LIVRO DARDO PARTE 1

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felipe barbosa


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felipe barbosa



A estética doméstica de Felipe Barbosa

Paulo Reis

I guess I am trying to make sense of a century of political disasters and artistic breakthroughs. To drill a hole in the wall and let the sun in. I guess I am trying to understand with Marcel Duchamp was such a great artist. Thierry de Duve

Os readymades de Duchamp personificaram, é claro, a proposição de que o artista não inventa nada, de que ele ou ela apenas usa, manipula, desloca, reformula e reposiciona aquilo que foi oferecido pela história. Não para com isso retirar do artista o poder de intervir no discurso, de alterá-lo e de expandi-lo, mas apenas para abrir mão da ficção de que a força surge de um eu autônomo que existe fora da história e da ideologia. Os readymades propoõem que o artista não consegue fazer, mas apenas tirar de algo já existente. Douglas Crimp

Thierry de Duve. Kant after Duchamp. Cambridge: The MIT Press, 1996.

Douglas Crimp. Sobre as ruínas do museu; fotos Louise Lawler. Tradução de Fernando Santos. São Paulo: Martins Fontes, 2005.


O título “Estética doméstica” evoca o livro Homemade esthetics – observations on art and taste, do crítico Clement Greenberg. Não se trata de homenagem, tampouco de uma crítica, mas sim de uma apropriação inequívoca do título pois este é evocativo dos procedimentos pelos quais o artista Felipe Barbosa elabora sua obra. Greenberg, ferrenho defensor de uma arte formalista, lutou desesperadamente contra o readymade a tal ponto que suas considerações estéticas são o canto do cisne do entendimento moderno do fazer arte. Depois de Duchamp, a estética moderna teve de ser domesticada em função dos novos procedimentos por ele apontados. Com o advento do minimalismo e da pop art, o readymade triunfou categoricamente. O crítico norte-americano, ideólogo de uma arte social, já apontava, anteriormente, no texto intitulado “Vanguarda e kitsch”, a ruptura que Duchamp provocara no momento em que insere o objecto serial como discurso. Em “Vanguarda e kitsch”, Greenberg ataca o processo interno da modernidade e seu flirt com a cópia. Para o crítico, a contaminação do kitsch nos objectos artísticos soava-lhe como “versões descafeinadas da arte elevada produzida para as massas industriais como compensação pela perda de tradições populares”. A visão marxista de Greenberg, em contrapor a obra de arte à cultura de massas, levou-o ao epíteto de formalista, renegando todo processo da arte disfuncional nas experiências vanguardistas. A questão central apontada por Greenberg é retomada quarenta anos mais tarde por Hal Foster. Num texto intitulado “The future of an ilusion, or the contemporary artists as cargo cultista” [O futuro de uma ilusão ou o artista contemporâneo como cultor de carga], Foster discorre sobre as razões de a arte (pós) moderna ser uma prática dialéctica em sua génese, essência e na sua finalidade. Um esclarecimento a priori: o título do ensaio citado alude a dois aspectos relevantes nas áreas das ciências sociais do século XX. Primeiro, toma emprestado o título do livro de Sigmund Freud (O futuro de uma ilusão), publicado em 1927, no qual o psicanalista discute as relações entre capitalismo, poder, fetiche, autonomia, anulação do superego e a manipulação da massa.

Clement Greenberg. Estética doméstica – observações sobre a arte e o gosto. Tradução de André Carone. São Paulo: Cosac e Naify, 2002. (Homemade esthetics – observations on art and taste. Oxfort University Press).

Clement Greenberg. “Vanguarda e kitsch”. Em Rosenberg e White (orgs.). Cultura de massa. Tradução de Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Cultrix, 1973. [o título do artigo vem entre aspas e o título do livro onde se encontra este artigo vem em itálico]

Hal Foster. “The future of an ilusion, or the contemporary artists as cargo cultista”. Em Endgame. Reference and simulation in recent painting and sculpture. (catálogo). Boston: The Institute of Contemporary Art, 1986.


Freud alertava que a manipulação de grandes massas pelo sistema nazifascista estava a criar no seio de uma Europa civilizada um monstro incontrolável. Já o “cultor de carga”, na segunda parte do título do ensaio, refere-se à descoberta, também nos anos 20, de uma sociedade tribal na Nova Guiné. O confronto da emergente sociedade capitalista europeia com esta tribo, revolucionou os paradigmas da antropologia moderna, e questionou os valores desta sociedade. A antropologia viu-se beneficiada pelas viagens “científicas” promovidas para cooptação de artefactos culturais para a realização das feiras internacionais. Os aparatos culturais recolhidos nas expedições acabavam recebendo o status de obra de arte, e o contágio dos vanguardistas europeus com esses aparatos resultou na arte moderna. Vanguarda e kitsch fundiam-se na medida em que os aparatos antropológicos – exóticos – passaram a interessar pelo seu aspecto formal, deixando o simbólico para as ciências sociais. O kitsch, se o tomarmos pela acepção de Abraham Moles, triunfa mesmo antes dos readymades de Duchamp. No panorama vanguardista da década de 1920, a mestiçagem cultural foi central para a antropologia de Franz Boas – leitura obrigatória é seu livro Arte primitiva; no cinema moderno do expressionismo alemão e do realismo soviético, no teatro de Bertold Brecht, de Artaud e de Jean Cocteau; na literatura de Max Jacob, de Guillaume Apolinaire, de Paul Eluard, de André Gide, de T. S. Elliot, de James Joyce; na afirmação da dança moderna pelo Balé Triático de Oskar Schlemmer; no atonalismo de Schöeberg; na definição da filosofia da linguagem de Husserl e Wittgenstein; na política de Max Weber, e ainda nas deambulações poéticas de Walter Benjamin e de Karl Krauss. Nas artes visuais, a Bauhaus, o neoplasticismo, o dadaísmo, o surrealismo e o construtivismo assentaram as bases modernistas pelo carácter mixer. Voltemos a Hal Foster e seu discurso sobre a pós-modernidade: “Agora, bem, por estranho que pareça, a pensée sauvage dos cultores de carga não está tão distante das ideias psico-estéticas de determinados artistas modernos. Assim, bastantes redefinições básicas da arte moderna implicam também, como o culto da carga, uma contradição entre as distintas formas do objecto e da elaboração de uma classe concreta de fetichismo. Por exemplo, o descobrimento cubista do artefacto tribal, a proposta dadaísta do readymade, a invenção surrealista do ‘objecto

Abraham Moles. O kitsch. São Paulo: Perspectiva, 1986.


de função simbólica’ e o experimento minimalista das formas seriais de imagens […]”. Para Foster, a modernidade constituiu-se na dialéctica, cujos princípios – contradição económica e objecto fetichista – informam sobre a escultura mediatizada em autores actuais como Jeff Koons, Haim Steinbach, Joel Otterson, Jon Kessler e General Ideia. Para o autor, com efeito, as obras destes artistas despregram-se do readymade duchampiano e do objecto serial minimalista/pop, modelos que, por sua vez, remetem à dinâmica entre arte moderna e cultura de massas. Segundo Foster, a contradição e o fetichismo na arte pós-moderna explicam o que o readymade duchampiano pôs em relevo como arte. “No contexto de uma galeria ou de um museu, o readymade sugeria que a obra autónoma da arte burguesa é totalmente fetichista, tanto no sentido marxista (é dizer, as relações entre arte e sociedade, entre artistas e público, se expõem como relações entre obras de arte) como no freudiano (é dizer, ditas funções artísticas como substitutas compensatórias que encobrem ou negam sua realidade material). Mais ainda, o readymade sugeria que a obra de arte na sociedade capitalista não pode iludir o status de mercadoria: que nossa adoração da obra de arte se parece a nosso fetichismo para com a mercadoria” […]. “Essa colisão entre arte autónoma e as mercadorias mais convencionais regressa cinquenta anos mais tarde com o minimalismo e a pop – onde se coloca como contradição entre o antigo modelo subjectivo de arte elevada, ratificada pelo expressionismo abstracto, e o novo modo de produção em série, preparado pelo capitalismo tardio […]. Ao objecto de dobrar essa contradição entre arte e mercadoria, tanto o minimalismo quanto a arte pop fazem do readymade seu emblema (no minimalismo o objecto industrial, na pop a imagem estabelecida […]. Para finalizar, o autor declara que a contradição entre arte e mercadoria é parte e parcela da dialéctica da modernidade e da cultura de massas. A estética doméstica de Felipe Barbosa evoca essas relações entre o fazer industrial e a inteligência do readymade. Toda a obra do artista refere-se ao desdobramento conceptual da serialização de unidades, únicas, permanentemente feitas e refeitas a fim de gerarem outros objectos, estes sim, disfuncionais. A feitura da sua obra parte dos materiais existentes no mundo, em particular, aqueles que habitam a casa: palitos de fósforo, martelos, pregos, notas

Hal Foster. Op. cit.

Idem, ibdem.

Idem, ibdem.


de dinheiro, tickets de transportes públicos, esquadros, livros, azulejos, tampas de garrafas, nível, cadeiras, antenas de TV, chapéus-de-chuva, caixas de chocolates, lápis, bolas de futebol, uma panóplia de objectos industriais que reforçam a génese de serialização. O desvelar e o relevar é a dialéctica implícita na feitura das suas obras a partir da soma ou da subtracção dos materiais. “Se tal procedimento limita a variedade das construções por ele criadas, permite que investigue os atributos formais que, a despeito de suas marcadas diferenças de uso, os objectos apropriados partilham”.10 Através da subjectividade, pela forma como percebe o significado dos materiais e suas relações com o mercantilismo e os valores atribuídos, Felipe Barbosa almeja domesticar a estética do espectador. Sua explicação é a não alteração das características iniciais. “Não altero a capacidade visual de um objecto, o que eu faço é transformá-los, reduzindo-os. Nunca penso do ponto de vista escultórico, mas sim da propriedade dos objectos existentes. Penso que a essência do trabalho é tentar não alterar a natureza do objecto, pois minha interferência em geral é de agregar informação, pois a memória que se tem do objecto será um elemento constituinte do trabalho”.11 Sunset é um exercício pop em que o artista recria a atmosfera visual de um pôr- do-sol feito com velas de windsurf. A figura geométrica das velas – um triângulo escaleno – sequenciadas cria uma semicircunferência, concebida como uma imagem ícone de pôr-do-sol, as banais dos cartões-postais das cidades costeiras. A peça aquece o ambiente pelo uso cromático, criando uma ilusão de calor solar, tal qual The weather project de Olafur Eliasson esquentou a Turbine Hall. Esse jogo visual entre significante e significado é a essência da obra deste artista. Assim como Duchamp – um jogo do xadrez foi sua última acção-readymade –, também Felipe tem enorme interesse pelos jogos. Mas seu interesse é puramente semântico e conceptual, pois jogos são, em geral, acções físicas oriundas de uma organização cartesiana, através da matemática ou outros, da física dos objectos. Sinuca de bico é um readymade modificado, no qual o artista reforça o sentido visual do acto mais importante num jogo de snooker que é a morte final pelo mau uso das jogadas. O suicídio do próprio objecto, uma espécie de no way out para o jogador não atento.

10 Moacir dos Anjos. “Felipe Barbosa”. Em catálogo da mostra na galeria Arte em dobro. Rio de Janeiro, 2006. 11 Idem.


Essa obsessão conceptual pelos jogos – ou pelos objectos usados nos jogos – é cada vez mais acentuada em sua obra. Pillball é irónico e desconstructor no sentido literal. O artista recria uma pílula, em inglês (pill), feita com bolas de futebol desconstruídas. Essa peça tem laços de parentescos conceptuais com as Pills, do General Ideia, e as Lullaby spring de Damien Hirst. No caso das pills de Felipe Barbosa, a referência irónica é ao sonífero que pode ser um jogo de futebol para alguns, e remédio para a vida soporífera de outros. As bolas de futebol são as principais fontes de pesquisa visual para a feitura de “pinturas-objectos”. Ao comprá-las pelas suas formas tão distintas nas cores e nos desenhos das formas geométricas, o artista desmontaas apropriando-se dos hexágonos existentes em sua forma inicial. Essa geometria desfeita dá origem a novas formas, recombinadas pelo artista e que podem tomar distintas aparências, desde um tapete oriental (Azulejo bola) ou um mural mexicano (Mexican patchwork), uma pintura construtiva (Plano bola, Tetris ball, Nike total blank) ou pontilhista (The grid, Multimarcas), um quilt (Bolas – Zigzag quilt) ou uma unidade métrica (Bolas – Tabuada). A dimânica mercadológica das grandes companhias de produtos esportivos é a da renovação para não cansar o comprador. Assim as obras feitas com bolas de futebol são operações matemáticas e podem chegar a um número infinito de combinações, caso o artista resolva transformá-las numa operação work in progress. Evoco nestas construções a ironia que alimentou a Jeff Koons a realizar sua Three ball, 50/50 tank. A referência à pintura também aparece nas obras feitas com gravatas, nas quais o artista, ao articular internamente o interesse pelo cromatismo das peças, costuradas e unidas, as transforma em figuras geométricas, assimétricas, orgânicas e, mais uma vez, irónicas pela desconstrução do seu índice. Os hexágonos das bolas de futebol e as gravatas são vistas pelo artista como estruturas mínimas – herança de um pensamento minimalista – que podem se desdobrar em combinações infinitas, quer na forma, quer na composição, quer na estrutura final. Também em Selfshelf a apropriação é de unidade industrial vulgar. Uma poleia é tomada como uma unidade infinita; poleias unidas uma a uma, lado a lado, criam uma linha repetida que resulta no próprio objecto para qual essa unidade fora criada como sustentação, transformando-se numa meta-prateleira. Tal qual o Quadro de nível, o Martelo de pregos, a Sala de reunião e o Homem bomba resultam numa meta-situação. A repetição de uma unidade mínima apareceu inicialmente nos Desenhos espaciais. Feitos com lápis coloridos unificados pelas suas pontas, a junção pela ponta arredondada gera a própria forma final do objecto, que repete a forma inicial da sua ponta. Também os Toblerones, a estrutura triangular da caixa do famoso chocolate, replicam sua forma na medida em que são unificados pelas suas pontas. Esses processos dialécticos de unificação, individualização; composição, recomposição; forma e função são elementos construtivos que mobilizam toda a


feitura da obra de Felipe Barbosa. Uma inteligência cartesiana de utilização de replicação de uma forma a partir da forma inicial. Como as Mórulas, exercícios feitos a partir de palitos de fósforo, em que as formas geométricas são construídas interna e externamente na agregação dos materiais, unificadas como numa estrutura minimalista levada ao infinito, as pequenas unidades, feitas de palitos colados um a um, são dobradas criando circunferências que outra vez são unificadas e acabam por construir novas imagens. “[…] Nas peças apresentadas por Felipe Barbosa, o recurso à geometria tem como ponto de partida a auto-estruturação do trabalho a partir das possibilidades oferecidas por elementos quaisquer. Elementos elegidos meio ao acaso, mas que já trazem implícitas sugestões para sua articulação. Assim, com fósforo, guarda-chuvas, triângulos equiláteros ou de sinalização de trânsito, parte da quantidade e continuidade, servindo-se da geometria descritiva, que permite uma figura transformar-se em outra permanecendo a mesma, apesar das alterações introduzidas pela projecção. No recurso a um mecanismo a priori para a formalização, o seu trabalho dialoga com o radical enfrentamento da composição e suas relações internas, operado pelos minimalistas. Contudo, não se trata de um investimento em uma positividade estética, mas de busca de uma ampliação do campo de intervenção […]”.12 Os Abrigos são uma série de trabalhos feitos com chapéus-de-chuva. Neles, Felipe Barbosa recorre ao antípoda do material para despertar a consciência do espectador ao romper com o uso do material utilizado. O primeiro da série, translúcido, chamou-se Abrigo transparente; o segundo é um abrigo negro, e a terceira versão, colorida, é inspirada numa estrutura neoplasticista. Se nas duas primeiras obras, a referência imediata seriam os objectos surrealizantes de Joan Brossa, essa terceira versão remete-nos para os espaços racionalistas do movimento De Stjll (neoplasticismo), dialogando com o ateliê de cor de Piet Mondrian e com a Casa Schroeder de Gerrit Rietveld. O que Felipe Barbosa propõe neste seu abrigo (des)construtivo é o questionamento em função e forma. “Compreensível mesmo pelo olhar distraído, esse método demonstra como as coisas que possuem uma função definida no mundo podem, quando agrupadas de uma dada maneira, constituir objectos inteiramente distintos. E embora as características dessas composições estejam já implicadas nas propriedades formais das unidades usadas, sua construção destitui daquelas coisas sua utilidade conhecida, fazendoas devedoras, apenas, do poder de invenção do artista”.13

12 Glória Ferreira. “Máquinas de arte”. Em Cotidiano plural (catálogo da exposição). Rio de Janeiro: SESC, 2003. 13 Moacir dos Anjos. Op. cit.


Mas parte do discurso do artista está no uso da perversão em inverter os sentidos de muitos objectos e suas tipificações. Em duas experiências com vídeo, Felipe radicaliza o pensamento ao propor a utilização das obras em seu sentido mais literal. Na primeira acção, realizada numa praia, o artista desloca um abrigo feito com guarda-sóis, criando uma espécie de abrigo rolante, que se desloca imperfeitamente pela instabilidade dos materiais e da sua própria forma maleável. No vídeo Igloo, o artista exercita seu lado mais radical ao atear fogo a uma estrutura feita com o material químico inflamável utilizado para acender lareiras. O abrigo esquimó indica-nos que o gelo é estrutura que o abriga das intempéries, mas mesmo assim, essa estrutura pode queimar na sua brancura. Nunca se está a salvo, seja qualquer for o abrigo. A pretensa banalidade de objectos como cadeiras de escritório, bolas de futebol, gravatas, piso de azulejos, palitos de fósforos, estalinhos, lápis coloridos, ursos de peluche, réguas e esquadros, livros de geometria ou de arte tornam-se uma questão conceptual para Felipe Barbosa. Intrigado com a aparente imobilidade destes, com a relação entre significante e significado, o artista opera no espaço da arte conceptual como um herdeiro dos processos artísticos de Joseph Kosuth e de On Kawara, mas, sobretudo, da operação radical de Duchamp com os readymades modificados. Como advoga Crimp sobre os readymades, Felipe Barbosa tira algo novo de algo já existente, pois o artista deseja arrancar o espectador do passivo acto contemplativo pela via do humor, afinal a ironia é uma arma poderosa nas mãos de um esteta.14 A estética doméstica deste artista necessita da interpretação contextualizada, semântica e simbolicamente, sendo necessário buscar-se a topoi, seu sentido cultural, espiritual e, por fim, ontológico. Ela é a reposta à solicitação de Gilles Deleuze para que os artistas insiram a arte no espaço da vida vivida.

14 Paulo Reis. No catálogo Mono#Cromáticos – algumas vertentes da arte contemporánea brasileira. Braga: Galeria Mário Sequeira, 2007.


Bola 3D / 3D Ball [2006] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewn soccer ball panels 155 x 200 cm


Contração e Distenção / Contraction and distension [2006] Duas bolas de futebol com os gomos reorganizados / Soccer balls with reorganized panels 22 x 22 x 16 cm e 22 x 22 x 28 cm


Red Carpet / Red Carpet [2007] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewn soccer ball panels 200 x 160 cm


Pill Ball / Pill Ball [2006] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewn soccer ball panels 22 x 22 x 76 cm


Super Ball / Super Ball [2007] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewn soccer ball panels 100 x 100 x 100 cm


Fruto Estranho / Fruto Estranho [2007] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewen soccer ball panels 180 x 240 cm


Nike Total Blank / Nike Total Blank [2005] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewn soccer ball panels 145 x 175 cm


Fractal / Fractal [2005] Bolas de futebol abertas e recosturadas / Sewn soccer ball panels 200 x 300 cm



Sem titulo / Untitled [2005] Bola de futebol onde os 12 pentรกgonos foram costurados gerando uma bola menor dentro da original / Soccer ball in which the 12 pentagons were sewn together, creating a smaller ball 22 x 22 x 22 cm Multimarcas / Multibrands [2004] Bola de futebol feita de gomos de diferentes marcas de bola / Soccer ball made of panels taken from different brand balls 22 x 22 x 22 cm


Código de Barras / Bar Code [2004] Bola de futebol feita de gomos com código de barras de diversas marcas de bola / Soccer ball made of bar code panels taken from different brand balls 22 x 22 x 22 cm FOFA approved / FOFA approved [2007] Bola Ready-made – Fotografía colorida / Ready-made – Color photograph 30 x 30 cm



Ferro de Marca / Branding Iron [2006] Ferro de marcar animais com o logo da Nike / Cattle branding iron with Nike logo 13 x 5 x 60 cm

Boi Bola / Cown Ball [2005] Bola de futebol feita de pele de boi / Ball made of cow fur 22 x 22 x 22 cm


BolĂŁo / Big Ball [2006] 9 bolas de futebol costuradas / 9 soccer balls sewn together 55 x 55 x 55 cm


Piso Bola / Ball Floor [2002] Objeto feito de cimento e ladrilhos cerâmicos / Object made of cement and ceramic tiles 27 x 27 x 27 cm


Estética Doméstica / Domestic esthetics [2007] Vista da exposição na galeria Filomena Soares / View of the Filomena Soares gallery show


The Domestic Esthetics of Felipe Barbosa

Paulo Reis

I guess I am trying to make sense of a century of political disasters and artistic breakthroughs. To drill a hole in the wall and let the sun in. I guess I am trying to understand with Marcel Duchamp was such a great artist. Thierry de Duve

Duchamps’s readymades personify, of course, the preposition that the artist does not invent anything, that he or she uses, manipulates, displaces, reformulates and repositions that which was offered by history. Not for this to take from the artist the power of intervening in discourse, of altering and expanding it, but only for giving up the fiction that the force comes from an autonomous being which exists out of history and ideology. The readymades propose that the artist cannot make, but only take from what already exists.

Douglas Crimp

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Thierry de Duve. Kant after Duchamp. Cambridge: The MIT Press, 1996.

Douglas Crimp. On the Museum’s ruins; photos by Louise Lawler. Translated by Fernando Santos. São Paulo: Martins Fontes, 2005.


The title “Domestic Esthetics” evokes the book Homemade esthetics – observations on art and taste, by critic Clement Greenberg. This is not homage, neither a criticism, but an inequivocal appropriation of the title because this is evocative of the procedures through which artist Felipe Barbosa elaborates his work. Greenberg, a strong defender of formalist art, fought desperately against the readymades to a point which his esthetics considerations are a last act landmark of a modern understanding of making art. After Duchamp, the modern esthetics had to be domesticated in function of the new procedures by him appointed. With the arrival of minimalism and pop art, the readymades triumphed categorally. The north-american critic, ideologist of a social art, already previously appointed, in a text entitled “Vanguard and Kitsch” the rupture which Duchamp provoked the very moment where he inserts the serial object as discourse. In “Vanguard and Kitsch”, Greenberg attacks the internal process of modernity and its flirtation with copy. For the critic, the contamination of kitsch on artist objects sounded like “decafed versions of elevated art produced for the industrial masses for a compensation to the lost of popular traditions”. Greenberg’s Marxist’s view of contrasting the work of art to mass culture took him to the epithet of formalist, renegating all the processes of dysfunctional art on the vanguard experiences. The central question appointed by Greenberg is retaked forty years later by Hal Foster. In the text entitled “The future of an illusionist, or the contemporary artist as Cargo Cultist” , Foster runs over the reasons that (post) modern art is a dialectic practice in its genesis, essence and finality. An a priori clearing: the title of the cited essay alludes to two relevant aspects in the areas of social sciences in the XX century. Firstly, it borrows the title of the book by Sigmund Freud (The future of an illusionist), published in 1927, where the psychoanalyst discusses the relationships between capitalism, power, fetishism, autonomy, annulations of the superego and the manipulation of the masses. Freud alerted that the manipulation of huge masses by the Nazifascist system was creating an incontrollable monster in the heart of a civilized Europe. The “Cargo Cultist”, in the second part of the title of the essay, refers to the discovery, also in the 20s, of a tribal

Clement Greenberg. Homemade esthetics – observations on art and taste. Oxfort University Press.

Clement Greenberg. “Vanguard and kitsch”. Rosenberg and White (orgs.). Mass Culture. Translated by Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Cultrix, 1973. [the title of the book appears in speechmarks and the title of the book where this article is found is in brackets]

Hal Foster. “The future of an ilusion, or the contemporary artists as Cargo Cultist”. In Endgame. Reference and simulation in recent painting and sculpture. (catalogue). Boston: The Institute of Contemporary Art, 1986.


society in New Guinea. The confront of the emerging European capitalist society with this tribe revolutionised the paradigms of modern anthropology, and questioned the values of this society. Anthropology saw itself beneficiated by the “scientific” voyages promoted for the aggregation of cultural artefacts for the realisation of international fairs. The cultural apparatus picked up on the expeditions ended up receiving the status of work of art, and the infection of the European vanguards by these apparatus resulted in modern art. Vanguard and kitsch blended as the anthropological apparatus – exotic – became of interest due to its formal aspect, leaving symbolism to the social sciences. Kitsch, if we take it from what Abraham Moles accepted, triumphs even before the readymades of Duchamp. The cultural crossbreed was central for the anthropology of Franz Boas on the vanguard panorama of the 20s – his book Primitive Art is obligatory reading; in the modern cinema of German expressionism and of soviet realism, in the theatre of Bertolt Brecht, Artaud and Jean Cocteau; in the literature of Max Jacob, Guillame Apolinaire, Paul Eluard, André Gide, T. S. Elliot and James Joyce; in the affirmation of modern dance by the Triadic Ballet of Oskar Schlemmer; on the atonalism of Schöeberg; on the definition of philosophy of language by Husserl and Wittgenstein; in the politics of Max Weber, and still in the poetic strolls of Walter Benjamin and Karl Krauss. In the visual arts, Bauhaus, Neoplasticism, Dadaism, Surrealism and Constructivism settled the modernist bases through the mixer character. Let’s go back to Hal Foster and his discourse about postmodernity: “Now, well, as strange as it seems, the pensée sauvage of the Cargo Cultist is not so distant of the psychoesthetic ideas of certain modern artists. This way, a lot of basic redefinitions of modern art also imply, as the Cargo Cultist, a contradiction between the distinct forms of the object and of the elaboration of a concrete class of fetishism. For example, the cubist discovery of the tribal artefact, the Dadaist proposal of the readymade, the Surrealist invention of the “object of symbolic function”, and the minimalist experiment of the serial forms of images […] . For Foster, modernity constituted in the dialectics, whose principles – economical contradiction and fetishist objects – inform about the mediated sculpture of recent artists like Jeff Koons, Jaim Steinbach, Joel Otterson, Jon Kessler and General Idea. For the author, with effect, the works of these artists detach themselves from

Abraham Moles. Kitsch. São Paulo: Perspectiva, 1986.

Hal Foster. Op. cit.


the readymades and of the minimalist/pop serial objects, models which, in turn, remit to the dynamics between modern art and mass culture. According to Foster, contradiction and fetishism in postmodern art explain what Duchamps’s readymades put in outstanded as art. “In the context of an art gallery or a museum, the readymades suggested that the autonomy of the bourgeoisie is totally fetishist, in the Marxist sense (to say, the relationships between art and society, artist and public, exposes itself as relationships between works of art) as in Freudian (to say, held artist functions as compensating substitutes which uncover or deny their material reality). Even more, the readymade would suggest that the work of art in a capitalist society cannot deceive the status of merchandise: that our adoration of the work of art seems like our fetishism towards merchandise” […]. “This collision between autonomous art and the more conventional merchandise comes back fifty years later with Minimalist and Pop – where it is placed as a contradiction between the old subjective model of elevated art, ratified by Abstract Expressionism, and the new way of serial production, prepared by late capitalism […]. By aiming the folding of this contradiction between art and merchandise, Minimalist and well as Pop art make of the readymade the emblem (in Minimalist, the industrial object; in Pop art the established image […]. To finalise, the author declared that the contradiction between art and merchandise is part of the parcel of the dialectics of modernity and of mass culture. The domestic esthetics of Felipe Barbosa evokes these relationships between industrial making and the intelligence of the readymade. All of the artist’s works refer to the conceptual unfolding of the serialisation of units, unique, permanently made and remade in order to generate other objects, these yes, dysfunctional. The creation of his work starts from materials which exist in the world, in particular those which live at home: toothpicks, hammers, nails, money bills, public transport tickets, squares, books, tiles, bottle tops, levels, chairs, TV antennas, raincoats, chocolate boxes, pencils, footballs, the armour of industrial objects which reinforce the genesis of serialisation. The unrevealing and revealing is the implicit dialects in the making of his works from the summingup or subtraction of materials. “If such a procedure limits the variety of the constructions by him

The same as.

The same as.


created, it allows the investigation of the formal attributes which, in contempt of its marked differences of use, are shared by the appropriated objects”.10 Felipe Barbosa aims to domesticate the esthetics of the spectator through subjectivity and through the way which he notices the meaning of materials and their relationships with mercantilism and their attributed values. His explanation is the non-alteration of the initial characteristics. “I do not alterate the visual capacity of an object, what I do is transform them, in a reduction process. I never think from a sculptural point of view, but from the propriety of the existing objects. I think that the essence of the work is to try not to alterate the nature of the object, because by interference, in general, one aggregates information, for the memory which the spectator has of the object will by a constituent element of the work”.11 Sunset is a pop exercise where the artist recreates the visual atmosphere of a sunset made out of windsurf canvas. The geometric figure of the canvas ­ – a scalene triangle – in sequence, creates a semi-circumference, conceived as iconic of a sunset, the banal one from postcards from coastal cities. The piece warms the ambient for its chromatic use, like The Weather Project by Olafur Eliasson warmed up the Turbine Hall. This visual game between significant and meaning is the essence of the artist’s work. Like Duchamp – a chess game was his last readymade action –, Felipe also has an enormous interest in games. But his interest is purely semantical and conceptual for games are, in general, physical actions derived from a Cartesian organization through mathematics or others, of the physics of the objects. Sinuca de bico is a modified readymade, where the artist reinforces the visual sense of the most important act in a snooker game, which is the final death through the bad use of plays. The suicide of the own object, a sort of no way out for the non-attentive player. This conceptual obsession towards games ­– or by the objects used in games – is increasingly accentuated in his work. Pillball is ironic and deconstructing in the literal sense. The artist recreates a pill, made out of deconstructed footballs. This piece has conceptual parental bonds with Pills, by General Idea, and Lullaby spring by Damien Hirst. In the case of Felipe Barbosa’s pills, the ironic reference is to the sleeping pill which can be a football game for some, and a remedy to the soporific life of others. The footballs are the main source of visual research for the making

10 Moacir dos Anjos. “Felipe Barbosa”. In a catalogue of an exhibition which took place in gallery Arte em dobro. Rio de Janeiro, 2006. 11 The same as.


of the “object-paintings”. By using them due to their distinct forms in colour and drawing of geometric forms, the artist dismantles them appropriating himself of the hexagons existent in their initial form. This unmade geometry gives origin to new forms, recombined and making distinct appearances, from an oriental rug (Azulejo bola) or a Mexican mural (Mexican patchwork), a constructivist painting (Plano bola, Tetris ball, Nike total blank) or dotted (The grid, Multimarcas), a quilt (Bolas – Zigzag quilt) or a metric unity (Bolas – Tabuada). The merchandizing dynamics of the big sports products companies is that of renovation in order to not make the consumer tired. In this way the works made our of footballs are mathematical operations and can reach an infinite number of combinations, in case the artist decides to transform them into a work in progress operation. I evoke in these constructions the irony that fed Jeff Koons to create his Three ball, 50/50 tank. The reference to painting also appears in the works made with ties, in which the artist, by internally articulating the interest to the chromatics of pieces, sewed and united, transforms the geometric figures, asymmetrical, organic and, once more, ironic due to the deconstruction of their indices. The football’s hexagon shapes and the ties are seen by the artist as minimum structures – a heritage of a minimalist thought – which can unfold into infinite combinations, whether in form, composition, or final structure. Also in Selfshelf appropriation is the industrial unity of vulgar. A crossarm brace is taken as an infinite unit; crossarm braces united one to another, side by side, create a repeated line which results in the object itself to which this unity was created as sustentation, transforming into something which goes beyond a shelf. As the Quadro de nível, o Martelo de pregos, a Sala de reunião and Homem Bomba result in a critical reflection. The repetition of a minimum unity appeared initially in the Desenhos espaciais, made out of coloured pencils unified by their ends, the junction by the rounded end generates the own final form of the object, which repeats the initial form of its ends. Also in Toblerones, the triangular structure of the box of the famous chocolate, multiply their form as they are unified by their ends. This dialectic process of unification, individualisation, composition, recomposition, form and function are constructive elements that mobilize the entire making of the work of Felipe Barbosa. A Cartesian intelligence of the utilization of replication of a form from its initial form. Like the Mórulas, exercises made from toothpicks, where the geometrical forms are constructed internally and externally in the aggregation of the materials unified as in a minimalist structure taken to an infinite level, the small unities, made out of toothpicks stuck one by one, are folded creating circumferences which once more are unified and end up by constructing new images. “[…] In the works presented by Felipe Barbosa, the resource to geometry has as a starting point the self-construction of the work as from the possibilities offered by any elements. Elements elected relatively randomly, but which already bring implicit suggestions for their articulation. In this


way, like a match, an umbrella, equilateral triangles or traffic signs, emerge from quantity and continuity, serving itself from descriptive geometry, which allows a figure to transform itself into another remaining the same, even with the alterations introduced by the projection. In the resource of an a priori mechanism to the formalisation, his work dialogues with the radical confrontation of composition and its internal relationships, operated by the minimalists. Altogether, this is not about the investment in a positive esthetics, but the search of the widening of the intervention field […]”.12 The Abrigos are a series of works made out of umbrellas. In them, Felipe Barbosa goes through to the opposite of the material to awaken the conscious of the spectator by provoking a rupture with the use of the utilized material. The first one of the series, translucid, was called Abrigo transparente; the second one is a black shelter, and the third version, coloured, is inspired by a neoplasticist structure. If in the first two works the two immediate references would be the surrealist objects of Joan Brossa, this third version takes us to the rationalized spaces of the De Stjll movement (Neoplasticism), dialoguing with the colour palette of Piet Mondrian and with the Casa Schroeder of Gerrit Rietveld. What Felipe Barbosa proposes in this (de)constructed shelter of his is the questioning of function and form. “Comprehensible even by the distracted eyes, this method demonstrates how the things which own a defined form in the world can, when grouped in a given manner, constitute entirely distinct objects. And although the characteristics of these compositions are already implied in the form properties of the used unities, its construction exonerated of those things which utility knew, making them in debt only with the power of intervention of the artist”.13 But part of the discourse of the artist is in the use of the perversion in inverting the senses of many objects ad their established types. In two experiences with video, Felipe radicalizes this thought by proposing the utilisation of the works of art in their most literal sense. In the first action, which takes place in a beach, the artist displaces a shelter made our of umbrellas, creating a sort of rolling shelter, which displaces itself imperfectly due to the instability of the material and of their own malleable form. In the video Igloo, the artist exercises his most radical side by setting fire to a structure made out of flammable chemical material used to lighten fireplaces. The Eskimo shelter

12 Glória Ferreira. “Máquinas de arte”. Em Cotidiano plural (exhibition catalogue). Rio de Janeiro: SESC, 2003. 13 Moacir dos Anjos. Op. cit.


points out that ice is the structure which shelters it from bad weather, but even so, this structure can burn in its whiteness. One is never safe, no matter in which shelter. The assumed banality of objects such as office chairs, footballs, ties, tiles, matches, fireworks, coloured pencils, stuffed bears, rulers and squares, geometry or art books, turn into a conceptual matter for Felipe Barbosa. Intrigued by the apparent immobility of these, with the relationship between significant and meaning, the artists operated in the field of conceptual art as an heir of the artistic processes of Joseph Kosuth or On Kawara, but, above all, of the radical operation of Duchamp with the modified readymades. As Crimp advocated about the readymades, Felipe Barbosa creates something new from something which already exists, for the artist wishes to push the spectator away from the passive contemplative act through means of humour, after all irony is a powerful weapon in the hands of an esthetic. 14 The domestic esthetics of this artist need contextualized interpretation, semantic and symbolically, with the necessity of being searched as a topoi, its cultural sense, spiritual and, at last, ontological. It is the answer to Gilles Deleuze’s solicitation that artists insert art in the space of lived life.

14 Paulo Reis. In catalogue Mono#Cromáticos – algumas vertentes da arte contemporánea brasileira. Braga: Galeria Mário Sequeira, 2007.


Desenho Espacial / Spacial drawing [2005] Estrutura realizada com lรกpis apontados e colados / Structure made of sharpened pencils and glue 33 x 33 x 33 cm


GeometrĂ­a descritiva / Descriptive geometry [2003-2005] 3 livros de geometria descritiva, acrĂ­lico e fio transparente / 3 descriptive geometry books, acrilyc and transparent string 25 x 25 x 25 cm


Toblerone / Toblerone [2006] 20 caixas de chocolate e cola / 20 chocolate boxes and glue 33 x 33 x 33 cm


Icosaedro eleva seus lados / Icosahedron [2003] Forma geomĂŠtrica feita com 60 esquadros iguais / Geometric figure made of 60 set-squares 45 x 45 x 45 cm


Icosaedro / Icosahedron [2001] Forma geomĂŠtrica feita com 40 esquadros iguais / Geometric figure made of 40 set-squares 40 x 40 x 40 cm


Piso 3D / 3D Floor [2002] Fotografia / Photograph 30 x 45 cm


Piso 3D / 3D Floor [2002] Fotografia / Photograph 30 x 45 cm


Piso 3D / 3D Floor [2002] Fotografia / Photograph 30 x 45 cm



Piso cúbico / Cubic Floor [2005 - 2006] Fotografía / Photograph 55 x 80 cm


Piso cúbico / Cubic Floor [2005 - 2006] Fotografía / Photograph 55 x 80 cm


Piso 3D / 3D Floor [2002 - 2004] Fotografia colorida / Color photograph 45 x 65 cm, 60 x 80 cm, 80 x 110 cm




Piso-Cubo / Cube Floor [2004] Azulejos hidráulicos e cimento / Hydraulic tiles and cement Dimensões vaiáveis / Variable dimensions

Piso 3D / 3D Floor [2002] Azulejos hexagonais e cimento / Hexagonal tiles and cement 45 x 163 x 163 cm

Mosaico Tridimensional / Three Dimensional Mosaic [2003 - 2004] Pastilhas de cerâmica, cimento e forma de acrílico / Ceramic pastilles, cement and acrylic cast 40 x 40 x 15 cm


Icosaedro de Sinalização / Road hazard icosahedron [2001] 20 triângulos de sinalização / 20 road hazard triangles 65 x 65 x 65 cm



Abrigo / Shelter [2002] Estrutura realizada com 6 guarda-chuvas e 24 pregadores de roupa / Structure made of 6 umbrellas and 24 hanging clips 100 x 100 x 100 cm Braunschweiger - Alemanha



8 velas de windsurf. Vista da exposição Estética Doméstica, Galeria Filomena Soares / 8 windsurfing vessels. View of the Domestic Esthetics show at Filomena Soares 580 x 1600 cm

Crepúsculo / Sunset [2007]



Sala de Reunião / Meeting room [2002] Estrutura realizada com 12 cadeiras de escritório soldadas pelos pés / Structure made of 12 bussiness chairs soldered together 200 x 200 x 200 cm


Satélite / Satellite [2003] 18 antenas de TV / 18 Television antennas Dimensões variáveis / Variable dimensions


Construtivismo Literรกrio / Literary constructivism [2005] Fotografia colorida / Color photograph 24 x 32 cm cada / each




O colecionador e o cartógrafo

Marisa Flórido

Suspeito, entretanto, que não era muito capaz de pensar. Pensar é esquecer diferenças, é generalizar, é abstrair. Jorge Luis Borges Funes, o Memorioso

Por que esse e não aquele pequeno objeto seduz o colecionador no breve instante em que, pela primeira vez, os olhos percorrem, curiosos, sua superfície? A delicada estranheza, seus contornos bizarros, sua feição prodigiosa... Talvez um pequeno brilho que reluz fugaz, mas que o destaca em meio a outras coisas que circulam distraídas pela espessura do mundo. Ou é sua esquiva tímida, quase desapercebida, que atrai o seu afeto? O colecionador retira o objeto de sua órbita vital, afasta-o de seu uso quotidiano e de sua prescrição prosaica. Protege-o em meio a outros em uma série: cerca-o em sua paixão meticulosa, precisa, metódica. O resguarda em uma nova ordem. Nem sempre a relação que essa reunião de objetos consuma — objetos por vezes distantes e alheios entre si — resulta clara para aquele que observa sua apurada operação. Em torno de cada objeto seqüestrado do mundo escava-


se uma espécie de silêncio: um espaço que não se preenche, salvo pela proximidade a outros que, com ele, integram a coleção. Salvo talvez pelo próprio ato de colecionar: é a série que deverá organizar, classificar, conservar, memorizar. Mas nesse seqüestro que retira o objeto do mundo e o resguarda em uma memória, é necessário um esquecimento. Gabinetes de curiosidade, galerias de prodígios e de arte, são precursores do museu. Talvez encontremos, no Renascimento, as genealogias mais explícitas desse fenômeno da cultura ocidental: a coleção — a acumulação e a classificação do estranho em uma unidade, em uma totalidade privada. Objetos bizarros cintilariam então em preciosas vitrines: muitos trazidos pelas grandes conquistas das navegações a alargar fronteiras territoriais e étnicas, a demandar cartografias cada vez mais precisas. E aqui se encontra o outro personagem desta fábula: o cartógrafo. Como o ato de colecionar, o de mapear exige uma abstração e uma reserva. O colecionador acumula objetos, o cartógrafo reúne informações. Mas se a coleção abstrai o objeto de seu lugar ordinário para introduzilo em um sistema particular, o mapa representa, em um plano, informações referenciadas ao espaço de sua localização. Uma sorte de escrita, a cartografia descreve as visões de uma época tanto do espaço físico como do mundo em geral. Sua abstração, contudo, é de outra espécie: as linhas que se desenham sobre a superfície bidimensional do mapa são fronteiras abstratas na carne do mundo, tramadas por conflitos de diversas naturezas. Os limites territoriais que se traçam sobre o plano têm uma dimensão temporal, uma profundidade histórica. Uma história de disputas, de poder, de apropriações. Uma terceira dimensão que não aquela da perspectiva pictórica. Poderes controlam os fragmentos: aglomeram-se as identidades da língua, do costume, da cultura. Coleções particulares que constroem as ficções das totalidades e excluem, de seus espaços circunscritos, o outro estrangeiro. Mapas codificam o espaço, nomeiam seu solo, mas não o decifram. Não desfazem os desvios entre a abstração dos códigos e o concreto da existência. Os objetos que Felipe Barbosa recolhe não são raros ou singulares. O artista não os coleta para inseri-los em uma série. Ao contrário, são pequenas unidades produzidas em série que exalam a fantasmagoria anônima da cópia que viveu seu breve ciclo de vida útil e agora repousa por aí, confundida na indiferença dos detritos, no purgatório das ruas. São vestígios da opulência, da cultura da acumulação, do excesso e do desperdício: tíquetes de metrô, tampas de garrafas de bebidas recolhidas pelas cidades em que permanece ainda que por alguns dias, por algumas horas, por alguns instantes: Rio de Janeiro, Fortaleza, Madri, Paris...


Fragmentos que já habitam o universo das sobras e dos esquecimentos: é justamente sua condição residual e repetida que o atrai. Os pequenos objetos resgatados pelo artista riscam, por sua vez, outras cartografias: os tíquetes tecem sobre o suporte da tela o labirinto subterrâneo dos metrôs, o desenho que se oculta da superfície das cidades. Cada tíquete não deixa de ser um signo indicial, perfura a superfície da tela em memórias distintas: basta um breve esforço para imaginarmos as mãos que o acolheram, os caminhos ao qual serviu, os encontros que quiçá proporcionou. Fragmentos que, se à princípio parecem querer resgatar o contínuo do tempo e do espaço, não nos liberam da condição esquizofrênica da vida contemporânea. Aludem às profundidades de vários tempos e espaços, a outras camadas arqueológicas. Não devolvem a temporalidade orgânica da História e seu ciclo linear das causalidades, a identidade do sujeito, a unidade do espaço, a contigüidade da linguagem. Sua estranha estratégia enfatiza o colapso, a dubiedade dos signos e os lapsos na significação: sublinha as descontinuidades. Os mapas que resultam não nos devolvem a um todo simbólico, à intuição de um sentido absoluto: a justaposição de fragmentos é alegórica, dispersiva, sua significação permanece incompleta e oscilante. As tampas de bebidas disputam, por sua vez, os territórios do chassi. Uma unidade de cada marca, depositada aleatoriamente sobre o plano, inicia a expansão das esferas de consumo. Em círculos concêntricos, rivalizam as fronteiras das marcas de cervejas e refrigerantes consumidos na ocasião da estadia do artista em uma cidade. O tempo de preenchimento do quadro confunde-se à duração de sua permanência ali. Não correspondem ao exato lugar onde descansavam esquecidas. Nem poderiam: estes desaparecem nos fluxos desterritorializados da economia globalizada. Uma abstração, mais violenta que aquela da coleção ou da cartografia, se instaura: tudo se equivale no plano da mercadoria, em seu sistema de trocas, nas superfícies sem solo e sem memória do consumo. Ou antes, os mapas do artista revelam seus paradoxos: a memória também se globalizou, comercializa-se na indústria cultural do ocidente. Onde situar a responsabilidade dos atos coletivos, o exercício político da memória? O mundo se musealiza, as cidades reivindicam seu gabinete particular, competem entre si pelo prestígio de guardar suas coleções. Poderíamos mapear as genealogias dos Mapas de Felipe Barbosa: Duchamp parodiaria com o ready-made a operação do colecionador – retiraria um objeto de seu contexto quotidiano, para inseri-lo na coleção da Arte e assim profanar seu sistema. Ao silêncio exalado dessa subtração, o artista agregaria o nome Arte. Mas estamos mais próximos da ironia pop e suas incursões


sobre o domínio da série: os mapas do artista não devolvem à existência ensimesmada da pintura moderna, como uma totalidade fechada e auto-referente. Ora, a pintura abstrata com suas especulações formalistas não teve lá sua coleção particular de ficções? — A asserção do espaço bidimensional como identidade indubitável da pintura, a reivindicação do tempo como o momento excepcional da recepção estética que se dá no encontro extasiado com o objeto de arte. Um tempo sem duração, comprimido em um instante que prometia a suspensão de seu fluxo irreversível. Um imediato que violava e traía o próprio tempo. A superfície aqui não é o plano ontológico da pintura, talvez o desencanto espectral do indiferenciado da série e as uniformidades sem solo da globalização. O tempo tampouco é o imediato do êxtase estético: este se dilui se multiplica na alusão nos prazeres fugazes e mundanos de uma bebida gelada. Breves memórias. Como então não desconfiar igualmente do presente? Da reivindicação do agora na duração da experiência? O presente intensificado está intricado ao volátil da mercadoria; o agora, ao imediato do consumo. Suspeito, afinal, que a paixão do arquivista tem sua própria mecânica, uma sistematização das obsessões, uma fixação do pensamento ao objeto ao qual se endereça sem parar – a paixão tem sua racionalidade específica. Suspeito, afinal, que método do cartógrafo quer mapear o que é próprio da memória, da temporalidade e da espacialidade atuais, que não sucumba indiferente às abstrações fáceis do consumo. A razão tem sua paixão específica. Por isso é necessário pensar outros tempos e espaços, uma outra prática da memória e do esquecimento. Por isso, são necessárias, outras abstrações.

Mapa de consumo Tijuana Alcoólico / Tijuana Alcoholic Consumer Map [2003 - 2005] Mapa estatístico de consumo, feito de tampas de bebidas coletadas pela cidade / Statistic consumer map made of bottle caps collected in the city 160 x 110 cm



Mapa de consumo, Londres / Consumer Map, London [2004] Mapa estatĂ­stico de consumo, feito de tampas de bebidas coletadas pela cidade / Statistic consumer map made of bottle caps collected in the city 160 x 110 cm



Mapa de consumo Rio de Janeiro AlcoĂłlico / Rio de Janeiro Alcoholic Consumer Map [2001 - 2003] Mapa estatĂ­stico de consumo, feito de tampas de bebidas coletadas pela cidade / Statistic consumer map made of bottle caps collected in the city 160 x 110 cm


Mapa de consumo Rio de Janeiro NĂŁo AlcoĂłlico / Rio de Janeiro Non-Alcoholic Consumer Map [2003 - 2005] Mapa estatĂ­stico de consumo, feito de tampas de bebidas coletadas pela cidade / Statistic consumer map made of bottle caps collect in the city 160 x 110 cm


Mapas de consumo e Mapas de metro / Consumer Maps & Underground Maps [2004] Vista da exposição Unbound - galeria Parasol-unit, Londres / View of the Parasol-unit gallery show, London


The collector and the cartographer

Marisa Flórido

I suspect, however, that I wasn’t very capable of thinking. To think is to forget differences, to generalize, to abstract. Jorge Luis Borges Funes, the Memorious

Why is it this and not that small object which seduces the collector in the brief instant in which, for the first time, the eyes run curiously through its surface? The delicate strangeness, its bizarre outlines, its prodigious features... Maybe a small spark which shines rapidly, but which highlights it amongst the other things that circulate distractively through the denseness of the world. Or is it its timid avoidness, almost unnoticeable, which attracts its affection? The collector takes the object away from its vital orbit, from its daily use and prosaic prescription. Protects it amongst others in a series: surrounds it in his meticulous passion, precise, methodical. Protects it in a new order. Not always does the relationship that this reunion of objects consume – objects that are at times distant and foreign amongst each other – result clear to the one, which observes its accurate operation. A sort of silence is built up around each object, which


is kidnapped from the world: a space, which is not filled, saved due to the proximity to others, which, with him, integrate the collection. Saved maybe by the actual act of collecting: a series that must organize, classify, conserve and memorize. But forgetting is necessary in this kidnapping which takes the object from the world and protects it in its memory. Cabinets of curiosity and galleries of prodigies and of art are precursors of the museum. Maybe we can find, in the Renaissance, the more explicit genealogies of this phenomenon of Occidental culture: the collection – the accumulation and classification of what is strange in one unit, in a private totality. Bizarre objects would scintillate then in precious show windows: many brought from the great conquers of the navigations, widening territorial and ethnic frontiers, demanding increasingly precise cartographies. And here we find another character of this tale: the cartographer. Like the act of collecting, the one of mapping demands an abstraction and a reservation. The collector accumulates objects, the cartographer brings together information. But if the collection abstracts the object from its ordinary place in order to introduce it to a particular system, the map represents, in one plan, information referential to the area of its location. A fortune of writing, cartography describes the visions of a time, of its physical space as well as of the world in general. Its abstraction, altogether, is of another species: the lines that are drawn over the two-dimensional surface of the map are abstract borders in the flesh of the world, plotted by conflicts of diverse natures. The territorial limits that are traced over the plane have a temporal dimension, a historical profoundness. A history of disputes, power, appropriations. A third dimension that is not the one of pictorial perspective. Powers control the fragments: identities of the language, of customs and of culture are agglomerated. Private collections which construct the fictions of totality and which exclude the other foreigner from its circumscribed spaces. Maps codify the space, nominate the land, but don’t decipher it. They do not undo the shunting lines between the abstraction of the codes and the concrete natures of existence. The objects that Felipe Barbosa collects are not rare or singular. The artist does not collect to insert them in a series. On the contrary, they are small unities produced in series that exhale an anonymous phantasmagory of the copy that its brief and utile life cycle lived and now rests around, mistaken in the indifference of the debris, in the purgatory of the streets. They are traces of the opulence, of the culture of accumulation, of the excess and of the waste: subway tickets, bottle tops which have been picked up in the cities in which he remains even if only for a couple of days, hours or instants: Rio de Janeiro, Fortaleza, Madrid, Paris... Fragments that already


inhabit the universe of the leftovers and of what has been forgotten: it is exactly their residual and repeated condition that attracts him. The small objects rescued by the artist trace, in turn, other cartographies: the tickets outline over the support of the screen the subterranean labyrinth of the subway, the drawing which occults itself from the surface of the cities. Each ticket does not remain from being an indicative sign, breaking the surface of the screen in distinct memories: a brief effort is enough for us to imagine the hands which picked them up, the paths which it served, the encounters which they perhaps enabled. Fragments which, if at first seemed to want to rescue the continuous aspects of time and space, do not free us from the squizofrenic condition of contemporary life. Allude to the profoundness of various times and spaces, and other archeological layers. They do not return the organic temporality of History and its linear cycle of casualties, the identity of the individual, the unity of the space, the contiguity of language. Its strange strategy emphasizes the collapse, the dubiety of the signs and the lapses of meaning: highlights the discontinuities. The maps which result do not return us back to a symbolic whole, to the intuition of an absolute sense: the juxtaposition of fragments is allegoric, dispersive, its meaning remains incomplete and oscillating. The bottle tops, in turn, fight for the territories of the chassi. A unity of each brand deposited aleatorally over the plane initiates the expansion of the spheres of consuming. In concentric circles, they rival the frontiers of the beer and soda brands consumed in the occasion of the artist’s stay in a city. The time of filling up the picture is confused with the duration of his stay there. They do not correspond to the exact place where they rested forgotten. Neither could they: these disappeared in the deterritorialized flux of globalized economy. An abstraction, more violent than that of that collection and of cartography, instaures itself: everything is equaled in the field of merchandising, in a system of trades, in the bare and memoryless surfaces of consuming. Or previously, the maps of the artist reveal its paradoxes: memory has also been globalized, commercialized in the cultural industry of the West. Where to place the responsibility of the collective acts, the political exercise of memory? The world turns into a museum, the cities vindicate their private cabinets, compete between each other for the prestige of keeping their collections. We could map the genealogies of the Maps of Felipe Barbosa: Duchamp would parody with the ready-made operation of the collector - he would take out an object from its daily context in order to insert it in the collection of Art and in this way desecrate its system. To the silence exhaled by this subtraction, the artist would aggregate the name Art. But we are closer to the pop irony and


its incursion over the domain of the series: the maps of the artist do not give back the obsessive existence of modern painting, like a closed totality and self-referential. Well, didn’t abstract painting, with its formalist speculations, have its private collection of fictions? - The assertion of the two-dimensional space as an undoubtable identity of painting, the vindication of time as an exceptional moment of the aesthetic reception that occurs in the blissful encounter with the object of art. A time without duration, compressed in an instant that promised the suspension of its irreversible flux. An immediate, which violated and cheated time itself. Surface here is not the ontological plane of the painting, maybe the spectral unenchantment of the indifferentiation of the series and the bare uniformity of globalization. Time is neither the immediate of the aesthetic ecstasy: this is diluted and multiplies itself in the allusion of the rapid and mundane pleasures of a cold drink. Brief memories. How then not to equally doubt the present? Of the reinvidication of what is now in the duration of the experience? The intensified present is involved to the volatile nature of merchandise; and the present, to the immediate nature of consuming. I suspect, alter all, that the passion of the archivist has its own mechanics, a systematization of obsessions, a fixation of thought to the object to which he addresses non-stop - passion has its specific rationality. I suspect, after all, that the method of the cartographer wants to map what is characteristic of the memory, of the temporality and of the current area, which does not succumb indifferent to the easy abstractions of consuming. Reason has its specific passion. Because of this it is necessary to think other times and areas, another practice of memory and forgetting. Other abstractions are necessary due to this.


Mapa de metro, Madri / Underground map, Madrid [2001] Bilhetes de metro redesenhando a malha metroviรกria da cidade / Underground tickets drawing the city underground map on canvas 195 x 195 cm


Mapa de metro, Londres / Underground map, London [2004] Bilhetes de metro redesenhando a malha metroviรกria da cidade / Underground tickets drawing the city underground map on canvass 200 x 290 cm

Mapa de metro, Paris / Underground map, Paris [2002]

Bilhetes de metro redesenhando a malha metroviรกria da cidade / Underground tickets drawing the city underground map on canvass 200 x 290 cm


Mapa de metro, Cidade do MĂŠxico / Underground map, Mexico City [2004] Bilhetes de metro redesenhando a malha metroviĂĄria da cidade / Underground tickets drawing the city underground map on canvass 180 x 140 cm


Cola / Cola [2002] Coleção de refrigerantes de sabor Cola, atualmente o trabalho conta com mais de 200 marcas diferentes oriundas de diversos paises / Collection of cola-flavored soft drinks from various countries Dimensões variáveis / Variable dimensions



Vista da exposição Super Mercado - galeria Casa Triangulo São Paulo 2007 / View of the Supermarket show at Casa Triangulo Gallery, São Paulo 2007


Felipe Barbosa

Fernando Cocchiarale

Duas vertentes opostas, surgidas na arte da primeira metade do século XX , mesclam-se na obra de Felipe Barbosa: o construtivismo e o dadaísmo. Se por um lado ambos voltavam-se contra os princípios acadêmicos da arte clássica e contra o teor artesanal dos processos convencionais da pintura e da escultura, por outro divergiam quanto aos novos passos a serem dados para a sua superação. Para o construtivismo o passado já havia sido suficientemente abalado pelas primeiras vanguardas modernistas. Tratava-se, pois, de construir sobre seus escombros uma nova arte comprometida com o socialismo e, portanto, com a lógica da produção industrial. Mas para o dadaísmo, ao contrário, era necessário avançar na demolição dos repertórios remanescentes da academia que impediam a superação de ideais como a transcendência da arte e a genialidade do artista, por meio de diversos procedimentos como a colagem e a apropriação de objetos produzidos no circuito industrial (o readymade de Duchamp embora lateral ao Dada tornou-se um emblema do método da apropriação como alternativa ao fazer manual).


A maior parte dos trabalhos recentes de Felipe, baseia-se na construção (que, conforme sua definição histórica, consiste na montagem da obra a partir de partes previamente fabricadas em função de um projeto geometricamente concebido). No entanto, Felipe não constrói por apreço à pesquisa formal pura (e sem qualquer narrativa), do construtivismo, uma vez que ele não só a relativiza, pelo recurso à irreverente banalidade da apropriação, como minimiza também, inversamente, esta última, ao submetê-la ao rigor da geometria. Os títulos e as fichas técnicas desses trabalhos são cristalinos quanto à sua natureza híbrida: Toblerone (estrutura geométrica feita com 20 caixas de chocolate); Coca-cola ( 5 garrafas de coca-cola com tamanhos diferentes) ou Super Ball (bola 3D feita com gomos de 30 bolas), dentre outros. Trata-se, aqui, de uma geometria de teor empírico. São trabalhos compostos a partir das possibilidades de modulação, inserção e montagem ditadas pela configuração formal dos objetos apropriados pelo artista. Por isso, sua organização geométrica final supõe, sobretudo, a experimentação concreta e não apenas a execução de projetos. Entre alguns emblemas do consumo cotidiano e sua estruturação geométrica, desloca-se o sentido poético de toda a produção recente de Felipe Barbosa. Se seus trabalhos não são formalistas, tampouco se rendem aos encantos e até as facilidades academizantes da apropriação pura e simples.O colecionador retira o objeto de sua órbita vital, afasta-o de seu uso quotidiano e de sua prescrição prosaica. Protege-o em meio a outros em uma série: cerca-o em sua paixão meticulosa, precisa, metódica. O resguarda em uma nova ordem. Nem sempre a relação que essa reunião de objetos consuma — objetos por vezes distantes e alheios entre si — resulta clara para aquele que observa sua apurada operação. Em torno de cada objeto seqüestrado do mundo escava-se uma espécie de silêncio: um espaço que não se preenche, salvo pela proximidade a outros que, com ele, integram a coleção. Salvo talvez pelo próprio ato de colecionar: é a série que


Cadeira / Chair [2007] Cadeira de acrĂ­lico transparente recheada con flocos de espuma / Acrylic chair filled with foam flakes 45 x 80 x 50 cm


Vista da exposição Felipe Barbosa - galeria Casa Triangulo São Paulo 2007 / View of the Felipe Barbosa show at Casa Triangulo Gallery, São Paulo 2007


Felipe Barbosa

Fernando Cocchiarale

Two diametrically opposed factions emerging in art in the first half of the twentieth century meet in Felipe Barbosa’s work: namely constructivism and dadaism. If on the one hand both movements were concerned with combating the academic principles of classical art and the craftsmanship of the conventional processes of painting and sculpture, on the other they diverged regarding the new steps to be taken for their overcoming. According to constructivism the past had already been sufficiently shaken by the initial modernist avant-gardes. Thus, it was a question of constructing atop its debris a new art preoccupied with socialism, and consequently with the logic of industrial production. However, for dadaism it was still necessary to advance on the destruction of the remaining academic repertoire that staunched the overcoming of ideas such as the transcendence of art and the genius of the artist by means of diverse mechanisms such as collage and the appropriation of objects produced in industrial surroundings (despite Duchamp’s readymade being marginal to Dada it has become an emblem of the appropriation method as an alternative to manual crafting).


The majority of Felipe’s recent work is based in construction (wich according to its historic definition consists on the work’s assembling from pre-fabricated items in function of a geometrically conceived project). Nonetheless, Felipe does not construct out of a consideration for the pure (and narrativeless) formal research of constructivism, since not only does he relativize it by means of the irreverent banality of appropriation, but he also inversely minimizes appropriation by submitting it to the severity of geometry. The titles and details of these works are crystal clear as regards their hybrid nature: Toblerone (geometric structure made up of twenty chocolate boxes); Coca-cola (five coca-cola bottles of varying size) or Super Ball (three-dimensional ball made with the panels of 30 football balls), among others. We are here dealings with a geometry of empirical significance. These are works formulated by the modulating, constructing, and setting possibilities dictated by the formal configuration of the objects appropriated by the artist. On that account their final geometric arrangement implies above all on concrete experimentation and not only on the execution of projects. The poetic significance of the entirety of Felipe Barbosa’s recent output shifts amidst emblems of routine consumption and their geometric arrangement. If his works are not formalist they also do not fall prey to the charms and even the academizing facilities of appropriation pure and simple.


Sem tĂ­tulo / Untitled [2000] Cerca de 120.000 palitos de fĂłsforo enfiados em uma tela / About 120.000 matchsticks poked in a plastic net 100 x 100 x 45 cm


Ursa Maior / Ursa Major (Great Bear) [2006 - 2007] Bicho de pelĂşcia revestido com estalinhos (pequenos explosivos) / Teddy bear covered with small explosives 120 x 110 x 100 cm



Panda / Panda [2005 - 2006] Bichos de pelĂşcia revestidos com estalinhos (pequenos explosivos) / Teddy bear covered with small explosives 34 x 27 x 25 cm Ursa Mel / Honey Bear [2007] Bichos de pelĂşcia revestidos com estalinhos (pequenos explosivos) / Teddy bear coverd with small explosives 90 x 87 x 78 cm



Piu-Piu / Tweety [2007] Bicho de pelĂşcia revestido com estalinhos / Stuffed toy animal covered with small explosives 26 x 20 x 18 cm Cavalo / Horse [2005] Bicho de pelĂşcia revestido com estalinhos / Stuffed toy animal covered with small explosives 45 x 20 x 36 cm



Homem Bomba / Bomber Man [2002] Vídeo que mostra a ação de acender a obra Homem Bomba e as relações da vizinhança / Video that shows the moment when the Bomberman was lit and how the neigborhood reacted to it


Homem Bomba / Bomber Man [2002] Objeto construĂ­do com bombas / Object made of explosives 44 x 20 x 13 cm



Igloo / Igloo [2007] Vídeo que mostra um pequeno iglu construído com acendalhas (cubos de alta combustão para lareiras e grelhas) arder / Video that shows a small igloo built with fire fueling blocks 20 minutos, cor, som / 20 minutes, colour, sound



Pontes (detalhe) / Bridges [2001] Palitos de fรณsforo colados lado a lado / Matchsticks glued together 30 x 30 x 30 cm

Big Bang / Big Bang [2004] Palitos de fรณsforo colados lado a lado / Matchsticks glued together 45 x 45 x 45 cm



Mรณrulas / Morules [2001 - 2003] Palitos de fรณsforo colados lado a lado / Matchsticks glued together 35 x 35 x 35 cm

Pontes (Hollow World) / Bridges (Hollow World) [2001 - 2003] Palitos de fรณsforo colados lado a lado / Matchsticks glued together 40 x 40 x 40 cm



Bandejas / Trays [2001] Desenhos realizados com palitos de fรณsforo / Drawings made with matchsticks 25 x 12 x 8 cm


Gravatas / Ties [2002 - 2006] Gravatas costuradas / Neck ties sewn together 200 x 200 cm


Gravatas / Ties [2002 - 2006] Gravatas costuradas / Neck ties sewn togethe 200 x 200 cm


Gravatas escorridas / Poured ties [2007] Gravatas costuradas / Neck ties sewn together 230 x 280 cm


Gravatas escorridas / Poured ties [2007] Gravatas costuradas / Neck ties sewn together 230 x 230 cm


Gravata - Gråfico Tipo Pizza / Tie – Pie graph [2007] Gravatas costuradas / Neck ties sewn together 200 x 200 cm


GrĂĄfico de consumo / Consumer bar graph [2004 - 2007] GrĂĄfico realizado a partir do consumo de bebidas enlatadas no perĂ­odo de 2004 a 2007 / Graph that shows the consumption of canned beverages from 2004 to 2007 90 x 150 x 8 cm


Fotografia colorida / Color photograph 82 x 117 cm

Quadro de Cortiรงa / Corkboard [2003 - 2006]



Fotografia colorida / Color photograph 27 x 32 cm

Ă lbum de fotografia / Photo album [2003 - 2006]


Fotografia colorida / Color photograph 50 x 75 cm

Janelas / Windows [2003]



Martelo de Pregos / Nail Hammer [2001] Pregos sobre cabo de martelo / Nails on hammer 25 x 11 x 9 cm

Quadro de nível / Line level square [2001] Quadro construído por 4 níveis / Square built with 4 line levels 30 x 30 x 30 cm


Coloca Cola PET / Coloca Cola PET [2006] 5 garrafas de Coca Cola / 5 plastic Coca-Cola bottles 33 x 14 x 14 cm


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