BOPP BRILHO
Com a globalização, ei-nos projetados para o “pós-cidade”, para o “pós-urbano”. Na Europa, estávamos habituados a ver a cidade como um espaço circunscrito no qual se desenvolve uma vida cultural, social, política, tornando possível uma integração cívica dos indivíduos... Somos agora confrontados de um
As cidades do escritor e do engenheiro urbanista • Antagonismos de Paris e Londres • Nova York, ou a arte do intervalo • A cidade como libertação • A cidade palimpsesto (as Tóquios de Claude Lévi-Strauss) • O transeunte, a mulher e o estranho • O spleen do flâneur: entre solidão e multidão (Baudelaire e Edgar Allan Poe) • O homem suspenso em Chicago: uma exterioridade carente de interioridade (Theodore Dreiser e Saul Bellow) • A polis, teatro do verbo e da ação gloriosa • A república cívica do Renascimento • Uma dinâmica de privatização e de separação • Genealogias do urbanismo (Françoise Choay) • Alberti, Haussmann, Cerdà • Urbanismo e arquitetura: de Thomas More aos CIAM • O arquiteto e as máquinas celibatárias • Roturas do tecido urbano e inversões da relação privadopúblico • A cidade genérica e a apologia do caos (Rem Koolhaas) • A multiplicação das megacidades • A Europa à margem • A indiferença generalizada (Karachi e Calcutá) • Autodestruição e dejeção (Los Angeles e a favela) • O Cairo, uma metrópole sem classe média? • Buenos Aires, a classe média ao abandono •
A CONDIÇÃO URBANA
nasceu em Paris em 1951. Estudou letras e antropologia na Universidade Paris VII e história e filosofia na Sorbonne, nesta última empreendendo o primeiro estudo universitário sobre Lévinas na França. Diretor da revista Esprit desde 1988, é autor de uma trilogia sobre as paixões democráticas: La Peur du vide (1991), La Violence des images (1997) e Éclats de rire (2002), e ainda de Face au scepticisme: Les Mutations du paysage intellectuel (1998), entre vários outros. olivier mongin
Reinstituir a cidade, recriar limites • A refundação megapolitana • A utopia urbana
OLIVIER MONGIN
A CONDIÇÃO URBANA
como enredo coletivo (Alberto Magnaghi)
OLIVIER MONGIN
A cidade na era da globalização
Tradução
Letícia Martins de Andrade
lado com metrópoles gigantescas e sem limites, e de outro com o surgimento de entidades globais, em rede, cortadas de seu ambiente. A reconfiguração que ora ocorre suscita inquietação: iremos assistir ao declínio irremediável dos valores urbanos que acompanharam a história ocidental? Prevalecerão inelutavelmente a fragmentação e o estiramento caótico? Estaremos condenados a lamentar a polis grega, a cidade do Renascimento, a Paris das Luzes, as grandes cidades industriais do século XIX?
Natanael
Relembrando os elementos distintivos que compõem a experiência da urbe, Olivier Mongin assenta os fundamentos de uma reflexão atual sobre a condição urbana. Vivemos numa época na qual a informação se troca de forma imaterial, mais de acordo com os fluxos do que com os lugares: como, nessas condições, refundar e reformular espaços urbanos de acordo com nosso tempo?
ISBN 978-85-7448-174-6
9 788574 481746
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O livier M Ongin
A condição urbana A cidade na era da globalização
Tradução
Letícia Martins de Andrade
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Títulooriginal:La Condition urbaine: La ville à l’heure de la mondialisation ©ÉditionsduSeuil,2005 ©EditoraEstaçãoLiberdade,2009,paraestatradução Revisão Composição
Imagem de capa
HuendelViana JohannesC.Bergmann/EstaçãoLiberdade China.Xangai,2001.LinhadohorizonteemPudong aoamanhecer,vistadaestradaZhongshan.©Thomas Hoepker/Magnum/LatinStock
Editores AngelBojadseneEdilbertoFernandoVerza CIP‑BRASIL.CATALOGAÇÃO‑NA‑FONTE SindicatoNacionaldosEditoresdeLivros,RJ M753c Mongin,Olivier,1951‑ Acondiçãourbana:acidadenaeradaglobalização/Olivier Mongin ; tradução Letícia Martins de Andrade. ‑ São Paulo : EstaçãoLiberdade,2009. 344p. Traduçãode:Laconditionurbaine:lavilleàl'heuredela mondialisation ISBN978‑85‑7448‑174‑6 1.Sociologiaurbana‑PaísesdaUniãoEuropéia.2.Cidadese vilas‑PaísesdaUniãoEuropéia‑Crescimento.3.Políticaurbana ‑PaísesdaUniãoEuropéiaI.Título. 09‑5372.
CDD:307.76 CDU:316.334.56
Estaobra,publicadanoâmbitodoAnodaFrançanoBrasiledoprogramadeparticipaçãoàpublicaçãoCarlosDrum‑ monddeAndrade,contoucomoapoiodoMinistériofrancêsdasRelaçõesExteriores. “França.Br 2009” Ano da França no Brasil/2009 é organizada no Brasil pelo Comissariado geral brasileiro, pelo MinistériodaCulturaepeloMinistériodasRelaçõesExteriores;naFrança,peloComissariadogeralfrancês,pelo MinistériodasRelaçõesexterioreseeuropéias,peloMinistériodaCulturaedaComunicaçãoeporCulturesfrance. Cetouvrage,publiédanslecadredel’AnnéedelaFranceauBrésiletduProgrammed’AideàlaPublicationCarlos DrummonddeAndrade,bénéficiedusoutienduMinistèrefrançaisdesAffairesEtrangères. «França.Br2009»l’AnnéedelaFranceauBrésilestorganisée: EnFrance:parleCommissariatgénéralfrançais, leMinistèredesAffairesétrangèreseteuropéennes,leMinistèrede laCultureetdelaCommunicationetCulturesfrance. AuBrésil:parleCommissariatgénéralbrésilien,leMinistèredelaCultureetleMinistèredesRelationsExtérieures.
Todos os direitos reservados à EditoraEstaçãoLiberdadeLtda. RuaDonaElisa,116|01155‑030|SãoPaulo‑SP Tel.:(11)36612881|Fax:(11)38254239 www.estacaoliberdade.com.br
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Sumário
INTRODUÇÃO Entre dois mundos, entre duas condições urbanas
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priMeira parte
A CONDIÇÃO URBANA I A CIDADE, UM “AMBIENTE SOB TENSÃO”
Prelúdio I. UM TIpO‑IDEAL DA CIDADE OU AS CONDIÇõES DA ExpERIêNCIA URBANA As cidades do escritor e do engenheiro urbanista A cidade, teatro da vita activa II. A ExpERIêNCIA CORpORAL OU A “CONfIgURAÇÃO” DA CIDADE Corpos múltiplos (Claudel) Antagonismos de paris e Londres Nova York, ou a arte do intervalo A cidade, ambiente sob tensão (a Nantes de Julien Gracq) O paradoxo urbano: um espaço finito que torna possíveis trajetórias infinitas Espaço mental, cosa mentale A cidade como libertação
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Tecidos narrativos Um espaço que contém tempo A cidade palimpsesto (as Tóquios de Claude Lévi‑Strauss) III. A ExpERIêNCIA púBLICA OU A CIDADE “COLOCADA EM CENA” Mostrar‑se em público O transeunte, a mulher e o estranho O spleen do flâneur: entre solidão e multidão (Baudelaire e Edgar Allan poe) Qual exteriorização? As passagens, o Império, Haussmann: uma magia transitória A cidade potencialmente solidária (Jules Romains) O homem em suspenso em Chicago: uma exterioridade carente de interioridade (Theodore Dreiser e Saul Bellow) A circulação como valor IV. A ExpERIêNCIA pOLíTICA OU A res publica A polis, teatro do verbo e da ação gloriosa A emergência da cidade europeia e a emancipação comunal A república cívica do Renascimento: a reivindicação de igualdade e a cultura do conflito A dupla polarização do Estado e da rede Colocar em relação um fora e um dentro ou a cidade‑refúgio V. URBANISMO, CIRCULAÇÃO E pREVALêNCIA DOS fLUxOS Uma dinâmica de privatização e de separação genealogias do urbanismo (françoise Choay) Alberti, Haussmann, Cerdà
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Urbanismo e arquitetura: de Thomas More aos CIAM O arquiteto e as máquinas celibatárias, ou a ilusão artística Circulação e zoneamento Roturas do tecido urbano e inversões da relação privado‑público Da passagem à “rua em anel” Os lugares e os fluxos: a inversão da relação
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segunda parte
A CONDIÇÃO URBANA II A pÓS‑CIDADE OU AS METAMORfOSES DO URBANO
Prelúdio I. A RECONfIgURAÇÃO DOS TERRITÓRIOS Ambiguidades do urbano A terceira globalização Um futuro multifacetado Os baldios da sociedade industrial Uma dupla ilimitação II. UM URBANO gENERALIzADO E SEM LIMITES. VARIAÇõES SOBRE O CAOS O paradoxo do urbano generalizado Um espaço ilimitado que possibilita práticas limitadas e segmentadas A cidade genérica e a apologia do caos (Rem Koolhaas) A era das cidades gigantes A multiplicação das megacidades
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A Europa à margem Cidades informes e caóticas A indiferença generalizada (Karachi e Calcutá) Autodestruição e dejeção (Los Angeles e a favela) Urbicidas: pressões de fora e de dentro III. O ARqUIpéLAgO MEgALOpOLITANO MUNDIAL E A ExpLOSÃO DAS METRÓpOLES O global e suas cidades Uma economia de arquipélago A cidade global O urban sprawl e os avatares da metrópole Devires metropolitanos nos Estados Unidos e alhures IV. CONVERgêNCIAS E DIVERgêNCIAS URBANAS. MUDANÇAS DE ESCALA E DE VELOCIDADE Desigualdades territoriais Demanda de segurança, demanda de Estado? Do enredo da exclusão à cidade de três velocidades Buenos Aires e Cairo, quais convergências urbanas? O Cairo, uma metrópole sem classe média? Buenos Aires, da classe média ao abandono
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terceira parte
A condição urbana III O imperativo democrático
Prelúdio I. O RETORNO DOS LUgARES Do global ao local Lugares, não lugares e cidade virtual
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II. pOR UMA CULTURA URBANA DOS LIMITES
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Em busca da experiência urbana “Ter lugar para ser” ou a capacidade de resistência dos corpos patrimônio e nova cultura urbana
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Derivas arquiteturais e urbanismo de projeto Rítmicas urbanas ou como abrir a matéria (Christian de portzamparc e Henri gaudin) O urbanista, o arquiteto e a vida pública Exigências políticas Reinstituir a cidade, recriar limites Estados Unidos: entre incorporação e metropolitics Os imperativos da conurbação A refundação megapolitana (da megacidade) permanência das cidades europeias
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III. RECRIAR COMUNIDADES pOLíTICAS. DA LUTA DE CLASSES à LUTA DOS LUgARES Lições de uma comparação frança‑América A dupla exigência do acesso e da mobilidade A utopia urbana como enredo coletivo (Alberto Magnaghi) Recolocações em movimento “periféricas”. A renovatio urbanis de Bernardo Secchi
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CONCLUSÃO No meio da cidade e entre dois mundos
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Referências bibliográficas Agradecimentos índice de pessoas citadas índice de cidades e de alguns bairros citados
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Aos habitantes de Argis e de Saint‑Rambert‑en‑Bugey, duas “cidades em anel”, situadas no vale do Albarine, no Departamento do Ain.
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INTRODUÇÃO
Entre dois mundos, entre duas condições urbanas
AcidadedeBilbao,noPaísBascoespanhol,metamorfoseadagra‑ çasaomuseuconstruídoaolongodaBidasoa,nazonaportuária,por FrankGehry;PragaeSãoPetersburgovisitadasporenxamesdeturistas apartirdaquedadoregimecomunista;Berlimprestesasubstituir Manhattan;aspaisagensurbanasredesenhadasporMichelCourajoud no parque Sausset em Paris; os planejamentos urbanos de Bruno FortiereAlexandreChemetoffemNantes;oparqueAndré‑Citroën, concebidoporGillesClémentaolongodoSena;áreasurbanasem viasdemetamorfoseno13oarrondissement parisiense e emmuitas cidades francesas ou europeias.Todos esses exemplos, entre tantos outros,mostramqueaculturaurbanaestánaordemdodiaapóster sidolongamenteignoradaequeorespeitoaopatrimônioprogressiva‑ menteseimpôs.Maisainda,BernardLassusdáformaàsimediaçõesdas estradas,eengenheiroselaboramfaçanhasaomesmotempoindustriais eestéticas,comooviadutogigantedeMillau.Aspolêmicasquetratam dosdanosdourbanismoprogressistaparecemumtantoarcaicasenão durammuito.NaFrança,edemodogeralnaEuropa,apreocupaçãocom ourbanoecomapaisagemserecompôs:eisnoquesecrê!Oumelhor, eisnoquesequercrer! Tantodopontodevistafrancêsquantoeuropeu,alucideznãoé muitocorrente.Ecomtodarazão:naFrança,adefesadaescalalocal, aquecorrespondeaoplanejamentodaszonasrurais,continuaaser umaexigênciaprioritária,enquantoodesenvolvimentodasredesea dinâmicadosfluxossãoprivilegiadosemescalaterritorial.Engraçado umpaíscomoaFrança:neleredescobrem‑seascidades,canta‑seoamor aelas,acomeçarporParis,acidade‑capitaldoséculoXIXindustrial juntamentecomLondres,aoevocarBaudelaireoulerWalterBenjamin;
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neletambémsecelebramasvirtudesdeuma“rurbanização”1àfran‑ cesa,essaalquimianaqualoruraleourbanoencontramum“bom” equilíbrio.Masissosoboriscodeesquecerqueacidadecedeuespaço, tantonaFrançacomoemoutroslugares,aumadinâmicametropoli‑ tanaequeafragmentaçãodosterritórioscriaumahierarquiaentreos espaçosurbanos,oquedestróioespíritoigualitáriodaleirepublicana. Entramosnomundoda“pós‑cidade”,aquelenoqualasentidadeson‑ temcircunscritasalugaresautônomosdoravantedependemdefatores exógenos,acomeçarpelosfluxostecnológicos,pelastelecomunicações epelostransportes…Obomequilíbrioentreoslugareseosfluxos tornou‑semuitoilusório. Éesteoparadoxofrancês:eisumpaísdeduasfacesqueconserva comportamentosruraismesmoqueoEstadoeseusengenheirosestejam navanguardadastransformaçõesqueafetamosfluxos,asredesdetrans‑ porte(TGV),astelecomunicaçõese,consequentemente,osterritórios dentrodocontextopós‑industrial,queéonosso.Odesenvolvimento territorialfrancês,queantesdetudoéumaobradeengenheirosaserviço doEstado,apoia‑seemgrandescorporaçõesquevalorizamopoderda técnicaedascifras.Assim,acorporação[dosengenheiros]dePontset Chaussées 2decidesoberanamenteapropósitodoterritório,daspontes, daspavimentações,dasestradas,dosviadutos,bemcomoapropósitodo controledosfluxosedosgrandeseixosdecirculação.Mas,aomesmo tempo,onúmerodecomunas3continuainflacionário,umavezque 1. Processodemodificaçãodasatividadesdesenvolvidasnasáreasrurais,queabsorveme integramatividadesantestipicamenteurbanasrelativasaolazer,aoturismoemesmo àindústria.[N.T.] 2. Os termos podem ser traduzidos, aproximadamente, por serviços de “pontes e pavimentações”,“pontesevias”,“ponteseestradas”,etc.NaFrança,acorporação dosIngénieursdesPontsetChaussées(IPC)constituiumcorpotécnicodenível superiornoserviçopúblicoatuanteemtodoodomíniodourbanismo.Ahistória dessacorporaçãoremontaa1716,comareuniãodeengenheiroscivisparaacriação deumaredeviárianopaís.Anosmaistarde,em1747,foicriadaaÉcoleNationale desPontsetChaussées(ENPC),quegarantiuaformaçãoeorecrutamentodesses engenheiros.[N.T.] 3. Nooriginal:comune; optamospelatradução“comuna”,umavezqueapalavraguarda umsentidomuitoespecíficodentrodaculturafrancesa,nãocorrespondendoperfei‑ tamenteaonosso“município”.A“comuna”éamaisbaixadivisãoadministrativado territóriodaFrança,conduzidapelomairejuntamentecomumConselhomunicipal
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12 milhões de habitantes vivem em 31 mil comunas de menos de 5milhabitantes.“EmplenaEuropa,aFrançaaindaofereceaimagem deumpaíspredominantementerural,fragmentadoem36.565comu‑ nascujametadetemmenosde 380 habitantes.”4 No entanto, essa realidadenãocorrespondeàescolhadeuma“civilizaçãocampestre”, comoaqueéreivindicadapelamaioriadosamericanos,porexemplo. Daíessemovimentopendularentreapaixãoporumavidaurbanano campo,oquesechama“rurbanização”,porumlado,e,poroutro, umdesenvolvimentoterritorialqueimplicaumcontroledosfluxos pelostécnicos.Essedesequilíbriopermiteaserviçospúblicosainda muitocentralizados,comoaEDF[ÉlectricitédeFrance],aGazde France,aSNCF[SociétéNationaledesChéminsdeFerFrançais], osPTT[Postes,TélégraphesetTéléphones],“poluirosespaçosmenos importantes,urbanoserurais,comequipamentosconcebidosapenassob opontodevistadasuaeficácia,semquejamaissetomeamedidadesua inserçãonoespaço”.5Assimseexplicam,norastrodohaussmannismo, apreponderânciadafiguradoengenheirourbanista,ocaosestéticoe humanodosanosdaprimeirareconstrução,adopós‑guerra(1945‑ ‑1950),eadasegundareconstrução(1950‑1980),queimpôsoreino dos“blocos”destinadosaacolherem“células”ahabitaçãosocial.Daí osentimentodeumdesastrearquiteturalemrelaçãoaoqualasrealiza‑ çõesartísticascontemporâneassãoummagroprêmiodeconsolação.6 (municipalité)epertencenteaumDepartamento(dirigidopelopréfet de Région)que, porsuavez,sesubordinaaoprimeiro‑ministro.[N.T.] 4. Atlas des Franciliens,t.I:Territoire et population,Paris,INSEE/AURIF,2000,p.42. 5. FrançoiseChoay,“SixThèsesenguisedecontributionàuneréflexionsurleséchelles d’aménagementetledestindesvilles”,inLa Maîtrise de la ville,Paris:Écoledes HautesEtudesenSciencesSociales,1994,p.226. 6. Sobreodesejodefazertábularasaquereinanopós‑guerraimediato,sãosignificativas aspalavrasdeEugèneClaudius‑Petit,ministrodaReconstruçãoedoUrbanismode 1948a1953:“SeráqueaFrançasimplesmenteporfaltadeousadiadevesetransfor‑ marnumaespéciedegrandemuseuparaturistasestrangeiros?Seráquesecontinuará de acordo com as ideias queVichy estabeleceu, e manteremos nossas aldeias da Champagnecomoaldeiasdebonecasparaturistascarentesdedomingo…?”Entre amusealizaçãodasaldeiaseoprogressismoarquiteturalprivilegiadopeloministro, nãohavia,naépoca,umcaminhoalternativo?PalavrastranscritasdeUrbanisme, le XX e Siecle: De la Ville à l’Urbain, De 1900 a 1999: Chronique Urbanistique et Architecturale,n.309,nov./dez.1999.
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Noentanto,pode‑seporoutroladorefutar,aculturaurbananãoéuma palavravã,osfrancesesmudaramseushábitosemtermosdeurbanismoede arquitetura,ascidadeseuropeiaspermanecemumareferênciaimportante emuitospaíseseuropeus,acomeçarpelaAlemanha,pelosPaísesBaixos epelaItália,gozamdeumatradiçãourbanaepatrimonialantiga.Masos paíseseuropeusseiludem,tambémeles,quandosedrapejamemvalores queseriaminscritosnahistóriaparatodaaeternidade,prestesatornar‑se ummodeloparaomundointeiro.Queofatodeessesvalorespossuíremum significadoprofundoeumadimensãouniversalnãoimpeçadeconstatar queofuturodourbanoseenunciahojeaomododo“pós‑urbano”.Ceder àtentaçãodacidade‑museuequivaleacolocardeladoasmutaçõesdour‑ banoemescalamundial,asevoluçõesdelongocurso,qualquerquesejasua denominação:ado“urbanogeneralizado”ouada“cidadegenérica”.Maus espíritos,nãonecessariamentecatastrofistas,serecusamadeixar‑seseduzir pelaideiadeumrenascimentodascidadeseuropeiasetocamassirenesde alarme.Maisquecelebrarumpatrimôniourbanodeexceção,elesconvi‑ damaregistrarasmetamorfosesdourbanonaescaladoterritóriofrancês, daEuropaedoplaneta.Exemplobemconhecido,espíritoprovocador,o arquitetoRemKoolhaaszombadascidades‑museus,dascidadeseuropeias devocaçãoturística.Eelenãoestácompletamenteerrado. Osfatosestãoaí,ascifrastambém,ambostemíveis,impiedosos. Enquantoseenumeram175cidadescommaisdeummilhãodehabi‑ tantes,trezedasmaioresaglomeraçõesdoplanetaseencontramhojena Ásia,ÁfricaouAméricaLatina.Das33megalópolesanunciadaspara 2015,27pertencerãoaospaísesmenosdesenvolvidos,eTóquioseráa únicacidadericaafigurarnalistadasdezmaiores.Numcontextocomo esse,omodelodacidadeeuropeia,concebidacomoumaaglomeração quereúneeintegra,estásefragilizandoemarginalizando.Oespaçoci‑ tadinodeontem,sejaqualforotrabalhodecosturadosarquitetosedos urbanistas,perdeterrenoembenefíciodeumametropolizaçãoqueéum fatordedispersão,defragmentaçãoedemultipolarização.Nodecorrerdo séculoXX,passou‑seprogressivamentedacidadeaourbano7,deentidades 7. De la Ville à l’urbain:assimseintitulaonúmerojácitadodarevistaUrbanisme,que apresentademaneirasignificativaasfigurasdeCerdà,Sitte,HowardSellier,Prost, LeCorbusier,Wright,Mumford,Delouvrier,Koolhaas,ecomeçacomumalonga
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circunscritasametrópoles.Noinstanteemqueacidadecontrolavaos fluxos,ei‑laapanhadaemsuarede(network),condenadaaseadaptar,a sedesmembrar,aseestenderemmaioroumenormedida;noinstante emquecorrespondiaaumaculturadoslimites,ei‑lacondenadaase ramificarsobreumespaçoilimitado,aqueledosfluxosedasredes, quenãocontrolava.“Éevidentequeasredestêmofuturodiantede siequeabremcampostãoricosquantoimprevisíveisàcriatividade humana.Seufuncionamentojátransformouaexpressãoarquitetônica e a organização espacial do conjunto das nossas instituições.” 8 Por outrolado,ofuturodourbanonãoestásomente,oumelhor,nãoestá mais,naEuropa,esimnospaísesnãoeuropeusondemegacidadesde todotipo,sobapressãodonúmero,seestendemdeumamaneirafre‑ quentementedisforme.Acidade“informe”sucedefrequentementeà cidade,caraaJulienGracq,quepossuiuma“forma”.Ei‑nosfinalmente bemdefasados,poisumurbanogeneralizadoesemlimitessucedeua umaculturaurbanadoslimites.Ei‑nos,portanto,entredoismundos. “Entredoismundos”:aíestáumaexpressãoparaserentendidaem váriossentidos.Primeiramente:entreduascondiçõesurbanas,entreo mundodacidade(aquelaquesignifica“mundo”)eaqueladourbano generalizado(quenãosignificamais“mundo”aopassoquepretende estarnaescaladomundo).Depois:entreummundoeuropeuainda dinamizadoporvaloresurbanosemundosnãoeuropeusondeaurbs eacivitasnãotêmmaismuitoaverjuntas. 9Nessecontexto,umdos objetivosdestaobraédescreverumestadodoslugareseoperarajustes semânticos.IldefonsCerdà,oprimeiroteóricodourbanismo,escrevia em1867:“Vouiniciaroleitornoestudodeumamaneiracompleta‑ mentenova,intactaevirgem.Comotudoalieranovo,foiprecisoque eubuscasseeinventassepalavrasnovasparaexprimirideiasnovascuja entrevistacomFrançoiseChoay,cujostrabalhossãoumdosfioscondutoresdesta obra(Le XXe siècle: De la Ville à l’urbain,op. cit.Cf.tambémUrbanisme:Tendances 2030,jan./fev.2004). 8. FrançoiseChoay,“Patrimoineurbainetcyberespace”,inLa Pierre d’Angle,n.21‑22, 1997. 9. Adistinçãoentreurbs(aformaurbanaearquitetural)ecivitas(asrelaçõeshumanas easligaçõespolíticas)remontaaLa Cité antique(1864),deFusteldeCoulanges.
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explicaçãonãoseencontravaemnenhumléxico.”10Semnostomarmos demodoalgumporCerdà(ostemposmudarammuito),épreciso reencontrarumsentidoparaaspalavras.Dequefalamosrealmente? Aqualcondiçãourbanafazemosreferência?Àcondiçãourbanaen‑ tendidacomoexperiênciaespecíficaemultidimensional,acondição urbanaentendidaemsentidoprimário,aexperiênciaurbanadaqualos escritoresfalamtãobem;ouentãoàcondiçãourbanaquecorresponde àépocacontemporânea,àcondiçãourbanaentendidaemsentidose‑ cundário,aquelaquenemsempreselembradacivilizaçãourbanaedá lugaraumavertigemsemânticanaqualostermos“metrópole 11,mega‑ cidade12,megalópole13,cidade‑mundo,cidadeglobal,metápolis14”, seconfundem…Defato,“apalavra‘cidade’servehojeparadesignar indistintamenteentidadeshistóricasefísicastãodísparesquantoa cidadepré‑industrial,asmetrópolesdaeraindustrial,asconurbações, asaglomeraçõesdepelomenos10milhõesdehabitantes,as‘cidades novas’easpequenascomunasdemaisde2milhabitantes.Damesma maneira,LeCorbusiernãoempregaotermo‘CidadeRadiosa’senão porabusodelinguagem.”15Paraleraliteraturaqueemanadosmeios 10. SãoessasaspalavrasintrodutóriasàsuaTeoria general de la urbanización(1867),reed. Madri,1969;trad.:La Théorie générale de l’urbanisation,org.A.LopezdeAberasturi, Paris:Seuil,1979.EmLa Ville franchisée(Paris:Villete,2004,p.25‑27),David Manginaproveitaaoportunidadeparasedetersobreproblemasdevocabulário. 11. Metrópoleéumacidadecentral(emtermoseconômicos,políticoseculturais)dentro deumaáreaurbanaformadaporváriascidadesunidasentresi,conurbadasouliga‑ dasporfluxosdepessoaseserviços.Emtermosconceituais,“metrópole”temmaior articulaçãocomadinâmicaeconômica,oqueadiferenciariade“megacidade”.[N.T.] 12. Nooriginal:mégapole.Megacidadeéumacidadecommaisde10milhõesdehabi‑ tantes(segundodefiniçãodaONU),dedestaquenocontextomundialemrazãode suasgrandesdimensõesedeseuaceleradoritmodecrescimentodemográfico.Em termosconceituais,essadenominaçãoseriamaisadequadaaocontextodepaíses emdesenvolvimento,sugerindo,inclusive,tensõessociaisecaosurbano.NoBrasil, apenasSãoPauloeRiodeJaneirosãoconsideradasmegacidades.[N.T.] 13. Megalópoleéumagrandeáreaurbanaformadapormúltiplasaglomerações,portanto polinuclear,cujossubúrbios,muitodistendidos,acabamporseunir.[N.T.] 14. Metápolissãograndesconurbações,emextensasáreas,descontínuas,heterogêneas emultipolarizadas.[N.T.] 15. FrançoiseChoay,“Post‑urbain”,inFrançoiseChoayePierreMerlin(Orgs.),Diction‑ naire de l’urbanisme et de l’aménagement,Paris:PUF,1996.
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daarquitetura,dourbanismo,dageografia, da administração e de outrosainda,aspalavras,acomeçarpor“cidade”,“lugar”e“urbano”, recobremrealidadesasmaiscontrastadas,atémesmocontraditórias. Masessaimprecisãosemânticanãoéprivilégiodepensadores,atorese produtoresdourbano.Eisporque,paraalémdabatalhadaspalavras, cujosefeitosnãosãosecundários,umavezqueelacondicionaaprópria possibilidadedediscussõesededecisõeslúcidasefecundas,estelivro igualmenteambicionaentenderoquepodeadvirdacondiçãourbana emumcontextoemqueacidadenãoémaisareferênciaprimordial. Emsuma,daconstataçãoimplacáveldequeosfluxossesobrepõem aoslugares,porqueconcluirespontaneamentequeénecessáriocurvar‑ ‑seàsdurasleisdaglobalizaçãourbanaousonharcomociberespaço, comterritóriosquenãotêmmaislimites?Nãoseriamaisútilrefletir sobreanaturezadaexperiênciaurbanacomotal,mesmoseempartenós jáaperdemos,paradecompô‑la,parapercebertodasassuasdimensões, paraentendercomoelapodedevolver“formas”e“limites”aummundo pós‑urbanocarentedeformasedelimites?Senãosetratadecriara “boacidade”,aboametrópole,aboacidadeglobal,sedesenharàmesa autopiaurbanadeamanhãéalgodestituídodeinteresse,umaexperiên‑ ciaurbanadignadessenomenãoperdeutodoosentido,e“oamoràs cidades”nãoestáobsoleto.16Daíointeresseemconfrontaressasduas “condiçõesurbanas”,noprimeiroenosegundosentido:“aexperiência urbana”eoestadoatualdourbano.Nãosetornouaprimeiraumluxo, umanostalgia,umvestígio?Hojeacidadedesposaformasextremas: ouelaseestendesemlimites,sedesdobracomoamegacidade,ouela secontrai,recolhe‑sesobresimesmaparamelhorseconectaràsredes mundiaisdosucesso,comoacidadeglobal,queéumdosmotores disso,onóprincipal.Ora,seourbanooscilaentre“desdobramento”e “retraimento”,aexperiênciaurbanasecaracterizaporsuacapacidadede produzir“dobras”,dobrasentredentroefora,entreprivadoepúblico, entreinterioreexterior.Ouseja,“ambientessobtensão”,“zonasde
16. BrunoFortier,L’Amour des villes,Bruxelas:InstitutFrançaisd’Architecture/Mardaga, 1994.
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Com a globalização, ei-nos projetados para o “pós-cidade”, para o “pós-urbano”. Na Europa, estávamos habituados a ver a cidade como um espaço circunscrito no qual se desenvolve uma vida cultural, social, política, tornando possível uma integração cívica dos indivíduos... Somos agora confrontados de um
As cidades do escritor e do engenheiro urbanista • Antagonismos de Paris e Londres • Nova York, ou a arte do intervalo • A cidade como libertação • A cidade palimpsesto (as Tóquios de Claude Lévi-Strauss) • O transeunte, a mulher e o estranho • O spleen do flâneur: entre solidão e multidão (Baudelaire e Edgar Allan Poe) • O homem suspenso em Chicago: uma exterioridade carente de interioridade (Theodore Dreiser e Saul Bellow) • A polis, teatro do verbo e da ação gloriosa • A república cívica do Renascimento • Uma dinâmica de privatização e de separação • Genealogias do urbanismo (Françoise Choay) • Alberti, Haussmann, Cerdà • Urbanismo e arquitetura: de Thomas More aos CIAM • O arquiteto e as máquinas celibatárias • Roturas do tecido urbano e inversões da relação privadopúblico • A cidade genérica e a apologia do caos (Rem Koolhaas) • A multiplicação das megacidades • A Europa à margem • A indiferença generalizada (Karachi e Calcutá) • Autodestruição e dejeção (Los Angeles e a favela) • O Cairo, uma metrópole sem classe média? • Buenos Aires, a classe média ao abandono •
A CONDIÇÃO URBANA
nasceu em Paris em 1951. Estudou letras e antropologia na Universidade Paris VII e história e filosofia na Sorbonne, nesta última empreendendo o primeiro estudo universitário sobre Lévinas na França. Diretor da revista Esprit desde 1988, é autor de uma trilogia sobre as paixões democráticas: La Peur du vide (1991), La Violence des images (1997) e Éclats de rire (2002), e ainda de Face au scepticisme: Les Mutations du paysage intellectuel (1998), entre vários outros. olivier mongin
Reinstituir a cidade, recriar limites • A refundação megapolitana • A utopia urbana
OLIVIER MONGIN
A CONDIÇÃO URBANA
como enredo coletivo (Alberto Magnaghi)
OLIVIER MONGIN
A cidade na era da globalização
Tradução
Letícia Martins de Andrade
lado com metrópoles gigantescas e sem limites, e de outro com o surgimento de entidades globais, em rede, cortadas de seu ambiente. A reconfiguração que ora ocorre suscita inquietação: iremos assistir ao declínio irremediável dos valores urbanos que acompanharam a história ocidental? Prevalecerão inelutavelmente a fragmentação e o estiramento caótico? Estaremos condenados a lamentar a polis grega, a cidade do Renascimento, a Paris das Luzes, as grandes cidades industriais do século XIX?
Natanael
Relembrando os elementos distintivos que compõem a experiência da urbe, Olivier Mongin assenta os fundamentos de uma reflexão atual sobre a condição urbana. Vivemos numa época na qual a informação se troca de forma imaterial, mais de acordo com os fluxos do que com os lugares: como, nessas condições, refundar e reformular espaços urbanos de acordo com nosso tempo?
ISBN 978-85-7448-174-6
9 788574 481746
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