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Vida

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Equilíbrio

Equilíbrio

CELSO GUTFREIND

MORANGOS AMIGOS

Terezinha Morango foi uma personagem folclórica da nossa cidade. Circulava por ruas, bares. E em Grenais, quando eu a vi, pela primeira vez. Também na segunda, na terceira, e assim por diante. Terezinha comparecia, ora de colorada (bem mais), ora de gremista (mais raro), ao sabor de seus próprios ventos, que sempre detinham a atenção das torcidas.

A nossa – digamos assim – amizade começou quando fui interno-bolsista do Hospital de Pronto Socorro, e ela vinha a todos os meus plantões. Entre tantos atendimentos “sérios” e “emergenciais”, poucos se dispunham a oferecer o que Terezinha pedia: atenção.

O futuro psiquiatra preferia estar com ela a suturar ou medicar, e nos tornamos – digamos assim – amigos. Ela conhecia a minha escala de atendimentos melhor do que eu e, nas madrugadas, sempre dava uma passada por lá, com aquela boca encharcada de batom vermelho e o olhar triste, em meio à estranha alegria que proporcionava.

Nem sempre as suas “visitas” eram calmas. Terezinha podia estar braba, com um impulso incontrolável de chocar o outro. Era capaz de dizer barbaridades, incluindo as de cunho erótico (ok, pornográfico), coisas picantes até mesmo para o quase adolescente que a acompanhava. Muito palavrão eu aprendi com ela.

Agora, eu já era residente em Medicina Geral Comunitária, uma espécie de pit stop para a psiquiatria. Toda sexta, fim de tarde, depois de uma semana corrida de atendimentos, presenteava-me com uma ida à livraria Sulina da Borges, para flanar entre a saúde dos livros. Porém, naquela sexta, deparei-me com uma multidão que rodeava um corpo caído, no calor do asfalto.

Livros adiados, percebi que era hora de mais um atendimento. Ao aproximar-me do corpo, deparei-me com aqueles lábios vermelhos, fosforescentes. Terezinha ergueu-se, em meio à fraqueza, e suspirou o meu nome.

Em seguida, tascou-me um beijo na face, que logo ruborizou, sob o efeito do batom e da vergonha. A cena foi mesmo um espetáculo, com direito a aplausos de uma plateia surpreendida.

Levei-a ao HPS, onde, desta feita, precisava algo mais do que conversa, pois uma tuberculose mal tratada já mostrava os seus efeitos daninhos. Despedimo-nos na sala 6 e nunca mais a vi.

Fiquei triste, anos depois, ao saber de sua morte, em meio àquele indizível de certas tristezas de quando perdemos alguém que não sabemos definir se um amigo, um paciente ou um familiar, talvez porque seja tudo ao mesmo tempo.

CELSO GUTFREIND É PSICANALISTA DE CRIANÇAS E ADULTOS E ESCRITOR

Bebida

rose Vinho

Uma onda cor de rosa invadiu as taças e transformou o vinho rosé no queridinho do momento. Descomplicado, leve, frutado, tem conquis-

tado apreciadores de todas as idades, com destaque para os jovens, e até celebridades, que não se contentam em apenas consumi-lo e o transformaram em negócio. Vai longe o tempo em que os rosés eram considerados de menor qualidade. Vinícolas em todo o mundo têm se dedicado a produzir ótimos exemplares. E não é diferente por aqui.

POR BETE DUARTE

Bebida

Num país tropical e quente como o Brasil, o rosé merece mais oportunidades. E elas têm sido dadas: só no ano passado, o consumo da bebida cresceu 30%. E a promessa é de um crescimento muito maior, porque são ideais para a estação. Muitos são os fatores que contribuem para o fenômeno. A começar pela cor, que ajuda a aguçar o paladar, além de remeter a lazer, verão, férias, descontração. Pesquisadores garantem que os tons de rosa deixam o cérebro em um bom estado de ânimo. O sabor frutado é outro fator-chave para a boa aceitação da bebida. Os rosés trazem a leveza, o frescor e o toque frutado dos vinhos brancos e, ao mesmo tempo, apresentam a estrutura e uma delicada adstringência dos tintos. O que os torna curingas na hora da harmonização com comida.

Se você cansou de discursos complexos sobre o vinho, aromas e outros quetais, a opção pode ser um rosé. Um vinho para tomar gelado, à beira da piscina ou do mar, em um bar acompanhando petiscos ou mesmo durante uma refeição com pratos leves ou de peso médio.

Não pense que os rosés são todos iguais. Eles têm pesos variáveis. Os mais clarinhos costumam ser frutados e delicados. Alguns têm cor mais intensa e são mais estruturados. Outros são um pouco frisantes. Tem os secos e os com um leve toque de doçura. Os preços também variam. Vale considerar que os produtos nacionais oferecem uma boa relação custo x benefício. Ainda mais quando a safra deste ano está sendo considerada excepcional.

Como escolher

Depois de todas essas informações, talvez você fique em dúvida sobre qual rosé comprar, por isso a sommelière Andreia Milan, diretora na Associação Brasileira de Sommeliers do Rio Grande do Sul, oferece algumas dicas de como selecionar a bebida que mais pode agradar a seu paladar.

PELO ESTILO

LEVES Refrescantes, delicados, alegres e descontraídos. Na cor, predomina um tom claro. Aromas frescos e delicados de frutas e flores. Os com uva Moscato têm toque floral. No paladar, expressam frescor e acidez marcante.

ENCORPADOS Frutados, estruturados, densos, com taninos delicados. Apresentam cor cereja. Aromas de frutas vermelhas (como cereja, morango, framboesa) e frutas negras (como ameixa e figo), podendo apresentar também aromas florais e de especiarias.

PELA NACIONALIDADE

FRANCESES A Provence faz os melhores vinhos rosés do mundo, destacados os da Côte de Provence e os Bandol. Dos cerca de 160 milhões de garrafas de vinho produzidas na região, 88% são rosés. As uvas mais utilizadas são Grenache, Cinsault e Mourvedre, o que resulta, em geral, em um vinho com sabor leve e agradável, e sobressaem pelo frescor, devido à acidez acentuada. Também destacados os produzidos ao sul do Vale do Rio Rhône, principalmente os de Tavel. Os da Provence costumam ser secos, delicados, frutados, aromáticos, com tons pálidos, salmão ou casca de cebola. Os do Loire são mais adocicados e com coloração vigorosa.

ITALIANOS Os rosés estão consagrados no país. A Toscana tem produzido belos exemplares a partir das uvas Sangiovese. Na região do Lago de Garda, a uva Groppello é um ícone na produção de rosés especiais. No Alto Ádige, são excelentes os com as uvas locais Moscato Rosa e Lagrein.

ESPANHÓIS O consumo desse vinho sempre esteve em alta na Espanha. Os destaques são os das regiões de Rioja, Navarra e Penedés. As uvas são a Garnacha, Tempranillo e Merlot.

PORTUGUESES Foram responsáveis por aumentar drasticamente o consumo de rosés no Brasil, conquistando os consumidores, ajudados pela importação direta e preços acessíveis. Destaque para os produzidos no Douro, Entremadura e Ribatejo. Costumam ser blends (diferentes uvas) ou varietais de Touriga Nacional.

SUL-AMERICANOS Têm cor e corpo mais intensos do que os rosés franceses e muitos deles chegam a se parecer mais com vinhos tintos. São ótimos para quem gosta de produtos mais encorpados.

BRASILEIROS O país está entre os 20 maiores produtores de vinho rosé. Algumas vantagens dos produtos brasileiros: elevada acidez, o que é essencial para esse estilo de vinho, além da excepcional safra deste ano e a excelente relação custo x benefício.

PELA UVA

PINOT, GRENACHE E MERLOT Originam rosés mais leves e claros. Tonalidade de pétalas de rosas e casca de cebola.

SANGIOVESE, MALBEC E SYRAH Para quem gosta de vinhos mais encorpados. Com cor mais escura, como morango e cereja.

CABERNET SAUVIGNON Origina vinhos de acidez agradável e bom corpo, mas têm características diferentes de acordo com o terroir onde a uva é plantada.

TEMPRANILLO Vinhos aromáticos e bem estruturados.

PELA QUANTIDADE DE AÇÚCAR

SECO O que contiver até 4 g de açúcar residual.

DEMI-SEC OU MEIO SECO O que tiver mais de 4 g e até 25 g de açúcar residual por litro.

SUAVE OU DOCE O que tiver mais de 25 g e até 80 g de açúcar residual por litro.

PELA SAFRA

Os vinhos rosés são delicados, frescos e leves, por isso, para que se possa apreciar plenamente suas características, quanto mais recente o envase, melhor. Prefira as safras com até 3 anos, e quanto mais jovem, melhor.

Bebida

Com que harmonizam

Os rosés são considerados curingas. Se na hora de acompanhar um prato há dúvida se o melhor seria um branco ou um tinto, opte por um rosé. Algumas dicas podem ajudar na hora da decisão.

AVES As regras mais gerais costumam indicar vinhos brancos para carnes brancas e tintos para carnes escuras. No entanto, se o rosé for resultado de uvas tintas vinificadas como brancas, tem acidez para cortar a gordura das aves. A maioria não tem quantidade significativa de taninos, o que poderia atrapalhar a harmonização. Na dúvida entre branco e tinto, fique com o rosé.

CARNES VERMELHAS Quem disse que os rosés não acompanham carnes vermelhas? O cuidado deve ser em escolher os mais encorpados. Fazem boa companhia para carne assada, filé grelhado, picadinho e até ossobuco. O tradicional carreteiro não tem muita gordura e ainda conta com o arroz (carboidrato), que pede fruta no vinho, o que torna o rosé a opção perfeita.

CARNE Ceviche e tartar – Os rosés de corpo médio aguentam bem a textura das carnes cruas. Têm acidez que equilibra os temperos de sabor intenso.

COMIDA JAPONESA Grande parte dos pratos da culinária japonesa tem sabores delicados que precisam de vinhos igualmente leves e delicados, por isso, fique com vinhos e espumantes rosés. A acidez dos espumantes rosés ressalta o sabor dos peixes nos sushis e sashimis e contrabalança o adocicado do arroz no sushi.

CULINÁRIA ASIÁTICA Vinhos rosés enfrentam bem a profusão de sabores e temperos da cozinha asiática. Têm pouco tanino, são leves, sutis, menos ácidos que os brancos e mais frutados, trazendo riqueza à harmonização. Combinam com arroz e curry não muito apimentado.

FRUTOS DO MAR Uma harmonização quase infalível é com camarões. Pode ser no bobó, no risoto ou na moranga, vai sempre bem, fazendo perfeita companhia a um vinho leve. Com salmão grelhado, polvo ou com paella, o corpo pode ser médio.

MASSAS O estilo do rosé terá mais a ver com o molho escolhido. Quanto mais leve o molho, mais leve o vinho. Quanto mais pesado, mais encorpada a bebida.

PATÊS E TERRINES Esses vinhos têm a capacidade de contornar sabores mais pungentes e também os mais delicados.

PETISCOS FRITOS Pastel, batata frita, coxinha, bolinho de bacalhau e lulas à dorê pedem essa companhia.

PIZZAS Os mais leves fazem boa parceria com a pizza margheritta e com a de abobrinha. Os mais encorpados, com as de pepperoni e calabresa, equilibrando o sal dos ingredientes mais curados. Se os ingredientes forem muito gordurosos, opte pelo espumante rosé.

SALADAS Os rosés leves, e até os com um toque frisante, vão bem com saladas. Inclusive as com queijos frescos, como a burrata, a ricota. O cuidado necessário deve ser com o vinagre, que pode atrapalhar a harmonização.

SOBREMESAS Aqui, a opção fica com os espumantes. O Moscato rosé combina muito com morangos e com macarons.

TÁBUA DE FRIOS Se para o vinho branco pode faltar potência, e para o tinto sobrar, o rosé é uma boa escolha. Um espumante rosé, então, seria ainda mais perfeito. Harmoniza e limpa o sabor dos embutidos, a acidez não conflita com picles e geleias. Com queijos, sustenta a textura dos mais frescos e equilibra o sal dos mais curados.

VEGETARIANOS Nada de deixar de lado os vinhos, o rosé vai harmonizar bem com receitas com abóbora, cenoura, tomate, feijão branco, lentilha. Com ratatouille fique com os leves.

Bebida

Taças famosas

Não seria exagero dizer que o rosé é o vinho das celebridades. E não apenas porque gostam de tomá-lo. A moda começou com Brad Pitt e Angelina Jolie. Não que sejam rótulos com nomes de celebridades, mas sim negócios nos quais estrelas de cinema e astros da música pop são proprietários, sócios ou parceiros. Além do glamour, os artistas buscam retorno financeiro, uma vez que os rosés têm vendido muito bem em todo o mundo.

BRAD PITT E ANGELINA JOLIE Em 2012, na época como casal, lançaram o Château Miraval, com uvas da propriedade que compraram na Provence. O vinho foi um sucesso imediato, pela qualidade, beleza da garrafa em forma de sino e pela fama dos produtores.

CAMERON DIAZ A atriz, em sociedade com a amiga e empresária de moda Katherine Power, produziu na Provence o Aveline Rosé, orgânico e de produção vegana.

SARAH JESSICA PARKER A atriz de Sex in the City apresentou em maio de 2020 o Invivo X, em parceria com a vinícola Chevron Vilette, que tem vinhedos na Provence, e a neo-zelandesa Invivo & Co.

SBON JOVI Com o filho Jesse Bongiovi costumava passar as férias nos Hamptons (ponta chique de Long Island, em Nova York), onde participava com outros milionários do grande consumo dos rosés à beira da piscina, e logo surgiu a ideia de lançar o próprio vinho. Em parceria com Gérard Betrand, produtor de Langedoc, colocou no mercado o Hampton Water. Sucesso absoluto.

STING Comprou uma propriedade na região de Chianti, na Toscana, onde produz ótimos tintos. Mas também se dedicou a um rosé, o Beppe, que homenageia um funcionário antigo da vinícola.

POST MALONE O rapper americano vendeu 50 mil garrafas do seu rosé francês, o Maison nº 9, em apenas dois dias de pré-venda.

JOHN MALKOVICH O vinhedo de onde saem as uvas para produzir o Les Quelles de la Costa Rosé fica na vila medieval de Lacoste, onde viveu o Marques de Sade. Malkovich tem uma propriedade na região, e a família mora ali boa parte do ano.

Espumantes

Os brasileiros costumam associar espumantes a festas. Os rosés viriam, então, dar mais colorido para essas ocasiões, seriam uma provocação para os sentidos. Porque, além do frescor, da vivacidade e das borbulhas, têm grande potencial gastronômico. Os rosés brut fazem bonito servidos como aperitivo, como ingredientes de drinks e como parceiros de pratos que exigem acidez e alguma potência. Os moscatéis, por sua vez, caíram no gosto dos brasileiros e enfrentam muito bem sobremesas, principalmente as de frutas vermelhas e os sorvetes.

PARA VALORIZAR O FRESCOR E A LEVEZA DOS ROSÉS, O IDEAL É QUE SEJAM SERVIDOS EM TEMPERATURAS MAIS BAIXAS. OS MAIS LEVES E OS DE CORPO MÉDIO PEDEM TEMPERATURA ENTRE 8 E 10 GRAUS. OS ESTRUTURADOS, ENTRE 10 E 12 GRAUS.

COMO SERVIR

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