Preludio 20

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Prelúdio 20

O ATO SEXUAL Antonio Quinet No programa de televisão VARIAÇÕES FREUDIANAS a apresentadora Miranda de Souza entrevistou o psicanalista Davi Wunschmann que foi convidado para fazer nesse famoso talk show uma participação especial na semana em que o programa se dedicou ao tema " O ATO".

MIRANDA: E agora, neste bloco vamos conversar sobre um tipo de ato que interessa a todo mundo. O ato sexual. E ninguém melhor para falar sobre esse assunto do que um psicanalista. Nos dias de hoje, com a liberação sexual, esse ato há muito tempo não é mais vinculado à reprodução da espécie como era apregoado por algumas religiões, como, por exemplo, a religião católica. E com a emancipação feminina ele se tornou assunto de todos: homens e mulheres. O que a psicanálise tem a dizer sobre esse ato tão almejado e tão problemático? DAVI: A psicanálise não se interessa pelo ato sexual. Só por seus impedimentos: a impotência, a frigidez, o nojo, a indiferença, o temor e a culpa. Aí, advém o sintoma: um substituto do ato sexual. Freud dizia que a vida sexual do neurótico é o sintoma. MIRANDA: Porque as pessoas chamam ato sexual de “fazer amor”? DAVI: Por hipocrisia, pudor ou engano. A união do sexo com o amor não é obrigatória, é sorte. MIRANDA (desconcertada): Amor sem sexo e sexo sem amor. A gente sabe disso. Mas não é horrível? DAVI (contundente): Miranda, é melhor saber que é isso é contingente, do que ficar à espera de um príncipe encantado que seja um sex symbol. MIRANDA (para o público): Mas a gente espera, né? DAVI (diz sem querer): Azar o seu! MIRANDA (indignada): Como??!?! DAVI: Desculpe, eu queria dizer que pode dar azar e isso acontecer, tem várias mulheres que conheço que esperam... MIRANDA (conciliadora):


Mas, quando as pessoas se amam têm vontade de ficar junto, tão junto que acaba no sexo, não? DAVI (bonzinho): Claro, você tem vontade de ficar juntinho, dormir de conchinha, penetrar, ser penetrada, até que os dois se dissolvam na unidade do amor. (menos bonzinho) Mas até hoje nunca se viu dois virarem Um. MIRANDA: Mas no ato sexual com amor não acontece isso? DAVI: Mesmo quando os dois têm orgasmo juntos não há essa fusão! No depois, o que acontece? Cada um cai para um lado: o homem fica com a detumescência e a mulher desorientada. MIRANDA (desafiante): Por que as pessoas confundem tanto amor e desejo sexual? DAVI (neutro): Por que querem ser amadas. Mas nem o desejo do seu parceiro por você nem o gozo dele na cama são sinais de amor. MIRANDA: E o amor? Não tem nada a ver com isso? DAVI: Tem, claro! O amor pode elevar o sexo aos píncaros do prazer. MIRANDA: Então, nesses casos acontece aquela comunhão dos dois, não é? DAVI: Miranda, o ato sexual testemunha o fracasso de um atingir o outro. Você vai para a cama é com a sua fantasia! MIRANDA (perplexa): Então, Davi, você quer dizer que quando vou para cama com meu marido é uma fantasia? DAVI (explicando): A mulher é capaz de tudo! Faz todas as concessões para ser objeto da fantasia do homem. MIRANDA (atacando): E o homem? DAVI (nervoso): É mais difícil. A mulher é mais desdobrável. (conciliador) Mas uma coisa é certa: na hora da cama não há demarcação sexual - cada um pode ser sujeito, objeto, "homem", "mulher", gato, sapato... Freud dizia que toda relação sexual de um casal é, na verdade, entre quatro pessoas. MIRANDA (cortante): Vamos terminar por aqui que essa cama já está cheia demais. Nossos comerciais!


Da peça "O ATO"


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