de Barack Obama para presidência dos EUA, campanha que estabeleceu um marco para o marketing político. Novos padrões de consumo vinculados a padrões de comportamento também modernos podem mudar, em hipótese, inteiramente o perfil dos processos comunicacionais na base da pirâmide social. Apesar da redução gradativa da influência dos veículos tradicionais, os "jornalões", frente a internet eles não deixaram de estabelecer um determinado controle discursivo. Na contramão do aparato tecnológico utilizado na campanha de Obama, e conseqüentemente da


71 diversidade de fontes criadas a partir dos novos espaços de comunicação, à pesquisa adotou como fonte primária um jornal de circulação nacional. A escolha do jornal enquanto fonte primária da pesquisa se mostrou adequada uma vez que confirma o papel do jornal seja como de formador de opinião, em especial nas classes A e B , mesmo que alguns pesquisadores identifique-os como simples reprodutores de vozes sociais que falam para si mesmas, alheando-se às mudanças ocorridas à sua volta Para cada tipo de fonte adotada, aplica-se uma metodologia, cuja finalidade é estabelecer limites ao universo pesquisado e provocar reflexões sobre o objeto almejado, buscando identificar a presença dos paradigmas que conduzem a reflexão teórica da pesquisa hospitalidade nas ações de marketing político, tomando os referenciais teóricos de hospitalidade e da comunicação política. O jornal, como fonte de pesquisa, consiste em uma ferramenta adequada nos casos de pesquisas qualitativas: “a arte de investigar diariamente, com visão crítica aliada à imparcialidade, apurando cuidadosamente, nos bons textos, o que é imprescindível no que se refere aos dados para a pesquisa” (Noblat,2006). [...] guardar notícias de jornal para delas depois extrair histórias... atrás de muitas notícias esconde-se uma história pedindo para ser contada. a partir daí eu tinha uma nova fonte de inspiração e de prazer [...] (SCILIAR; Moacyr, 2002). O jornal é o espaço de criação cujo acontecimento se transforma em fato, espaço que nos informa e no qual a informação toma forma de verdade. Essa arte, que tem o jornalista como artífice, deve ser interpretada à luz da crítica, e cabe ao pesquisador juntar os fragmentos dessa fonte, e das diversas fontes consultadas para tecer uma análise crítica. O primeiro pilar que dá sustento à credibilidade de um jornal é a capacidade que tem de ouvir seu leitor, exercício tão importante quanto o de informar. Esse canal de abertura para o outro, em forma de espaço para manifestação de opiniões, deve fazer parte da vocação de um jornal. O jornal enquanto fonte de informação e pesquisa pode ser considerado um doador que busca por intermédio do seu ofício estabelecer uma rede com características específicas, cujo objeto doado é sua reflexão sobre determinado assunto em forma de notícia. O jornal, por sua vez, aposta no conteúdo das matérias, suas reflexões e abre seu espaço para divulgação, os quais, bem recebidos pela opinião pública, passam a fazer parte do rol de demandas dos leitores, garantindo a compra do periódico. Dessa forma, se estabelece uma rede cuja continuidade dependerá da capacidade do jornalista trazer o leitor para seu universo particular, o que garantirá sua manutenção. Em cada texto é possível estabelecer um fio condutor mostrando como os jornais se relacionam com a opinião pública e como interferem nas agendas políticas. O aspecto comercial da operação não anula o caráter dadivoso, uma vez que, nesse caso, o grande diferencial é a liberdade de expressão, e pode-se considerar a obrigatoriedade contratual de escrever como o elemento sacrifical presente em toda dádiva que se mistura com o prazer (Godbout, 1999). O jornal o Estado de São Paulo é conhecido também como "o Estadão", que se identifica como um jornal "brasileiro". É fundado, baseando-se nos ideais de um grupo de republicanos, em 4 de janeiro de 1875. Nessa época, o jornal chama-se a província de São Paulo e é o pioneiro em venda avulsa no país, fato pelo qual é ridicularizado pela concorrência. Curiosamente, a venda avulsa é impulsionada pelo imigrante francês Bernard Gregori, que sai às ruas, montado em um cavalo (ver logo marca) e tocando uma corneta para chamar a atenção do público. Décadas depois, torna-se o próprio símbolo do jornal, fato que aumenta significativamente sua tiragem. O “estadão” mostrou-se em conformidade com os critérios adotados para seleção de material como fonte primária da pesquisa, a partir do momento que ficou comprovado que o jornal preenche os quesitos estabelecidos: credibilidade, estrutura como empresa jornalística globalizada e, principalmente, seu compromisso com as questões políticas são fatores fundamentais na


72 construção da imagem de um veículo de imprensa que se propõe cobrir as notícias que circulam pelo mundo em especial eleições internacionais. Identificado com o pensamento "conservador" ou "neoliberal" desde o golpe militar de 1964, e, principalmente, após 1968, o “estadão” vem tomando posições mais que liberais também nos cenários social e político. Além do jornal o Estado de São Paulo preencher os requisitos básicos, que a metodologia estabelece para uma fonte impressa de pesquisa, atende aos interesses da pesquisadora, como a assiduidade na distribuição, garantindo uma análise sistemática dos fatos políticos internacionais, tradição em jornalismo político, e elenco de articulistas respeitados. O percurso metodológico teve início na seleção de matérias sobre a campanha presidencial americana, a partir de reportagens do jornal o Estado de São Paulo no “Caderno Internacional – Corrida á Casa Branca”; artigos do “Caderno Aliás” publicado aos domingos e Caderno 2, sobre as eleições americanas de 2008, cujas chamadas apresentavam incidência de jargões políticos utilizados pela imprensa escrita nacional para descrever as ações da campanha presidencial americana, no período que compreende os meses de agosto; setembro; outubro de 2008, com o objetivo de confirmar a presença dos indicadores de hospitalidade enquanto fundadora de vínculos de motivação política, expressa nas ações do marketing político. As conexões feitas em decorrência da leitura das matérias e compreendidas com base em fatores culturais, apesar de parecerem simples, são instrumentos eficazes para entender a teia de relações que sustenta o sistema político, tal qual a análise dos “jargões" políticos. As eleições, no sistema democrático, são batalhas importantes da guerra entre as diversas facções políticas. Essa é uma das formas de como, com bastante freqüência, a linguagem jornalística utiliza-se para tratar das campanhas eleitorais. As mais comuns são as que comparam campanhas a corridas de cavalos ’horse race’, jogos de azar, futebol, lutas corporais e guerras (NEGREIROS, 2003, p. 29) Extraem-se das manchetes dos jornais e dos títulos das reportagens selecionadas termos que demonstrem a linha frágil que tece os relacionamentos de motivação política e como o uso dessas expressões identificam o tipo de relação de um determinado momento político. Conhecedor da força simbólica das palavras e de como o imaginário do povo reage a mensagens desse tipo, jornalistas fazem uso dos termos de forma pejorativa ou não. A partir dessa base textual, as definições de cada um também são extraídas dos textos do banco de dados e de informações da literatura especializada na área política. A apropriação de palavras da língua corrente para uso político é fruto de um ambiente liberalização política, portanto de liberdade de expressão – cada um escreve e diz o que bem entende. a imprensa abriga um debate democrático, porém sem regras, cujos níveis de violência incluíam insultos, palavrões, ataques pessoais e agressões enunciadas sem precedentes na nossa história. É nesse momento que a força da palavra toma forma nos jargões e a criatividade nas descrições deturpadas de aspectos físicos, e surgem as charges. Tais palavras, “os jargões políticos”, em virtude de sua incorporação à fala e aos discursos utilizados pela imprensa escrita para descrever as ações da campanha presidencial americana se mostraram possíveis fontes de pesquisa desses espaços de hospitalidade. O cenário eleitoral favorece a análise dos jargões políticos usados pela imprensa escrita para noticiar as ações de campanha. Em um primeiro momento foram selecionados nas manchetes dos artigos e reportagens dos jornais termos denominados ”jargões políticos”, a fim de analisá-los sob o paradigma da hospitalidade na política. Demonstrar como o uso contextualizado de algumas palavras pode promover o fortalecimento dos vínculos ou sua ruptura. Os jargões políticos, ganham status de termos, ou seja, palavras que ampliam a extensão do seu significado, podendo expressar momentos de paz ou guerra verbal entre políticos, militantes e colaboradores, normalmente deflagrada na época das eleições. Dependendo do lado da fronteira em que estiver o autor ou o


73 receptor da fala, esses termos podem criar ambientes, tanto de hostilidade quanto de hospitalidade, capazes de transformar, em muitas ocasiões, o debate político em verdadeiros embates. É possível interpretar o uso desses termos, tanto na fala quanto no discurso dos políticos, como gestos que indicam desejos de aproximação, inclusão, de dar início ou manter um relacionamento, ou os desejos de romper, afastar ou excluir indivíduos ou partidos do projeto político em questão, que é a vitória nas urnas. Os jargões podem ser usados para registrar uma marca pessoal, a qual, pela repetição, se fixa na memória. Partindo dessa compreensão do significado subjetivo dos jargões, é possível estabelecer uma relação simbólica entre o termo e aquele que o profere. O jargão tem papel importante na composição da imagem do fato e do ser político. O critério adotado para a seleção dos jargões fundamenta-se na aderência do conteúdo, de duas categorias estabelecidas a partir do fundamento teórico para análise dos artigos publicados. a saber: hospitalidade, bens simbólicos e marketing político Parte-se da análise das manchetes, dos títulos das matérias e do corpo do texto da reportagem, do jornal o estado de São Paulo para a seleção dos jargões, observando-se sua freqüência. Depois de selecionar os mais usados pela imprensa, outros termos, com significado similar de acordo com a aderência ao conceito e com as categorias de pesquisa estabelecidas, são identificados e agrupados. a hospitalidade pressupõe uma aposta, sempre que se da ou se faz algo não se tem certeza do retorno; o que se pode ter é uma expectativa. Essa dinâmica é reconhecida no universo político pela expressão “jogo político” – “arte de executar diferentes combinações; manejar com destreza o risco, a aposta" (glossário publicado no jornal o diário do grande abc, 5/6/06, p. 4). O referencial teórico da hospitalidade abrange os termos usados para identificar situações de vínculo e situações de ruptura de vínculos políticos. Com esse sentido, selecionam-se os termos ”aliança” e ”adversário”. O termo aliança implica em oito outros termos derivados, a saber: acordos, aliados, apoio, assédio, base aliada, coalizão, coligação, conciliação e dobrada; o termo adversário implica em nove outros termos, a saber: ataque, contra-ataque, debate, degola, divisão, fogo cruzado, inimigo, ofensiva e oposição. A cordialidade é analisada a partir de dois grupos de palavras que reflete essa identidade No tocante às identidades histórico-culturais, são escolhidos cinco jargões: cacique, cardeal, clientelismo, padrinho e raposa política. Quanto à ingerência dessa identidade históricocultural em um determinado espaço físico, são escolhidos três termos – bordões, grotões e redutos. Em relação ao paradigma da economia de bens simbólicos, são selecionados três jargões: capital político, dobrada e fatia. Capacidade de mobilizar/discutir/conciliar; voluntariado; jovens; descentra mento; imagem/identidade; monitoramento ético; humor Análise dos jargões busca privilegiarem o significado dos jargões e sua força mediante a repetição exaustiva dos termos nas reportagens. Em um total de 100 matérias que cobrem o período de 01/08/08 a 20/10/09, com 3 dias de intervalo para cada bloco de matérias foram analisadas as manchetes dessas matérias e agrupadas de acordo com as categorias elencadas com base no paradigma da hospitalidade. "Marqueteiro ajuda a transformar Obama em fenômeno político", em Estado de São Paulo. São Paulo 17 fev. 2008. Caderno Internacional A14. "Wal-Mart alerta para "riscos" da vitória de Obama”, em Estado de São Paulo. São Paulo 17 fev. 2008. Caderno Internacional A17.


74 "Obamania não se traduz em votos”... “Candidatos buscam vices que compensem suas deficiências’, em Estadas de São Paulo. São Paulo 03 ago. 2008. Caderno Internacional A18. "Mccain usa Hillary contra obama", em Estado de São Paulo. São Paulo 08 ago. 2008. Caderno Internacional A15. "Grandes grupos dão dinheiro para Obama" em Estado de São Paulo. São Paulo 08 ago. 2008. Caderno Internacional A17. "Convenção democrata será histórica... partido remete fazer a convenção mais ecológica da história", em Estado de São Paulo. São Paulo 15 ago. 2008. Caderno Internacional A20. “Para alguns adversários, os EUA oferecem diálogos; para outros, o gelo”... “Obama e Mccain dão prévia de debates eleitorais”, em Estado de São Paulo. São Paulo 18 ago. 2008. Caderno Internacional A16. "Obama promete anunciar vice por mensagem de texto", em Estado de São Paulo. São Paulo 19 ago. 2008. Caderno Internacional A14. "Obama faz suspense sobre vice", em Estado de São Paulo. São Paulo 20 ago. 2008. Caderno Internacional A14. "Mccain ultrapassa obama em pesquisa", em Estado de São Paulo. São Paulo 21 ago. 2008. Caderno Internacional A19. “Mccain diz que não sabe quantas mansões possui", em Estado de São Paulo. São Paulo 22 ago. 2008. Caderno Internacional A16. "Obama fatura com mistério sobre vice", em Estado de São Paulo. São Paulo 23 ago. 2008. Caderno Internacional A28. "Obama escolhe Joe Biden como vice”... “um político autêntico e experiente”, em Estado de São Paulo. São Paulo 24 ago. 2008. Caderno Internacional A16. "Obama usa convenção para renovar campanha”... “o presidente precisa ver além do próprio horizonte”, em Estado de São Paulo. São Paulo 24 ago. 2008. Caderno Internacional A18. "Preto branco e bege”... "a grande reunião", em Estado de São Paulo. São Paulo 24 ago. 2008. Caderno Aliás, J3 “Abominação no circo das eleições”, em Estado de São Paulo. São Paulo 24 ago. 2008. Caderno Cultura D6. “Convenção americanizará obama”... “para eleitores, mídia favorece candidato”, em Estado de São Paulo. São Paulo 25 ago. 2008. Caderno Internacional A12. “Senador precisa repensar lema de campanha”, em Estado de São Paulo. São Paulo 25 ago. 2008. Caderno Internacional A13.


75 "Michele obama abre convenção e enfatiza "americanismo" do marido", em Estado de São Paulo. São Paulo 26 ago. 2008. Caderno Internacional A14. "Hillary tenta unir partido em torno de obama”... “Lobbies de energia patrocinam festas na convenção”, em Estado de São Paulo. São Paulo 26 ago. 2008. Caderno Internacional A15. "Hillary faz discurso decisivo para socorrer candidatura de obama", em Estado de São Paulo. São Paulo 27 ago. 2008. Caderno Internacional A14. "Democratas apostam em valores como arma", em Estado de São Paulo. São Paulo 27 ago. 2008. Caderno Internacional A16. "Partido oficializa candidatura de obama”, em Estado de São Paulo. São Paulo 28 ago. 2008. Caderno Internacional A13. "Clinton promete lutar para eleger obama”... “nomeado vice, Biden inicia ataques a adversários”, em Estado de São Paulo. São Paulo 28 ago. 2008. Caderno Internacional A14. "Obama aceita indicação, ataca bush e Mccain e promete resgatar economia”... “ícones Luther King e JFK inspiram candidato”, em Estado de São Paulo. São Paulo 29 ago. 2008. Caderno Internacional A18. “Mccain promete anunciar vice hoje", em Estado de São Paulo. São Paulo 29 ago. 2008. Caderno Internacional A20. "Preconceito no caminho de obama", em Estado de São Paulo. São Paulo 30 ago. 2008. Notas & Informações A3. "Política do Alasca será vice de Mccain", em Estado de São Paulo. São Paulo 30 ago. 2008. Caderno Internacional A25. "Ex-miss combate aborto e união gay”... "vice também fazem confronto de gerações”... “discurso de obama dá impulso à campanha”, em Estado de São Paulo. São Paulo 30 ago. 2008. Caderno Internacional A28. "Mccain tenta superar déficit de entusiasmo em reunião republicana”... "convenção une democratas e fortalece nome de obama", em Estado de São Paulo. São Paulo 31 ago. 2008. Caderno Internacional A20. "Obama, o nômade, simboliza EUA", em Estado de São Paulo. São Paulo 31 ago. 2008. Caderno Internacional A21. "Adivinhe qual deles é o caprichoso", em Estado de São Paulo. São Paulo 31 ago. 2008. Caderno Aliás, J3. “Furacão atrapalha convenção do partido republicano”, em Estado de São Paulo. São Paulo 01 set. 2008. Caderno Internacional A13. “Mccain enfrenta protestos”, em Estado de São Paulo. São Paulo 01 set. 2008. Caderno Internacional A14.


76

"Furacão dá a partido chance de redenção”... "vice de Mccain anuncia gravidez da filha menor"; "Republicanos transformam convenção em evento de ajuda às vítimas de Gustav",, em Estado de São Paulo. São Paulo 02 set. 2008. Caderno Internacional A14. "Vice pode constranger mais Mccain", em Estado de São Paulo. São Paulo 03 set. 2008. Caderno Internacional A16. "Vice de Mccain critica a mídia”... "Republicanos partem para ataque contra obama”, em Estado de São Paulo. São Paulo 04 set. 2008. Caderno Internacional A14. "Mccain promete grandes mudanças”... "Convenções marcam diferença entre partidos", em Estado de São Paulo. São Paulo 05 set. 2008. Caderno Internacional A15. "Convenção dá novo ânimo a Mccain”... "Republicanos igualam-se a obama na retórica opositora", em Estado de São Paulo. São Paulo 06 set. 2008. Caderno Internacional A29. "Candidatos apelam para perfil povão”... "Mccain faz aposta arriscada para ganhar eleitores pró e anti-Bush”, em Estado de São Paulo. São Paulo 07 set. 2008. Caderno Internacional A18. "Obama e o fim da estupidez dos EUA", em Estado de São Paulo. São Paulo 07 set. 2008. Caderno Internacional A19. "Por trás do Maverick John Mccain”... “Investiga a construção da “persona” pública do republicano.”, em Estado de São Paulo. São Paulo 07 set. 2008. Caderno Cultura D14. "Mulheres, olho nela! '; "por dentro da polícia do Alasca”; "O reality show de Sarah"; "Cenas de uma América que ainda existe", em Estado de São Paulo. São Paulo 07 set. 2008. Caderno Aliás, J5. "Estrela da mídia rejeita entrevistar vice de Mccain", em Estado de São Paulo. São Paulo 08 set. 2008. Caderno Internacional A13. "Efeito Sarah põe Mccain na frente", em Estado de São Paulo. São Paulo 09 set. 2008. Caderno Internacional A15. "Batom acirra a disputa nos EUA, em Estado de São Paulo. São Paulo 11 set. 2008. Caderno Internacional A21. “Inovações de obama inspiram candidatos no rio”, em Estado de São Paulo. São Paulo 14 set. 2008. Caderno Nacional A9. "Sarah coloca em cheque força do voto feminino", em Estado de São Paulo. São Paulo 14 set. 2008. Caderno Internacional A18. “Impasse sobre pacote traz mais prejuízo a Mccain”, em Estado de São Paulo. São Paulo 30 set. 2008. Caderno Aliás, J6. “Obama arrecada valor recorde para campanha”, em Estado de São Paulo. São Paulo 15 set. 2008. Caderno Internacional A15.


77

“Mccain muda de idéia sobre ajuda à Aig”... “Obama arrecada U$ 10 milhões em Hollywood”, em Estado de São Paulo. São Paulo 18 set. 2008. Caderno Internacional A17. "Em meio a crise, obama retoma a vantagem", em Estado de São Paulo. São Paulo 20 set. 2008. Caderno Internacional A28. “Caos em Wall Street implode plataformas de obama e Mccain”... “Sarah Palin é um Dick Cheney com batom”, em Estado de São Paulo. São Paulo 21 set. 2008. Caderno Internacional A22. "Nova denúncia atinge Sarah”, em Estado de São Paulo. São Paulo 22 set. 2008. Caderno Internacional A15. "Obama critica plano proposto por Bush", em Estado de São Paulo. São Paulo 22 set. 2008. Caderno Internacional A17. "Nova denúncia atinge Sarah", em Estado de São Paulo. São Paulo 23 set. 2008. Caderno Internacional A15. "Crise faz obama rever promessas eleitorais", em Estado de São Paulo. São Paulo 24 set. 2008. Caderno Internacional A14. "Crise altera rumo da campanha”... "Momento expõe estilos de liderança", em Estado de São Paulo. São Paulo 26 set. 2008. Caderno Internacional A14. “Obama e Mccain trocam acusações”, em Estado de São Paulo. São Paulo 27 set. 2008. Caderno Internacional A25. “Equilíbrio no debate divide analistas”... “Sarah Palin vira a musa do humor na internet”, em Estado de São Paulo. São Paulo 27 set. 2008. Caderno Internacional A26. "Obama venceu debate, indica pesquisa", em Estado de São Paulo. São Paulo 28 set. 2008. Caderno Internacional A26. "Sorumbáticos e macambúzios" em Estado de São Paulo. São Paulo 28 set. 2008. Caderno Aliás, J715. “Agenda econômica é obstáculo para campanha de Mccain na reta final”, em Estado de São Paulo. São Paulo 29 set. 2008. Caderno Internacional A17. "Crise muda estratégia de campanha" em Estado de São Paulo. São Paulo 29 set. 2008. Caderno Internacional A27. “Impasse sobre pacote traz mais prejuízo a Mccain”, em Estado de São Paulo. São Paulo 30 set. 2008. Caderno Internacional A15. "Esta na hora do preto no branco", em Estado de São Paulo. São Paulo 30 set. 2008. Caderno 2 D14


78 "Sarah vira preocupação para Mccain", em Estado de São Paulo. São Paulo 01 out. 2008. Caderno Internacional A16. "Debates de vices pode alterar eleições", em Estado de São Paulo. São Paulo 02 out. 2008. Caderno Internacional A17. "Candidato a prefeito, obama da baixada é atração internacional", em Estado de São Paulo. São Paulo 03 out. 2008. Caderno Internacional A14. "Biden vence Sarah em debate na TV”, em Estado de São Paulo. São Paulo 03 out. 2008. Caderno Internacional A18. "Bom desempenho de Sarah não melhora situação de Mccain", em Estado de São Paulo. São Paulo 04 out. 2008. Caderno Internacional A25. "Audiência de debate entre vices bate record", em Estado de São Paulo. São Paulo 04 out. 2008. Caderno Internacional A28. “O embate entre dois monólogos", em Estado de São Paulo. São Paulo 05 out. 2008. Caderno Aliás, J3. "Obama cresce em estados-chave", em Estado de São Paulo. São Paulo 05 out. 2008. Caderno Internacional A10. "Obama denuncia "jogo sujo" de rivais", em Estado de São Paulo. São Paulo 05 out. 2008. Caderno Internacional A7. “Obama liga Mccain a escândalo”, em Estado de São Paulo. São Paulo 07 out. 2008. Caderno Internacional A18. “Crise econômica domina debate”... “Obama ganha briga por novos eleitores em estados-chave”... “Revista justifica apoio a democrata”... “Mccain é acusado de laço com grupo direitista”, em Estado de São Paulo. São Paulo 08 out. 2008. Caderno Internacional A18. “Obama consolida imagem de líder”... ““Mccain esquece princípios ao partir para o ataque”...” Antigos redutos tornam-se problema para republicano” , em Estado de São Paulo. São Paulo 09 out. 2008. Caderno Internacional A14. “Republicanos temem derrota no congresso”... “Partidos temem fraudes em registro de eleitores”... “Campanha estimula comércio”, em Estado de São Paulo. São Paulo 10 out. 2008. Caderno Internacional A16. “Organização e estratégia explicam vantagem de obama sobre Mccain”, em Estado de São Paulo. São Paulo 12 out. 2008. Caderno Internacional A20. “O iceberg de obama e de todos nós”, em Estado de São Paulo. São Paulo 12 out. 2008. Caderno Internacional A22. “Paralelos brasileiros e americanos, principalmente nos ataques que sofrem”, em Estado de São Paulo. São Paulo 12 out. 2008. Caderno Aliás, J6.


79

“Obama anuncia plano de Us$ 60 bi pra classe média...” “Atrás nas pesquisas, Mccain relança campanha”, em Estado de São Paulo. São Paulo 14 out. 2008. Caderno Internacional A10. “Obama abre 14 pontos sobre Mccain”... “É hora de os republicanos partirem”, em Estado de São Paulo. São Paulo 15 out. 2008. Caderno Internacional A14. “Mccain reage, mas obama vence duelo” em Estado de São Paulo. São Paulo 16 out. 2008. Caderno Internacional A16. “Perfil de líder deu vitória a obama”, em Estado de São Paulo. São Paulo 17 out. 2008. Caderno Internacional A14. “Mccain agora luta por seus redutos”, em Estado de São Paulo. São Paulo 18 out. 2008. Caderno Internacional A18. “Bush deixa um legado sombrio” em Estado de São Paulo. São Paulo 19 out. 2008. Caderno Internacional A18. “Próximo líder terá mais problemas e menos dinheiro” em Estado de São Paulo. São Paulo 19 out. 2008. Caderno Internacional A19. “Deixando de ser superpotência”, em Estado de São Paulo. São Paulo 19 out. 2008. Caderno Internacional A20. “Por que obama não dispara” em Estado de São Paulo. São Paulo 19 out. 2008. Caderno Aliás, J5. “É o eleitor estúpido, estúpido!”, em Estado de São Paulo. São Paulo 19 out. 2008. Caderno Aliás, J7. “Obama arrasa recorde de arrecadação”... “Republicano Powell anuncia apoio a democrata” em Estado de São Paulo. São Paulo 20 out. 2008. Caderno Internacional A8. Não foram identificadas incidências dos jargões políticos listados no glossário publicado no Jornal o Diário do Grande ABC, 5/6/06, p. 4, nas manchetes das matérias do Jornal o Estado de São Paulo na cobertura das eleições presidenciais americanas de 2008 a partir do referencial teórico da hospitalidade. No texto das reportagens e artigos selecionados foi possível identificar termos cuja aderência abrange os paradigmas que norteiam a reflexão proposta, termos que possibilitam identificar situações de fundação de vínculos e situações de ruptura de vínculos políticos.


80 Tabela 1 – Paradigma da Hospitalidade FFUNDAÇÃO DE VÍNCULOS Apoio 1; Buscar 1;

RUPTURA DE VÍNCULOS Acusação 1; Adversário 2; Ataque 5; Briga 1; Confronto 2; Contra 1; Contra-ataque 1; Duelo 1; Luta 2; Opositor 1; Rivais 1

Fonte: Elaborado a partir das anotações do caderno de campo. Tabela 2 – Quanto à ingerência dessa identidade histórico-cultural em um determinado espaço físico Reduto 2;

Fonte: Elaborado a partir das anotações do caderno de campo. Tabela 3 – Paradigma da economia de bens simbólicos Aposta 2; Jogo político 1;

Fonte: Elaborado a partir das anotações do caderno de campo. Tabela 4– Elementos com aderência as ações de marketing eleitoral Capacidade de mobilizar 2; Discutir 1; Conciliar 5;

Fonte: Elaborado a partir das anotações do caderno de campo.


81

Tabela 5– Temas mais freqüentes nas 100 matérias analisadas Estratégia de Campanha – 10; Eventos Polítcos– 10; Imagem/Identidade – 11; Mídias – 4; Monitoramento ético - 7;

Fonte: Elaborado a partir das anotações do caderno de campo. Conclusão A análise sistemática da constituição de vínculos políticos a partir dos jargões políticos, permite constatar que o paradigma da hospitalidade mostra-se eficaz para a sustentabilidade da rede que avaliza candidaturas nas urnas. Apesar dessa constatação, a hospitalidade, como forma de dádiva, não é facilmente percebida e conseqüentemente compreendida pelos agentes ativos do jogo político e por seus pares como ferramenta, que pode ser utilizada para fornecer meios de compreensão dos mecanismos sociais, identificando e potencializando novas formas de conduzir sua práxis política na constituição das redes de relacionamentos. A distorção do entendimento do papel da hospitalidade na fundação dos vínculos é freqüente na fala dos articulistas analisados nos jornais e nos formadores de opinião pública, os quais, na sua maioria, reconhecem a força das redes e se respaldam, muitas vezes, nos mesmos referenciais teóricos usados na presente pesquisa, como a presença da hospitalidade no exercício da função política e a importância da troca de bens simbólicos A analise da campanha de Barack Obama evidencia o estreitamento e o cultivar de seus vínculos políticos com a rede, que permeia a práxis política, nos pontos mais distantes do eixo de poder – circunstância que comprova a presença da hospitalidade na formação dos vínculos políticos, sua importância na fundação e na manutenção dessas relações e, fundamentalment,e sua importância na escolha das práticas comunicacionais de campanha. Identificar a circularidade da dádiva ao observar o sistema de trocas em eventos políticos organizados pelos responsáveis pela comunicaçâo da campanha, pelos partidos, pelas instâncias civis representativas de naturezas diversas e outros, para definição de candidatos e consolidação de candidaturas, é tarefa exeqüível. Ao levar-se em consideração a presença da hospitalidade e do capital simbólico do candidato, abrem-se novas possibilidades para fortalecimento nas urnas. A capacidade de esse candidato trazer votos, por meio do seu carisma pessoal e prestígio, sem garantia alguma de vitória, o que caracteriza circularidade da hospitalidade enquanto dádiva... Desvelar a natureza simbólica do capital político permite instaurar processos de mudança, cuja rede de relações define o resultado nas urnas – o espaço político dos sujeitos – e reconhece, institucionalmente, seu valor enquanto força propulsora do processo comunicacional da campanha e moeda de troca no mercado político. Ao obedecer a uma metodologia adequada para análise de um tema tão complexo como a hospitalidade na política, cujo foco são os acontecimentos políticos da época, gera uma


82 quantidade imensa de material coletado, arquivado, mas não contemplado neste trabalho. Esse arquivo, em primeira análise, pode servir para o profissional de evento político, ou mesmo de outros tipos, que desconhece seus conceituais teóricos ou restringe sua prática no campo dos conceitos da comunicação e do marketing. Novos estudos sobre as relações nesse universo podem abrir oportunidades para a pesquisa da hospitalidade sob diferentes ângulos. Entre algumas sugestões, ressalta-se a importância desse assunto no universo político a partir de um estudo de gênero, respaldado no crescente aumento da presença feminina na vida política nacional e na estreita relação da hospitalidade com o feminino, Destacam-se, ainda, estudos sobre a importância e a influência da hospitalidade na formação da liderança política, levando-se em conta deslocamentos populacionais e as questões culturais decorrentes desses movimentos. Aponta-se, também, a importância em se dar seqüência à observação do percurso da dádiva, uma vez comprovada sua presença na fundação dos vínculos de motivação política, sua circularidade e alteridade, redesenhando o jogo político. O resultado das urnas define como vencedor Barck Obama, sujeito natural da análise do cenário pós-eleitoral, análise coerente dentro de um contexto de cumprimento de mandato, que implica a circularidade desse capital e possíbilita identificar a importância do paradigma dos bens simbólicos. A pesquisa também aponta o surgimento de novos jargões – aliança e coligação –, que se adaptam ao momento político. A incidência desses termos nas matérias e nas manchetes dos jornais confirma a importância de uma rede de vínculos políticos bem articulados, cuja força de coesão possibilita tanto a sustentabilidade de candidaturas quanto a sobrevivência dos partidos enquanto instituições, Patido Democrata. A própria linguagem política testifica a força dos vínculos e a necessidade de doação – uma aposta – mesmo calculada, sem a qual não há relacionamento. As informações contidas nas manchetes do noticiário internacional do Jornal o Estado de São Paulo enquanto fonte primária escrita da pesquisa, a partir dos jargões e termos de profundo significado simbólico propiciam uma leitura sobre o como se estabelecem e mantém os vínculos de natureza política, possibilitando uma análise das ações de marketing político eleitoral desenvolvidas no decorrer da campanha e desenvolvimento de novos meios de comunicação Referências bibliográficas BAUMAN, Zygmunt (1925) Identidade: entrevista a Benedito Vecchi. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2005. ______ (1925) Em busca da política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000. BOFF, Leonardo. Virtudes para um outro mundo possível. Hospitalidade: direitos e deveres de todos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005. BOURDIEU, Pierre. Marginália: algumas notas adicionais sobre o dom. São Paulo: Maná, 1996. ________________. Razões práticas sobre a teoria da acção. Oeiras: Celta Editora, 1997. CAILLÉ, Alain. Nem holismo nem individualismos metodológicos. Marcel Mauss e o paradigma da dádiva. Revista Brasileira de Ciências, out. 1998. CAILLÉ, A.; GRAEBER, D. Introdução. In: MARTINS, P. H. (Org). A dádiva entre os modernos: discussão sobre os fundamentos e as regras do social. Petrópolis, RJ; Vozes, 2002. CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. Hospitalidade. São Paulo: Aleph, 2004. In: Art. III O evento no contraponto do cotidiano. Revista Hospitalidade, ano I, no 1, 2o sem. 2004. COELHO, Maria Cláudia. O valor das intenções: dádiva, emoção e identidade. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.


83 GIÁCOMO, Cristina. Tudo acaba em festa: evento, líder de opinião, motivação e público. São Paulo: Summus Editorial, 2007. GODBOUT, Jacques. O espírito da dádiva. Rio de Janeiro: Edição Fundação Getúlio Vargas, 1999. GODELIER, Maurice. O enigma do dom. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. GRINOVER, Lucio. Hospitalidade. São Paulo: Aleph, 2004. In: Art. II A hospitalidade urbana, acessibilidade, legibilidade e identidade. Revista Hospitalidade, ano III, no 2, 2o sem. 2006. LAFER, Celso. O sistema político brasileiro: estrutura e processo. São Paulo: Perspectiva, 1975. LUSTOSA, Isabel. Insultos impressos: a guerra dos jornalistas na independência 18211823. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. MARTINS, Paulo Henrique; CAMPOS, Roberta Bivar C. Polifonia do dom. Recife: UFFE, 2006. NOBLAT, Ricardo. A arte de fazer um jornal diário. São Paulo: Contexto, 2006. SCLIAR, Moacyr (1937) O imaginário cotidiano. São Paulo: Global, 2002.


84

Internet e novos padrões de financiamento das campanhas eleitorais: um estudo do pleito presidencial norte-americano em 2008

Introdução

Sylvia IASULAITIS 30

Há diversas décadas que as campanhas eleitorais nos Estados Unidos têm atraído especial atenção internacional. O modo como tais campanhas são realizadas e as mudanças e inovações implementadas neste país tem impactado diversos países, a ponto da literatura temática sobre eleições apontar uma convergência internacional das técnicas e estilos de campanhas políticas. A adoção de formatos, lógicas e estratégias de comunicação é denominada “americanização”, visto que foram desenvolvidos inicialmente nos Estados Unidos e posteriormente importados por outros países onde transformações sociais e estruturais fizeram possível tal incorporação (SWANSON; MANCINI, 1996). Durante os últimos anos as campanhas eleitorais nos Estados Unidos têm se transformado de maneira drástica. Uma das mais recentes inovações refere-se à introdução de novas infra-estruturas tecnológicas, como a Internet, fato que gerou calorosa discussão acadêmica em torno de seus limites e possibilidades. Diversos autores apontam que a Internet vem mudando o cenário político norteamericano, e as eleições presidenciais de 2008 vêm acentuar este quadro. Um dos aspectos de destaque neste pleito foi o aumento considerável no volume de arrecadação on-line, bem como o novo perfil de doadores da campanha de Barack Obama. O objetivo deste artigo é, à luz dos dados financeiros referentes ao pleito presidencial norte-americano em 2008, avaliar o uso da Internet focando no aspecto do financiamento de campanha. Serão testadas as hipóteses de equalização, conforme a qual a angariação de fundos on-line aumenta o pluralismo e gera padrões mais igualitários de competição eleitoral, bem como a de normalização, de acordo com a qual a Internet não apresenta diferenciais para o pluralismo; ao contrário, reproduz condições desiguais de competição em um novo meio. Buscaremos compreender as mudanças recentes do sistema de financiamento norteamericano e o que representam para a natureza das campanhas presidenciais e o perfil dos candidatos nomeados, bem como suas implicações para a competição eleitoral.

Antecedentes do uso da Internet nas campanhas eleitorais norte-americanas A Internet, apesar de seu relativamente recente advento, tem se tornado peça-chave na comunicação política norte-americana. Desde meados da década de 90 os candidatos têm visto na rede eletrônica um meio de baixo custo para a distribuição de mensagens políticas. No entanto, inicialmente seu uso limitou-se ao modo “panfletos eletrônicos”, sem que houvesse características interativas nos websites políticos, que refletiam a função “top-down” (de cima para baixo) e de “one-way” (mão única), negligenciando as possibilidades interativas da nova mídia para promover diálogo com os cidadãos. A rede eletrônica foi assumindo importância de forma gradativa nas campanhas políticas norte-americanas. Em 1992 verificou-se um uso básico da Internet pelos presidenciáveis Bill Clinton e Al Gore, que apenas marcaram presença online, tirando proveito da Internet como um recurso de campanha para enviar mensagens eletrônicas, postar boletins para a imprensa, 30

Doutoranda da Universidade Federal de São Carlos


85 discursos e posições oficiais dos candidatos a respeito de assuntos específicos (KLOTZ, 2004; ANSTEAD; CHADWICK, 2008). Em 1996, a Internet desempenhou um papel mais significativo nas campanhas eleitorais e passou a ampliar sua audiência. Durante o primeiro debate presidencial em outubro, o senador e candidato republicano Bob Dole elevou a política na Internet a um nível novo, conforme aponta Klotz (2004, p. 68). Quando o candidato Dole passou ao último bloco do debate, encerrou suas observações finais fazendo referência ao seu website: “Se você realmente quiser se envolver com a campanha, visite minha home page www.dolekemp96org”. Tal iniciativa de Dole gerou uma resposta imediata, que conduziu a 500.000 acessos ao seu website nas 24 horas imediatamente posteriores ao debate. No entanto, seu servidor não era tão eficiente para suportar tantos acessos simultaneamente, travando o sistema. Mesmo com tal imprevisto, pesquisadores apontam que após este episódio “a política na Internet nunca mais foi a mesma” (KLOTZ, 2004, p. 68), pois se percebeu como esta ferramenta podia despertar a curiosidade. Do ponto de vista da interatividade, embora durante a corrida presidencial de 2000 Al Gore já tivesse organizado algo inovador para sua campanha política, o denominado “town hall”, um tipo de foro de discussão on-line, o candidato que fez uso da Internet de forma mais efetiva e original foi Howard Dean. A campanha de Howard Dean para as primárias democratas em 2004 tornou-se um exemplo paradigmático do uso bem sucedido da Internet, demonstrando o potencial desta ferramenta para as campanhas políticas. Dean, ex-governador de um pequeno estado sem visibilidade na cena política norte-americana, não tinha seu nome difundido nacionalmente. Ainda assim, desenvolveu essencialmente pela Internet um movimento que deixou a sociedade norte-americana estarrecida. Esta foi a primeira vez que a Internet foi utilizada como a principal ferramenta de campanha eleitoral. A campanha de Dean foi a primeira a utilizar interação mediada por computador com os cidadãos e por tal motivo tornou-se extremamente popular. No que se refere à participação dos cidadãos, a campanha de Dean abriu espaço para que os mesmos se sentissem livres e à vontade para postar comentários e perguntas ao candidato e coordenadores de campanha, que se encarregaram de respondê-las o mais breve possível. No site advertia-se que, caso o candidato ou seus assessores não respondessem imediatamente, os internautas deveriam sentir-se livres para discutir as questões ou outros assuntos entre si criando, deste modo, um foro interativo. Após uma hora de participação online de coordenadores da campanha no foro e trinta respostas efetuadas, um dos internautas postou o seguinte comentário: “Uma linha direta de comunicação com o comitê de campanha de Dean????!!!!!! Me belisque, que eu devo estar sonhando!” (SIFRY, 2004, p. 17). Determinadas decisões de Dean foram baseadas em votações em tempo real realizadas em seu website. Também foram criadas listas, realizados encontros ao vivo pela Internet e formadas comunidades voluntárias de arrecadação de fundos para a campanha. Em poucos meses, utilizando um website, mensagens de e-mail e voluntários, Dean arrecadou cerca de 25 milhões de dólares de 318.884 cidadãos. A maioria das doações efetuadas a Dean foi de quantias modestas, de $200 ou menos (HINDMAN, 2005). Deste modo, seu obscurantismo foi logo substituído por um estrondoso espaço midiático: por este volume de angariação de doações on-line, Howard Dean atraiu a atenção midiática, que até então considerava sua candidatura irrelevante. Dean, portanto, foi a novidade e seus apoiadores foram os curiosos. Conforme atestam as pesquisas científicas desenvolvidas, a maior parte dos adeptos de sua candidatura nunca havia se envolvido em campanhas políticas e foi convencida pela Internet, sem mediação pessoal (WILLIAMS; WEINBERG; GORDON, 2004).


86 Dean foi pioneiro também na utilização do Meetup.com, uma rede social cujo objetivo é facilitar o encontro de pessoas de acordo com interesses comuns. Os usuários digitam seu código postal e o site disponibiliza tempo e lugar para os encontros virtuais. Esta rede social foi criada em 2001 e seus idealizadores afirmam que a inspiração 31 foi o livro de Robert Putnam “Bowling Alone. The Collapse and Revival of American Community”, no qual discorre a respeito do declínio do capital social e da comunidade nos Estados Unidos. Nesta obra, Putnam busca compreender a transformação da vida cívica ocorrida nos Estados Unidos desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Com base em materiais estatísticos, Putnam diagnostica um crescente desinteresse dos cidadãos norte-americanos em assuntos concernentes às comunidades locais e um declínio no engajamento político, que se traduz em taxas decrescentes de participação nas eleições e campanhas eleitorais, nos índices de filiação a partidos políticos, associações, participação em reuniões públicas, bem como nos níveis de confiança. Em suma, um declínio no associativismo que marcou a política norte-americana, conforme demonstrado de forma efusiva por Alexis de Tocqueville em sua obra “Democracia na América”. Um dos principais fatores apontados é a transformação tecnológica do lazer, que está privatizando ou individualizando o tempo livre e mostrando-se deletéria para a formação de capital social, da qual o instrumento mais poderoso é a televisão: Time-budget studies in the 1960s showed that the growth in time spent watching television dwarfed all other changes in the way Americans passed their days and nights. Television has made our communities (or, rather, what we experience as our communities) wider and shallower. In the language of economics, electronic technology enables individual tastes to be satisfied more fully, but at the cost of the positive social externalities associated with more primitive forms of entertainment. The same logic applies to the replacement of vaudeville by the movies and now of movies by the VCR. The new "virtual reality" helmets that we will soon don to be entertained in total isolation are merely the latest extension of this trend. Is technology thus driving a wedge between our individual interests and our collective interests? It is a question that seems worth exploring more systematically (PUTNAM, 1995, p. 75). No que se refere à Internet, Putnam aponta que avanços efetivos na integração entre mundo virtual e real são fundamentais para que a Internet não reforce a tendência de enfraquecimento das comunidades locais, ao contrário, possa ser parte da solução. Para o autor, “é difícil imaginar uma solução de nossos dilemas cívicos contemporâneos sem a comunicação mediada por computadores” (PUTNAM, 2000, p. 180 apud FREY, 2003). No caso específico da campanha política de Dean, o uso da rede Meetup consistiu na formação de grupos de partidários que se comunicavam e reuniam-se regularmente. A iniciativa foi tão singular a ponto de se tornar generalizada a frase “a Internet inventou Howard Dean”. Embora não tenha logrado êxito em conquistar a nominação democrata, suas estratégias de comunicação dinamizaram as campanhas políticas nos Estados Unidos e atraíram a atenção de pesquisadores de todo o mundo. Joe Trippi, responsável pela cibercampanha de Howard Dean, alcançou fama internacional pelos esforços empreendidos. De acordo com Scott Heiferman, um dos fundadores da rede social, atualmente as pessoas nem ao menos conhecem seus vizinhos. Deste modo, o objetivo do Mettup foi de revitalizar as comunidades locais mediante a Internet (Meetup.com, Scott Heiferman Interview, 2004). 31


87 Além das campanhas presidenciais, a Internet marcou diversas campanhas para o Senado, como a disputa entre José Lieberman e Ned Lamont. Diversos analistas políticos e pesquisadores atribuíram grande parcela da derrota de Lieberman ao uso bem-sucedido de um blog por parte de Ned Lamont (ANSTEAD; CHADWICK, 2008). Outro episódio marcante que caracterizou o uso extensivo da rede nos EUA foi a disputa para um assento no Senado em 2006, com o qual se provou que a Internet vinha se solidificando como uma ferramenta de amplo impacto, tanto positivo quanto negativo. Era esperado que George Allen se elegesse confortavelmente e cacifasse seu nome para uma possível corrida presidencial em 2008. No entanto, poucos meses antes da eleição, ele se referiu a um membro da campanha de seu adversário Jim Webb de forma pejorativa, chamando-o de “macaco”, um termo racista. O vídeo deste evento foi imediatamente compartilhado e disponibilizado no YouTube, e logo se tornou uma sensação virótica, causando indignação entre os eleitores. No primeiro dia em que foi postado, o vídeo foi acessado aproximadamente 2.000 vezes e após tal veiculação, o assunto tornou-se manchete nacional. Mesmo com seu favoritismo e tendo aberto 20 pontos nas pesquisas de opinião antes do episódio, Allen perdeu as eleições (CNN, 2006; YouTube, 2006 apud ANSTEAD; CHADWICK, 2008). É provável que sem o uso da Internet o vídeo não fosse amplamente difundido, tampouco causasse tamanho impacto (o que não quer dizer que somente este episódio foi responsável pela derrota do candidato). Tais episódios são apenas exemplificações dentre muitas outras da influência da Internet na política estadunidense. Não obstante, no último ciclo presidencial foi particularmente importante para a campanha do candidato do Partido Democrata, Barack Obama. Estatísticas de acesso à Internet nos Estados Unidos Para dimensionarmos o alcance da Internet na sociedade e na política norte-americana, recorreremos a dados secundários oriundos de diversos relatórios disponibilizados pelo instituto de pesquisa Pew Research Center’s Internet & American Life Project. Em maio de 2008 o Pew Center divulgou que 73% da população adulta norte-americana está online e 78% dispõe de telefone celular. A parcela da sociedade off-line pertence à faixa etária acima dos 70 anos e possui grau de escolaridade inferior à educação secundária. Os usuários da Internet que mantém um perfil em um website de gestão de redes sociais mais que quadruplicou nos últimos quatro anos, passando de 8% em 2005 a 35%, ainda de acordo com dados do centro de pesquisas Pew Internet (2008). Em termos de faixa etária, a distribuição é a seguinte: Tabela 1. Percentual de adultos que mantém perfil em rede social Faixa etária Percentual 18 a 24 75% 25 a 34 57% 35 a 44 30% 45 a 54 19% 55 a 64 10% Acima de 65 anos 7%

A audiência das notícias pela Internet Desde 2006, a proporção de norte-americanos que afirmam adquirir notícias on-line ao menos três dias por semana aumentou de 31% a 37%. Mais pessoas adquirem notícias regularmente on-line do que regularmente assistem a um noticiário noturno (37% vs. 29%).


88

Tabela 2

Fonte: Pew Research Center’s Internet & American Life Project, 2008. A Internet é utilizada como fonte de notícias para a mesma proporção de norteamericanos jovens e de meia-idade. Por exemplo, o público de 50 a 64 que se informa mediante a Internet está equiparado com o público de 18 a 24 anos (29% e 30%, respectivamente). Menos da metade das pessoas com mais de 65 anos obtém notícias pela Internet (13%). Tabela 3

Tabela 4


89

Fonte: Pew Research Center’s Internet & American Life Project, 2008. Analisando tais dados não em números absolutos, mas principalmente em termos de tendência, percebe-se que a Internet tem ampliado audiência, enquanto todas as demais mídias, como rádio, TV e jornal apresentaram queda (conforme tabela 3). A Internet e a campanha eleitoral norte-americana de 2008 A Internet foi um diferencial na campanha de 2008 enquanto fonte de informação e como um meio de comunicação entre os candidatos, partidos e cidadãos, bem como dos eleitores entre si. Analisando a Internet como fonte de informação eleitoral, os dados apontam que muitos norte-americanos estão adotando a Internet como fonte fundamental de notícias eleitorais. A televisão permanece a fonte dominante, mas o percentual daqueles que alegam obter a maioria das notícias de campanha pela Internet triplicou desde outubro de 2004, passando de 10% para 33%. Novamente aqui o fator idade é relevante: a Internet é uma fonte consideravelmente mais popular para notícias de campanha entre os americanos mais jovens do que entre os mais velhos. Não obstante, comparado com 2004, o uso da Internet para efeito de informação sobre a eleição aumentou em todas as faixas etárias. Entre os mais jovens (idade 18 a 29), a TV perdeu terreno de forma significativa para a Internet (PEW CENTER, 2008). As atividades políticas online em números A campanha presidencial norte-americana de 2008 testemunhou níveis sem precedentes de compromisso on-line no processo político, com milhões de cidadãos comuns utilizando a Internet para se manterem informados sobre as eleições, doarem dinheiro, compartilharem suas opiniões, construírem comunidades on-line em torno de interesses ou objetivos comuns e mobilizarem outras pessoas em defesa de seus candidatos. No último mês de campanha (outubro de 2008) o Pew Center levantou que quase 60% dos eleitores se envolveram em algum tipo de atividade de campanha on-line. A maioria dos eleitores norte-americanos (59%) afirmou ter procurado conteúdo eleitoral na Internet ou estabelecido algum tipo de comunicação com finalidade eleitoral on-line durante o pleito presidencial de 2008. Os eleitores mais jovens e democratas ultrapassaram o eleitorado mais velho e os republicanos no uso da Internet para informação e desenvolvimento de atividades de campanha.


90 Em outubro de 2008, um mês antes da eleição, que se realizou em 4 de novembro, o percentual de eleitores que enviou ou recebeu e-mails sobre a campanha da parte de amigos ou familiares atingiu 37% e 26% dos eleitores afirmaram ter recebido um e-mail oriundo de um dos candidatos ou partido político. A proporção de eleitores que foram on-line para ver vídeos sobre a campanha aumentou substancialmente. Ao todo, 39% dos eleitores assistiram algum tipo de vídeo relacionado à campanha política on-line. Houve um aumento na audiência de todos os tipos de vídeos de campanha, tais como: discursos de candidatos (28%), entrevistas (27%), comerciais de campanha (21%) e debate entre candidatos (23%). Neste pleito, um número significativo de eleitores visitou websites de candidatos ou blogs políticos durante a campanha eleitoral (37%). Quase um em quatro eleitores (23%) visitou o website de um candidato até um mês antes das eleições e 27% leram blogs sobre a campanha política. No que se refere aos sites de relacionamento, 26% dos eleitores afirmaram ter visitado tais sites, no entanto, 8% afirmaram objetivos de campanha ao fazê-lo. 4% se inscreveram como "amigo" de um candidato. Tabela 5. Atividades de Campanha Online. Estatísticas de outubro de 2008. Atividades de Campanha Online % [outubro/2008] Mensagens eletrônicas E-mail de amigos ou familiares 37% E-mail de grupos ou organizações políticas 26% Recebeu ou enviou algum tipo de email de campanha 44% Vídeos de campanha Assistiu vídeo com discursos de candidatos Assistiu entrevista com candidatos Assistiu debate de candidatos Assistiu comercial de campanha Assistiu algum tipo de vídeo de campanha

28% 27% 23% 21% 39%

Websites ou blogs de candidatos Leu blogs sobre a campanha política Visitou website de candidatos Obteve informações de campanha por sites de relacionamento Visitou algum tipo de website ou blog político

27% 23% 8% 37%

Realizou alguma atividade de campanha online 59% Fonte: Elaboração própria, com base nos dados de Pew Center, 2008. O eleitorado jovem e a Internet É mais provável que os eleitores jovens (que utilizam a Internet com maior freqüência do que os eleitores mais velhos) acessem-na com a finalidade de adquirir informações políticas ou realizar atividades de campanha. A metade dos eleitores em todas as faixas etárias – com exceção daqueles com 65 anos ou mais – enviou ou recebeu e-mails sobre a eleição. Entre esta última faixa etária apenas ¼ (um quarto) enviou ou recebeu e-mails relacionados à campanha. Cerca de dois terços dos eleitores abaixo de 30 anos de idade (65%) assistiram vídeos on-line relacionados à campanha política e quase 60% leu blogs, visitou websites de candidatos,


91 páginas ou comunidades de candidatos em sites de relacionamento. Praticamente a metade do eleitorado jovem informou ter assistido a discursos (48%), entrevistas (47%) ou debates entre candidatos on-line (47%); um pouco menos (36%) assistiu comerciais de campanha na rede. Mais de um terço dos eleitores mais velhos, 41% na faixa de idade compreendida entre 30 e 49 anos e 34% de 50 a 64, assistiu algum tipo de vídeo de campanha. Tabela 6

Fonte: Pew Research Center’s Internet & American Life Project, 2008. Blogs políticos e de campanha emergiram como um destino popular na Internet entre os eleitores jovens, mas uma minoria significativa do eleitorado mais velho informou leitura dos mesmo s. Entre os eleitores abaixo de 30 anos, 42% visitaram blogs, 30% dos eleitores entre 30 e 49 e 24% de 50 a 64. Aproximadamente um em dez eleitores mais velhos (9%) leu um blog político ou relacionado à campanha. Sites de relacionamento e gestão de redes sociais consistiram em uma fonte de informação para muitos dos eleitores mais jovens; um terço (37%) dos eleitores da faixa etária de 18 a 24 anos relatou que obteve informações de campanha em tais locais. Tabela 7

Fonte: Pew Research Center’s Internet & American Life Project, 2008.


92 A Internet e os novos padrões de financiamento de campanha Do ponto de vista da disputa eleitoral, caso as condições de concorrência sejam muito desiguais o caráter competitivo das eleições fica vitalmente comprometido. Daí advém uma série de problemas, dentre os principais está a concentração de poder político a alguns setores da sociedade, detentores privilegiados de outras modalidades de poder, em especial do econômico. A literatura sobre Internet e eleições aponta que uma das vantagens mais importantes que a rede propicia aos candidatos norte-americanos é a angariação de fundos on-line. Mas quais são as implicações disto? Analisando o referencial teórico verificam-se, por um lado, pressupostos de que a angariação de fundos on-line aumenta o pluralismo e gera padrões mais igualitários de competição eleitoral (hipótese de equalização). Os candidatos considerados não competitivos e que dispõem de parcos recursos e alcançam tímidas intenções de voto em pesquisas de opinião comumente não desfrutam de visibilidade via meios de comunicação de massa tradicionais. É neste sentido que a Internet pode fazer a diferença, pois, de acordo com esta visão, é um espaço plural, onde todos os candidatos dispõem das mesmas oportunidades, no qual há um nivelamento no campo de disputa eleitoral (CORRADO; FIRESTONE, 1997; RASH, 1997; MORRIS, 2000 apud GIBSON et al., 2003). Por outro lado, verifica-se a hipótese de normalização, de acordo com a qual a Internet não apresenta diferenciais para o pluralismo; ao contrário, reproduz condições desiguais de competição em um novo meio. Portanto, as novas tecnologias fortalecerão o poder das elites políticas, visto que as desigualdades se perpetuarão também na Internet (LANDTSHEER, KRASNOBOKA; NEUNER, 1999). A hipótese de normalização baseia-se no fato de que há uma transferência das características políticas do mundo real para a Internet (MARGOLIS; RESNICK, 2000, p.2). O intuito é testar tais hipóteses de equalização e normalização à luz dos dados financeiros referentes ao pleito presidencial norte-americano em 2008. O sistema de financiamento das campanhas nos Estados Unidos A campanha eleitoral norte-americana é mais onerosa do que em qualquer outro lugar do mundo. Também é a que recebe maior visibilidade, com intensa cobertura jornalística internacional, inclusive durante o processo de primárias. Os Estados Unidos contam com um sistema de financiamento de campanha misto, combinando financiamento público com particular, a partir de doações de pessoas físicas e jurídicas. No que se refere ao financiamento público, existe um fundo público que financia os candidatos, oriundo de contribuições via imposto de renda. O candidato que aceita esse financiamento sujeita-se a controles legais e tem estabelecido um limite rígido de gastos (HASEN, 2008). As doações privadas, realizadas diretamente a candidatos ou partidos e que são submetidas ao sistema regulador das eleições federais, constituem o chamado hard money. Até 2002, era permitido que empresas ou qualquer grupo de indivíduos constituíssem PAC’s (Political Action Commitees), que reuniam doações sem limites para repassá-las aos partidos. Esse segundo tipo de doação, que escapava ao controle da legislação, foi batizado de soft money. De acordo com as antigas regras do Federal Election Campaign Act (FECA) de 1974, os indivíduos poderiam doar até $1.000 durante as primárias e outros $1.000 para a eleição geral a candidatos presidenciais. Esta distinção entre “soft money” e “hard money” na política norte-americana é fundamental. Enquanto a doação do “hard money” era limitada e fiscalizada, o “soft money”


93 estava fora deste marco regulador e, contanto que não fossem doadas diretamente para um candidato, poderiam ser angariadas quantidades ilimitadas de dinheiro (ANSTEAD; CHADWICK, 2008). A mais recente iniciativa para corrigir esta falha ocorreu em 2002, quando as regras de financiamento foram alteradas pelo Ato de Reforma de Campanha Bipartidário de 2002 - BCRA, mais geralmente conhecido como McCain-Feingold, aludindo aos senadores autores da proposta. Deste modo, foi proibida a captação e uso de soft money em campanhas federais, bem como a veiculação de propaganda de apoio a um tema, patrocinada por grupos externos. Por outro lado, a lei elevou o limite de doações de pessoas físicas para $ 2.000 por eleição. Em 2008 este limite foi fixado em $2.300, graças a um mecanismo de reajuste inflacionário. O financiamento das campanhas políticas durante as primárias Nos Estados Unidos, no início do ano em que ocorre a eleição nacional, começam as denominadas “primárias”, que são prévias partidárias, onde se escolhe qual dos pré -candidatos representará oficialmente o partido no pleito. Cada estado dispõe de um número de representantes no colégio eleitoral proporcional à sua população. Os votos nas primárias são dados pelos representantes de cada partido. Em cada estado a definição do grupo desses representantes pode ser diferente. Em alguns, votam apenas os filiados do partido. Em outros, votam também os cidadãos comuns. Os denominados delegados do estado comparecem à convenção do partido e escolhem, por maioria, o candidato definitivo. O candidato que obtiver o maior número de votos dos delegados será o candidato oficial à presidência nas eleições nacionais que ocorrem em novembro. Do ponto de vista do financiamento das campanhas eleitorais, salvo raras exceções, até as eleições de 2000 todos os candidatos recorreram aos recursos do fundo público durante as primárias. Naquela eleição, George W. Bush, candidato republicano, optou por não aderir ao sistema de financiamento público e arrecadou $95,6 milhões em doações (MALBIN apud HASEN, 2008).

A figura do bundler no financiamento de campanha Durante a corrida presidencial de 2000, surgiu uma nova tendência de arrecadação encabeçada por George W. Bush: a figura dos bundlers, que são pessoas que trabalham para arrecadar fundos para financiar as campanhas dos candidatos. Considerando que há limite para os donativos privados, os candidatos utilizam a figura dos bundlers também como uma maneira de “contornar” a lei. Eles visitam altos executivos das empresas para pedir que, individualmente, façam doações que contarão, de maneira oficiosa e informal, como uma doação global da empresa. Portanto, havendo disposição de pessoas em altas posições em doar mais do que o limite de contribuição pessoal, os bundlers sugerem que um conjunto de doadores entregue uma grande quantia, algo como um “pacote” de doações. O contrário também ocorre: existem doações realizadas por grandes empresas e corporações de maneira indireta, onde quem aparece são seus múltiplos executivos. Quando esta figura, denominada “bundler” alcança um determinado teto de doações, conquista acesso privilegiado ao candidato. Após tais iniciativas, que renderam grandes quantias aos cofres da candidatura de Bush, em 2004 ambos os candidatos dos dois principais partidos, Democrata e Republicano, também optaram por buscar financiamento fora do sistema público durante as primárias. Cada um


94 angariou muito mais do que o percentual que seria destinado pelo financiamento público: Kerry angariou $234,6 milhões e Bush, candidato à reeleição, arrecadou $269,6 milhões (MALBIN, 2008 apud HASEN, 2008). No pleito de 2008, os únicos candidatos que optaram pelo financiamento público foram aqueles que tinham baixo poder de competição. John Edwards concordou em se beneficiar do financiamento público quando percebeu que sua angariação pessoal de fundos não obteve sucesso (KIRKPATRICK, 2007 apud HASEN, 2008) e John McCain concordou com o financiamento público, tendo em vista que sua candidatura foi avaliada como não tendo potencial para conquistar a nomeação republicana. Enquanto o então senador Obama, que viria a ser o nomeado democrata, optou pelo financiamento privado, o senador McCain, futuro nomeado republicano, aceitou a concessão de $84,1 milhões do fundo público (KUHNHENN, 2008 apud HASEN). No entanto, a partir do momento em que McCain tornou-se o principal competidor do partido Republicano, ele voltou atrás em sua decisão de receber financiamento público durante as primárias (MOSK, 2008 apud HASEN, 2008). Durante as primárias até a Convenção Nacional do Partido Democrata, o candidato Barack Obama angariou $414,2 milhões por contribuições privadas. Durante este mesmo período, Obama angariou um adicional de $41,9 milhões a ser utilizado para a campanha eleitoral geral, enquanto o nomeado do Partido Republicano John McCain, ao todo, arrecadou $216,3 milhões, sem levar qualquer financiamento público (The Campaign Finance Institute, 2008). No pleito de 2008, verificou-se um aumento geral na quantia de dinheiro angariado por candidatos durante as primárias, comparativamente às últimas três eleições, com amplo destaque para os democratas (figura 1).

Fonte: HASEN, 2008.


95

Durante a campanha para as primárias de 2008, pelo menos 534 bundlers arrecadaram $75.750,000 para McCain e 509 angariaram cerca de $63.300,000 para Obama (Center for Responsive Politics, 2008). As Micro-Donations e os Micro-Donors Outra nova tendência notável no processo de finanças de campanha refere-se ao aumento impressionante das micro -doações, ou seja, doações de quantias abaixo de $200 (duzentos dólares). As micro -doações responderam por 25% das contribuições totais aos candidatos dos dois partidos principais que buscavam sua nomeação para as eleições presidenciais. Este tipo de contribuição subiu de 34% em 2004 para 38,8% em 2008 (MALBIN, 2006 apud HASEN, 2008; The Campaign Finance Institute, 2008) [ver Fig. 4].

Fonte: HASEN, 2008. Em 2000, Al Gore angariou 20% e George W. Bush 16% do total de seus fundos para as primárias em micro-doações. Em 2004, John Kerry arrecadou 37% e George W. Bush 31% desta maneira (MALBIN, 2006 apud HASEN, 2008).


96 Assim, antes do pleito presidencial de 2008, houve um histórico de pequenas doações, o que possivelmente ampliou a confiança de Obama (e dos principais partidos) nas micro-doações. Em 2008, porém, Barack Obama angariou mais da metade (53%) dos fundos para as primárias por micro-doações pela Internet. Contrastivamente, John McCain arrecadou 31% de seus fundos (mais de $62 milhões) mediante às micro-doações (The Campaign Finance Institute, 2008). A campanha de Obama anunciou em agosto de 2008 que havia ultrapassado a casa de 2 milhões de doadores individuais e a imensa maioria desses doadores doou menos que $200 à campanha (Political Intelligence, 2008). A candidata Hillary Clinton, que disputou com Obama a nomeação democrata, angariou 36% de suas finanças de campanha com micro-doações (The Campaign Finance Institute, 2008).

Fonte: HASEN, 2008. Portanto, Obama angariou muito mais em micro-doações em 2008 do que os demais candidatos durante as primárias de 2000 e 2004 (figura 5). Considerando também que a angariação de fundos total de Obama foi bem maior do que dos outros candidatos, ele arrecadou um total muito maior de dinheiro no período primário por micro-doadores se comparado a Kerry (2004), Bush (2004) ou McCain (2008). Obama levantou $117,7 milhões de micro-doadores durante as primárias, comparado a $64 milhões para Bush, $43,1 milhões para Kerry e $42,9 milhões para McCain. Nas primárias de 2008, 25,6% das contribuições vieram de contribuintes que deram $2.300 (o máximo permitido para contribuições individuais, graças ao ajuste inflacionário). McCain recebeu 33% de suas contribuições deste grupo e Obama 15% durante as primárias (The Campaign Finance Institute, 2008).


97

Fonte: HASEN, 2008. Analisando os dados a respeito da angariação de fundos para as primárias de 2008, podemos verificar que McCain confiou fortemente nos bundlers enquanto Obama apostou nas micro-doações. A figura 8 demonstra tais disparidades.

Fonte: HASEN, 2008. Financiamento nas eleições gerais: mudanças efetivas nos padrões de financiamento ou estratégia de marketing? De acordo com um estudo promovido pelo The Campaign Finance Institute os doadores de Barack Obama durante as eleições gerais podem não ter sido tão diferentes quanto se imaginava. Como vimos, durante as primárias Obama recebeu mais da metade de suas doações por meio de discretas contribuições de menos de 200 dólares cada. Difundiu-se que este perfil perpetuou-se durante toda a campanha eleitoral geral; de acordo com divulgação da campanha de Obama, mais de 3 milhões de pessoas contribuíram financeiramente com o candidato. No entanto, de acordo com o pesquisador e diretor executivo do Instituto, Michael J. Malbin, os dados apresentados por Obama à Comissão Eleitoral Federal (FEC) não condizem integralmente com a realidade.


98 Após uma análise mais aprofundada dos dados da FEC, o estudo apontou que muitos doadores registraram pequenas doações mais de uma vez, evidenciando que médios e grandes doadores foram mais importantes para o financiamento da campanha de Obama do que os analistas tinham inicialmente avaliado. “Criou-se um mito de que o dinheiro dos pequenos doadores dominaram as finanças de Barack Obama” (MALBIN, 2009). Embora o Instituto reconheça que não é possível checar completamente as informações sobre pequenas doações e que, de fato, a angariação de pequenos doadores à campanha de Obama tenha sido impressionante, a realidade não corresponde ao mito. De acordo com o IFdC, analisando mais detalhadamente os registros da FEC, foi possível identificar que diversos pequenos doadores repetiram suas doações, não constando seu montante acumulado, e sim as doações até $ 200 separadamente. Apesar de, no cômputo geral da campanha, uma elevada porcentagem (49%) das arrecadações de Obama ter sido contabilizada em discretas contribuições de $200 ou menos (ver tabela 8), apenas 26% do valor arrecadado pela sua campanha até 31 de agosto de 2008 e 24% dos seus fundos até 15 de outubro foram oriundos de doadores cujas contribuições totais agregadas não ultrapassaram a casa dos $200 ou menos (The Campaign Finance Institute, 2009). O Instituto de Finanças de Campanha realizou também uma análise comparativa deste montante de 26% de micro doações para Obama com os 25% de George W. Bush em 2004, bem como 20% de John Kerry em 2004, assim como aqueles 21% para John McCain em 2008, 13% para Hillary Clinton em 2008 e 38% para Howard Dean em 2004 (conforme tabela 9). Tabela 8. Individual Contributions (Not Aggregated) to Presidencial Candidates through August 31, 2008 Candidate

Total Net Net Indiv. Primary & Contributions General Receipts

$201999 as % of Total Indiv.

$1.0002.299 as % of Total Indiv.

$2.300 Contribs as % of Total Indiv.

All $1.000 & Up as % Total Indiv.

452.852.990

$200 or less as % of Total Indiv. 49%

Obama

456.114.562

18%

15%

18%

33%

McCain

219.500.542

206.363.245

32%

15%

20%

33%

53%

Fonte: The Campaign Finance Institute, 2009


99 Tabela 9

Fonte: The Campaign Finance Institute, 2009 Deste modo, devido aos denominados “mid-range repetidores”, Obama teria angariado 27% de sua verba de campanha de pessoas cujas contribuições agregadas estariam no intervalo médio, ou seja, entre $ 201 e $ 999. Muitos daqueles que foram computados como pequenos doadores repetiram a operação e acabaram como doadores medianos (The Campaign Finance Institute, 2009). Devido à sua bem-sucedida campanha durante as prévias democratas, nas quais derrotou a ex-primeira dama Hillary Clinton, seu carisma pessoal e, principalmente, por conta da maneira como organizou sua campanha, Obama foi capaz de utilizar a Internet para retornar aos mesmos adeptos e solicitar a repetição de contribuições. O Instituto apontou, ainda, que 47% dos recursos de campanha de Obama vieram de grandes doadores, em comparação com 56% para Kerry e 60% para ambos, Bush e McCain. No entanto, devido aos 47% de Obama ser baseado em um total maior arrecadado, significa que ele também angariou mais dinheiro de grandes doadores em termos absolutos do que qualquer um de seus rivais ou antecessores. Vale ressaltar, no entanto, que o Instituto frisa que tais resultados não negam a importância de Obama ter repetido o apelo aos pequenos doadores, tampouco seu uso inovador do website de campanha e redes sociais on-line para a angariação de contribuições on-line e, “embora a realidade não corresponda ao mito, a realidade em si foi impressionante” (The Campaign Finance Institute, 2009). Análise dos dados e considerações finais A despeito das divergências no que se refere ao número de pequenos doadores da campanha de Obama, é possível verificar que os padrões de financiamento nos Estados Unidos se alteraram consideravelmente nas eleições recentes.


100 De acordo com diversos analistas, o sistema de financiamento público se desmoronou nos Estados Unidos. Abrindo mão deste sistema, os candidatos presidenciais precisam angariar mais recursos, ao mesmo tempo em que necessitam viajar pelo país à procura de votos e não apenas de dinheiro. É neste sentido que outros meios de angariação de recursos ficaram muito atraentes, como a utilização de bundlers. No entanto, tais figuras podem tornar-se indesejáveis, pois podem conquistar uma grande influência e requerer vantagens. É neste cenário que as micro -doações pela Internet tornaram-se estratégicas; no pleito de 2008, em particular, foram fortalecidas e incrementadas pelo uso de mensagens de texto para celular. A Internet, que já havia se mostrado importante durante o pleito de 2004, acelerou rapidamente sua influência. Autores como Volokh (1991) afirmam que a ampliação da possibilidade de fala política barata (cheap speech) aumentou a habilidade de candidatos para trocar mensagens políticas por e-mail, messaging e em páginas de gestão de redes sociais. Portanto, permite aos candidatos acessarem contribuintes em potencial de forma rápida e barata, solicitando contribuições pequenas de dinheiro. A campanha investe apenas nos custos fixos de comunicação pela Internet e o custo total de enviar numerosos e-mails de solicitação é pequeno. Uma das principais estratégias de angariação de fundos consistia em lucrativos jantares com os candidatos, cujos ingressos custavam o valor máximo permitido para recebimento de contribuições de pessoas físicas. Difundiram-se fortemente nos Estados Unidos os eventos de “$1.000 por prato” até o ano de 2000 e de “$2.300 por prato” a partir da elevação da contribuição para este teto; com 500 participantes presentes, a maior parte artistas, pessoas de renome e influentes na sociedade, um jantar deste porte poderia significar mais de um milhão de dólares. No entanto, neste pleito de 2008 a Internet mudou a natureza da angariação de fundos. Tais jantares de $2.300 por prato diminuíram em importância e foram substituídos pelos pedidos diretos de pequenas doações por e-mail, telefone ou mensagem de celular. Não significa que o jantar de $2.300 por prato desapareceu, mas a doação de fundos de pequenos doadores mostrou-se uma alternativa ao “dinheiro grande”. Uma estratégia difundida por Obama já é citada por um especialista em campanhas políticas na Internet – Phil Noble - como uma nova tendência para os próximos pleitos, tendo em vista seu sucesso. Ao invés de investir fortemente no jantar de $2.300 por prato, a campanha de Obama promoveu um sorteio dentre os pequenos doadores, onde quatro seriam contemplados com um jantar com o candidato. Assim, milhares doaram e quatro compareceram a um face-toface com Obama (figura 9). Figura 9

Fonte: www.barackobama.com


101

Mediante a análise dos dados apresentados, o que podemos inferir? O que tais mudanças representaram para a natureza da campanha presidencial? Do ponto de vista normativo, as mudanças efetivadas no sistema de financiamento são positivas ou negativas? Quais são as implicações para a comp etição eleitoral? A partir da eleição paradigmática de Obama, infere-se que o financiamento da campanha pode influenciar e mesmo alterar ambos: a natureza das campanhas políticas, bem como o perfil dos candidatos nomeados. Partindo de uma constatação, se a preocupação for o total de dinheiro empregado nas campanhas eleitorais, a tendência emergente de emprego da Internet é deletéria: na campanha eleitoral de 2008 arrecadou-se mais e também se gastou muito mais em comparação aos pleitos anteriores - de $332,7 milhões na campanha de 2000 para bem mais de $1 bilhão na eleição de 2008, mesmo com a crise financeira que certamente afetou a campanha. Do ponto de vista normativo, porém, corroboramos a tese de Hasen (2008) de que não é apenas o dinheiro total empregado nas campanhas eleitorais que mede a qualidade das eleições e da democracia. Deslocando a análise para as dimensões de igualdade política, bem como atributos e interação dos candidatos com os cidadãos, pode-se defender que a Internet representa mudanças importantes. Do ponto de vista das condições de competição, neste pleito específico a Internet propiciou padrões mais igualitários. Considerando a derrocada do sistema de financiamento público, que prejudica a meta de igualdade política, a Internet contribui neste sentido, possibilitando um aumento considerável de pequenas contribuições. O pleito presidencial de 2008 demonstrou que as grandes doações estão começando a importar menos, devido ao papel desempenhado pela Internet na angariação de fundos de pequeno porte por parte de uma imensidão de pequenos doadores. Tal cenário contrasta com as eleições anteriores, que demonstraram que os doadores ricos, grandes corporações, lobistas e grupos de interesses — denominados de “dinheiro grande”— tiveram importância decisiva nas competições presidenciais (ANSTEAD; CHADWICH, 2008). A Internet é um fator explicativo principal para a mudança sistêmica que resultou na diminuição da importância das grandes contribuições no processo de eleição presidencial, pois possibilitou as condições efetivas para as pequenas doações: diminuiu barreiras espaçotemporais para o engajamento e a participação e tornou mais fácil para os cidadãos contribuírem com seu candidato preferido. Durante as primárias, Hillary Clinton, na condição de ex-primeira dama e senadora cujo nome é amplamente difundido na sociedade e representa grande força política no partido Democrata, contou com um cenário muito mais favorável para grandes arrecadações em comparação a Barack Obama. Certamente se a decisão do Partido Democrata fosse de cúpula, a escolhida seria Hillary Clinton. Barack Obama era um candidato com nome pouco difundido e que inicialmente dispunha de parcos recursos financeiros para a campanha. Negro, filho de queniano com uma norte-americana formou-se em Direito em Harvard. O advogado e professor foi senador por apenas quatro anos e, antes disso, legislador de Illinois por oito. Era, portanto, apenas um político regional, pouco conhecido fora de seu estado. Ganhou fama pelo seu discurso quando subiu ao palanque da Convenção do Partido Democrata, em 2004, para apoiar a candidatura de John Kerry à presidência dos EUA. A Internet possibilitou a Obama mobilizar partidários e recursos on-line de forma rápida. E foi através desta ferramenta que anunciou sua candidatura à presidência em 2007, cujo lema principal foi “Change”. Os temas de mudança e esperança balizaram toda sua campanha, utilizados de forma impressionante nos discursos empolgantes do candidato, que é dono de uma convincente oratória.


102 Obama foi profundamente ativo na Internet. A gestão de redes sociais se tornou um elemento proeminente em sua campanha, desde o princípio do processo de primárias. Obama anunciou nestas páginas que a criação de redes era uma chave principal para o sucesso de sua campanha. Obama desfrutou ampla vantagem no novo meio. O website de Obama www.barackobama.com tornava muito fácil que apoiadores entrassem em ação e contribuíssem com a campanha. Eles podiam receber notícias de campanha imediatamente após postadas no website, realizar chamadas telefônicas para eleitores indecisos e traçar planejamento de visitações e operações porta em porta com outros apoiadores residentes na mesma área geográfica, apenas para citar alguns exemplo s. Obama inovou também utilizando-se de SMS (mensagens de texto) para enviar notícias da campanha e solicitar doações. A campanha de Obama mobilizou seus partidários também por listas de e-mail e bancos de dados da Internet. A partir destes, foi possível identificar eleitores potenciais em todo o país, utilizando tecnologias que apontam as preferências do eleitor com base em dados comerciais, onde constam informações do tipo propriedade de carro, assinatura de revistas, websites acessados, dentre outras. Utilizaram, ainda, o targeting de comportamento online: quando um eleitor navegava pelo site da campanha, um “cookie” era colocado no seu navegador, identificando os tipos de sites antes visitados e apresentando o conteúdo de acordo com as preferências deste eleitor. O website de Obama recebeu muito mais visitas, o que tornou seu targeting ainda mais efetivo (Pew Center, 2008). Portanto, a campanha de Obama foi eficiente na segmentação dos seus apoiadores, montando diferentes métodos de comunicação para cada grupo. Ao invés de massificar sua propaganda a partir de comerciais de TV que atingissem várias classes, no pleito de 2008 literalmente montaram-se campanhas para cada perfil de indivíduo. Tudo isto foi possível por meio da Internet. A partir desta ferramenta foram obtidos indicativos detalhados de quem visitar, inclusive mapas das áreas e rotas, a quem solicitar contribuições, bem como os assuntos que seriam prováveis que cada eleitor potencial se interessasse. A Internet, portanto, levou a um aumento considerável no cálculo estratégico e o nível da comunicação passou de massificado para altamente personificado. Utilizar o website oficial da campanha e de relacionamentos com o propósito de criar uma comunidade ativa provou ser mais eficiente na campanha de Obama, visto que o capital social e humano se mostrou mais interessante, e acabou por gerar o financeiro. Isto criou um ciclo positivo de mobilização e participação eleitoral, encorajando as pessoas a participarem de forma mais intimista da política. Barack Obama lançou apelos de construção de um novo tipo de política: Em vez de nos forçar a depender dos milhões dos lobistas e dos grupos de interesse, vocês abasteceram esta campanha com doações de cinco, dez, vinte dólares, o que vocês conseguiram. E, porque vocês fizeram isso, nós construímos um movimento de base de mais de 1,5 milhões de americanos (Barack Obama em discurso, Reuters, 2008). O sucesso das redes de campanha que se formavam on-line e que, por sua vez, resultavam em doações financeiras, recebeu intensa cobertura midiática, gerando um eco multiplicador. Neste sentido, os comentários tecidos ao sucesso de Barack Obama como receptor de doações, comparativamente a Hillary Clinton durante as prévias e a John McCain no pleito geral foi considerado um diferencial. O uso da Internet, portanto, pode chamar a atenção para candidaturas menos conhecidas e refletir o apoio popular para as idéias do candidato. Tal sistema de micro doações demonstrou que os candidatos devem valer-se de capacidade de convencimento para que os cidadãos doem dinheiro. Deste modo, são impelidos


103 a investir mais fortemente em plataformas e propostas políticas para buscar o apoio da esfera civil. Após a corrida presidencial de 2008, os defensores da equalização das condições de financiamento têm mais motivos para o otimismo. Os autores denominados igualitários defendem que a distribuição desigual de riqueza durante a campanha deve desempenhar o menor papel possível na determinação dos resultados eleitorais (FOLEY 2004; HASEN 1996). É neste sentido que, para autores como Hasen, os micro-doadores promovem igualdade na competição eleitoral, o que denomina “barometer equality” (HASEN, 2003, p. 111). De fato, as quantias de dinheiro que um candidato popular pode angariar de micro doadores podem permitilo competir de forma mais equalizada com os candidatos mais abastados ou que representam grandes interesses. Por tal motivo, alguns autores têm discutido que a Internet está criando uma nova democracia de pequeno dólar: Some have even gone as far as to argue that the Internet, as a mechanism for giving, is creating a new era of “small dollar democracy” (SCHMITT, 2007, p. 68). É evidente que não é possível acabar, num futuro próximo, com os grandes doadores, mas as pequenas e médias doações de pessoas físicas podem ser interpretadas como um mecanismo de contrapeso. Outra implicação apontada na literatura é que as micro doações tendem a ser mais ideológicas, enquanto as macro mais movidas por interesses. Quando os recursos são oriundos de fontes empresariais, o risco de corrupção é maior. As empresas que mais contribuem são aquelas que dependem de regulamentação governamental, de contratos com o governo, concessão de subsídios, além de definições macroeconômicas, como juros e tarifas. As pequenas doações podem significar um aumento na accountability e na transparência. Se engajar em uma campanha política, inclusive doando dinheiro, pode se traduzir em um maior acompanhamento, fiscalização e cobrança do político eleito. Pode resultar, ainda, em maior influência e impacto mais direto na agenda política. No entanto, há também o risco de inclinar o governo para os interesses desses microdoadores, cujas visões e atributos, apesar de serem mais representativos do que dos grandes doadores, não refletem perfeitamente a população americana como um todo. É salutar enfatizar, portanto, que os efeitos na igualdade política são limitados, se considerarmos que ainda é uma pequena parcela da totalidade de eleitores que doam recursos a candidatos presidenciais. Além do mais, tais doadores tendem a ser mais abastados do que a população em geral. Um estudo sobre o perfil dos doadores na eleição presidencial de 2004 apontou que aqueles que deram mais de $200 eram altamente educados, mais velhos e muito mais ricos do que a maioria dos americanos. Já os pequenos doadores, cujas doações foram abaixo de $200, são mais parecidos com o público geral em muitos aspectos. Doadores pequenos não eram nem tão ricos, nem tão altamente educados quanto os doadores grandes, embora fossem muito mais do que a população geral (Institute for Politics Democracy & the Internet 2006, p. 16). Não obstante, mesmo considerando que os micro-doadores não representam perfeitamente a totalidade da sociedade norte-americana, tampouco um eleitorado estratificado, eles são mais representativos da população americana do que os grandes doadores, lobistas e grupos de interesses que dominaram o sistema no passado, tornando mais difícil que se abafe as vozes de muitos: “It is harder for big money to “drown out” the voices of the many. This is political equality that “levels up” the field rather than “leveling down” with spending limits (FLEISHMAN; MCCORKLE, 1984). É salutar enfatizar que neste pleito não se verificou uma mudança nas velhas regras do jogo político, ou seja, os grandes financiadores continuam existindo. Reconhecemos, ainda, que Obama pode ter sido um candidato extraordinariamente inspirador, capaz de atrair muitos doadores pequenos. O pleito de 2008 tratou-se de uma eleição histórica, mas nos dispusemos


104 aqui a analisar uma pequena parcela do processo. A Internet, neste contexto, desempenhou um papel peculiar também pelo fato de que o desejo de mudança era muito forte; deste modo, tornou-se um meio adequado para a ampla mobilização política. É evidente a impossibilidade de mensurar todas as variáveis intervenientes na vitória de Obama. Cabe destacar, portanto, que esta análise foca o papel da Internet para o financiamento da campanha. Não colocamos aqui como fator decisivo a rede eletrônica, mas como um importante instrumento. No entanto, apesar de ressaltar o caráter peculiar do pleito norte-americano em 2008, é possível afirmar que a Internet é, de fato, uma nova tendência e continuará a desenvolver um papel ativo nas eleições norte-americanas. Referências bibliográficas ANSTEAD, Nick; CHADWICK, Andrew. Parties, election campaigning, and the Internet. Toward a comparative institutional approach. In: CHADWICK, Andrew; HOWARD, Philip N. (eds). The Routledge Handbook of Internet Politics, 2008. BRUNNER, W. La Campaña electoral en los Estados Unidos in Frank Press (editor) Relación entre política y medios. Konrad Adenauer/Temas, Buenos Aires, 2002. FREY, Klaus. Capital social, comunidade e democracia. Ensaio bibliográfico acerca da obra Bowling Alone. The collapse and revival of american community. Política e Sociedade, n. 2, abril de 2003. GIBSON, Rachel K.; MARGOLIS, Michael; RESNICK, David and WARD, Stephen J. Election Campaigning on the WWW in the USA and UK. A Comparative Analysis. Party Politics, vol. 9, nº 1, p. 47-75, 2003. GOMES, Wilson. Capital social, democracia e televisão em Robert Putnam in Wilson Gomes e Rousiley C. M. Maia. Comunicação e democracia – problemas e perspectivas, São Paulo, Paulus, 2008, pp. 221-274. _____________. Esfera pública política in Wilson Gomes e Rousiley C. M. Maia. Comunicação e democracia – problemas e perspectivas, São Paulo, Paulus, 2008, pp. 31-162 HASEN, Richard L. Has the U.S campaign finance system collapsed? Political Equality, the Internet, and Campaign Finance Regulation. The Forum, Volume 6, Issue 1 Article 7, 2008. HINDMAN, M. The Real Lessons of Howard Dean: Reflections on the First Digital Campaign. Perspectives on Politics, 3(1): 121-128, 2005. KLOTZ, R. J. The Politics of Internet Communication. Lanham, MD, Rowman and Littlefield, 2004. LANDTSHEER, C.; KRASNOBOKA, N.; NEUNER, C. La facilidad de utilización de las “web sites” de partidos políticos. Estudio de algunos países de Europa del este y Occidental. Cuadernos de Información y Comunicación – Ciberdemocracia. Madrid, Universidad Complutense, 2000. MAIA, Rousiley. Redes cívicas e internet: efeitos democráticos do associativismo in Wilson Gomes e Rousiley C. M. Maia. Comunicação e democracia – problemas e perspectivas, São Paulo, Paulus, 2008, pp. 327-372. MANCINI, P. & Swanson, D. L. Politics, Media and Modern Democracy: an International Study of Innovations in Electoral Campaigning and their Consequences. Westport, London: Praeger, 1996 (Introdução). MANCINI, P. Americanización y modernización In Munõz-Alonso, A. y Rospir, J. I. (Orgs.) Comunicación Política. Madrid, Editorial Universitas, S.A., 1995, pp. 141-168. Meetup.com, Scott Heiferman Interview, 2004. Pew Research Center’s Internet & American Life Project. Political Intelligence. Obama Reaches 2 Million Donors. Boston Globe, Aug. 14, 2008.


105 PUTNAM, Robert. Bowling Alone: America's Declining Social Capital. Journal of Democracy, 6:1, Jan 1995, 65-78. SIFRY, Michael. The rise of open-source politics. New Media, 2004. SWANSON, David L. El campo de la comunicación política. La democracia centrada en los medios. In: MUNÕZ-ALONSO, A.; ROSPIR, J. I. Comunicación Política. Madrid, Editorial Universitas, S.A., 1995. TOCQUEVILLE, Alexis de. A democracia na América, 4. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 1987. WILLIAMS, C. B., WEINBERG, B. D., & GORDON, J. A. When online and offline politics “Meetup.” Paper Presented at the 2004 American Political Science Association Conference, September 2-5, 2004, Chicago, Illinois. www.barackobama.com


106

Bolívia em processo eleitoral: A provável reeleição de Evo Morales Andréia RÊGO32 Introdução A Bolívia vem passando por uma reforma constitucional, reforma essa que foi aprovada por cinco dos nove departamentos da Bolívia. Como era esperado, foi rejeitada nos quatro que decretaram autonomia em 2008: Santa Cruz, Pando, Beni e Tarija, os mais ricos do país. Localizados no Oriente, região produtora de petróleo e gás, esses departamentos concentram 25% da população boliviana e são contra iniciativas como a nacionalização dos recursos naturais e o corte no repasse de impostos obtidos com petróleo e gás. Mesmo com essa baixa na votação, Evo Morales consegue a aprovação da Nova Constituição em Abril de 2009. A Nova constituição estabelece para o país várias mudanças como a inclusão da população indígena (cerca de 70% do total de habitantes), a nova Carta Magna, que deve ser aprovada em referendo, é um modelo econômico conformado pelas economias estatal, comunitária e privada. A Carta Magna respeita a propriedade privada, sempre que esta cumpra uma função social, e uma das mudanças que mais chama a atenção nessa nova constituição boliviana é a nova lei eleitoral, que abre caminho para que o presidente seja eleito em 06 de dezembro de 2009 para um segundo mandato, relativo ao período entre 2010 e 2015. Outra novidade é a mudança no sistema eleitoral, adotando novidades tecnológicas para evitar fraudes no pleito. As autoridades eleitorais farão a coleta das digitais dos eleitores, que também serão fotografados e terão suas assinaturas digitalizadas. A Corte Nacional Eleitoral (CNE) garantiu que será possível implementar o sistema antes da votação. Ao mesmo tempo, o governo concordou em reduzir de quinze para sete - e não oito como se esperava - o total de cadeiras destinadas às minorias dos grupos indígenas das áreas rurais do país. O último item do entendimento foi em relação ao voto no exterior, pela primeira vez, os eleitores que não moram na Bolívia poderão votar numa eleição do país e estima-se que sejam pelo menos trezentos mil pessoas beneficiadas pela medida. Com essa nova constituição, podemos perceber que o mais beneficiado com essas mudanças no país é o atual presidente Evo Morales, pois o seu mandato encerra ano que vem, e de acordo com a antiga legislação, Morales não tinha o direito de concorrer à reeleição e seria obrigado a deixar de comandar o país. Novas eleições De acordo com a nova constituição boliviana, as eleições passarão a ter algumas mudanças, mudanças essas que proporcionarão uma votação tranqüila e propícia a um sistema sem fraudes, pois antes da votação, os parlamentares da situação e da oposição chegaram a um acordo que acabou ratificado na nova lei. Cedendo a um pedido da oposição, o presidente concordou em mudar o sistema eleitoral, adotando novidades tecnológicas para evitar fraudes no pleito e as autoridades

32Andréia

Rêgo é Publicitária e aluna do programa de Pós - Graduação da Universidade Metodista de São Paulo.


107 eleitorais farão a coleta das digitais dos eleitores, que também serão fotografados e terão suas assinaturas digitalizadas. A Eleição na Bolívia em 06 dezembro de 2009 ficou marcada como uma eleição histórica, pois os bolivianos foram as urnas para votarem por um novo país. Nessa eleição, além de escolherem o presidente, os parlamentares e os governantes, o eleitorado também definia a aprovação de 18 processos para a nova constituição. Após essa eleição, a Bolívia dá um novo passo e põe em prática um modelo de estado multinacional unitário e da economia social mista, que, no entanto, começam a tomar forma apenas a partir de 06 de dezembro, quando 5.138.583 bolivianos forma às urnas para eleger governadores e 166 membros da assembléia, que será responsável pela construção do enquadramento legal que vai lançar um novo Estado. Não só isso, a votação decidiu também sobre o rendimento total do país em 18 referendos modelo autônomo: cinco departamentos, um regional e 12 índios. Daí, vemos que este processo eleitoral é um dos mais importantes na história da Bolívia, não só pela sua composição política, mas também porque foi marcado por três acontecimentos históricos: a maioria dos eleitores que se inscreveram (Indígenas que não tinham o direito de votar), o primeiro em que os bolivianos vão votar residentes no estrangeiro e os primeiros que terão por base de um padrão moderno biométricos. Nas últimas eleições nacionais (18 de dezembro de 2005), quando Evo Morales foi eleito presidente com 53,7% a favor, 3.679.886 bolivianos registrados foram às urnas, atualmente esse número subiu para 1.458.679, equivalente ao padrão de La Paz, o departamento com o maior número de eleitores no país. Isso só foi possível, entre outras coisas, o padrão biométrico, um próximo sistema informativo onde o governo decidiu investir mais de $ 50 milhões para superar as sensibilidades entre partidários do governo e opositores, que no final de 2008 e início de 2009 trouxe o país à beira do colapso por suas diferenças ideológicas, agravadas pelo processo de reforma constitucional. Em 14 de abril deste ano, após meses de tensão, confronto, morte e uma greve de fome presidencial, os membros do parlamento aprovaram a Lei Eleitoral de Transição do Sistema 4021, que convida nomeadamente os eleitores para as eleições gerais e referendo autonômico em abril de 2010 e a eleição de autoridades departamentais e municipais. Essa lei também definiu a elevação do padrão biométrico, regulamentado voto no exterior e encontrou a criação de sete distritos indígenas. Uma vez que este processo, a Corte Nacional Eleitoral entregar os resultados oficiais da eleição, até 30 de dezembro, a Assembléia Legislativa Plurinacional, o primeiro do novo estado, será instalado em 06 de Janeiro de 2010 e 47 dias depois, 22 fevereiro, assume o novo Presidente e Vice Presidente para comandar o país com uma nova constituição.


108 A disputa Morales chegou à Presidência em janeiro de 2006 e seu atual mandato terminaria em 2010, ano que vem. No entanto, de acordo com as pesquisas feitas no decorrer do período eleitoral, sempre apontaram a reeleição do mesmo. Pela antiga lei eleitoral, Morales não poderia ter dois mandatos consecutivos, mas com a nova constituição ele passou a ter o direito de se candidatar e concorrer à reeleição. No entanto, se Evo Morales achou que essa eleição seria uma disputa tranqüila o próprio havia se enganado, pois além de Morales a Bolívia tinha mais sete candidatos concorrendo à presidência. Além da Presidência, está em jogo também a formação da Assembléia Legislativa Plurinacional, órgão legislativo que substituirá o Congresso de acordo com a Constituição aprovada no princípio de 2009. Esse fato deu uma importância dobrada às eleições de 2009, pelo motivo de que a Assembléia Legislativa Plurinacional desenhará as estruturas de governo, ou seja, essa eleição determinou poder que substituirá o Congresso, segundo dita a nova Constituição, e desenhará as estruturas políticas de um Estado boliviano reformado. A Assembléia Plurinacional é o órgão legislativo que substituirá o Congresso. Assim como o Congresso, será formada por duas câmaras, ou seja, os integrantes da Assembléia Legislativa Plurinacional serão responsáveis pela elaboração da estrutura jurídica dos outros dois poderes, o Executivo e o Judiciário, e pela colocação em prática de um novo tipo de jurisdição política previsto na nova Constituição: as autonomias. No meio de todo esse cenário, o presidente Evo Morales concorre à presidência com mais sete candidatos no qual de acordo com pesquisas recentes, poderá se tornar o primeiro presidente reeleito para um mandato consecutivo na história do país. Nesse contexto, podemos destacar que a Bolívia elegerá o presidente, o vicepresidente e os legisladores da futura assembléia. Para isso será necessário uma apuração prolongada dos votos, onde o conselho eleitoral já informou que todos os resultados só serão lançados em 30 de dezembro. O presidente indígena e esquerdista Evo Morales se candidata à reeleição e tem grandes chances de vencer no primeiro turno. Se as previsões dos institutos de pesquisa - que dão a Morales mais de 50% das intenções de voto - se confirmarem, Morales venceria com cerca de 30 pontos percentuais de vantagem em relação ao candidato de direita Manfred Reyes Villa. Reyes Villa, ex-militar e ex-governador de Cochabamba, é o candidato da oposição mais bem situado nas pesquisas, concorrendo pelo Plano Progresso Para Bolívia- convergência Nacional (PPB-CN) e chega às eleições com cerca de 20% das intenções de voto. Outro concorrente à presidência é o empresário da indústria de cimento Samuel Doria Medina que está em terceiro na corrida, com menos de 10%. É Candidato à Presidência pela Unidade Nacional (UI). Há também outros cinco candidatos, que somariam cerca de 5% das intenções de votos, além disso, as pesquisas registram cerca de 7% de indecisos. É nesse panorama que se encontra as eleições bolivianas, onde existe um grande número de candidatos, mas pelas vias de fato o povo pretende, segundo as pesquisas, reeleger o Indígena e presidente do país Evo Morales. A corrida à presidência boliviana A Corrida à presidência da Bolívia se deu exatamente em 05 de outubro de 2009, onde todos os candidatos à presidente e demais cargos a serem escolhidos, lançaram suas campanhas eleitorais e iniciaram uma caminhada para chegar ao poder.


109 Nesse meio de campo, encontra-se o atual presidente e candidato a reeleição, Evo Morales, no qual lançou sua candidatura a presidência e de acordo com pesquisas recentes, Morales poderá assumir o poder de governar o país por mais cinco anos. Em sua caminhada, Morales poderá ser reeleito já no primeiro turno, desde que ele obtenha mais de 40% dos votos e conte com uma vantagem de pelo menos 10% sobre seu principal concorrente, segundo a lei eleitoral boliviana. Em sua campanha, Morales adotou estratégias que confirmam uma elaboração significativa, em termos de planejamento e marketing político. Ele está trabalhando no relacionamento, nas alianças, no controle de regiões e, quando entrou dinamicamente no ar a plataforma de governo do presidente, ele investiu numa publicidade que dificilmente foi batida ao longo da campanha. De acordo com os levantamentos da tendência eleitoral, os institutos de estatística identificam que, até o momento, o presidente Evo Morales apresenta índices que oscilam entre 43% e 54% dos votos, contra 20%, ou 19% do segundo colocado. Assim, se forem mantidas as tendências, e não ocorrer algo excepcional, Morales se reelegerá. Independentemente de quaisquer posicionamentos, os analistas, tanto quanto os profissionais do marketing acentuarão que o presidente da Bolívia cumpriu parte elevada de sua plataforma eleitoral anterior, a qual se baseava em três pilares: primeiro, a nacionalização dos hidrocarbonetos, das minas e da exploração de minérios no país; segundo, a reforma constitucional, com uma Assembléia Nacional Constituinte e, terceiro, a recuperação do mar territorial boliviano. Imediatamente após ser eleito para este mandato que se encerra, Morales nacionalizou os hidrocarbonetos e obrigou a uma revisão de todos os posicionamentos das lideranças na América do Sul em relação ao seu país, obtendo apoio direto, algumas vezes explícito, do próprio presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, que se viu na posição de negociar os termos da ocupação da Petrobrás, empresa brasileira que, na época, representava sozinha, aproximadamente, 18% do PIB (Produto Interno Bruto) boliviano e 20% de todos os investimentos diretos no país, segundo dados revelados e divulgados em vários jornais, apesar de a informação ter sido esvaziada ao longo do tempo e depois anulada, sem ser apresentada contrapartida a esses números. Em seguida, Morales investiu na realização da Constituinte para alterar a modificar a Constituição, gerando oposição da metade mais rica e mais produtiva da Bolívia (a metade amazônica), que buscava autonomia administrativa com a qual desejavam controlar os 1 / 4 dos impostos gerados na própria região, para investimento local. Não houve declarações oficiais de separatismo, exceto quando perceberam que poderiam sofrer intervenção do governo central. É necessário destacarmos também que a alegação de Morales sempre foi de centralizar a arrecadação de impostos para distribuí-lo em benefício das regiões menos desenvolvidas, apoiando as populações indígenas e mantendo a produção cocaleira, considerada por ele um problema exclusivamente cultural, argumentos que foram usados em sua campanha. A forma de contrabalançar a perda do dinamismo econômico, pelo seu cálculo estratégico, seria revendo os tratados de exploração e comercialização de hidrocarbonetos, alterando, principalmente, os preços disponibilizados no mercado internacional, já que havia ocorrido à nacionalização e tudo estava sob o controle do Estado. Nessa ponte, o presidente mostrará ao povo indígena, maioria populacional, que foi forte, por isso ele é o líder adequado para governar o país. Como numa campanha eleitoral não se trabalha com explicações científicas sobre o melhor modelo econômico, mas com os dados concretos de liderança, enquanto se luta pelo voto, Morales fará uso desse fator em seu próprio benefício, fazendo com que a população acredite que ele é um líder que cumpre com suas obrigações, pois dos três pilares de promessa


110 de campanha anterior, dois foram cumpridos, mesmo que com problemas, ou jogados à mesa, e o terceiro (a recuperação do mar territorial), neste momento, está em fase de negociação direta com o Chile, cuja presidente, Michele Bachelet, anunciou que pretende chegar a um termo com Morales antes do término de seu mandato, em 2010. Essa negociação da recuperação do mar territorial boliviano trará a abertura do tão sonhado canal para o Pacífico, apesar de ser esse o discurso que interessa ao presidente Morales. Para o Chile, certamente estará na pauta, à resolução do problema do fornecimento do gás boliviano, que é necessário às suas indústrias, e, hoje, chega ao país por intermédio da Argentina, já que as relações entre Chile e Bolívia são conflituosas. Ou seja, a probabilidade de o terceiro pilar ser anunciado como em vias de concretização, dará ao atual presidente mais força para anunciar que teve um mandato vitorioso. Nesse sentido, Morales vem trabalhando numa campanha que tem o objetivo de mostrar a população boliviana, que se Morales não permanecer no poder, a Bolívia não terá progresso. Da mesma forma, Morales tem usado estrategicamente o argumento da ilegalidade de estrangeiros em regiões fronteiriças (o caso mais divulgado foi o das famílias de brasileiros na fronteira com o Acre) para fazer o deslocamento de famílias de indígenas da região dos Andes (mais pobre) para a região amazônica (mais rica e onde tem grande oposição). No caso dos brasileiros, essa foi a interpretação dos analistas que viram uma forma de contrabalançar a contraposição que Morales recebe no Departamento de Pando onde estão esse brasileiros na faixa fronteiriça. Os Departamentos correspondem aos Estados no Brasil, como São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Amazonas, Maranhão etc. Pando faz parte da divulgada "Média Luna" (Meia Lua) grupo composto pelos Departamentos mais ricos, que comportam 44% do PIB (Produto Interno Bruto) boliviano, e se opuseram ao governo central, reivindicando autonomia administrativa e controle dos tributos. Essa região é composta por Pando, Bene, Santa Cruz de La Sierra e Tarija. Diante desse quadro, das medidas adotadas atualmente, do marketing político que será feito, usando vários elementos para tanto, dentre eles o prêmio de "Defensor Mundial da Mãe Terra" que Morales recebeu da ONU (Organização das Nações Unidas) no final de agosto deste ano, 2009, por intermédio do nicaragüense Miguel D'Escoto Bockmann, presidente da Assembléia Geral das Nações Unida; do apoio externo que lhe tem sido dado por líderes do terceiro mundo, sendo o mais importante o apoio do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, a tendência é que Morales se reeleja. Além disso, que consiga controlar as regiões e, principalmente, estabeleça o controle sobre Legislativo, se forem confirmadas as tendências eleitorais atuais. O resultado será a implantação efetiva de seu projeto sobre a Bolívia. De acordo com esse contexto, a propaganda ideológica usada por Evo Morales na sua campanha presidencial, busca demonstrar que Morales é a melhor opção para a Bolívia, ou seja, toda a estratégia de sua campanha pode ser usada como um exemplo em que o autor Nelson Jahr Garcia explica em seu livro "O que é Propaganda Ideológica": "A Propaganda eleitoral, geralmente realizada em vésperas de eleições. Suas mensagens, veiculadas pelos meios de comunicação ou divulgadas diretamente através de discursos e apelos pessoais, convidam a votar em determinado candidato, enaltecem suas qualidades positivas e informam sobre as obras que realizou no passado e as que irá fazer no futuro, se eleito". Nessa campanha, Morales busca também se posicionar como se fosse o melhor acontecimento à Bolívia, pois apesar de ser um Indígena, Evo possui conhecimento de causa e sabe a necessidade verdadeira que o país precisa para sair do anonimato.


111 Considerações finais Ao pesquisar e acompanhar o período eleitoral na Bolívia, período esse que ocorreu no segundo semestre de 2009, podemos destacar que a Bolívia além de passar por um processo eleitoral, houve também mudanças em sua constituição, e essas mudanças acabarão beneficiando o atual presidente boliviano Evo Morales. Morales antes da nova constituição não poderia concorrer à reeleição, mas como a Bolívia vem passando por um processo recheado de alterações em sua constituição, essa lei foi derrubada e o atual presidente acabou barganhando o direito de se candidatar à reeleição. Na sua corrida à reeleição, Evo Morales adotou estratégias que confirmam uma elaboração significativa, em termos de planejamento e marketing político. Ele está trabalhando no relacionamento, nas alianças, no controle de regiões e, quando entrou dinamicamente no ar a plataforma de governo do presidente, ele investiu numa publicidade que dificilmente foi batida ao longo da campanha. Sua campanha possui estratégias baseadas num trabalho, que tem o objetivo de mostrar a população boliviana, que se Morales não permanecer no poder, a Bolívia não terá progresso, buscando desta forma, criar uma imagem positiva do candidato para que a população o considere com simpatia, a melhor opção que para governar o país. De acordo com esse contexto, podemos afirmar que toda a campanha de Evo Morales, está baseada em uma propaganda ideológica que permite disseminar de forma persuasiva, para toda a população boliviana, as idéias do candidato, nas quais depois de emitidas, essas idéias passam a ser retransmitidas, direta ou indiretamente, no seio da diversa sociedade boliviana, fazendo com que a população escolha Evo para a presidência na Bolívia. Referências bibliográficas GARCIA, Nelson Jahr. O Que é Propaganda Ideológica. São Paulo - Abril Cultural: Brasiliense 1985. GARCIA, Nelson Jahr. Sadismo, Sedução e Silêncio. Edições Loyola, São Paulo - 1990. www.eldiario.net, acesso em 15 de outubro de 2009. http://www.guiademidia.com.br/acessar_ji.htm?http://www.eldiario.net/, acesso em 18 de outubro de 2009. http://www.guiademidia.com.br/acessar_ji.htm?http://www.la-epoca.com/, acesso em 21 de outubro de 2009. http://www.guiademidia.com.br/acessar_ji.htm?http://www.laprensa.com.bo, acesso em 05 de novembro de 2009. http://www.guiademidia.com.br/acessar_ji.htm?http://www.lapatriaenlinea.com/, acesso em 11 de novembro de 2009. http://www.guiademidia.com.br/acessar_ji.htm?http://www.elmundo.com.bo/, acesso em 21 de novembro de 2009. http://www.guiademidia.com.br/acessar_ji.htm?http://www.elpaisonline.com/, acesso em 30 de novembro de 2009 http://www.prensaescrita.com/diarios.php?codigo=BOL&pagina=http://www.lostiempos.com, acesso em 05, 06 e 07 de novembro de 2009.


112

TERCEIRA PARTE _________________________________ EUROPA


113

Dos cravos à rede: um estudo sobre o marketing político em Portugal 33 Adolpho Carlos Françoso QUEIROZ34 Roberto Gondo MACEDO35

Introdução O processo de pesquisa e desenvolvimento da produção foi realizado como forma de integração de conteúdos acerca da comunicação política de Portugal. Foi realizado pelos alunos36 do componente curricular de Marketing Político Internacional da Universidade Metodista de São Paulo, programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Comunicação, a partir de revisão de literatura sobre o assunto, pesquisa direcionada a portais informacionais com conteúdo de Comunicação Política em Portugal na Internet, apresentação e discussão do filme “Capitães de Abril”, entre seminários e discussões internas. Para a realização destes seminários foi feito inventário sobre a produção contemporânea da literatura específica na área, para a qual foi reutilizada a revista “Comunicação e Política”, organizada pelos professores Paulo Ribeiro Cardoso e Álvaro Lima Cairrão, da Universidade Fernando Pessoa, em Portugal. Além desta revista que traz estudos contemporâneos de pesquisadores portugueses e internacionais, foram utilizadas também fontes adicionais que tangenciassem o tema, através da Colecção Comunicação, da editora Minerva Coimbra, que tratou de temáticas como as Presidências Abertas do período de Mário Soares e a censura no período Marcelo Caetano e a película “Capitães de Abril”. Para o balizamento histórico, foi analisada a obra clássica de Alejandro Pizarroso Quintero, que mostrou de que forma a Revolução dos Cravos representou uma ruptura no processo político daquele país. E, por fim, foram feitas pesquisas na Internet, para visualizar questões contemporâneas sobre o tema, tais como a existência de uma Associação Portuguesa de Marketing Político, os institutos de pesquisa, o papel das agências de publicidade no planejamento de ações comunicacionais políticas, dentre outros. A revolução dos cravos Em 1926, um pronunciamento militar pôs um fim ao período conhecido como Primeira República de Portugal. Este pronunciamento chamado de Movimento do 28 de Maio trouxe a implantação da chamada Ditadura Nacional, com aspirações fascistas e que vigorou como Trabalho apresentado no I Colóquio Brasil-Portugal de Ciências da Comunicação, evento componente do XXXI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 34 Doutor em Comunicação Social pela UMESP, Mestre em Comunicação, Publicitário. Docente do programa de Stricto Sensu da Universidade Metodista de São Paulo na linha de pesquisa Comunicação Massiva, Marketing Político Nacional e Internacional. Membro da Associação Brasileira de Consultores Políticos – ABCOP e VicePresidente da Intercom. E- mail.: adolpho.queiroz@metodista.br 33

Doutorando em Comunicação Social pela UMESP, Mestre em Administração Pública pela Universidade de São Caetano – USCS, Matemático, Analista de Sistemas e Mercadólogo. Docente do programa Lato Sensu de Comunicação Empresarial UMESP e Gestão Estratégica e Marketing FAMA. Consultor nas áreas de Gestão e Marketing. 36 Contribuíram para o desenvolvimento do artigo os discentes Alexandre TORREZAM, Ana Maria CORDENONSSI, Ana Paula OLIVA, José Aparecido de OLIVEIRA, Lincoln FRANCO, Péricles Flores da SILVA, Maurício GIL e Ricardo HIAR. 35


114 concebida até a aprovação da Constituição de 1933, sobre o comando de Oliveira Salazar. Marcelo Caetano o substituiu em 1968, dirigindo o país até 25 de Abril de 1974, quando foi deposto. Em 24 de março de 1974, numa última reunião clandestina, os membros do MFA (Movimento das Forças Armadas) decidem o derrube do regime pela força. Um mês depois era dado início ao movimento pacífico que em apenas um dia tomou o poder. A revolução que tinha a cooperação de vários regimentos militares de todas as partes do país que desenvolveram juntos as etapas do levante, sincronizados por sinais combinados transmitidos pelas rádios. Apesar de dividir opiniões entre os analistas portugueses e internacionais, a data da Revolução dos Cravos é considerada o Dia da Liberdade em Portugal. Na manhã de 25 de abril, a população juntava-se nas ruas apoiando os militares revoltosos quando alguém (e existem várias versões sobre quem terá sido e uma delas é de uma florista contratada que levava cravos para a abertura de um hotel) foi visto distribuindo cravos vermelhos aos soldados que depressa os colocavam no cano da espingarda. A partir daí, a flor passou a ser considerada como o símbolo da revolução. Após a revolução, inicia-se um período de grande agitação social em Portugal onde pouca organização aliada a uma grande diversidade de idéias sucede vários debates políticos “acesos” que deixam Portugal a beira de uma guerra civil. (WIKIPEDIA, 2006). Em 1975 foi criada a nova Lei da Imprensa (retocada em 1976,1978 e 1988) e que entre outros itens estabelece: a proteção da liberdade de imprensa, anulação da censura e estatutos gerais sobre a profissão de jornalista. Vários meios de comunicação foram nacionalizados (ainda na década de 80, alguns dos diários importantes de Portugal não haviam sido privatizados). O último meio de comunicação a voltar a mãos privadas foi o Diário de Notícias em 1991. No dia 25 de Novembro de 1975, Portugal sofre um Golpe de Estado que posteriormente promulga a Constituição de 1976 (ainda vigente). Cavaco Silva, atual Presidente da República de Portugal e que no período ocupava o cargo de primeiro ministro, privatizou os órgãos de informação do Estado. Historicamente, os partidos políticos e governos de Portugal sempre tentaram controlar a informação. Demissões, estatizações, nomeações de administrações e dos membros do governo encarregados da área de comunicação eram meios de manter o controle ao acesso e disseminação de informação. As administrações eram ocupadas por militares, socialistas e comunistas portugueses. Em uma análise contemporânea, sob a égide da imprensa portuguesa, é possível citar que tradicionalmente regional, possui mais de 500 títulos registrados na AIND (Associação da Imprensa Não-Diária). Atualmente, o governo controla a Radio-Televisão Portuguesa e parcialmente a agência Lusa através da secretaria do Estado para a Comunicação Social. O país conta com quatro canais de TV sendo RTP e RTP2 que são canais estatais e SIC e TVI que são os dois únicos canais privados de TV aberta. A imprensa em Portugal – transformações e tendências Uma das contribuições analisadas no arcabouço comunicacional português foi a obra “A Imprensa em Portugal”. O livro aborda as transformações dos últimos 30 anos, especificamente, nas empresas portuguesas de comunicação, fazendo uma síntese das tendências, os impactos de fatores externos às empresas de imprensa, as estratégias e negócios emergentes, a gestão da imprensa, quais as oportunidades do mercado e cinco desafios da imprensa portuguesa. Efetua um panorama das duas fases vividas pela imprensa após a Revolução dos Cravos: a Era Democrática logo após a ditadura, com a reposição das liberdades, abolição da


115 censura e nacionalização das empresas de imprensa, e ao fim da década de 80, a segunda fase, com a re-privatização dos jornais estatizados, a liberação do sistema midiático e consolidação dos grupos de comunicação nacional. Segundo Faustino (2002), “as principais tendências e evidências do mercado de imprensa português, segundo o autor, são: a Globalização (mais de 50% das revistas lançadas foram versões internacionais com adaptação local), a Concentração do mercado (mais de 60% do investimento em publicidade está em três editoras de jornais e revistas), a Diversificação (empresas estão reforçando presença nos vários segmentos de imprensa), a Especialização (o número de publicações aumentou 50% no período de 1995 a 2004), investimentos em Multimidia (a difusão de informações é independente do suporte de comunicação). E ainda, a Rendibilidade (pressão por números cada vez melhores), atuação em Marketing (ênfase em gestão e marketing como fator de competitividade), a Gratuidade (500% de aumento de publicações grátis entre 1997 e 2004) e incremento da Publicidade (dependência cada vez maior como fonte de receita das publicações)”. Há um longo caminho a ser percorrido pelas empresas portuguesas de comunicação, principalmente na captação de novos leitores (apostar em públicos jovem e feminino), reinventar novas formas de entregar a informação, melhor gestão da distribuição da informação e melhorar a performance em relação à Europa. Cinco desafios a serem melhorados pelos portugueses são fundamentais para o desenvolvimento da imprensa: a Competitividade, a Globalização, a Concentração empresarial e diversificação Multimídia, os Clientes (melhorar índice de leitura: 87,6 jornais diários/mil habitantes, sendo que a média nos países da União Européia é de 255 jornais/mil habitantes) e aprimorar uso de Novas Tecnologias. A censura à imprensa na época Marcelista Um dos momentos da história política de Portugal relevantes para análise comunicacional foi à ascensão de Marcello Caetano ao poder majoritário português. Todo o conteúdo (anúncios, fotografias, boletim metereológico, dentre outros) é submetido à censura prévia. Três vias vão à comissão de censura para exame e duas vias retornam com dois carimbos (visto e autorizado, parcialmente, suspenso e proibido). São instaladas tele-impressoras nas comissões de censura, que recebem o material das agências de notícias internacionais e retransmitem aos jornais. Fotografias são inspecionadas, sendo algumas cortadas parcialmente pelo lápis azul. O resultado é uma adaptação dos jornalistas: auto-censura, metáforas e adaptações estilísticas. Com o fim do longo consulado de Salazar, emerge uma crise política e sobe ao poder Marcello Caetano. Dá-se início a um movimento de “liberalização”, com freqüente alusão à restauração das “liberdades”, seguido de crédito e otimismo por parte dos editoriais aos discursos do primeiro ministro, traduzidos por um momento de “evolução liberalizante”. A metáfora “Primavera política”, em 68-69, diz respeito à tolerância por críticas, charges, menos cortes no noticiário estrangeiro, bem como o abrandamento do rigor censório e o regresso dos exilados. No entanto, essa calmaria duraria pouco. Findo o período eleitoral, retorna o aumento do rigor da censura. Marcello Caetano anuncia, em 1969, sua disposição em criar uma nova lei de imprensa. Enquanto os editorialistas ainda estavam otimistas com o fim da censura, esta dá


116 lugar a uma legislação repressiva – imprensa vigiada e excluída numa fachada democrática (a exemplo do que ocorria na Grécia, Brasil e Espanha). Segundo Carvalho (1999), “a Liberalização Marcelista é, na verdade, demag ogia e neocapitalismo, travestidos em uma modernização conservadora: o regime não vive sem censura e os grupos e empresas jornalísticas concordam: exame prévio”. Na nova lei, M. Caetano prefere a repressão administrativa e judicial à censura prévia. Possui uma concepção utilitarista da imprensa (propaganda de Estado, obras públicas, viagens ministeriais, TV), além de uma tolerância aos ataques ao colonialismo português. A Lei de Imprensa de 1970 teve como base p Projeto Sá Carneiro-Pinto-Balsemão com 18 artigos. Um ano depois, um parecer aprecia o documento e fundamentado na evolução das leis de imprensa em Portugal, Alemanha, Brasil, Espanha, França, Grécia, Itália e Uruguai. O texto aprovado mediante o Decreto-Lei 150/72 em 1972, corresponde a uma comissão especial e não ao Projeto Sá-Balsemão. A lei determina exame prévio durante estado de sítio, emergência ou “atos subversivos graves”. A justificativa é proteger a Constituição, as instituições, o prestígio internacional, a ordem pública, segurança do Estado, a família, a moral e os bons costumes. São proibidos textos ou imagens de movimentos cisórios, agitação social, casos de vadiagem, libertinangem, suicídios e crimes violentos, bem como revelar segredos de Estado ou informações secretas. Para o exame prévio, eram entregues três exemplares dos jornais à Direção-Geral de Informação no dia da publicação e três exemplares de publicação não-periódicas que versem sobre assuntos político, econômico ou social três dias antes da circulação. O jornalismo português de hoje e o anterior a 1974, sob a perspectiva do comunicador dos bastidores políticos: Mário Pinto Na história política portuguesa é possível fazer uma contraposição entre os papéis do jornalismo e os protagonistas da própria política em dois grupos distintos diferenciados na suas atuações antes e depois de Abril de 1974. O primeiro período compreendendo todo o regime chamado de Estado Novo (1926 -1974) e o segundo período, Abril de 1974 em diante, já sobre o regime democrático. Todo este contexto desenvolvido em terras portuguesas. O atual estado de comunicação política é primado por clichês e que a sua intenção é avaliar se nos dois períodos acima considerados esse lugar-comum se apresenta ou se tal vício é relativamente recente, objetivando ainda de maneira genérica verificar, se ocorreu evolução ou regressão no uso da linguagem e na efetiva comunicação dos bastidores da política. Segundo Pinto (2005), “para tanto, é colocado o 25 de abril de 1974, como marco delimitador de dois períodos opostos da Historia Política Portuguesa, dessa comparação ele estabelece um critério de análise”. A comunicação política sob o Estado Novo dava-se por uma comunicação dita “criptografada”, principalmente quanto aos clichês com os quais os políticos “comunicavam” seus atos e intenções, tais noticias se apresentavam de maneira superficial e cerimoniosa e de linguagem respeitosa e sintaticamente correta. Em contrapartida, no período mais recente a partir da década de 80, houve uma evolução no uso maior de palavras antes proibidas uma, por exemplo: partidos, greves, sindicalização, e outras. Em suma, o ator político mostra-se de outrora como uma figura essencial ao poder, sendo, por conseguinte bajulado e sendo seus atos superficialmente retratados pelos jornalistas da época. Atualmente os políticos e jornalistas em quanto protagonista da comunicação política são quando corretamente situados servidores do público alvo, ou seja, do cidadão em geral. Mário Soares e as presidências abertas


117

Um período relevante para descrição do processo de comunicação política portuguesa se dá com a chegada de Mário Soares à Presidência em 1986, onde permanece por dois mandatos de cinco anos cada, portanto até 1996. Sua estratégia de comunicação passava pela construção de pseudo-acontecimentos, que podem ser divididos em quatro categorias: 1) aparições públicas; 2) encontros formais e informais; 3) deslocamentos no interior do país; 4) visitas ao estrangeiro. (SERRAN, 2002). Soares implanta, em primeiro lugar, o que ele chama de uma “Presidência aberta aos meios”, utilizando sua bagagem como colaborador de jornais e sua grande proximidade com a imprensa. O presidente, do Partido Socialista convive nesse período com o primeiro-ministro Cavaco Silva, do Partido Social Democrata, ambos são opositores. O segundo passo foi implantar as “Presidências Abertas”, o que garantiu uma campanha permanente a Mário Soares. Elas aconteciam, sempre, a convite de lideranças regionais e o Gabinete da Presidência se transferia completamente para o lugar escolhido. A duração variava de uma a duas semanas, período em que aconteciam cerimônias, jantares oficiais, inaugurações e homenagens a personalidades locais. Participavam membros do Governo e deputados, além disso, a imprensa fazia grandes coberturas do evento. Nessas reuniões, Soares ouvia os anseios da população, suas reclamações e sugestões, mas continuava em uma posição muito tranqüila: ele não possuía poderes para tomar as atitudes exigidas. Enquanto o presidente defendia que as presidências eram grandes oportunidades de discutir os problemas do país, parte da imprensa já começava a interpretar que tudo não passava de uma estratégia para divulgar a imagem dele e enfraquecer a do Governo. Em 13 de janeiro de 1991, Mário Soares é reeleito com 70,4% dos votos, prometendo aprofundar as “Presidências Abertas” no segundo mandato. Isso não acontece. Enquanto no primeiro período são realizadas oito, no segundo, são apenas três. Uma delas é a Presidência Aberta da Área Metropolitana de Lisboa (AML), que ocorre em um período conturbado, de 30 de janeiro a 15 de fevereiro de 1993. As divergências entre a Presidência e o Governo se acentuam, no início de fevereiro Cavaco Silva determina a expulsão de brasileiros sem visto. O presidente é acusado por Silva de obstruir os trabalhos governamentais e a agitação política é grande em todo o país. Em outubro de 1995, dois anos e oito meses depois da PA na AML, o Partido Socialista vence as eleições legislativas e António Guterres é o novo primeiroministro. Imagem elege? Refletindo sobre a importância da imagem dos políticos na comunicação eleitoral, o caso de Valentim Loureiro, versa como exemplo de político com projeção pública e midiática. Loureiro lança-se, em 2005, candidato à prefeitura de Gondomar, região metropolitana do Porto, em Portugal e, ao ser recusado pelo próprio partido (PSD) devido a várias denúncias, é obrigado a mostrar um perfil independente e diferenciado dos demais candidatos. Os ajustes na imagem pública dele decorreram de campanha criativa e bem elaborada que implicou estudo dos problemas, necessidades e aspirações do eleitor, assim como rigoroso planejamento da comunicação da mensagem a ser transmitida. Ele obteve 57,53% de votos, o melhor resultado de um independente, na História de Portugal, tanto em termos percentuais quanto em número de votos: 48.826 votos. Segundo Melo & Melo Silva (2006, p. 276) Loureiro contou com o carisma pessoal, "Se o votante gosta do candidato, se acredita que ele lhe garante qualidade de vida e que vai fazer


118 bem o trabalho político, muito dificilmente haverá espaço para a intriga, a maledicência ou até a crítica razoável". Para eles, a utilização do marketing político é "imparável" e isso aumenta a importância destes profissionais e dos meios de comunicação massiva, já que "podem afetar e influenciar de forma muito profunda a opinião pública, alterando as suas atitudes e comportamentos a favor dos objectivos ou propósitos políticos dos candidatos”. Afirmam que os resultados também "têm uma explicação local, cada vez mais o povo se desliga dos partidos. A dimensão ideológica perde importância em relação à obra que se diz feita. De fato, este candidato contou com um conjunto de ações coordenadas com uma estratégia coerente que lhe permitiram a vitória". O sucesso de uma comunicação política se deve ao planejamento adequado que permite as equipe trabalharem de forma organizada e ordenada, definindo as melhores alternativas e estratégias para cada meio de comunicação, bem como prevendo e se preparando para qualquer situação, conflito, mudança ou oportunidade. O planejamento abrange desde as aparições em público, fotos, discursos, Infomails ensinando como votar até como reverter a favor de ataques dos concorrentes. Loureiro estruturou a equipe com: relações públicas, publicitários, profissionais de Marketing, designers gráficos, assessor de imagem (para as aparições públicas) e Ghostwriter (redação dos discursos). O plano de marketing político bem feito e os meios de comunicação de massa podem influenciar as percepções dos eleitores. Além disso, as imagens determinam a decisão eleitoral de forma mais poderosa que a própria idoneidade do candidato para exercer uma atividade política. Revoluções por cartazes O espaço exterior já é utilizado para há milênios como local de divulgação de mensagens, dando ao cartaz um papel de crucial importância. Até os dias de hoje ele é utilizado por ser uma forma muito barata de divulgação. Com a falta de outros meios de comunicação, como a televisão e o rádio, coube ao cartaz divulgar os dois lagos da Primeira Guerra Mundial, como também a ascensão de grandes líderes e ditadores do século XX, como Lênin, Mussolini e Hitler. Portugal também se utilizou de cartazes para divulgação de posições e opiniões políticopartidárias. No estudo feito por Camilo (2004), no período entre 25 de abril de 1974 e dezembro de 1975 – período durante o qual ocorreram transformações e ajustes radicais na sociedade portuguesa, com especial destaque a renovação da estrutura e das modalidades de funcionamento do campo político – é constatado que nestes 25 meses, Portugal pode ver o restabelecimento das liberdades de associação e de expressão, o que aumentou de forma muito acentuada o ritmo de produção de mensagens. A produção de signos de natureza visual foi tão ampla e heterogênea, que algo semelhante só foi visto naquele país quando da implantação de sua república. No âmbito desta explosão visualista, o discurso político veiculado pelo cartaz apresentou um papel central, “assumindo-se como um dos principais meios através do qual a energia de produção sígnica contida sob pressão, explodiu, invadindo subitamente a totalidade do País” (CAMILO, 2004, p. 33). O autor explica que o cartaz foi explorado pelas instituições políticas, sobretudo as de vocação político-partidária, para transmitir um discurso que fosse significativo das suas singularidades ideológicas e dos seus programas de ação e reforma política.


119 Visão contemporânea através da Internet O cenário da propaganda política em Portugal, principalmente com relação a buscas realizadas pela Internet, apresenta evolução em sua capacidade de análise e diagnóstico de Marketing. Atualmente são vários os meios eletrônicos que permitem servir de via de comunicação e integração entre profissionais da área e demais membros da sociedade. Segundo Sepúlveda (2000) “a Internet vem permitir que maior interação entre políticos e cidadãos, dando mais liberdade de expressão aos cidadão e pequenas forças políticas que, faces aos tradicionais meios de comunicação social, tem muita dificuldade em fazer passar a sua mensagem”. Neste universo On-Line de troca de informações, uma das formas mais disseminadas em endereçamentos eletrônicos de Portugal são os diários eletrônicos, também conhecidos como “blogs”, cuja popularidade de dá em proporções similares no território brasileiro. Este recurso permite eficácia no contato entre atores formadores de opinião e analistas políticos com seu público local, pois fatos ocorridos na esfera pública, sejam eles relevantes ou não podem facilmente ser alocados em web-sites e fóruns para discussão aberta, gerando seqüencialmente um conceito de democratização da informação. Segundo Lopes & Silva (2002), um dos fatos mais relevantes da política portuguesa contemporânea pode ser considerado, paradoxalmente, um fato não político, isto é, a popularização do Marketing Eleitoral. Pinto (2005) afirma que Portugal não tem tradição em Marketing Político, mas esse é um negócio que alicia muitos, principalmente m épocas eleitorais. Segundo Nazaré (2005) “os atores da nova política, treinados por especialistas, spin doctors e consultores de viagens, vêem no Marketing Político uma admirável mundo novo de oportunidades de sucesso instantâneo, daquela que a mídia e o povo aderem alegremente”. A associação portuguesa de comunicação e Marketing Político em sua página na Internet incentiva a organização dos profissionais da área e prega fatores mais intensificados para análise e articulações de uma campanha eleitoral. Apesar de Portugal apresentar iniciação nas aplicabilidades profissionais do Marketing Eleitoral, o empenho apresentado por consultorias e órgãos públicos existentes criam base para a maturação do processo organizacional nas esferas de trabalho públicas e políticas. O processo democrático e a influência dos avanços nos meios de comunicação Os meios de comunicação em massa, de maneira geral, desempenham grande influência sobre a sociedade. No panorama político isto não e diferente, já que a mídia é um dos canais mais utilizados por políticos para chegar ao eleitor e, conseqüentemente, no poder. Neste contexto, é difícil falar de democracia representativa, sem citar a televisão, o rádio, o jornal impresso e, até mesmo, a internet. Por meio desses veículos, candidatos mostram suas propostas e fazem seus “apelos” para que sejam escolhidos para representar o povo. Em Portugal essa situação também acontece até hoje, apesar do país buscar, desde 1996, ter a implantação da democracia direta. Esse sistema nada mais é que a possibilidade da intervenção direta do povo nas ações do governo. Um dos aspectos que podem contribuir para isso são os avanços na área da comunicação. A TV Digital que está próxima de se tornar uma realidade para um grande número de telespectadores, dará ao telespectador o direito de escolher e definir sua programação. A partir desse fato novo, os “mass media” não conseguiriam ter os mesmos efeitos massificadores, onde o mesmo conteúdo é enviado a todas as pessoas.


120 Nesse aspecto, o conteúdo emitido passa a ser fragmentado e direcionado ao receptor, de modo que ele possa interagir e opinar nas ações da administração pública. Este é um exemplo que já pode ser encontrado na internet, com o crescente número de “blogs”, nos quais os autores e seus receptores opinam abertamente sobre diversos temas. Essas discussões podem se intensificar com a TV Digital. É possível apontar, a partir desse pressuposto, que aos poucos a tradicional frase “vote em mim” seja instinta, dando espaço a outro tipo de atuação política. Isso porque com a possibilidade da escolha, a sociedade em geral não precisaria mais receber um conteúdo rotulado e mais passível de manipulações. Ao contrário, ela seria o ‘editor’, aquele que define o que é melhor para se assistir e absolver nos meios de comunicação. Além do poder de escolha, essas alterações podem fortalecer o aumento de uma população mais crítica em relação ao conteúdo apresentado pelos políticos. O povo deixaria assim, de ter representantes para tomar decisão por eles, para assumir diretamente a responsabilidade por essa decisão na democracia. Considerações finais O universo de estudo proposto pelo artigo é vasto no que tange as experiências vividas no âmbito político de Portugal, pelos períodos vivenciados de transição de regimes e mudanças de comportamentos dos atores públicos envolvidos nos diversos períodos políticos do país. O recorte que compreende da revolução dos Cravos até os dias atuais objetivou demonstrar como que, em um curto espaço de tempo, a sociedade civil, bem como demais atores sociais conseguiram equilibrar o sistema político de Portugal e instaurar um clima democrático nas suas instâncias legais. A imprensa portuguesa ganha a cada dia mais espaço para implantar uma liberdade de imprensa saudável e coerente, sem resquícios de “Síndromes de Mordaça”, características de históricos de turbulências políticas de regimes governamentais ditatoriais. Os exemplos de Marcello Caetano, Mário Soares e Valentim Loureiro demonstram em períodos diferentes as formas de aplicabilidade das estratégias de comunicação política, principalme nte no que tange a compreensão de formas alternativas de integrar uma comunicação eficaz com a população. Com o avanço tecnológico, intensificado principalmente na última década, as mídias tradicionais e eletrônicas tendem a interagir, propiciando um ambie nte mais acirrado de informações para os leitores, fomentando a reflexão dos feitos dos respectivos atores políticos, tornando o ambiente de comunicação política de Portugal ou de demais países, como o Brasil, uma aplicação clara de estratégias de comunicação e planejamento organizacional destinado ao ambiente político e eleitoral. Referências bibliográficas CAMILO, E. O Cartaz Partidário em Portugal (1974-1975). Monografia? Universidade da Beira Interior. Portugal – Cidade, 2004. CAPITÃES de Abril. Título Original: Capitaines d´Avril. Direção: Maria de Medeiros. Produção: Concha Díaz, Gabriela Cerqueira, Jacques Bidou. Elenco: Stefano Accorsi, Maria de Medeiros, Joaquim de Almeida. Produtoras: Alia Film, Filmart, JBA Productions, Mutante Filmes. França, Espanha, Portugal, Itália: 2000, 1 DVD, (123 min), Dolby, Color. CARVALHO, A. A. de. A censura à imprensa na época marcelista. Coimbra: Minerva, 1999. FAUSTINO, P. A Imprensa em Portugal – Transformações e tendências. Portugal - Lisboa: Media XXI, 2002.


121 LOUREIRO, V. Blog oficial da candidatura independente à Câmara Municipal de Gondomar. Disponível em: <http://valentimloureiro.blogs.sapo.pt/> Acesso em: 27 set. 2006. MELO, R. de & MELO SILVA, E. Uma abordagem à imagem do político - o caso Valentim Loureiro. In: CARDOSO, P. R. & CAIRRÃO, Á. L. (org). Cadernos de Estudos midiáticos 04 comunicação política, edição especial. Porto: Editora Universidade Fernando Pessoa, 2006, p. 275-287. NAZARË, Luis. O Marketing e a Política. Portal Jornal de Negócios, 2006. PILAGALLO, Oscar. Leituras Cruzadas: Uma no cravo, outra na ditadura. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u777.shtml>. Acesso em: 12 ago. 2006 PINTO, M.. A Hora da propaganda. Portal Visão On-line, 2005. ROCHA, Nuno. Os meios de Comunicação após a Revolução dos Cravos (1974-1996). In: QUINTERO, Alejandro Pizarroso. História da Imprensa. Planeta Editora. Lisboa-Portugal, 1994. SEPULVEDA, A. J. Marketing Político na Internet. Lisboa, editora Neosis, 2000. SERRAN O, Estrela. As Presidências Abertas de Mário Soares – As estratégias e o aparelho de comunicação do Presidente da República. Colecção Comunicação. Minerva Coimbra. Coimbra – Portugal, 2002. LOPES, R. & S, R. Geomarketing Eleitoral: Aplicação de metodologias e ferramentas de Geomarketing na campanha eleitoral das eleições municipais de 2001. Disponível em: http:// www.gismedia.pt/newsletter/dl/esig2002_2.pdf. Acesso em: 10 out. 2006. WIKIPEDIA. Revolução dos Cravos. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_dos_cravos>. Acesso em: 09 ago. 2006.


122

Um panorama do marketing político na França: fundamentos utilizados nas ações de comunicação política no Brasil37 Adolpho Carlos Françoso QUEIROZ38 Paulo Cezar ROSA39 Roberto Gondo MACEDO40

Introdução O resgate histórico da comunicação política na França foi possível, pois o núcleo de pesquisa em propaganda política do programa Stricto Sensu de Comunicação Social da Universidade Metodista de São Paulo oferece o componente de Marketing Político Internacional. A escolha da França como objeto de estudo dos pesquisadores41 foi realizada pela importância do processo evolutivo democrático francês e pela proximidade de mídias e interações nos momentos pré, eleitorais e pós-eleitorais brasileiros. A propaganda política na França apresenta relevantes aspectos com relação à imprensa e a propaganda, principalmente no que tange a viés políticas. O século XIX do ponto de vista jornalístico é o período em que a imprensa atinge a sua plenitude, com as inovações tecnológicas; organização empresarial e financeira; aumento das tiragens dos periódicos, e a influência política. Dentro de uma perspectiva geral, a Historia da Propaganda, Quintero (1990) salienta que embora existisse a propaganda política e os Estados se ocupassem dela não houve, no século XIX, um salto qualitativo relevante. Entretanto, os progressos da comunicação abrem novos caminhos à propaganda, e os grandes processos de transformação política e social do século geram uma grande atividade propagandística, principalmente de oposição. A França pós-napoleônica buscou recuperar-se das convulsões que vivenciou durante anos. Com a monarquia de Luís Filipe são introduzidas medidas liberalizadoras. A liberdade de imprensa é efetiva. Iniciou a expansão colonial francesa a procura de prestígio para o seu regime que estava muito isolado das demais monarquias européias.

Trabalho apresentado no IX Colóquio Brasil-França de Ciências da Comunicação, evento componente do XXXII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação 38 Doutor em Comunicação Social pela UMESP, Mestre em Comunicação, Publicitário. Docente do programa de Stricto Sensu da Universidade Metodista de São Paulo na linha de pesquisa Comunicação Massiva, Marketing Político Nacional e Internacional. Membro da Associação Brasileira de Consultores Políticos – ABCOP, VicePresidente da Intercom na gestão 2004-2008 e Presidente da Rede POLITICOM – Sociedade Brasileira de pesquisadores e profissionais de comunicação política. E- mail.: adolpho.queiroz@metodista.br 39 Doutorando em Comunicação Social pela UMESP, Mestre em Administração Pública pela Universidade de São Caetano – USCS, MBA em Marketing. Docente do programa Lato Sensu da Universidade Metodista de São Paulo, Diretor de Comunicação e Planejamento da Naster Consultoria e Instituto Gestão do Conhecimento. É Diretor Editorial da Rede POLITICOM - Sociedade Brasileira de pesquisadores e profissionais de comunicação política. Email.: rgmnaster@hotmail.com 40 Doutorando em Comunicação Social pela UMESP, Mestre em Controladoria pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Docente do programa Lato Sensu da Universidade Metodista de São Paulo, atua como consultor na área de gestão e planejamento. E- mail.: paulocezarrosa@uol.com.br 41 Contribuiram para o desenvolvimento da pesquisa os discentes CALDAS, Fabio Ciaccia Rodrigues; CASTRO, Ana Caroline; CEROZZI, Willians; CUNHA, Jorge Vidigal; GAMAS, Maria Helena; GARCIA, Paulo Roberto Salles; MANHANELLI, Carlos; NASCIMENTO, Anderson Rafael Barros do; RAMOS, Thaillissa Andara; ROCHA, Daniela. 37


123 Com efeito, a luta contra o regime da Restauração por toda a Europa dá lugar ao conjunto da propaganda liberal e nacionalista com a imprensa, as sociedades secretas e as intentonas revolucionárias. A propaganda política nos grandes Estados, na França do Segundo Império, está debilitada, e «Napoléon le Petit» tenta ressuscitar os mitos do seu tio, mas os governos são incapazes de manipular a opinião pública. As Campanhas propagandísticas são levadas a efeito, para criar uma opinião favorável às várias intervenções militares do Segundo Império no exterior. Mas, o fracasso de algumas delas, acabam por ter resultados negativos ao prestígio do imperador. Todos os governos Franceses desde 1892 apóiam a propaganda anti-germânica. O antisemitismo ganha carta de alforria. O exército é utilizado como meio de propaganda em dois sentidos: como continuador da tradição nacional e como instrumento da vingança. Foram criadas organizações privadas de propaganda nacionalista ou agrupamentos patrióticos, como a Ligue des Patriotes (1882) cuja finalidade era a «organização de educação militar e patriótica através do livro, da ginástica e do tiro». A expansão colonial das potências européias, principalmente França e Inglaterra, necessitam de uma propaganda interna e externa. A interna para justificar ante a opinião pública o esforço econômico e militar. A externa dirigida para outros países e aos territórios dominados para facilitar a sua sujeição. Analisando com maior detalhe, a história da imprensa está diretamente ligada à história da evolução das sociedades feudais e rurais para sociedades burguesas e urbanas. E conseqüentemente dos diferentes sistemas políticos e governos. A partir do século XV, com o Renascimento, Reforma Protestante, as grandes descobertas além-mar e o início da efervescência comercial e de trocas bancárias, surgem novas necessidades de informação. Após a criação da tipografia e da prensa móvel por Gutenberg em 1438, em Estrasburgo, torna-se possível reproduzir em série um mesmo texto. E isso vai trazer novas formas de imprensa na França e no mundo todo. Ao longo da história da imprensa, os governantes percebem então o poderoso veículo que é a impressa e tentam usa-la a seu favor. Essa maneira de incentivar os jornais também funcionava como uma maneira de filtrar e manipular todas as informações que chegavam ao público. Por muitos anos, e isso se repete diversas vezes na história da França, os dirigentes mantém uma relação dúbia com a imprensa. Ora dão liberdade, ora impõem à censura através de decretos, selos (os jornais só poderiam circular se tivessem o selo do rei e o rei só dava o selo para quem estivesse ao seu lado) e até mesmo a proibição do uso de certas palavras. A imprensa ganha um novo fôlego com a Revolução Francesa em 1789. Pela primeira vez, com a Declaração dos Direitos do Homem de 26 de agosto de 1789, coloca-se em voga o princípio de liberdade de imprensa: Artigo XI: “A livre comunicação do pensamento e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem: todo cidadão, portanto, pode falar, escrever e imprimir livremente, respondendo pelo abuso dessa liberdade nos casos determinados pela lei” O período revolucionário além de dar um impulso na criação de diversos jornais e folhas (foram publicados mais de 1.500 novos títulos apenas entre 1789 e 1800), deu à imprensa um poder político que antes não havia. Ela enfim se torna parte do poder. Com o Golpe 18 de Brumário, o governo do Diretório foi derrubado na França sob o comando de Napoleão. E uma das primeiras decisões dele foi restabelecer o sistema de autorização prévia. Napoleão também foi um dos primeiros governantes na França a perceber o poder dos jornais e


124 usá-lo a seu favor: “sempre que houver uma notícia desagradável ao governo, ela não deverá ser publicada até que todos estejam tão certos da verdade que se tornem desnecessários dizêla, já que todos a conhecem”. A partir do fim da Segunda Guerra Mundial, a imprensa passou por grandes transformações, não apenas técnicas, mas de conteúdo e função. Agora os jornais não concorriam apenas com o rádio, mas, observava a televisão ocupar cada vez um espaço maior. A imprensa escrita perdera o monopólio da informação que exercera durante três séculos e, conseqüentemente das verbas publicitárias. De Luís XIV a revolução francesa Para uma compreensão histórica da comunicação política francesa a imagem de Luis XIV torna-se obrigatória para análise de seus comportamentos e estratégias de imagem pública. Com rei de França, Luís XIV subiu ao trono em 1643 aos quatro anos de idade e reinou por 72 anos até sua morte em 1715, coleciona episódios e posturas que revelam como essa imagem foi sendo lapidada ao longo de sua vida a ponto de se tornar um mito – constantemente comparado com os deuses e heróis da mitologia clássica, como Apolo e Hércules – e ser reverenciado como “nosso Deus visível” e “o mais poderoso monarca do universo”, entre outros atributos a ele conferidos. Desde o seu nascimento – “celebrado pela França inteira com fogueiras e fogos de artifício, repicar de sinos, salvas de canhão e comemorado com sermões, discursos e poemas” (BURKE, 1994), parece clara a preocupação com a imagem real. Todos os seus feitos, mesmo os de menor importância eram registrados em gravuras, pinturas, retratos, medalhas (mais de trezentas), estátuas, monumentos, arcos de triunfo, além de sermões, poemas, narrativas e discursos. Artistas plásticos, escultores, pintores e eruditos permaneciam a seu serviço, sempre com a finalidade de enaltecer-lhe os feitos e as conquistas. A presença do “rei-sol” e também chamado de Luís, o Grande nas guerras era acompanhada de historiadores e poetas que descreviam com detalhes cada vitória obtida. Também merece menção o fato de que a rotina do rei levantar-se, fazer refeições, deitar-se, dentre outros era ritualizada, poder acompanhar esse cotidiano real constituía-se algo por demais importante e significativo. Outros movimentos de Luís XIV, cuidadosamente planejados, também reforçaram a sua postura de homem forte, vigoroso, preocupado com o bem-estar de seu povo, justo, acessível, sensível às questões da arte. Valem como exemplos sua aparição no carrousel, considerado um dos mais grandiosos espetáculos públicos do reinado, em que o rei, como “imperador dos romanos”, saiu-se muito bem entre outros homens que, a cavalo, deviam correr em um picadeiro e realizar outras proezas; e a construção de grandes monumentos e palácios, como o de Versalhes, no qual se evidenciava a intenção de perpetuar sua imagem. Toda essa representação, Luís XIV cumpria muito bem esse papel, ao representar-se a si mesmo também experimentou momentos de crise, haja vista que havia discrepâncias entre a imagem oficial do rei e a realidade cotidiana. Além dos aspectos relacionados à sua aparência fisicamente era menor do que sugeriam as ilustrações e retratos, a peruca disfarçava a pouca quantidade de cabelo, dentre outros, eventos não-ocorridos eram celebrados, derrotas eram ocultadas e opositores denunciavam atributos diametralmente opostos àqueles divulgados, como ambição, falta de escrúpulo moral e de religião, tirania, vaidade e debilidades militares, sexuais e intelectuais. O fim do reinado de Luís XIV, que coincidiu com os últimos anos de sua vida foi marcado pelo que alguns críticos consideraram de “ocaso real”. As guerras, mesmo as vitoriosas,


125 deixaram o país endividado, a fome assolou a França no final do século, a doença abatia cada vez mais o ânimo do rei são exemplos daquele período. Entretanto, até mesmo no leito de morte, a teatralização se manteve com o adeus do rei aos seus cortesãos e os conselhos a seu bisneto, além, naturalmente, do funeral, relatado oficialmente como de grande magnificência. Já em outro momento histórico, a revolução francesa, assim como a inglesa e a americana, representou à tentativa, conseguida, de uma mudança da realidad e existente. O novo governo instituído é diferente do anterior, acabou o sistema feudal e modificou a estrutura social deixando na Europa uma semente fecunda. Contudo, isso foi possível graças a uma “gigantesca e múltipla operação propagandística” (QUINTERO, 1990). Contudo, muito além dos instrumentos, a propaganda revolucionária foi possível graças aos efeitos simbólicos que agregados permitiam a mudança de uma forma de vida antiga para outra nova. Por exemplo, o ineditismo de um exército formado por pessoas em torno de uma única nação foi utilizado como efeito propagador de uma outra forma de vida. Em linhas gerais a propaganda estava firmada em um novo modo de pensar que substituiu a tradição pelo progresso, o rei pela pátria e a fidelidade pela liberdad e e a igualdade. Essas idéias-chave permitiram construir no imaginário popular a figura de um inimigo. Esses eram os contra-revolucionários, aqueles que defendiam o antigo regime. A lei da liberdade de expressão nesse processo revolucionário foi uma bandeira defendida principalmente pelos citadinos do terceiro estado. O clero e a nobreza, por exemplo, eram a favor da liberdade de expressão, mas pensavam em uma certa limitação ou responsabilização para ela. A revolução francesa só foi possível pela ampla propaganda realizada que potencializou os efeitos das novas idéias e de uma nova forma de vida. Essa época ainda não pode ser chamada de uma propaganda científica aos moldes do século XX, mas já tem bem definidos seus objetivos, meios e temas. Ou seja, não era uma propaganda puramente intuitiva, pois já eram elaborados reflexões sobre o fenômeno e o meio. O resultado dessa ação deu efetivos resultados uma vez que a propaganda foi uma ação organizada e duradoura. O marketing político na França: conceitos A prática de estratégias de Marketing Político na França foi conceituada por representativos autores, dentre eles, é pertinente citar a obra de Domenach, cuja relevância no cenário global permitiu a fundamentação de conceitos do planejamento de comunicação política / eleitoral atual. As principais leis apresentadas propiciam um planejamento eficaz nas estratégias de campanha e comunicação, vale salientar neste artigo os principais conceitos abordados por sua obra na década de 60, onde os principais modelos de análise se reportavam a líderes de massa como Benito Mussolino e Adolph Hitler. Lei da simplificação e do inimigo único: “Em todos os domínios, a propaganda logo se empenha na busca da simplificação. Trata-se de dividir a doutrina e a argumentação em alguns pontos, os definido o mais claramente possível. O propagandista tem a disposição uma escala inteira de formulas: manifestos, profissões de fé, programas, declarações, catecismos, os quais em geral sob forma afirmativa, enunciam certos numeros de proposições em texto conciso e claro” (DOMENACH, 1963). É possível observar inúmeros exemplos no mundo moderno, do uso desta técnica, porém, separamos apenas um que se tornou conhecido em todo o mundo. I NY. Observa-se a simplificação da mensagem, a simbologia e o slogan identificando os pontos principais da comunicação que se pretende.


126 Lei da ampliação e desfiguração: A ampliação exagerada das noticias, é um processo jornalístico empregado correntemente pela imprensa em todos os partidos. No nazismo, as informações importantes jamais eram comunicadas em “bruto”, ao aparecerem, já vinham valorizadas e carregadas de um potencial de propaganda. Lei da orquestração: A primeira condição para uma boa propaganda é a infatigável repetição. Conhecemos largamente o principio da freqüência em propaganda e é isso que Domenach nos alerta com a Lei da orquestração. “Goebbels dizia: A igreja católica mantém-se porque repete a mesma coisa há dois mil anos. O estado nacional –socialista deve agir analogamente”. Lei da Transfusão: “Jamais acreditaram os verdadeiros propagandistas na possibilidade de se fazer propaganda a partir do nada e impor as massas não importa que idéia e não importa em que momento”. A propaganda, em regra geral, age sempre sobre um substrato preexistente, seja uma mitologia nacional (a Revolução Francesa, os mitos germânicos), seja simples complexo de ódios e de preconceitos tradicionais: chauvinismo, “fobias”, ou “filias” diversas. Nesta lei fica demonstrada a importância da pesquisa na comunicação política/eleitoral, obtendo estas informações para o trabalho de detecção da opinião preponderante da população. Lei da unanimidade e de contágio: “Desde que a sociologia existe, tem-se focalizado a pressão do grupo sobre a opinião individual e os múltiplos conformismos que surgem nas sociedades”. No decorrer do processo conceitual, uma outra contribuição remete-se ao livro do autor Roger-Gerard Schwartzenberg, cujo objetivo se direciona em um ensaio sobre e contra o star system em política. O autor parte do princípio, que a política vai buscar no teatro inspirações para efetivar a prática do governo ser administrado por estrelas de partido, “vedetes políticas”, que ao assumirem posições na hierarquia política obscurecem o programa e a organização, além disso, faz o espetáculo girar exclusivamente em torno de si mesma, como mera plataforma para promoção pessoal. A primeira publicação, em 1977, está dividida em três capítulos, o primeiro, intitulado Personagens, traz a idéia de personalização do poder. Nessa etapa atribuí-se ao homem público papéis estereotipados do repertório político, procura-se projetar uma imagem heterogênea seja de Herói (Common Man), de Líder Charmoso ou do Pai da Pátria, na batalha constante de criar um rótulo, que seja a representação real ou suposta do seu perfil frente à opinião pública. Não se deve dissociar muito do real a sua imagem, porém infelizmente “pouco importa a realidade em si mesma o importante é que acreditem nesses mitos e símbolos e aceitem-nos.” Escolhido o papel, monta-se o Espetáculo, título do segundo capítulo, através de inspirações nas peças teatrais ou cinematográficas, com o objetivo de melhor confundir a arte política e o artifício. Sendo assim, os profissionais do espetáculo e da política compartilham atitudes e hábitos, o show business se desdobra num pol´business. O ator político se transforma num plastic politicians manipulado pelo coordenador de mídia, afirmando com isso uma nova forma de direção de atores afim de “projetar” uma imagem atraente. Em consequência, da inserção desses atributos, a política se transforma em teatro de ilusão, aliado a um ídolo, consegue distrair o coletivo dos problemas reais através da contemplação fascinante de um “monstro sagrado a exibir emoções, por vezes sinceras, frequentemente fictícias, e sempre egocêntricas”. “Assim, pode-se dizer que todo o ato de linguagem está ligado à ação mediante as relações de força que os sujeitos mantêm entre si, relações de força que constroem simultaneamente o vínculo social” (CHARAUDEAU, 2006). Com relação à linguagem adotada pelos políticos, é apresentado que o ideal é trabalhar com argumentos de razão e paixão, sendo que toda a escolha é minuciosamente articulada. “Segue -se uma grande prudência na escolha das palavras, uma estratégia de emprego de fórmulas inanes, suscetíveis de agradar a maioria, ou uma estratégia de banalização do


127 vocabulário, certamente, do emprego do vocabulário da parte adversa. Isso se verificou várias vezes nos grandes momentos de enfrentamento face a face no campo político (como durante as disputas presidenciais na França entre François Mitterrand e Valéry Giscard d’Estaing, em 1981; entre Mitterrand e Jacques Chirac, em 1988; entre Chirac e Lionel Jospin, em 1995” (CHARAUDEAU, 2006) Porém, para que todas essas estratégicas sejam adotadas, o político (personagem) deve transparecer legitimidade à nação, levando sempre em conta a diferença entre ser legítimo e crível, permitindo a transmissão da idéia e imagem de credibilidade interagindo com a camada populacional envolvida. Assim, para que o ‘personagem’ tenha um bom resultado nas urnas, ele deve despertar no imaginário coletivo uma correlação entre sua fala e seu comportamento, sua postura moral e ética, seu comprometimento humanístico, sempre evidenciando a certeza de que, ao chegar ao poder, seus ‘aliados sociais’ serão respaldados por um homem (ou mulher) que os represente e que faça por eles o que foi prometido e idealizado pelos eleitores. Segundo Charaudeau (2006), “o político é assim conduzido implacavelmente a fazer o triplo papel de ator, de personagem e de pessoa: como ator, mostra sua imagem, na verdade, seu carisma; como personagem, desempenha plenamente seu papel de político no exercício de suas funções; como pessoa – discretamente destilada -, mostra que não é menos humano, que tem sentimentos como os demais” . Mas antes de chegar ao poder, o candidato tem que passar por um processo eleitoral e confrontar suas idéias com adversários que certamente irão querer massacrá-lo para denegrir sua imagem. É nesse momento que o político deve tomar cuidado com suas posturas e seu discurso. Marketing contemporâneo na França Na contemporaneidade, várias contribuições se dispuseram relevantes, porém foram selecionadas algumas obras e análise de fatos contemporâneos que comple mentam o caráter de exposição cronológica objetivada pelo artigo. O livro “A vertigem das Urnas” apresenta a prática da comunicação política, feita por um dos mais renomados publicitários da França, Jacques Séguéla. Responsável por diversas campanhas pelo mundo, do Oriente Médio à América do Sul, acredita que a publicidade tem o dever de trabalhar em grandes lutas humanitárias e políticas. Séguéla ressalta algumas barreiras na relação entre publicidade e política, como o pouco tempo para que as campanhas sejam organizadas e a vergonha dos políticos em admitir a necessidade das ferramentas publicitárias nas disputas eleitorais. O autor fortalece a opinião de que os políticos não entendem que eleição é um ato de consumo como outros, com a diferença de não existir devolução, o eleitor tem que esperar até a próxima disputa para fazer outra escolha. Neste cenário a publicidade deve ser vista apenas como um amplificador do que o candidato realmente é. Não lhe compete criar uma imagem falsa, pois esta não se sustentará. A eleição é ganha pelo candidato, podendo uma boa comunicação ajudar na vitória. Porém, quando a campanha é mal feita pode derrubar uma boa candidatura. O livro apresenta dez regras que norteiam as campanhas realizadas pelo autor e segundo ele, semp re que deixou de seguir alguma, foi derrotado. São elas: vota-se num nome, não num partido; vota-se numa idéia, não numa ideologia; vota-se no futuro, não no passado; vota-se pelo espetáculo, não pela banalidade; vota-se para si mesmo, não para o candidato; vota-se no verdadeiro, não no fingido; vota-se por um destino, não por uma banalidade; vota-se num valor, não numa função; vota-se na ação, não na passividade; vota-se num vencedor, não num perdedor.


128 Uma contribuição na compreensão do cenário atual francês é o artigo da Linda Bulik, onde aborda a construção da imagem dos presidenciáveis: Elouard Balladur e Jacques Chirac, pela imprensa francesa durante a campanha eleitoral de 1995 na França. O artigo apresenta à luz da semiótica discursiva, a retórica que norteia as estratégias do “fazer saber” e do “fazer crer”, operadas pela mídia impressa, mostrando como os procedimentos discursivos da narrativa jornalística, adotado nos textos, fundem-se com os dos registros e relatos da história. (BULIK, 2006). Este trabalho focaliza as conexões entre o jornalismo e a história por meio das mudanças, discurso jornalístico/narrativa histórica. São analisadas as matérias de dois jornais franceses, o Le Nouvel Observateur e o L´evenement Du Jeudi. A disputa eleitoral entre os dois candidatos foi comparada a dois grandes vultos da história francesa. Os jornais informavam aos franceses e chamavam a atenção dos mesmos para acompanhar o desenrolar de um estilo diferente de levar a notícia, fazendo um vínculo entre a história e atualidade que está sendo contada. Um importante meio de comunicação e interação política são os veículos de mídia impressa, nesse caso, em um jornal, a informação é dada de três maneiras: na organização do material do jornal, na transferência da enunciação em favor dos agentes da atualidade e na organização narrativa do propósito, que se fundamenta no enunciado narrativo e sobre artigos realistas, que trata menos de ter a ilusão do reproduzir a realidade do que uma produção simbólica do real. Tétu (1997) diz que o jornal “faz acreditar”. Não necessariamente acreditar nos fatos, mas no novo “real” produzido por esse ele. Véron (1981) afirma: o jornal constrói o acontecimento. Até 1881 o poder da imprensa política ocorria sobre os debates provocados pelo jornal enquanto na atualidade este debate aparece pela voz “dos outros” repercutidas nas matérias. A organização e distribuição dos enunciados sobre a página, provocam a hierarquização da leitura. A distribuição dos assuntos no jornal é uma forma de persuasão. Nesta ótica é feita análise do Le Monde e Libération. No Le Monde as informações são classificadas por uma normalização que não obedece a uma hierarquização natural dos acontecimentos. Os assuntos são dispostos pelas categorias do conteúdo das informações. Isso constitui um dos modos de “produzir o real”. Jean Baudrillard (1970), explica que o Le Monde publica as notícias em uma multiplicidade de “esferas transcedentes, autônomas e abstratas”. “Os temas são organizados por um consenso normalizador”. A leitura do Le Monde faz aparecer uma dupla organização: a sucessão linear horizontal dos títulos e seções, combinados com a organização vertical do espaço do texto. As subseções seguem hierarquia pela classificação dos assuntos. Por esta razão parece não dar maior destaque a um ou outro assunto. Com isso a mídia francesa, escrita, rádio e TV, utilizam o Le Monde como uma referência, um modelo de informações. Somente os assuntos políticos aparecem dominados pelo acontecimento, ou parecem dizer o acontecimento. De maneira geral, o Le Monde consiste em integrar um acontecimento expressa pelo título em uma problemática existente. Não tenta produzir ou manifestar uma significação, mas sim uma referência: liga a informação à referência. O Libération, conforme descrito por Mouillaud (1997), é uma tendência na forma de apresentar notícias. Sua diagramação parece um quadro do renascimento, onde o espaço comum para os acontecimentos é homogêneo em todos os seus pontos, seja qual for à origem geográfica e a natureza temática das informações. O Libération dispõe as notícias numa suposta certa ordem do mundo, como sendo “um conjunto de formas reunidas”. A disposição da informação faz a representação do real nesta forma. Enquanto no Le Monde a arquitetura é uma alegoria da instituição social, no Libération


129 parece que as figuras do mundo saltam diretamente aos olhos do leitor numa ordem que parece se tornar instituidor. A diagramação do Libération não impõe uma ordem estável. O formato tablóide facilita a visibilidade e leitura. Neste formato as informações parecem produzir dia após dia um pequeno número de lembretes, orienta a opinião todos os dias sobre um pólo como um ímã que poria ordem em uma massa. Quanto à estrutura atual no regime frances é da consideração do voto universal, pessoal, livre e secreto, com idade mínima de 18 anos para o exercício do voto. Para a participação do processo eleitoral como candidato as respectivas idades mínimas se enquadram como sendo para municipais acima de 18 anos, presidenciavel e legislativa acima de 23 anos e senatoriais acima de 35 anos. No aspecto eleitoral é instituído o segundo turno em caso de necessidade, sendo o mandato de cinco anos para os cargos, exceto para o senado, onde o período do pleito são nove anos. Nas eleições proporcionais a distribuição de cadeiras é realizada obedecendo o critério do quociente eleitoral, ou seja, o total de votos válidos divididos pelo número de cadeiras. Nas eleições de 2007 cinco candidatos concorreram ao pleito, sendo eles Nicolas Sarcosy, ex-ministro do Interior do governo de Jacques Chirac (UMP), Sègoléne Royal do partido socialista, onde participa desde 1978, Bayrou, líder do partido da União pela Democracia Francesa (UDF), Jean Marie Le Pen, do partido da Frente Nacional (FN) e Olivier Besancenot, líder da liga comunista revolucionária. No segundo turno, os candidatos foram Sarcosy e Royal, finalizando o processo eleitoral com vitória de Sarcosy com 53,06 % dos votos válidos. A bandeira principal de ambos os candidatos foi o desemprego e o fomento de políticas públicas para o tratamento de imigrantes no país. Como marco na história política francesa, 44,5 milhões de eleitores compareceram para o processo eleitoral. Logo após a vitória de Sarcosy, várias manifestações oposicionistas ocorreram pelo país, com focos mais acentuados na região em que 2005, ocorreram intensos combates entre imigrantes e policiais hierarquicamente reportados ao até então ministro do interior Nicolas Sarcosy. Com relação à Internet, uma pesquisa no sítio Google francês sobre o tema: “Marketing contemporâneo da política francesa” resultou, em 28 de outubro de 2007, em 927.000 páginas. Para análise e evidenciação foram utilizados apenas os 10 primeiros itens na ocorrência de pesquisa. É importante informar, que o serviço do sítio Google classifica os ítens pelos mais acessados, desta forma, foi possível realizar uma pesquisa com caráter qualitativa, pois a incidência de acessos se relaciona com a aceitação dos respectivos conteúdos. Com estas informações, evidenciou-se que as fontes de conhecimento sobre este assunto utilizada pelos franceses são: os livros em primeiro lugar, seguidos de cursos. Em segundo momento foi efetuada uma nova busca, agora com o tema “marketing político francês”. Nos primeiros itens, de um total de 1.960.000, o primeiro refere -se a um site sobre livros de marketing político, que quando acessado, nos remete a uma página contendo 772 livros sobre marketing politique française. Baseado nesses dados é possível apontar que neste assunto (para os franceses que utilizam à rede digital) os livros são sua principal fonte de conhecimento. O segundo item pertence a uma empresa de negócios e tecnologia comercializados pela net “zdnet” e refere-se a um artigo sobre Marketing Político. O número de acessos deve ser significativo para que possa estar em terceiro lugar na página sobre marketing político. Foi também desenvolvida uma visita a sites franceses de charges e foram selecionadas com as relacionadas com o tema da última eleição francesa. As charges encontradas neles são impactantes, contendo uma dose de critica a inteligência dos dois principais candidatos: Nicolas


130 Sarkosy e Ségolène Royal. Também faz menção a opção sexual de cada candidato e satirizam suas propostas de plano de governo. Considerações finais A análise desenvolvida sobre a temática de comunicação política propiciou uma compreensão dos comportamentos políticos e culturais da França, pois suas características atuais, como seu sistema político possui históricos que justificam esse processo evolutivo de defesa dos direitos civis e de liberdade de expressão. A história da imprensa francesa apresentou pontos de luta pelos direitos de liberdade de expressão vivenciados em diversos momentos da história do século XIX e XX. A tipografia de Gutenberg alavanca o cenário impresso no país, propiciando de maneira gradativa uma ampliação cultural nas diversas regiões francesas. Na análise da figura de Luís XIV, ao buscar construir uma imagem pública, bebeu de fontes importantes, como a de seu próprio pai, Luís XIII, e de seu tio e sogro, Filipe IV. Ambos, de modos peculiares, dedicavam especial atenção à construção de uma imagem favorável de seu governo. A obra de Domenach, desenvolvida na década de 60 contribui de maneira intensa na estruturação das diretrizes de comunicação política no mundo. Suas Leis e implantação no cenário político propicia um ferramental funcional no planejamento de comunicação política. Schwartzenberg expõe de maneira coerente o formato de compreensão dos atores políticos quanto à credibilidade e exposição perante a população. Relembra que não existe espetáculo sem espectadores, a personalização do poder não está apenas em quem o exerce, mas também naqueles quem a ele se submetem ou a alimentam, tornando-se cúmplice dela. No Marketing político contemporâneo, uma contribuição significativa foi a conversão em livro dos relatos de experiência de Jacques Séguelá em sua atuação no cenário político francês contemporâneo. Os profissionais de marketing político devem estar atentos às características dos eleitores, conhecerem seus valores e acompanhar as mudanças. A diversificação das ferramentas de comunicação propõe uma nova forma de comunicação entre políticos e eleitores e orientar para essas mudanças é função dos profissionais de comunicação. Bulik foca as conexões entre o jornalismo e a história por meio das mudanças, discurso jornalístico/narrativa histórica, com a análise de matérias de dois jornais franceses, o Le Nouvel Observateur e o L´evenement Du Jeudi. A análise dos tablóides franceses Le Monde e Libération contribuiram para o fortalecimento da aplicabilidade da comunicação impressa e digital. Os autores Jean-François Tétu e Maurice Mouillaud, consideram que nossa sociedade é feita de adaptações múltiplas, mimética, uma sociedade de empatias. Compara o Le Monde como um grande jornal clássico onde as informações são publicadas por uma normalização definida pelo editor, enquanto o Libération tem uma diagramação ousada, que parece um quadro renascentista onde o leitor encontra sob um sentido a informação e o prazer, compartilha entre o sério e o não-sério, que se apresentam em outro sentido. No sistema atual, a estrutura eleitoral francesa possui muitas próximas a do Brasil, principalmente no que tange a distribuição de cadeiras na esfera legislativa e as formas de interação de poderes, centrado no executivo. Nas eleições de 2007, cinco candidatos concorreram à presidência e Nicolas Sarcosy saiu vitorioso em disputa em segundo turno com Sègoléne Royal. No ambiente digital, pesquisas realizadas em sítios de busca do país, principalmente na ferramenta Google permitiram a análise que o público usuário da rede na França se interessa


131 pelo assunto política e marketing político, pois a ocorrência apresentada nas buscar foi significativa.

Referências bibliográficas ALBERT, P. & TERROU, F. História da Imprensa. São Paulo: Martins Fontes, 1970. BAUDRILLARD. Jean. La société de consommation. In MOUILLAUD, M. O Jornal, da forma ao sentido. Brasília: Paralelo, 1997 BULIK, L. Quando o Jornalismo se faz História. Comunicação Veredas Revista do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UNIMAR – Universidade de Marília - Marilia/SP, Brasil, ano 5, nº 05, 1996. BURKE, P. A Fabricação do Rei: A construção da imagem pública de Luis XIV. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1992. CHARAUDEAU, P. Discurso Político. São Paulo: Contexto, 2006. DOMENACH, Jean Marie. A Propaganda Política. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1964. QUINTERO, A. P. História da Propaganda. Lisboa-CODEX Portugal: Planeta editora, LDA, 1997. MOUILLAUD, M. & PORTO, S. O jornal da forma ao sentido. Brasília: Par. 15, 1997. SCHWARTZENBERG, R.G. O estado espetáculo. Propaganda, o poder da imagem (Propaganda: L’image et son pouvour). Rio de Janeiro: Difel, 1977. SEGUELA, J. A Vertigem das urnas. São Paulo: Tag Line, 2007. TÉTU, J.F. Referências e Significação: Le Monde. In MOUILLAUD, M. O Jornal, da forma ao sentido, Cap. 9, p 191. Brasília, Paralelo, 1997. VÉRON, E. Construire l’événement. Paris: Minuit, 1981.


132

Marketing político Brasil X Itália: conceitos e perspectivas42 Bruna Vieira GUIMARÃES43

1. Introdução O artigo traz o panorama da propaganda política e do marketing político no Brasil e na Itália nas últimas quatro décadas. A autora recorre as definições do francês Jean-Marie Domenach (1963) e do russo Serge Tchakotine (1967) sobre propaganda política, de modo a introduzir o conceito de marketing político, utilizado nas atuais campanhas eleitorais. Resgata a ‘construção’ do conceito de marketing político no Brasil e sua aplicação, principalmente de 1989 a 2008. A primeira e a segunda partes do artigo são uma introdução ao capítulo posterior que faz uma leitura detalhada de duas recentes publicações italianas 44 sobre marketing político. Referente à tradução das citações dos livros em italiano, a autora preferiu fazê-las diretamente na língua portuguesa, devido ao limitado número de páginas deste artigo, e teve como apoio o Dicionário Escolar Italiano-Português (POLITO, 2007). A metodologia utilizada foi à Pesquisa Histórica a partir da investigação bibliográfica. Pesquisa Histórica na definição de José Honório Rodrigues (1982, p.21) é “a descoberta cuidadosa, exaustiva e diligente de novos fatos históricos, a busca da documentação que prove a existência dos mesmos, permita sua incorporação ao escrito histórico ou a revisão e interpretação nova da História”. O fato histórico ‘novo’ proposto pela autora neste artigo é o cruzamento dos conceitos de marketing político brasileiro e italiano, numa tentativa de estimular a troca de experiências entre os profissionais nos dois países. Roberto Richardson (1989, p.199) complementa a definição do autor acima. “A pesquisa histórica ocupa-se do passado do homem, e a tarefa do historiador [...] consiste em localizar, avaliar e sintetizar sistemática e objetivamente as provas, para estabelecer os fatos e obter conclusões referentes aos acontecimentos passados”. Explicando as técnicas de pesquisa bibliográfica e documental, Antonio Carlos Gil (1989, p.48) afirma que “boa parte dos estudos exploratórios pode ser definida como pesquisa bibliográfica”, justamente porque a pesquisa bibliográfica coloca o pesquisador em contato direto com tudo que foi escrito sobre o objeto pesquisado.

Trabalho publicado no REDE ALCAR 2008 - VI Congresso Nacional de História da Mídia, Niterói/RJ, 13 a 16 de maio 2008 e apresentado no POLITICOM 2008 - VII Seminário Brasileiro de Marketing Político, 16 e 17 out. 2008, na Faculdade Prudente de Moraes, em Itú/SP, na mesa-redonda: A evolução do conceito de marketing político na Itália. O artigo contém parte da dissertação de mestrado defendida pela autora em abril de 2007: ‘Deodoro da Fonseca – A propaganda política do primeiro presidente do Brasil’. 43 Jornalista com experiência em jornais, revistas e assessoria de imprensa no Litoral Norte Paulista. Mestra em Comunicação Social pela UMESP (Universidade Metodista de São Paulo). Cursa especialização em Jornalismo Literário na ABJL (Academia Brasileira de Educação e Jornalismo Literário). Em 2008, ministrou a disciplina de Jornalismo Investigativo na Universidade Paulista – UNIP, em São Paulo. E- mail: brunajornalista@hotmail.com. 44IACONETTI, Fabrizio. Il marketing della politica - funzione, strategia e comunicazione dei partiti. Italia: Milano. Edizione Angelo Guerini e Associati, 2006, 171 p. e; COLARIETI, Stefano; GUARINO, Paolo. Introduziuone al Marketing Politico. Italia: Roma. Luiss University Press, 2005. 228 p. As publicações foram selecionadas pela autora de forma alienatória, de acordo com a disponibilidade nas livrarias de Florença/Itália, em fevereiro de 2008. A autora complementa o panorama político italiano com outras duas obras: FALABRINO, Gian Luigi. Storia della Pubblicità in Italia dal 1945 a Oggi. Italia: Roma. Carocci Editore, 2007, 144 p., e; CATTANEO, Alberto; ZANETTO, Paolo. (E)lezione di successo – Manuale di marketing politico. Italia: Parma, Edizione Etas, 2003, 307 p. 42


133 Seguem algumas definições de propaganda política no Brasil e na Itália, além de um breve resgate do cenário político brasileiro republicano. 2. Definições de Propaganda e Marketing Político Se Jesus apenas com a palavra falada, tendo apenas o apóstolo Paulo, como Assessor de Imprensa, e mais onze apóstolos para assessorá-lo nas outras áreas, conseguiu repercussão universal, imagine hoje, o que não conseguiria se tivesse a sua disposição jornal, rádio e TV (Roberto Dalpiac Rech apud DIAS, 2004). Propaganda Política segundo definição do francês Jean-Marie Domenach (1963, p.9) é “uma nova técnica, que usa meios subministrados pela ciência, a fim de convencer e dirigir as massas constituídas”. Ele explica que propaganda política é também “uma técnica de conjunto, coerente e que pode ser, até certo ponto, sistematizada, sendo sucedida ao conjunto dos meios empregados em todos os tempos pelos políticos para o triunfo de suas causas [...]”. Na introdução do livro A propaganda política, Domenach (1963) afirma que “um dos fenômenos dominantes da primeira metade do século XX é a propaganda política. Sem ela, os grandes acontecimentos da nossa época: a revolução comunista e o fascismo, não seriam sequer concebíveis”. Posteriormente, o psicólogo russo Serge Tchakotine (1967) publica Mistificação das massas pela propaganda política, enfocando as ações de Mussolini (fascismo) e de Hitler (nazismo). Para ele, o sucesso de um movimento político consiste em conscientizar grande número de cidadãos: É evidente que um movimento político só tem a possibilidade de sucesso se suas idéias são adotadas por um número considerável de pessoas que delas se apoderem por um processo de assimilação e, além disso, quando são compreendidas e sustentadas, de maneira unânime, pela grande maioria dos adeptos desse movimento (TCHACKOTINE, 1967, p.258). Para o italiano Fabrizio Iaconetti (2006, p.24), uma das primeiras concepções de propaganda política pode ser considerada a de Nicolau Maquiavel, no século XVI, quando trata do homem de governo, afirmando que o que mais proporcionava apreço à um príncipe era o fato dele passar a impressão de ser excepcional: “Um príncipe deve sobretudo esforçar-se com a imagem de homem grande e de gênio excelente [...]. Deve também nos momentos mais oportunos do ano, distrair o povo com festas e espetáculos”. As festas e espetáculos para ‘distrair’ o povo continuam existindo, principalmente nos períodos de campanha eleitorais, na realização de comícios e festas partidárias. Gianni Laterza concorda com Iaconetti e afirma que o marketing político entendido como comunicação, não nasce hoje. “Nasce com o homem. Platão, Aristóteles, Sócrates foram grandes comunicadores. Se utilizaram e tornaram mais sofisticados os meios, mas o ponto crucial era o relacionamento entre cidadão e a coisa pública” (LATERZA apud IACONETTI, 2006, p.134). Ney Lima Figueiredo (2002, p.15) diz que o marketing político sempre foi usado pelas grandes figuras da história. “Hitler, Stálin, Napoleão empregaram seu marketing político pessoal na propagação das suas idéias e propósitos”.


134 Segundo Rubens Figueiredo (1994, p.10), propaganda política é um conjunto de técnicas e procedimentos que tem como objetivos “adequar um candidato ao seu eleitorado potencial, procurando fazê-lo [...] conhecido do maior número de eleitores possível e, em seguida, mostrando-o diferente de seus adversários, obviamente melhor do que eles”. Nas últimas décadas, a palavra marketing político, mais abrangente que propaganda política, começou a ser utilizada massivamente. Carlos Augusto Manhanelli (1992, p.20) explica uma das diferenças. “Na fase de propaganda, os candidatos desenvolviam esforços para ‘vender’ e ‘difundir’ as ações sociais que produziam, tentando persuadir a sociedade à ‘comprálas’ como sendo o melhor que poderia ser feito”. Na fase de marketing, “primeiro o candidato procura obter informações sobre aquilo que a sociedade quer, para aí então produzir propostas sociais adequadas a estes desejos”. Manhanelli (1992, p.19) afirma que “na fase mais antiga, os candidatos utilizavam-se de princípios básicos de divulgação para implantar sua campanha, fazendo o que seus conselheiros ou assessores, e eles próprios, achassem que seria melhor para os cidadãos”. Para Gianni Laterza45, que preside uma editora italiana, o marketing político é um projeto de estratégias e instrumentos utilizados por partidos políticos para ajudar os cidadãos a julgar e escolher a melhor proposta política. Segundo Philip Kotler46, guru do marketing europeu, a disciplina é definida como: “A gestão eficaz, da parte de uma organização, de relacionamentos de troca com os seus vários mercados e públicos, entre as atividades de análise, planificação, realização e controle” (KOTLER apud COLARIETI, 2005, p.101). Ele continua: “Relacionamentos de troca: é o que mais interessa na nossa escolha de privilegiar uma ótica comunicativa, na qual a política é o relacionamento contratual em uma situação de concorrência discursiva”. Para Michel Bongrand 47, um dos primeiros political consultants franceses e cofundador da Associação Internacional de Consultores Políticos, o conceito comunicacional da política, “deveria por princípio não somente fazer avançar a história, não somente oferecer uma escolha entre os diversos processos, mas colocar em relação permanente o poder e o indivíduo” (BONGRAND, apud COLARIETI, 2005, p.101). A definição de Bongrand foi dada em 1986, mas segundo Stefano Colarieti e Paolo Guarino48 (2005, 102), autores de um dos livros analisados neste artigo, “passados dezenove anos, ainda parece que na Itália se está desenvolvendo a maturidade do marketing político”. Para Rubens Figueiredo (1994, p.11), “o marketing político é algo mais permanente, é quando o político no poder se preocupa em sintonizar sua administração com os anseios dos cidadãos. Trata-se de um trabalho de longo prazo”, expõe. “Já o marketing eleito ral aparece na hora do ‘vamos ver’, quando todos os candidatos saem à procura de um mandato”. O marketing político, segundo Rubens Figueiredo (1994, p.24), se profissionalizou quando um candidato contratou uma agência de publicidade para fazer sua propaganda na televisão. Isso ocorreu em 1952, com o candidato general Eisenhower, nos EUA, país pioneiro na aplicação das técnicas de marketing político. Ele foi acusado pelos adversários de ‘tentar se Presidente da ARCA Sociedade Editora que edita o jornal diário L’Unità, atualmente propriedade do grupo DS na região da Lombardia. 46 P. Kotler é autor do livro: Al servizio Del pubblico, EtasLibri, Milano, 1978. 47 M. Bongrand é autor do livro: Marketing político. M&B Publishing, Milano, 1995. 48 Stefano Colarieti, laureado em Ciências Políticas, é membro do Conselho Administrativo e responsável pela formação na Sociedade Running, uma das primeiras sociedades italianas de formação e comunicação política. É docente de Direito Local e de Comunicação Política para Luiss Management, docente contratado no ano acadêmico de 2004-2005 da Faculdade de Ciências Políticas de Perugia (Itália), desenvolve atividades de consultor na Sociedade Reti S.p.A.. Paolo Guarino é laureado em Comunicação, desde 2000 trabalha com marketing político e é presidente da Running. Docente de Semiótica na Faculdade de Comunicação La Sapienza (Roma), ta mbém ensina Comunicação Política em cursos de pós-graduação e coordena o jornal mensal científico New Politics. Informações obtidas na ‘orelha’ do livro (2005) analisado neste artigo científico. 45


135 vender como se vende um sabonete’. Portanto, a profissionalização das campanhas políticas registrou resistências no início. Em 1960, aconteceu o primeiro debate televisivo entre os candidatos americanos John Kennedy e Richard Nixon. Os estudiosos italianos Alberto Cattaneo e Paolo Zanetto 49 (2003, p.3), retrocedem um pouco mais na história política americana, quando afirmam que o primeiro político-star a usar de modo competente a pontecialidade do marketing político foi Franklin Delano Roosevelt em 1936, quando “utilizou os instrumentos de análise do eleitorado, de posicionamento da própria proposta política e planificação racional da mídia como se fosse o chefe de uma tradicional empresa comercial”. Nesta campanha foi realizada a primeira pesquisa eleitoral científica, aplicada pelo Instituto Gallup. Para Alberto Cattaneo e Paolo Zanetto (2003, p.2), “hoje mais do que nunca o político deve utilizar os instrumentos do marketing político estratégico para atingir o status de estrela, para adquirir a visibilidade necessária, para atingir o sucesso e realizar seus próprios projetos”. Marketing significa antes de tudo examinar um produto em relação a um mercado e determinar como valorizar sua potencialidade. “Em muitas eleições, todavia, um aparato de marketing estratégico pode fazer a diferença entre a vitória e a derrota. Nos processos de transformação e construção da própria imagem, pouca diferença pode fazer grandes diferenças” (REIN et al apud CATTANEO; ZANETTO, 2003, p.2)50. Cattaneo e Zanetto (2003, p.3) assumem que não tem sido fácil, na Itália e no resto do mundo, falar com seriedade da utilidade do marketing para a política, nem tem sido simples traduzir algumas das ações de estratégias comerciais na linguagem das organizações políticas. No entanto, para eles, o primeiro político na Europa a desfrutar totalmente da potencialidade do marketing político foi Margaret Thatcher, eleita líder do Partido Conservador inglês em 1975. Em 1978, um ano antes das eleições políticas, os conservadores decidiram contratar uma agência de publicidade para realizar não só uma campanha de comunicação, mas um verdadeiro estúdio de marketing. [...] A campanha realizada pela Saatchi & Saatchi é ainda hoje um dos melhores exemplos de marketing político. [...] A pequena agência de publicidade que deu início a era moderna do marketing político na Europa é hoje uma das maiores sociedades multinacionais da comunicação (CATTANEO; ZANETTO, 2003, p.4). Até a França, país não afinado ao espírito americano, foi seduzida pelos novos instrumentos do marketing político. O primeiro a entender isso como no vidade foi François Mitterand, líder socialista e candidato a presidência da República em 1981. O marqueteiro de Mitterand foi o publicitário Jacques Seguéla citado mais adiante no artigo (CATTANEO; ZANETTO, 2003, p.4-5). Enquanto na Europa o marketing político fazia progresso, na América estava no auge. Já no Brasil, segundo Figueiredo (1994, p.26-27), o marketing político era um fenômeno recente. O motivo do atraso foram as “descontinuidades do regime democrático”. Somente nas eleições presidenciais de 1982, o marketing político passou a ser utilizado com mais rigor.

Alberto Cattaneo, consultor empresarial, se ocupa de marketing e estratégia. Participou de campanhas eleitorais de importantes políticos italianos. Paolo Zanetto, consultor político e de relação institucional, colabora com Il Foglio e Ideazione. Encarregado político a nível nacional e europeu. Informações contidas na orelha do livro. 50 I.J.REIN; P. KOTLER; M. R. STOLLER. High Visibility. Ntc Pub. Group: Lincolnwood, 1997. 49


136 Para Gaudêncio Torquato (1985, p.14), “os tempos de mudança e as crescentes exigências sociais não mais aceitam improvisações. O marketing político, portanto, está fadado a instalar-se definitivamente no país”. Figueiredo (1994, p.27) defende que os presidentes Getúlio Vargas e Jânio Quadros, tiveram sua ‘marca’ política, mas “a atuação de ambos, pouco tinha a ver com o marketing político moderno. Tratava-se da era da quase pré-comunicação de massa”. A autora adotou também a obra Na arena do marketing político (QUEIROZ, 2006), para obter informações sobre as campanhas presidenciais no Brasil republicano. Ney Lima Figueiredo (2002, p.15) confirma que nas últimas décadas, no Brasil, “foi o candidato eleito Fernando Collor que usou de maneira consistente, talentosa e competente todas as estratégias do marketing político que os demais candidatos tiveram dificuldade de enfrentá-lo na campanha presidencial de 1989”. Ronald Amaral Kuntz (1982, p.15-16) ressalta uma peculiaridade do povo brasileiro, de votar no candidato e não em seu partido (situação que ocorre também na Itália), porém, segundo ele “é imprescindível que o assessor procure ressalvar qualidades ou circunstâncias que favoreçam o político sem indispô-lo com o seu partido”. Nessa linha contemporânea, o autor brasileiro Renato Costa Dias (2004) confirma que as campanhas -por meio do marketing político- saíram do cenário das disputas tradicionais para transformar-se em verdadeiros teatros de guerra moderna, no qual vence não o melhor candidato, mas o estrategicamente melhor posicionado, pois o marketing bem sucedido tem como base, estratégias centradas na competição. Na opinião do também brasileiro Fernando Lima: O marketing político, desenvolvido com ética e responsabilidade, não é responsável por más políticas, nem sequer por maus candidatos. Sendo uma condição necessária, pois apóia no delineamento da melhor estratégia e evidencia os pontos fortes do candidato, por si só não vence eleições. Podemos ter uma excelente prática de marketing político, mas se o candidato é medíocre não há marketing que o salve (LIMA, 2006, p.330). Retomando ao marketing político na Itália: [...] teve origem nos anos trinta. Difundiu-se na Itália três décadas mais tarde graças ao trabalho tenaz de estudiosos orientados à nova impostação comercial [...]. O marketing supera a simples gestão comercial para entrar em estreita co-relação com a estratégia, a planificação e o controle, a organização e a tecnologia em uma nova forma de integração de diversas funções comerciais (IACONETTI, 2006, p.17). Cattaneo e Zanetto (2003, p.7) concordam que o marketing político demorou para se impor na Itália. “O nosso país é sempre visto como ‘lanterna’ na Europa, por causa de uma perdurante concepção do marketing visto como uma disciplina ligada exclusivamente a empresas e comércios [...]”. Os autores confirmam o seguinte silogismo da opinião pública italiana: “o marketing ajuda a vender o supérfluo; o marketing político vende portanto um projeto político supérfluo”. Segundo Cattaneo e Zanetto (2003, p.7), há uma outra razão que impediu por longos anos o desenvolvimento dos instrumentos do marketing político na Itália: o voto não mudava os vencedores. Por cinquenta anos a Itália viveu uma situação de democracia bloqueada, “na qual os partidos do governo venciam a eleição e comprovavam justamente a mudança ‘zerovírgula’ nos resultados eleitorais. [...] Se trata de um mercado bloqueado onde os eleitores não tinham


137 escolha e onde os políticos não podiam inovar as suas ofertas”. Portanto, “quando um mercado não é liberal, o marketing não só é ineficaz, mas tende também a ser danoso (CATTANEO; ZANETTO, 2003, p.7-8). Mais adiante, a autora explicará o funcionamento do atual sistema eleitoral italiano. No entanto, foi “Silvio Berlusconi, líder indescutível de centro-direita, que historicamente interpretou um novo modo de comunicar a política na Itália, em meados da década de 1990” (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.93). Cattaneo e Zanetto (2003, p.10) confirmam que o caso Berlusconi e a respectiva ideologia de seu partido, não foram os únicos fatores responsáveis pela abertura do mercado eleitoral. “Há um terceiro fator: em 1994 iniciou a era do sistema majoritário. Seguido do Referendo de 1993, de fato, na Itália se modificou o sistema eleitoral proporcional”. Para o jornalista e publicitário italiano Gian Luigi Falabrino51 (2007, p.93), autor do livro Storia della publicità in Italia dal 1945 a oggi (História da publicidade na Itália de 1945 a hoje), “por muitos anos depois do retorno da democracia, a propaganda política não se apropriou das novas técnicas publicitárias [...]. A propaganda era feita nos comícios, com os panfletinhos deixados nos carros e com o santinho”. A propaganda política italiana antes dos anos 90 era baseada na velha técnica da propaganda ideológica, conceituada por Nelson Jahr Garcia (1986) e, segundo Falabrino (2007, p.94), conduzida nos modos tradicionais: “a publicidade nos jornais era considerada cara, e a RAI não abria certamente aos partidos, salvo nos raros encontros [do programa televisivo] Tribuna politica, moderada por Jader Jacobelli”. Falabrino (2007, p.94-95) descreve que quando os partidos políticos começam a renovar as suas comunicações, iniciam pelo material gráfico, e o primeiro foi o Partido Republicano. Antes disso, já em 1966, o Partido Socialista tinha feito algumas tentativas publicitárias “com a gráfica neoliberty de Alfredo De Santis, que se inspirava na swinging London e no estilo psicodélico dos americanos”. O autor continua: “próprio em 1976, Pirella e Göttsche tinham tentado trabalhar para os socialistas, mais que pelos radicais e pela Democracia proletária, mas tinham encontrado muitas desilusões, sobretudo com os primeiros, porque os responsáveis da propaganda corrigiam e readequavam as propostas”. Até os republicanos entenderam rápido que o material gráfico não bastava para manter contato com os eleitores, e em 1980, a agência Pirella e Göttsche fez a primeira campanha realmente publicitária do Partido PRI, numa tentativa de humanizar o líder (FALABRINO, 2007, p.95). Outro partido político, Democrata Cristão, em 1975, tinha começado a usar campanhas publicitárias reais e próprias, com mensagens como: “Quando o Democrata Cristão é forte/ a violência é fraca”, ou mesmo “Perfume de Liberdade”, que se baseava num filme excepcional de Dino Risi, Perfume de Mulher. “Chega 1987, quando a agência RSCG lançou pela primeira vez, mas sem sequência, o slogan Forza Italia! que seis anos depois se tornou a bandeira política do novo partido de Berlusconi” (FALABRINO, 2007, p.95-96). O uso das técnicas publicitárias por parte dos partidos italianos começou a se tornar completa com a utilização da televisão comercial: “enquanto a RAI no tempo do monopólio tinha proibido os spots publicitários, a TV privada se abria para a propaganda eleitoral, e agora se torna necessário recorrer ao copy strategies, ao envolvimento psicológico dos eleitores e

Gian Luigi Falabrino é professor em Gênova e na Politécnica de Torino. Autor também do livro: A comunicação de empresa, Ed. Carocci, 2005. 51


138 portanto, a mensagens sintéticas e incisivas, ou melhor, fáceis de lembrar” (FALABRINO, 2007, p.96). Falabrino (2007, p.96) contextualiza a criação da Forza Italia, um dos mais influentes partidos políticos italianos hoje: Em 1989 cai o Muro de Berlim e em 1991 o Partido Comunista italiano se transforma no Partido Democrata de esquerda. Dois anos depois, Mani Puli destrói muitos velhos partidos, o Democrata Cristão, o Partido Socialista e os partidos menores da aliança, restavam o Democrata de esquerda, o Movimento Social, que [...] se transformou na Aliança Nacional. Mas tinha forças novas: em poucos meses Berlusconi com organização de publicitários, de seguros e fundos de previdência, construiu do nada um novo partido, Forza Italia. Hoje, pode-se dizer que todas as técnicas e ferramentas do marketing político são utilizadas no Brasil e na Itália 52, em algumas regiões de maneira mais eficaz/profissional e em outras regiões de modo mais peculiar/amador. Abaixo, prosseguem os estudos de marketing político de pesquisadores italianos e uma breve descrição do cenário político naquele país. 3. Propaganda e Marketing Político Italiano A autora reconstrói o cenário político italiano nas duas últimas décadas, tendo como base a leitura detalhada de duas publicações recentes sobre marketing político. O livro Introduzione al Marketing Politico (Introdução ao Marketing Político) de autoria conjunta de Stefano Colarieti e Paolo Guarino (2005), é dividido em três capítulos. O primeiro descreve a política italiana do ponto de vista institucional e revela detalhes da legislação eleitoral vigente no país, além de detalhar sobre a “personalização” da política, a crise dos partidos, entre outros assuntos. O segundo cap ítulo trata do marketing político e dos pressupostos entre comunicação e política. Esboça um roteiro de como o candidato deve agir durante as campanhas eleitorais, por exemplo, conhecendo o território onde atuará, analisando os cenários políticos, a imprensa, o adversário, a opinião pública, fazendo sondagem, etc. Na parte da “estratégia”, os autores descrevem o que é elegibilidade, identidade e comunicação do candidato. O terceiro cap ítulo detalha algumas técnicas e instrumentos de comunicação utilizados nas campanhas eleitorais, tais como os antigos e novos meios de comunicação, a internet e a comunicação não verbal (gestos, posturas, aspéctos físicos e olhar). Nos apêndices do livro, constam os interventos de dois renomados publicitários europeus: Jacques Séguéla e Philip Gould que detalham a história política italiana atual. Colarieti e Guarino (2005, p.8), na introdução da obra, afirmam que “o marketing e a comunicação política não são maquiagens para usar com cautela e vergonha a fim de esconder as “imperfeições” da política, mas são úteis (indispensáveis?) instrumentos de realização e interação”. Em seguida, propõem: “O porquê deste livro? Não é um manual, [...] pensamos de chamá-lo de introdução, pois cada um deve (se conseguir) interpretá-lo sozinho”. Os autores fazem uma crítica a “lenta aplicação” do marketing político no país. A cada eleiç ão, isso há dez anos, se promete, da parte dos espertos da mídia, uma repetida explosão de marketing político. Mas ainda não é assim. Há uma progressiva, lenta e provável inclinação para A intenção da autora não é detalhar as técnicas e ferramentas utilizadas pelos políticos nas campanhas eleitorais, mas aprofundar os conceitos e relatos de pesquisadores para evidenciar o aprimoramento do marketing político no Brasil e na Itália. 52


139 mudança, começa a deslanchar, supera os freios que a cultura política italiana continua colocando, num ato extremo de defesa que evite tornar-ser auto-destrutivo. Mas, sempre considerando o marketing político como a varinha mágica que resolve os temores pré-eleitorais. (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.8-9). O também italiano Fabrizio Iaconetti (2006, p.57) é mais enfático na crítica: “A comunicação política é, na Itália, hoje pouco: positiva, contínua e constante, construtiva, de duas vias, transparente, atenta aos resultados da política, e corajosa no falar dos problemas e dos pontos fracos. Se isto é verdade, uma real escolha estratégica seria aquela de fazer exatamente o contrário”. O autor ainda afirma que “deixando aos espertos da política o julgamento mais preciso sobre os partidos neste país, como cidadão sentimos ao dizer que a política na Itália hoje está enrolada nela mesma, longe dos cidadãos e em contínua regressão”. Um dos maiores desafios para o aplicação das técnicas de marketing político na Itália é o “complicado” sistema eleitoral53. Cabe ressaltar que a forma de governo é a RepúblicaParlamentar, com base em duas câmaras legislativas: Senado e Câmara dos Deputados54, tendo como Chefe-de-Estado: o Presidente, e como Chefe-de-Governo: o Primeiro -Ministro. Os pesquisadores Colarieti e Guarino (2005, p.29), confirmam que o sistema eleitoral italiano prevê que prefeitos e presidentes das regiões sejam eleitos por sufrágio universal, vencendo o que obtêm maioria absoluta dos votos. “Mas 75% dos candidatos ao Senado e à Câmara dos Deputados são eleitos por votos majoritários. Os outros 25%, por votos proporcionais”. Eles completam: “De qualquer modo, o resultado da votação recebida pelos candidatos eleitos com votos majoritários são determinantes para a distribuição da quota de 25% de eleitos com votos proporcionais”. O partido Democrata Cristão guiou o país ininterrupdamente de 1948 a 1994, obtendo sempre a maioria relativa aos internos da coalizão. Segundo Colarieti e Guarino (2005, p.30-31), atualmente não sobrevivem nenhum dos partidos existentes nos primeiros anos da década de 1990: “alguns desapareceram completamente da cena política, outros mudaram de nome (essência). Com as eleições de 1994 se fala do nascimento da segunda República italiana. Do ponto de vista formal esta afirmação é errada [...] porque nada mudou constitucionalmente”. Mas, segundo os autores, “de qualquer modo, é inegável que o novo sistema eleitoral tenha mudado o modo de fazer política”. Detalhando sobre este ‘novo’ modo de fazer política, os autores propõem a melhoria na colaboração e no relacionamento de instituições e cidadãos, de eleitos e eleitores, de partidos e sociedade civil. Fazer política hoje [...] é um superamento definitivo de cada lógica de campanha eleitoral. Nunca mais campanha eleitoral: gritamos quatro anos atrás. Campanha permanente é aquela que mais nos sentimos parte [...]. Portanto, como objeto do que nos ocupamos e nos Colarieti e Guarino (2005, p.36-37) comentam sobre o sistema eleitoral italiano: “É assim, de um sistema que prevalece o Parlamento, um tipo de bipolarismo imperfeito, no qual a maioria e o governo se chocam e se confrontam com a oposicão no Parlamento e na cena política, apresentando-se na forma de coalisão nacional saída de uma competicão eleitoral. Resta, no entanto, sempre forte o componente pluripartidário do sistema, que torna problemático o relacionamento entre os componentes políticos e a coalisão. São estes os cenários que desenham o valor estratégico da atividade de comunicação e do marketing político”. 54 “Eleições - Itália: resultado simplificará o jogo político: Os resultados definitivos das eleições gerais na Itália [realizadas dias 13 e 14 de abril de 2008] confirmam a clara vitória da coalizão conservadora Povo da Liberdade (PDL), liderada por Silvio Berlusconi. Graças ao “prêmio da maioria”, detalhe da lei eleitoral que presenteia o partido vencedor com 55% dos acentos no Parlamento, o novo governo terá 340 deputados e 171 senadores. A bancada de oposição formada pelos dois grupos contará com 239 deputados e 130 senadores no Parlamento”. Disponível em: http://praticaradical.blogspot.com/2008/04/eleies-itlia-resultado- simplificar-jogo.html. Acesso em: 20 abr. 2008. 53


140 ocuparemos: fazer política de modo eficaz com uma contínua e (lenta) (novamente) visão comunicativa (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.102103). Ainda na linha do new politics, os autores propõem que no marketing político vale “a lógica estratégica na qual conhecimento, visão, direção e velocidade apresentam-se como palavras-chaves e guias operativas para a troca contínua política-cidad ão” (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.103). No capítulo seguinte do livro, os autores descrevem o uso dos meios de comunicação nas campanhas eleitorais italianas. O principal veículo é a televisão que “mostra os políticos nos particulares mais íntimos: o ílder político, de herói passa a homem comum” (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.112). Os autores complementam com um dado significativo: “Se diz que há mais de dez anos, Berlusconi têm as TVs [como proprietário]. E de fato a história de Berlusconi em 1994, como cada história, precisava de um meio para ser recontada. E é evidente que este meio of i a televisão” (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.108). A questão de políticos serem proprietários ou sócios de veículos de comunicação -numa explícita tentativa de manipulação da informação-, não é um ocorrência somente italiana, mas também brasileira. Explicando sobre o uso de jornais nas campanhas eleitorais, os autores afirmam: Poucos italianos lêem jornais e considerariam pouco útil à corrida a visibilidade que assimila tantos políticos. Aos menos que, obviamente, o objetivo seja dirigido a classe dirigente e a opinion leader. Mas se, como estamos fazendo, pensamos ao nosso eleitor modelo, agora os jornais diários (até os locais) como meios comunicativos, tem pouca serventia (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.130-131). Apesar dos italianos (e brasileiros) lerem pouco os jornais, os autores confirmam duas utilidades estratégicas dos impressos nas campanhas eleitorais. “Uma boa leitura analítica de quanto se publica, [...] [pois] as notícias, se sabe, não existem em natureza, mas são frutos de sele ção, tratamento, narração (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.131-132)”, e continuam: “A segunda direção de utilidade da análise do jornal é uma leitura qualitativa da cobertura institucional ou da campanha eleitoral. Saber como um personagem político é descrito pelos jornais, quais competências pessoais e políticas são postas em evidência [...]”. Referente ao uso da internet nas campanhas, os autores concordam que nas mãos de espertos e competentes, como demonstram as experiências americanas, “a internet começa a ser um importante instrumento de ativação, partecipação e organização: contato com militantes e simpatizantes, distribuição de material, organização e promo ção de eventos, difusão de mensagens, comportamentos, ações (COLARIETI; GUARINO, 2005, p.169)”. Mas lembram que “esta é uma história que, na Itália, está apenas no início”. Neste momento, a autora inicia a leitura detalhada do segundo livro adotado no artigo científico, trata-se da obra Il marketing della politica - funzione, strategia e comunicazione dei partiti (O marketing da política – função, estratégia e comunicação dos partidos), de Fabrizio Iaconetti 55 (2006). A obra está dividida em quatro capítulos. O primeiro descreve o marketing estratégico e a comunicação na política, detalhando o que é um partido pró-ativo (voltado aos cidadãos), como funciona a comunicação integrada, o mix de mídia, os multicanais e, principalmente a web na procura do consenso político. Fabrizio Iaconetti é atualmente administrador da Future Drive, sociedade de serviços integrados para rede de vendas, onde se ocupa em modo particular do marketing, desenvolvimento de recursos humanos, comunicação de marketing, e comunicação organizativa. Publicou diversos artigos sobre o assunto, e também participou de congressos e conferências de business. Informações obtidas na contracapa da obra (2006) analisada neste artigo. 55


141 O segundo capítulo trata do modelo Customer Relationship Managment. Indica um processo estruturado de gestão -managment- das relações -relationship- com os cidadãos customer- e constitui, de fato, um apoio empresarial cuja finalidade é a construção e a valorização da relação com os clientes a longo prazo. O terceiro capítulo resgata dois Estudos de Caso de eleições européias: a do primeiroministro britânico Tony Blair, eleito em 2005 para seu terceiro mandato; e a do presidente da Ucrânia Viktor Yushchenko, eleito em 2004. O último capítulo, denominado de “voz aos especialistas”, recupera entrevistas com Antonio Palmieri, responsável pela comunicação eleitoral e internet do partido político Forza Itália; e Gianni Laterza, presidente da Editora ARCA. Fabrizio Iaconetti inicia o seu livro adotando o pensamento do pesquisador Antonio Foglio56, e propondo que o marketing político deveria ser visto como uma ligação inteligente entre os partidos políticos e seus representantes, respeitando os cidadãos-eleitores. Hoje a única forma praticável de marketing político é aquela que considero como: um conjunto de teorias e de práticas nas quais as organizações políticas podem servir para definir, apresentar, fazer aceitar a oferta política (programa político-eleitoral, ação política, políticos, candidatos, etc) dos cidad ãos-eleitores; isto se baseia numa série de fatores: o partido, o eleitorado, os políticos e os candidatos, o programa político, as campanhas políticas, a campanha eleitoral (IACONETTI, 2006, p.20 apud FOGLIO). Iaconetti diz que o futuro da Política na Itália não será “mais ou menos” a correta aceitação e definição do marketing político. “Certamente o futuro da política se jogará sobre a nova visão e missão que os partidos irão afirmar e sobre a credibilidade das organizações que manifestem uma orientação aos cidad ãos, respeitando aqueles que se dirigem aos eleitores” (IACONETTI, 2006, p.21). Iaconetti prevê um modelo articulado de “partido político ideal”: o orientamento estratégico de fundo; a estratégia; o marketing a nível de área geográfica e/ou área temática; os públicos de referências com os quais há uma relação estável de valor; o recurso humano com competência necessária; o recurso eco-financeiro a aplicar com equilíbrio; [...] o painel de controle para a medição dos resultados; a tecnologia a serviço e suporte; a comunicação contínua/séria/constante (IACONETTI, 2006, p. 22-23). Ao esboçar o panorama atual político na Itália, Iaconetti confirma que os elementos do marketing foram introduzidos no final dos anos 90 [...]. Se primeiro a comunicação política era centrada sobre a comunicação eleitoral via canais clássicos (jornais, tv, rádio) e meios tradicionais como a convenção, o comício, a comunicação para e com o líder, [...] a partir dos anos noventa, com o “declínio em campo” de um não-político de profissão e empreendedor de sucesso, Sílvio Berlusconi, a política conhece uma nova forma de marketing e novos instrumentos de organização e comunicação (IACONETTI, 2006, p.23-24).

56 FOGLIO, Antônio. Il marketing politico ed elettorale: Politica, partiti e candidati. La politica sui muri. I manifesti politici dell’Italia Repubblicana 1946-1992. Torino: 1999 [...]. (Tradução: O marketing político e eleitoral: Política, partidos e candidatos. A política sobre os muros. O manifesto político da Itália Republicana 1946-1992. Turim). Disponível em: www.com-pol.it/pdf/compol_1-2001_bibliografia_profess.pdf. Acesso em: 15.dez.2008.


142 O político mais influente na Itália continua sendo Silvio Berlusconi57, que “cobriu um vazio no mercado da política através da mais refinada técnica de marketing estratégico e operativo. Utilizou para este motivo um management team com os melhores profissionais presentes em diversas atividades empreendedoristas” (IACONETTI, 2006, p.24). Em 1992-1993 Berlusconi contratou o Instituto Acabus para fazer sondagem de opinião pública do vencedor nas eleições e da imagem de líder. No capítulo seguinte, a autora detalhará outras técnicas de marketing utilizadas nas campanhas eleitorais do atual primeiro-ministro italiano. Iaconetti (2006, p.39) continua a reflexão sobre a comunicação que no marketing político “deve ser planejada para se constituir como alavanca estratégica e integrada, não podendo ser considerada somente um artifício eleitoral e publicitário”. Ele esclarece que ‘integração’ compreende a relação entre “comunicação interna e externa e entre diversas mídias”. Para o autor, a comunicação de um partido novo, pró-ativo, tem como objetivo orientar os cidad ãos e servir como uma nova arquitetura organizativa à rede de computadores -internet-, sendo capaz de gestir um sistema complexo de conhecimento e de difusão, rendendo frutos aos diversos públicos de referência (interno e externo). “É a alavanca necessária para o funcionamento e para a coligação de vários elementos do network” (IACONETTI, 2006, p.43). A comunicação é um processo estratégico contínuo e constante que parte PRIMEIRO da verificação eleitoral, se desenvolve com força e transparência DURANTE a prova eleitoral e continua, com intensidade variável e um mix diverso de instrumento, DEPOIS ao propósito de informar os diversos públicos de referência sobre como estão atuando os programas políticos de governo (IACONETTI, 2006, p.43). Segundo Iaconetti, o partido político que não consegue transferir de modo envolvente e transparente a própria mensagem política interna, dificilmente conseguirá impor relação duradoura com os target do mundo externo. Comentando sobre os meios de comunicação, Fabrizio Iaconetti ressalta que a oferta política televisiva é absolutamente imprescindível em períodos eleitorais e se exprime através da mensagem eleitoral gratuita e do spot ou publicidade paga. Para ele, a figura do líder e do portavoz ou coordenador do partido são os pontos de contato com o mundo midiático.

“Perfil de Silvio Berlusconi, eleito primeiro- ministro da Itália”. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u392100.shtml. Acesso em: 20.abril.2008. Aos 71 anos de idade, o líder conservador Silvio Berlusconi será o primeiro-ministro da Itália pela terceira vez [...] Após dois anos na oposição, Berlusconi reinventou seu partido para estas eleições [...]. Filho de um banqueiro de classe média, Berlusconi é o político mais rico da Itália, com uma fortuna que a revista Forbes calcula em quase 9,4 bilhões de euros, 400 milhões de euros a mais que nas últimas eleições, quando ocupava o primeiro posto entre os magnatas italianos -- hoje é o terceiro. Negócios - O líder conservador construiu sua fortuna em uma meteórica carreira empresarial iniciada muito jovem. Com apenas 25 anos, fundou sua primeira construtora, a Cantieri Riuniti Milanese. Em meados dos anos 70, Berlusconi abriu um canal de TV a cabo que transmitia sua programação para um dos bairros de Milão que ele mesmo havia construído. Depois, adquiriu ações da publicação Il Giornale antes de criar a emissora de televisão Canale 5, em 1978. Cerca de uma década depois, já tinha três canais privados --Italia1, Rete4 e Canale 5-- que acabaram com o monopólio da rede pública RAI, enquanto chegava ao mundo do futebol com a aquisição do poderoso clube Milan. Seu império se estendeu na época, com empresas como o grupo editorial Mondadori, a rede de locadoras de vídeo Blockbuster e participações na Casa Olivetti, valores que reuniu no conglomerado Fininvest. Tendo chegado ao topo em seu projeto empresarial, Berlusconi se preparou para invadir a arena política no final de 1993 com a criação do partido populista Forza Italia. Apoiada no poder dos canais de televisão do magnata, a legenda entrou de forma espetacular na disputa pelo governo italiano. 57


143 Também são relevantes, pela tradição e pela eficácia, os encontros públicos que incluem (sempre segundo os mais espertos de marketing político) uma série de possibilidades de ações de comunição (comício, debates, workshop, mesa-redonda, entrevista, eventos especiais em geral). “Durante a campanha eleitoral, um partido pode recorrer a meios que o coloquem em contanto direto com o eleitor” (IACONETTI, 2006, p.56 apud FOGLIO). Sobre a internet, Iaconetti (2006, p.66) diz que há “um pontencial enorme de exercício dos direitos civis mas não pode substituir as ações de reforma dos governos nem a luta social”. Para ele, as transformações em atos na sociedade da informação estão redefinindo os contornos da vida econômica, social e política na Itália. Alguns dados sobre os usuários de internet italianos são mostrados no livro de Iaconetti (2006, p.73). Uma pesquisa de 2004, do Instituto Cencis diz que: “São famílias com filhos que apresentam um mais alto nível de penetração tecnológica: 9 sobre 10 dos casais com filhos possuem câmara gravadora, televisão e telefone. Os 72% de jovens (com idade inferior a 34 anos) usam o computador [...]”. Segundo uma outra estimativa do Instituto Nielsen/NetRatings, realizada no quarto semestre de 2004, o percentual de família italiana que dispõe de acesso a internet gira em torno de 43%. “De cada 4 italianos, 3 nunca se conectaram a internet (74% não sabem usar o computador), 72,6 % usam a linha telefônica, 70,7% se coligam de casa, enquanto somentre 35,4% do local de trabalho” (IACONETTI, 2006, p.74). O uso da rede de computadores por parte dos partidos políticos italianos, teve início nos anos noventa, quando começaram os investimentos na construção de sites web com a intenção, na maior parte dos casos, de repetir on-line a correspondente versão off-line. Limitando o olhar ao contexto italiano, se deve reconhecer que a presença da política na web é, atualmente, a mais superficial, no senso que se limita a repetir modalidades comunicativas off-line e parece não servir em modo significativo, exceto, como estruturas interativas. Se tem a sensação que por muitos sujeitos políticos italianos o site apresenta uma vitrine, uma bancada, um santinho, mas raramente um eficaz instrumento de community (IACONETTI, 2006, p.79). Para Iaconetti (2006, p.80-81), são próprias as peculiaridades do e-mail que permitem desfrutar a potencialidade do marketing virtual em termos de ampliar a difusão: velocidade, interatividade, facilidade de uso, seguridade, conveniência, personalização. Os grupos de discussão temáticos ou o mailing list podem serem úteis para envolver os cidadãos-eleitores a definirem uma agenda política. Segundo Marco Montemagno58 (apud IACONETTI, 2006, p.82), um dos espertos italianos sobre o tema internet e política, autor do Web Elections -um blog-book com curiosidades, link e opiniões sobre as eleições americanas e italianas atuais-, a Internet é o novo meio de comunicação das campanhas políticas. “Os políticos americanos estão recorrendo sempre mais frequentemente a web para organizar as campanhas e obter ajudas dos patrocinadores”. E continua: “Os instrumentos colocados a disposição na rede são: forum, e-mail (um a um), mailing list (muitos a muitos), debates on-line, newsletter temáticos (um a muitos). Outros instrumentos de agregação a serem desenvolvidos são: meretup, community, social networking [...]” (IACONETTI, 2006, p.83 apud MONTEMAGNO).

MONTEMAGNO, Marco. Blog com curiosidades sobre vários cargos políticos, estudos sobre política, internet e ferramentas web político. Disponível em: http://montemagno.typepad.com/politica_web. Acesso em: 15.dez.08. 58


144 A utilização de blogs nas últimas campanhas políticas na Itália tem uma história peculiar59. Em 16 de fevereiro de 2005, Romano Prodi, ex-presidente da União Européia e exprimeiro -ministro italiano, abriu seu blog com um post, alegando que este seria um canal de discussão política com o seu eleitorado. De início, os blogueiros italianos adoraram a idéia. Mas, Prodi ficou 11 dias sem publicar nada. Tal atitude gerou um amplo debate em toda a blogosfera italiana e Prodi foi massivamente ironizado por sua ‘desatualização’ no blog. O blogueiro Paolo Valdemarin sintetizou o tema central da polêmica: “Se você tem um blog e nada a dizer, fecha-o”. No segundo post, de modo formal, Prodi se desculpou por não ter publicado nada no período e finalmente, 37 dias após o primeiro post, um mês após o início das discussões entre os blogs, 26 após o segundo post, Prodi decidiu fechar seu blog. Desta forma, o Corriere della Sera, o mais lido jo rnal italiano, escreveu um artigo sobre o tema, apontando a “pressão” dos blogueiros italianos, como um dos principais motivos para que Prodi finalizasse seu blog. 4. A voz de três “marqueteiros políticos” atuantes na Itália60 Antonio Palmieri, responsável pela comunicação eleitoral e internet do partido político Forza Italia61, em entrevista transcrita na obra de Iaconetti (2006, p.129), o marketing político se constitui como “um conjunto de atividades de comunicação cuja finalidade é dar aos cidadãos mais informações, para fazer com que eles escolham de modo consciente [o seu candidato]”. Palmieri relata que a Forza Italia 62 nasceu em 2004, graças à habilidade retórica de Silvio Berlusconi63. O partido foi criado com várias finalidades: BLOG de Romano Prodi. Os dois parágrafos deste artigo que relatam a história peculiar do blog político de Romano Prodi, foram baseados nas informações contidas em www.davidorban.com/2004/11/il_blog_nella_p/en. Acesso em 15.dez.2008. 60 Apesar de a autora ter morado na Itália no período de junho/2007 a março/2008, quando realizou uma breve pesquisa pela internet a fim de resgatar nomes de especialistas/pesquisadores/marqueteiros políticos daquele país, ela adotou como base do artigo, as entrevistas com profissionais contidas nos dois livros analisados (consultar Bibliografia). A autora entende também que os três “espertos em marketing político”: Antonio Palmieri, Gianni Laterza e Jacques Séguéla, não devem ser considerados somente “marqueteiros políticos”, pois desenvolvem outras atividades principais, que não somente esta. 61 http://www.forzaitalia.it/, é um site com diversos links que super valorizam o presidente do partido Silvio Berlusconi: Com Silvio, Carta de Valores, Pré-Adesão, No Mundo, Imprensa, PDL Câmara, PDL Senado e Intranet. Há também links sobre a história e fundação do partido e outros links que remetem a partidos políticos apoiadores e afins: Aliança Nacional, Democrata Cristão pela Autonomia, Novo PSI, Popular Liberal, Ação Social, Partido Republicano Italiano, Partido ‘Pensionati’, O círculo do Bom Governo e Círculo da liberdade. Acesso em: 15.dez.2008. 62 Raniolo, Francesco. Forza Italia: Um líder com uma parte. Artigo científico (em inglês), publicado em setembro/2006, páginas 439 a 455. Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=ptBR&sl=en&u=http://www.informaworld.com/index/. Acesso em: 15.dez.2008. 63 Continuação do “Perfil de Silvio Berlusconi, eleito primeiro-ministro da Itália”. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u392100.shtml. Acesso em: 20.abril.2008. Política - Em apenas dois meses e com uma campanha na qual prometia administrar o Estado como se fosse uma de suas prósperas empresas, Berlusconi obteve uma arrasadora vitória sobre a centro-esquerda nas eleições de março de 1994. Aquele governo durou pouco. Desestabilizado pelos ataques da oposição, por polêmicos decretos de lei e, principalmente, por diversos empecilhos judiciais, seus aliados da Liga Norte decidiram retirar o apoio ao Executivo, provocando a renúncia de Berlusconi no final do mesmo ano. As empresas do líder conservador se multiplicavam na mesma velocidade de seus problemas judiciais. A situação chegou ao ponto em que, entre 1996 e 2000, ele enfrentou até cinco processos ao mesmo tempo com acusações que iam de corrupção e suborno à falsificação de balanço. No entanto, o magnata nunca foi preso, pois todas as ações terminaram em absolvição, prescrição do delito ou em um emaranhado de interminável burocracia judicial que prossegue até hoje. Apesar de seus problemas com a Justiça, Berlusconi não deixou de lado o terreno político. Ele liderou a oposição até as eleições de 2001, quando reconquistou o governo italiano com maioria absoluta no comando da coalizão conservadora Casa das Liberdades. Nos cinco anos de mandato, o líder conservador ‘fez a alegria’ da imprensa com suas brigas com os juízes, as leis promulgadas sob medida de seus interesses, seus retoques estéticos e sua 59


145

comunicar aos cidadão s uma proposta política usando uma linguagem simples, fruto de um duro trabalho de: a) individualização dos problemas dos cidadãos através das indagações da opinião publica; b) estudo das soluções a luz dos nossos valores de referência, das indagações dos estudiosos italianos e estrangeiros, da melhor experiência de reforma realizada na democracia ocidental; c) comparação de dados e de cenários, encontros de verificação com espertos de categorias produtivas e sociais do nosso país: d) acertado trabalho de simplificação das mensagens para as quais divulgarem o êxito das fases anteriores de estudo (PALMIERI, apud IACONETTI, 2006, p.129). Para Palmieri (apud IACONETTI, 2006, p.130), Silvio Berlusconi e Forza Italia transformaram a comunicação política na Itália 64, colocando no centro da campanha eleitoral os cidadãos, o simples eleitor. Em 1994, o partido aplicou pela primeira vez na comunicação política, os principais instrumentos de marketing empresarial: sondagem, spot e grandes aparições. Para ele, Forza Italia não é um partido empresarial, nem tradicional, mas “uma realidade única”. O partido também inovou com o uso da internet na campanha eleitoral de 1994. Nós estamos on-line desde fevereiro de 1995 e isto diz muito sobre a importância que damos a este meio. O nosso site é fundamental para os militantes. É pensado próprio para eles. Certamente é uma sede virtual aberta 24 horas sobre 24, onde encontra a história do líder, a organização, os programas e o cotidiano dos temas políticos sem a mediação imposta pelos órgãos de informação. O nosso site é o ponto de referimento da Community Azzura65 (Comunidade Azul). Por dia recebemos em média 1.800 a 2.000 mensagens [...] e enviamos o newsletter a 55 mil inscritos. Na campanha eleitoral tudo muda e, são muitos os freqüentadores ocasionais (PALMIERI apud IACONETTI, 2006, p.132). Sobre as novidades da campanha eleitoral de 200666, Palmieri (apud IACONETTI, 2006, p.133) apontava que uma esquadra de cidadãos-militantes e voluntários seriam “o verdadeiro elemento de novidade como mobilização do território [...], também para o boca-a-boca; os instrumentos de marketing permitidos por lei; [...] um bom uso de web e das novas tecnologias”.

língua afiada -que já deu muita dor de cabeça à diplomacia italiana-. Em abril de 2006, perdeu as eleições contra Romano Prodi, o que lhe afastou do primeiro plano nacional e internacional. 64 Campus, Donatella. Líderes, sonhos e viagens: Itália da nova política da comunicação. Artigo científico (em inglês) publicado em agosto/2002, páginas 171 a 191. Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=ptR&sl=en&u=http://www.informaworld.com/index/. Acesso em: 15.dez. 2008. 65 No site http://www.forzaitalia.it/ consta que o SPAZIO AZZURRO é dedicado as opiniões dos eleitores e dos simpatizantes da Forza Itália e do Povo da Liberdade que freqüenta o site. Todas as mensagens recebidas são lidas e uma parte, que representa opiniões diversas com maior freqüência dos próprios eleitores, é escolhida para publicação, o que ocorre várias vezes no dia. As mensagens publicadas não refletem necessariamente a posição do partido e servem como pontos de reflexão e discussão. Acesso em 15.dez.2008. 66 Lembrando que apesar desse artigo ter sido escrito em 2008, o livro analisado de Fabrizio Iaconetti foi publicado em 2006, quando não tinha ocorrido a eleição a qual Silvio Berlusconi saiu derrotado.


146 A segunda entrevista da obra de Iaconetti (2006) é com Gianni Laterza, já apresentado neste artigo como presidente da Editora ARCA que edita o jornal L’Unità. Ele faz uma breve retrospectiva dos últimos cem anos de história política italiana, para introduzir sua análise atual: [...] descobrimos que grandes comunicadores como D’Annunzio e Mussolini tiveram como objetivos primários o envolvimento das massas para o desenvolvimento de suas idéias e de seus projetos com qualquer meio. Com a ditadura fascista, o conceito de fundo era o controle da comunicação, não o envolvimento no projeto políticosocial, que era somente uma conseqüência. O uso dos meios de comunicação de massa estava sobre o absoluto controle [do Estado] e havia somente uma voz. [...] A comunicação política democrática deve ser transparente e garantir a liberdade. Não é correto dizer que a comunicação hoje é mais importante. Hoje é mais moderna tecnologicamente e tecnicamente e suas mensagens muito mais variadas e sofisticadas, mas o objetivo continua aquele de gestir o relacionamento entre administradores e administrados (LATERZA apud IACONETTI, 2006, p.134). Laterza (apud IACONETTI, 2006, p.135) confirma que o início dos anos sessenta marcou uma reviravolta na comunicação italiana devido à utilização massiva dos novos meios de comunicação, em particular a televisão. Mais adiante, ele reflete sobre a existência dos partidos políticos. “A mudança contínua dos partidos é necessária e tende à constante procura de políticas e estratégias de acordo com os tempos. Tempos que correm com uma velocidade cada vez maior” (LATERZA apud IACONETTI, 2006, p.137). Laterza também comenta uma particularidade das campanhas políticas em seu país. Na Itália, devemos considerar, tantas vezes, que somos uma realidade particular e complexa. Por exemplo, ao Norte, Centro e ao Sul ocorrerão estratégias e ações relativas em comunicação ad loc. Uma comunicação voltada e com objetivos específicos [...]. A coisa mais importante, porém, continua aquela de ter macro-objetivos superiores e guardando todo o país no seu conjunto (LATERZA apud IACONETTI, 2006, p.138). A terceira entrevista analisada neste artigo está no livro de COLARIETI e GUARINO (2005), e consiste na transcrição de uma conferência67 do publicitário francês Jacques Séguéla68 que esteve no Brasil diversas vezes, inclusive em 2008, em ocasião do lançamento de seu livro A vertigem das urnas, que tem um capítulo sobre marketing político no Brasil, intitulado “Marketing político: Culpado ou Inocente”. Como consta: Mas eu sou de esquerda. Não sou feliz que tenha vencido Berlusconi, mesmo que se espera algo diverso. Se eu tivesse que escolher um A conferência de Jacques Séguéla ocorreu em 15 jun. 2001, em Roma, com o tema: “O marketing político depois da campanha de 2001”. 68 Jacques Séguéla. Após obter o título de PH.D em Farmácia, Séguéla tornou-se repórter do Paris Match e do France Soir. Depois deu a volta ao mundo em um Citroën 2CV, incluindo o Brasil em seu roteiro. Aos 32 anos, associou-se com Bernard Roux, Alain Cayzac and Jean-Michel Goudard para criarem juntos a RSCG, que em 1991 uniu-se com a Eurocom. Considerado um dos maiores expoentes da propaganda mundial, Séguéla ganhou ampla projeção no segmento com a publicação do best- seller “Não conte a minha mãe que trabalho em publicidade...”. O publicitário francês é CCO (Chief Creative Officer) do Havas Advertising, sexto maior grupo de comunicação do mundo, presente em 77 países e que emprega mais de 14 mil pessoas. Disponível em: http://www.targetsp.com.br/seguela.htm. Acesso em: 15.dez.2008. 67


147 comunicador eu teria escolhido ele, porque era vivo, falava com o coração, com tenacidade, com emoção, não falava somente de sondagem. Tinha vida, tinha sangue, tinha espírito latino. [...] Precisa crer profundamente que seja em você a própria campanha. A publicidade política não é nem boa, nem ruim, nem Deus nem o diabo, nem manipulação, nem milagre: é uma técnica como qualquer outra. Mas, quanto mais paixão, mais envolvente, mediática (SEGUÉLA apud COLARIETI; GUARINO, 2005, p.194). Seguéla afirma que a comunicação política deve ser “algo que toca a alma”. A campanha é, sobretudo, sentir o pulso da nossa sociedade. [...] Berlusconi, o conheço, faz sempre. É por isto, entre outras coisas, que ele criou um império mediático”. Ele continua relatando algumas experiências adquiridas nas quinze campanhas que fez na vida, nas quais venceu quatorze. “A última perdi, na África [...] isso demonstra que não adianta a publicidade, se o país já escolheu [o candidato]. Porque ninguém vence uma campanha eleitoral, é sempre o adversário que a perde”. Ele justifica que sabia desde o início que perderia a campanha no país Senegal, mas que mesmo assim decidiu se empenhar por se tratar da “primeira democracia africana” (SEGUÉLA apud COLARIETI; GUARINO, 2005, p.201). O publicitário revela que foi François Mitterand que deu a “mais bela definição de eleição”, dizendo: “Vence quem sabe contar ao seu povo a história que o povo quer ouvir naquele preciso momento, a na condição de que ele seja o herói daquela história” (SEGUÉLA apud COLARIETI; GUARINO, 2005, p.202-203). Concluindo, Seguéla fala sobre a internet que “foi decisiva para as eleições americanas. Internet é marketing direto. No entanto, a próxima vez, as eleições serão também problema de database [...]. A primeira coisa que deve fazer Berlusconi, é começar a preparar os databases de internet, porque os cartazes não bastam mais”, (SEGUÉLA apud COLARIETI; GUARINO, 2005, p.210). 5. Conclusão Diversos autores citados, concordam que a comunicação política foi usada deste a antiguidade por personalidades como Platão, Aristóteles, Sócrates, Nicolau Maquiavel, Hitler, Mussolini, Stalin, Napoleão e outros. Porém, este artigo recuperou o uso da propaganda, depois marketing político, de candidatos à presidência no Brasil e na Itália. Segundo os autores brasileiros, as técnicas de propaganda política vêm sendo usadas e aprimoradas há mais de 120 anos, desde o início da República no país. Porém, a profissionalização das campanhas políticas nacionais é recente. O primeiro presidente a usar todos os aparatos do marketing político foi Fernando Collor de Melo, em 1989, por um partido político desconhecido, o que demonstra que o brasileiro vota no candidato e não no partido. Nos Estados Unidos, já na década de 1930 eram feitas as primeiras pesquisas eleitorais, e na década de 1950 um candidato contratou a primeira agência de publicidade com a finalidade específica de se eleger presidente. Os autores italianos afirmam que o marketing político no país teve origem nos anos 30, mas sua aplicação concreta ocorreu da década de 1960 em diante, como conseqüência do aprimoramento do marketing comercial. No entanto, o primeiro político de alto escalão na Itália a contratar um target completo de profissionais foi Silvio Berlusconi em 1994, que anos antes criara seu próprio partido. Dois pontos em comum entre Brasil e Itália são: o aprimoramento do marketing político como conseqüência do marketing comercial e a tendência dos eleitores votarem no candidato, independente da tradição do partido político.


148 O Brasil possui um quadro restrito de partidos políticos tradicionais, apesar da facilidade de se criar novos partidos políticos. Assim também ocorre na Itália. Durante quatro décadas, o país foi guiado pelo grupo “Democrata Cristão”. Segundo Colarieti e Guarino (2005), atualmente não sobrevivem nenhum dos partidos existentes nos primeiros anos 90: alguns desapareceram completamente da cena política, outros mudaram de nome (e essência). Um dos motivos apontados no artigo pelo atraso da aplicação do marketing político do Brasil, é do regime democrático ter sido interrompido pela ditadura. Já os autores italianos, dizem que seu país é visto como ‘lanterna’ na Europa, por causa de uma perdurante concepção do marketing visto como uma disciplina ligada exclusivamente a empresas e comércios e, também devido ao sistema eleitoral proporcional que pouco reflete o resultado das urnas. O Brasil está hoje um pouco à frente da Itália na concreta utilização dos aparatos de marketing político. Tal afirmação é confirmada pelos autores italianos quando dizem que “ainda hoje a Itália está desenvolvendo a maturidade do marketing político” e que “a cada eleição, isso há dez anos, se promete, da parte dos espertos da mídia, uma repetida explosão de marketing político. Mas ainda não é assim”, (COLARIETI; GUARINO, 2005). Para Falabrino (2007): “por muitos anos depois do retorno da democracia, a propaganda política não se apropriou das novas técnicas publicitárias”. E, para Iaconetti (2006): “A comunicação política é, na Itália, hoje pouco: positiva, contínua e constante, construtiva, de duas vias, transparente, atenta aos resultados da política, e corajosa no falar dos problemas e dos pontos fracos. [...] Sentimos ao dizer que a política na Itália hoje está enrolada nela mesma, longe dos cidadãos e em contínua regressão”. Tanto os autores italianos, como os brasileiros fazem comparações em suas obras, com as campanhas americanas tidas como referência no mundo. Enquanto os autores dos dois livros analisados retratam a realidade das campanhas de políticos do continente europeu, visto que a Itália integra a União Européia, os brasileiros, em sua grande maioria, retratam as campanhas nacionais. Referente à análise detalhada dos dois livros italianos, o marketing político é visto sob diversos pontos de vista. Iaconetti (2006) propõe um “partido político ideal” e recorre às estratégias do marketing comercial e empresarial para entrar na realidade do marketing político. O melhor da obra está nos apêndices com a íntegra de duas entrevistas com especialistas italianos em marketing político. Já, o livro de Colarieti e Guarino (2005) num primeiro momento reserva espaço para explicar o complexo quadro político eleitoral italiano, e num segundo momento serve como manual de como fazer uma campanha eleitoral bem sucedida. As intervenções de publicitários nos apêndices também são o que há de mais atual na obra. No entanto, ambas as obras trazem “pitadas” do marketing e da política atual italiana. Entre os autores italianos, é ponto comum que Silvio Berlusconi foi o líder que interpretou um novo modo de comunicar a política na Itália, em meados da década de 1990. Já, entre os pesquisadores brasileiros, não há unanimidade sobre qual presidente foi o primiero a usar todos os aparatos do marketing político, visto que a cada campanha presidencial, as técnicas se aprimoraram. No entanto, a autora adota neste artigo a constatação de Ney Lima Figueiredo (2002) de que Fernando Collor, em 1989, foi o candidato que “usou de maneira consistente, talentosa e competente todas as estratégias do marketin político”. O uso da televisão no Brasil para fins de propaganda eleitoral vem desde as décadas de 60 e 70. Já na Itália, a principal televisão pública, a RAI, abriu-se para a propaganda política somente na década de 90, seguindo o exemplo dos canais pagos, propriedade do político Silvio Berlusconi. Tanto no Brasil como na Itália, a televisão é hoje o veículo mais importante nas campanhas eleitorais. A propaganda politica na Itália, por muitos anos usou as técnicas primitivas da propaganda ideológica. Segundo Falabrino (2007), os primeiros materiais gráficos de partidos


149 políticos italianos datam da década de 1960. No Brasil, sete décadas antes, os partidos republicanos publicavam seus manisfestos. No entanto, a iniciativa contemporânea do político italiano Romano Prodi de, em 2005, abrir um blog na internet a fim de ampliar o diálogo com seus eleitores, é uma constatação que deixa os políticos brasileiros para trás. Continuando a análise comparativa do uso dos meios de comunicação nos dois países, consta que a propaganda em jornal é pouco valorizada na Itália, pois “poucos italianos lêem jornais e considerariam pouco útil à corrida a visibilidade que assimila tantos políticos” (COLARIETI; GUARINO, 2005). Apesar dos políticos brasileiros veicularem anúncios em jornais, aqui também é questionável a sua real eficácia. O uso da internet nas campanhas eleitorais pode e deve ser apliado no Brasil e na Itália, como sugerem os autores analisados no artigo. Os dois países não usufruem plenamente de todos os canais virtuais de comunicação, apesar de já estarem em rede com suas páginas na internet e de procurarem aperfeiçoar o setor a cada campanha, visto que as experiências americanas demonstram ser este, o futuro do marketing político. O marketing político deveria ser visto como uma ligação inteligente entre os partidos políticos e seus representantes, respeitando os cidadãos-eleitores, mas esta não é uma realidade no Brasil, nem na Itália, assim como não existe “partido político ideal” como o proposto por Iaconetti (2006). Enfatizando que a forma de governo no Brasil é a República-presidencialista com eleições diretas para presidente, governadores e prefeitos. E, na Itália, prevalece a República-parlamentarista, no qual são escolhidos de forma majoritária, o presidente e o primeiro -ministro. Este artigo também tem como propósito servir de “embrião” a futuros estudos sobre marketing político italiano e brasileiro. Ainda é pouco, ou quase nulo, o intercâmbio de informações e de profissionais entre os dois países. Registro neste artigo a vinda ao Brasil do publicitário francês Jacques Seguéla, atuante em campanhas italianas e européias, em virtude de lançamento de seus livros e para reuniões de negócio em São Paulo, onde mantém uma filial de sua agência de publicidade multinacional. Referências bibliográficas BLOG de Romano Prodi. Disponível em: www.davidorban.com/2004/11/il_blog_nella_p/en. Acesso em: 15 dez. 2008. CAMPUS, Donatella. Líderes, sonhos e viagens: Itália da nova política da comunicação. Artigo científico (em inglês) publicado em agosto/2002, páginas 171 a 191. Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=ptR&sl=en&u=http://www.informaworld.com/index/. Acesso em: 15 dez. 2008. CATANEO, Alberto; ZANETTO, Paolo. (E)lezione di successo – Manuale di marketing politico. Italia: Parma, Edizione Etas, 2003. COLARIETI, Stefano; GUARINO, Paolo. Introduziuone al Marketing Politico. Italia: Roma. Luiss University Press, 2005. DIAS, Renato Costa. Marketing político: como ganhar uma campanha eleitoral, seguindo os ensinamentos de Sun Tzu, Maquiavel, Clausewitz. Natal (RN): Ed. do autor. 2004. DOMENACH, Jean-Marie. A propaganda política. 2.ed. Tradução de Ciro T. de Pádua. São Paulo: Difusão Européia, 1963. ELEICOES-Itália: resultado simplificará o jogo político. Disponível em: http://praticaradical.blogspot.com/2008/04/eleies-itlia-resultado-simplificar-jogo.html. Acesso em: 20 abr. 2008


150 FALABRINO, Gian Luigi. Storia della Pubblicità in Italia dal 1945 a Oggi. Italia: Roma. Carocci Editore, 2007. FIGUEIREDO, Ney Lima. Jogando para ganhar. 2ª ed. São Paulo: Geração Editorial, 2002. FIGUEIREDO, Rubens. O que é marketing político. São Paulo: Brasiliense, 1994. FOGLIO, Antônio. (1999). Il marketing politico ed elettorale: Politica, partiti e candidati. La politica sui muri. I manifesti politici dell’Italia Repubblicana 1946-1992. Torino. Disponível em: www.com-pol.it/pdf/compol_1-2001_bibliografia_profess.pdf. Acesso em: 15 dez. 2008. FOLHA Online: Perfil de Silvio Berlusconi, eleito primeiro-ministro da Itália, disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u392100.shtml. Acesso em: 20 abr. 2008. FORZA ITALIA. Disponível em: http://www.forzaitalia.it/. Acesso em: 15 dez. 2008. GARCIA, Nelson Jahr. O que é propagnda ideológica. 6.ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1989. IACONETTI, Fabrizio. Il marketing della politica - funzione, strategia e comunicazione dei partiti. Italia: Milano. Edizione Angelo Guerini e Associati, 2006, 171 p. JACQUES Seguéla vem ao Brasil para lançar seu livro “A Vertigem das Urnas”. Disponível em: http://www.targetsp.com.br/seguela.htm. Acesso em: 15 dez. 2008. KUNTZ, Ronald Amaral. Marketing político: a eficiência a serviço do candidato. São Paulo: Global, 1982. LIMA, Fernando. A comunicação como ferramenta do marketing político – um bem necessário. In: CARDOSO, Paulo Ribeiro e CAIRRÃO, Álvaro Lima (org.) Cadernos de estudos mediáticos 04 Comunicação Política. Portugal: Edições Universidade Fernando Pessoa, 2006. MANHANELLI, Carlos Augusto. Eleição é guerra: marketing para campanhas eleitorais. São Paulo: Summus, 1992. MONTEMAGNO, Marco. Blog com curiosidades sobre vários cargos políticos, estudos sobre política, internet e ferramentas web político. Disponível em: http://montemagno.typepad.com. Acesso em: 15 dez. 2008. POLITO, André Guilherme. MICHAELIS: minidicionário italiano-português, portuguêsitaliano. São Paulo: Melhoramentos, 1996. QUEIROZ, Adolpho (org.). Na arena do marketing político: ideologia e propaganda nas campanhas presidenciais brasileiras. São Paulo: Summus, 2006. RANIOLO, Francesco. Forza Italia: Um líder com uma parte. Artigo científico (em inglês), publicado em setembro/2006, páginas 439 a 455. Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&sl=en&u=http://www.informaworld.com/index/. Acesso em: 15 dez. 2008. RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social – métodos e técnicas. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1989. RODRIGUEZ, José Honório. A pesquisa histórica no Brasil. 4.ed rev. e atualizada. São Paulo: Nacional, 1982. TCHAKHOTINE, Serge. A mistificação das massas pela propaganda política. Tradução de Miguel Arraes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1967. TORQUATO DO REGO, Francisco Gaudêncio. Marketing político e governamental: um roteiro para campanhas políticas e estratégias e comunicação. 5ª ed. São Paulo: Summus, 1985.


151

Influências do fascismo na propaganda política do Brasil Adolpho QUEIROZ 69 Introdução Mussolini pode ter-se inspirado no presidente Campos Salles, que governou o Brasil no princípio do século XX, para, por exemplo, oferecer dinheiro aos jornais e revistas italianos para se alinharem às suas idéias. O ex- ministro da Fazenda e depois Presidente da República, Campos Salles, iniciou a prática perversa no Brasil de oferecer dinheiro, facilitar empréstimos e empregar jornalistas, para manter a imprensa sob sua tutela. Já Mussolini, em 1922, ampliou de 50.000 liras para 438.000 liras em 1932, os recursos disponíveis no orçamento do país para subsidiar jornais e jornalistas, numa rubrica que ele chamou de “fundo de répteis”. Outra ação que teve repercussões no Brasil foi o pedido do governante italiano para que as mulheres do seu país doassem suas alianças de ouro de casamento para ações do seu governo. Esta ação repetiu-se no Brasil por duas vezes, em 1932, quando São Paulo rebelou-se contra o governo de Getúlio Vargas e criou a campanha “doe ouro para o bem de São Paulo”, para levantar fundos para a revolução constitucionalista e depois, em 1964, quando da revolução militar, com a campanha “doe ouro para o bem do Brasil”. As camisas pretas, invariavelmente acompanhadas de porretes, que os grupos fascistas usavam na Itália, serviu de parâmetro para a criação, no Brasil, dos camisas verdes, integrantes do Partido Integralista, em 1930, “cujo lema era : Deus, Pátria e Família. Além do uniforme, camisa verde, o partido possuía simbologia muito rica. A saudação entre os membros era feita com a mão estendida para o alto, gesto complementado pela palavra indígena anauê”. (PARENTE, 1999. Pg. 21). O período de governo fascista foi inspirador de várias campanhas no meio rural, como a “Batalha dos Grãos”, para fins propagandísticos, e ,mais do que isso, assegurar o controle político nos meios camponeses. Em princípio, esta ação poderia ter sido parodiada no Brasil, no período da ditadura militar pelo ex-presidente João Figueiredo, que chamou para si a responsabilidade das ações no campo da produção agrícola, com o slogan “Plante que o João garante!”. É deste período igualmente na Itália, a campanha “Não tire o pão da boca do seu filho. Consuma apenas produtos italianos”, incitando o povo italiano a não consumir produtos importados e, com isso, fazer com que os produtos da Itália suprissem livremente o comércio, incrementando os empregos e os impostos, numa atitude de pouco diálogo comercial com países circunvizinhos. No Brasil, ações parecidas deram ao maior produto de exportação, o café, o apelido de “café do Brasil”, como marca registrada de um produto de qualidade, antes que ele perdesse em mercado, qualidade e força para países como a Colômbia, por exemplo. Foi igualmente no período de Mussolini que se criou o primeiro organismo formal para a administração dos recursos financeiros destinados a propaganda. A criação do Ufficio Stampa Del Capo Del Governo, em 1923 iniciou a organização de divulgação do governo que previa, além da implementação de recursos em jornais, emissoras de rádio, produção de filmes, 69Adolpho

Carlos Françoso Queiroz é Doutor em Ciências da Comunicação, pela Universidade Metodista de São Paulo, onde participa como docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e dirige o projeto de pesquisa sobre propaganda política no Brasil. É formado em publicidade e propaganda pela Universidade Metodista de Piracicaba. Tem o título de mestre em comunicação pela Universidade de Brasília. Foi presidente da INTERCOM, Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, 1993/94. Atualmente é editor da revista Comunicação e Sociedade, da UMESP e membro do Conselho Curador da INTERCOM.


152 eventos, espetáculos, artes, a homogeneização do discurso, a ponto de os responsáveis pela comunicação nas prefeituras municipais da Itália, serem designados e nomeados por este organismo. No Brasil, Getulio Vargas criou em 27 de setembro de 1939, o D.I.P., Departamento de Imprensa e Propaganda, com o intuito de garantir a intervenção do Estado brasileiro junto aos órgãos de comunicação. Mais tarde, a revolução militar de 64 criaria a SECOM, Secretaria de Comunicação, com objetivos similares de censurar os veículos descomprometidos com o regime e promover as benesses necessárias para que os veículos engajados pudessem ter créditos, empréstimos e anúncios para suas empresas de comunicação. Outra faceta do regime fascista foi incrementar o turismo, fazendo com que os cidadãos do seu país conhecessem, gratuitamente, pontos turísticos importantes da Itália, museus, centros culturais e recreativos, para com isso, aumentar a auto-estima da população. Ainda hoje no Brasil, escolares, sindicalistas e desassistidos conseguem em programas similares, conhecer centros culturais de referência a expensas do Estado. Benito Mussolini, na Copa do Mundo de 1934, realizada – e vencida! – na Itália, cuidou pessoalmente para que jogadores estrangeiros fossem naturalizados e sob o slogan “vencer ou morrer!”, disputar uma das Copas mais conturbadas da história. No Brasil do século XX, em 1970, o General Presidente Emilio Garrastazu Médici, utilizou-se igualmente do espaço político oferecido por uma Copa do Mundo, abriu ao país a transmissão de televisão em cores para este evento enquanto simultaneamente fazia descer aos porões da ditadura, inúmeros oposicionistas. Vencida a Copa pelo Brasil, Médici posou ao lado dos jogadores como autentico esportista, enquanto muitos morriam vítimas dos desmandos do regime militar. Objetivos da propaganda fascista Num grande seminário que promoveu, em 1977, em Vincenne, a historiadora Maria Antonieta Macciocchi, inventariou objetivos perseguidos pela propaganda fascista. Reproduzido no Brasil nos “Cadernos de Opinião” daquela época, as idéias gerais contidas nos dois volumes da obra intitulada “Elementos para uma análise do fascismo”, mostra que “o fascismo lançou-se infatigavelmente à conquista de três objetivos fundamentais: a obsessão racista, as mulheres e a questão dos intelectuais e das artes” (SOLLERS, 1977, pg.112), mostrando mais adiante que o racismo era o mais forte elemento que movia a propaganda fascista no período, vindo a seguir as mulheres, para quem a propaganda no período “mobilizou todos os meios possíveis para enquadrá-las numa dança sistemática, contando para isso com seus impulsos mais arcaicos, com efeito, as mulheres representariam um perigo revolucionário se fossem capazes de tomar consciência da derrocada da ideologia religiosa. Para as mulheres, por conseguinte seria esta a nova religião: o culto do chefe e dos heróis mortos, maternidade “em cadeia”. A dança histérica de Mussolini e Hitler, por exemplo, em volta da população feminina, é um dos mais espantosos capítulos desse cenário demente. Mortes – nascimentos, mortes – nascimentos, é preciso embrutecer inteiramente a todos os povos nessa equação acelerada. Aí está “a multidão viva e recolhida das mães e das viúvas dos desaparecidos” mergulhada hipnoticamente, no seu masoquismo de sacrifício, no seu gozo de renúncia. O fascismo – reivindicação viril e maternal, sangue e solo, pureza e asseio, verdadeiro homem e verdadeira mulher, se apresenta, então como encarnação fanática de uma normalidade, que vive de uma negação permanente de sexualidade. A série raça – família – partido – Estado é essa imensa máquina que esmaga o corpo por conta da mãe primordial, que funda uma fraternidade irrisória.” ( SOLLERS, 1977, pg. 112) Para difundir estes objetivos, Mussolini utilizou-se de extensa rede de jornais e revistas, do rádio, do cinema e especialmente das artes plás ticas. Ele próprio um jornalista e agitador político antes de assumir cargos políticos, transformou jornais como Il popolo d´Itália, Il Corriere Padano, Cremona Nuova, Impero, Il Corrieri italiano, entre outros, em parceiros e


153 aliados, ao mesmo tempo em que apenas três grandes jornais procuravam, em 1925, manter-se independentes das suas investidas : Il Mondo, La Stampa e Corriere della Sera. Em 5 de outubro de 1924 criou a Unione Radiofônica Italiana, URI, que passou a difundir seus discursos e ações políticas. Em 1925 criou a LUCE, L´Unione Cinematográfica Educativa, que “foi dividida em oito sessões, encarregadas, cada uma delas dos projetos de elaboração de filmes e documentários em distintos setores como a turismo, a agricultura, indústria, religião, cultura, assuntos militares, assistência social e assuntos exteriores. (PIZARROSO QUINTERO, 1990, pg. 322). E participou nos sets de filmagens de Scipião, o Africano, em 1937, de Carmine Gallone, considerado um dos clássicos produzidos durante o regime fascista. Para Heloisa Mattos, “a propaganda política observada no momento histórico entre dois conflitos mundiais teve como fator favorável a sua eficácia, além do clima propício à criação de um sentido de unidade nacional contra o inimigo externo, própria das circunstâncias de guerra e conflito, a possibilidade de utilizar os meios de comunicação, especialmente o rádio, a imprensa, o cinema e as publicações como mediadores desses valores e sentimentos” (MATTOS, 1989, pg. 7). Nesse sentido, a sociedade daquele período, na Itália, “passa a ser entendida pelos teóricos como conseqüência da industrialização progressiva, da revolução dos meios de transporte e do comércio e da difusão de valores abstratos de igualdade. Esses processos teriam provocado a perda da exclusividade por parte das elites que se vêem expostas à massa. O enfraquecimento dos laços tradicionais: família, comunidade, associações de ofício, religião, entre outros, contribuíram por seu lado, para afrouxar o tecido conectivo da sociedade e para preparar as condições que conduzem ao isolamento e a alienação das massas” (WOLF, 1987, pg.19) As táticas da propaganda fascistas estavam baseadas, pois nos seguintes princípios: a criação de um Estado Corporativo, construída sobre nacionalismos extremos, base imperialista com a necessidade de conquistar mais espaços de ação, preponderância em um culto à raça – baseado no desprezo às demais como negros, judeus, ciganos e muçulmanos, afastamento dos princípios da igreja católica, presença forte do líder/caudilho e, como ações no campo da propaganda, tínhamos a manipulação das massas, demonstrações de força e de poder, aplicação do terror e domínio da dialética e da oratória. Com estes ingredientes, o modelo e o governo avançavam. Aproximações deste modelo com ações desenvolvidas no Brasil Há, no Brasil do século XX, pelo menos três momentos de aproximação entre as técnicas da propaganda política fascista e governos/governantes destes períodos. No Estado Novo, com Getúlio Vargas, na Revolução de 1964 com os governos militares e, mais recentemente, nos anos 90, indiscutivelmente associadas à imagem pública do então presidente, Fernando Collor de Melo. Se, por um lado, Getúlio Vargas criou a figura do “marmiteiro”, trabalhador que levava comida de casa para o trabalho e através desta imagem mandou cunhar milhares de broxes de lapela para distribuir em suas campanhas eleitorais, Fernando Collor de Melo pretendeu acabar com os “marajás”, apelido dado aos funcionários públicos que recebiam salários muito diferenciados da maioria dos trabalhadores do Estado de Alagoas, que governou antes de ser candidato a Presidente da República. A exploração de símbolos abstratos e fortes, como “marmiteiros” e “marajás” surgem na esteira de criações das imagens do fascismo, como se fossem os camisas pretas a serviço de Mussolini para espancar, inspirar ódio pelo diferencial que representavam. Numa autocrítica que publicou na revista Manchete, nos anos 60, o jornalista Lourival Fontes, que foi o executor das ações de propaganda política no governo de Getulio Vargas nos anos 30, afirmou que “os erros e defeitos veniais de Getulio se esfumam no tempo, e só


154 aparecem, num balanço seguro, as perspectivas, as obras e as realizações. Previa e produzia, adiantava-se ao tempo, antecipava-se como um precursor às correntes cruzadas sob mundo. Os marcos do seu destino são monumentos que durarão. Só queria o Brasil maior e melhor” (MANCHETE, 21/1/1967). Fontes foi um precursor do moderno marketing político no Brasil. E provavelmente um dos primeiros profissionais a influir de forma tão grande num governo. Ou como se lembram alguns dos seus colegas, “o Lourival Fontes trouxe aquela filosofia de propaganda do Mussolini. Ele foi à Itália numa delegação de futebol, foi recebido por Mussolini e andou estudando tudo aquilo. Voltou de lá apaixonado pelo regime fascista, principalmente em relação às propagandas. Quando veio o golpe do Estado Novo, um golpe de características fascistas, ele se entendeu com Getúlio e resolveu então criar o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (DPDC) e nessa altura dos acontecimentos ele criou também a Hora do Brasil.” (PALMEIRA, 1985, acervo sonoro) O sergipano de Riachão das Dantas, Lourival Fontes “nasceu a 20 de julho de 1899 e aos quinze anos já colaborava com o Jornal do Povo de Aracaju e no Diário da Manhã.”(SOUZA, 1990, pg. 117). Depois disso mudou-se para Salvador, cursou até o terceiro ano do curso de Direito, tendo apoiado a eleição de Getulio Vargas em 1929/1930. Mais adiante em 1931, “fundou a revista de tendência fascista Hierarquia, ele que tinha grande admiração por Benito Mussolini, sendo correspondido pelo Duce que chegou a escrever na revista que no Brasil somente três pessoas conheciam muito bem o fascismo, sendo uma delas, Lourival Fontes.” (SOUZA, 1990, pg. 118). Posteriormente mudou-se para o Rio de Janeiro, onde no governo Pedro Ernesto, ocupou vários cargos públicos: “foi oficial de gabinete e secretário do prefeito, procurador dos feitos da Fazenda Municipal, diretor do departamento de turismo (setor encarregado de promoções esportivas como a corrida internacional de automóveis, a corrida hípica internacional, entre outras), diretor das Matas e Jardins, do Montepio Municipal, Secretário Municipal de Finanças e membro da Comissão de Orçamento da Prefeitura. Foi candidato derrotado à Assembléia Nacional Constituinte.” (SOUZA, 1990, pg.118/119). Se, num primeiro momento, a criação de um órgão público que controlasse as verbas publicitárias para jornais, revistas, emissoras de rádio, cinema e eventos, parecesse desnecessário, é certo que do ponto de vista ideológico, esta bem montada arquitetura no campo comunicacional, fez com que Getulio Vargas tivesse ampla base popular para manter-se no poder, em dois momentos, por quase 15 anos e se transformasse no mais citado e no mais referenciado presidente da república do Brasil, até os dias presentes. Outras ações, inspiradas na propaganda fascista, fizeram de Getúlio Vargas um expoente na comunicação. Sua presença constante em shows de teatro e rádio, seu sucesso como objeto de canções populares e carnavalescas. E mais do que isso, a idéia de colocar, como no regime fascista, uma foto do presidente em cada repartição pública, foram contribuições que Lourival Fontes aprendeu -- e pôs em prática – a partir de sua estada na Itália. Para Karla Amaral, “Getulio foi um criador de ilusões, que soube usar técnicas de teatro e o populismo para governar o Brasil com apoio das ações de comunicação”. (AMARAL, 2001, pg. 137). Em processos eleitorais para outros cargos públicos, ações de propaganda e frases de campanha, soam como ações de propaganda fascista. A saber: a estrela de xerife utilizada pelo candidato ao Senado, pelo PFL, Romeu Tuma, é um dos adereços importantes para revelar que a ordem deve ser mantida a qualquer preço. Especialmente por um político que fez sua carreira junto aos órgãos de segurança pública, eu que, certa feita chegou a afirmar que “bandido bom é bandido morto”. Outro momento lapidar dos slogans fascistas foi à máxima emitida pelo então candidato ao governo de São Paulo, Paulo Salim Maluf, em entrevista a jornalistas, declarando que os bandidos podiam “estuprar, mas não matar!”, elevando o


155 sentimento de revolta da população para o tipo de sensibilidade e compromisso que manifestava em suas campanhas. O Brasil na mira do fascismo Benito Mussolini igualmente desenvolveu muitas ações, com o objetivo de cooptar lideranças intelectuais, de políticos e de trabalhadores no Brasil. Nos seus primeiros anos de governo, nos anos 20, sua política externa não lhe deu muita visibilidade. Contudo, sobrevieram ações, especialmente dirigidas aos italianos emigrados nos vários Continentes, e aos seus filhos, nos anos seguintes. Aqui no Brasil a fundação do Instituto Ítalo Brasileiro de Alta Cultura passou a ter correspondência direta com o Instituto Colombo, de Roma, que desenvolvia política cultural de cooptação de intelectuais, jornalistas, distribuição de livros e financiamento de viagens de intercâmbio cultural. Nos anos 30, com a instituição do Ministério da Propaganda, “ao lado da potencialização dos métodos já conhecidos de conferências e distribuição de livros e publicações, o governo italiano começou a enviar grandes quantidades de artigos, fotos e material de propaganda para serem distribuídos para um bom número de jornais em todo o Brasil e há até algumas tímidas tentativas de colocar filmes italianos (como o “Camicia Nera”), em circuito comercial no Brasil.” (BERTONHA, 2000, pg.2) No Brasil, a mobilização da comunidade italiana em defesa do seu país de origem durante a guerra, atingiu plenamente os seus objetivos: “O uso de italianos do Brasil na batalha pela opinião pública na guerra teve, contudo, mecanismos mais diretos. De fato, não só filmes e documentários eram exibidos para o público brasileiro nos fasci all´estero e nos Dopolavoro como seções da Società Dante Aleghieri organizaram conferências e reuniões para explicar ao público local a justiça da guerra italiana. Além disso, publicações sobre a guerra fluíram para o público brasileiro através dos órgãos italianos no país e o próprio dinheiro para pagar os subsídios aos jornais brasileiros vieram de subscrições da guerra da colônia italiana de São Paulo.” (BERTONHA, 2000, pg.3). Além da distribuição maciça de material que alimentava os jornais e jornalistas brasileiros com informações sobre a propaganda fascista, “um órgão especial do MinCulPop,o escritório NUPIE, se encarregava de fazer propaganda anticomunista, enviando grandes quantidades de folhetos a respeito para o Brasil.” (BERTONHA, 2000,pg.3. ) Há inclusive nos arquivos do Ministério da Cultura Popular, dados oficiais de que 11.785 publicações foram mandadas para o Brasil, enquanto quantidades similares eram enviadas a todos os países da América Latina. No campo do rádio, foram dedicados esforços especiais para “programas como a Hora Italiana, inclusive com amplo fornecimento de discos e outros materiais vindos direto da Itália para a rádio Inconfidência de Belo Horizonte, em 1937; na Rádio Gaúcha de Porto Alegre em 1938 e na Rádio Cultura de São Paulo. Na mesma época, havia outro programa italiano na rádio PRA-5, de São Paulo, com o sugestivo titulo de Littorio enquanto no Rio de Janeiro, capital da República, há informes de uma Hora Italiana na Rádio Vera Cruz, de noticiário italiano sendo veiculado pela Rádio Club do Brasil e de retransmissão dos discursos do Duce pela Rádio Tupy ainda em 1939.” (BERTONHA,2000,pg. 5). Contudo, o esquema de propaganda fascista no Brasil não se limitava a mídia de massa. “O esquema de propaganda do fascismo usava também expedientes mais clássicos como exposições e pomposas visitas aeronavais, utilizadas pelo regime para alcançar o público brasileiro. Em relação às exposições, poderíamos nos referir, por exemplo, à participação italiana na Exposição do estado Novo em 1939 ou à grande mostra comemorativa dos cinqüenta anos da imigração italiana em São Paulo, em 1937, onde as maquetes sobre a conquista da Abissínia


156 e ilustrações sobre as grandes obras fascistas conviviam com tanques e tratores FIAT e que recebeu até uma mensagem especial do Conde Ciano, direto de Roma. “(BERTONHA, 2000, pg.6) Deve-se registrar igualmente que a propaganda cultural foi intensificada, com a cooptação de intelectuais e jornalistas para a concessão de honrarias, a troca de experiências entre professores universitários e a promoção de cursos de música, arte e idioma, como instrumentos de aproximação, cooptação de quadros e difusão da propaganda fascista no Brasil. Com a chegada da II Guerra Mundial, entre 1940-45, a propaganda italiana aliou-se ao nazismo alemão e manteve no Brasil suas estratégias de difusão de documentos, informações, fotos, programas de rádio e filmes, enquanto os aliados Estados Unidos, França e Inglaterra, cuidavam das ações de contrapropaganda. Com isso, aumentaram as dificuldades da presença das ações do fascismo italiano entre nós, a ponto de, em um relatório redigido em 1936, onde se analisavam os esforços da propaganda italiana no Brasil, dizia-se que “dos 224 artigos e 2235 fotografias enviadas naquele período, só 08 artigos e 35 fotos foram publicadas. Um sinal claro das dificuldades da propaganda italiana no Brasil.” Deu-se em seguida um grande declínio das ações de propaganda, por conta da falta de recursos, bem como da falta de percepção do governo italiano de que o Brasil era taticamente um país importante para estas ações. As negativas de setores da imprensa brasileira serviram para alicerçar uma certa independência em relação aos esforços feitos pelo governo italiano naquele momento. O fim do voto livre Após Getúlio Vargas, o Brasil viveu particularmente mais dois grandes momentos de dificuldades de expressão política. Uma ditadura militar, que durou 23 anos e um novo período de conquistas democráticas, sepultado por um impeachment. Entre 1964 a 1986, os generais presidentes que se sucederam no país, desfiguraram os procedimentos de livre arbítrio, fecharam o congresso nacional e conduziram políticas publicas à revelia da sociedade. O slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o”, estimulado pela Secretaria de Comunicação do Governo Federal, à época do general presidente Emílio Garrastazu Médici, foi talvez a síntese dos ensinamentos advindos do fascismo. Na mesma dimensão em que Mussolini fechava as portas da Itália para o consumo de produtos estrangeiros e estimulava a auto-estima e o isolamento do seu povo diante da Europa e demais Continentes, o Brasil do General Médici, com frases de efeito, pretendia silenciar as oposições que cresciam aos desmandos do regime militar, sugerindo-lhes que, se descontentes, deixassem o país para os que desejam a ordem e o progresso. E depois de duas décadas sem votar, quando aos brasileiros foi dado o direito de escolher um novo Presidente da República, a escolha recaiu sobre a figura de um jovem exjornalista e empresário bem sucedido nos campos da indústria da comunicação e do agronegócio. Fernando Collor de Melo, o jovem presidente eleito sob sofismas, que chamava os adversários para a briga, que lhes dava “bananas” em gestos feitos com os punhos cerrados e que repetia bordões aos modos dos fascistas, foi eleito por votação direta de forma surpreendente, mas ficou no poder pouco tempo, submetido a um “impeachment” que mobilizou a sociedade brasileira que lhe concedeu o voto. No entender de Ricardo Costa, “a campanha de Fernando Collor partiu de uma pesquisa do Instituto Vox Populi (1988) que apontava como atributos essenciais da preferência popular de um candidato a presidência: ser jovem 53,3% e combater marajás 64,2%. Desta forma, Collor subiu ao palco político com uma gama de traços visuais de juventude, de coragem e dinamismo, o que o identificava com os anseios do povo. O candidato Collor tinha o poder de


157 preencher estas lacunas que o tempo se encarregou de criar: corrupção, impunidade, entre outros.” (COSTA, 2001, pg.152). Conclusões A história da Propaganda Política no mundo confunde-se, em vários momentos, com os ditadores que a praticaram. A construção deste diálogo de aprendizados entre ações políticas no Brasil e o fascismo, a propósito da realização do Colóquio Brasil Itália, pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, enseja aos pesquisadores deste campo, um olhar atento sobre as influências mútuas neste diálogo. Inspirado nas práticas de Campos Salles e inspirador de ações que influíram no contexto brasileiro do início do século XX, Benito Mussolini faz das ações autoritárias, exemplos e seguidores. O Brasil dos integralistas, de Getulio Vargas e Lourival Fontes, o executor das políticas fascistas no Brasil, dos governos militares e, em especial, do governo Médici e, mais recentemente, do governo Collor, são talvez cópias insensatas das ações produzidas pela propaganda fascista na Itália dos anos 20 e 30. Entre os legados históricos da propaganda política contemporânea, parece-nos que os exemplos das várias formas de autoritarismo, sobrevivem com maior realce perante a história, do que propriamente as ações democráticas mais contagiantes e generosas. Trata-se de um capítulo importante a ser destacado, pesquisado e difundido, especialmente para que novas gerações de pesquisadores e políticos, a partir destes exemplos e das ações dele decorrentes, possam alimentar convicções democráticas mais duradouras, negando evidentemente o que de bem sucedid o houve num período em que a história – e os cidadãos destes tempos – gostariam de sepultar e esquecer. Referências bibliográficas AMARAL, Karla. “Getulio Vargas, o criador de ilusões”, dissertação de mestrado defendida na UMESP, 2000. BERTONHA, João Fábio. “Divulgando o Duce e o fascismo em terra brasileira, a propaganda italiana no Brasil, 1922-1943”. Revista de História Regional/ UNICAMP, volume 5, nº 2, 2000, páginas 1 a 25. CESAR, Afonso. “Vargas, 40 anos depois”. Editor Destaque, Rio de Janeiro, 1995. COSTA, Ricardo. “Fernando Affonso Collor de Mello, a projeção de um ilustre desconhecido”, dissertação de mestrado defendida na UMESP, 2002. ENSAIOS DE OPINIÃO, nº 22, volume 4, Editora Inúbia, Rio de Janeiro, 1977. MATTOS, Heloiza H.G. “Modos de olhar o discurso autoritário no Brasil (1969-1974): o noticiário de primeira página na imprensa e a propaganda governamental na televisão”, tese de doutorado, ECA/USP, 1989. PARENTE, Josênio Camelo. “ANAUÊ, os camisas verdes no poder”. UFC Editores, Fortaleza, 1999. PEROSA,Lílian Maria F. de Lima. “A hora do clique. Análise do programa de rádio Voz do Brasil da velha à nova República”. Editora AnnaBlume/ECA-USP, São Paulo ,1995. QUINTERO, PIZAROSO. “La história de la propaganda política”, Lisboa, 1990, pg. 322. SOUZA, José Inácio de Melo . “A ação e o imaginário de uma ditadura: controle, coerção e propaganda política nos meios de comunicação durante o “Estado Novo”, dissertação de mestrado, defendida na ECA/USP, 1990. WOLF, Mauro. “Teorias da Comunicação”. Lisboa, Presença, 1987.


158

QUARTA PARTE _________________________________ ÁSIA E ORIENTE


159

Propaganda na China: histórias e questões contemporâneas Adolpho Carlos Françoso QUEIROZ70 Aline F. LIMA Bruna Vieira GUIMARÃES Claudemir BERTUOLO Daniel Bernal GONZALEZ Ingrid GOMES Maria Carolina RODRIGUEZ Moisés Stefano BAREL Patrícia PAIXÃO Roseane PINHEIRO71.

Introdução A revolução cultural chinesa desenvolvida sob o comando do ex-jornalista Mao TseTung, foi apenas um dos passos que aquele país deu no sentido de construir uma propaganda política fortemente ideologizada, onde vários métodos de comunicação foram utilizados. Antes dele, Marco Pólo – o viajante veneziano, o general Sun Tzu e mesmo o contemporâneo Chu EnLai, dispensaram grandes parcelas de seu conhecimento e inteligência em favor da difusão da propaganda ideológica no país. Estudar estas contribuições à luz da moderna propaganda política que se desenvolve em outros cantos do mundo é perceber particularidades que se disseminaram pelo mundo das comunicações, ou que simplesmente foram absorvidas pelos chineses. A idéia deste artigo é apresentar um panorama calcado em bibliografia disponível para conhecer melhor a cultura chinesa e de que forma ela foi capaz de produzir um paradigma para o campo da propaganda política mundial. China – Império do centro, o início de uma civilização. A China foi conhecida como o Império do Centro, por causa da sua superioridade cultural, as férteis terras e as riquezas de seus cinco mil anos de história, que impulsionaram os povos da Ásia. Um descobrimento chinês que fomentou a cultura e a ciência tanto do Oriente como do Ocidente foi a imprensa, sem a qual não seria imaginável a civilização na Idade Média. No século X foram impressos pela primeira vez os clássicos confucianos e os cantos budistas completos em placas de madeira. Com a invenção do papel e da técnica da imprensa em blocos, os chineses não consideram Gutemberg como o inventor da imprensa com letras móveis, pois há quatrocentos anos, Pi Sheng conseguiu na China unir em uma forma letras de argila. Uma das conseqüências da criação da imprensa foi a expansão da literatura na China, sua escrita é composta de 64 hexagramas. A base do império era a agricultura, conforme decreto de 178 a.C. Desde o século VIII se abriu definitivamente o caminho do desenvolvimento de latifúndios particulares. O povo

Adolpho Queiroz é Doutor em Comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo, onde atua no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. 71 Aline F. Lima, Bruna Vieira Guimarães, Claudemir Bertuolo, Daniel Bernal Gonzalez, Ingrid Gomes, Maria Carolina Rodriguez, Moisés Stefano Barel, Patrícia Paixão e Roseane Pinheiro são mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UMESP. 70


160 pagava imposto em partes com seda. Apesar da extensão da China, o transporte terrestre era feito por cavalos, mas o principal meio era via fluvial. A China viveu várias dinastias, como a Shang (Yin); Zhou do Oeste e do Leste; Qin; Han do Oeste e do Leste; Três Reinos (wei, shu, wu); Jin do Oeste e do Leste; Dinastias do Sul e do Norte; Sui; Tang; Cinco Dinastias e Dez Reinos; até o período mais contemporâneo, quando ocorreram as dinastias, Ming; Qing e entre 1644 a 1911 a República da China e de 1911 a 1949, a República Popular da China de 1949 até os dias atuais. A arte de vencer na guerra e na propaganda política Uma segunda contribuição cultural da China é sua história acerca das estratégias para vencer as guerras, que se tornaram referências em diversos campos e atividades. No campo da política os preceitos apregoados pelo mais conhecido comandante chinês no Ocidente, Sun Tzu, autor do livro A Arte da Guerra, escrito há 25 séculos, nos inspira a compreender a trajetória da China. Os trezes princípios do comandante do período do general do Rei Wu (SUN TZU, 2005), condensados em sete por MCNELLY (2003), surpreendem pela atualidade: Na guerra, de modo geral, a melhor política é tomar um Estado intacto. Arruinando-o seu valor diminui (...) Porque obter uma centena de vitórias numa centena de batalhas não é o cúmulo da habilidade. Dominar o inimigo sem o combate, isso sim é o cúmulo da habilidade. Portanto, na guerra é de suprema importância atacar a estratégia do inimigo (SUN TZU, 2005, p.39). Formado pela 101ª divisão aerotransportadora do Exército, Mark Mcnelly, atualmente estrategista de Marketing da IBM, analisou as recomendações do comandante chinês à luz das principais guerras do século XIX e XX: conquistar o inimigo sem destruí-lo; atacar os pontos críticos do outro; aplicar a dissimulação e a previsão para coordenar implicitamente as ações do adversário; apostar na velocidade dos ataques e na concretização de idéias; fazer alianças estratégicas e ater-se a posições-chave, além de liderar pelo exemplo concreto e não pela imagem fugaz. A inteligência competitiva de Sun Tzu, segundo o estrategista da IBM, levou generais norte-americanos a ousar, a lançar mão de jogadas arriscadas e a enfrentar desafios, por exemplo, na Guerra do Golfo e nas operações militares para superar insurgentes e detê-los de surpresa. No plano político, os líderes comunistas que comandaram com êxito a chegada ao poder de Mao Tsé-Tung 72, em 1949, após embates internos contra forças conservadoras, personificam, em muitos momentos, os princípios ditados por Sun Tzu, embasando a arte de fazer política. Um dos principais nomes da equipe do timoneiro Mao, o revolucionário Chu En-Lai, primeiro ministro do Conselho de Estado e Ministro das Relações Exteriores, ajudou a acelerar o acordo entre União Soviética e China nos anos 50, projetou seu país no exterior e conseguiu o reconhecimento de várias nações, em plena Guerra Fria, época de choques e tensões entre os Estados Unidos e a União Soviética. No caminho à construção de uma integração nacional de uma China fragmentada por séculos de regionalismos internos seguidos por décadas de exploração por parte de potências mundiais, Mao e o Partido Comunista Chinês estabeleceram, após a revolução de 1949, dois modelos de estratégias comunicacionais: a de penetração cuja base de sustentação é o uso do Mão Tse-Tung foi um grande líder do Partido Comunista da China que além de liderar a Revolução do Socialismo chinês em 1949 exerceu forte influência na ideologia política na época, marcando o cenário social que se denota aos dias atuais com suas especificidades. 72


161 poder coercitivo, e identificação que buscava refletir os valores da sociedade e não o poder da autoridade política; ambas foram linhas condutoras pelas quais trafegaram as diferentes táticas de propaganda de 1949 a 1974. Para poder estabelecer um mecanismo eficiente de propaganda, as primeiras barreiras a serem superadas foram do idioma e do analfabetismo. Até o início da década de 50, a China não possuía um idioma oficial. Foi a partir da revolução que o governo implantou um programa de criação de um idioma para toda a China (1950- 1958), usando como matriz a “língua familiar” (putong-hua), que era um estilo de mandarim atualizado. A parte escrita chamava-se Pai-hua, que literalmente significa “língua vernácula em sua forma escrita”. Para isto desenvolveram-se programas de integração, passando principalmente pela integração geográfica (implantação de novas ferrovias e auto-estradas). Neste projeto de construção nacional, os meios de comunicação obedeciam três fundamentos: a) o da integração nacional; b) o da integração de desenvolvimento e c) o do enlace com a comunicação direta. Neste traçado de políticas de comunicação, o Partido Comunista Chinês - PCC implantou o Departamento de Propaganda do Comitê Central que ordenaria todas as linhas de comunicação; subordinados a este órgão encontravam-se quatro sessões principais: os departamentos de propaganda dos comitês regionais do partido, o Ministério de Cultura do governo, as Organizações de Massas e os Meios de Comunicação. Este departamento estava subdividido em 15 sessões e todas as atividades dele eram consideradas estratégicas e secretas. Pelas características político-ideológicas de Mao, todas as ações do departamento de Propaganda estavam sujeitas à palavra final do Grande Líder, como era conhecido Mao TseTung, do mesmo modo que os princípios nos que se estabeleceram os moldes da persuasão de massas: o isolamento, o despertar emocional, a simplificação e a politização. Além de buscar o apoio dos jovens, o PC desenvolve paralelamente um amplo esquema de repressão a opositores políticos e um culto à personalidade de Mao Tse-Tung. Foi ampliada a utilização de cartazes, faixas, folhetins, fotos, livros e outros objetos propagandísticos de Mao e de suas concepções para a China comunista. É editada ainda a “Carta dos Princípios da Revolução Cultural”, documento que continha 16 pontos a serem seguidos pela sociedade chinesa e para mobilização das massas em torno de Mao e do partido e a publicação do livro vermelho73. Rádio Considerando que a maioria da população, era analfabeta e predominantemente rural, o uso do rádio foi o principal meio empregado pelo Partido Comunista Chinês. Seguindo o modelo soviético os chineses organizaram sua rede de radiodifusão em três níveis operativos: a) central, controlado pela Emissora Central do Povo (rádio Pequim); b) a radiodifusão regional que consta de dois níveis, as redes de Emissoras do Povo provinciais e municipais; e c) local que constava de uma rede de emissoras. Ano

Nº emissoras

1949

08

Nº Autofalantes % de auto-falantes/emissoras 500

62,5%

O livro vermelho representou um forte poder midiático e um importante instrumento de proliferação da doutrina do marxismo-leninismo que se estendia como pano de fundo da proposta do Partido Comunista Chinês, além de ter usado na obra retóricas conhecidas da linguagem chinesa, e que intensificava o posicionamento de contraposição com os Estados Unidos e o Japão, reforçando o contexto de polarização entre esses países com a China. 73


162 1964

1975

6 milhões

3037,9%

Em conjunto, o sistema centralizado de radiodifusão, segundo Alan P. L. Liu, serviu de forma excelente ao regime comunista, pois remediou a irregularidade geográfica que existia na radiodifusão na época pré -comunista e rompeu a concentração urbana instalando sistema de fios nas zonas rurais Cartaz Segundo Stefan R. Landsberger, a imagem que costumava prevalecer na República Popular da China caracterizava-se pelas representações políticas disseminadas pela arte propagandística. Ao longo de sua extensa história o sistema político chinês utilizou as artes para propagar formas corretas de comportamento e pensamento. Num país com os níveis de analfabetismo que a China tinha nos anos 40 e 50, este método de visualizar idéias abstratas e de educar o povo apresentava resultados extremamente significativos. Os cartazes, de produção fácil e barata, tornaram-se um dos veículos privilegiados deste tipo de comunicação. Nos anos dos grandes movimentos das massas como “o grande salto pra frente” (1958 – 1960) e a subseqüente “Revolução Cultural” (1966 – 1976), quando milhões de pessoas foram mobilizadas para a ação, assistiu-se ao apogeu da produção dos cartazes. O cartaz atingiu o pico da expressão artística, tanto em termos formais como de conteúdo. Em especial durante a “Revolução Cultural”, a política pareceu sobrepor-se a todos os outros assuntos nos cartazes. O presidente Mao, na qualidade de Grande Professor, Grande líder, Grande Timoneiro e Supremo Comandante, pareceu tornar-se o único assunto permissível daq uela época. Segundo Stefan R. Landsberger estima-se que tenham sido impressos cerca de 2,2 bilhões de retratos oficiais de Mao durante a revolução cultural, o que corresponde a três por habitante.

O jornal O jornal, pelas características singulares do me io, foi um veículo pouco empregado pelo PCC. Embora as leituras públicas de jornal tivessem grande audiência, principalmente durante a campanha do Grande Salto Pra Frente e alguns auditórios chegassem a ter mais de 60.000 pessoas ouvindo as leituras. Para melhor aproveitamento deste veículo, o governo Chinês possuía 5 categorias de jornais: O Diário do Povo, órgão do Comitê Central, os jornais das organizações de massas (sindicatos, associações, liga comunista da juventude, agremiações profissionais, etc projetadas para mobilizar e controlar grupos sociais) como Diário de Kuang Ming, o Diário da Juventude Chinesa, etc, em terceiro lugar a imprensa institucional publicada pelos órgãos públicos, como escolas, fábricas, etc, a quarta categoria não possuía caráter formal e orgânico, eram publicações anteriores à Revolução, por último a imprensa militar que servia de propaganda política nos quartéis. Exemplo disto era o jornal Diário do Exército de Libertação. Cinema Embora, dividida em três centros de produção, o cinema chinês atendia amplamente à propaganda do partido. No geral, as funções do cinema não diferiam das do rádio ou do jornal


163 impresso. Durante todas as campanhas, o cinema foi uma mídia de grande apoio e ressonância no campo ideológico político, possibilitando um forte efeito de convencimento na população. Além da projeção em grandes salas, e auditórios pré-estabelecidos, a China usou das equipes de projeção móveis para garantir uma ampla penetração da propaganda cinematográfica. O processo de exibição constava de três etapas: a propaganda pré-exibição, debate improvisado durante as projeções e exposição de opiniões após a sessão. O uso eficiente da propaganda política durante todo o período estudado, deve-se principalmente ao fundamento da integração entre todos os meios, desde um simples cartaz cujo significado visual era mais importante que o textual, até as construções estéticas dirigidas por Shiang Shi na ópera de Shangai, passando pela construção de mitos populares pós-revolução, como o “espírito da Lei Feng”, cujo personagem, embora não provado, mais parece ter saído de um escritório propagandístico, que conduziu às campanhas de “aprender a Lei Feng” e a grande mobilização de massas em torno de temas nacionais como as campanhas de “Cem flores” ou dos “cinco Antis”. Mao Tse-Tung acreditava que a consolidação do regime comunista seria através da mobilização das massas camponesas. E a integração entre estas massas e o proletariado da incipiente indústria chinesa. Tv

A integração da televisão à sociedade chinesa se deu em quatro fases, demonstrando um processo de acessibilidade ao aparelho e de aculturação. O primeiro contato ocorreu em locais públicos e de trabalho, depois houve o período em que algumas famílias, com condições financeiras puderam adquirir um aparelho próprio, em seguida aponta-se a saturação dos lares urbanos com a televisão e, por fim, a transição dos aparelhos em preto e branco para coloridos. Este fenômeno gerou alteração no modo de vida do cidadão que passa a reestruturar o tempo, coloca-se frente à exposição e interpretação de um novo material simbólico e mais, muda sua orientação mental, até então direcionada por uma cultura e uma história marcantes. “A introdução da televisão nos lares das famílias chinesas talvez tenha sido o desenvolvimento cultural e político mais importante na República Popular desde o fim da Revolução Cultural”. (LULL, 1992, p.44). Mas então, o quê se podia ver na televisão chinesa? Naquele período predominavam os programas educacionais, como a Universidade pela televisão, também os programas de cidadão-modelo e de trabalhador-modelo, cuja proposta era destacar indivíduos com atitudes a serem copiadas pela sociedade. Os noticiários de televisão tinham como principal objetivo estabelecer a legitimidade do Partido Comunista, outras informações vinham dos noticiários internacionais da CCTV (China Chanel Television), órgão de televisão público. No entanto, o cidadão, o telespectador chinês, junto com os conteúdos transmitidos, percebia outras questões como o fato de a mídia ser incapaz de checar ou criticar o governo, das autoridades governamentais receberem um destaque excessivo e da voz do povo não se fazer ouvir (LULL, 1992, p.59). Apesar do controle do governo sobre o conteúdo e o formato dos programas da televisão na China, foi identificado em 1986, um marco na sua programação. Tratava-se do programa de doze capítulos, exibido em horário nobre em quase toda a China, o chamado “Xin Xing”, ou “A Nova Estrela”. O programa retratou a história sobre a modernização da China e apresentou uma crítica à pesada burocracia e às terríveis conseqüências sociais que isso provocou, refletindo muito bem as condições e frustrações vividas pelos operários e camponeses, que agora vivem nas cidades. Outro resultado da abertura política e da inserção da televisão na China na década de 80 foi a alteração dos padrões de comportamento e de cultura do povo, dando origem a uma política de comunicação e cultura ambíguas e mal aplicadas. A vinda da cultura ocidental com


164 todos os seus padrões e bens de massa (disco music, astros pop) promoveram tanto resultados negativos (consumismo, individualismo, materialismo, etc) como positivos (desenvolvimento do cinema e da publicidade chineses, preocupação com qualidade e estética, etc). Por outro lado, esta nova estética fez o telespectador chinês perceber a má qualidade das produções e conteúdos dos programas. Existiam freqüentes reclamações a respeito do ritmo tedioso das histórias, do exagero das reprises, dos horários irregulares e da falta de veracidade no conteúdo dos comerciais, desrespeitando o telespectador/consumidor. Este fenômeno tratava-se do direcionamento do olhar do telespectador para dentro e para fora da televisão chinesa, esta mídia tornou-se ponto de referência cultural, abrindo a mente em relação ao mundo, promovendo comparações e conhecimento de outras realidades. A Revolta da Praça da Paz Celestial, já citada, conflito mundialmente conhecido pela imagem do estudante desafiando um tanque do exército chinês, foi um evento resultante da combinação de acontecimentos políticos e midiáticos. Além dos canais de comunicação tradicionais dos estudantes (cartazes, charges, grafites, boca-a-boca, rádio pirata, alto-falantes, mimeógrafos, máquinas de escrever, correios, telefones públicos, panfletos, etc), também os jornalistas e diretores da tv aderiram à revolta, dando maior espaço e cobertura à revolução dirigida pelos estudantes universitários da China contra o sistema ditatorial do governo. O pósconflito, com a derrota e o massacre de muitos estudantes, levou a China a adotar um novo sistema de informação em relação à televisão. Aquilo que em algum momento, antes da Revolução, parecia ter uma abertura e um espaço mais flexível de informações, tornou-se fonte de total controle por parte do governo, direcionando uma propaganda ideológica contrária ao que de fato aconteceu naquela sociedade. “É muito difícil para qualquer pessoa determinar o efeito da propaganda. De fato, há algo a dizer acerca do poder da mensagem repetida” (LULL, 1992, p.153). No entanto, é fato que a televisão na China fez surgir uma nova sociedade, uma sociedade ligada em si mesma e no mundo. Pode-se concluir que, neste período – década de 80 e início da década de 90 – a televisão foi instrumento insuperável de informação, fórum político e cultural para a sociedade; também deixou muito claro qual era o papel dos emissores e dos receptores, que havia uma polissemia de mensagens e significados, apontando um modo muito específico de como o telespectador chinês interpretava e usava deste material simbólico.

China Contemporânea Com a morte de Mao Tse-Tung, em 1976, Deng Xiaoping assume o comando da China, dando início à política de modernização do país. Em 1978, Xiaoping lança o programa das Quatro Modernizações (agricultura, indústria, forças armadas, e ciência e tecnologia), associado ao capital internacional. Começa, assim, a construção do chamado socialismo tipo chinês. É nesse cenário que Jiang Zemin assume a presidência da República Popular da China em 1989, acumulando ainda os cargos de presidente da Comissão Militar Central da China e secretário-geral do Comitê Central do Partido Comunista. Analisando os discursos feitos por Zemin de 1989 a 2001, publicados no livro Reforma e Construção da China, verificamos que, em seu mandato, o presidente deu continuidade à política de modernização do país, iniciada por Deng Xiaoping. Uma das metas da propaganda ideológica no processo de abertura ao exterior era manter o espírito do socialismo, mesmo em uma economia de mercado em que os valores capitalistas do Ocidente penetrariam inevitavelmente (2002, p.478). Internet


165

A análise feita de notícias publicadas em jornais, revistas e veículos de Internet brasileiros e internacionais, de julho a setembro de 2005, permitiu o diagnóstico detalhado a seguir. A primeira notícia A decolagem da indústria chinesa de rádio e TV, de autoria de Adelina Lapa, foi veiculada no portal Observatório da Imprensa. No texto, que aborda os principais assuntos tratados no Colóquio de Comunicação da China e dos países de língua portuguesa, realizado de 4 a 17 de julho de 2005, em Pequim, Adelina Lapa mostra como a comunicação tem sido valorizada pelo governo chinês. Segundo a autora, o lema dos representantes do governo chinês durante todo o evento foi “Mostrar a China ao mundo e o mundo à China”. Também destaca que, apesar da ênfase na proteção aos produtos nacionais, a China vem redefinindo seu sistema de comunicação para divulgar ações do PCC e do governo, por isso, vem valorizando-o cada vez mais. O objetivo do governo chinês é adaptar a indústria da comunicação à crescente influência do sistema econômico de mercado. Mas o governo também dá indícios de que não fará nada de forma acelerada, o que demonstra uma preocupação com o controle da comunicação. A análise dos veículos de comunicação oficiais da China, aqueles comandados pelo governo Chinês, parece demonstrar realmente uma preocupação em “mostrar a China ao mundo”. Nas páginas de Internet dos principais veículos oficiais – o portal China Radio International, a Agência Xinhua, o Diário do Povo, o Diário da China e a CCTV – é possível notar uma atenção com o acesso de outros povos. O portal China Radio International, por exemplo, é oferecido em mais 43 versões, inclusive na versão língua portuguesa. É notável na análise das notícias desses portais, sobretudo, uma preocupação em mostrar uma China bastante positiva ao mundo. As notícias veiculadas têm, em sua maioria, um direcionamento positivo, mostrando feitos do governo chinês. Notícias negativas raramente são encontradas e o presidente chinês, Hu Jintao, normalmente aparece com uma imagem vencedora em banners e em outros recursos publicitários. A valorização dos meios de comunicação pelo governo chinês ainda é expressa no aumento significativo no número destes meios. Uma entrevista publicada em 4 de julho de 2005, no jornal Meio & Mensagem, com Shi Xuezhi, secretário-geral da China Adversiting Association (CAA), diz que de 1980 a meados de 1990 a China passou de 382 para 2.100 jornais; de 38 emissoras e retransmissoras de TV para mais de 2 mil; de 114 difusoras de rádio para mais de 1200 estações; ultrapassou o número de 9 mil publicações; e conta com 63 veículos de mídia aprovados e em funcionamento. Mas ao lado da valorização, sempre é possível notar o controle dos meios de comunicação. De acordo com Garcia (1982, p. 67), os meios de comunicação servem de instrumento para difusão da propaganda ideológica elaborada pelos grupos dominantes na sociedade e como arena para o embate ideológico de duas concepções de realidade diferentes. Quando os meios de comunicação são controlados pelo Estado, como é o caso da China, a versão dos fatos transmitida que passa a ser predominante é a do próprio governo. O embate ideológico é prejudicado e o governo tem nos meios de comunicação uma arma preciosa de propaganda política, para manter seu poder. Em nossa pesquisa, encontramos diversos exemplos de controle da comunicação, como forma de difusão da propaganda política do governo chinês. A matéria “Surto de gêmeos burla lei chinesa”, de O Estado de S. Paulo, de 6 de março de 2005, por exemplo, informa que as chinesas têm utilizado medicamentos de fertilização para terem gêmeos e, desta forma, burlar a lei chinesa que admite apenas 1 filho por casal, mas abre exceção para gravidez múltipla. Em contrapartida, o governo lançou forte propaganda ideológica na mídia estatal, que ficou conhecida como “Propaganda de terror”. A matéria diz que, “[...] Imediatamente, uma enxurrada de histórias de horror surgiu na mídia estatal visando convencer os casais a não assumirem esse


166 risco. [...] O Notícias de Yangcheng informou os leitores que uma mulher em Guangzou que tomou pílulas para fertilidade e, em vez de engravidar, sofreu tontura e vômito. Seu médico lhe avisou que ela poderia ficar estéril como punição por ter tomado o remédio”. Outra notícia que demonstra o uso dos meios de comunicação pelo governo chinês, como forma de difundir sua propaganda ideológica, é “China terá jogos ‘patrióticos’ de Internet”, publicada em 14 de setembro de 2005, pela Folha de S. Paulo. Segundo a matéria, o governo chinês previa formar uma parceria com a empresa de entretenimento Shanda Interactive Entertainment, cujas ações são cotadas na Bolsa americana Nasdaq, para produzir jogos de Internet protagonizados por heróis nacionais do país. Um dos protagonistas dos jogos, segundo a matéria, seria Lei Feng, soldado que o líder comunista Mao Tsé-Tung apontava como modelo devido à sua devoção incansável aos ideais do comunismo e ao seu senso de sacrifício pessoal em nome da causa. A Internet, aliás, é um dos meios de comunicação mais controlados pelo governo chinês. O veículo é visto como um perigoso instrumento para a população transpor as muralhas do controle político, conhecendo culturas de outros países e podendo mobilizar-se junto a outros povos. São muitas as notícias sobre prisões de jornalistas, inspeções em cyber-cafés e censura pelo uso “indevido” da rede mundial dos computadores. O curioso é pensar que todo esse controle acontece num país que conta hoje com cerca de 100 milhões de usuários de Internet, perdendo apenas para os Estados Unidos. A matéria “China restringe publicação de notícias na internet”, de 26 de setembro de 2005, da Folha de S. Paulo, por exemplo, fala de um pacote de medidas baixado pelo governo chinês que diz que os sites que quiserem publicar notícias no país deverão pedir aprovação do Escritório de Informação do governo local. Outra notícia, do portal português SAPO - “Blogues são censurados na China” - de junho de 2005, diz que a Microsoft auxiliou o governo chinês a censurar dos blogues do país as palavras "democracia", "liberdade", "direitos humanos", "comunismo", "socialismo", "capitalismo", "independência de Taiwan", "Tibete", "Dalai Lama" e "Tiananmen” (nome da praça onde ocorreu o massacre da Praça da Paz Celestial). O representante da Microsoft, Adam Sohn, assumiu a censura, nesta matéria, justificando-se: "Mesmo com os filtros, estamos a ajudar milhões de pessoas a comunicar, partilhar histórias e fotografias e a construir amizades. Para nós isso é que interessa". Uma matéria do portal Magnet, de setembro de 2004, também revela censura parecida, mas no portal Google News. Segundo a reportagem - “Google News cria sistema de autocensura na China”, após o lançamento do Google News naquele país, a empresa divulgou uma nota dizendo que iria excluir, voluntariamente, muitos sites que teriam sido banidos pelos censores da internet chinesa. Conclusão No cenário mundial, atualmente a China tem despontado como potência política – com assento no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas - ONU - e convergido o interesse das principais multinacionais do planeta. Porém, ao contrário de outras nações, no tabuleiro da política e na seara da economia, o governo chinês atua através de jogadas estratégicas, não divulgando ostensivamente seus armamentos e evitando conflitos por território ou recursos naturais. Por que uma nação milenar, comunista desde 1949, e que estreita seus laços com o Ocidente, age de forma tão eficiente e vem galgando posições de destaque no complexo e intricado processo de globalização? As estratégias de propaganda política desde esse momento foram anunciar o desenvolvimento econômico, atrair mais investimentos estrangeiros e diminuir a presença do Estado na vida privada dos cidadãos, apesar das ações enérgicas do governo comunista quanto


167 a temas delicados, como livre fluxo da informação e direitos humanos. Até onde os ensinamentos do comandante Sun Tzu podem ser aplicados em um panorama cheio de tantas teias é o principal questionamento que fica para os estudiosos da cena chinesa. Nesse sentido, conhecer a história dos principais personagens políticos chineses, bem como de seus principais meios de comunicação – o livro Vermelho, a rádio, os cartazes, a Televisão e hoje a Internet - possibilitou vislumbrar uma visão da função estratégica que esses instrumentos midiáticos tiveram na consolidação do Estado e da história chinesa, especialmente através da propaganda ideológica. Referências bibliográficas ALMOND, Mark. O livro de ouro das revoluções, movimentos políticos que mudaram o mundo. Ediouro. Rio de Janeiro, 2002. AVILA, Alisson. Meio & Mensagem. São Paulo, p. 6-7, 4 jul. 2005. BLOGUES são censurados na China. SAPO. Jun. 2005. Disponível em <http://dn.sapo.pt/2005/06/17/media/blogues_censurados_china.html>. Acesso em: 17 set. 2005. CHINA restringe publicação de notícias na Internet. Folha de S. Paulo. 26 set. 2005. Caderno Informática. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u19024.shtml> Acesso em 19 set.2005. Chinese Propaganda Posters, From The collections Michel Wolf with the enssays by Anchee Ming, Duo and Stefan Landsberger. Taschen books. Itália, 2004. CONY, Carlos Heitor e ALCURE, Lenira. As viagens de Marco Pólo. Ediouro: Rio de Janeiro, 2001. DICKIE, Mure. China terá jogos "patrióticos" de Internet. Folha de S. Paulo.14 set. 2005. Disponível em:< http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1409200537.htm> Acesso em: 10 set. 2005. GARCIA. Nelson Jahr. O que é propaganda ideológica. Editora Brasiliense, 6 ed. São Paulo,1986. GOEPPER, Roger. História de la cultura oriental – China, império del centro. Editorial Labor: Barcelona, 1968. GOMES, Flávio A. Um repórter na China. Editora Garatuja. Porto Alegre, 1975. HOBLER, Dorothy e Thomas. Os grandes líderes, Chu Em-Lai.Editora Nova Cultural, São Paulo, 1988. LAPA, Adelina. A decolagem da indústria chinesa de rádio e TV. Observatório da Imprensa. 16 ago. 2005. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=342AZL002 > Acesso em 29 ago.2005. LIU, Alan P.L. Comunicacion e intergacion nacional en la China Comunista. Editorial Gustavo Gilli. Barcelona, 1978. LULL, James. A China ligada: televisão, reforma e resistência. Tradução Fernando Rebello e Maria Claudia Coelho. Rio de Janeiro: Rio Fundo Ed., 1992. McNELLY, Mark. Sun Tzu e a Arte da Guerra Moderna. São Paulo: Record, 2003. PINSKY, Jaime & PINSKY, Carla Bassanezi (orgs). Faces do fanatismo. São Paulo: Contexto, 2004. POMAR, Wladimir. O enigma chinês. Editora Alfa Omega. São Paulo, 1987. REZENDE, Emerson. Google News cria sistema de auto-censura na China. Magnet. set. 2004. Disponível em:<http://www.magnet.com.br/bits/mercado/2004/09/0054>. Acesso em: 7 set. 2005. SUN TZU. A Arte da Guerra. Editora Martin Claret. São Paulo, 2005.


168 SHERIDAN, Michael. Surto de gêmeos burla lei chinesa. O Estado de S. Paulo. 6 mar. 2005. Caderno Internacional. TSE-TUNG, Mao. O livro vermelho. Edição : Fac-simile da versão em Língua Portuguesa das edições em Línguas Estrangeiras. Pequim, 1972. ZEMIN, Jiang. Reforma e Construção da China. Tradução da Rádio Internacional da China. Record. Rio de Janeiro, 2002.


169

O Estado de S. Paulo e a guerra do Iraque: um estudo sobre propaganda ideológica

Introdução

Adolpho QUEIROZ 74 Kleber CARRILHO Livio SAKAI Milton Pimentel MARTINS Patrícia POLACOW Victor Kraide Corte REAL75

Este artigo pretende analisar a cobertura da guerra do Iraque realizada pelo do jornal “O Estado de S. Paulo”. As observações foram feitas nos cadernos especiais editados pelo jornal entre os meses de março e abril, contemplando o período de 21 de março a 23 de abril de 2003. Para melhor compreender as contribuições do jornal naquele período, as edições foram observadas a partir de suas manchetes, textos noticiosos e opinativos, fotos, origens e procedências do material jornalístico, culminando com a realização de uma entrevista com o editor de assuntos internacionais do jornal, que ofereceu uma visão particular das dificuldades/facilidades para a realização desta cobertura. Por fim, o estudo contempla uma visão de propaganda ideológica, a partir da qual centramos nossa análise das principais matérias, assuntos e imagens oferecidas aos leitores naquele período; reservando-se para as considerações finais a nossa percepção de que a cobertura do evento foi facilitada enormemente em função da utilização de recursos noticiosos e opinativos oferecidos pelas principais agências internacionais de notícias do mundo. Metodologia Como aspectos metodológicos desse artigo destacamos os seguintes procedimentos. Primeiro, trata-se de um estudo descritivo e documental. Para Rudio (1999,71), “a pesquisa descritiva está interessada em descobrir e observar fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpreta-los”. E para Gil, a pesquisa documental (1987,pg.73) “assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica, e a única diferença entre elas está na natureza das fontes”. Segundo, procuramos fazer uma revisão de literatura breve que contemplasse estudos mais recentes sobre impactos da globalização na comunicação, sendo este um caso peculiar para estudo, destacando contribuições de Baudrillard, Chomski, Herman, Huntington, Martins Filho, Melo Neto, Porto, Ramonet e Schiller para compreendermos um pouco melhor a natureza do jornalismo globalizado. Em terceiro lugar procuramos apresentar, ainda que brevemente, uma faceta importante do jornal “O Estado de S. Paulo”, justamente o seu perfil editorial voltado para grandes acontecimentos internacionais, especialmente em tempos de guerra. O jornal tem disponibilizado aos seus leitores, historicamente, contribuições importantes e pluralistas tanto nos campos noticiosos, como opinativos nestes acontecimentos.

Adolpho Queiroz é Doutor em Ciências da Comunicação pela UMESP, Universidade Metodista de São Paulo, onde atua no programa de Pós-graduação em Comunicação Social. 75 Kleber Carrilho, Lívio Sakai, Milton Pimentel Martins, Patrícia Ozores Polacow e Victor Kraide Corte Real são alunos do programa de Pós- Graduação em Comunicação Social da UMESP. 74


170 Para tanto foram escolhidas 28 edições no período de 21 de março a 23 de abril de 2003, destacando-se a cobertura feita pelo caderno especial “2ª Guerra do Golfo”, que possuía em mé dia 12 páginas. Dentro delas, foram destacadas matérias noticiosas, opinativas, fotos e, especialmente, a sua origem (identificação das agências de notícias responsáveis pelo material e dos autores/correspondentes do material editado). No final, a equipe que produziu este artigo foi recebida pelo editor de assuntos internacionais do jornal, Paulo Nogueira, que não só esclareceu pontos fundamentais da cobertura, como ofereceu sua visão sobre dificuldades de confeccionar um produto com este tipo de conteúdo. No quarto momento do estudo, a partir dos dados empíricos recolhidos, procuramos fazer uma leitura de propaganda ideológica deste caderno, servindo-nos dos conceitos de Tchackotine, Domenach e Garcia, teóricos cujas contribuições tem sido objeto de reflexões no curso de “Marketing Político Internacional” do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UMESP. No bojo das conclusões a serem apresentadas está o nosso maior questionamento, direcionado a que, segundo o nosso juízo, foi a realização de uma cobertura jornalística à distância, subsidiada muito mais pelo trabalho de correspondentes internacionais e agências de notícias do que pela redação do próprio jornal estudado. Revisão de literatura A parte morfológica de nossa análise segue as linhas propostas por Kayser, que podem ser encontradas no livro “Estudos de jornalismo comparado” (Marques de Melo, 1972) e têm aplicação no estudo sobre a identidade da imprensa brasileira no final do século XX, de Marques de Melo e Adolpho Queiroz (1998) entre outros. Um dos conceitos centrais de nossa análise ideológica, encontramos em “Simulacros e simulação” de Jean Baudrillard (1991b); conceito que este autor considera na análise da primeira guerra do Golfo em 1991 e que define como “simulacro”. Refere-se às imagens irreais criadas pela mídia, que é quem em último caso define a cultura. Alijado de uma de suas funções mais elementares, o povo deixa de ser “sociedade” para tornar-se “massa”. O título da obra em que Baudrillard (1991a) analisa a primeira guerra do Golfo, “La Guerre du Golfe n´a pas eu lieu” – “A guerra do Golfo não ocorreu” – já sugere a análise que o autor faz do conflito: a guerra de 1991 foi um evento simulado. Waldenyr Caldas (2000) explica: Para ele, o excesso de informações das mais diversas procedências tem efeito oposto ao que se espera. Elas chegam todas ao mesmo tempo, narrando situações opostas e contraditórias acerca do mesmo fato. Justamente por isso é que para o autor houve pelo menos três guerras do golfo: uma divulgada pela mídia americana para todo o mundo, onde os Estados Unidos saíram vencedores; outra divulgada no Iraque e, finalmente, a verdadeira guerra que se deu nas linhas de combate. Não é à toa, portanto, que até hoje não sabemos o verdadeiro resultado daquele conflito. Baudrillard chega mesmo a dizer que a guerra vista em todo o mundo pela televisão não existiu. Nessa linha, Ignácio Ramonet (1999, p.49) analisa a censura da era moderna, identificando o discurso que aparece nesses eventos como “verdadeiros discursos de propaganda”: Vejamos a guerra do Golfo, por exemplo, que deu lugar, como se sabe, a fantásticas manipulações e a incríveis operações de censura, em suma, um verdadeiro discurso de


171 propaganda. Isso não aconteceu com base no princípio da censura autoritária. A mídia não disse: “Vai haver uma guerra e não vamos mostrá-la”. Pelo contrário, ela disse: “Vocês vão ver a guerra diretamente”. E ela mostrou imagens tais que todo mundo acreditava estar vendo a guerra, a ponto de ninguém compreender que não a via, que aquelas imagens mascaravam silêncios; que aquelas imagens eram na maioria das vezes falsas, reconstruções, enganações. Como de resto, coloca Ramonet (1999, p.27-8), ocorreu em todos os conflitos contemporâneos (Malvinas em 1982, invasão de Granada em 1983 ou do Panamá em 1989, guerra da Bósnia entre 1993 e 1996). Não entendemos que essa carga de informações seja sinônimo de democracia informativa. Nesse sentido, encontramos nos trabalhos de Schiller (1976), Beltrán (1982) Chomsky (2002) a base para pensar os problemas causados pela sobrecarga de informação produzida por poucos centros. Para Beltrán (1982, p.53): (...) o fluxo internacional de notícias na região [latino-americana] se encontra fortemente controlado, em todos os sentidos, pelas agências noticiosas norte-americanas. Apesar de operarem mediante critérios comerciais, estas empresas efetuam uma distorção na informação que parece ser orientada mais do ângulo político do que propriamente empresarial. Com freqüência, manipulam-se as notícias de forma a ajusta-las a uma situação de dominação política. A realidade apresentada à região, bem como a que ela projeta para além de suas fronteiras, tende a ser distorcida em benefício das posições políticas dos Estados Unidos. Para Schiller (1976, p.12), essas distorções não são pensadas exclusivamente para informar outras regiões que não os Estados Unidos. A dominação da informação deve controlar também a tensão interna, criada pelo “papel mundial de supervisão dominadora” Chomsky (2002) explica que Restrições à livre informação em países como os EUA dificilmente têm suas origens no governo; o que mais acontece é a autocensura, e de um tipo bastante conhecido. (...) No entanto existem alguns exemplos alarmantes dos esforços dos EUA para restringir o livre fluxo de informação no exterior. O mundo árabe conta com uma nova fonte, totalmente aberta, o canal via satélite Al-Jazeera, no Qatar, cujo modelo é a BBC, com enorme audiência por todos os países de língua árabe. É a única fonte que não sofre censura e que transmite um enorme volume de importantes notícias (...) O Al-Jazeera é, naturalmente, desdenhado e temido pelas ditaduras da região (...). Os EUA aderiram a esse “clube”. “O Estado de S. Paulo”, um jornal de guerras – breve histórico Nascida em 4 de janeiro de 1875, “A Província de S. Paulo”, que depois passaria a se chamar “O Estado de S. Paulo”, teve seu princípio ligado aos movimentos abolicionista e republicano. Redigido inicialmente por Rangel Pestana e Américo Brasiliense, por suas páginas passaram grandes nomes do jornalismo e da literatura nacionais, como Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Rachel de Queiroz.


172 A partir de 1902, passou a pertencer a Júlio Mesquita, patriarca da família que até hoje controla o jornal, e tornou-se conhecido como o grande órg ão político do Estado, que dava os primeiros passos para se tornar a região mais desenvolvida do país. Nos conflitos e embates políticos internos e externos, o papel do “Estadão”, como é conhecido, foi sempre muito destacado. Em suas páginas, apareceram as notícias sobre a guerra de Canudos, nos relatos de Euclides da Cunha, que deram origem ao clássico “Os Sertões”. Durante a Primeira Guerra Mundial, o jornal tomou uma posição contra o militarismo. Na política nacional, apoiou a candidatura de Rui Barbosa contra Epitácio Pessoa, em 1919, e, no final da década de 20, era um dos porta-vozes do partido democrático, que representava a oposição, apoiando o candidato da Aliança Liberal para a presidência. Já no governo de Getúlio Vargas, “O Estado de S. Paulo” foi um importante apoio para os ideais paulistas na Revolução Constitucionalista. Esse evento e outras animosidades com o presidente fizeram com que mais tarde, entre abril de 1940 e dezembro de 1945, sofresse uma intervenção do governo federal, quando a direção e os editores foram banidos. O conteúdo desse período até hoje é negado pela empresa como pertencente à história do jornal. Durante o regime militar, houve um grande controle do conteúdo pela censura prévia, o que fez com que fosse adotado um expediente muito lembrado até hoje: sempre quando uma matéria era reprovada e proibida de ser veiculada, era colocada no seu lugar uma parte do poema épico de Camões “Os Lusíadas”. Depois da reabertura democrática, período em que apoiou a campanha pelas diretas, o jornal passou a ser criticado pelos partidos de esquerda, que o acusavam de apoiar os candidatos adversários, como Fernando Collor, em 1989, e Fernando Henrique Cardoso, em 1994 e 1998. Atualmente, o jornal continua sendo um dos de maior circulação no país, com média diária de 400 mil exemplares e tem convênios com as agências Estado (pertencente ao mesmo grupo), AFP, Ansa, DPA, EFE e Reuters, e com os jornais The New York Times, Los Angeles Times, The Washington Post, The Times e The Sunday Times, além de contar com correspondentes na Europa e nos Estados Unidos.

Estudo empírico A partir da análise das 28 edições do Caderno Internacional de “O Estado de S. Paulo”, selecionadas no período de 21 de março a 23 de abril de 2003, foram coletados diversos dados quantitativos sobre a cobertura da “Guerra do Iraque”, titulada pelo jornal como “2ª Guerra do Golfo”. Os dados foram tabulados e possibilitaram a realização do estudo empírico que será apresentado a seguir. Primeiramente foi realizada a contagem do número de páginas dedicadas ao assunto da guerra no Caderno Internacional, tomando como ponto de partida a publicação do dia 21 de março de 2003, data na qual o jornal produziu 12 páginas sobre a entrada das tropas da chamada “Coalizão” no território iraquiano. Este caderno chegou a ter 14 páginas no dia 30 de março (Domingo), porém com o enfraquecimento da resistência iraquiana o assunto foi perdendo interesse, consequentemente o número de páginas publicadas sobre o conflito foi diminuindo, chegando na semana do dia 21 de abril a sair do Caderno Internacional e ocupar apenas 3 páginas no 1º Caderno do jornal.


173 Considerando a média diária de páginas do jornal “O Estado de S. Paulo” constatamos que das 28 edições pesquisadas, 16 tiveram o assunto da guerra representado dentre 10% a 15% do total das páginas publicadas. Tabela 1. Relação entre o número de edições de “O Estado de S. Paulo” com o número de páginas dedicadas a Guerra do Iraque, no período de 21 de março a 23 de abril de 2003. N° DE EDIÇÕES 01 08 05 08 02 01 01 02

N° DE PÁGINAS 14 12 10 08 06 05 04 03

O segundo passo, com relação ao estudo empírico, foi a sistematização das fontes das matérias e reportagens. Constatamos que 564 matérias foram elaboradas a partir de uma composição feita pelo jornal, tomando como fonte as informações fornecidas por suas diversas agências de notícias conveniadas. Essas matérias enquadram-se no gênero jornalístico informativo, conceituado por Marques de Melo e Queiroz (1998, p. 23) como sendo no caso do formato notícia um “relato integral de um fato que já eclodiu no organismo social”; e no formato reportagem um “relato ampliado de um fato que já repercutiu na sociedade e produziu alterações que são percebidas pela empresa jornalística”. As demais matérias publicadas neste período foram assinadas e categorizadas em três principais fontes: 1) Empresas jornalísticas norte-americanas (120 matérias); 2) Empresas jornalísticas inglesas (28 matérias); e 3) Correspondentes de “O Estado de São Paulo” (114 matérias). Por serem matérias assinadas, o próprio manual de redação do jornal as define como sendo passíveis de expressarem opinião pessoal. Marques de Melo e Queiroz (1998, p. 24) enquadram as matérias do gênero opinativo nas seguintes modalidades: artigo como “texto em que alguém, jornalista ou não, desenvolve uma idéia e apresenta sua opinião”; comentário como “texto feito, geralmente, por um jornalista de grande experiência, que não apenas acompanha os fatos na sua aparência mas também possui dados nem sempre disponíveis ao cidadão comum”; crônica como “texto de caráter mais literário, baseado em fatos reais ou imaginários e em experiências e observações pessoais do autor”; e finalmente editorial como “texto que expressa a opinião oficial da empresa jornalística diante de fatos de maior repercussão no momento”. A partir da leitura atenciosa destas matérias foi possível notar que muitas vezes, de fato, o responsável pela assinatura do texto deixa transparecer uma opinião bastante evidente sobre as informações transmitidas. Porém em outros casos, o autor adota uma postura exclusivamente informativa, não sendo possível detectar claramente sua opinião. Notamos também um fato curioso, não explicitado em momento algum do manual de redação do jornal, com relação a estratégia assumida pelo jornal, de colocar em itálico o título de algumas das matérias advindas das empresas jornalísticas norte-americanas e inglesas. O


174 número destas ocorrências é pequeno, mas foi possível perceber que nestes casos a opinião do autor é apresentada com muita ênfase. Apresentaremos a seguir os dados quantitativos referentes a estas matérias, consideradas opinativas pela definição de Marques de Melo e Queiroz, e pelas regras do manual de redação do jornal “O Estado de S. Paulo”. Tabela 2. Número de matérias tendo como fonte as empresas jornalísticas norte-americanas. FONTE The New York Times The Washington Post Los Angeles Times News Week News Day San Francisco Chronicle TOTAL

N° DE MATÉRIAS 62 32 19 4 2 1 120

Tabela 3. Número de matérias tendo como fonte as empresas jornalísticas inglesas. FONTE The Times Sunday Times The Guardian TOTAL

N° DE MATÉRIAS 6 6 16 28

Tabela 4. Número de matérias assinadas pelos correspondentes de “O Estado de S. Paulo” e o local de sua correspondência.

CORRESPONDENTE Paulo Sotero Lorival Santana Reale Jr. Roberto Godoy Gilles Lapouge Ariel Palacios Napoleão Sabóia TOTAL

LOCAL Washington Oriente Médio Paris Brasil Paris Buenos Aires Paris

Tabela 5. Relação do número de fotos das agências.

N° DE MATÉRIAS 33 21 20 20 11 06 03 114


175 AGÊNCIA Associated Press Reuters AFP NY Times AE France Press Outras TOTAL

N° DE FOTOS 152 125 117 21 7 2 7 431

Um dado importante, constatado através do presente estudo empírico, foi o fato de O Estado de S. Paulo ter feito toda a cobertura da guerra sem ter qualquer correspondente no território do Iraque durante o período da guerra. O jornalista mais próximo do local do conflito foi Lorival Santana, que produziu seus textos até o início do mês de abril, das cidades da Jordânia. Com a tomada de Bagdá, pelos exércitos da “Coalizão”, no 19° dia de conflito, e a declaração do final da guerra pelos Estados Unidos na segunda semana de abril, o jornalista Lorival Santana passada a enviar seus textos do Iraque, sendo o único mo mento em que O Estado de São Paulo passa a ter um corresponde na região onde o conflito já havia ocorrido. A propaganda ideológica Neste segmento a idéia é demonstrar de que forma as variáveis da propaganda ideológica, estudadas por Tchackotine, Domenach e Garcia, a saber, o controle ideológico, a difusão e a contrapropaganda, estiveram presentes na cobertura do jornal durante a Guerra. Percebemos, após a sistematização de dados, que o jornal O Estado de S.Paulo realizou a cobertura de uma guerra à distância. Com dificuldades econômicas para enviar correspondentes estrangeiros, preferiu adquirir material jornalístico de agências noticiosas textos, reportagens, artigos e fotos - e, por meio de sua editoria internacional, ampliou as discussões a partir da análise de convidados especiais: jornalistas com especialização em noticiário de guerras. A realização de uma cobertura jornalística, mesmo distante do campo de batalha sofreu todas as dificuldades enfrentadas por outros assuntos polêmicos, mas acabou por prestar um serviço importante à sociedade, no campo informativo e analítico. Tem sido assim historicamente nas coberturas de guerras. Mas, mesmo diante da conjuntura econômica desfavorável, a empresa se esforçou para produzir um caderno atualizado e coere nte. Do ponto de vista da propaganda ideológica, a cobertura do jornal alinha-se ao discurso favorável às ações militares desenvolvidas pelos estados unidos na caça ao "ditador" sadam Hussein, discurso esse incorporado pela maioria da midia ocidental.


176 Referências bibliográficas BAUDRILLARD, J. La Guerre du Golfe n´a pas eu lieu. Paris: Galilée, 1991a. BAUDRILLARD, J. L'esprit du terrorisme. Paris: Galilée, 2002. BAUDRILLARD, J. Simulacros e simulação. Lisboa: Antropos, 1991b. BELTRÁN, L.R., FOX, E. Comunicação dominada: os Estados Unidos e os meios de comunicação da América Latina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. CALDAS, W. As memórias finas e ferinas de Baudrillard. O Estado de S. Paulo. 16 de setembro de 2000. Caderno 2. CHOMSKY, N. 11 de setembro. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. DÁVILA, S. Diário de Bagdá: a Guerra do Iraque segundo os bombardeados. São Paulo: DBA Artes Gráficas, 2003. DOMENACH,J.M. A propaganda política. São Paulo, Editora Difel,1970. DORNELES, V. A revista imperialista – análise do discurso de Veja na cobertura dos preparativos para a guerra EUA X Saddam. In: XXVI Intercom, Belo Horizonte, 2003. CD-Rom do evento. GARCIA, N.J. O que é propaganda ideológica, São Paulo, Editora Brasiliense,1982 ( Coleção Primeiros Passos) GIL, A.C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5a. edição, São Paulo, Atlas, 1999. HERMAN, E. S.; CHOMSKY, N. A manipulação do público. São Paulo: Futura, 2003. HUNTINGTON, S. O choque de civilizações e a recomposição da ordem mundial. Rio de Janeiro: Objetiva, 1997. MARQUES DE MELO, J. QUEIROZ, A. Identidade da imprensa brasileira no final do século. São Bernardo do campo: Unesco /Umesp, 1998. MARQUES DE MELO, J. Estudos de jornalismo comparado. São Paulo: Livraria Pioneira, 1972. MARTINS FILHO, E. L. Manual de Redação e Estilo de O Estado de S. Paulo. 3ª ed. São Paulo: O Estado de S. Paulo, 1997. MELO NETO, F. P. de. Marketing do terror. São Paulo: Contexto, 2002. PIZARROSO QUINTERO, A. Historia de la propaganda. Madrid: Eudema, 1990. PORTO, S. D. (org). A incompreensão das diferenças - 11 de setembro em Nova York. Brasília: IESB, 2002. RAMONET, I. A tirania da comunicação. Petrópolis: Vozes, 1999. RUDIO, F.V. Introdução ao projeto de pesquisa científica, 26a. edição, Petrópolis, Vozes, 1999. SCHILLER, H. O império norte-americano das comunicações. Petrópolis: Vozes, 1976. TCHACKOTINE, S. A mistificação das massas pela propaganda política. Tradução de Miguel Arraes.Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,1967.


177

POLITICOM Elegeu sua primeira diretoria Ao chegar a sua VII Conferência Brasileira de Marketing Político em outubro de 2008, o evento, promovido pela Cátedra UNESCO/ UMESP de Comunicação para o Desenvolvimento Regional, aproveitou sua estada na cidade de Itu/SP, berço da República do Brasil, para a criação e posse da primeira diretoria da Sociedade Brasileira de Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing Político, POLITICOM. A entidade foi constituída tendo como objetivos promover a difusão do conhecimento no campo do marketing político, realizar seminários, congressos, cursos, publicar revistas, livros, integrar-se como rede científica de pesquisadores e profissionais e contribuir para o aperfeiçoamento do processo democrático no país. Fazem parte da primeira diretoria os professores Adolpho Queiroz, presidente (UMESP); Paulo D’Elboux, vice-presidente (Faculdade Anhanguera de Santa Bárbara d’Oeste); secretário, Victor Kraide Corte Real (PUCCamp e Isca Faculdades/Limeira); diretor científico, João Carlos Picolin (Faculdades Integradas Claretianas de Rio Claro); diretor de planejamento, Mauricio Romanini (Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé/MG); diretor editorial, Roberto Gondo Macedo (UMESP); diretor de relações interna cionais, Carlos Manhanelli (ABCOP); diretora de documentação, Ingrid Gomes (Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto); Diretora Cultural, Cláudia Serti Gouvea, diretores

regionais, Luciana Panke (Universidade Federal do Paraná Região Sul), Débora Tavares (Universidade Federal de Mato Grosso/Cuiabá, Centro-oeste), Sander Neves (Faculdade Metodista do Espírito Santo, Sudeste) Daiane Rufino(Nordeste) e Andréia Rego (Região Norte). Como membros do Conselho Fiscal foram eleitos os professores Jorge Vidigal (UNIMEP); Daniel Galindo (UMESP) e Bruna Vieira Guimarães (UNIP). Para o prof. Adolpho Queiroz, presidente eleito do POLITICOM, os próximos desafios da entidade são “a disponibilização do e-book lançado, contendo os melhores papers das seis conferências anteriores, a regularização jurídica, o início do planejamento para ações institucionais e realização de cursos presenciais e a distância em convênio com Universidades brasileiras, a preparação do próximo número da Revista Brasileira de Marketing Político, a avaliação dos sete últimos congressos e a organização da oitava Conferência Brasileira, que será realizada em outubro de 2009, no campus da UNITAU, Universidade de Taubaté.” Para Taubaté, a POLITICOM pretende aprovar formalmente seus estatutos em Assembléia Geral, bem como a temática e o local do próximo congresso.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.