Kawabata estudou literatura na Universidade Imperial de Tóquio e foi um dos fundadores da Bungei Jidai, revista literária influenciada pelo movimento modernista ocidental. Acompanhado de jovens escritores, defenderia mais tarde os ideais da corrente neo-sensorialista (shinkankakuha), que visava uma revolução nas letras japonesas e uma nova estética literária, deixando de lado o realismo em voga no Japão em prol de uma escrita lírica, impressionista, atravessada por imagens nada convencionais. Ao contrastar o ritmo harmônico da natureza e o turbilhão da avalanche sensorial, Kawabata forjou insólitas associações e metáforas táteis, visuais e auditivas que surpreendem por revelar os processos de fragilização do ser humano diante do cotidiano, numa composição surrealista de elementos da cultura e filosofia orientais, personagens acuados e cenários inóspitos. Sua obsessão pelo mundo feminino, sexualidade humana e o tema da morte (presente em sua vida desde cedo, sob a forma da perda sucessiva de todos os seus familiares) renderam-lhe antológicas descrições de encontros sensuais, com toques de fantasia, rememoração, inefabilidade do desejo e tragédia pessoal. Desgastado por excesso de compromissos, doente e deprimido, Kawabata suicidou-se em 1972.
Capa_Contos_mão.indd 1
Yasunari Kawabata Ela, que vivera
sempre perseguindo amores intensos, mesmo agora que estava enferma, não conseguia conciliar o sono sossegado sem sentir, no seu pescoço ou no peito, o braço de um homem. Entretanto, quando seu estado se agravou, ela implorava: — Segure meus pés! Não posso suportá-los tão tristes.
Tradução de Meiko Shimon
ISBN 978-85-7448-137-1
9 788574 481159
contos da palma da mão
Yousuf Karsh / National Gallery of Australia
Prêmio Nobel de 1968, Yasunari Kawabata é considerado um dos representantes máximos da literatura japonesa do século XX. Nascido em Osaka em 1899, após uma infância solitária e sofrida, interessou-se cedo pelos clássicos japoneses, que viriam a ser uma de suas grandes inspirações.
A
Yasunari Kawabata
CONTOS DA PALMA DA MÃO
narrativa curta — ou mesmo brevíssima — de Yasunari Kawabata já se consolidou como um clássico do gênero. O autor de A casa das belas adormecidas, Mil tsurus e O país das neves atinge nestes Contos da palma da mão, pelos quais tinha expressa predileção, um grau de virtuosismo por muitos aclamado. Para tanto desenvolveu técnica própria, ampliando com precisão microscópica o tradicional pendor japonês por pureza e delicadeza. À sua leitura, abate-se sobre nós, discreta e súbita como uma brisa outonal, uma ferina desintegração do “eu”, mitigada por um distanciamento apenas aparente. Isso passou a levar um nome, shinkankakuha ou neo-sensorialismo, e Kawabata esteve à frente desse movimento de renovação literária que ocorreu no Japão nos anos 20 e 30 do século XX. Sobressai, na confluência de forma e conteúdo, um despojamento minimalista que deixa nus e crus sentimentos e sensações, convergindo ora para toques de surrealismo, ora para leituras do subconsciente à maneira psicanalítica. Entre muitos outros temas, especialmente prazerosos são os que põem em cena o bairro de Asakusa em Tóquio, com seu amálgama de teatros, cabarés musicais (com grande presença tanto do jazz quanto de formas teatrais japonesas clássicas) e casas de deleites carnais. Esse exercício de economia literária torna o trabalho de tradução bastante árduo, pois há a constante tentação de parafrasear algo aqui e ali, o que seria trair Kawabata logo de saída. A tradutora Meiko Shimon, que se especializou na obra do autor e se dedicou longamente ao estudo destes contos, manteve aqui uma criteriosa fidelidade ao mestre japonês. Quando necessário, foram inseridas notas, que um glossário complementa. A atual seleção abrange 122 contos, que Kawabata considerava, nos seus anos tardios, seus “contos que cabem na palma da mão”, e dos quais dizia com a candura que era de seu feitio: “entre eles há algumas peças não muito razoavelmente fabricadas, mas há algumas boas, que jorraram de minha pluma naturalmente, de seu próprio aval. [...] Vive neles o espírito poético de meus dias jovens.”
18/2/2008 13:19:43