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83 MARÇO ‘13
A Vida é o Bolor do Mundo
O BOLETIM DO QUE POR CÁ SE FAZ MENSAL / DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
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2. Fazendo Editorial
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83 MARÇO ‘13
83 Ano da publicação dos livros “Arqui-
ilhas habitadas
e Arquivo de Angra do Heroísmo edi-
tectura nos Açores: subsídios para o
ta “Manuel Joaquim de Andrade um
seu estudo” e “Escultura nos Açores
editor açoriano na cidade de Angra:
-1983” do investigador e colecciona-
catálogo de uma exposição.” A área
mo do Corvo, com uma pista de 800
dor terceirense Francisco Ernesto de
envolvente ao porto de Vila do Topo,
metros de comprimento. O postal máximo CEPT Açores traz consigo a ban-
Oliveira Martins. O escritor, professor
ilha de São Jorge, é classificada como
e filósofo, Onésimo Teotónio Almei-
Reserva Natural Parcial, pelo Gover-
deira do arquipélago açoriano e custa
da, publica “A Questão da Literatura
no Regional dos Açores. Angra do
12 escudos e cinquenta centavos. No
Direcção
Açoriana”. É inaugurado o museu da
Heroísmo acorda em Setembro com
continente, Mário Soares substitui
Aurora Ribeiro Tomás Melo
Graciosa, que recupera uma casa ru-
um aparatoso incêndio no interior da
Francisco Pinto Balsemão no cargo
ral, uma adega e um moinho, exibindo
Catedral da Sé que lhe destruiria de
de primeiro-ministro de Portugal (IX
canhões do século XV, uniformes e
forma irreversível o seu interior, es-
Governo Constitucional-PS/PSD). Nas
Capa
barcos baleeiros. A Biblioteca Pública
pecificamente a sua talha dourada
salas de cinema estreiam-se os filmes
Ceci Lombardi
Fazendo Crónica
egrégoras em mutação
dos altares, os órgãos de tubos e o
“Zelig” do nova iorquino Woody Allen e
teto em caixotões. O centro histórico
“La Nave Va” do italiano Federico Fellini.
Colaboradores
“Estás cá? Quando partes? –
ainda que muito abstracto possa ser este conceito,
Mas é que nas ilhas ainda se
da cidade de Angra é elevado a Cida-
Do nosso convívio desaparecem o ci-
Ana Besugo
As duas perguntas seguidas
reconhecemo-lo: será a identidade de uma turma
mantém a importância da via-
de Património Mundial da UNESCO,
neasta mexicano Luis Buñuel, realiza-
Carlos Alberto Machado
são características dos micaelen-
de adolescentes a mesma quando a professora está
gem. Como quando há ainda nem
tornando-se pioneira na atribuição
dor de filmes como “Susana”, “Le Chien
Cristina Lourido
ses que mantém o gosto de re-
presente e quando não está? Non...
100 anos se escrevia no jornal que
deste título em Portugal, completan-
Andalouz” ou “Los Olvidados”, e ainda
Daniela Silveira
ceber os forasteiros. Daí a mani-
do trinta anos desta efeméride. A 28
Hergé, autor de banda desenhada do
Fernando Nunes
festação de alegria ao encontrar
A palavra “egrégora”, segundo apurei na internet
dos Cedros estudar para a Horta. A
de Setembro é inaugurado o Aeródro-
célebre “Tintin”.
Júlio Ávila
alguém que se encontrava em-
(essa gigante e estranha egrégora) não é anterior
escassez dá importância às coisas.
Luís Bicudo Luís C.F. Henriques Regina Venâncio Silveira Victor Rui Dores Layout Design Mauro Santos Pereira
barcado (estás cá?) e a pergunta
ao séc. XIX. Encontrei muitas referências a ela em
Hoje todos os jovens cedrenses es-
imediata querer saber quando dei-
sites ligados ao ocultismo ou maçonarias, mas nem
tudam na Horta e é tão natural que
xará a ilha (quando partes?), porque
sequer sabia que daí vinha nem me parece coisa da
nem sai nos jornais (à normalidade
qual eu vos possa falar com alguma propriedade, até
ninguém lhe liga, e ainda bem).
isso, tem de se conhecer a sua agenda
porque nesses meios nem sempre é utilizada com
de compromissos.” in Dicionário Senti-
este sentido que comummente damos hoje em dia
Mas vir às ilhas ou de cá sair continua a ser
mental da Ilha de São Miguel de A a Z, de
e que me levou a escrever este texto. A definição da
caso de conversa e de reparo, de atenções
wikipédia é: “Egrégora, ou egrégoro para outros, (do
e de perguntas. Tem que haver mais moti-
grego egrêgorein, Velar, vigiar), é como se denomina
vações para vir de Lisboa ao Faial do que para
Fátima Sequeira Dias, 2011
www.comunicaratitude.pt Paginação Tomás Melo Revisão Carla Dâmaso
Esta observação feita por uma ilustre mi-
a entidade criada a partir do coletivo pertencente a
parar em Vendas Novas. Ora, ninguém cá vem
caelense que faleceu pouco depois de eu ter
uma assembleia, ou seja, é um campo de força cria-
só para comer bifanas. A SATA leva e traz os personagens, alguns outros chegam e saem
tomado conhecimento do seu trabalho e que
do no Plano Astral a partir da energia emitida por um
eu tanto, mas tanto, gostaria de ter conhecido,
grupo de pessoas através dos seus padrões mentais
bravamente por mar, e enquanto cá estão (esse
pode ser estendida a todos os açorianos (arris-
e emocionais.” Peguemos nesta noção de egrégora
dourado e frutuoso momento que vai desde o
co a afirmar até que a todos os ilhéus). Mas já cá
como entidade (conceito mais concreto e personifi- “chegar” até ao “partir”) aproveitamos todas as
voltamos. Propriedade
Capa Ceci Lombardi
Associação Cultural Fazendo
Acontece de vez em quando, num jantar de amigos ou num passeio, que um deles, dos amigos,
Sede
por motivos tão inadiáveis quanto inconvenien-
Rua Conselheiro Medeiros
tes, nos abandona e se vai, deixando o grupo que
nº 19 — 9900 Horta
resta desfalcado, desasado, informe. O que fica é outra coisa, não a mesma. Perde-se uma centelha
Periodicidade
de alegria se for um amigo humorado, de sarcas-
Mensal
mo se ele for mais para o retorcido ou de conexão se aquela alma que abalou fosse o elo de ligação
Tiragem
entre todas as outras.
500 exemplares
O Verde.
e cor.
os personagens (nós) actuam, entram e saem de
mos o que se perdeu com a ida de tal ou tal pessoa.
transformar. Estarmos atentos...
conjunta. Uma nova energia ou,
daquilo a que chamamos “a História”. Dentro do universo, cada um de nós vive a sua história, nos limites
em voga no associativismo e na
do seu tempo e espaço (e na sua imaginação tam-
política: uma nova sinergia. E
bém ela mais ou menos limitada).
Visitou os Açores em 2009 e os “bró-
nesta edição são dos autores
culos verdes” das ilhas ficaram grava-
e não necessariamente
quem habita a ilha sente na pele.
dos na sua memória. Quatro anos de-
da direcção do Fazendo
O papel guarda assim a memória das
pois pinta, desenha, rabisca e colora a
texturas que nascem da intervenção
sua nostalgia.
mos conta que a vinda deste ou daquele personagem nos tornou mais isto ou mais aquilo e percebe-
para usar uma palavra muito
De clima instável, o degradé acompa-
dela resultam coisas, palpáveis ou imaginadas. Da-
Entendo a ilha (qualquer ilha) como um palco, onde
As opiniões expressas
nha a flutuação metereológica que
Verão) outras mais intelectual (o Inverno ajuda). E
pode extrapolar para o mundo inteiro, imenso palco
grupo cria uma nova identidade, a do grupo, a alma
Trabalha com pintura, ilustração, água
-se. Umas vezes mais fervilhante (sobretudo no
Mudanças culturais, afectivas, sociais, cognitivas,
Gráfica O Telégrapho
maior harmonia no Faial: o verde.
E a cada vinda e ida de alguém a egrégora da ilha altera-se. A entidade que nós somos transforma-
sei lá. A todos os níveis... E a vida é isto, ir, vir, ficar...
ainda mais que a pura soma das suas partes. Um
Londres (que é cinzenta).
ninguém cá vem só para comer bifanas
bém as maravilhas cenográficas do décor (nesse campo altamente cotadas, as ilhas, sim senhor).
por aí afora. Claro que não é só nas ilhas, isto até se
Impressão
(1982), vive e trabalha entre Lisboa e
possibilidades dramáticas desses novos actores e estes por sua vez aproveitam as nossas e tam-
cena, transformam e fazem progredir a narrativa e
Ceci Lombardi nasceu em São Paulo
mistas, sobrepostas e unidas pela cor
cado do que o de identidade) criada a partir da coexistência de um grupo.
Os grupos são assim somatórios de vontades e O desenho é composto de técnicas comum, aquela que o olho guarda com
fulano tal filho de tal tinha vindo
se pretende recebê-lo em casa e, para
Ruth Bartenschlager
humana.
Fazendo Crónica
Aurora Ribeiro
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Ernesto
Fazendo Prosa
Sapateia (de São Miguel)
Ernesto era branco e bonitinho. Olhos avermelhados e uma cauda longa em tons rosa. Corria até ser vencido pelo cansaço dentro da roda chiadeira no canto
83 MARÇO ‘13
Fazendo Música
A dança constituiu sempre um ato
da gaiola. Até ontem correu e correu, não por gosto,
eminentemente
não por opção, mas porque um não sei o quê o fazia
social,
cumprindo
uma função integradora. Dança(va)-
galgar quilómetros todos os dias desde o acordar ao
-se
repouso. Ontem, porém, parou um pouco e começou a pensar. “Para que corro eu se não chego a lado algum? Não faz sentido que me esfalfe dia após dia se verei sempre o sol por entre estas grades.” E mais pensou, mas também não incomodemos demasiado a privacidade do ratinho. Certo é, e importante na sua biografia, que nunca mais voltou a correr, limitando-se a comer, dormir e pensar. Hoje, o Dr. Sousa diagnosticou-lhe uma maleita própria dos da sua espécie e lançou-o ao Félix, o rafeiro preto que pas-
e canta(va)-se para exteriorizar
Sapateia, meu bem, sapateia
a alegria de viver, por um lado, e, por
Sapateia amor aqui
Mas há referências menos jocosas,
Ai vira e volta a sapateia
outro, pela necessidade de fazer uma
Amor do meu coração
como por exemplo a alusão às con-
Ai quantas vezes, ai quantas
espécie de catarse. É o caso da Sapa-
Se tu choras, também choro
dições sócio-económicas da maioria
O jantar serve de ceia.
teia da ilha de S. Miguel, caracterizada
Vê lá se te quero ou não.
da população micaelense de outros tempos:
pela sua energia rítmica.
Ou uma veia mordaz:
A melodia desta cantiga assenta so-
Se o padre cura soubesse
(Isto num tempo em que o jantar era o almoço e a ceia o jantar).
bre os acordes da tónica e da dominan-
O que a sapateia tem
É ou não verdade que “quem canta
te. A letra varia. Ora tem uma vertente
Largava de dizer missa
seus males espanta”?
lírica:
Sapateava também.
Victor Rui Dores
sava horas a salivar olhando para a gaiola. E o mais absurdo é que Ernesto nem ensaiou uma tentativa de fuga, pois já não sabia como correr. Júlio Ávila
Heitor Lobo Uma Nota Biográfica
Fazendo Música
Esculpir Sons
O organeiro Heitor Lobo terá nascido em Vila Real,
deste órgão ainda sobreviveram até ao século XVIII,
de ter sofrido várias alterações desde a sua constru-
por volta de 1496, vindo a morrer depois de 1571.
tendo sido incorporados no órgão que construiu
ção, este instrumento é um claro exemplo da orga-
Lobo, que partilha o mesmo apelido que o compo-
Manoel Lourenço da Conceição para aquela Sé. Lobo
naria portuguesa de quinhentos: um instrumento
sitor do início do século XVII Duarte Lobo, é tido
ainda construiu um órgão para as Igrejas de S. Salva-
que possuía os requisitos para o repertório da época.
Pedro vinha com uma ideia no bolso e outra na cabe-
ragir e descobrir que quando o assunto é música são
como um dos primeiros organeiros portugueses. O
dor (Vilar de Frades, Barcelos), em 1551, e de Nossa
Através das fontes documentais, nomeadamente as
ça. Deseja que a música seja mais como o azul, mais
todos bem-vindos!
Dançam notas no vento, afiam-se claves, colcheias
primeiro órgão que se sabe ter construído foi para
Senhora da Oliveira (Guimarães), em 1562.
relativas a Santa Cruz de Coimbra, poder-se-á dizer
como a poesia, mais como a dança – e a música é.
A música narra histórias, fabrica sonhos, povoa a
e semi-fusas. Timbres de mão-dada na conjunção de
o Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra, entre 1530
Heitor Lobo entra ao serviço da Sé de Évora em
que Heitor Lobo terá sido um organeiro bastante
- As estrelas, Pedro, não te esqueças das estrelas-
imaginação de cores, bemóis e outros sóis. Tem
percussão e sopros. Manifestações de regozijo na
e 1532. Pela documentação que chegou aos nossos
1544, permanecendo até 1553. Terá sido durante
conceituado, apesar de praticamente todos os seus
-do-mar.
pronúncia. O que nos diria um maestro se juntasse
companhia familiar e de amigos, o despique quando
dias, tem-se uma boa descrição deste instrumento,
este período que construiu o grande órgão para esta
órgãos (à excepção do de Évora) terem sido substi-
Pedro reparou na Marta ao 1º dó. Susteneu-se. Le-
palavras aos seus gestos? Como espirra uma banda
se juntam agremiações diferentes. Sons na rua em
que voltou a ser reconstruído em 1541 e ainda em
Catedral, que sobreviveu até à actualidade. Este ins-
tuídos no início do século XVIII.
var-lhe-ia ainda alguns ensaios até se aperceber que
filarmónica? Quão diferentes podem ser duas inter-
manobras peregrinas. Alegria e Arte vivida no quoti-
1559. Lobo terá sido também autor de um grande ór-
trumento é conhecido pelas suas características so-
não ouvia realmente qualquer outro instrumento na
pretações da mesma paisagem sonora? Que instru-
diano, que privilégio!
gão para o coro alto da Sé do Porto (em 1537-1538)
noras únicas, resultado de uma exímia construção
e mais dois de pequena dimensão. Alguns dos tubos
dos tubos aliada a uma baixa pressão de ar. Apesar
Luís C. F. Henriques | www.luiscfhenriques.com
mento é aquele que parece zangado? Como é que
A música ensina a ouvir, apreciar o mundo e o valor maior do Silêncio. Tomemos uma pausa, como se
não te basta estar aqui?
clássica?
houvesse um botão, ponhamos a mão sobre a ore-
Pedro não tem respostas para as perguntas de Mar-
De repente ao virar da esquina, tropeça-se numa
lha para ouvir em mono e imaginemos mesmo, mes-
ta, nem perguntas para as suas respostas.
banda filarmónica. Aconteceu-me com a Sociedade
mo tudo isto a ser: partilha artística, confluência de
Filarmónica “Lira Madalense” (Sete Cidades, Pico).
linguagens estimuladoras, território de liberdade de
Os cruzamentos acontecem e passam. Os encontros
Fundada em 1899, é composta actualmente por 57
expressão e realização.
- Sim!
Antes de Começar de Almada Negreiros Estreia dia 5 de Abril no Teatro Faialense
rios ou aquilo que cada um conseguir “assobiar”.
a melodia desse telemóvel foi parar a uma sinfonia
banda, senão a trompa. - E para que precisas tu tanto do ré, do mi ou do fá,
Teatro de Giz
Fazendo Música
acontecem e ficam. A música já não vinha de fora,
elementos dos 11 aos 76 anos, dirigida pelo maestro
Na Terceira houve um uôrquechòpe de Música Com
saía de dentro. Em melodia e harmonia.
Reginaldo Neves. Desde há longo tempo almejava
Todos: agentes infiltrados numa missão (em)possível ultra–secreta foram vasculhar o Palácio dos
Há mais filarmónicas do que ilhas no arquipélago.
aprender a ler uma pauta musical, tocar um instru-
Quase tantas quantas as baleias no mar dos Açores,
mento parecia-me demasiado difícil. Fui. Aprendi.
Capitães-Generais à procura de sons em objectos da
um pouco menos que as cagarras no céu. Só na Ilha
No momento de escolher o instrumento pedi flauta
vida doméstica. Pretendia-se encontrar e identificar,
do Pico são catorze. TODOS aprendem música. Mui-
transversal, o maestro simpático mas assertivo de-
em flagrante delito, vida musical em ruídos banais
tas gerações de tocadores.
clarou: Já tenho duas. Vai para saxofone! Eu assim fiz.
suspeitos de participarem na criação de música. Explorando instrumentos em staccato, legato, forte e
Quilómetros de fins-de-semana em concertos, pro-
E gostei.
cissões e demais festas pagãs. Resmas e resmas de
A intervenção das filarmónicas através do ensino, di-
piano descobriram que a música, até em versão pic-
pautas ensaiadas metodicamente, com rigor e con-
vulgação, fruição musical, criação artística e sociali-
cola, é sempre grande!
centração. Maestros dedicados.
zação, amplificam a função indispensável de serviço
Toda a Arte é uma permanente Revolução.
- Traz o teu instrumento. Ou então usa os nossos. Im-
público junto das populações onde estão inseridas.
portante mesmo é que venhas com vontade de inte-
Sons e ritmos a pulsar, compassos binários, terná-
Cristina Lourido
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Entrevista +Jazz academia das artes e da juventude da ilha terceira
Puto Ems Fazendo Música
Marco Menezes Martins
José Ribeiro Pinto, autor do programa de rádio “Os
eles surgiu a oportunidade e o convite para fazer um
Quais as suas preferências musicais no geral?
Marco Menezes Martins, musicalmen-
Sabores do Jazz”, que comemorou no passado dia 3
programa autónomo.
Adoro música clássica, ainda esta manhã estive a
te conhecido por Puto Ems, venceu
ouvir Mozart. Adoro os Beatles os The Doors adoro
recentemente o concurso “Desafio a
de Fevereiro 21 anos de vida (emitido na RDP Açores desde 1992), cofundador do festival Angra Jazz e o
O Sr. Eng.º é cofundador do Festival Angra
o Jim Morrinson. E também gosto imenso de fado,
DJ´s Produtores/ Descobrir os Açores
grande impulsionador da Orquestra AngraJazz.
Jazz que tem tido uma evolução notável a
mas sou extremamente exigente porque gosto de
2013”, com o hip pop “Orgulhosamen-
Engenheiro Civil de formação.
par dos melhores festivais a nível nacional e
fado bem cantado. Eu acho que o fado é a música
te”, o que lhe dará direito a participar
Em 2009 é homenageado pela Câmara Municipal de
internacional. Qual o segredo para se ter um
que mais se parece com o Jazz. Um fadista que cante
na primeira edição dos Azores Fringe
Angra do Heroísmo aquando da sessão comemora-
festival de sucesso, à parte de um bom cartaz
como deve de ser tem de swingar, quer dizer ele não
Festival, a realizar entre 19 e 30 de
tiva dos 475 anos de elevação de Angra a cidade em
claro?
swinga ele estila como se diz na linguagem do fado,
Junho na vila da Madalena, Ilha do Pico.
que foi distinguido com a medalha municipal de mé-
Ponto número um é sempre um bom cartaz, em se-
que no jazz chamamos swingar. Adoro o Camané,
Este cantor de hip-hop de origem ter-
rito cultural de Angra do Heroísmo.
gundo eu referia a disciplina, e também uma gran-
Carminho, Ana Moura…são grandes nomes da músi-
ceirense está a preparar um álbum
de carolice. Tem de se gostar muito daquilo que se
ca Portuguesa.
intitulado “Luz”, com data prevista de
Se pudesse prever a evolução do Jazz Açoria-
ao mesmo tempo que está envolvido
faz. Importante também é ter uma boa relação com a comunicação social. Eu costumo dar como exem-
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Fazendo Música
lançamento para o dia 1 de Outubro,
Sr. Eng.º. Lembra-se do seu primeiro contac-
plo o Cristiano Ronaldo ir jogar à ilha das Flores: se
no onde nos veria ou gostaria de ver dentro
to com o Jazz, ou em que altura começou a
ninguém souber que ele lá esteve é mentira que ele
dos próximos 10 anos?
na produção do EP do Jay, chamado “Jason’s Room” e o LP do Fugitivo, am-
ganhar-lhe o gosto?
lá tenha estado. Aqui é a mesma coisa, temos de
O que eu gostava era que houvesse mais jovens a
bos a serem lançados também este
Comecei a ouvir Jazz tinha uns 5/6 anos, porque
ter cá um jornalista do Público ou um jornalista do
tocar Jazz, mais músicos de Jazz mais consolidados e
ano.
o meu pai gostava muito de Jazz, principalmente
Expresso senão ninguém sabe no Continente que
que houvesse maior oferta de concertos. E natural-
gostava de ir ver as Big Bands de Swing. E naquele
tivemos aqui o Kurt Elling (http://www.youtube.
mente que esses músicos fossem tocar ao continen-
tempo vivíamos em Lisboa, nos anos 50, e eu lem-
com/watch?v=iXprs8-U5nA) a dar o melhor concer-
te e fossem conhecidos a nível nacional.
bro-me perfeitamente de estar a fazer os trabalhos
to do ano de todos os concertos de Jazz que houve
de casa, o pai estava a trabalhar, e eu ouvia rádio
em Portugal. E é por isso que o nosso festival é co-
No +Jazz acreditamos que o Jazz é música
Como é que foi a génese deste
em ondas curtas de emissões de rádios america-
nhecido a nível nacional e internacional, porque os
para a alma, partilha dessa opinião?
projecto?
aos meus pais, que desde sempre
uma geração que está perdida,
nas, ouvia Glenn Miller (http://www.youtube.com/
músicos gostam de cá vir e como é evidente cria uma
Claro que sim, eu diria que não há Jazz sem alma, um
O começo foi muito simples e inocente.
metiam a altos berros em casa esses
inclusive a geração dos pais des-
juventude açoriana?
watch?v=ZJE-onnw2gM) e Duke Ellington (http://
experiência e uma maturidade que faz com que as
músico que toque sem sentimento sem alma não
Desde 94 que ouvia Hiphop, deliciava-
artistas e eu, felizmente, comecei a
ta mesma geração, concordas?
Que tenham orgulho nas artes que se
www.youtube.com/watch?v=bHRbEhLj540) , de-
coisas corram todas bem. Depois são os músicos a di-
está a tocar Jazz está a tocar uma música corrida.
pois entrei naquela fase da juventude em que ouvia
zerem aos agentes que adoraram e posteriormente
os Beatles e os Beach Boys e em 68/69 quando en-
são os agentes a procurarem-nos e eles próprios pu-
trei para a universidade volto às sonoridades do Jazz
blicitam nas suas páginas e jornais dos seus países.
-me com o conteúdo que era uma “fo-
gostar (risos).
tografia” de cidades quatro vezes mais
O que é que gostarias de dizer à
Penso que a palavra protesto não será
praticam na região. Não tentem ir bus-
a apropriada. A cidade do gelo talvez
car ao longe algo que têm tão perto,
problemáticas que a minha, e nunca
O que é que estás a preparar nes-
tenha sido uma tentativa de mostrar
apoiem, divulguem o que é nosso. É
pensaria em tentar escrever nada.
te momento?
a uma sociedade diurna o que aconte-
claro que temos mil e uma plataformas
Contudo, certo dia, comecei a ter a ne-
Aqui vai a lista (risos). Neste momen-
ce quando dormem. É claro que todos
na internet para divulgar os nossos
Na sua opinião qual a maior dificuldade que
cessidade de fazer parte deste mes-
to estou a preparar principalmente o
nós sabemos que há noitada, que há
produtos, mas no fim do dia, não há
De Engenheiro a locutor de rádio como surge
encontra um músico de Jazz nos Açores?
mo “movimento” e, assim, lentamente,
meu álbum chamado “Luz”, que talvez
álcool e drogas, mas o que talvez não
melhor divulgação que a palavra. Por
esta oportunidade? Rádio era algo que dese-
Não têm onde tocar e portanto tocam muito poucas
comecei a escrever algumas letras,
seja lançado dia 1 de Outubro deste
sabemos é que hoje em dia, o que se
isso, sem nós, os “de casa”, tudo será
java fazer?
vezes, este é que é o nosso grave problema. Porque
embora, sem pensar em expor ou até
ano, o EP do Jay, chamado “Jason’s
vê nos filmes é literalmente o que
muito mais difícil.
Sempre estudei a ouvir rádio, desde cedo nutri uma
temos músicos belíssimos com muita qualidade, mas
mesmo fazer canções como hoje em
Room” e o LP do Fugitivo, ambos a se-
acontece na ilha, e é isto que pelo me-
imensa paixão pela rádio.
poucos deles conseguem solar, porque não têm
dia.
rem lançados também este ano. Jun-
nos a mim arrepia. A cidade do gelo é
Pensas que aquilo que fazes se
Tive a minha primeira experiência quando entrei
onde tocar acabando por ter uma falta de autocon-
tamente com isto tudo, temos alguns
um “cartão de visita” ao submundo,
pode considerar político?
para a Universidade, na Faculdade de Ciências de
fiança, não têm um incentivo para treinar.
e a partir daí nunca mais larguei o Jazz.
Entrevista de Daniela Silveira para +JAZZ
A partir de que material é que de-
concertos a realizar, tal como outras
o qual descrevo como um mero es-
Não. Penso que o que faço é uma reac-
Lisboa. Transmitíamos programas de rádio apenas
cides fazer as tuas composições
“Surpresas” que não posso adiantar
pectador. É claro que indirectamente
ção à política, é uma tentativa de des-
para a sala do refeitório, mas nós fazíamos aqueles
musicais?
programas como se fosse a coisa mais séria deste
Em termos de temas para as canções,
muito mais.
critico uma juventude com valores
crever as consequências de políticas
opostos aos meus e critico também a
talvez erradas. Se fosse para comparar o que faço à política, considerava a
mundo. Eu e um colega na altura fazíamos um pro-
não há nada especifico, ou seja, não
Qual foi a reacção das pessoas da
geração anterior (os pais) por não te-
grama pop-rock , mas conhecíamos um amigo nosso
há temas que abordo e que não abor-
Ilha Terceira nas tuas primeiras
rem dado a educação devida, mas no
minha música, o “partido do povo”, pois
que tocava num grupo de Jazz e propusemos que ele
do, sempre que sinto a necessidade
actuações? Já actuaste em ou-
fim do dia, a canção é mesmo a tal des-
é literalmente o que vejo no dia-a-dia.
tivesse uma espécie de 15 minutos de Jazz no nosso
de escrever, escrevo. Em termos ins-
tras ilhas?
crição desse tal mundo de uma forma
programa.
trumentais, também é um bocado do
Eu comecei a actuar tardiamente, só
pura sem rodeios.
mesmo, se bem que há estilos musi-
dez anos depois é que iniciei as minhas
Como surge a oportunidade na Rádio Difusão
cais mais propícios que outros.
Portuguesa-Açores?
lides no palco, com muita pena minha.
Sentes que aquilo que fazes é
Por ter começado muito tarde penso
açoriano e universal ao mesmo tempo?
Surgiu em 1991, embora se tivesse concretizado em
Quais são as tuas influências mu-
que não estranharam assim tanto,
1992, o Paulo Henrique Silva e a São Rocha que já
sicais?
porque já tinha algum nome. Em 2011
Completamente. Por muito que eu es-
trabalhavam na RDP convidaram-me eles iam come-
São muitas, literalmente muitas. Em
tive a sorte de ter actuado em várias
creva dos açorianos para os açorianos,
çar no dia 15 de Fevereiro de 1992 com um programa
termos de Hiphop propiamente dito,
ilhas como São Miguel, São Jorge e
em termos estratégicos, e de artista,
na nova grelha das 21h às 00h todos os dias e con-
sou fã de Mos Def, Nach, NBC, J Cole,
Pico, contudo, uma pessoa gostaria e
penso internacionalmente, em tentar
vidaram-me para eu fazer todas as segundas-feiras
etc. Em termos de música em geral,
precisaria de muitos mais concertos,
chegar ao maior número de pessoas.
meia hora sobre a história do Jazz. Eles já me conhe-
gosto desde a música francesa (Jac-
porque isto torna-se uma droga (salvo
Aqui no estúdio temos o lema de “Pen-
ciam porque eu já fazia umas coisas na anterior Rá-
ques Brel , etc), até Bossa Nova (Tom
seja claro).
sar só na região é pensar pequeno” por
dio Horizonte, uma rádio pirata que existia no Alto
Jobim, Vinicius, Chico Buarque, etc), ao
Das Covas e aí fazia um programa de Jazz com o José
Rock anos 60, e claro, o soul de Chica-
O tema “Cidade do Gelo” parece
presente a ilha e, consequentemente
Manuel Gaspar Correia. Quando acabou a série com
go. Esta abertura à música foi devida
ser um libelo de protesto contra
a região, tem como alvo o mundo.
isso, o que fazemos, por muito que re-
Entrevista de Fernando Nunes
8. #
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83 MARÇO ‘13
#83 MARÇO ‘13
A Primavera da Casa do Sal
Baleias e Baleeiros
Os Filmes Que Por Cá Se Fazem
Fazendo Cultura
Há um texto atribuído a Gaspar Fru-
bebidas verdes de teor ambiental e
ra sido presa 110 dias. São os slides
tuoso
sustentável e onde há quase sempre
de uma viagem aos Açores que agora
(Ribeira
Grande-S.Miguel-
-Açores:1522-1591) que diz que “…é
um concerto de permeio que logra ir
completa quarenta anos, podendo
necessário ter nascido do ventre de
da voz bem açoriana da Susana Coelho
agora ser vistos os fotogramas da ilha
uma mulher, numa ilha, ou morando
aos Wave Jazz Ensemble até à improvi-
Terceira. A 4 de Outubro de 2011, uma
nela, ser inoculado pelo vírus da in-
sação e interpretação de standards de
parte destes slides foram vistos na
sularidade”. Maior consciência terão
jazz em saxofone pelo Nuno Sardinha.
Ilha do Faial, na igreja de São Francisco,
aqueles que, tendo um dia vivido fora
O registo é sempre temperado e bem
bem como em Novembro de 2011, na
da ilha(s), imaginaram outras formas
refinado dependendo do tema em
escola primária de São Roque do Pico,
de vida e outros modos de preencher
combinação. Situada mesmo no cora-
sede da Associação Padre José Idalmi-
o quotidiano aquando do seu regres-
ção da baía de Angra, tendo o Monte
ro. Na altura desta última projecção
so aos espaços insulares de origem.
Brasil como horizonte e paisagem, a
houve um acompanhamento musical
Estes podem bem ser os motivos que
Casa do Sal é repetidamente poiso e
de Pedro Gaspar (Bandarra e Expe-
estão na base de quem tem sabido
abrigo da contemporaneidade e das
rimentar Na M´Incomoda). Um ano
dar o corpo às noites de tertúlia que
artes, sempre com apego e respeito
depois, esta apresentação contará
têm animado a programação da Casa
às tradições existentes no arquipé-
novamente com música improvisada e
do Sal nos tempos mais recentes, po-
lago, já para não falar das sessões de
preparada para o momento pelo músi-
dendo nós arriscar a dizer que esta é
ioga, aulas de pintura, crochet saltea-
co Paulo Cunha.
já um caso sério de uma actividade
do e sessões de leitura e discussão de
Em suma, a Primavera muito em breve
cultural regular e consistente, ali bem
livros que ali se podem obter. A oito de
anunciará a sua chegada e a Casa do
junto das zonas líquidas e tempera-
Março celebra-se o Dia Internacional
Sal – bonito nome, sem qualquer dú-
das do centro histórico de Angra. Nas
da Mulher e, para além de uma conver-
vida – será um espaço cada vez maior
noites de sexta-feira há, portanto,
sa-debate com uma representante da
e bem mais frequentado por todos os
a “SALgada Cultura” que consiste em
UMAR, a Sara, irão ser apresentados
interessados em aprender e descobrir.
conversas que podem ir da panóplia
“os slides de 1972” da artista plástica
Haja Angra e terceirenses para ilumi-
e combinação das mais diferentes es-
Tereza Arriaga, resistente política do
ná-la e povoá-la de vida e alegria.
peciarias nos hábitos alimentares às
período salazarista, tendo ela à altu-
algo que continuarei a fazer nos próximos meses. A
É um projecto que começou em 2010 e que, só após
questão que se me coloca todos os dias enquanto
meu ponto de vista sobre o que me contaram mais
dois anos de trabalho e de inúmeras tentativas fa-
monto o filme é: como se ligam estes temas?
de 40 baleeiros.
conseguiu em 2012 uma bolsa de criação artística
Fui procurando cada vez mais baleeiros. A caça já
Lembro-me do Sr. José Silveira, das Ribeiras do Pico;
através do Governo Regional dos Açores.
não pode ser filmada e para mim tudo reside na im-
contou-me: “O meu avô esteve na América a balear,
portância dos seus testemunhos, na maneira como
voltou e fundou a primeira companhia baleeira de
Desde cedo começou a fascinar-me a baleação
eles falam, nas palavras que usam, nas histórias de
Santa Cruz, a Companhia Americana (…)”. E pensar
americana e a participação açoriana nesta indústria.
que se lembram. Todo este processo constitui uma
que essa técnica ancestral de caçar baleias chegou
Imagino muitas vezes as aventuras vividas pelos
reflexão sobre quem foi o meu avô e os da sua gera-
vagamente até nós. Os ilhéus voltavam, transfor-
numerosos açorianos que durante o sec XIX embar-
ção, e a vida que eles viram transformar-se. Só eles
mavam os botes americanos em botes açorianos
caram clandestinamente em barcas ou brigues ba-
me fazem sonhar.
e lançavam-se de terra, em vez de partirem de um
terras da América, não sonhando que navegariam
O meu avô começou a balear aos 16 anos; lá ia ele
a mesma, uma canoa que faz de vela e faz de remo, um arpão e uma linha para perseguir o animal, uma
pelos mares do mundo à caça da baleia, antes de de-
arriando o bote de corrida logo que o foguete reben-
sembarcarem na costa norte-americana. Outros te-
tava na vigia. Caçou baleias antes de haver rádio, co-
lança para o matar. De preferência tudo em triplica-
riam ouvido histórias na primeira ou na terceira pes-
municando com as vigias através de sinais de pano e
do. E competiam os homens entre si para ver quem
soa e ansiavam por ver o mundo para além daqueles
de fumo. Rebocou baleias a força de remos, antes de
chegava primeiro, para ver quem apanhava mais
rochedos. Gostava de ter conhecido um daqueles
haver lanchas a motor. Desmanchou baleias no por-
baleias. Que confusão devia ser nesse mar! Botes
homens, mas esses são os velhos que contavam his-
to de Santa Cruz antes de haver fábricas nas Lajes,
daqui, botes dali, lanchas pra terra, lanchas pro mar.
tórias aos pais dos meus avós.
em S. Roque ou no Porto Pim. Os baleeiros estão a
Baleias mortas, baleias trancadas, linhas cruzadas,
desaparecer e não vão voltar a existir homens como
botes partidos, homens no mar, homens mortos.
Li o Dias de Melo (a minha grande referência) e o
eles. Os mais antigos lutavam constantemente com
Herman Melville, entre outros romancistas, histo-
a natureza, tanto na terra como no mar, pela sobre-
Hoje ainda navegamos nos nossos botes baleeiros,
riadores, biólogos e poetas. Vi os documentários
vivência nas ilhas.
para desporto, longe das baleias, perto da costa.
que se fizeram em época de caça nos Açores. Come-
Os baleeiros são o exemplo maior dessa luta: sabiam
Agora as baleias fazem mais dinheiro vivas. Mas o
cei a filmar o meu avô em 2009. As histórias que me
que a morte podia estar perto a cada arriada, e tal-
meu avô sabia como apanhar o Moby Dick. Ele e os
contou do seu tempo de baleeiro eram inacreditá-
vez por isso o meu avô mostre tanta vida
seus seis companheiros sabiam mesmo como apa-
anos de idade. Ainda Dediquei os últimos tempos a ver
Fazendo Prosa
O senhor Emerenciano tem aquela idade provecta
no hospital da capital, enrolado em gesso. O que é
em que facilmente confunde um piano com uma
que foi, dona Leocádia, o que é que aconteceu? foi
No dia seguinte, ao começo da noite, havia concerto
jarra de flores de plástico – sobretudo quando sobre
a primeira frase que se lhe ouviu – aliás, ninguém a
da orquestra municipal no salão da freguesia. E lá foi
o que basta…
um piano apenas pairam as sombras provocadas
ouviu, pois quando despertou estava sozinho, e as-
ele, todo aperaltado, sempre tinha sido maestro de
pelas suas cataratas. Digamos, para simplificar, que
sim ficaria, que era pessoa sem família. A dona Le-
filarmónica, homessa! Quando chegou, estava a sala
o senhor Emerenciano sofria de imaginação senil –
ocádia também não poderia ter ouvido: no mesmo
repleta e os músicos atafulhados no palco quase a
em estado irreversível.
dia e na mesma hora em que o senhor Emerenciano
darem início à função. O senhor Emerenciano olhou, olhou e de repente exclamou em alta voz: onde está
Um dia, estava o senhor senil, perdão, Emerencia-
fora passado a ferro pela camioneta, a mexeriquei-
no, a tratar das suas drogas, pois droguista era a
ra tivera um mortal ataque de coração, fulminante.
o meu piano, gatunos, onde está o meu piano? A
sua profissão, quando lhe entra pela botica, espa-
Esteve, pois, o senhor Emerenciano longos três me-
sala inteira de imediato mostrou ao droguista a sua
vorida, a dona Leocádia, de profissão indefinida e
ses hospitalizado sem saber de Leocádia e do moti-
indignação, do estilo: queres levar o piano p’ra casa?,
prática linguareira mais do que diplomada. Venha
vo por que o chamara ela à rua naquele fatídico dia.
‘tá caladinho, vai mas é curá-la p’ró caneiro! ou: vai-te
ver, senhor Emerenciano, venha ver, depressa! E
Quando chegou à sua terra apenas ficou a saber que
encher de veneno de ratos! O senhor Emerenciano,
tão rápida quanto entrou, saiu da botica do senhor
o cemitério tinha mais uma sepultura. Emerenciano
saindo “à francesa”, resolveu optar pela última “sugestão”.
Emerenciano a dona Leocádia. Emerenciano, dado
tinha os ossos mais ou menos colados mas as anti-
a mexeriquices, nem pensou duas vezes, saiu tam-
gas forças tinham ido parar a outra freguesia. Pen-
No exacto momento da ingestão do veneno, come-
bém a correr. Mal pôs a patorra direita na estrada
sou então em matar-se com veneno de ratos, mas
çava no salão o concerto, com o tema Ilhas de Bruma.
logo se arrependeu, e decidiu ir à pesca. Nem vos
e um imenso carácter aos 88
veis.
O Abominável Homem das Cataratas
digo como correu a pescaria, para desgraças já basta
navio num mar distante. A técnica era praticamente
leeiros. Muitos queriam apenas uma passagem para
rever tudo aquilo que filmei:
Lá foi o senhor Emerenciano pelos ares! Só acordou
do filme, mas, seja ele qual for, retratará apenas o
Baleias e Baleeiros vai ser um filme, mas ainda não é.
lhadas de ser financiado no Continente e nos Açores,
Fernando Nunes
foi colhido pela camioneta da carreira matinal. Pum!
Fazendo Cinema
Carlos Alberto Machado
as entrevistas aos baleeiros, as regatas de botes, o negócio de observação de cetáceos;
e
nhar e matar uma baleia e isso não era mais do que a vida deles.
não sei qual vai
Luís Bicudo
ser o resultado
baleiasebaleeiros.wordpress.com
10. #
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83 MARÇO ‘13
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83 MARÇO ‘13
Cartas do Exílio VII
ir do Faial à China e voltar
Fazendo Viagens
Dadadatackdadadack… Xian, uma curta viagem de
Um parque público em Shanghai, a apenas 14 ho-
respeito pela sua comida que usa ingredientes des-
12 horas, é uma cidade de 5 milhões de pessoas. Pe-
ras de comboio, num domingo de manhã: como nós
conhecidos e cria cheiros deliciosos e nunca vi uma
quena, se comparado com Pequim (20 milhões). Há
levamos as crianças ou os cães ao parque num do-
pessoa, nem adulto nem criança, com peso a mais. E
1300 anos, durante a dinastia de Quing, Xian era a
mingo, os chineses levam os seus pássaros. Em cada
tenho respeito pelo tamanho do país e pelo seu nú-
capital da China, e na altura já havia 2 milhões de
árvore ou arbusto há pelo menos duas gaiolas e os
mero de habitantes: 1300 milhões.
habitantes dentro das suas agora bem restauradas
seus proprietários juntam-se perto para comparar
muralhas - um conjunto de pedras maciças de uma
talento para cantar ou a sua beleza. Há grupos de 15
Apesar disso o país também se ajusta: dezenas e de-
largura de 30 metros a abraçar a parte interior da
pessoas na relva a praticar Tai Chi, homens a correr
zenas de arranha-céus brotam da terra em todas as
cidade. Lá em cima alugam-se papagaios e bicicletas
enquanto recitam poemas, mulheres a andar em
cidades, cada um a oferecer aproximadamente 400
para circundar os seus 13 km de perímetro - o único
slow motion, cada pé levanta-se desde o calcanhar
canis para viver e se olharmos para um mapa de mi-
lugar onde tive confiança para conduzir …
aos dedos, pausa, depois a perna estende-se à fren-
gração vemos que há 15 anos 75% da população vi-
te, pausa, lentamente os dedos ao calcanhar, pausa,
via nas aldeias e 25% na cidade. Hoje o ratio é 50:50.
Quinta-feira é dia de Mercado no centro da cidade
depois outra perna… e tem as mesmas máquinas de
E amanhã?
(metade são muçulmanos) e cada rua tem artigos
exercício que nós temos no Parque da Alagoa, só que
de uma certa área para vender: uma rua vende pás-
ali todas estão ocupadas!
saros exóticos junto a lindas gaiolas ornamentadas
Tal como disse uma vez que no Faial se vive de vez em quando por baixo de uma campânula, na China
Montra de Ler António Manuel Couto Viana
12 Poetas Açorianos
com tigelas pequeninas de cerâmica para pôr água
Para acabar, que país lindo e arrebatador! Nunca
também há sempre uma, com o vidro embaciado, es-
ou alpista; outra rua tem vegetais e frutas de for-
pensei vir a gostar da China. Nem gostava da comida.
fumado... Há uma nebulosidade e névoa constantes
Edição da Salamandra, 2001
mas e cores nunca vistas; havia uma que era dividida
Agora estou cheia de respeito por eles, pela sua ma-
que nunca permitem, mesmo num dia sem nuvens,
(156 páginas)
em carne de um lado e tofu em todas as formas e
neira de tratar os outros, sempre cortês e com um
ver o céu azul ou ver mais longe que 2 km e é difícil,
texturas de outro. A seguir uma com animais vivos:
sorriso - ok, se calhar por ter vindo da Rússia é muito
se não impossível, localizar a posição do sol.
tartarugas, ratos, cães, porquinhos-da-Índia e grilos
fácil impressionar-me...
em jaulas minúsculas; uma rua oferece especiarias e
Ruth Bartenschlager
Fazendo Literatura
Joaquim Manuel Magalhães José Sousa Gomes
Do Corvo a Santa Maria Edição Relógio D’Água, 1993 (200 páginas, ilustrado)
Nesta compilação de pequenos textos sobre poetas açorianos (de origem, adopção ou contingência),
Do Corvo a Santa Maria é, sem dúvida, um dos mais
reencontramos Couto Viana na sua faceta mais en-
singulares livros dedicados aos Açores. Antes de
pós coloridos - e em todas estas ruas, além das me-
Tenho respeito pelas suas tradições e pela sua lín-
saística. Não estamos, contudo, perante um crítico
mais, pelo modo fortíssimo como os textos (em que
sas e barraquinhas de vendedores e das centenas
gua poética - cada palavra tem dois sentidos, Xian
escravo de teorias ou modas, mas de alguém que
confluem poesia e prosa) de Joaquim Manuel Maga-
de compradores, também há o trânsito, sempre com
por exemplo, para alem de ter sido a capital que uniu
demonstra uma atitude assumidamente subjecti-
lhães e as fotografias de José Sousa Gomes parecem
buzinas e gritos.
o país por muitos anos, o seu nome é composto por
va e descomprometida, tanto na escolha como na
aliar-se contra o cliché, o lugar-comum. E porque, ao
Todavia, Xian não é famosa pelo seu mercado mas
Xi = sempre e An = paz. Weiji, traduzido à letra, junta
abordagem dos autores. Sejam nomes consagrados
invés de análises de carácter mais etnográfico ou
as palavers Wei= perigo e ji= oportunidade. Tenho
ou vultos mais esquecidos nas dobras do tempo e da
sociológico, nos deparamos com um livro feito de
pelos seus soldados de Terracota - impressionante,
geografia, todos obedecem a um critério de gosto
acasos e perdas, de «corpos intocáveis e desejos
sem dúvida, mas uma loucura! Um imperador que
pessoal, de afinidade electiva, conseguindo Couto
que para sempre irão» (p. 71), perdidos nos corredo-
precisava de mais de 6000 figuras de barro, cons-
Viana fazer-nos aceder à sua «imagem humana e
res do tempo e da geografia. Um livro pessoal mas
truídas por 700.000 trabalhadores para lhe fazer
literária» (p. 68), ao mesmo tempo que nos pinta
transmissível.
companhia no seu mausoléu! Isso já não é loucura,
um fresco do meio geográfico e histórico em que se
antes uma presunção arrogante indescritível!
moviam. Genuíno Madruga
O Mundo Que Eu Vi
Duplas Frente Mar - Cidade da Horta - 1912 vs 2012
Manuel Tomás
Maroiço Edição da Companhia das Ilhas Lajes do Pico, 2013 (48 páginas) O autor picoense dedica-se, desde meados dos anos
Edição da Veraçor, 2011
1970, a investigações de cultura e de língua portu-
(168 páginas, profusamente ilustrado)
guesas. O ano de 2012 deu-nos a conhecer uma outra faceta sua, a de poeta. Na verdade, com a colega
Genuíno Madruga foi o 10º velejador mundial, e o priFazendo Comparação
de escola Marta Alexandra Campos Oliveira, Manuel
meiro português, a dar a volta ao mundo em solitário,
Gaspar, aliás, Manuel Tomás Gaspar da Costa, deu-
dobrando o Cabo Horn do Atlântico para o Pacífico,
-nos, deram-nos, sob o nome Oliveira e Gaspar, o
em cerca de 2 anos de viagem, terminada com a che-
livro de poesia Entre Sei Lá e o Quê (edições Vieira
gada ao Pico em Junho de 2009. Essa proeza está
da Silva). Ainda em 2012 saiu o livro de crónicas Pi-
agora documentada neste belo álbum, patrocinado
colândia e agora este Maroiço, igualmente de poesia
pela Mútua dos Pescadores, Governo Regional e por
(ambos Companhia das Ilhas).
diversas Câmara Municipais. Genuíno nasceu em S.
Um dos símbolos característicos do Pico – o “maroi-
João do Pico. Em 1975, conheceu Marcel Bardiaux,
ço” – é o leit motiv para esta nova digressão poética
protagonista de 4 voltas ao mundo, entre muitos
de Manuel Tomás. «Na terra dos ilhéus / um sítio
feitos excepcionais. Em 1999, Genuíno adquiriu um
sobressai / há salgueiros e muito azul / basalto rijo
veleiro em fibra de vidro com 11,1 metros, que bapti-
/ e cinzento ao vento / na aspiração dos figos / ama-
zou de Hemingway. Pouco tempo depois, às 9 horas
relos no gosto / como o sal na rocha / e o sol à chuva
do dia 28 Outubro de 2000, começou a concretizar
/ caída nos laranjais / à beira dos maroiços / onde
o sonho e desafio que há muito acalentava: circum-
cresce o funcho / e o mar entra pelas narinas / rasas
-navegar o planeta a bordo de um veleiro, façanha
de nêsperas / e ameixas perdidas.» (“Do lugar”, p. 11).
que terminou em 2002. Cerca de 9 anos depois, a que agora relata.
Carlos Alberto Machado/Companhia das Ilha
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12. #
83 MARÇO ‘13
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Odisseia de uma tartaruga marinha Fazendo Ciência
83 MARÇO ‘13
Cuidar na sua Essência
Fazendo Saúde
Fazendo Saúde
Seres humanos!
tartaruguinhas guerreiras que tenta-
vo de acasalar. No entanto, é tanta a
Gostaria de redigir esta minha reflexão de uma for-
podendo então, orientar de forma ética os meus
de crenças e valores próprios. Tudo isto experimen-
Estou presa numa rede de pesca per-
vam a todo o custo sobreviver.
oferta que dou por mim a acasalar com
ma original, sem desacatos, rasuras ou descuidos.
comportamentos.
to diariamente na relação com os clientes. Percebo
dida no oceano, e só me restam alguns
Quando por fim chego ao mar, deparo-
muitos deles.
Nenhuma tristeza, nenhuma nota destoante que a
É deste modo, que enquanto enfermeira de cuida-
que a satisfação das suas necessidades exige muita
minutos de vida. Se não me conseguir
-me com uma forte rebentação. Deba-
Em bolsas especiais que possuo no
possa desafinar. Que ao lê-la pudessem sorrir como-
dos gerais a exercer funções em meio hospitalar,
atenção, dedicação, sentido de disponibilidade, pro-
desenvencilhar desta maldita rede,
to-me então com tal ondulação, que
meu ventre, armazeno os vários es-
vidos. Uma reflexão espontânea, singela mas com
consigo justificar toda a minha prática quotidiana.
fissionalismo, sentido crítico e autonomia.
que se estende por centenas de km,
com todas as minhas forças, ultrapas-
permas para depois fecundar os meus
felicidade e realização. É muita pretensão a minha,
Uma prática que vem crescendo por processos de
De fato, o centro da minha preocupação é o cliente
a pescar tudo o que mexe nos nossos
so e nado para longe até atingir o mar
ovos. Assim, os meus filhotes não te-
mas eu desejaria que assim fosse.
formação pessoal e profissional, experiências vi-
que me comprometo cuidar. Daí, que a autonomia e a
oceanos, serei mais uma tartaruga
aberto.
rão apenas um pai, mas sim vários. No
Para mim, a palavra Cuidar tem imensos significados,
venciadas quer sejam positivas ou negativas, todas
responsabilidade se configurem fundamentais nos
marinha que entrará para as estatísti-
Com barbatanas do tamanho de asas
entanto, eu e qualquer um daqueles
peço a Deus longos anos para que possa a cada dia
culminam numa aprendizagem contínua e transpa-
cuidados que desenvolvo e tudo faço para que se-
cas da pesca acessória!
de uma borboleta, impulsiono-me,
machos, não compartilharemos as
que passa, ter a oportunidade de a descobrir muito
recem nos cuidados de enfermagem prestados a
jam cuidados de excelência, equidade e proximidade.
Durante a luta que travo com a rede,
libertando-me da terra entrando no
nossas vidas. Esta última parte da
mais, apreciando o valor a sua beleza e magnificên-
cada cliente.
Agir em função do outro e ir ao encontro das suas
que se emaranhou nas minhas barba-
desconhecido abismo, o mar. Sou
rem grandes distâncias, levados pela
viagem é exclusivamente para mim e
cia.
Estabelecer uma relação de confiança, vinculada
necessidades, proporcionar-lhe momentos de alen-
tanas e carapaça, e que me impossibi-
agora uma peregrina no imenso Oce-
corrente rumo à zona de alimentação
devo fazê-la sozinha. Já não me guio
Desde cedo que cuidamos, à medida que crescemos
muitas vezes pelo primeiro encontro; ser quem de-
to que possam atenuar a dor e o incómodo causados
lita agora de chegar à superfície para
ano Atlântico e farei uma das viagens
de verão, no norte. Mas, a minha via-
pela memória ancestral, senão pela
vamos tendo essa noção do cuidado, quer connosco
monstrou um sorriso precursor de um acolhimento
pela situação de doença, são de fato, o fundamento
respirar, sou invadida por uma panó-
mais longas do mundo. Mas jamais me
gem é incrível. Viajo na minha balsa
minha própria, por já ter estado ali an-
quer com as pessoas e as coisas que nos rodeiam,
eficaz; ser quem dá informação, quem fundamenta,
de toda a relação/comunicação que se possa desenvolver.
plia de flashes de vários momentos
esquecerei onde nasci. Nado durante
a 8 km/h, a incrível velocidade da
tes, há mais de vinte anos. Encontro
torna-se uma responsabilidade que emana do inte-
mas essencialmente quem escuta; quem permite
que passei pela minha longa vida.
dois dias e duas noites e chego por
Corrente do Golfo. No entanto, devo
agora uma terra muito diferente da
rior com uma energia inexplicável que só se conclui
que falem de si, dos seus medos, ser respeitadora
Vem-me agora à memória o dia em
fim à grande Corrente do Golfo. Esta
confiar no meu passado, pois durante
que deixei. Defesas construídas, por
no outro, enquanto pessoa.
muito feliz. Fiquei estupefacta, sem saber ao que
que nasci. Eu, e a minha centena de
será a minha rota pelo oceano, como
milhões de anos, tartarugas como eu,
causa da subida do mar, parecem-se
Foi no trilho da enfermagem e nesta incessante
ela se referia, mas ela esclareceu-me: “ …fiquei mui-
irmãzinhas. Foi num dia quente de ve-
foi para as outras gerações de tarta-
nadaram atravessando o poderoso
um estranho labirinto de recifes que
vivência de me tornar uma cuidadora por excelên-
to feliz quando me disseste que a minha filha podia
rão numa praia do sudoeste da Florida.
rugas. Entro no coração desta intensa
Atlântico. Por agora, a minha balsa é
bloqueiam o meu caminho para a praia.
cia, que caminho, e a cada passo descubro a multi-
trazer a minha maquilhagem, o que mais gosto é
Pelo amanhecer e após cerca de três
corrente e em poucos minutos volto à
todo o meu mundo. Gostaria que fos-
Depois de tanto lutar para deixar a
plicidade do cuidar como o verdadeira senda para a
andar bem arranjada…” Então percebi a razão da sua felicidade e isso contribuiu para tornar mais forte a
Um dia, uma cliente disse-me que eu a tinha feito
dias a escavar, chegámos finalmente à
superfície para mais uma respiração,
se apenas minha, mas há outros que
terra, luto agora para regressar a ela.
felicidade.
superfície. O mar estava apenas a 40
pois como todos os répteis tenho de
chegaram antes, como estes peque-
Com a cabeça fora de água, altas som-
Cuidar, em meu entender, significa tudo na enfer-
ideia de que são pormenores como este, que fazem
m de distância, mas para mim, que era
respirar ar. Depois de mais 70 km en-
nos peixes que aqui procuram abrigo
bras e falsas estrelas chegam de terra.
magem: é proporcionar bem-estar e contribuir para
do cuidar grandes momentos e o torna personaliza-
tão pequena, a praia parecia imensa.
contro o que procurava, um aglomera-
e alimento ou aqueles, que passam
São grandes prédios e luzes que os ilu-
uma boa qualidade de vida, é olhar interessadamen-
do sem prejudicar a vivência de cada pessoa.
No entanto, eram poucos os minutos
do de algas, como se de um bote salva-
aqui toda a sua vida, como o frágil ca-
minam. Mas a minha praia é esta! Toda
te, falar com verdade e ouvir com compaixão. É reali-
O cuidar, é deste modo, pessoal, intencional, rela-
-vidas se tratasse. E pela primeira vez
valo-marinho, que se camufla em todo
a minha vida foi uma preparação para
zar as funções que me são confiadas o melhor possí-
cional, depende da vontade, do auto conhecimento,
que tinha para viver ou morrer. Rapidamente, sou surpreendida por
rendo-me ao sono.
este ambiente. Na imensidão do azul,
este momento. Seis mil vezes maior,
vel com o sentimento de o fazer cada dia melhor.
de desprendimento, de grande responsabilidade e
um exército de caranguejos que pa-
Ao largo de centenas de km, inúmeras
a balsa é o meu único refúgio. Agora
regresso agora à praia onde nasci. E
O ato de cuidar envolve uma ação interativa entre
comprometimento.
trulhavam a praia, ao qual e com sorte
acumulações de sargaços transpor-
vejo estes gigantes de pedra; ilhas
por isso nesta noite troco a elegância
quem cuida e quem é recetor desse cuidado, visan-
O cuidar não pode ser comprado, é o que temos de
consigo escapar. Pelo caminho, a tris-
tam pequenos organismos. Ao meu
oceânicas perdidas no meio Atlântico,
do mar pela gravidade da terra. Subo
do prevenir a doença e promover os processos de re-
mais precioso, é um pouco de nós mesmos. É uma
teza é grande ao ver que dezenas das
redor existem outras viajantes em
onde o meu alimento preferido abun-
lentamente pela areia e por fim, cavo
adaptação após a mesma. Procura-se também a sa-
chave especial que abre o cofre interior, onde se
minhas irmãs não conseguem vencer
marcha. Golfinhos, baleias, mantas e
da: águas-vivas, caravelas-portugue-
um ninho de meio metro de profundi-
tisfação das necessidades humanas fundamentais,
encontra tudo o que há de mais puro, verdadeiro e
tais predadores tão vorazes. Mas o
tubarões, cruzam também o Oceano
sas e outros organismos gelatinosos.
dade, onde deposito a minha dívida à
a máxima independência e proporcionar a reabilita-
pessoal…Não é uma chave de ouro, mas com valor
perigo, naquele momento, não esprei-
Atlântico. A Corrente do Golfo é como
Nos Açores vaguearei por cerca de 15
terra. Esta antiga oferenda é o propó-
ção por défices frequentemente através
imenso porque vai embalada com vontade de só fa-
tava apenas por terra, mas também
uma grande auto-estrada marinha
anos, gozando a minha juventude.
sito da minha viagem de toda a minha
de processos de aprendizagem do
pelo ar. Inúmeras aves marinhas bom-
utilizada por muitos dos animais mi-
vida. Sou mãe e triunfei!
cliente.
bardeiam a superfície do mar a fim
gradores do Atlântico Norte. E em cada
Mas, continuo emaranhada na rede e
O cansaço e desespero tomam outra
Neste processo, é impor-
de conseguirem apanhar uma de nós,
primavera, os nómadas do mar percor-
sinto-me realmente exausta, quase
vez conta de mim. Há quase 1 hora que
tante saber estar e de-
no meu limite. Mas parece ainda haver
estou aqui presa e a esperança de so-
senvolver uma prática
desabrochado no meio
tempo para mais uma recordação, que
breviver começa agora a desvanecer-
onde assente a ideia
de tanto sofrimento, …
marca outro momento importante na
-se. São vários os cortes que possuo
de que, cuidar, im-
na sensibilidade e na
minha vida. O dia em que regressei
nas minhas barbatas e pescoço e só
plica uma enorme
força perante a vida.
pela primeira vez à praia que me viu
um milagre me tirará deste desastre.
responsabilidade
É aqui que culmina
nascer.
Lá ao fundo vejo uma sombra que me
ética, onde o objec-
a minha caminhada
Seguindo o campo magnético da Terra,
parece um mergulhador. E como um
tivo é a adopção de
trilhada de trabalho,
oriento a minha bússola interna rumo
passo de magia vejo-me finalmente
atitudes,
tristezas,
à praia no sul da Florida. Junto à costa
livre daquela rede assassina. Tal acto
tamentos e práti-
cansaços e anseios,
encontro-me com outras tartarugas
de bondade torna-me de novo um ser
cas possuindo uma
…onde começa o vos-
da minha espécie. Como é bom ver
livre! Obrigado ser humano, por me
visão holística do
so alento e desponta
que para além de mim, também outras
salvares a vida!
ser humano, pois,
a minha felicidade.
conseguiram sobreviver e chegar até
Ana Besugo
zer bem, só ajudar e nunca perturbar. Os frutos desse bem são colhidos
compor-
a cada dia na tranquilidade da aceitação e no sorriso
emoções,
essa amplitude de
aqui. Somos os preciosos sobreviven-
perspectiva,
tes de mais uma geração de tartaru-
mite
gas. Só uma, em cada dez mil, chega
as minhas próprias
Regina Venâncio
tão longe.
responsabilidades
Silveira
Alguns machos que por ali vagueiam
e os meus deveres
aproximam-se de mim com o objecti-
para com o outro,
per-
A todos Bem-haja
reconhecer
14. #
.15
83 MARÇO ‘13
#
Entrevista com o Morcego Frederico Cardigos
Agenda Cinema
Música
Março ‘13
Evento
Dia Mundial do Teatro
Fazendo Entrevista
Chamarritas
Fábrica da Primavera
Casa do Povo
centro de artes das lajes
teatro radiofónico
São Caetano
do pico
104.7 fm
16 de Março . 21h00
23 de Março
27 de Março
15h00 às 17h30
9h30, 11h30 e 17h30
Feira
Idade: 42 Profissão: Biólogo Marinho,
O que é que pequeno-almoçaste?
Assuntos do Mar dos Açores
Feira Rural da
Concerto
Poesía
O habitual. Nem mais um trago de nada ou o resto de alguma
de Ang Lee
Pedreira
coisa.
Teatro Faialense
Criação Velha
poesia musicada a várias
exercendo as funções de Diretor Regional dos
A vida de Pi
inúteis, o que pode ser periódico e que favorece o seu crescimento, forma-a, trata-a e renova-a.
Concerto Sinfónico de
Há também uma técnica açoriana de fazer com que a
Páscoa
planta não cresça, chamada bonsai.
15 e 17 de Março . 21h30
17 de Março
vozes
Horta-Camerata
Se o Conde Drácula viesse cá às ilhas onde o levarias?
Lajes do Pico
11h30 às 16h30
Matriz da Madalena
de Kurt Spanier
Ver a lua a nascer por trás do Pico, até porque o senhor se dá
16 Março . 21h00
mal com o Sol. Aliás, se aqui visse o Sol, neste período do ano,
Na jardinagem, poda é o ato de se retirar parte de plantas, arbustos, árvores, cortando-se ramos, rama ou braços
Dia Mundial da
Nome: Frederico Cardigos
83 MARÇO ‘13
23 de Março
Local a designar
Cinema
19h30
31 de Março . 21h30
Força Ralph
Cinema
Teatro
era mesmo um grande azar.
Oficina
Qual é a semelhança entre o Pico e o Faial?
Artítico-Pedagógicas
Teatro Faialense
Pouca coisa. Têm ambas boa gente.
com Susana Moura
17 de Março . 17h00
Antes de Começar
“Em tempos, o Teatro começava como por magia: a magia
Centro de Formação
Lajes do Pico
de Almada Negreiros
dos festivais sagrados, a magia do momento em que as
Se não gostas de chuva o que é que estás aqui a fazer?
artística da Madalena
16 Março . 17h00
Teatro Faialense
luzes se acendem. Hoje é o contrário. O Teatro é pouco
A mi me gusta mucho! O “aqui” e a “chuva”.
16 de Março
5 de Abril . 21h30
desejado e quem lá trabalha merece pouca confiança.
Na escola que outra “disciplina” deveria ser obrigatória?
Evento
Feira
Biologia marinha com especialização em espécies e ecossis-
6 de Abril . 21h30
Por isso, não podemos esperar que o público compareça
7 de Abril . 21h30
com devoção e atenção. Nós é que temos de captar a
14 de Abril . 21h30
sua atenção e fazê-lo acreditar. Só o conseguiremos se
temas dos Açores. Quem conseguisse dizer o nome da disci-
Alfama
Os Miseráveis
19 de Abril . 21h30
provarmos que não há truques, que nada está escondido,
plina sem pestanejar já teria positiva.
Uma História do Fado
de Tom Hooper
20 de Abril . 21h30
abrindo as mãos e mostrando que não temos nada na
Teatro Faialense
Teatro Faialense
21 de Abril . 21zzzh30
manga. Nessa altura poderemos começar.” Peter Brook
16 de Março . 21h30
23 e 24 de Março . 21h30
Porque é que tens alguns projectos na gaveta? Porque, se estivessem todos em cima da mesa, não consegui-
Lajes do Pico
ria trabalhar.
Mercado de Trocas
O que é que mais odeias na internet?
23 de Março . 15h00
22 Março . 21h00
Castelo de São Sebastião
A velocidade nas Flores e no Corvo. Vem, cabo de fibra óptica! Que forma de arte é que te aguça os caninos? A melodia da boa música, as cores da excelente pintura, as formas da magnífica escultura, as linhas e as entrelinhas da literatura espetacular e tudo aquilo que reflete a excelência de alguns seres humanos. Tenho mesmo pena de não ser hábil o suficiente para provocar as sensações que me fazem sentir os magos da arte. O que é que gostavas de ter nascido? Sei que é estranho, mas gosto de mim assim… Gostavas de ir morrer longe? Não. Gostava de ir longe, de vez em quando, e voltar aqui sempre que possível. Também podemos “ir longe” aqui, não é?
Gatafunhos
Tomás Melo
Horários
Índice 83
.2
Fazendo Crónica Horta — Madalena
Ilhas Habitadas
.3
7h30 10h30 13h15 15h15 17h15 Fazendo Prosa Ernesto
.4
Fazendo Música Heitor Lobo
.4
Fazendo Música Sapateia
.5
Madalena — Horta Fazendo Música
8h15 11h15 14h00 16h00 18h00
Esculpir Sons
.5
Fazendo Música Entrevista +Jazz
.6
Fazendo Música Puto Ems Cedros — Horta
Horta — Cedros
P. Norte — Horta
Horta — P. Norte
7h00; 12h45; 16h00;
11h45; 15h20 (Hospital);
7h00; 12h45;
11h45; 17h30;
Sábados: 8h00
18h15;
Sábados: 8h00
Sábados: 13h15
Sábados: 13h15
.7
Fazendo Cultura A Primavera da Casa do Sal
.8
Fazendo Prosa Abominável Homem Piedade — S. Roque — Madalena
Madalena — S. Roque
Piedade — Lajes
Madalena — Lajes
— Piedade
— Madalena
— Piedade
6h15; 13h30;
10h00; 17h45;
5h45; 12h55;
10h00; 17h45;
Domingos e feriados: 13h15
Domingos e feriados: 9h30
Domingos e feriados: 12h55
Domingos e feriados: 9h30
das Cataratas
.8
Fazendo Cinema Baleias e Baleeiros
.9
Fazendo Viagens Cartas do Exílio VII
.10
Fazendo Comparação Duplas
vai.se.fazendo@gmail.
.10
Fazendo Literatura Montra de Ler
.11
Fazendo Ciência
Fazendo Publicidade
Odisseia de uma Tartaruga Marinha
.12
Fazendo Saúde Cuidar na sua Essência
.13
Fazendo Entrevista
vai.se.fazendo@gmail.com
Com o Morcego
.14
Gatafunhos
.15
Agenda
.15