Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários ou de aut

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Catalogação na Publicação (CIP)

Ficha catalográfica feita pelo autor G491e Gimenez, Fernando Antonio Prado, 1957 Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários ou de autoajuda / Fernando Antonio Prado Gimenez. – Curitiba: Fernando Antonio Prado Gimenez, 2020. 188p. ISBN: 978-65-00-03894-1 1. Empreendedorismo 2. Administração 3. Pequena empresa 4. Sustentabilidade 1. Título CDD: 658 CDU: 65.016



Sumário Prefácio ....................................................................................................... 5 Apresentação ............................................................................................ 8 O artista: permanência, mudança e lealdade ou "se você quer ser empreendedor precisa ter o que os outros não têm" ......... 10 _ Zezinhoooo! Vai lá no Gimenez... ................................................. 12 Vantagem competitiva na pequena empresa - almoço no Candidu´s em Mossoró. Bom quissó! ............................................. 15 Dando cor ao empreendimento: a busca do equilíbrio entre inspiração e domínio técnico ............................................................ 17 O administrador dividido em dois: empreendedor e gestor na pequena empresa .................................................................................. 20 Trajetórias empresariais femininas: o encontro entre realidade e ficção .................................................................................. 27 Que nome dar à empresa? ................................................................. 31 Da sustentabilidade ............................................................................. 33 A fórmula do sucesso: Luis Buñuel, MGM e administração .. 37 Pequena empresa familiar: um espaço conflituoso? ................. 40 Fábulas de Esopo: lições para a gestão de pequenas empresas ....... 46 Os limites das ferramentas na administração ............................ 50 Helena Ignez, cinema de arte e panificadora em Cuiabá: até onde pode nos levar a necessidade de realização? .................... 53 Escolha de Sofia e modelo de forças competitivas de Porter .. 56 Ensaio eloquente sobre o vazio e o nada no empreendedorismo ............................................................................... 61


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Mintzberg, formas organizacionais e o poderoso chefão .......... 62 Pandora, Medianeras e a esperança no empreendedorismo .. 65 O estranho caso da autonomia alugada ....................................... 68 Frustração, ruptura e medo: dimensões de análise pouco exploradas no empreendedorismo .................................................. 71 Empreendedorismo e a servidão moderna ................................... 75 O encontro da coragem com a prudência: um texto multimídia sobre encontros, empreendedorismo e gestão ...... 77 Conversas com empresárias: lições de vida no mundo dos negócios ................................................................................................... 81 Sustentabilidade e a montanha mágica de Thomas Mann ..... 84 Rotunda de Vitor Meireles: o primeiro crowdfunding da indústria criativa no brasil ................................................................ 87

Administração na Tropicália ............................................................. 92 Carne de cavalo, os miseráveis e responsabilidade social corporativa .............................................................................................. 95 Uma diretriz para a implantação da responsabilidade social corporativa .............................................................................................. 98 Esponja inteligente: forças que configuram organizações eficazes ................................................................................................... 100 A pequena empresa como espaço expressivo do empreendedor ..... 105 (ins)pirações: misturando Godard, Faroeste caboclo, O amante da rainha e responsabilidade social corporativa ...... 107 Os 5 Ps do empreendedorismo ....................................................... 111 Sobre desafios e ganas ou cabelo e barba em uma barbearia portuguesa ............................................................................................ 114 Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Perto da concha acústica: o cachorro-quente que virou pitbull! .................................................................................................... 117 A freira e a taxista - entre a eficiência e a eficácia! ................. 122 Sustentabilidade: reflexões sobre textos chineses e trabalho interno, o filme..................................................................................... 125 Reflexões londrinenses sobre longevidade .................................. 130 A cuidadora de Sócrates ................................................................... 134 A beleza no empreender.................................................................... 138 A cobradora de ônibus, o guia cego, a jovem estudante de cinema e o empreendedorismo: como eles se encaixam? ...... 142 De como a morte de Dona Duartina me mostrou a importância da visão sistêmica ...................................................... 147 Namorou, perdeu vida! ou, a administração, testemunha ocular do embate entre sustentabilidade e competitividade 150 O sexto P do empreendedorismo: prazer..................................... 154 Capacidades supercalifragilisticexpialidocious: Mary Poppins e a quase mágica da administração ............................................. 157 Vontade junta necessidade com oportunidade? ....................... 158 Nitis Jacon, uma empreendedora cultural ................................. 159 A jovem Tina e o teto de vidro na pequena empresa ............... 162 Algumas lembranças e memórias do Supermercado Gimenez ........ 166 Muito antes desse tal de delivery .................................................. 170 Reflexões de um editor de dois periódicos quase marginais e quase anárquicos ................................................................................ 173 Posfácio .................................................................................................. 182 Fernando Antonio Prado Gimenez


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PREFÁCIO

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á alguns anos - cerca de duas décadas - pensávamos, no grupo de pesquisa sobre Educação em Administração da Universidade Estadual de Maringá, que a atuação do administrador se dava em três amplas frentes, das quais a liderança seria uma e, o empreendedorismo, uma das possibilidades de atuação de líderes. Discutíamos, então, a ideia de que essas frentes de atuação, separadas por nós por motivo de categorização, ocorreriam em maior ou menor grau onde e quando o fenômeno da administração emergisse. Aquele grupo era constituído, basicamente, por quatro professores e pesquisadores, dentre os quais o Fernando Gimenez era o único engajado em reflexões e estudos a respeito da administração em pequenas empresas. Olhar o mundo a partir de três amplas categorias era uma de nossas obsessões, inspirada por um dos nossos colegas mais experientes e coordenador (ou algo assim) de nosso grupo. Se tínhamos ou não razão, o fato importante era que, daquela perspectiva que tentativamente esboçávamos, o empreendedorismo enquanto ato administrativo implicaria, sempre, forte capacidade de liderança e também alguma habilidade política acentuada (desnecessário é alertar que não tratávamos de política partidária), além de algumas habilidades gerenciais. Hoje, mesmo à distância dessas duas décadas, impossível é não perceber a força daquelas ideias no fenômeno do empreendedorismo conforme ele é tratado em 'Empreendedorismo e Pequenas Empresas: Coisas que você não vai ler em livros universitários ou de autoajuda'. E, talvez, mesmo aquela nossa obsessão ainda inspire o seu autor, o que parece evidententemente anunciado, já de largada, no próprio título da obra. Quanto ao empreendedorismo, a sua discussão acadêmica vem sendo realizada, malgrado a sua costumeira vinculação Fernando Antonio Prado Gimenez


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com a criação, a inovação, o desbravamento de fronteiras, em moldes bastante convencionais. Já a literatura popular (pop management) costuma ser demasiadamente normativa e, invariavelmente, superficial e pobre de reflexões. Ambas são como de resto a maior parcela da literatura em administração - pouco receptivas à cultura e à arte.

Não é este o caso, certamente. Fernando Gimenez consegue, neste livro, nos apresentar, com singeleza e audácia, muitas facetas do empreendedorismo sem sucumbir ao academicismo, à superficialidade e à aridez cultural. Antes, 'Empreendedorismo e Pequenas Empresas' é uma deliciosa coleção de pequenos textos nos quais ideias e sugestões sobre gestão e empreendedorismo surgem enquanto o autor reflete a respeito do seu cotidiano e de sua paixão pela arte, especialmente pelo cinema. Já no primeiro texto do livro, a reflexão nos leva, a partir do filme 'O Artista', a considerar três aspectos fundamentais à vida humana e ao empreendedorismo: a necessidade de mudança, o natural apego à permanência, e a lealdade. Sem rodeios Fernando nos brinda, nesse primeiro texto, com a estrutura que seguirá por todo o livro e que o caracteriza. De modo surpreendentemente agradável, desvela-se em duas páginas um movimento que sai da experiência do autor em um evento cotidiano específico qualquer - aquele instante no qual, como escreveu certa vez Kierkegaard, o tempo se abre para acolher o que é eterno e infinito - e encontra um pensamento que concerne, simultaneamente, ao empreender e ao viver. Arte, negócio, vida; essa estranha e conflituosa tríade se torna pacificada e bela na escrita do nosso professor londrinense, fazendo com que cada um dos quarenta e nove textos que compõem o livro seja uma janela pela qual se pode espiar um ou outro traço da subjetividade do Fernando e, com ele, a subjetividade do próprio empreendedor de pequenos negócios. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Além disso, cada texto é um agradável passeio, em companhia do autor, por cinemas, bares, ruas, ou mesmo à casa de sua família em sua Londrina, em suas outras cidades, ou ainda em lugares distantes. Não faltam o bom humor, a simplicidade e um certo realismo otimista que são típicos do Fernando. Não falta igualmente - o leitor esteja atento e não se deixe iludir pela aparente simplicidade das ideias e pela coloquialidade com que o professor Fernando nos conduz neste passeio - uma lição filosófica, marcada na intuição do autor de que a singularidade do instante, no qual se fundem subjetividade e átimos da realidade, pode ter significado existencial, afetivo, experiencial e até profissional. Das janelas de subjetividade configuradas em cada um dos textos deste livro, como de cenas de um filme ou pinturas de uma galeria, contemplamos fragmentos de vida sendo tocados por ideias e conceitos e adquirindo, com isso, sentidos diversos. Finalmente, acrescento isto: que este não é um livro para qualquer um. Ao mesmo tempo é um livro para todo tipo de pessoa. Não é um manual de gestão ou de empreendedorismo; não é um mapa técnico de soluções préconcebidas, artificiais e 'pré-cozidas'. Ele exige de seu leitor um certo gosto pela vida como um dom e pelo dia-a-dia como palco, laboratório ou sala onde todos nós, com um pouco de atenção e disposição, podemos aprender lições importantes e onde um mestre como o Fernando pode delinear, com letra, memória e paixão, um caminho melhor para a administração e o empreendedorismo. João Marcelo Crubellate - Prof. Dr. do Departamento de Administração - Universidade Estadual de Maringá

Fernando Antonio Prado Gimenez


APRESENTAÇÃO

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esde fevereiro de 2012, alimento meu blog Empreendedorismo e Estratégia em Empresas de Pequeno Porte (https://3es2ps.blogspot.com/). Foi minha experiência inaugural neste tipo de suporte para disseminação de meus estudos e reflexões sobre empreendedorismo, pequenas empresas, sustentabilidade e administração. Nesse período, as visualizações de páginas do blog, ultrapassaram 95 mil. Em mais de oito anos de existência, escrevi 225 posts. Alguns breves registros de notícias que estavam relacionadas a estes temas, outros formam um conjunto um pouco maior relatando minhas pesquisas sobre o campo de pesquisa em empreendedorismo no Brasil. Mas, a grande maioria foram reflexões provocadas, muitas vezes, por filmes ou livros, que, por razões que a própria razão desconhece, me puseram a pensar em empreendedorismo, pequenas empresas, administração ou sustentabilidade. No momento em que escrevo estas linhas, estou próximo de completar 39 anos de carreira docente. Tem sido uma carreira longa, em que além da docência e pesquisa, tive a oportunidade de ocupar cargos de gestão universitária. É uma carreira que devo concluir no prazo de dois anos, quando poderei me aposentar definitivamente do cargo de professor. Mas, embora nada se possa dizer sobre o futuro, espero continuar ativo em outras esferas que não a vida universitária. Há alguns anos, minha escrita tem se manifestado na forma de crônicas, contos, poesias, além de textos diversos no campo do cinema. A premência da escrita, espero eu, continuará a se fazer presente nos outros blogs que criei ao longo desses anos recentes (contos e crônicas: https://brevestextos.blogspot.com/; poesias: https://umhaikaiaodia.blogspot.com/; textos sobre cinema: https://leiturasemcinema.blogspot.com/). Talvez, até, no Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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3ES2PS, visto que, eventualmente, algum ideia ou reflexão sobre empreendedorismo ou pequenas empresas possa ainda vir à luz.

Os quarenta e nove textos que você encontra neste livro foram retirados do blog sobre empreendedorismo e estratégia em pequenas empresas. Decidi reuni-los nesta forma de publicação, embora não sejam inéditos. É uma espécie de livro-testamento, se é que tal figura exista! Se não existe, tento criá-la agora. Em cada um deles, inspirado por diferentes momentos de minha vida, escrevi sobre temas que me incomodavam, Um incômodo intelectual e, às vezes, existencial! Ao escrevê-los pude, quase sempre, ordenar meu pensamento e registrar minha opinião sobre o que julgava importante naquele momento. Posso parecer pretensioso, mas espero que não seja assim percebido por eventuais leitoras e leitores. Em muitos dos textos, há mais emoção do que razão. E, quando há o predomínio da razão, espero que ela tenha sido mais substantiva do que instrumental. Meu desejo é que estes textos possam inspirar outros e outras a refletirem sobre a sociedade que construímos enquanto humanos habitantes deste planeta Terra. Em especial, neste momento em que enfrentamos a pandemia de nosso século, e somos forçados a repensar nosso estilo de vida. Por fim, que seja uma leitura agradável! Coisa que todo escritor, creio eu, mais deseja para aqueles que se aventuram a ler seus escritos. Fernando Antonio Prado Gimenez Curitiba, junho de 2020.

Fernando Antonio Prado Gimenez


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O ARTISTA: PERMANÊNCIA, MUDANÇA E LEALDADE OU "SE VOCÊ QUER SER EMPREENDEDOR PRECISA TER O QUE OS OUTROS NÃO TÊM"

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ssisti a O Artista, filme mudo de Michel Hazanavicius produzido em 2011, que conta a estória de George Valentim, ator bem sucedido do cinema mudo, que precisa enfrentar a decadência na carreira com o surgimento do cinema falado. Atuações primorosas de Jean Dujardin, no papel principal e Bérenice Bejo, como a figurante Peppy Muller, que conhece George em uma filmagem e acaba se tornando uma estrela de Hollywood na novidade do cinema falado. A trama me fez refletir sobre como lidamos com a mudança, nosso desejo de permanência e a importância da lealdade em nossa vida. Mais que tudo, quando Peppy e George se conhecem e aparentemente se sentem atraídos, uma fala deste para aquela me chamou a atenção. Diz ele, ao fazer uma pinta com lápis de maquiagem na face de Peppy, o que a deixa belíssima e praticamente irresistível: _ Se você quer ser atriz, tem que ter o que as outras não têm. A partir daí a história vai se desenrolando, com uma vertiginosa e bem sucedida carreira de Peppy, enquanto que George Valentim começa a ver a sua ir ladeira abaixo. Nessa trajetória, Valentim conta com a lealdade canina de seu pequeno cão, que também estrelava seus sucessos no cinema mudo e de seu chofer, vivido pelo veterano ator James Cromwell, um misto de faz-tudo, de lealdade quase que canina, que segue com o ator decadente por um ano sem receber salário. Além da beleza e ousadia do filme, filmado em preto e branco, reproduzindo o formato dos filmes mudos do início da história do cinema, inclusive nos créditos iniciais, e trilha sonora muito bem ajustada aos diferentes humores do filme, vi nele uma metáfora para o empreender. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Para mim, a ação empreendedora demanda uma constante busca do equilíbrio entre o permanente e o mutável. O sucesso de empreendedoras e empreendedores depende muito de sua capacidade de perceber quando a aposta no mesmo de ontem ainda é valiosa e, quando guiadas(os) por transformações ao seu redor, percebem a hora de mudar. Meu amigo Paulo Grave, certa vez, chamou minha atenção para algo fundamental: a capacidade essencial do empreendedor não está na sua experiência anterior, que apenas lhe permite reproduzir o que fez, caso nada tenha mudado, mas sim em prognosticar o momento de inovar. Nessa hora, sua experiência será menos importante do que a competência em criar algo novo que se ajuste ao diferente que será enfrentado. É este o drama vivido por George Valentim que aposta na sua experiência e fracassa ignorando os desejos do público. Mas, nem tudo está perdido. No momento derradeiro, quase desesperador, Peppy Muller, tão leal quanto o cão e o chofer de George, embora movida por outro tipo de amor, encontra uma saída. Não direi qual é para não desmanchar o prazer de quem ainda não viu o filme. E assim, acabo enxergando mais um fator essencial para a ação empreendedora. Longe de ser algo que se faz sozinho, empreender só é bem sucedido quando se conta com a lealdade daqueles que nos ajudam: os coadjuvantes (colaboradores) que podem assumir papéis centrais na trama fascinante do empreendedorismo. Ou seja, se você quer empreender, precisa ter o que os outros não têm!

Fernando Antonio Prado Gimenez


_ ZEZINHOOOO! VAI LÁ NO GIMENEZ...

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uando publiquei O estrategista na pequena empresa, na introdução relatei que meus irmãos e eu passamos boa parte da infância brincando no supermercado que nossos pais haviam criado na esquina da Paranaguá com Goiás em Londrina. Com o passar dos anos, a pequena empresa de meus pais deixou de ser um espaço de brincadeiras, tornando-se o local de nosso primeiro envolvimento com o trabalho. Essa pequena empresa e as pessoas que nela trabalharam ou que foram seus clientes (fregueses no dizer de meus pais) povoam parte de minha memória com lembranças que, às vezes, ainda hoje, depois de muitos anos de seu fechamento, servem de exemplo para ilustrar um ou outro aspecto do empreendedorismo e da administração de pequenas empresas em minhas aulas. Outro dia, quando estava acompanhando minha mãe nas compras em uma loja de uma grande rede de supermercados que se instalou em Londrina, encontramos o José Brunelli, irmão da Margarida, filho da Dona Letícia, que fora freguesa durante toda a existência do Supermercado Gimenez. O José, depois dos abraços e cumprimentos calorosos que marcam o reencontro de pessoas que se tornaram amigas, indo muito além da relação comercial, me disse: _ Fernando, sabe que algo que nunca esqueço são os momentos em que minha mãe me chamava e dizia: "Zezinhooooo! Vai lá no Gimenez e me traz....". E continuou: _ Foram infinitas idas ao Gimenez... Assim como o Zezinho, muitos outros filhas e filhos atenderam a esse chamado: Vai no Gimenez e me traz uma caixa de sabão, uma lata de óleo, cinco pães e um litro de leite. Fala pro Seu Christovam ou pra Dona Kilda marcarem. Depois eu passo lá e pago. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Uma pequena empresa que existiu por algumas décadas no mesmo local, deixa de ser apenas um espaço de trocas comerciais e torna-se um lugar onde laços de amizade e companheirismo se formam e permanecem. Assim como os Brunelli, meus pais estabeleceram relações de amizade com os Fernandes, os Amaral, os Ferrari, os Gorini, aquela família de "turcos", como era mesmo o sobrenome? Além desses, a família do Prof. Samuel Fabri, do Dr. Moisés Godói, Seu Souza e Maria Luíza, Dona Catarina e seus filhos, Zanda Amaral e seu Arnaldo com os filhos, os Garcia Lopes, a família da Jane, Magali e Divina, os Gonçalves, e muitos outros que estão na minha memória e, certamente de minha mãe e meus irmãos. Esse encontro com o Zezinho Brunelli me veio à mente quando estava lendo uma edição especial da Entrepreneurship Theory and Practice, uma das revistas mais importantes do campo do Empreendedorismo. O tema da edição especial é O coração do empreendedorismo e contém oito artigos que abordam os mais variados aspectos da relação das emoções com o empreendedorismo e a administração de pequenas empresas. Essa leitura me fez lembrar um livro publicado por Stafford Beer, uma das pessoas mais brilhantes que tive o privilégio de conhecer quando fiz meu doutoramento na Inglaterra. Em 1979, Stafford Beer publicou um livro cujo título era O coração do empreendimento (The heart of enterprise) cujo propósito foi complementar seu livro anterior O cérebro da firma (The brain of the firm) publicado em 1972. O professor Stafford Beer, nessas duas obras, defendia um modelo que tratava as organizações como sistemas viáveis e propunha princípios de administração. Mas, algo que aparentemente parecia embutir a frieza do conhecimento científico racional era carregado de emoções, pois para Stafford Beer "a administração que é profundamente baseada em quaisquer princípios científicos, e não tem 'coração', no sentido de consideração humana, não será bem sucedida". Fernando Antonio Prado Gimenez


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Explicar a permanência de pequenas empresas durante décadas em um mercado que é cada vez mais competitivo e dominado por grandes redes não é uma tarefa acadêmica fácil. Há uma quantidade tão variada de coisas que podem se relacionar com o fracasso ou sucesso de uma pequena empresa, que até hoje, apesar dos esforços dos estudiosos, temos muitas certezas e, também, muitas dúvidas. Mas, nesses mais de 40 anos que tenho dedicado a essa tarefa, carrego comigo uma certeza que não aprendi nos bancos escolares, mas sim no convívio com meus pais no tempo em que os ajudei no supermercado: tão importante quanto o sucesso financeiro e econômico, a administração de uma pequena empresa bem sucedida depende de laços afetivos entre os que nela trabalham e os que dela dependem para a aquisição de produtos ou serviços em sua vida. Talvez, para explicar essa presença da pequena empresa em nossa sociedade, precisamos olhar além da academia e, por exemplo, refletir sobre os versos de Pablo Neruda: Assim cada manhã de minha vida trago do sonho outro sonho.

Há na ação dos proprietários de pequenas empresas a representação de um sonho que é renovado a cada dia. Anos depois, é bom lembrar que os sonhos de Kilda e Christovam marcam as memórias de muitos Zezinhos, Joãozinhos e Mariazinhas.

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VANTAGEM COMPETITIVA NA PEQUENA EMPRESA ALMOÇO NO CANDIDU´S EM MOSSORÓ. BOM QUISSÓ!

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m grupo de doutorandos me levou para almoçar no Candidu´s do bairro Abolição em Mossoró. Desfrutei da companhia agradável de Liana, Adriana, Thaiseany, Ana Maria e Álvaro e da saborosa comida regional. Carne de sol na nata, arroz de leite, baião de dois, torresmo, farofa de carne e outras delícias. A buchada de bode e sarapatel resolvi deixar para uma próxima visita! Além disso, os doces estavam bom quissó! Gargamel, cocadão e torta de banana e outros que não consegui experimentar. Já estava de bucho cheio! Correndo o risco de pegar umas carnes! Mas, haverá outras oportunidades... O Cândidu´s existe há trinta anos conforme pude perceber em uma faixa comemorativa que estava na entrada. Essa longevidade de pequenas empresas é um estudo esperando para ser feito. O que explica que, entre milhares de pequenas empresas que abrem suas portas, a grande maioria encerra atividades precocemente e poucas conseguem chegar à casa das dezenas de anos? Do ponto de vista da literatura em estratégia, a permanência das empresas no mercado está associada à capacidade de criar e manter vantagem competitiva que leva a desempenhos superiores. Quando se fala de pequena empresa, parece que as opções de vantagens competitivas não são tão numerosas quanto as possíveis em médias e grandes empresas. Mais de uma vez, já defendi a ideia de que em uma pequena empresa, que assim permanece por longos períodos, na qual seus proprietários/dirigentes não manifestam a intenção de crescer, uma vantagem competitiva importante, embora pouco defensável, é a localização. Estar próximo a uma comunidade, com população suficiente, que precisa de produtos ou serviços adequados, mas que não valem um esforço muito grande de deslocamento, é uma característica Fernando Antonio Prado Gimenez


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de inúmeras pequenas empresas, tais como, panificadoras, açougues, farmácias, bazares, mercearias, pequenos supermercados, butecos, entre outros. Mas, assim como os dirigentes dessas empresas souberam escolher uma localização vantajosa, outros poderão fazê-lo e passarão a disputar o mesmo mercado, eliminando a vantagem competitiva. Nesse momento, minha hipótese é que outras vantagens competitivas, ligadas à história e trajetória de cada empresa e seus dirigentes fazem valer seus efeitos positivos. São os frutos de uma história de proximidade junto aos clientes e de flexibilidade no atendimento às suas necessidades que levam as pessoas a manterem-se fiéis aos seus fornecedores de pequeno porte. É a relação afetuosa, com calor humano, que ainda se encontra no mundo dos negócios. Poderia dizer que são as vantagens competitivas pathdependent, mas acho essa expressão a manifestação mais exacerbada do pedantismo acadêmico tupiniquim na administração! Como se diria em Mossoró: É coisa de cabra que quer botar banca! Num sabe? É bom mangar dos doutores de vez em quando. Mas eu vou parar por aqui, pois já estou falando mais que a preta do leite! Ôxente!

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DANDO COR AO EMPREENDIMENTO: A BUSCA EQUILÍBRIO ENTRE INSPIRAÇÃO E DOMÍNIO TÉCNICO

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capa da Revista Bravo, 176, de abril de 2012, traz uma bela foto de Antonio Fagundes, esse brilhante ator brasileiro, com parte do rosto e da camisa manchados de vermelho. A princípio pode-se pensar que é uma imagem produzida por meio dessas maravilhas tecnológicas da computação que temos à nossa disposição hoje em dia. No entanto, na Carta da Redação, Armando Antenore, redator chefe da Bravo, explica que a capa foi o resultado de um ensaio fotográfico que contou com a generosidade do ator em se submeter a vários banhos de tinta guache vermelha lançados pela equipe liderada por Valéria Mendonça, editora de fotografia, e Dani de Lamare, produtora. Nas palavras das duas: Jogamos copos e copos de guache no rosto do artista até alcançar o efeito que desejávamos. A imagem final talvez pareça milimetricamente calculada, mas o seu impacto está justo no fato de que há nela boa dose de acaso. Ou, se você preferir, de erro. Todos nos preparamos bastante para a missão... Procuramos a tinta mais adequada, montamos a luz, descolamos o figurino minimalista. Mesmo assim, na hora H, as coisas desandaram um pouco... Depois de várias tentativas, segundo elas, com Antonio Fagundes aguentando firme, a mira do Theo Carias (maquilador) e as lentes do Daniel Klajmic (fotógrafo) encontraram a perfeita sintonia. A descrição dessa produção me fez refletir sobre o desenvolvimento da visão empreendedora como guia principal do processo de empreender. O empreendedorismo tem sido descrito recentemente como um processo de criação ou percepção de uma oportunidade que é posteriormente avaliada e explorada com fins empresariais ou sociais. Esse processo, que no meu ver é essencialmente um ato de Fernando Antonio Prado Gimenez


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criação, distinto das fases posteriores de gestão do empreendimento, pode resultar em uma nova empresa, uma nova unidade de negócio em uma corporação, um projeto social ou de governo que atende a uma demanda de parte da população, novos produtos ou processos que são incorporados a organizações já existentes. Filion, o pesquisador canadense, já comentou muito sobre o processo visionário de empreendedores, que para ele também é o início do ato de empreender.

No entanto, a visão do futuro empreendimento é geralmente imprecisa, com contornos indefinidos, e conforme o empreendedor procura transformar a oportunidade em algo concreto, a visão vai se transformando, ajustando-se aos acertos e erros de uma ação humana que não é, nem pode ser, exata, no sentido quantitativo da palavra. Entendo que é um processo muito parecido com a produção da foto de capa da Bravo. Embora a ação de empreender não possa ser milimetricamente planejada, ela pode, também, assim como a fotografia, se apoiar em uma técnica para que surja eventualmente em um formato próximo da visão imaginada pela pessoa ou grupo de pessoas que empreende. Há na literatura uma difusão muito antiga do plano de negócio como uma ferramenta que está à disposição daqueles que querem empreender. Nos inúmeros manuais de planos de negócios, apresentam-se diversas técnicas que podem ser usadas no planejamento de um novo empreendimento: análise da qualidade do negócio, posicionamento competitivo, ponto de equilíbrio, fluxo de caixa e taxa interna de retorno, alinhamento entre competências organizacionais e de potenciais colaboradores, divisão de tarefas e criação de mecanismos de coordenação, entre outras. Mas, não quero, aqui, comentar sobre planos de negócios que, embora úteis, nem sempre são essenciais para a criação Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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de novos empreendimentos. Para desespero dos consultores, e de alguns pesquisadores, que apregoam sua infalibilidade!

Quando estava fazendo meu mestrado, três décadas atrás, fiz uma disciplina com o Prof. Scaico, relacionada com a análise sistêmica de organizações. Entre as coisas muito bacanas que aprendi naquela época, me lembro do Prof. Scaico dizendo que para entendermos um sistema, precisamos pintar suas cores. Em seguida nos deu um acrônimo: CORES. Um sistema é um conjunto de Componentes, que tem um Objetivo comum, transformando sob Restrições, Entradas em Saídas. Ou seja, para entender um novo empreendimento, por exemplo, eu preciso saber: Quais serão suas partes? Para que ele vai existir? Qual é o seu contexto em termos de facilidades e dificuldades? E que recursos são necessários para transformar produtos em serviços? Assim, se uma pessoa envolvida na exploração de uma oportunidade, é capaz de dar as cores para seu empreendimento, a possibilidade do resultado ser positivo, ou seja, o novo empreendimento surgir no mercado ou na sociedade, é maior. A inspiração da visão guiando as escolhas das cores do empreendimento se manifesta em um equilíbrio dinâmico que transforma a visão, depois de vários acertos e erros, em algo concreto que se tornará útil a toda a sociedade. O acaso e a intenção conspiram juntos para que visão e técnica encontrem a perfeita sintonia.

Fernando Antonio Prado Gimenez


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O ADMINISTRADOR DIVIDIDO EM DOIS: EMPREENDEDOR E GESTOR NA PEQUENA EMPRESA

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ntender como pequenas empresas são criadas e mantidas no mercado por longos períodos de tempo é algo que tem me atraído constantemente. Estudar empreendedorismo e gestão de pequenas empresas permite que eu olhe ao mesmo tempo para aspectos da criação de um empreendimento e de facetas de seu crescimento e consolidação ao longo do tempo. Este processo, no meu entendimento, é um ciclo contínuo de criação => gestão => criação => gestão=> criação => gestão... Infinitas vezes? Talvez sim, se os empreendimentos sobreviverem a seus criadores e continuadores. Mas, na maioria dos casos, em algum momento, esse ciclo se interrompe, com o encerramento das atividades. Fases de transformação são seguidas por fases de consolidação de forma ininterrupta. Julgar qual é a mais importante não faz sentido, pode-se apenas tentar compreender que há momentos para mudar e há momentos para preservar. Há momentos onde a ação é empreendedora e outros onde prevalece a gestão. Em todos os momentos, o que parece ser comum são as incertezas e os riscos. Às vezes parece que ao invés de mudar, o administrador deveria tentar preservar. Outras vezes, aquilo que se preserva parece inadequado em face do que deveria ter se transformado. Hoje em dia há um discurso dominante na literatura da administração que pode ser sintetizado de forma resumida assim: inovar é a solução para qualquer empresa; sem inovação não há salvação! Por esse discurso somos levados a pensar que a humanidade está constantemente em busca de produtos ou serviços novos e deixando de lado os produtos e serviços antigos. Surgem tantas coisas novas que os marqueteiros nos impelem a comprar e, de repente, parece que os administradores devem deixar de lado o que fazem bem há muito tempo, para fazer o novo. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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É óbvio que isso é exagerado, e não se pode levar tão a sério as profecias sinistras do “inove ou pereça”. Basta um pouco de bom senso (meus colegas acadêmicos ficam irritados quando uso essa expressão!) para notar o quão incompleta e imprecisa é essa ideia da busca da inovação contínua. Proponho um simples exercício:

Reflita sobre seu comportamento de consumidor: Quantas vezes vocês compra produtos novos ou se utiliza de serviços inovadores? Quantas vezes suas compras estão associadas a produtos tradicionais ou serviços rotineiros? Não tenho medo de errar ao afirmar que na maioria das vezes, suas compras são de serviços e produtos velhos, feitos da mesma forma e com a mesma utilidade há muitos anos. Nós queremos, ou melhor, precisamos de estabilidade em nossas vidas. Não há tatu que aguente viver só à base de inovações! Lembrei-me dessa expressão que ouvi muitas vezes quando criança. Antiga, mas ainda tão apropriada. De onde será que ela veio? Ora, se estou certo, ou seja, se as pessoas precisam de continuidade e estabilidade em boa parte das suas necessidades de consumo, se eu for um administrador de uma pequena empresa, talvez fosse prudente que eu, além de buscar coisas novas, prestasse muita atenção àquilo que tem sido bem sucedido. Esse é o constante ciclo de criação e gestão que mencionei, não há como só inovar, assim como não há como só fazer o mesmo sempre. É parecido com a novela O Visconde partido ao meio de Italo Calvino, publicada pela primeira vez em 1952. Nessa estória Calvino relata as aventuras do Visconde Medardo que em uma batalha vê-se partido ao meio no sentido vertical do corpo. Graças à equipe médica do campo de batalha a sua parte direita, preservada intacta, conseguiu sobreviver e retornar à sua terra natal. Mas, para agrura de seu povo, essa parte era extremamente malvada. Depois de algum tempo, a parte esquerda que se supunha destruída, retorna também à casa paterna. Ela fora encontrada e curada por Fernando Antonio Prado Gimenez


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alguns eremitas. Ao contrário da outra metade, esta era extremamente generosa. A grande sacada de Calvino foi mostrar nessa estória que nenhuma das duas formas – a bondade pura ou a maldade pura – eram aturadas pelos habitantes. Era preciso dar um jeito de ter uma mistura de novo. A solução calviniana é genial! Leia o livro e descubra qual foi. No caso das pequenas empresas, não há como ser só empreendedor ou só operador de pequenos negócios, termos usados por Louis Jacques Filion em artigo publicado em 1999. De forma muito esclarecedora, Filion demonstrou as diferenças entre formas de pensar do empreendedor e do gestor de uma pequena empresa. Há momentos para criar e há momentos para gerir, procurando em cada momento superar as incertezas e os riscos nas decisões. As duas formas de pensar devem coexistir. Simples assim, mas nem um pouco fácil! É isso que torna a administração fascinante! Ainda mais quando se trata de pequenas empresas.

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COMPETIÇÃO E COOPERAÇÃO ENTRE EMPRESAS: UM TEXTO INSPIRADO POR ARANHAS

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PEQUENAS TEIAS DE

U

m fenômeno da natureza atraiu minha atenção certa manhã. Enquanto trabalhava com amigos em Brasília, observei um conjunto de sete teias de aranha que se esparramavam entre as copas de duas árvores. Cada teia com sua aranha, o conjunto formava uma imagem complexa e inspiradora. Fiquei imaginando o momento em que um infeliz inseto se prendesse em uma das teias entrelaçadas. Imediatamente, sete aranhas estariam se encaminhando para a origem do distúrbio dessa intricada rede. Não importa qual delas chegaria primeiro, mas o destino do inseto já estaria traçado: terminar nas garras de uma delas! Essa imagem me trouxe à mente, em primeiro lugar, a ideia de uma rede de pequenas empresas. Imaginei que as aranhas poderiam representar, cada uma delas, pequenas empresas, e o emaranhado de suas teias uma rede de cooperação de pequenas empresas. A união delas permitiria compartilhar esforços e recursos na busca de uma maior competitividade no mercado. Assim como essas aranhas, com suas teias entrelaçadas, têm aumentadas suas chances de sobrevivência em função da maior probabilidade de obter insetos em sua cadeia alimentar, as pequenas empresas quando se unem seja em centrais de compras, seja em suas relações com o mercado consumidor, têm suas expectativas de sucesso empresarial ampliadas. Essa noção de cooperação entre empresas tem sua lógica residente em uma ideia muito simples que foi exposta de forma precisa pelo Prof. Sérgio Baptista Zaccarelli em seu livro Estratégia e Sucesso nas Empresas. Para o Prof. Zaccarelli, o sucesso de uma empresa depende de dois fatores: a qualidade do negócio em que atua e a qualidade de sua administração. Essa relação se dá de uma forma que quanto maior for a qualidade do negócio, menor pode ser a qualidade da administração da empresa para se ter sucesso. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Por outro lado, se a qualidade do negócio não é muito boa será necessário um esforço maior para se obter sucesso por meio da qualidade da administração que deve compensar a qualidade insuficiente do negócio.

Ações de cooperação entre pequenas empresas são uma forma de melhorar a qualidade do negócio em que atuam. A cooperação permite maior poder de negociação com fornecedores, obtendo melhores condições de compra. Permite, ainda, enfrentar em melhores condições as ações competitivas de grandes concorrentes. Por outro lado, além da cooperação, as pequenas empresas em rede competem entre si. Nesse momento é que a qualidade da administração se manifesta levando a melhores ou piores resultados. No entanto, embora essa noção de cooperação entre pequenas empresas seja comumente estudada na literatura de administração, a imagem das teias de aranhas tão próximas se assemelha, de forma mais adequada penso eu, a uma concentração geográfica de pequenas empresas. Em muitas cidades, observa-se a coexistência de pequenas empresas que competem em um mesmo mercado em espaços geográficos muito restritos. Em Curitiba, por exemplo, há as lojas de sapatos da Rua Teffé, na sua maioria pequenas empresas. Outro aglomerado de pequenas empresas, em Curitiba, ocorre na Rua 24 de maio com suas lojas de materiais de informática, vídeo e som. São Paulo, onde fiz meu mestrado, tem muitos exemplos, entre os quais me ocorre a Rua José Paulino, no Bom Retiro, com sua concentração de lojas de roupas e acessórios. Maringá, outra cidade em que morei, tem, na Rua Pedro Tacques, uma concentração de lojas voltadas para a comercialização de produtos e serviços automotivos. Estas concentrações geográficas são um fenômeno empresarial interessante. Elas ocorrem em geral, de forma espontânea, com o comportamento imitativo de indivíduos empreendedores que veem um caso de sucesso em Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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determinado local e decidem instalar uma nova empresa nas proximidades. Na maioria das vezes, as concentrações ocorrem por facilidades de acesso a algum tipo de matériaprima quando se tratam de empresas manufatureiras. No caso do comércio, o grande afluxo de consumidores é, em geral, o principal motivo da repetição desse comportamento empreendedor. O interessante nesses casos é que o comportamento empresarial predominante é a competição, mas esporadicamente podem surgir casos de cooperação entre as pequenas empresas ali localizadas. A disputa pela atenção do consumidor com mix de produtos diferenciados, atrativos promocionais, preços diferentes é a tônica. Mas, junto a esses esforços competitivos surgem movimentos de cooperação em torno da realização de esforços compartilhados de comunicação com o mercado, articulação concertada para agilizar a realização de benfeitorias públicas na região, comemoração de datas festivas com apresentações artísticas que atraem público e, provavelmente, maior consumo. Nestes esforços coletivos, os custos são compartilhados e os ganhos de cada empresa acabam dependendo principalmente de sua capacidade administrativa de se preparar e atuar nesses momentos. É nesse sentido que associo a concentração de teias de aranhas nas copas daquelas duas árvores à concentração de pequenas empresas. Na maior parte das vezes, o consumidor é o foco da atenção gerencial e, dessa forma, as mais ágeis em atendê-lo acabam se beneficiando mais da concentração. Igualmente, são as aranhas mais ágeis que chegarão mais depressa ao infeliz inseto emaranhado em suas teias. Por fim, de novo quero citar o Prof. Zaccarelli que, junto com os professores Ruy Leme e Adalberto Fischmann, publicou o livro Ecologia de Empresas que li no inicio dos anos 80 quando fiz meu mestrado na Faculdade de Economia e Administração da USP. Sem essa leitura, essas sete teias de aranha não teriam passado de um fenômeno natural Fernando Antonio Prado Gimenez


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interessante para mim. Certamente a leitura desse livro, que quatro décadas atrás me marcou profundamente, e as ideias nele apresentadas me ajudaram a fazer essas relações hoje.

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TRAJETÓRIAS EMPRESARIAIS FEMININAS: O ENCONTRO ENTRE REALIDADE E FICÇÃO

A

Para minha irmã Kilda

literatura de empreendedorismo aborda com frequência as diferenças de percurso, de estilo, de desempenho e dificuldades enfrentadas pelas mulheres empresárias em comparação com seus pares masculinos. No caso das mulheres empreendedoras, entre as principais dificuldades para se inserirem no mundo empresarial, estas enfrentam maiores barreiras no acesso a fontes de financiamento e dificuldades associadas ao que se denomina dupla jornada de trabalho feminino, ou seja, a acumulação de atividades empresariais com as atividades do lar, como mães ou esposas, que são ainda culturalmente e socialmente determinadas como mais inerentes à mulher do que ao homem. Por outro lado, as filhas enfrentam maiores barreiras em processos sucessórios nas empresas familiares do que os filhos de fundadores. Muitas vezes, estas não são nem consideradas como potenciais sucessoras e ficam à margem de programas de preparação de sucessores naquelas empresas que se preparam com antecedência para o momento de transição. Estive envolvido em um projeto voltado para a identificação das trajetórias empresariais de mulheres que conseguiram vencer as barreiras do mundo empresarial e se tornaram dirigentes de empresas familiares ou criaram empresas próprias. Nesse estudo, as trajetórias femininas foram descritas com base na percepção das mulheres sobre os seguintes aspectos: a) história de vida englobando origem familiar, composição da família e formação educacional; b) trajetória profissional com ênfase nas razões para empreender ou tornar-se dirigente empresarial e como se deu o envolvimento com a atividade empresarial; c) auto percepção como empreendedora ou dirigente empresarial explorando a conciliação entre os diferentes papéis exercidos, Fernando Antonio Prado Gimenez


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suas atividades e expectativas e aspirações pessoais e empresariais; e d) percepção do mundo de negócios com seus aspectos facilitadores e dificultadores do exercício do papel de empresária.

Estudos anteriores abordaram uma diversidade de aspectos das trajetórias femininas no mundo empresarial. Por exemplo, a conciliação trabalho-família é uma dimensão constantemente explorada. Outro aspecto frequente na literatura é a possível diferença de desempenho entre empresas criadas ou geridas por mulheres em comparação aos homens. É claro que possíveis diferenças não podem ser explicadas unicamente em função do gênero, mas alguns resultados apontam para um desempenho inferior das empresas das mulheres, o que evidencia a necessidade de explorar que condições estão associadas a este fenômeno. Não se pode aceitar que haja diferenças de competências empresariais entre homens e mulheres hoje em dia que poderiam levar a desempenhos diferentes. A participação feminina no mundo escolar e nas universidades é igual à masculina, portanto há outros fatores que estão causando essa diferença. Outro foco de atenção dos estudos relatados na literatura é a motivação para empreender. Estudos evidenciaram que as principais razões para empreender mencionadas por mulheres são a realização profissional, a percepção de uma oportunidade de mercado e a falta de perspectiva no emprego anterior ou desemprego. No que diz respeito à forma de gestão das empresas, há evidências na literatura que reforçam a existência de diferenças estilísticas entre homens e mulheres. As mulheres tendem a um compartilhamento de informações e preocupação com o ensinamento de outros. Além disso, em geral, a maneira de gestão feminina tende a ser participativa e democrática. Outros aspectos mencionados na literatura são um ritmo de trabalho intenso, elevado nível de Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


autoexigência e de seus autoconfiança e obstinação.

colaboradores,

com

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muita

Nossa expectativa em relação a esse projeto era aprofundar as discussões encontradas na literatura, mas também subsidiar a formulação de políticas públicas que incrementem efetivamente a inclusão das mulheres de forma mais acentuada no mundo dos negócios. Mas, a inspiração para esse tipo de estudo não vem só da academia. Muitas vezes, os escritores da literatura de ficção são capazes de retratar o drama empreendedor muito acuradamente. Lembro-me do dia em que participei da defesa da tese de doutoramento da Jane Mendes Ferreira Fernandes, que fez um belíssimo estudo sobre cinco empresárias curitibanas, apresentado na tese A ação de empreender sob a perspectiva sócio histórica de González Rey que foi desenvolvida no Doutorado em Administração da Universidade Positivo. Nessa tese, Jane juntou uma excelente capacidade de análise científica com uma sensibilidade quase poética na descrição das cinco histórias empreendedoras. Foi essa sensibilidade que me fez lembrar alguns contos do escritor peruano Julio Ramón Ribeyro publicados em sua coletânea La palavra del mudo, volume I. Esse escritor, cuja obra conheci ao final de 2011, tem uma habilidade impressionante para narrar pequenas estórias. Entre elas, a estória de Mercedes que sonhava ter uma pequena quitanda, mas quis o destino que esse sonho teria que esperar um pouco mais. O conto se chama Mientras arde la vela e foi escrito em Paris, 1953. Ou então, a hilariante estória de um desempregado dando explicações a um policial sobre sua situação de embriaguez e como isto se relacionava ao seu plano de abrir uma empresa. Esses contos nos ajudam a compreender de forma mais completa a experiência humana de sonhar e empreender. E é nessa toada, que recordo a experiência de Kilda, minha irmã, que sonhou com e criou uma escola de línguas – Littera - que entrou na vida de muitas crianças londrinenses durante Fernando Antonio Prado Gimenez


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os anos em que funcionou. Na Littera, Kilda pode experimentar os prazeres da realização pessoal, vivenciar as angústias da gestão cotidiana de uma pequena empresa, sofrer a dor da traição de uma sócia em que tanto confiava e aplicar seu estilo na lida com as suas colaboradoras. Mas, embora nunca tenhamos falado sobre isso, tenho certeza que ela guarda na memória muito mais as alegrias do que as dores do empreender e, assim como muitas empreendedoras, marcou a história de vida daquelas que com ela trabalharam.

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QUE NOME DAR À EMPRESA?

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credito que a empreendedora ou o empreendedor passa por alguns momentos de angústia quando tem que batizar a empresa que está criando. O nome da empresa passará a fazer parte de sua identidade. É preciso escolher um nome que passe alguma mensagem significativa ao mercado e, ao mesmo tempo, que agrade a quem está empreendendo. Se possível o nome da empresa deve ser escolhido de forma ambiciosa para que se torne uma marca reconhecida por muitos. Não é uma tarefa fácil! Tendo vivido em Londrina boa parte de minha vida, eu acabei me tornando um cliente fiel do Salão King´s, onde sempre fui atendido pelo Jair. De vez em quando, quando de passagem por Londrina, ligava para o Jair e passava por lá para cortar o cabelo e barba. Essa relação durou uns trinta anos. Infelizmente, Jair faleceu alguns anos atrás. Nos anos que vivi em Maringá tomei conhecimento de uma história muito peculiar. Londrina e Maringá estão separadas por apenas 90 quilômetros. Toda vez que precisava de um corte de cabelo eu viajava para Londrina. Depois de algum tempo de vida naquela cidade, tive que escolher um novo salão para fazer a barba e cortar os cabelos. Foi nesse dia que Sara me disse: _ Por que você não corta o cabelo com o Carlos? É aqui perto de casa e o meu irmão diz que ele é muito bom. Realmente o Carlos é muito bom profissional e acabei me tornando seu cliente também. Depois de algumas idas ao salão onde o Carlos trabalhava, um dia perguntei: _ Carlos, de onde vem o nome do salão de vocês? (O salão é da sogra, de sua esposa e dele) _ Fernando, foi minha sogra que escolheu o nome. _ Mas é nome da família? Fernando Antonio Prado Gimenez


O Carlos riu e disse:

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_ Não. Antes de abrirmos esse salão, minha sogra trabalhava em outro que existe há muitos anos em Maringá. O Salão Royal. Minha sogra comentou com a proprietária que tinha o desejo de abrir seu próprio salão. _ Legal, eu disse. É muito comum isso acontecer. Empregados que têm uma boa habilidade em determinada profissão, acabam deixando o emprego e abrindo sua própria empresa. _ Pois é, continuou o Carlos. A minha sogra pediu alguns conselhos para a proprietária do Salão Royal. Ela deu muitas dicas, mas chamou a atenção para algo muito importante. _ O que era? _ A dona do Salão Royal é descendente de japoneses e ela disse que minha sogra deveria escolher muito bem o nome do salão. Deveria ser algo que significasse crescimento! Foi assim que surgiu o Salão Fleischmann!

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DA SUSTENTABILIDADE

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o acordar, em uma dia de meu aniversário, a primeira coisa que fiz, depois do abraço apertado de Sara, foi ler uma crônica de Affonso Romano de Sant´Anna. Desde muito, o livro Tempo de delicadeza, publicado pela L&PM no formato de bolso, estava no criado mudo aguardando pelo meu olhar. Nessa crônica, que dá título ao livro, em contraponto à vida cada vez mais áspera, violenta, rápida e grosseira, o poeta nos convida à delicadeza, seja a de Ghandi, a de São Francisco ou até mesmo a de Guevara. Há alguns anos, fiz uma incursão em alguns escritos que tratam da ideia da sustentabilidade e do desenvolvimento sustentável. Movido por um interesse profissional, me preparava para o concurso de professor titular na Universidade Federal do Paraná, pude apreciar de forma mais organizada a beleza desse sonho que é compartilhado por um número crescente de pessoas, mas ao mesmo tempo, não pude deixar de registrar os limites de sua possibilidade. Na administração, os princípios do desenvolvimento sustentável se refletem em discussões e proposições sobre justiça organizacional, ética nos negócios, gestão socioambiental, responsabilidade social corporativa, preocupação com os stakeholders, e outros temas. Em síntese, o desejo da sustentabilidade pode ser resumido na busca por uma vida confortável para todos, com uso consciente dos recursos naturais de que dispomos, preservando nosso planeta para as futuras gerações. Tudo isso com equidade social no acesso ao conhecimento e aos frutos da evolução do conhecimento humano. Mas, os desafios da sustentabilidade são enormes. E, especialmente, conflituosos com nossa forma de vida guiada pelo sistema capitalista de produção, acumulação e distribuição de riqueza. Nessa sociedade, em que o princípio do lucro se sobrepõe ao princípio da equidade no bem viver para todos, a preocupação com práticas sustentáveis só estará presente enquanto estas contribuírem para o lucro Fernando Antonio Prado Gimenez


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crescente. Qualquer ameaça à lucratividade, poderá reduzir os esforços da responsabilidade social corporativa. É isso que me faz indagar: é a sustentabilidade sustentável no nosso modo de vida contemporâneo? Quando foco minha atenção para as pequenas empresas, percebo que essa fragilidade da aplicação da responsabilidade social corporativa se acentua. Os desafios da sobrevivência e da permanência, em um mercado dominado por grandes corporações, levam a um predomínio da razão prática, deixando de lado a preocupação com o humano, no sentido de relações de trabalho mais justas, por exemplo. Além disso, na própria relação das grandes empresas com as pequenas, quando o desempenho econômico-financeiro das primeiras pode ser diminuído, as práticas da responsabilidade social corporativa são postas de lado. O mundo real está repleto de histórias. Procure algum empreendedor de uma pequena empresa que negocia com as maiores e, com certeza, algum caso poderá ser contado.

Mas, se você deseja ver até que ponto a crueza e a violência desse convívio podem chegar, leia A Caverna de José Saramago. Nesse romance, Saramago narra as dificuldades do oleiro Cipriano Algor. Cipriano descobre certo dia, que seus produtos não são mais desejados pelo mercado e que ele, como diria um professor de estratégia, precisa reposicionar sua empresa. É nessa tentativa que Cipriano vai se relacionar com os administradores do Centro. Brilhante metáfora de Saramago para essa figura imprecisa, mas onipresente em nossa vida, o Mercado. Nessa relação é que, um dia, Cipriano ao terminar uma conversa com um dos gestores do Centro, sai a refletir: Se te espetam uma faca na barriga, ao menos que tenham a decência moral de te mostrarem uma cara que seja conforme com a acção assassina, uma cara que ressumbre ódio e ferocidade, uma cara de furor demente, até mesmo de frieza desumana, mas por Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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amor de Deus, que não te sorriam enquanto te estiverem a rasgar as tripas, que não te desprezem a esse ponto extremo, que não te deem esperanças falsas,..

Se desejamos mesmo que a sustentabilidade seja uma presença concreta, ainda que intangível, na vida das organizações, parece que transformações em nosso modo de vida precisam anteceder à sustentabilidade. Em particular, a Administração precisa ser ressignificada. Para isso, meus amigos Ariston e Paulo, já chamaram a atenção quando disseram: A administração é uma ação virtuosa. Enquanto tal, ela se dá no âmbito das organizações, como formas sociais modernas que produzem bens úteis. Embora o seu âmbito de ocorrência seja as organizações, isto não significa dizer que as mesmas encerrem sua finalidade. Pelo contrário, a finalidade da administração ultrapassa os fins organizacionais, pois que está teleologicamente comprometida com a existência humana; não uma existência qualquer, diga-se, mas aquela em que o homem vive bem (AZEVEDO; GRAVE, 2008). Mais ainda, ... importa perguntar qual a importância da administração para que possamos lograr o alcance do viver bem coletivo? Se houver um fim humano último, ou bem supremo, ou um bem maior, a administração deve contribuir para o seu alcance, de modo, pelo menos, indireto; do contrário, a administração, como um ato que é mundano, não teria sentido ou importância para a humanidade. Sendo o que é, conforme estamos defendendo, tal fenômeno acaba por se nos apresentar como um dos inúmeros instrumentos dos quais o homem se vale para resolver suas questões de vida, especialmente as relacionadas ao seu cotidiano. Neste sentido, ela Fernando Antonio Prado Gimenez


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estaria voltada para o bem, um bem que é coletivo, e não individual apenas, como temos verificado cotidianamente (AZEVEDO; GRAVE, 2008).

Para concluir Impossível, para mim, não lembrar Dersu Uzala, filme de Akira Kurosawa lançado em 1975, e merecedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1976. O filme relata a amizade que surge entre um caçador asiático e um capitão do exército russo, resgatado pelo primeiro na Sibéria. Ao ser levado para a cidade, o caçador questiona os padrões de vida da sociedade, em conflito acentuado com seus costumes. Inesquecível para mim, mais de 30 anos depois de ter visto o filme, é uma cena em que Dersu (o caçador) depois de passar uma noite em uma cabana no meio da mata, ao levantar-se de manhã, antes de partir, deixa tudo muito limpo e organizado, dizendo que é preciso pensar naqueles que um dia poderão precisar dessa cabana. Uma imagem incrivelmente bela e poética do que precisamos fazer com nosso planeta. Ou seja, um mundo onde impere a delicadeza proposta por Sant´Anna e praticada por Sara na gestão hospitalar que reflete sua inspiração nos estudos da hospitalidade e seu aprendizado na vida profissional em uma pequena empresa e nos seus tempos de maruja no Mykonos de Ubatuba. P.S.: Não deixe de ler o texto de Ariston e Paulo cuja referência é: AZEVÊDO, A.; GRAVE, P. S. Prolegômenos a toda administrologia possível: administração - o que é isso?. In: XXXII Encontro Nacional da ANPAD, 2008, Rio de Janeiro. Anais Eletrônicos do XXXII Encontro Anual da ANPAD, 2008.

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A FÓRMULA DO ADMINISTRAÇÃO

SUCESSO:

LUIS

BUÑUEL,

MGM

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E

C

om a ajuda de Jean-Claude Carriére, o cineasta espanhol Luis Buñuel, que passou boa parte de sua vida no México, narrou sua história de vida no livro Meu último suspiro. Cineasta com trinta e quatro filmes realizados entre 1929, ano de lançamento de Um cão andaluz em parceria com Salvador Dalí, e 1977, com seu último filme, Esse obscuro objeto do desejo, Buñuel retrata com humor e sensibilidade sua trajetória cinematográfica. Natural de Calanda, pequena vila de 5.000 habitantes na província de Aragão, na Espanha, Buñuel relata suas aventuras e desventuras passando por Zaragoza, Madrid, Paris, Hollywood, e México. Logo no inicio de sua carreira, na época do lançamento de seu segundo filme A idade do ouro (1930), Buñuel foi convidado pelo gerente geral da Metro-Goldwin-Mayer (MGM) na Europa a passar seis meses nos Estados Unidos, em Hollywood, recebendo US$ 250 por semana, com o compromisso de apenas observar como se faziam filmes segundo a técnica norte-americana. Seu tutor nesse período foi Charles Chaplin, mas Buñuel relata que não fez muita coisa relacionada a cinema nesse período. É desse período que Buñuel conta uma história que envolve Louis B. Mayer, à época o todo poderoso da MGM. Segundo o cineasta, certo dia, movido pela curiosidade, foi a um grande set de filmagens da MGM onde Mayer se dirigiria a todos os empregados da companhia. Eram cerca de 200 pessoas, vários diretores fizeram seus discursos e ao final Louis B. Mayer se levantou e disse, segundo Buñuel, em meio ao mais respeitoso e atento silêncio: _ Caros amigos, após longas reflexões, creio ter conseguido condensar numa fórmula muito simples – e talvez definitiva – o segredo que irá nos proporcionar, no respeito a todos, o progresso Fernando Antonio Prado Gimenez


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contínuo e a prosperidade duradoura de nossa companhia. Vou escrever essa fórmula.

No set de filmagens havia um quadro de giz e Mayer se dirigiu a ele e escreveu em letras maiúsculas: COOPERATE (em português, cooperar). Sentou-se e foi entusiasticamente aplaudido por todos. Buñuel diz em seu livro ter ficado estupefato, mas essa foi uma das poucas vezes em que aprendeu algo sobre o mundo dos negócios do cinema nos Estados Unidos. A intenção do gerente geral da MGM que fizera o convite a Buñuel era que após os seis meses, pudessem chegar a um acordo sobre a permanência de Buñuel nos Estados Unidos. Mas, o cineasta decidiu voltar para sua Espanha, e em abril de 1930 retornaria a Madri. Gosto muito dessa história que já havia lido, anos atrás na primeira edição da biografia de Buñuel no Brasil. Reli essa biografia, agora em uma edição muito bem cuidada da Editora Cosacnaify, em tradução de André Telles. O livro me foi presenteado por Paloma, minha filha. A busca da fórmula de sucesso para a perenidade das empresas, sejam grandes ou pequenas, é uma constante nos estudos acadêmicos e na prática da consultoria. Encontrar um método que possa garantir isso é como a busca do Santo Graal. O incrível é que a solução muitas vezes parece ser tão simples como a fórmula de Louis B. Mayer: basta conseguirmos a cooperação de todos e teremos sucesso. Mas embora a solução seja simples, o caminho até ela é complexo. Afinal quem são “todos”? Mayer falava para todos os empregados da companhia, mas me parece que o “todos”, de que falava, envolve muito mais gente: clientes, fornecedores, as comunidades no entorno da empresa, governo, além de donos e empregados. Conseguir a cooperação de “todos” significa ser bem sucedido nessa busca do bem estar coletivo. Ou seja, está relacionado à obtenção Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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da beleza de um viver bem humano. E, como disse o próprio Buñuel:

para alcançar qualquer beleza, três condições me parecem indispensáveis: esperança, luta e conquista (p. 307).

Fernando Antonio Prado Gimenez


PEQUENA EMPRESA CONFLITUOSO?

D

FAMILIAR:

UM

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ESPAÇO

Em memória de meu pai

urante alguns anos tive a oportunidade de trabalhar com meus pais em uma pequena empresa tipicamente familiar. Qualquer um que tenha passado por esse tipo de experiência sabe das dificuldades que gerações diferentes encontram quando precisam trabalhar juntos, em particular quando nesse tipo de trabalho há uma relação que extrapola a profissional, envolvendo pais e filhos ou mães e filhas. O afeto paterno ou materno pode ser um fator gerador de conflitos, pois os filhos muitas vezes desejam ser tratados como um profissional competente que pode trazer uma contribuição relevante para a empresa da família. De vez em quando, diferentes compreensões sobre uma oportunidade empresarial ou um problema a ser enfrentado levam a conflitos que extrapolam a vida profissional e afetam a relação familiar. Nesses momentos, a autoridade materna ou paterna tende a prevalecer, independentemente de qualquer solução técnica. Mas, conflitos pessoais não são exclusivos de empresas familiares! Em qualquer organização eles ocorrem e, também, as soluções encontradas nem sempre são exclusivamente técnicas. A neutralidade emotiva não existe nas organizações! Em qualquer situação, aspectos afetivos estão presentes nas soluções encontradas. O que pode ser diferente é a maior ou menor ênfase dada aos aspectos relacionais nos processos decisórios nas empresas que, provavelmente, vão ser característicos de diferentes culturas organizacionais. Charles Handy apresentou em um de seus livros uma forma de encarar as diferentes maneiras com que a cultura das organizações pode se manifestar. Em Os deuses da administração, Handy aborda como que as empresas podem evoluir ao longo do tempo, passando por quatro estágios culturais que marcam a maneira como as pessoas Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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compartilham diferentes pressupostos sobre processos decisórios, aprendizagem, poder de influência, modos predominantes de mudança organizacional, motivação das pessoas e formas de recompensa.

Neste livro, Handy usa a figura de quatro deuses da mitologia grega para diferenciar entre culturas de grupo ou clube, da função, da tarefa e existencial. Cada uma dessas culturas, segundo Handy, pode representar um estágio na evolução de uma empresa em particular, embora algumas empresas possam passar toda sua existência com uma cultura predominante. A cultura de grupo ou de clube, Handy associa a Zeus, poderosa entidade do Olimpo Grego que, segundo a tradição, tinha comportamentos muito enérgicos e emotivos. Quando Zeus estava irado com os humanos causava grandes tempestades, repletas de trovoadas aterrorizantes e infindáveis raios. Por outro lado, quando Zeus estava muito satisfeito, fazia chover ouro em pó sobre os humanos. Segundo Handy, esse tipo de cultura é frequentemente encontrado em empresas jovens e pequenas, com a presença de um líder muito poderoso. Essa cultura enfatiza a informalidade e empatia entre pessoas, acentua rapidez nas decisões, e é eficiente onde rapidez é mais importante que detalhe. A presença de Zeus nesse tipo de organização se nota pela forma com que o principal tomador de decisões na empresa, se for familiar seria o pai ou a mãe, trata a todos de forma (m)paternalista, tentando reproduzir na empresa um clima de família. Nessas empresas, em geral, a aprendizagem ocorre por tentativa e erro ou baseada em modelos; a influência é exercida através do controle de recursos e carisma pessoal; a base da mudança é a substituição de pessoas; e a motivação é orientada pela busca do poder sobre pessoas e acontecimentos. Handy associa o deus Apolo à cultura da função que enfatiza a definição da função a ser realizada baseada em princípios Fernando Antonio Prado Gimenez


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racionais e lógicos, com a busca constante de estabilidade e previsibilidade e as mudanças ocorrem por meio de alterações estruturais ou dos sistemas. O que motiva as pessoas nesse tipo de organização é a autoridade formal e o status.

A cultura da tarefa é representada pela deusa Atena, que caracteriza empresas onde se visualiza a administração como solução de problemas de forma contínua e bem sucedida (projetos). Por fim, Handy menciona a possibilidade de serem encontradas organizações onde a cultura predominante é a existencial representada pelo deus Dionísio. Esse tipo de organização é excelente onde o talento ou habilidade individual é o recurso crucial da organização. Segundo Handy, a noção de chefia não faz sentido nesse tipo de organização, sendo mais consistente a ideia da presença de alguém que coordena as diferenças tarefas individuais. É o que Handy brilhantemente chama de administração consentida, com a coexistência de diversos estilos de pensamento e respeito integral ao indivíduo, sem paternalismo. Nesse tipo ideal de organização as pessoas são motivadas pela liberdade pessoal e autonomia. A leitura do livro de Handy é indispensável para quem deseja conhecer um pouco da diversidade que existe no fenômeno organizacional. Para cada uma das culturas, Handy cita diversos exemplos de organizações onde predomina a cultura específica. Mas, aqui minha ideia é refletir sobre a cultura típica da pequena empresa familiar que é, sem dúvida, a de grupo, onde se encontra uma liderança forte feminina ou masculina representadas por Zeus no livro de Handy. Ora, levando isso em conta como é possível aos filhos conviverem de forma harmoniosa e darem uma contribuição efetiva à empresa da família? Lembro-me de alguns episódios em que tive a oportunidade de discordar de Zeus na empresa de minha família. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Em geral, os conflitos que tive com meu pai ocorreram por causa de diferentes perspectivas na solução de problemas. Meu pai trazia na sua bagagem de vida, uma experiência bem sucedida de mais de 20 anos de condução da empresa. Eu trazia os conhecimentos novos que estava aprendendo no curso de graduação em administração. E muito ansioso para transformar alguns dos processos da empresa. Naquela época, eu não sabia, mas o que tentava fazer era transformar a empresa em direção a uma cultura da função. Eu estava aprendendo o valor das regras explícitas, da análise racional de causas e efeitos, da busca de soluções alternativas, baseadas em avaliação de custos e benefícios. Meu pai sabia que, em geral, o que decidia dava certo. Ele sempre fez daquela maneira! E sempre ganhava o argumento, pois ao fim dizia: _ Você tem muita gramática e pouca prática! E, típico de Zeus, fazia as coisas a seu modo. Embora, isso causasse certa tensão, no geral as decisões em nossa empresa eram consistentes com os objetivos de meus pais. Nunca percebi nele um desejo de que a empresa viesse a se tornar grande no futuro. Parecia que meu pai e minha mãe se sentiam satisfeitos com o que tinham realizado: ter uma pequena empresa bem sucedida que fosse uma base segura para manter a família com uma qualidade de vida muito boa. Talvez eu, inconscientemente, desejasse que a empresa se expandisse, impregnado pelos aprendizados que tinha na graduação e que, em geral, falavam de estratégias de crescimento constante. Eu estava sendo formado para dirigir uma grande empresa. Os conteúdos em geral se voltavam para essa realidade, muito diferente daquela que eu vivenciava no dia-a-dia. Aliás, era nesse dia-a-dia que o meu aprendizado teórico era calibrado pelas contingências da administração em uma pequena empresa. Foi assim que pude aprender que nem sempre as regras racionais poderiam ser aplicadas. Ou, ao menos, havia exceções que eram importantes e que faziam Fernando Antonio Prado Gimenez


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sentido. Por exemplo, durante certo período meu pai estabeleceu uma regra de que cigarros não poderiam ser vendidos no fiado. A empresa fornecedora só nos vendia à vista e, assim, não fazia sentido vendermos os cigarros no fiado, para receber no final do mês. Mas, meu pai conhecia bem seus fregueses e, segundo um deles, nessa época meu pai chegava e colocava no bolso do freguês um dinheiro para a compra do cigarro. Depois ele acrescentaria esse valor na conta mensal. Ele não podia deixar que um freguês em dificuldade deixasse de atender sua necessidade, mas preservava a regra e as funcionárias dos caixas não ficavam sabendo disso. Belíssimo, não? De novo um comportamento de Zeus, paternalista. Outro exemplo era o relacionamento com os empregados. Muito zangado algumas vezes, muito afetivo outras vezes. Era hilariante ver como meu pai se preocupava em particular com as moças que trabalhavam conosco. Em geral, esse era o primeiro emprego delas, aprendiam na prática e meu pai as tratava como se fossem filhas. Chegava ao cúmulo de querer ser informado quando estas começassem algum namoro, queria saber quem era o rapaz, se era de boa família, e assim por diante... Mas, se faziam algo errado, fosse na empresa ou fora dela, lá vinha a tempestade! Com os clientes era a mesma coisa. Em alguns momentos eram tratados como reis, em outros eram o alvo de discussões e, até mesmo, desaforos! Afinal seu Gimenez era um Zeus espanhol! Chegou a ser retratado na imprensa local como o tubarão da rua Paranaguá, na época em que houve racionamento de alguns produtos e ele dava jeito de atender alguns clientes confiáveis, mas outros não. Foi uma escola de administração para mim. Como filho, algumas vezes foi difícil. Anos depois, quando já me havia decidido pela vida acadêmica, assisti a um filme que me fez enxergar melhor qual foi o papel de meu pai na minha carreira. No filme Estrada para Perdição (Road to Perdition), Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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de 2002, dirigido por Sam Mendes, Tom Hanks vive o papel de um contador cujo filho presencia um assassinato e, a partir desse momento, corre sérios riscos de ser assassinado também. O personagem de Tom Hanks parte em uma jornada para uma pequena cidade chamada Perdition, tentando proteger a vida do filho. Nessa jornada ele comete vários atos violentos. O filme começa com a narração feita pelo filho que diz: _ Alguns dizem que meu pai foi um homem mau, outros dizem que ele foi um homem bom, eu só posso dizer que ele foi meu pai... Pois é, alguns me diziam que meu pai era um ótimo empresário, outros me diziam que ele não era tão bom assim. Quanto a mim, só posso dizer que ele foi meu pai. Aprendi muito com ele!

Fernando Antonio Prado Gimenez


FÁBULAS DE ESOPO: PEQUENAS EMPRESAS

LIÇÕES

PARA

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ncontrei em um sebo, uma edição de bolso das Fábulas de Esopo publicada pela L&PM em 2002. Foi uma volta à infãncia! Muitas das fábulas foram transformadas em contos infantis que imagino ainda estejam no mercado livreiro. Entre várias que me fizeram recordar os dias de infância e minhas idas à Biblioteca do Colégio Londrinense, há duas que servem de lições para a gestão de pequenas empresas também. A primeira é muito conhecida e se intitula "Os filhos do camponês". Naquela época, Esopo contava que: A discórdia reinava entre os filhos de um camponês. Em vão, ele os exortava a mudar de comportamento; suas palavras não produziam nenhum efeito. Foi por isso que decidiu dar-lhes uma lição na hora: _ Tragam-me - disse ele - um feixe de gravetos, Os meninos foram buscar. O camponês pegou os gravetos e os uniu num feixe compacto e pediu que eles o partissem. Apesar de toda a força que botaram, não conseguiram. O pai então desfez o feixe e deu a cada um deles um graveto. As crianças os quebraram com facilidade. _ Vejam, meus filhos, o mesmo acontece com vocês: se forem unidos, não temerão seus inimigos, mas se continuarem na discórdia, cairão nas mão deles. (Fábulas de Esopo. Porto Alegre: L&PM, 2002, p, 5051). Muitas vezes a união entre pequenas empresas é uma forma de aumentar sua competitividade. Uma das formas mais comuns de cooperação entre pequenas empresas são as centrais de compras, que permitem melhores condições de barganha junto a fornecedores e oferta de produtos ou serviços em condições mais competitivas ao mercado. No Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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entanto, algumas vezes, algum graveto cede à tentação de sair do feixe. Isto é, uma pequena empresa pode ceder a tentações egoísticas e não compartilhar com as demais que estão unidas alguma oportunidade. Nesse momento, a união pode ser ameaçada e o feixe desfeito. Alguns poderão se quebrar!

Lembro-me de um exemplo que aconteceu em uma associação de pequenos supermercados no norte do Paraná. Essa associação, semanalmente, publicava um folheto com as ofertas da semana que poderiam ser encontradas em todas as lojas dos supermercados da associação. Essa promoção semanal era combinada com antecedência de uma semana. Certa vez, um dos associados, se aproveitou dessa combinação antecipada de promoção, e no dia seguinte à definição de quais seriam as ofertas da próxima semana, resolveu fazer uma promoção antecipada em suas lojas, antes de todos os membros da associação, já que estava com estoques altos da maioria dos produtos que seriam ofertados na semana seguinte. Esse comportamento egoístico gerou muito conflito e discórdia no âmbito da associação. O feixe foi momentaneamente quebrado! A confiança entre os cooperados sofreu muito. Outra fábula que eu gostava muito quando criança é a que conta sobre uma disputa entre o vento e o sol. Esse é o registro da fábula (Fábulas de Esopo. Porto Alegre: L&PM, 2002, p, 83): O Vento e o Sol discutiam para ver quem era o mais forte. Ficou estabelecido que ganharia aquele que conseguisse arrancar o casaco de um viajante. O Vento começou: pôs-se a soprar violentamente e, como o homem segurasse o casaco com força, ele redobrou os ataques. Transido de frio, o viajante pôs um segundo casaco, de modo que o Vento, desencorajado, deu a vez ao Sol. Este a princípio brilhou moderadamente e o homem tirou o segundo casaco. O Sol lançou então seus raios mais fortes e, Fernando Antonio Prado Gimenez


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assim, sem suportar mais o calor, o viajante tirou toda a roupa e se jogou num rio próximo. Esopo concluía: Conseguirás o que queres pela persuasão, não pela violência.

Aqui a relação com pequena empresa não é tão direta como na fábula anterior. Creio que essa fábula nos permite refletir sobre dois aspectos da gestão que são relevantes para a pequena empresa. O primeiro, quando pensamos na ação do Vento, pode-se refletir sobre a importância de conhecer o nosso mercado. O Vento não sabia nada sobre porque o viajante usava um casaco! Quanto mais ventava, mais o viajante precisava do seu casaco. Assim, se queremos que o cliente prefira nossa empresa, precisamos saber o que o motiva, suas necessidades e de que forma podemos atendê-lo. Por outro lado, a ação do Sol também é ilustrativa. Quando não sabemos bem o que o mercado quer, precisamos ser prudentes, agir devagar, analisar sua reação e persistir. Se fizermos algo que deu bons resultados, reforçamos esse comportamento, se os resultados não foram bons, vamos tentar entender porque não deu certo. E, depois, tentar algo diferente. Para mim, quando me lembro das pequenas empresas e de seus dirigentes que tive a oportunidade de conhecer ao longo da vida, um padrão surge entre as bem sucedidas. É o que chamei, certa vez, de experimentação estratégica. Na pequena empresa, é preciso juntar a ação cotidiana, em condições elevadas de incerteza, com a capacidade de refletir e experimentar ações alternativas, e reforçar aquelas que foram bem sucedidas. Para que isso funcione, algo é fundamental, e agora tomo emprestado as ideias de Edmilson Oliveira Lima. Segundo Edmilson, os dirigentes de pequenas empresas precisam desenvolver a capacidade de realizar conversas estratégicas. Discutir os rumos da empresa com seu sócios, outros parceiros, empregados e, nessas conversas, ir Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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(re)definindo os rumos da empresa. Essas conversas são uma base muito adequada para a experimentação estratégica.

Procurem textos do Edmilson sobre conversa estratégica, São muito interessantes. Um deles pode ser encontrado no livro "Empreendedorismo e estratégia de empresas de pequeno porte – 3Es2Ps", disponível gratuitamente em https://pucpress.pucpr.br/index.php/pucpress/catalog/boo k/29.

Fernando Antonio Prado Gimenez


OS LIMITES DAS FERRAMENTAS NA ADMINISTRAÇÃO

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onsidero impossível assistir a qualquer filme de Krzysztof Kieslowski sem ser, de alguma forma, afetado pelo que vemos. Esse cineasta polonês fez mais de 30 filmes em uma carreira que se iniciou em 1966 e, voluntariamente, se encerrou em 1994. Seus últimos filmes foram especialmente bem sucedidos, tanto em termos de público quanto de crítica. Entre eles se destacam A fraternidade é vermelha (1994), A igualdade é branca (1994), A liberdade é azul (1993) e A dupla vida de Verónique (1991). Os três primeiros formam a Trilogia das Cores, que foi baseada nas cores da bandeira francesa e no lema da Revolução Francesa do século XVIII: Liberdade, Igualdade, Fraternidade. No final dos anos 80, Kieslowski realizou para a TV Polonesa o filme Decálogo. Composto por dez histórias, o filme apresenta dilemas morais com inspiração nos Dez Mandamentos, da tradição cristã. Na trajetória de Kieslowski há um fato marcante, ocorrido em 1994, quando o cineasta comunica que estava se aposentando por sentir-se cansado de fazer cinema. Embora, tenha continuado trabalhando no roteiro de três filmes (Paraíso, Purgatório, Inferno) baseados na Divina Comédia de Dante Alighieri, Kieslowski faleceu em 1996 antes de realizar essa nova trilogia. Tive a oportunidade de ver alguns dos filmes que compõem o Decálogo no Paço da Liberdade em Curitiba. Assisti às partes de número sete, oito e nove, cujos títulos são Não furtarás, Não levantarás falso testemunho e Não cobiçarás a mulher do próximo. Mais do que simplesmente reproduzir os mandamentos a que cada parte se refere, os filmes que compõem o decálogo criam situações de dilema moral que evidenciam as dificuldades que nós humanos enfrentamos quando temos que lidar com nossas escolhas cotidianas que nos apresentam interesses conflitantes muitas vezes. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Apesar de ter sido profundamente afetado pelos três filmes, foram os dois últimos que mais me fizeram refletir sobre a vida, sobre a administração, em especial sobre seu ensino. Em Não cobiçarás a mulher do próximo, temos a estória de um cirurgião que descobre que sua mulher está tendo um relacionamento amoroso com outro homem. Em uma cena, Roman, o cirurgião consegue posse da chave do apartamento onde Hanka, sua esposa, e Marius, o amante, se encontravam. Roman decide fazer uma cópia da chave e a cena da máquina de reproduzir chaves foi inspiradora para mim.

A chave representa apenas uma ferramenta, vai permitir a Roman ter certeza do que desconfiava. Mas, como ferramenta, não vai além disso. A chave em nada pode ajudar Roman sobre como agir após a confirmação de suas suspeitas. De igual forma, para mim as ferramentas administrativas são limitadas. Elas ajudam o administrador a enxergar uma situação organizacional melhor, mas pouco podem fazer em relação ao agir administrativo. A prática da Administração é muito mais do que usar ferramentas de planejamento, diagnóstico e prospecção. A Administração depende da interpretação que o profissional faz daquilo que está vendo. Não é possível agir sempre da mesma maneira, pois no agir administrativo temos a interação com os outros, seus interesses, sua influência, sua propensão a colaborar ou sua inclinação à resistência. Ou seja, as ferramentas são como a chave de Roman, apenas abrem as portas, nada dizem sobre o que fazer depois da porta aberta. Se reconhecermos essa limitação das ferramentas administrativas, temos que reconhecer as implicações disso para o ensino da Administração. Ora, não é suficiente ensinarmos o uso de ferramentas para o futuro profissional de Administração. Precisamos buscar formas de prepará-lo para um agir competente que extrapola o uso das ferramentas e que conduz a organização para o fim desejado. Ou seja, para que serve a Administração? Em outro texto, já comentei que a Administração precisa ser repensada na Fernando Antonio Prado Gimenez


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direção de seu entendimento como uma prática social que busca o bem viver da humanidade.

É nesse momento, que me vem à mente uma cena do Não levantarás falso testemunho. Nesse episódio do Decálogo somos apresentados a uma professora de Ética que recebe a visita de sua tradutora nos Estados Unidos. O que a professora não sabe é que sua vida está ligada à da tradutora de uma forma muito mais complexa do que a relação acadêmica. Em determinado momento do filme, a tradutora pergunta à professora sobre como ela ensina. A professora diz que procura auxiliar seus alunos de forma que eles possam chegar a suas próprias conclusões. A tradutora insiste: Para chegar onde? E a professora complementa de forma emocionante: para chegar ao bem. Às vezes o mal predomina, mas precisamos chegar ao bem. Como disse no começo, é impossível assistir a Kieslowski sem ser afetado pelo que vemos! Uma obra que merece ser apreciada!

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HELENA IGNEZ, CINEMA DE ARTE E PANIFICADORA EM CUIABÁ: ATÉ ONDE PODE NOS LEVAR A NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO?

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aí em estado de graça da sessão de abertura da Mostra Rogério Sganzerla que aconteceu no SESC Paço da Liberdade em Curitiba. Foram dez filmes desse grande cineasta brasileiro em exibição ao longo de nove dias. O primeiro da mostra foi Luz nas trevas - a volta do bandido da luz vermelha, idealização de Helena Ignez, viúva de Sganzerla, atriz e cineasta que já realizou Canção de Baal, A miss e o dinossauro: bastidores da Belair e Reinvenção da rua. A cineasta adaptou roteiro original de Sganzela e, junto com Ícaro C. Martins, dirigiu uma comédia de espírito altamente crítico com a participação de Ney Matogrosso, André Guerreiro Lopes, Djin Sganzerla, Sandra Corveloni, Bruna Lombardi, Paulo Goulart, Sérgio Mamberti, Arrigo Barnabé, Simone Spoladore, Mario Bortolotto, José Mojica Marins e outros mais. Um elenco impressionante que foi muito bem dirigido em um filme de trilha sonora inigualável, imagens inovadoras e visualmente impares. Após a sessão houve um debate com Helena Ignez que começou falando sobre a realização do filme. Lembrando-se, de forma emocionante, do período de oito meses entre a descoberta da doença de Sganzerla e sua morte, Helena Ignez contou sobre a tarefa de trabalhar 600 páginas de roteiro para a realização desse filme durante esses meses. Um trabalho de amor e dor segundo suas palavras. Que tinha que ser feito para honrar a obra de Sganzerla e continuar a sua trajetória de vanguarda, assim como a da própria Helena. Mas, foi na sua fala que Helena Ignez disse algo que também chamou minha atenção. Ela disse que o filme é uma comédia, cinema de arte, e que a indústria não vai conseguir acabar com o cinema de arte. Voltando para casa, comecei a pensar nessa frase e como ela está associada à ideia que David McClelland nos apresentou no começo dos anos 60 do século passado: a necessidade de realização. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Para McClelland, a necessidade de realização é um dos motores da motivação humana que ajuda a entender a tendência empreendedora que as pessoas possuem. Dadas as condições adequadas, quanto maior a necessidade de realização de uma pessoa, maiores as chances dela se envolver na criação de um novo empreendimento. McClelland, psicólogo, deu uma contribuição importante para o campo de conhecimento sobre empreendedorismo, ao notar a insuficiência das explicações de origem na economia sobre o comportamento empreendedor. Aliás, poucos notaram que Schumpeter, um dos chamados pais do estudo do empreendedorismo, ao escrever sobre a função empreendedora na economia, na introdução de seu livro, de forma bem humorada, reconhece que estava falando de um aspecto limitado da vida humana, pois estava se restringindo aos fatos econômicos. Esse grande pensador reconhecia, já no inicio dos anos 30, a limitação das explicações econômicas, pois a vida tem muitas outras facetas e, segundo Schumpeter, talvez muito mais interessantes. Enfim, as palavras de Helena Ignez ao contar sobre os esforços de fazer uma produção de baixo orçamento, buscando apoio em quatro editais e conseguindo recursos do Canal Brasil para finalizar sua comédia, contam também uma história empreendedora. Segundo ela, houve também um efeito positivo do período de governo Lula, quando os recursos para apoio ao cinema eram muito maiores que agora. Pois é, foi o conjunto todo das palavras da cineasta que me levaram a essa reflexão: necessidade de realização, paixão, criatividade, recursos disponíveis, disposição para agir, um ambiente favorável, uma equipe competente e público! Tudo isso junto levando à criação desse grande filme. Além de tudo, para mim houve um momento especial. Assisti ao filme na primeira fila. Quando este estava terminando, Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Helena Ignez entrou e sentou-se ao meu lado. Na hora de dirigir-se ao centro da sala para iniciar a conversa, ela me deu um imã com a reprodução do cartaz do filme. Presente que ficará guardado junto a outras relíquias, de valor afetivo, que surgiram em minha história.

Ah! Estava esquecendo... Você quer saber por que no título desse post há uma "panificadora em Cuiabá"? Vai ter que assistir ao filme! Cena deliciosa do filme! Tão inesquecível quanto Ney Matogrosso cantando Sangue Latino em arranjo exclusivo para o filme. A indústria cinematográfica não vai acabar com o cinema de arte! Concordo com Helena Ignez.

Fernando Antonio Prado Gimenez


ESCOLHA DE SOFIA E COMPETITIVAS DE PORTER

MODELO

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FORÇAS

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erta vez fui procurado por uma ex-aluna em Curitiba que estava enfrentando uma situação empresarial peculiar e não estava muito segura de como agir. Ela era uma aluna que sempre participava ativamente das aulas e, quando teve que enfrentar esta situação, lembrou-se de um evento que contei em sala sobre a época em que trabalhei com meus pais. Era uma situação que envolvia certo conflito com um fornecedor e que contei aos alunos no dia em que estava falando das cinco forças competitivas do modelo de análise da indústria de Michael Porter. Depois de formada, Sofia, esse é seu nome, abriu uma butique feminina localizada em um bairro de alto poder aquisitivo em Curitiba em sociedade com sua irmã mais velha. As duas irmãs aproveitaram o apoio financeiro oferecido pelo pai, comerciante bem sucedido em outro ramo de negócio, que contava com a participação do filho mais velho na gestão. Como algumas vezes acontece, as duas haviam percebido que não teriam espaço em uma provável sucessão no negócio do pai quando esse se ausentasse. Aliás, Sofia decidira fazer administração porque desejava iniciar um negócio próprio. Sua irmã já havia trabalhado em uma butique quando brigara com o pai e decidira ir atrás de seu próprio destino. Assim, as duas acabaram unindo forças - o conhecimento adquirido por Sofia na graduação e a experiência de três anos da irmã - e abriram as portas da empresa voltada para um público feminino de poder aquisitivo mais elevado, classe média-alta. Depois de anos trabalhando, ficaram conhecidas no mercado, a empresa tinha se estabilizado, as duas irmãs conseguiam ter um bom padrão de vida e sentiam-se realizadas. Além disso, tinham conseguido devolver os recursos iniciais que o pai emprestara para elas na abertura da empresa. A butique era uma loja multimarcas e, graças ao Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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bom trabalho das duas, havia até alguma marcas que eram exclusivas delas na região em que atuavam.

Foi então que, certo dia, Sofia foi procurada por José Carlos que lhe fez uma proposta. José Carlos gostaria de comprar 50 peças da marca NEWLOOK, um dos fornecedores da loja de Sofia. José Carlos tentara fazer a compra diretamente com o fabricante, mas esse não aceitou o pedido. Ocorre que José Carlos, além de varejista, é também fabricante de roupas femininas e é conhecido por adotar uma prática não muito legítima no mercado: comprar roupas de outros fabricantes e colocar sua marca antes de revendê-las. Os clientes da fábrica de José Carlos são, na sua maioria, as chamadas “sacoleiras” que compram de diversos fornecedores em shoppings atacadistas para vender no varejo. Sofia é revendedora também das roupas fabricadas pela empresa de José Carlos. E, além disso, a NEWLOOK era uma de suas marcas exclusivas naquela região. Pois é, não por acaso, lembrei-me do filme Escolha de Sofia, em que Meryl Streep faz o papel de uma polonesa que viveu em um campo de concentração. Sob a direção de Alan J. Pakula, esse filme de 1982 rendeu a Meryl Streep um dos diversos Oscars de sua carreira. Atuando com Kevin Kline e Peter Macnicol, a personagem de Meryl tem segredos que guardam uma escolha difícil que teve que fazer no passado. Prisioneira, em certo momento, teve que escolher entre filha e filho, qual deveria ser enviado para execução no campo de concentração. Kevin Kline faz o papel de namorado de Sofia, Nathan, e Peter Macnicol é Stingo, o novo vizinho que se torna amigo do casal e acaba se apaixonando por Sofia. Um filme que deve ser revisitado! É claro que a escolha de Sofia, a empreendedora, não tem o mesmo nível de dificuldade que a da personagem vivida por Meryl. Mas, Sofia queria minha ajuda: o que fazer? A princípio a situação vivida por Sofia e sua irmã apresentava um dilema moral: trair a confiança de um fornecedor que havia dado exclusividade a elas na região, vendendo uma Fernando Antonio Prado Gimenez


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quantidade de atacado para um empresário de comportamento não muito confiável. Será que José Carlos retiraria as etiquetas da NEWLOOK e colocaria as de sua própria marca?

Para dilemas morais, as ferramentas de administração não oferecem muita ajuda. Talvez, Sofia poderia se inspirar nas teorias que tratam da Responsabilidade Social Corporativa, ou nas que abordam a visão de Stakeholders e decidir de forma a se sentir socialmente responsável ou levando em consideração os interesses de todos os stakeholders. Mais fácil falar do que fazer! Na essência é uma escolha entre o que julgamos certo ou errado no mundo dos negócios. Mas, se o dilema moral é posto de lado, será que é possível analisar essa situação sob um ponto de vista de qual seria a solução mais vantajosa para a empresa de Sofia? Ou seja, quais as consequências de um sim ou de um não ao pedido de José Carlos? Foi nesse ponto da conversa que falei para Sofia: _ Sofia, lembra-se das nossas aulas de estratégia? Lembra-se do modelo das forças competitivas de Porter? Sofia respondeu: _ Sim, Fernando. Lembro-me que nessa aula você contou da tentativa que fez de enfrentar a PepsiCo quando estava trabalhando com seus pais. Eles mudaram as condições de negociação, não foi? Não queriam mais vender a prazo, só a vista. Você disse que à vista não comprava, buscou produtos substitutos, mas os clientes só queriam daquela marca! Seus concorrentes tinham e seus clientes começaram a reclamar. Você teve que rever sua decisão trinta dias depois para atender aos clientes. Foi bacana, pois a gente percebeu a ideia de poder de negociação de fornecedores, ameaça de produtos Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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substitutos, intensidade de concorrência e poder de negociação de clientes.

_ Pois é Sofia. Naqueles dias eu ainda não tinha chegado às aulas de estratégia na minha graduação. Talvez, você possa analisar a situação que está enfrentando pensando nessas forças: qual o poder da NEWLOOK em relação a vocês? O que eles fariam se descobrissem que você vendeu uma grande quantidade para o José Carlos? De igual forma, qual o poder do José Carlos em relação a vocês, já que ele também é seu fornecedor? Se você fizer essa venda poderá deixar alguns clientes na mão, isso é conveniente? Qual o risco de irem atrás de outras butiques? Pense nessas coisas. Depois de algum tempo reencontrei Sofia. Curioso, perguntei o que ela e a irmã tinham feito. Sofia me respondeu: _ Primeiro a gente se desfez do dilema moral! Essa era uma decisão de negócios que tinha impactos a curto e médio prazo. Podíamos fazer um grande venda e gerar caixa para nossa empresa, que estava necessitando. Por outro lado, havia um risco muito grande, pois a NEWLOOK representava 60% de nosso faturamento. A reação deles poderia nos colocar em dificuldades no médio prazo. Poderiam, por exemplo, tirar nossa exclusividade na região. Ou deixar de vender para nossa empresa. Por outro lado, o fornecimento de José Carlos para nossa empresa era também significativo: 25% do faturamento. _ E então? Eu perguntei. Ansioso para saber o que tinha acontecido. Sofia concluiu: _ Nós atendemos ao pedido de José Carlos. Além de resolver nossa questão financeira de curto prazo, nós descobrimos que a NEWLOOK estava Fernando Antonio Prado Gimenez


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planejando abrir lojas próprias e uma das primeiras seria em nossa região. A gente perderia o fornecimento deles em seis meses. Assim, fizemos a venda, pedimos peças extras para atender aos demais clientes e continuamos indo bem.

Gosto dessa história da Sofia, pois além de verdadeira, é um exemplo prático de dilemas que enfrentamos na gestão de pequenas empresas no dia-a-dia. Não temos uma receita única, mas quando aprendemos a pensar estrategicamente, podemos decidir de forma mais consistente, acertar, errar, voltar atrás quando necessário. Além disso, essa história realça a importância de estarmos sempre atentos aos movimentos de nosso mercado. Afinal de contas, essas forças competitivas não são estáticas, ao contrário, são muito dinâmicas. P.S.: Se é você professor(a), use essa história como uma atividade em sala. Já fiz isso muitas vezes, dá uma boa dinâmica em grupo. Divida a turma em duas partes e apresente o parágrafo que conta a proposta feita por José Carlos a Sofia. Um grupo deve buscar argumentos a favor e outro grupo contra. Veja o que acontece!

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ENSAIO ELOQUENTE SOBRE O VAZIO E O NADA NO EMPREENDEDORISMO

Inspirado em Yves Klein e sua exposição de salas vazias, Paris, 1950. Fernando Antonio Prado Gimenez


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MINTZBERG, FORMAS ORGANIZACIONAIS E O PODEROSO CHEFÃO

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á algum tempo, ganhei de presente de Amanda, minha enteada, o livro O poderoso chefão de Mário Puzo, que foi a origem dos filmes dirigidos por Francis Ford Coppola na trilogia O poderoso chefão. Vi os filmes várias vezes. O livro não conhecia e fiquei impressionado pela fidelidade entre livro e filmes. Isso não é surpreendente, pois Mario Puzo foi coautor do roteiro dos filmes junto com Coppola. No entanto, foi muito agradável ler o romance, pois durante a leitura, visualizava as cenas que vi nos filmes. Foi um ótimo presente da Amanda! Há no livro um capítulo em que Puzo descreve a origem e evolução dos negócios de Don Corleone. Para mim foi muito prazeroso ver a descrição feita sobre como Vito Andolini, seu verdadeiro nome, tornou-se Don Corleone, chefe de uma poderosa organização com diversos interesses de negócios. Essa descrição me fez lembrar a estória narrada por Mintzberg sobre a Senhora Raku em seu livro Structure in fives - designing effective organizations, publicado em 1983. Esse livro é uma versão resumida de estudo realizado por Mintzberg, de três anos de duração, sobre a literatura que tratava de estruturação das organizações. Esta pesquisa se materializou em um livro seminal para os estudiosos das configurações organizacionais - The structure of organizations - publicado em 1979 pela Prentice-Hall. Mas, como estava dizendo, Mintzberg relata na parte introdutória de ambos os livros, como a Senhora Raku que fazia cerâmica no porão de sua casa teve que lidar com as necessidades de organizar suas atividades para atender um volume cada vez maior de pedidos para seus potes que se tornaram famosos e bem aceitos no mercado. Isso significou, em um primeiro momento, a contratação de uma assistente para ajudar na preparação do material que seria finalizado pela Sra. Raku, que era a artesã dos produtos demandados Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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pelas lojas. Assim, suas atividades informais de ceramista deram lugar a uma pequena empresa. Com o passar do tempo, a empresa foi contratando cada vez mais gente, a produção começou a ter que ser feita também por outros artesãos e criaram-se linhas de montagem. A Sra. Raku teve seu papel dentro da empresa cada vez mais transformado. Sua atividade de artesã diminuía e ela tinha que dedicar uma parte cada vez maior de seu tempo às atividades de coordenação e organização do trabalho das pessoas que passavam a colaborar com a empresa. Certo dia, a Sra Raku decidiu diversificar seus produtos e começou a produzir pisos cerâmicos, tijolos e peças sanitárias, criando três divisões - produtos de consumo, produtos para construção e produtos industriais. Assim, o trabalho da Sra Raku passou a ser o de coordenar as atividades dessas divisões por meio de relatórios de desempenho trimestrais com ações corretivas quando os resultados, em termos de lucratividade e crescimento, estavam aquém do previsto no orçamento anual. Sua pequena empresa de cerâmica tinha-se tornado uma organização grande e complexa. Mintzberg, em seus livros, chama nossa atenção para o fato de que a criação de uma estrutura organizacional envolve dois requisitos fundamentais: a divisão do trabalho em tarefas distintas e a coordenação dessas tarefas. Ao contrário do que propunha a maior parte da literatura da época, Mintzberg defendeu que não era possível que houvesse uma resposta única que representasse a melhor estrutura possível para qualquer empresa. E assim, surge a proposta de configurações organizacionais de Mintzberg, que nos permite entender que diferentes formas de divisão do trabalho demandam diferentes mecanismos de coordenação e levam à configuração de diferentes formas organizacionais. Quem quiser saber mais sobre essas ideias, pode buscar também a versão em português do Structure in fives, cuja segunda edição foi publicada pela Editora Atlas em 2003, sob Fernando Antonio Prado Gimenez


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o título Criando organizações eficazes: estruturas em cinco configurações.

Quanto à trajetória de Don Corleone, esta foi retratada no filme O poderoso chefão - parte II. Mas, no capítulo 14 do romance de Mário Puzo, em 33 páginas, pode-se ver como na ficção também as tarefas da organização de Don Corleone começaram a ser divididas ao longo do tempo e os mecanismos de coordenação foram se sofisticando com o crescimento e o sucesso da Família Corleone. Será que Mintzberg leu O poderoso chefão quando estava estudando a literatura de estrutura organizacional?

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PANDORA, MEDIANERAS EMPREENDEDORISMO

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ESPERANÇA

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á muitos anos tinha a intenção de me debruçar sobre as histórias da mitologia. Deuses, ninfas, centauros e humanos povoam a literatura e o cinema. De vez em quando encontro uma referência a Zeus/Júpiter, relatos dos trabalhos de Hércules/Asterix na animação, a paixão de Orfeu e Eurídice retratada no Orfeu Negro, a tragédia de Medéia narrada por Shakespeare, filmada por Pasolini e transformada em peça teatral por Chico Buarque e Paulo Pontes na inesquecível Gota d´água, a caixa de Pandora nos Caçadores da arca perdida. Mas, sempre sentia uma incompletude e uma vontade de saber mais. Outro dia, encontrei uma edição de bolso, em dois volumes, das Melhores histórias da mitologia (A.S. Franchini; C. Seganfredo, L&PM Pocket, 2012). Será que foi Minerva, a deusa da Sabedoria, que colocou os livros em meu caminho? Não resisti e, mais uma vez, quebrei a promessa de não comprar livros enquanto não concluísse a leitura de vários que estão em minha mesa do escritório, no criado mudo ao lado da cama, e até dentro da mala que me acompanha nas viagens curtas a Brasília. Em algumas horas, devorei o primeiro volume. 55 histórias que começam com o Nascimento e glória de Saturno, cuja morte é relatada no Nascimento e glória de Júpiter, seguida pela Guerra dos Titãs. Foi delicioso tomar conhecimento de detalhes que não sabia e relembrar coisas que me haviam contado no passado: o nascimento de Vênus, a desventura de Ícaro, o rapto de Europa. De como a ninfa Quelone se transformou em uma tartaruga por não ter ido ao casamento de Júpiter e Juno, que, aliás, eram irmãos. As aventuras de Jasão e seu encontro com Medéia e os doze trabalhos de Hércules. De como Minerva transformou Aracne, uma artesã do fio inigualável, em uma aranha que fez a mais bela teia, tudo isso para desespero ainda maior da deusa que não aceitava ser superada por uma humana. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Enfim, são muitas as histórias, mas a da Caixa de Pandora me impressionou demais. Tinha comigo a compreensão de que a Caixa de Pandora tinha trazido ao reino dos humanos todas as desgraças e vilanias. E ponto! Mas, a história não é assim tão simples. De forma resumida, eis o que se conta, Júpiter andava às turras com Prometeu que havia modelado o primeiro homem de barro, além de ter dado aos humanos o acesso ao fogo. Assim, certo dia Júpiter pediu que Vulcano, junto com Minerva, sua mulher, criassem uma companhia para o homem. Os dois criaram Pandora, uma linda mulher, que era quase tão bela quanto a mais bela das deusas. Júpiter ficou muito satisfeito com a criação de Minerva e Vulcano. Em seguida a despachou para o reino dos mortais com um presente em sinal de seu apreço pelos humanos: uma caixa ricamente enfeitada com ouro e prata. Mas era um engodo. Júpiter avisou que Pandora não deveria abrir a caixa nunca. Pandora e a caixa chegaram até Epimeteu, que era o irmão humano de Prometeu e este ficou impressionado com ambas. Levou Pandora e a caixa para seu quarto. Pandora adormeceu e sonhou que abrira a caixa e dela saíram somente coisas belas. Quando acordou não resistiu, abriu a caixa e aí... Todo mundo sabe o resto da história! Foi um Deus nos acuda! Ou Deuses nos acudam! Da caixa escaparam a Doença, a Gula, a Inveja, a Avareza, a Arrogância, a Crueldade, o Egoísmo, e otras cositas mas! Mas nem tudo estava perdido, em certo momento Pandora conseguiu fechar novamente a caixa e pensou que nada havia sobrado dentro dela. Olhando mais uma vez viu um rosto muito belo e jovem, que Pandora descobriu ser a Esperança.

Nesses mesmos dias, minha amiga Simone recomendou muito que eu visse a um filme – Medianeras - filme argentino de 2011 dirigido por Gustavo Taretto. O filme retrata dois jovens, Mariana e Martin, que não se conhecem pessoalmente, cada um com sua vida solitária, até o encontro entre eles. Dividido em três estações - um outono curto, um inverno longo, e a primavera enfim - o filme trata de forma Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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bem humorada e delicada, as buscas típicas de jovens em nossa sociedade contemporânea, mas com ênfase na busca pelo outro, metaforicamente representada pela busca de Wally, em Onde está Wally?. Filme bem produzido, com ótimas atuações dos personagens, que me emocionou. Para mim, o filme trata da esperança. Apesar de todos os contratempos, enfim chega o momento em que Mariana e Martin se encontram.

Fiquei intrigado com a coincidência! Pandora e Medianeras tratando da esperança! O mais incrível para mim, é que havia decidido escrever esse texto quando li a história da Caixa de Pandora. No entanto, os dias foram passando e não consegui fazê-lo. Será que alguns deuses conspiraram para que eu visse o filme antes de escrever o texto? Creio que deve ter sido um trabalho conjunto de Mercúrio e Juno! Pensando sobre o empreendedorismo, o que eu queria escrever logo após ler a Caixa de Pandora diz respeito à esperança que está embutida nessa ação humana. Quando a empreendedora ou empreendedor se motiva para criar algo novo, qualquer que seja o empreendimento, há sempre a esperança de um mundo melhor. Seja esse mundo tão pequeno quanto aquilo que está ao redor de quem empreende, seja esse mundo tão grande quanto a nossa capacidade de sonhar. Mas, empreender é sempre um ato de esperança. Que esses atos sejam sustentáveis em termos econômicos, sociais e ambientais. Só assim, podemos vencer a força divina de Júpiter e nos aproximar de um convívio humano fraterno e solidário!

Fernando Antonio Prado Gimenez


O ESTRANHO CASO DA AUTONOMIA ALUGADA

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ma justificativa que se ouve com frequência de pessoas que buscam abrir sua própria empresa é o desejo de autonomia. Para muitos, ser dono do próprio negócio significa dispor de seu tempo como melhor lhe convir, sem ter que dar satisfações a ninguém, muito menos a um patrão. No entanto, assim que o envolvimento com uma nova empresa se torna realidade, o(a) empreendedor(a) descobre que a autonomia de que dispõe é muito pequena. Há tantos compromissos a atender, seja em relação a fornecedores ou a clientes, que a sensação de liberdade que era buscada demonstra-se ilusória. Mas, há outros encantos que o empreendedorismo tem para atrair as pessoas, tais como, o senso de realização e a possibilidade de relacionamentos com pessoas. Mas, para aqueles que conseguem conquistar um pouco de liberdade ou autonomia, esta se torna muito valiosa. Ela representa a possibilidade de influir verdadeiramente sobre o destino pessoal, como é o caso que relato a seguir. Estive no Rio de Janeiro participando do encontro anual da ANPAD (Associação Nacional de Programas de Pós-graduação em Administração). No último dia do encontro, peguei um táxi para ir da Barra até o Aeroporto do Galeão. Viagem longa que se tornou muito prazerosa pela simpatia e bom papo do Robinho do taxi, motorista que estava passando ao acaso em frente ao hotel em que me hospedara e respondeu ao aceno do porteiro do hotel para me pegar. Logo no começo da viagem, Robinho começou a reclamar da vida: _ A coisa não está fácil! Disse ele, e começou a falar de um acidente que tivera no ano passado e de como tivera que se desfazer do carro em função Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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do financiamento que não conseguia honrar todo mês. Imediatamente pensei com os meus botões:

_ Ih! Lá vem conversa mole de carioca para me arrancar uma gorjeta ao final da corrida. Mas, continuei ouvindo a história do Robinho. A certa altura ele me falou: _ Tive que alugar minha autonomia para continuar na praça. A princípio não entendi bem o que isso queria dizer. Mas, não quis perguntar o que era esse negócio de alugar a autonomia. Robinho continuou dizendo que pegava o carro de um empresário de taxis todo dia às seis da manhã e devolvia às 18 horas. Doze horas de trabalho! Ao final do dia ele tinha que entregar R$ 100,00 para o empresário e o restante da féria do dia era seu. Para mim, pareceu algo muito parecido com o que vários motoristas de taxi já me contaram em outras cidades. O mais recente foi o caso do Raimundo, no mês passado em Salvador, que tinha que pagar uma diária de R$ 150,00 ao proprietário do carro que dirigia. Mas, a história de Robinho era diferente. _ No final do mês - disse ele - o empresário me paga R$ 1.000,00. É o aluguel da autonomia. Dessa vez resolvi perguntar: _ O que é autonomia? Foi então que Robinho me explicou que autonomia é a licença que ele possui para ser taxista na cidade do Rio de Janeiro. Quando ele passou pela situação ruim causada pelo acidente, quase vendeu a autonomia. Um sujeito lhe ofereceu R$ 150.000,00 por ela. Mas, se tivesse vendido, Robinho acabaria gastando esse dinheiro e acabaria tendo que buscar outro emprego. Para ele, a autonomia significava a independência, não podia se desfazer dela. Foi então que Fernando Antonio Prado Gimenez


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associei a autonomia com a condição de trabalho autônomo como taxista.

Assim, Robinho me contou, ficou sabendo da possibilidade de alugar a autonomia. Fez um contrato com o empresário que lhe paga R$ 1.000,00 por mês pela autonomia por um prazo de 24 meses. O carro foi colocado no nome de Robinho que é quem tem o direito de ser taxista. A remuneração pelo carro que o empresário recebe é a diária de R$ 100,00 por dia, durante os 24 meses. Mais de R$ 60.000,00 se forem seis dias de trabalho por semana. Ao final desse prazo, o contrato se encerra, Robinho devolve o carro e volta a ter sua autonomia. E Robinho me disse: _ Todo mês guardo o aluguel da autonomia. Vou poder voltar a ter meu carro. E eu completei: _ E sua autonomia. Essa história representa de forma bem singela o valor de um recurso raro e difícil de imitar. A autonomia garante as condições de realizar um trabalho decente, de acordo com as normas, sem precisar se sujeitar a possíveis multas da fiscalização. Representa, também, uma lição de persistência. Para o empreendedor, assegurar recursos essenciais para seu negócio e persistir na busca de sua realização são coisas muito importantes para o sucesso. Robinho viu que para não se tornar empregado, precisaria alugar seu bem mais valioso naquele momento. E dar um jeito de poupar essa renda para voltar a ter liberdade no futuro. Robinho me falou de outras coisas durante a viagem: sua mãe e a reforma de sua casinha, sua esposa, sua filha, sua enteada e de como ela amarrou um gringo com seus encantos físicos. A conversa foi tão boa que, além de dar a ele o último exemplar de meu livro, dei também uma boa gorjeta. Foi uma das melhores viagens que fiz até o aeroporto do Galeão! Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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FRUSTRAÇÃO, RUPTURA E MEDO: DIMENSÕES DE ANÁLISE POUCO EXPLORADAS NO EMPREENDEDORISMO

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C. Wyatt é uma mulher de negócios bem sucedida. Executiva de uma grande empresa de consultoria, especializada em fusões e aquisições de empresas, é respeitada por todos e até mesmo temida por alguns. Em suma, protótipo da executiva contemporânea que disputa em pé de igualdade o espaço com seus adversários do sexo oposto. Tem um namorado, com quem divide o apartamento bem localizado em Nova Iorque. Certa noite, recebe uma ligação dizendo sobre uma herança que chegará no dia seguinte ao aeroporto. Algo que sobrou da morte de uma prima distante na Inglaterra. Quando chega ao aeroporto, descobre que a herança é uma menina, ainda bebê e órfã, cujo único parente vivo era J. C. Wyatt. Inicialmente, Wyatt tenta se desfazer da "herança". Procura uma agência de adoções, que logo arruma um casal que adotará a linda menina. Ao fim da entrevista com o casal, a executiva parece feliz com o resultado e sai caminhando decidida, a passos firmes, mas no meio do caminho, uma ponta de dúvida... Interrompe a caminhada, retorna e cancela a adoção. Uma ruptura na sua vida surge. A princípio ela acha que conseguirá conciliar a vida profissional com os cuidados da criança, mas as coisas não serão tão fáceis! Em certo momento, descobre-se preterida na condução de um grande negócio na empresa onde trabalha. Seus constantes atrasos, em função dos cuidados com a criança, deixaram-na menos confiável para o chefe. Com orgulho ferido, ela decide pedir demissão e resolve mudar-se para o interior de Vermont. Compra uma propriedade que vira apenas em uma revista. Ao chegar lá descobre que a mesma estava quase em ruínas, mas tinha uma bela e produtiva plantação de macieiras. É provável que, a esta altura, muitos já tenham descoberto que estou relatando a história do filme Baby boom, de 1987, com Diane Keaton no papel de J. C. Wyatt, dirigida por Fernando Antonio Prado Gimenez


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Charles Shyer, cujo título em português é Presente de grego. Já utilizei essa deliciosa comédia romântica, dividida em duas partes, para comentar sobre aspectos do empreendedorismo. Na segunda metade do filme, Wyatt descobre o potencial que tem para construir uma nova empresa com a produção de maçãs de sua propriedade. Entra para o ramo de comidas para bebês. Os momentos iniciais dessa parte do filme, em um roteiro bem montado, nos mostram aspectos relevantes do empreender: a busca de informações sobre o mercado; a experimentação do produto; o desenvolvimento e teste de uma marca; a capacidade de resposta rápida a informações e tendências de consumo; e a estruturação inicial da empresa. J. C. Wyatt consegue criar uma empresa bem sucedida em um negócio dominado por grandes players. Esse sucesso atrai a atenção de uma empresa maior que contrata a antiga empresa de consultoria onde Wyatt trabalhara para negociar uma aquisição. É o momento da volta por cima! Wyatt recebe uma proposta aparentemente irrecusável! Mas, será mesmo? Em um brilhante trabalho de montagem, a personagem vivida por Keaton parece decidida a aceitar, pede licença, se ausenta da reunião, vai ao toalete, lava o rosto e diz: _ Eu voltei! Em seguida, sai caminhando decidida, a passos firmes, mas no meio do caminho, uma ponta de dúvida... Interrompe a caminhada, retorna e... Veja o filme e descubra o final. A única coisa que posso adiantar é que Diane Keaton repete a cena da caminhada, muito semelhante à primeira quando retorna à agência de adoções, de forma magistral, coisa de grandes atrizes bem dirigidas. Hoje, no entanto, refletindo sobre o filme, vejo que o mesmo me permite explorar outros aspectos do empreender, além daqueles mais racionais que enxergava antes. Essa percepção me ocorreu quando via um documentário brasileiro sobre um poeta, cantor e compositor pernambucano de nome Siba. O Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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documentário dirigido por Caio Jobim e Pablo Francischelli Siba nos balés da tormenta - relata a trajetória desse artista em constante transformação. Ao tomar contato com a história de Siba, fui despertado para o papel que a frustração e a ruptura desempenham na trilha desse artista. Pareceu-me que, constantemente, Siba busca romper com o que faz, movido talvez por uma frustração ou insatisfação pessoal. Mas, como ele mesmo diz, esses momentos são acompanhados pelo medo de errar. Defendo a ideia de que empreender é um ato criativo. Assim, de forma metafórica, à semelhança da trajetória de Siba, penso que o empreender também pode surgir de momentos de frustração que levam a algum tipo de rompimento com a vida presente, na tentativa de construir um futuro diferente. Sem dúvida, é o que aconteceu com J. C. Wyatt em Baby boom. Mas, acompanhando essa ruptura, lá estava o medo marcando presença na segunda parte da trajetória da personagem. Na literatura recente sobre empreendedorismo é comum encontrarmos uma distinção sobre a motivação para empreender: por oportunidade ou por necessidade. Empreendimentos surgem porque alguém percebeu uma oportunidade não explorada no mercado. Mas, também, pessoas empreendem porque precisam sobreviver nessa sociedade capitalista que não lhes oferece um emprego decente. São categorias aparentemente muito abrangentes e bem distintas, mas nem sempre suficientes. Por exemplo, alguém pode empreender porque tem uma necessidade muito grande de transformar a sua vida. A necessidade não tem um caráter unicamente financeiro! Ou, o que parece ser uma necessidade financeira para alguns, para outros não é. O que leva alguém a empreender por necessidade ou por oportunidade pode ter uma explicação antecedente: será que a frustração e a vontade de romper com a situação vivida podem nos ajudar a entender melhor a motivação para Fernando Antonio Prado Gimenez


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empreender? Eis aí uma questão interessante de pesquisa e, até onde sei, pouco explorada! Junto com a frustração e a ruptura, pode ser que o medo seja uma emoção a ser analisada pelos pesquisadores, já que pelos empreendedores, com certeza, ela é sempre sentida.

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EMPREENDEDORISMO E A SERVIDÃO MODERNA

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cabo de assistir ao documentário Da servidão moderna, que pode ser acessado no Youtube. A obra de Jean François Brient e Victor León Fuentes, concluído na Colômbia em 2009, com base em texto escrito na Jamaica em 2007, apresenta uma crítica devastadora ao modo de vida dominante em nosso planeta que denominam "sistema totalitário mercante". Tão devastadora que me deixou atordoado e quase que descrente na possibilidade de saída dessa jaula! Qualquer leitor atento que vasculhe a literatura sobre empreendedorismo, vai encontrar nela traços marcantes de uma ideologia que parece reproduzir as ideias que são o dogma do "sistema totalitário mercante". Será que não há espaço para a crítica social na literatura sobre empreendedorismo? Eu acredito que sim. Volta e meia encontram-se pessoas tentando discutir a possibilidade da ação empreendedora sob uma lógica não mercantil. Empreendedorismo social, empreendedorismo comunitário, empreendedorismo local e empreendedorismo responsável são expressões que podem indicar ao leitor outras formas de entendimento da ação empreendedora. Mas, é evidente que o discurso dominante nessa literatura reproduz a forma dominante de pensar em nossa sociedade contemporânea. Ao final do documentário, os autores afirmam que a autogestão nas empresas e a democracia direta na escala comunal constituem as bases desta nova organização que deve ser anti-hierárquica tanto na forma quanto no conteúdo. É uma antítese que se apresenta à tese dominante. É ainda fraca no seu poder de convencimento das pessoas, mas não é nova. A autogestão já é discutida há décadas no campo da Administração. Qual será síntese que surgirá desse embate? Não tenho uma resposta a esta questão, mas como já pude explorar em outro texto, o desenvolvimento sustentável e um Fernando Antonio Prado Gimenez


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repensar da prática da administração, no sentido de uma responsabilidade social efetivamente presente nas empresas, podem ser ideias que estão sendo semeadas para que um novo paradigma germine nesse conflito.

Charles Handy, autor que já mencionei anteriormente em outro texto, apresentou a noção de que uma organização pode ter uma cultura existencial, onde predominam valores semelhantes aos propostos pelos cineastas. Aliás, essa é, na opinião dele, a forma ideal de organização como pode ser visto em seu livro do final da década de 70, Os deuses da administração. E aí, também será possível falar de empreendedorismo com ternura!

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O ENCONTRO DA CORAGEM COM A PRUDÊNCIA: UM TEXTO MULTIMÍDIA SOBRE ENCONTROS, EMPREENDEDORISMO E GESTÃO

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ncontros podem ser inspiradores. Nos últimos dias passei por alguns momentos da vida que podem ser reduzidos a encontros que fizeram a mente divagar. Assistindo ao delicioso e belíssimo filme de Christophe Honore, As bem amadas, com Chiara Mastroianni e Catherine Deneuve, uma cena de encontro entre pai e filha me despertou a imaginação. Catherine e Chiara interpretam mãe e filha (Madeleine e Véra), em uma história que dura quase 50 anos. Milos Forman é o pai na fase adulta e Rasha Bukvic na infância e adolescência de Véra. Em uma conversa entre Milos Forman e Chiara, o pai diz algo assim para a filha (não me lembro da frase exata): _ Você tem coragem e prudência. Duas virtudes centrais para o ser humano. A coragem é ser capaz de tentar fazer algo, mesmo sabendo que poderá não dar certo. Empreender e gerenciar uma empresa ou organização são ações que precisam equilibrar as duas virtudes. Como está na wikipedia (me rendi a ela!), a prudência pode ser encarada como o exercício do julgamento sadio em questões práticas (http://pt.wikipedia.org/wiki/Prud%C3%AAncia). Sem usar essas palavras, já falei sobre a tensão entre a mudança e a permanência na gestão de pequenas empresas. A coragem de inovar (mudar) precisa ser balizada pela prudência, assim como é também a prudência que inspira a coragem da permanência do modo como se faz as coisas em qualquer organização. Além de sair do cinema com uma sensação de bem-estar pela fruição de uma sessão cinematográfica inspiradora sobre a vida em geral, fiquei com essa ideia na cabeça: será que já se abordou a questão da coragem no empreendedorismo? Fernando Antonio Prado Gimenez


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Chegando à minha sala, ao final da tarde, antes de ir para as aulas de Fundamentos da Gestão das Organizações, fiz uma rápida busca no Google. Encontrei um post no Blog do Hashimoto, meu companheiro de ANEGEPE (www.anegepe.org). Texto muito bem escrito, inspirador mesmo, um encontro entre pai e filha que me fez lembrar quando ensinei Paloma e Fernanda a andarem de bicicleta nos tempos que morávamos no campus da Universidade de Lancaster na Inglaterra. Um emocionante encontro com o passado inspirado pelo Marcos Hashimoto (http://www.marcoshashimoto.com/apps/blog/show/13774 662-seguran-a-ou-risco).

Mas, tive outros encontros recentes nos últimos dias. Voltei a ser aluno após 35 anos vivendo o papel de professor. Decidi fazer um curso de especialização em cinema e tive meu primeiro reencontro com uma tarefa para casa. A professora Denize nos pediu que fizéssemos um breve comentário por escrito sobre um dos filmes que foram exibidos na edição curitibana do Kinoforum – Festival Internacional de CurtasMetragens de São Paulo realizada esse ano. Entre os curtas que assisti durante os três dias que durou o festival, decidi escrever sobre o Morning Stroll (Caminhada matinal), animação concebida e dirigida por Grant Orchard e produzida pelo Studio AKA em 2011, também acessível no Youtube. Com sete minutos de duração, o curta retrata 100 anos de permanência e mudança, por meio de três encontros entre um pedestre e uma galinha em Nova Iorque nos anos de 1959, 2009 e 2059. Com estilos de desenho distintos em cada momento, e com uma trilha sonora muito bem escolhida, o curta me fez pensar sobre essa tensão constante entre mudança e permanência. Embora, com um caráter de distopia, o curta permite que se reflita sobre as transformações que alteraram profundamente nossa sociedade ao longo dos últimos 50 anos, nem sempre para Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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melhor, apontando para uma perspectiva sombria no futuro. Mas, toda essa reflexão é acompanhada de uma forma de humor leve que completa o trio de qualidades do curta: traços e desenhos muito bem feitos, excelente música e mensagem inspiradora. O terceiro encontro está em um filme que ainda não vi. Paulo Camargo, na Gazeta do Povo, informa sobre o último filme de Abbas Kiarostami, homenageado na 36a. edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo (http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/conteudo.phtml ?tl=1&id=1313493&tit=Kiarostami-conta-a-historia-de-umamor-no-Japao). Já estou ansioso, aguardando a chegada desse filme em alguma sala de cinema de Curitiba. Segundo Camargo: A trama gira em torno de uma trombada amorosa inesperada: uma jovem prostituta (Rin Takanashi) conhece um tradutor idoso (Denden), que acabam enxergando, um no outro, um alento, a possibilidade de conseguirem aplacar a solidão na qual estão imersos... pessoas à deriva, se aproximam e encontram um no outro motivos para serem felizes. Ela quer estabilidade, um porto seguro, e ele, a negação da finitude. A negação da finitude! Essa frase me marcou. Parece-me que a gestão é uma tentativa constante de negação da finitude. A organização surge do esforço empreendedor, fertilizada pelo desejo da longevidade, mas muitas vezes assim como nós, a organização morre. O empreendedor/gestor constantemente tenta adiar esse encontro com a finitude que levará sua criação para o inevitável encontro com Hades, no subterrâneo empreendedor. Para tanto, nessa negação da finitude, se vale da coragem e da prudência, enfrentamento do inevitável e porto seguro, ousadia da mudança e crença na permanência. Encontro dessa mesma natureza, no mundo da vida real, presenciei anos atrás quando fazia minha caminhada diária Fernando Antonio Prado Gimenez


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pelo Passeio Público em Curitiba. Caminhadas vespertinas, ao som de ruídos diversos emitidos por carros, pessoas e pássaros. Certo dia, caminhando mais lentamente, próximo ao final da caminhada, ouvi uma frase de uma prostitua para um senhor idoso, beirando os setenta anos: _ Mas por dez reais, você quer mais o que?

Uma negociação se aproximava de seu final! Nesse encontro, talvez houvesse ainda a tentativa de negação da finitude por parte do idoso, mas a prostituta com certeza não estava em busca de um porto seguro. Para mim, ela estava, na verdade, tentando preservar um mínimo de dignidade (paradoxal, não?) ao valorizar seu serviço e indicando que, por dez reais, muito não seria feito! Enfim, talvez o que sobre disso tudo, é persistir. A tensão entre mudança e permanência faz parte da vida humana e a nós cabe apenas lidar com ela. Se possível sendo capaz de, assim como Edith Piaf, não se arrepender de nada, como registrado inesquecivelmente por Cássia Eller! (http://letras.mus.br/cassia-eller/44923/).

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CONVERSAS COM EMPRESÁRIAS: LIÇÕES DE VIDA NO MUNDO DOS NEGÓCIOS

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Omo já contei em outro texto, estive envolvido em um projeto de pesquisa que estudou as trajetórias de mulheres empresárias no Paraná. Nosso objetivo foi tentar descobrir diferentes aspectos sobre a vida empresarial relatada pelo olhar feminino. Para isso, meus colegas e eu entrevistamos dirigentes de empresas localizadas em cinco cidades do Paraná: Curitiba, Londrina, Maringá, Cascavel e Ponta Grossa. Como parte desse esforço, estive em Cascavel para cumprir uma agenda de seis entrevistas. Uma das empresárias não pode me atender, mas as outras cinco puderam dispor de um pouco de seu tempo e atenção para um pesquisador que queria, mais do que entrevistá-las, ter a oportunidade de conversar sobre o que significa ser empresária, com pessoas que além desse papel, normalmente exercem outros tão ou mais importantes: mãe, esposa, filha, companheira, tia, etc. Em outro momento, já havia feito uma entrevista em Curitiba. Fazia tempo que eu não me envolvia em um esforço de coleta de dados para pesquisa no campo. Percebi como isto estava me fazendo falta! A experiência de ouvir os relatos de cada uma me fez lembrar as entrevistas que fiz para minha dissertação de mestrado, para a tese de doutorado, e algumas outras. Mas, com certeza já tinham passado quase dez anos desde a última entrevista que fiz. Uma década! Cada história, cada trajetória dessas mulheres é diferente. Uma se envolveu com a empresa porque não aguentava ficar em casa sem fazer nada, enquanto o marido ia para o trabalho. Outra se casou com um filho de empresária e, pelo estímulo de sua sogra muito empreendedora, abandonou a carreira de professora e foi para a loja da família. A terceira voltou para casa após terminar o curso superior, recebeu um convite da mãe para se juntar a ela na empresa e acabou tornando-se sua sucessora. Teve aquela que junto com a mãe resolveu abrir uma empresa na área onde tinha trabalhado Fernando Antonio Prado Gimenez


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desde pequena com o pai. A separação dos pais dividiu a família e levou ao surgimento de mais uma empresa. Dor levando á realização! Teve o caso daquela que estudou letras, fez uma pós em cinema e resolveu abrir uma empresa nesse ramo. Seus pais foram professores. A última, cansada de ver o ex-patrão fazendo coisas inadequadas para o ramo de negócio em que atuava, resolveu abrir sua própria empresa, tendo o ex-chefe como um anti-modelo. Não quer ser como ele! E, vai muito bem, obrigada! Em oito anos, já tem dezesseis colaboradores atuando com ela e acaba de abrir uma filial em outra cidade. As conversas abordaram muitos aspectos da vida empresarial: existência de modelos, coisas que gosta de fazer e que não gosta de fazer, como tomam decisões muito importantes, por exemplo, sobre investimentos, relacionamento com os colaboradores, o significado de ser empresária, facilidades e dificuldades no exercício desse papel, possíveis conflitos com os outros papéis sociais, expectativas sobre si mesmas e sobre as empresas, momentos mais críticos e momentos de maior satisfação. Na diversidade de histórias e acontecimentos surge uma dificuldade para o pesquisador: o que há de comum nessas histórias de vida? Será que cada caso é um caso, e a riqueza do conhecimento está nos aspectos únicos de cada experiência? Ou, é possível encontrar regularidades, coisas que se repetem, não exatamente iguais, mas de forma semelhante, em todas as histórias? Desafio! O que percebi de comum nessas histórias? Não muito, mas descobertas altamente valiosas e que, talvez, sirvam de inspiração para outras. Paixão pelo que fazem, persistência e, até mesmo, obstinação, com o desejo de perenidade da empresa, necessidade de constante busca de conhecimento sobre seu negócio e uma necessidade de realização associada com a capacidade e competência no agir. Tudo isso temperado por um estilo de gestão marcado pela Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


atenção à opinião de colaboradores e construção relacionamentos de confiança com elas e eles.

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Marcou-me o que Fátima disse sobre quando perguntei a respeito de momentos de maior satisfação e ela me disse: _ Um momento inesquecível foi quando um senhor, nosso cliente, me disse certa vez: Lembro de seu inicio, com um salão pequenininho em outra cidade. Fico feliz em ver como sua trajetória foi bem sucedida. Fátima sentiu-se orgulhosa. Com razão! Mais do que o dinheiro, é a necessidade de realização que move aquela que se envolve com negócios. Lição inesquecível para mim! Mais de uma vez, as conversas com essas mulheres, me lembraram do meu convívio com meus pais na pequena empresa que criaram e mantiveram juntos por quase 40 anos. Em especial, os relatos dessas mulheres gentis me lembraram da trajetória de minha mãe. Professora e contadora, ao casarse com meu pai, que já tinha um pequeno bar na esquina da Paranaguá com a Goiás em Londrina, começou a se envolver com o negócio do marido. Uma doença afastou-a das salas de aulas, mas não impediu que continuasse trabalhando com o marido. Tornou-se empresária e, assim como essas mulheres que entrevistei, exerceu esse papel com paixão, persistência e serenidade. Ainda hoje se sente muito contente quando reencontra antigos clientes que passam alguns momentos relembrando as atividades do supermercado que dirigiu com meu pai.

Fernando Antonio Prado Gimenez


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SUSTENTABILIDADE E A MONTANHA MÁGICA DE THOMAS MANN

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oi há poucos anos que ouvi falar a respeito do romance A montanha mágica de Thomas Mann. Por que será que nos meus anos de formação esse livro não chegou às minhas mãos? Por que minhas professoras e meus professores não me contaram sobre esse livro? Ou será que eu não prestei atenção? De Thomas Mann só conhecia A morte em Veneza, pequeno romance transformado em filme inesquecível por Luchino Visconti em 1971. Presenças marcantes de Dick Bogarde como um compositor que vai a Veneza descansar e de Silvana Mangano que representa a mãe de Tadzio, adolescente que passa férias com a mãe e as irmãs naquela cidade italiana. O filme trata da paixão platônica do compositor pelo jovem e aborda a questão do ideal da beleza representado pelo jovem Tadzio e, de forma discreta, trata também do homossexualismo. Mas, A montanha mágica, enfim, um dia chegou às minhas mãos. Terminei a leitura, feita em doses homeopáticas quase que diárias, pois a edição em português que li chega às 957 páginas! Esforço prazeroso, pois a história de Hans Katorp, jovem que vai visitar o primo Joachin internado em hospital para tuberculosos nos Alpes suíços, é emocionante. Chegando lá, tem sua estadia prolongada em função do diagnóstico de que é portador da mesma doença do primo. O livro narra os setes anos em que Hans viveu nesse espaço e aborda, de forma sublime e magistral, a relação subjetiva que temos com o tempo e as inúmeras facetas dessa maravilhosa jornada que é a vida humana: amor, política, ciúme, prazer, dor, sexo, morte, guerra, religião, filosofia, artes, música, medo, humor, doença, saúde, desdém, repulsa, vingança, ou seja, quase tudo que se puder pensar que faça parte do ser humano. Até mesmo a sustentabilidade que parece uma discussão tão recente! Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Pois é, em uma passagem do romance, Mann fala do projeto de um escultor austríaco que, em conversa com Hans Kastorp, se mostrara tão fanaticamente envolvido com a ideia, mas não evidenciava propensão concreta a realizá-la. Será que Mann, por meio desse personagem, já estava nos alertando sobre a dificuldade inerente à realização da busca da sustentabilidade em nossa sociedade? Vejam o projeto que aparece às páginas 845 e 846 do romance: Um antigo escultor, natural de uma província da Áustria, homem de certa idade, com um bigode branco, nariz adunco e olhos azuis, concebera um projeto político-financeiro que caligrafara, sublinhando os trechos decisivos com pinceladas de tinta nanquim. Esse projeto tinha o seguinte objetivo: cada assinante de jornal deveria ser obrigado a entregar no primeiro dia de cada mês uma quantidade de papel de jornal velho que correspondesse a 40 gramas por dia. Isso importaria anualmente a cerca de 1.400 gramas, e em vinte anos em nada menos de 288 quilos, os quais, à base de um preço de 20 pfennigs por quilo, representaria um valor de 57,60 marcos. Cinco milhões de assinantes - assim prosseguia o memorando - entregariam, portanto, em vinte anos a soma formidável de 288 milhões de marcos, dois terços da qual poderiam ser deduzidos das assinaturas, ao passo que o resto, aproximadamente cem milhões de marcos, seria aproveitado para fins humanitários, como por exemplo, o financiamento de sanatórios populares para tísicos, subvenções para talentos, pobres etc. Mais à frente, Mann continua a descrição do projeto: O gesto insensato e a destruição de papel de jornal, que a gente mal-avisada ainda desperdiçava em cloacas ou fogões, constituía alta traição às nossas Fernando Antonio Prado Gimenez


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florestas e um golpe contra a economia nacional. Poupar papel, guardar papel, significaria conservar e economizar celulose, árvores, máquinas, que a fabricação de pasta mecânica e de papel desgastava, como também seriam menos exigidos o capital e o material humano. Acrescia a isso o fato de o papel de jornal velho adquirir facilmente o quadruplo valor pela transformação em papel de embrulho ou em papelão, de maneira que seria capaz de se converter num fator econômico de vasta importância e em fundamento de rendosos impostos estaduais ou municipais, ao passo que os leitores de jornais veriam suas contribuições aliviadas. Impressionante! Em 1924, em seu romance, Mann já defendia o que hoje denominamos tripé da sustentabilidade: a preocupação econômica, ambiental e social. Está tudo aí!

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ROTUNDA DE VITOR MEIRELES: O PRIMEIRO CROWDFUNDING DA INDÚSTRIA CRIATIVA NO BRASIL

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á poucos anos, a literatura de empreendedorismo vem abordando um fenômeno aparentemente recente: o crowdfunding. Em poucas palavras, um empreendedor que tem uma ideia de negócio ou projeto social, mas não conta com recursos financeiros suficientes para iniciá-lo, busca o apoio de pequenos investidores que darão uma contribuição financeira em troca de alguma recompensa futura. O crowdfunding está sendo chamado de financiamento coletivo ou colaborativo no Brasil. Este tipo de financiamento parece ser ideal para projetos que demandam um investimento financeiro de menor porte. A atividade tornou-se mais popular pelas facilidades de comunicação que o advento da internet propiciou. Um exemplo interessante de espaço para busca de financiamento colaborativo é o site Impulso (http://www.impulso.org.br/pt/explore) criado pelos idealizadores da Aliança Empreendedora (http://www.aliancaempreendedora.org.br). A indústria criativa é outro tema que tem atraído a atenção dos pesquisadores e estudiosos do empreendedorismo. Essa temática já é explorada há pelo menos duas décadas, mas recentemente tem atraído um nível mais intenso de atenção da academia. Uma das razões para isso é que as áreas de negócios relacionadas à indústria criativa - atividades onde o conhecimento e a criatividade são ingredientes fundamentais de empreendimentos bem sucedidos - são responsáveis por parcelas cada vez maiores da economia de muitos países. Na indústria criativa, penso que um aspecto essencial que se une aos dois anteriores é a colaboração entre inúmeros parceiros. A aplicação da criatividade e do conhecimento em produtos ou serviços úteis à sociedade envolve o trabalho de muitas pessoas criativas. É o caso, por exemplo, da indústria de software, da área de Design, e dos projetos nas atividades artísticas e culturais: teatro, cinema, literatura, museus, Fernando Antonio Prado Gimenez


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entre outros. Muitas iniciativas recentes na área de atividades artísticas e culturais têm buscado financiamento por meio do crowdfunding.

Tenho refletido sobre a junção desses dois fenômenos e estou iniciando uma investigação, ainda de forma preliminar, sobre como se configuram projetos e empresas culturais. Minha ideia é explorar as dimensões de recursos, estrutura e estratégia que se alinham em configurações bem sucedidas de empreendimentos culturais. Meu primeiro olhar será sobre as atividades teatrais e de cinema em Curitiba. Essa reflexão inicial tem sido apoiada por leituras aleatórias de textos que encontro sobre o assunto. Nesses dias comecei a leitura de um livro de Vicente de Paula Araújo - A bela época do cinema brasileiro - cuja segunda edição foi publicada pela Editora Perspectiva em 1985, mas publicado originalmente em 1973. Nesse livro, o autor apresenta resultados de uma pesquisa histórica situando a origem do cinema no Brasil. Para contar a chegada do cinema no Brasil, Araújo faz uma descrição muito interessante dos tipos de divertimento que a população do Rio de Janeiro tinha acesso no século XIX. O cinema surge como um novo divertimento para o povo. Só mais tarde é que irá adquirir um status de arte. Surgido em 1895, com a criação do cinematógrafo pelos irmãos Lumière, aparelho que tinha melhores capacidades técnicas que seus antecessores, o cinema chegou muito rápido ao Brasil. Vieira nos conta que já em 1896 aconteceram projeções de pequenos filmes usando aparelhos semelhantes ao cinematógrafo. A pesquisa de Vieira aponta o dia 08 de julho de 1896 como a data da primeira exibição de "vistas animadas" no Rio de Janeiro. Essas exibições eram feitas em espaços temporários. A primeira sala de exibição fixa no Rio de Janeiro foi fundada em 15 de julho de 1897 e chamava-se Salão de Novidades de propriedade de Germano Alves e Pascoal Segreto. Já em outubro do mesmo ano, Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Germano vendeu sua parte a Pascoal e foi para Petrópolis criar uma nova sala fixa chamada Salão Bragança, inaugurada em 11 de outubro de 1897. (p. 93-97).

A primeira filmagem feita no Brasil foi obra de Afonso Segreto, irmão de Pascoal, que fora enviado por este à França para comprar equipamentos de filmagem, dando inicio às filmagens em 19 de junho de 1898. Chegando de navio, ao desembarcar, Afonso Segreto usou os equipamentos para filmar as fortalezas e navios de guerra (p. 108). Mas, antes do cinema, havia vários divertimentos. Vieira aponta as touradas, jogo da bola, cavalhadas, brigas de galo, circo de cavalinhos, concertos musicais, procissões, bailes de máscara, corridas de cavalo, representações teatrais... Enforcamentos também eram uma espécie de divertimento da população! (p. 26). Um divertimento muito diferente eram os panoramas. Segundo Araújo, o panorama é um enorme quadro esférico em que o espectador, colocado no centro, como se estivesse no alto de um morro, vê todo o horizonte (p. 31). Vitor Meireles teve seu primeiro panorama, segundo Araújo, exposto na Exposição Universal de Paris em 1989, retratando um panorama da cidade do Rio de Janeiro (p. 32). Mas, a vida de Vitor Meireles não foi fácil, conforme nos conta Araújo. Com a implantação do regime republicano e a reforma do ensino artístico, Vitor Meireles foi exonerado de seu cargo de professor e passou a fazer exibições públicas de seu panorama para sobreviver. Ocupou um pavilhão no Largo do Paço cedido pela municipalidade em 1891. Nesse espaço fez um segundo panorama retratando a Entrada da Esquadra Legal, inaugurado em 1894. Mas, em 1898, Vitor Meireles teve que desocupar o espaço da prefeitura (p. 32-34). Foi nesse momento de sua vida que Vitor Meireles resolveu empreender e construir uma rotunda panorâmica, que pretendia inaugurar em maio de 1900, para expor o quadro Fernando Antonio Prado Gimenez


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que estava pintando sobre o descobrimento do Brasil com 115 metros de circunferência. (p. 34).

Graças à investigação de Vicente de Paula Araújo para seu livro é que tomo conhecimento da, talvez, primeira iniciativa de crowdfunding da indústria criativa no Brasil. Pois, como relata Araújo, Vitor Meireles não dispunha dos meios para construir sua rotunda panorâmica e divulgou amplamente um plano para isso, exposto à página 35 do livro: O artista nacional Vitor Meireles de Lima, professor aposentado da antiga Academia das Belas Artes do Rio de Janeiro, no empenho de concorrer para a comemoração do 4o. Centenário do Descobrimento do Brasil, em 1900, propôs-se a construir uma rotunda com dimensão igual à construída em 1890 na Praça Quinze de Novembro, representando panoramicamente a memorável data histórica. Essa rotunda, levantada nos terrenos da chácara do antigo Seminário de São José, com entrada para a rua de Santa Luiza no. 60, acha-se quase concluída. Estava o artista persuadido de poder levar a cabo o seu tentame, por esforço exclusivo seu e nesse empenho não hesitou em empregar todas as suas economias. Acontece, porém, que, para a conclusão da rotunda, instalação da tela no interior, acessórios de pintura, da plataforma e do terreno natural, é forçoso ainda o dispêndio ou o emprego da soma de 30 contos. Para evitar o fracasso da tentativa e o aniquilamento de tudo quanto já se acha feito, apela o mesmo artista para o auxílio dos seus compatriotas, amigos e propugnadores da comemoração do 4o. Centenário do Descobrimento do Brasil, solicitando a subscrição, por empréstimo da aludida soma de Rs. 30:000$000, para conclusão do referido panorama, devendo ser as Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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quotas da referida subscrição ou empréstimo remidas em trimestres a partir do dia inicial da exposição, com inclusão de juros à razão de 10% ao ano, contados da data do recebimento das mesmas quotas. Os amigos do artista e subscritores do empréstimo-auxílio receberão um título creditório das quotas com que se dignarem concorrer, título remível com seus juros pelo modo acima indicado.

Para melhor conhecimento da praticabilidade desta idéia, cumpre-me cientificar que o primeiro panorama produziu no primeiro ano, Rs. 91:849$000, e o segundo panorama, logo no primeiro trimestre, Rs. 46:000$000. Obsequiosamente serão recebidas as inscrições nos escritórios do Jornal do Comércio, Jornal do Brasil, O País, Gazeta de Notícias, Imprensa, Cidade do Rio, Tribuna e Notícia. Rio de Janeiro, 23 de junho de 1899. (a) Vitor Meireles de Lima. Maravilhoso! Nesse primeiro projeto a apelar pelo crowdfunding pode-se ver a preocupação em expor claramente a ideia, o apelo à responsabilidade social e cultural (comemoração do 4o. Centenário do Descobrimento), a demonstração da competência do empreendedor (professor aposentado) e experiência anterior (dois panoramas), a recompensa aos investidores e a viabilidade do projeto. Não é belíssimo?

Fernando Antonio Prado Gimenez


ADMINISTRAÇÃO NA TROPICÁLIA

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ssisti ao documentário Futuro do Pretérito: tropicalismo now, dirigido por Ninho Moraes e Francisco Cesar Filho. Lançado em 2011, com músicas de André Abujamra, o filme é uma mistura de entrevistas, shows e encenações com uma participação inesquecível de Gero Camilo. Muito bem construído o documentário informa sobre esse movimento da cultura brasileira que teve início nos anos 60 do século passado. Por coincidência, anteriormente, havia lido Verdade tropical, em que Caetano Veloso narra sua trajetória e envolvimento como um dos criadores desse movimento. André Luís Rosa e Silva faz uma interessante apresentação deste movimento: O Tropicalismo foi um movimento artístico do final da década de 1960 que buscou reinventar as artes brasileiras, sobretudo a música, e romper com as tendências nacionalistas defendidas por setores de esquerda que queriam afastar a arte brasileira da influência norte-americana. Quem defendia o Tropicalismo achava impossível conciliar a evolução musical e cultural do país, e consequentemente, o progresso e o projeto de independência nacional, sem levar em conta a inserção nos acontecimentos do período, como a revolução sexual e a Guerra Fria. O movimento se apoiou em teses modernistas como o Antropofagismo, que acreditava ser possível absorver e reaproveitar de maneira benéfica os conteúdos dos produtos culturais estrangeiros. (Fonte: http://bravonline.abril.com.br/materia/otropicalismo). Essa ideia do Antropofagismo não poderia deixar de ser mencionada no documentário. Quando isso aconteceu, me veio à mente, algo que tenho observado ao longo de mais de uma década fazendo um exercício sobre liderança em sala de aula com alunos dos mais diferentes níveis de ensino: Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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iniciantes de graduação em administração, alunos de último ano, participantes em cursos de especialização, em geral profissionais já experientes, alunos de mestrado e doutorado.

Patricia Pitcher, uma pesquisadora canadense, publicou em 1997 um livro no qual relata estudos que fez sobre a liderança de empresas bem sucedidas no Canadá. O livro, com prefácio de Mintzberg, aliás, foi a leitura dele que me levou à compra, demonstra como o sucesso na condução de empresas pode ser influenciado por diferentes estilos de liderança. O livro faz uma retomada interessante da discussão sobre liderança na administração e, com seus estudos, Patricia Pitcher conseguiu evidenciar três perfis distintos de liderança a que denominou: Artista, Artesão e Tecnocrata. Esses perfis foram identificados a partir de entrevistas com pessoas que atuavam sob a liderança de homens e mulheres em empresas bem sucedidas. O interessante no estudo da autora é que esta partiu de uma identificação dos atributos que as pessoas enxergavam nos dirigentes que estavam à frente das empresas bem sucedidas. Ela não perguntou aos executivos como se viam, mas sim fez essa indagação àqueles que trabalhavam com esses executivos. De forma resumida cada estilo é descrito por um conjunto de dez qualidades: Artista (imprevisível, imaginativo, engraçado, audacioso, intuitivo, excitante, emocional, visionário, empreendedor e inspirado); Artesão (equilibrado, atencioso, honesto, sensato, responsável, confiável, realista, calmo, razoável e previsível); e, Tecnocrata (cerebral, difícil, não faz concessões, sem jogo de cintura, intenso, detalhista, determinado, meticuloso, durão e preocupado só com o que acha relevante). Com base em seus resultados, Patrícia conseguiu evidenciar que, entre os três estilos, o Artista era melhor sucedido e conclui com uma defesa da abertura de espaço para pessoas com esse tipo de perfil na gestão das organizações. A partir dessa leitura, elaborei uma atividade que é desenvolvida em sala com alunos quando desejo falar a Fernando Antonio Prado Gimenez


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respeito da possível influência do estilo do estrategista sobre o sucesso das empresas. Denominei esse exercício de "O Administrador Ideal". Basicamente, o exercício é uma lista de adjetivos, extraídos da lista de qualidades que surgiram na pesquisa de Pitcher, e os alunos são estimulados, primeiro individualmente e depois em grupo, a escolherem um conjunto de dez adjetivos que melhor descreva alguém (real ou imaginário) que eles considerem como administrador ideal.

Os resultados dessa atividade, invariavelmente, têm sido muito semelhantes entre os diversos tipos de cursos nos quais pude aplicar o exercício, em várias cidades brasileiras esparramadas entre o sul e o centro-oeste do Brasil. Quando os grupos terminam suas atividades, cada um escreve a lista que escolheu em um quadro de giz e surge uma semelhança entre os perfis muito grande que é sempre uma mistura de qualidades dos três estilos nomeados por Patrícia Pitcher. Em geral, os atributos do administrador ideal entre alunos e profissionais da administração que encontro são: empreendedor, audacioso, visionário, inspirador, equilibrado, responsável, realista, atencioso, determinado e intenso. Ou seja, uma mistura de artista com artesão com uma pitada de tecnocrata! Pois é, para mim essa é mais uma manifestação de nosso antropofagismo cultural. Por décadas expostos a modelos estrangeiros de administração, vamos deglutindo essas ideias e regurgitando algo que nos parece mais adequado à nossa realidade. É o tropicalismo na administração! Se você quer conhecer um pouco mais sobre o estudo de Pitcher, a referência completa do livro é: The Drama of Leadership. Chichester: John Wiley & Sons, 1997. Um resumo de seus resultados aparece como texto no livro de Mintzberg e Quinn, O processo da estratégia. 3a. edição. Porto Alegre: Bookman, 2001.

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CARNE DE CAVALO, OS MISERÁVEIS RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA

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ssistir ao musical Os miseráveis, dirigido por Tom Hooper, com a participação de Hugh Jackman, Russell Crowe e Anne Hathaway, foi uma experiência emocionante. É claro que o romance de Victor Hugo, do qual o musical da Broadway é uma adaptação que, em seguida, foi transformada no filme, narra uma estória que toca mesmo o mais insensível dos corações. Mas, ver essa história contada no formato de musical, acentua sua dramaticidade e acaba forçando uma reflexão sobre os caminhos humanos nesse planeta que habitamos. Mas, para mim, Helena Bonham Carter e Sacha Baron Cohen, que interpretam a Madame e Monsieur Thénardier estão tão bem ou melhor que Hugh Jackman e Anne Hathaway indicados para Oscar de melhor ator e melhor atriz coadjuvante. O filme também concorre ao Oscar desse ano. O casal vivido por Helena e Sacha, donos de uma estalagem, são apresentados em uma cena hilariante e muito dinâmica, na estalagem que conduzem, fazendo uma séries de trapaças e artimanhas com seus fregueses. Há um momento na cena, em que aparece uma máquina moedora de carnes, com os dois personagens preparando uma mistura que leva de tudo: carne de boi, fígado de cavalo, intestino de porco, rabo de gato, etc. Impossível não se lembrar do mais recente escândalo da carne de cavalo encontrada nas lasanhas congeladas comercializadas na Inglaterra como se fossem feitas com carne bovina. Coincidência: o filme também é uma produção inglesa. Esta cena do filme me trouxe à lembrança a noção da responsabilidade social corporativa. Esse tema é uma das formas com que a literatura em Administração tem abordado a questão da sustentabilidade. Há cerca de três décadas, a academia e a sociedade têm buscado soluções para os problemas de poluição ambiental, desigualdades sociais e desenvolvimento. A busca tem sido de um chamado Fernando Antonio Prado Gimenez


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desenvolvimento sustentável, que se baseia em um tripé: desenvolvimento econômico viável, com preservação do mundo em que vivemos de forma a não prejudicar as gerações futuras e com solidariedade social, visando a diminuição das desigualdades. No que diz respeito às empresas, isso se manifesta em decisões que seguem os princípios da responsabilidade social corporativa, atendendo interesses de todos os stakeholders: proprietários, empregados, clientes, fornecedores, comunidade do entorno. Ou seja, todos que possam ser afetados, positiva ou negativamente, por ações da administração de uma empresa. Ora, o recente caso da carne de cavalo nas lasanhas congeladas é mais um exemplo de como a responsabilidade social corporativa é difícil de acontecer na prática. Nesse caso, o consumidor tem todo o direito de saber que está comprando gato por lebre, quer dizer, cavalo por boi! Mais ainda, é preciso ter certeza de que a carne não veio de cavalos tratados com substâncias que possam causar dano à saúde humana. Na época retratada por Victor Hugo, essa discussão ainda não estava presente, o casal Thénardier podia produzir sua carne moída peculiar sem muita preocupação, mas hoje em dia esse comportamento é inaceitável. Mas, o romance de Victor Hugo mostrou uma situação de desigualdade social extrema, que ainda, em muitas partes de nosso mundo, está presente. Enfim, continuo sendo cético em relação à possibilidade de uma prática de responsabilidade social corporativa nas empresas de nossa sociedade. Para mim, há um conflito primordial entre a noção de sustentabilidade, que orienta a responsabilidade social corporativa, e nosso modo de vida. Sustentabilidade é incompatível com a propriedade privada! Não é possível otimizar decisões que combinem aspectos econômicos, ambientais e sociais. Em nosso sistema de vida, a viabilidade econômica será sempre o Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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fator dominante, e, assim sendo, se não for viável economicamente, a ação será abandonada, ou terá suas preocupações sociais e ambientais diminuídas.

Fernando Antonio Prado Gimenez


UMA DIRETRIZ PARA A IMPLANTAÇÃO RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA

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á abordei a questão da Responsabilidade Social Corporativa (RSC) em outros textos deste livro, inclusive no anterior. Retomo a ela, inspirado pela leitura do primeiro volume d´A correspondência de Fradique Mendes memórias e notas, de Eça de Queiroz, publicado pela primeira vez em 1900, ano da morte de seu autor, escritor português que nasceu em 1845. Fiz as primeiras leituras de Eça de Queiroz recentemente. O primeiro livro que li de sua autoria for Alves & Cia. A leitura foi muito boa e resolvi ir atrás de outros livro de Eça. Nesse sítio podem-se encontrar informações sobre o autor e sua obra: http://www.brasilescola.com/literatura/ecaqueiros.htm. A leitura d´A correspondência de Fradique Mendes também foi prazerosa. Em uma passagem, o narrador relata uma carta de Fradique que, para mim, poderia servir como diretriz estratégica orientadora de qualquer organização cujos dirigentes desejem adotar a Responsabilidade Social Corporativa como orientação de comportamento empresarial. Vejam como é: Todos nós que vivemos neste globo formamos uma imensa caravana que marcha confusamente para o Nada. Cerca-nos uma Natureza inconsciente, impassível, mortal como nós, que não nos entende, nem sequer nos vê, e donde não podemos esperar nem socorro nem consolação. Só nos resta para nos dirigir, na rajada que nos leva, esse secular preceito, suma divina de toda a experiência humana: Ajudai-vos uns aos outros! Que na tumultuosa caminhada, portanto, onde passos sem conta se misturam, cada um ceda metade do seu pão àquele que tem fome; estenda metade do seu manto àquele que tem frio; acuda com o braço Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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aquele que vai tropeçar; poupe o corpo daquele que já tombou; e, se algum mais bem-provido e seguro para o caminho necessitar apenas simpatia de almas, que as almas se abram para ele transbordando dessa simpatia... Só assim conseguiremos dar alguma beleza e alguma dignidade a esta escura debandada para a Morte. (p.89)

Grande figura esse Fradique Mendes! Um humanista incorrigível pelo jeito! Criação de um cidadão crítico da sociedade do século XIX. O que será que Fradique diria do mundo atual? QUEIROZ, Eça A correspondência de Fradique Mendes, v. 1: memórias e notas. Porto Alegre: L&PM, 1997.

Fernando Antonio Prado Gimenez


ESPONJA INTELIGENTE: FORÇAS ORGANIZAÇÕES EFICAZES

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utro dia, enquanto ouvia uma pessoa falar sobre as possibilidades de interação que existem hoje na web, em particular sobre a possibilidade de espalhamento de novos processos organizacionais por meio das redes sociais de forma mais restrita, ou na web de forma mais ampla, minha imaginação foi disparada. Comecei a pensar em uma imagem das organizações como esponjas que absorvem aquilo que está ao seu redor, na tentativa de sobrevivência e crescimento. Pensei: será esta uma boa metáfora para o entendimento de como as organizações podem se configurar em formas estáveis em nosso mundo organizacional? Imediatamente, o palestrante perdeu minha atenção, e eu me pus a divagar sobre quais seriam as forças condutoras que levariam a configurações organizacionais estáveis. Obviamente, essa divagação passou a ser inspirada, também, no famoso modelo de configurações estruturais de Mintzberg, que já comentei em outro texto. Após minha divagação, devidamente anotada em meu celular que assumiu as funções de antigos blocos de papéis para anotações, fui buscar informações sobre as esponjas. Interessante! Embora simples, elas também se configuram em diversas formas: As esponjas (Filo Porifera) são animais bentônicos sésseis (fixos no substrato). Possuem uma fisiologia bastante simples na sua construção. Utilizam células flageladas chamadas coanócitos para promover a circulação da água através de um sistema de canais exclusivo do filo, o sistema aquífero, ao redor do qual seu corpo é construído. Esta corrente de água traz partículas orgânicas que são filtradas e digeridas. São geralmente Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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sustentadas por um esqueleto mineral formado por espículas, que são estruturas de sílica ou carbonato de cálcio cujo tamanho pode variar de poucos micrometros a centímetros. Existem, no entanto, diversas variações. Em algumas este esqueleto pode ser constituído por calcário maciço, naquelas que são chamadas esponjas coralinas. Em outros, conhecidas como esponjas córneas, por fibras de espongina, uma proteína do tipo do colágeno. A definição simples que é geralmente mais aceita para este grupo é: "Animais filtradores e sedentários, que se utilizam de uma única camada de células flageladas para bombear água através de seu corpo" (Bergquist, 1980).

Apesar de sua morfologia simples e do seu baixo grau de organização, as esponjas apresentam uma enorme diversidade de formas e cores nas mais diferentes tonalidades. Estão sem sombra de dúvida entre os mais belos e admirados invertebrados marinhos, apesar de raramente serem reconhecidas por olhos não-treinados. De modo geral, esponjas têm uma ou mais aberturas exalantes circulares (ósculos), e muitas espécies têm sistemas de canais subsuperficiais semelhantes a veias. Muitas espécies são compressíveis, e a superfície é frequentemente híspida (com extremidades das espículas atravessando parcialmente a superfície) ou conulosa (com pequenas elevações cônicas) (http://acd.ufrj.br/labpor/1Esponjas/Esponjas.htm#Caracteristicas). Embora sedentárias, as esponjas são uma metáfora organizacional interessante por sua característica de sistema aberto, em constante interação com seu ambiente, do qual extrai insumos e expele resíduos. Afinal, é isso que as organizações fazem! Fernando Antonio Prado Gimenez


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Então, quais seriam as forças que se manifestam nas organizações que passo a chamar de esponjas inteligentes? Inteligentes, por que, ao contrário das esponjas naturais, são capazes de, por meio de suas partes humanas, fazerem escolhas baseadas em razões que vão além do instinto. A primeira força é o que chamo de interação. As esponjas inteligentes desenvolvem mecanismos ou processos que facilitam sua interface com outras esponjas inteligentes que povoam o mundo organizacional, além de outras entidades e instituições presentes na sociedade. É por meio dessa interação que pode ocorrer a segunda força: absorção. A força da absorção é manifestada na capacidade que as esponjas inteligentes têm de recolher para seu interior, informações, recursos materiais e financeiros e pessoas que passarão a ser aplicados internamente, como parte do esforço de buscar a perenidade no ambiente. Junto com a absorção, atua quase que ao mesmo tempo, uma terceira força denominada seleção. Assim como para as esponjas marinhas, nem tudo que é absorvido do ambiente, tem utilidade. Dessa forma, as esponjas inteligentes necessitam exercitar um processo de seleção que avalia a qualidade e a quantidade dos diferentes tipos de recursos que necessita reter internamente e os que não serão internalizados. Essa força se alia a três outras na continuidade do esforço de sobrevivência das esponjas inteligentes: retenção, transformação e extroversão. A força da retenção está envolvida em assegurar que os recursos necessários estejam presentes no momento em que cada um é necessário às atividades que buscam a sobrevivência da esponja inteligente. Por exemplo, as pessoas extremamente competentes que devem ser estimuladas a ficar trabalhando nessa esponja, resistindo aos apelos de outras esponjas inteligentes. A quinta força, a transformação, é uma componente da metáfora que é usual na literatura administrativa. Ora, Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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qualquer esponja inteligente só tem existência estimulada pelo ambiente, quando performa uma transformação nos recursos absorvidos do ambiente e devolve a ele outros tipos de recursos que tenham valor. A transformação é parte essencial, mas não única, da sobrevivência esponjal, visto que ela permite a diferenciação entre as esponjas inteligentes justificando sua permanência no ecossistema organizacional. A sexta força, decorrente da transformação, mas não exclusivamente dela, é a extroversão. Isto é, a capacidade de permitir a fluição de seus produtos/serviços para fora de suas fronteiras. Esse é um processo controlado pela esponja inteligente, mas a extroversão tem também seus traços não controláveis, ou, pelo menos, pouco controláveis. A extroversão de efeitos indesejados no ambiente (poluição, transtornos à comunidade, etc), bem como, a perda de recursos por ineficiências dos mecanismos e processos ligados à força da transformação, são menos controláveis. Por fim, há também, os não controláveis, que é, por exemplo, a extroversão de talentos para esponjas inteligentes competidoras pelo mesmo tipo de recurso. Além dessas forças, considero que mais quatro têm papel fundamental na forma como as esponjas inteligentes se configuram em formas estáveis no mundo organizacional: estruturação, articulação, reflexão e regulação. A estruturação tem a ver com os mecanismos que serão construídos pelas esponjas inteligentes para permitir que as demais forças possam operar em condições relativamente estáveis. É a criação de procedimentos de fragmentação/aglutinação de tarefas com uso de recursos adequados, em conjunto com a formatação de mecanismos de coordenação que fornecem harmonia aos processos de interação, absorção, seleção, retenção, transformação e extroversão típicos das esponjas inteligentes. A articulação está associada intimamente à força da estruturação, mas diz respeito a algo que poderia ser chamado de estruturação externa. A permanência das Fernando Antonio Prado Gimenez


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esponjas inteligentes no ambiente depende muito de sua capacidade de relacionamento proveitoso com outros tipos de esponjas inteligentes no mundo organizacional, por exemplo, esponjas fornecedoras de recursos, esponjas que exercem a mesma função no sistema, esponjas que exercem atividades complementares, etc. Aqui é claro que estou falando, na linguagem não metafórica, de fornecedores, concorrentes, distribuidores, etc.

A reflexão é a força relacionada a dois processos inerentes à inteligência da esponja: a capacidade de aprendizagem e a memória do aprendido. As esponjas inteligentes desenvolvem mecanismos e processos que permitem que, periodicamente, sua trajetória seja analisada, apontando para acertos e fracassos, que devidamente considerados, passam a fazer parte da memória esponjal. Por fim, a força da regulação é a maneira pela qual a esponja inteligente manifesta sua capacidade de ajuste ao ambiente em que vive. A regulação se reflete em esforços que redundarão em cinco formas de sobrevivência: manutenção, expansão, retração, adaptação ou inovação. Isto é, tentar preservar seu modus operandi como está em função da estabilidade do ambiente; buscar o crescimento ou diminuição quando o ambiente esteja propício ou ameaçador, respectivamente; transformar-se de forma adaptativa, gradual, quando o ambiente se transforma lentamente, ou tornar-se muito diferente porque houve mudanças radicais em aspectos centrais do ambiente. É na relação entre a esponja inteligente e seu ambiente que surgem as diferentes oportunidades de manifestação das dez forças sucintamente descritas acima. Se você é administrador de uma esponja inteligente ou está pensando em criar uma, reflita um pouco sobre essas forças. Elas te ajudarão a pensar uma configuração esponjal que possa vir a ser mais estável. Boa sorte! Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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A PEQUENA EMPRESA COMO ESPAÇO EXPRESSIVO DO EMPREENDEDOR

T

ive a oportunidade de assistir a uma palestra da cineasta Lúcia Murat em Curitiba. Antes da palestra foi exibido o making of do filme A memória que me contam, filme da diretora carioca que seria lançado brevemente. A memória que me contam é o sexto longa da carreira de Lúcia Murat que inclui os seguintes filmes: Brava gente brasileira, Doces poderes, Quase dois irmãos, Maré - nossa história de amor e Uma longa viagem. Após a exibição do making of, Lúcia comentou sobre sua carreira e sua ligação com o movimento de resistência ao golpe de 1964. Contou também sobre sua experiência na produção de filmes na condição de empregada de uma grande rede de televisão brasileira. Nesse momento, ela comentou sobre a transição para uma carreira independente em que consegue viver só do cinema. Lúcia Murat fez uma comparação entre os dois momentos de sua carreira que foi muito precisa e inspiradora. O trabalho na rede de televisão, marcado por uma escala de massa, de produção industrial, era um espaço pouco propício à expressão própria da cineasta. Não havia muita liberdade para a experimentação, para o fazer filme enquanto arte ou poesia. Por outro lado, ao assumir o desafio de viver de sua arte, Lúcia Murat encontrou o espaço para sua expressão como artista, onde pode contar histórias da forma que julga mais adequada. Essa fala de Murat, não exatamente com essas palavras, me permitiu refletir sobre um aspecto do empreendedorismo e da gestão da pequena empresa que não se encontra com frequência na literatura. Lúcia Murat é uma cineasta, mas pode ser vista também como uma empreendedora ou gestora de projetos fílmicos. Assim, da mesma forma como ela encontrou na sua independência artística o espaço expressivo, penso que pessoas que se desvinculam de empregos em grandes empresas e buscam criar suas Fernando Antonio Prado Gimenez


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empresas próprias, em geral pequenas, podem sentir algo parecido.

Muitas vezes, a literatura diz que o ato de empreender surge de um desejo de independência do indivíduo que cria sua própria organização. Ser patrão de si mesmo! Fazer aquilo que gosta! Fazer o que percebe como necessário para uma parte da sociedade ou do mercado! Essa é a motivação inicial em muitos casos. Deixem-me expressar-me como sinto! Parece ser o grito dos potenciais empreendedores. Quando a organização se estabiliza, muitas vezes, percebe-se que é necessário um equilíbrio entre o que o gestor quer fazer e o que o mercado/sociedade deseja. É o momento de ajuste, de mudança, de inovação, de transformação. Mas, continua sendo um espaço expressivo. É da percepção do gestor da pequena empresa sobre seu espaço de atuação empresarial que surge sua interpretação de qual é a situação. A partir dessa interpretação, suas decisões serão tomadas. Surge o momento da expressão do dirigente da pequena empresa: é isso o que eu enxergo e assim que quero participar desse mundo! Eis uma possibilidade de pesquisa em empreendedorismo e gestão de pequenas empresas: o que empreendedores e gestores de pequenas empresas querem expressar para o mercado e a sociedade? Alguém se habilita?

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(INS)PIRAÇÕES: MISTURANDO GODARD, FAROESTE CABOCLO, O AMANTE DA RAINHA E RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA Feriado é tempo de ver filmes! Comecei minha jornada de cinema assistindo a Pierrot le fou de Godard em casa, depois fui ao cinema ver Faroeste caboclo. No dia seguinte, foi a vez de assistir a O amante da rainha. Cinema francês, brasileiro e dinamarquês. Esta mistura mexeu com as ideias, pôs o cérebro a funcionar.

Godard, em Pierrot le fou, faz em seu filme de 1965, sua homenagem ao cinema. Passeia por diversos gêneros e estilos – comédia, musical, surrealismo, gangsteres, drama. Ferdinand e Marianne buscam, no sul da França, o que a sociedade não lhes oferece. Faroeste caboclo, filme nacional lançado em 2013, inspirado na música de Renato Russo e dirigido por Renê Sampaio, retrata impossibilidades da vida ao contar a estória do encontro e paixão, em nossa capital federal, entre João do Santo Cristo e Maria Lucia, vividos por Fabrício Boliveira e Ísis Valverde. Plano piloto e Ceilândia, dois mundos distantes, mas geograficamente próximos, são o palco deste Romeu e Julieta brasileiro. Mais uma vez, a sociedade separa aqueles que o coração uniu. Por fim, O amante da rainha dirigido por Nikolaj Arcel. Terceiro casal dessa narrativa, Caroline Mathilde, casada com Christian VII, rei da Dinamarca, se apaixona pelo médico do rei, Johann Struensee. As personagens são interpretadas por Alicia Vikander e Mads Mikkelsen nessa produção de 2012. Struensee é um iluminista que, após ganhar a confiança do rei, se aproveita de sua loucura para destituir o Conselho Real. Christian VII acaba dando plenos poderes ao médico que, guiado pelas ideias iluministas, introduz alterações na vida do povo dinamarquês. Da paixão entre Caroline Mathilde e Johann Struensee nasce uma filha. Descoberta a traição, igreja e nobreza voltam ao poder e desfazem os avanços sociais implantados. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Traição, paixão e transformação. Absurdo, violência e poder. Temas que perpassam as três histórias. Qual é o espaço do indivíduo e do coletivo em nossa sociedade capitalista? Como conciliar nossos desejos e aspirações individuais com a do outro? França de 1965, anos 70 no Brasil, último quarto do século XVIII na Dinamarca. Espaços e épocas distintas, mas com as mesmas questões humanas mal resolvidas.

Godard, em 1965, já comentava sobre o consumismo. Nos momentos iniciais de Pierrot le fou, Ferdinand caminha entre os convivas de uma festa que dialogam com frases que são retiradas de propagandas de produtos. Deliciosamente surreal! Faroeste caboclo mostra a impossibilidade do rompimento das barreiras sociais e de raça. A futilidade das tentativas de aproximação entre dois mundos. Em O amante da rainha surge a esperança do iluminismo. O conhecimento científico se opondo à tradição e à religião. O primeiro round dessa luta é vencido pelos iluministas, no segundo vencem religião e nobreza. E depois? E a responsabilidade social corporativa? Onde entra nesse texto? Você me pergunta. Eu respondo: Justamente agora, leitor impaciente! Volto a esse tema! Mais uma vez, a esperança de que seja esse o caminho. Será que vou conseguir superar meu ceticismo? Será que essas três histórias de amor impossível ajudam a encontrar uma saída? Pouco provável, mas não custa tentar. Como diria Goulart de Andrade: vem comigo! Estamos em busca de um desenvolvimento sustentável. Um desenvolvimento que, no dizer de Veiga (Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2008), pode permitir que cada indivíduo revele suas capacidades, seus talentos e sua imaginação na busca da auto realização e da felicidade, mediante esforços coletivos e individuais, combinação de trabalho autônomo e heterônomo e de tempo gasto em atividades não econômicas... maneiras viáveis de produzir meios de vida não podem depender de Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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esforços excessivos e extenuantes por parte de seus produtores, de empregos mal remunerados exercidos em condições insalubres, da prestação inadequada de serviços públicos e de padrões subumanos de moradia (p. 80-81). No campo da Administração, parece que a resposta a essa busca é a institucionalização da Responsabilidade Social Corporativa. Já que se abandonou a derrubada do sistema, vamos aperfeiçoá-lo. É isso possível?

Para alguns é! Por exemplo, Aligleri, Aligleri e Kruglianskas (Gestão socioambiental: responsabilidade e sustentabilidade do negócio. São Paulo: Atlas, 2009) apresentam uma boa síntese da temática da gestão socioambiental demonstrando como esta evoluiu a partir das premissas da responsabilidade social e do relacionamento com stakeholders. Para esses autores, a preocupação com posturas socialmente corretas, ambientalmente sustentáveis e economicamente viáveis estará cada vez mais presente entre os temas de gestão. (p. 8). Isso implica dizer que há um desafio presente na gestão das organizações: observar o atendimento aos critérios de responsabilidades econômica, legal, ética e filantrópica propostos por Carrol (The pyramid of corporate social responsibility: toward the moral management of organizational stakeholders. Business Horizons, v. 34, n. 4, p. 39-48, 1991). Mas, em um mundo, onde as paixões escapam ao domínio da temperança será isso possível? Tenho sentimentos conflitantes sobre isso. Por um lado, muitas vezes, sou descrente. Por outro, algumas vezes, confiante. Jean Luc Godard, Renê Oliveira e Nikolja Arcel despertaram as duas forças conflituosas em movimento no meu cérebro. Desse conflito surge a síntese: a esperança. Em Pierrot le fou há uma cena inspiradora. Ferdinand, interpretado por Jean Paul Belmondo, e Marianne, por Anna Karina, estão em uma estrada, conversando dentro do carro em movimento. São vistos por trás. Ferdinand comenta sobre fala de Marianne: as mulheres só querem divertimento. Marianne responde: para quem você está falando? Ferdinand Fernando Antonio Prado Gimenez


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responde: para a plateia. Marianne olha para trás em direção à câmera. Momento sublime, suavemente irônico, em que Godard revela a câmera ao espectador e nos lembra de que vemos um filme. Será que os administradores que discursam sobre responsabilidade social corporativa não estão falando só para a plateia? Em Faroeste caboclo, a tragédia nos lembra da impossibilidade do convívio. Pessimista, reforça minha descrença. Duzentos anos depois do nascimento dos ideais iluministas, as desigualdades permanecem! Caminhamos tão lentamente! Por fim a esperança d’O amante da rainha. O filme é uma carta de Caroline para seus dois filhos, Frederick e Louise Augusta. Separada dos dois pelo exílio, Caroline conta para eles a sua história e conclui: sei que vocês me deixarão orgulhosa. Outras gerações serão capazes de fazer o que não fizemos? Espero que haja tempo!

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OS 5 Ps DO EMPREENDEDORISMO

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P

assei dois dias e meio na UNICAMP participando de um curso sobre ensino para o empreendedorismo. Conduzido por Shirley Jamieson e Shiba Barakat da Universidade de Cambridge, o curso teve representantes de várias agências de inovação de universidades brasileiras e foi organizado pela INOVA UNICAMP. Foi uma boa oportunidade de aprendizagem sobre a condução de programas de desenvolvimento de empreendedores. A experiência de Cambridge no tema foi o eixo condutor do curso, mas houve relatos das abordagens dos participantes brasileiros também. Em determinado momento, um dos participantes mencionou um modelo que contêm três dimensões que explicam o sucesso no empreendedorismo: paixão, habilidades e mercado. Edmundo Inácio Júnior, meu amigo que reencontrei no curso, disse que essa ideia é mencionada por Tina Seelig no livro What I wish I knew when I was 20. Foi nesse momento que, inspirado por essa ideia, minha atenção focou-se em meu caderno de anotações e minha presença no curso tornou-se apenas um fenômeno físico. Minha mente começou a viajar pelo mundo da imaginação! Pensei: independente de qual seja o sucesso desejado, o que move empreendedores em direção ao sucesso que almejam? Comecei a teorizar a partir do modelo citado por Tina Seelig e iniciei minha jornada, à maneira de Mintzberg, para encontrar os 5 Ps do empreendedorismo. O primeiro P já estava no modelo: Paixão. Não sei o que o modelo diz sobre isso, pois não li o livro de Seelig. Para mim, paixão está relacionada com a dedicação que devotamos a algo ou alguém que nos aproxima da felicidade. A paixão por alguém é, quase sempre, mais gratificante, pois pode ser retribuída, mas no empreendedorismo o objeto de desejo é o empreendimento. Sem a paixão, será difícil surgir a apetência Fernando Antonio Prado Gimenez


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para atender as demandas desse objeto do desejo. Que as vezes pode ser um pouco obscuro! (um pouco de surrealismo Buñueliano).

Mas a paixão, embora necessária, não é suficiente. Ela precisa ser guiada por um Propósito, o segundo P. Para que essa paixão? Onde posso chegar com ela ou quero chegar? O propósito se refere à motivação para empreender. Qual é o objetivo do empreendedor? Mas, não é só isso. Propósito tem a ver também com a razão de existência do empreendimento. O que é oferecido ao mercado, se for uma empresa, ou a sociedade, se for outro tipo de organização. Ou seja, tem a ver com o que chamo posicionamento co-opetitivo no mercado ou sociedade. O terceiro P está parcialmente incluído no modelo citado por Seelig. Quando se fala de mercado, não se pode esquecer que mercados são Pessoas. É evidente a ligação do propósito com pessoas. Para ser bem sucedido, o empreendimento deve ter uma oferta capaz de atrair pessoas. No entanto, essa dimensão extrapola esse sentido de ofertar algo desejado por pessoas. O empreendimento, em geral, necessita de outras pessoas para existir: empregados, sócios, fornecedores, parceiros etc. Para cada tipo de público, há interações que precisam ser estabelecidas. Como convencer fornecedores a proverem as necessidades do empreendimento? Como atrair e manter pessoas trabalhando no empreendimento seja como sócios ou empregados. Como envolver pessoas de outros empreendimentos em parcerias? Estas e outras questões conduzem para as Práticas, quarto P que imaginei. Empreender requer um saber fazer que é direcionado por três eixos: imaginar uma nova organização, buscar e articular recursos e tecnologias em um modo de operação e estimular e conduzir pessoas visando atingir objetivos. O quarto P se materializa nas Práticas desse saber fazer. Elas podem se manifestar pelo uso de ferramentas de diagnóstico, planejamento e controle ou são ações que Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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surgem na lida cotidiana com as demandas do funcionamento inicial do empreendimento. Em essência, dizem respeito ao exercício de três papéis empreendedores: criador, organizador e condutor. Papéis pelos quais se manifesta o empreendedorismo individual ou coletivamente.

Enfim o quinto P é o Produto. Todo empreendimento se constrói em torno da capacidade de entregar um produto, tangível ou intangível, para a sociedade de forma mais ampla ou mercado, de forma mais estreita. É no Produto que surge o resultado de Paixão, Propósito, Pessoas e Práticas. De novo, tangível ou intangível, é o vir a ser do produto que justifica o ato de empreender. É devido à complexidade deste vir a ser que nossa sociedade precisa de empreendedores e empreendimentos. Se fosse trivial não haveria razão para o empreendedorismo. Assim, terminou minha jornada em busca dos cinco Ps do empreendedorismo. Cheguei onde minha imaginação pode me levar.

Fernando Antonio Prado Gimenez


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SOBRE DESAFIOS E GANAS OU CABELO E BARBA EM UMA BARBEARIA PORTUGUESA

E

ste texto foi escrito em meu celular dentro de um ônibus entre Faro e Lisboa. Poder viajar para fora do Brasil é uma oportunidade de vida ímpar. Depois de sete dias em Portugal, estou a caminho de Lisboa para a viagem de retorno. Um problema no avião em Faro me colocou em um ônibus que segue pela autopista A2 a cerca de quarenta minutos. Aproveito para refletir sobre essa semana em que reencontrei Fernanda. Há um mês fora do Brasil, passou por momentos desagradáveis quando, logo na primeira semana, teve sua bolsa furtada. Perdeu algum dinheiro, passaporte, cartões de banco e crédito. Estava desanimada quando nos encontramos em Sevilha. Aos poucos seu semblante foi desanuviando. Passeamos com Sara e Dona Aparecida uma noite e um dia por lá. Depois, no dia seguinte fomos a Lisboa onde passeamos por dez horas. Hoje, ao deixá-la na rodoviária de Olhão, fiquei feliz ao vê-la pronta para a luta da vida de novo. Cheia de desafios! Com ganas de enfrentá-los! Ao falar com ela no meio da tarde, já estava na Universidade de Sevilha, fazendo seus trabalhos do Mestrado em Comunicação e Cultura. Ver Fernanda pronta para recomeçar me trouxe à lembrança o encontro com Vitálio, técnico em cabelo, como me informou o crachá em seu guarda-pó. Na quarta pela manhã, passeando pelo centro de Olhão, indago por uma barbearia. Um vendedor em uma praça sugere que vá a barbearia do Vitálio. Sigo suas indicações pelas vielas de Olhão e logo a encontro. De imediato, lembrei-me de seu Lauro e sua barbearia. Personagem de minha infância e adolescência com seu pequeno salão onde eu e meus irmãos estivemos incontáveis vezes. Primeiro com nosso pai e, quando maiores, sozinhos. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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O salão do Vitálio tem apenas uma porta. Duas cadeiras antigas de barbeiro ao fundo, de frente para um espelho. Paredes laterais emolduradas por espelhos na altura dos olhos. Abaixo dos espelhos, cadeiras para os clientes. Fotos, gravuras e pequenos quadros enfeitam as paredes. Ao entrar, havia um par de clientes sendo atendidos e mais dois a esperar. Perguntei a um dos barbeiros se poderiam me atender. Diante da resposta positiva pus-me a esperar.

Vitálio, cujo nome só descobri quando foi me atender, conversava com um senhor mais idoso. De repente sai-me com uma pergunta ao idoso: _ Quero ver se está com o cérebro a funcionar? O que vem primeiro: o Natal ou o Novo Ano? A resposta do idoso foi: _ Natal, ora pois. _ Errado, disse o Vitálio. O novo ano vem sempre antes do Natal. O Natal vem sempre ao final do ano. Continuou: _ Que mês tem vinte e oito dias? _ Fevereiro. _ Não. Todos os meses têm vinte e oito dias. Nesse momento, o outro barbeiro entrou na conversa: _ Em que mês as mulheres mijam menos? No meio da risada de todos, o próprio respondeu: _ Fevereiro, pois tem menos dias. Assim, o tempo foi passando e chegou minha vez de ser atendido. Expliquei como queria cabelo e barba. Não precisei falar muito. O barbeiro só me perguntou o número da máquina para aparar a barba. O resto foi como sempre tivesse me atendido. Perfeito! Fernando Antonio Prado Gimenez


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Fiz algumas perguntas e descobri que Vitálio tem essa profissão desde os dez anos. Aprendeu com seu pai, que foi ensinado pelo pai também, que aprendera o ofício com seu pai. Há algumas gerações o ofício é transmitido de pai para filhos. Mais recentemente, algumas sobrinhas também se tornaram cabeleiras.

Vitálio no ano que vem completa sessenta e seis anos. Fundou seu salão ha quarenta e um anos. Está pensando em se aposentar. Caso isso ocorra, completará 56 anos de profissão e 42 anos com sua pequena empresa. Fico pensando nos desafios que enfrentou nessa jornada. Com certeza deve ter tido muita gana para enfrentá-los. Tenho certeza que, além do serviço competente, o clima que vivenciei em cerca de uma hora é um dos aspectos que garantiram a permanência do Vitálio no mercado por tanto tempo. Feliz de mim que tive o acaso a meu favor me permitindo conhecer Vitálio, o técnico em cabelo!

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PERTO DA CONCHA ACÚSTICA: O CACHORRO-QUENTE QUE VIROU PITBULL!

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erta noite, fiz um lanche em uma das esquinas do centro de Londrina. Voltava, a pé, do lançamento da Revista Organizações e Sustentabilidade cujo editor é o Ivan de Souza Dutra, professor do Departamento de Administração da Universidade Estadual de Londrina. Tive o privilégio de ser o autor de um ensaio na primeira edição deste novo periódico do Programa de Pós-graduação em Administração da UEL. Por um acaso do destino, estava em Londrina no dia da cerimônia organizada por Ivan, Luis Miguel Luzio dos Santos e Marli Verni. Ambiente acolhedor e momentos de reencontro com colegas e ex-alunos. Lilian Aligleri também estava lá, com a filhinha de nove meses e Marli, sua mãe. Pena que Luís Antônio, pai de Lilian, não veio. Saudades desse amigo de longa data, professor competente sempre homenageado pelos estudantes. Ao final do evento, decidi caminhar até a casa de minha mãe onde estou hospedado. Pouco mais de mil metros, a partir de um shopping nas proximidades da rodoviária até Concha Acústica de Londrina, vizinha à Catedral. Os mais jovens devem estar curiosos! O que é uma concha acústica? Não vi muitas em minha vida. Na verdade, acho que conheço só a de Londrina. É uma construção de alvenaria, convexa, em forma de concha, que fica sobre um palco em uma praça pública. A praça tem cerca de dez fileiras de bancos de concreto. Na Concha Acústica são apresentados shows musicais, peças e outras atrações. Já foi muito usada no passado. Ultimamente, durante as noites, tem sido utilizada como dormitório por sem-tetos. Mas, o que quero relatar é a história do cachorro-quente que virou pitbull! Subindo pela Rua Maranhão notei um aglomerado de pessoas na esquina com a Souza Naves, ao lado de um carrinho de cachorro-quente. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Apesar de ter comido e bebido no lançamento da revista, resolvi comer um cachorro-quente. A cena e a fresca brisa noturna me trouxeram lembranças de minha juventude. Sempre que saía das sessões noturnas do Cine Vila Rica, voltava a pé para casa. No caminho, na Avenida Higienópolis, comia um cachorro-quente. Sempre no mesmo carrinho. Aproximei-me e o lancheiro me disse: _ Se for comer, põe o nome na lista. Me passou uma prancheta com uma caneta e folha de papel. Nela já havia mais de 15 nomes. Quando terminou de preparar o lanche que estava fazendo, pegou a prancheta e chamou alguém. Em seguida me avisou: _ Tem mais dois na sua frente. _ Não tem pressa, respondi. Não tenho nada pra fazer esta noite. Na minha vez, ele perguntou: _ O que vai ser? _ Duas salsichas, maionese, catchup e mostarda. _ Pit 2. Não quer milho verde e batata palha? _ Não. Como você chama o lanche? _ Pit 2. Pão pequeno com duas salsichas. Pit 1 quando tem uma salsicha.

Esse foi o começo do papo. Estimulado por minhas perguntas, o lancheiro me contou que está nisso há 29 anos. Foi office-boy antes de começar a fazer lanche na rua. Há nove anos está nessa área da cidade, mas antes trabalhou na Higienópolis e na Quintino Bocaiúva. Mais ou menos dez anos em cada rua. Nessa altura da conversa é que reconheci a figura: _ Lembro de você da Higienópolis! Como está a vida? Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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_ Não está mal. Melhorou nos últimos dez anos quando comecei a fazer sucos. A partir do meio do dia preparo tudo e venho pra rua entre quatro e quatro e meia. Começo perto da delegacia e, mais tarde venho para esse lugar. Os sucos são meu diferencial junto com os lanches maiores: dogão e pitbull.

Nesse momento, chega uma moça com uma criança no colo e um menino ao lado. Uma graça de garoto, quatro anos no máximo, que fala para o lancheiro: _ Oi Davi. Eu voltei! Davi sorri e brinca com o menino: _ Eu vi. Mas achei que era um gatinho. _ Não era um gatinho. Era eu. A cena me encantou! Ao mesmo tempo, chegam três rapazes. Com uma larica danada, um deles pede: _ Faz três bem regadão! Davi repete o procedimento: _ Coloca os nomes aqui, para eu chamar quando for fazer. Continuo conversando com Davi, agora o chamando pelo nome que aprendi com o garoto. Davi me conta sobre o que conseguiu nesse ofício: _ Duas casinhas, um carro e uma pequena caminhonete para transportar o carrinho e material. Parece muito satisfeito. Pergunto se não pensa em ter um espaço próprio, mesmo que seja apenas com uma porta. _ Não! Gosto da rua, não conseguiria ficar num lugar só. Aprendo com Davi! Fazer diferente, mas do jeito que gosta. Enquanto conversamos, vários clientes pedem por suco. Fernando Antonio Prado Gimenez


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_ Ele tem vários, mas o melhor é morango com danone, me diz uma moça. _ Sou bom no suco, garante Davi. Chama o primeiro dos rapazes: _ O que vai ser? _ Bem regadão, repete o cara. _ Vai ser o pitbull então. Pão grande, duas salsichas, maionese, catchup, mostarda, maionese verde, milho, frango na chapa e batata palha. Pros três? _ Sim, respondem os três ao mesmo tempo. Davi olha pra mim e diz: _ Tem que dizer o que é, pra não reclamarem depois. O dogão é quase igual. Só não tem o frango. Quase ao fim da conversa, Davi me ensina um pouco mais. Um dos três jovens pega uma bisnaga de catchup. Davi avisa: _ Não encosta o bico da bisnaga onde morder. _ A fiscalização pega no pé? Pergunto. _ Não, eles estão certos, diz Davi. Na mordida pode estar alguma bactéria. Em seguida, fala para o jovem: _ Traz a bisnaga aqui. Vou fazer um potinho para você. Davi se mostra socialmente responsável e, ainda, consegue customizar o pitbull para o cliente. O que vi nessa noite? Davi de bem com a vida, trabalhando de segunda a sábado, descansando aos domingos, se sentindo bem sucedido! Sabendo atender, sendo organizado e Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


cortês, socialmente diferencial.

responsável

e

desenvolvendo

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seu

Nada mais adequado para uma noite em que surgiu a Revista Organizações e Sustentabilidade!

Fernando Antonio Prado Gimenez


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A FREIRA E A TAXISTA - ENTRE A EFICIÊNCIA E A EFICÁCIA!

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inha irmã, Kilda, me enviou essa pequena anedota que serve bem para ilustrar o dilema entre eficiência e eficácia na administração, em particular nas pequenas empresas. Kilda a recebeu a de uma amiga. Em uma cidade do interior, viviam duas mulheres que tinham o mesmo nome: Flávia. Uma era freira e a outra taxista. Quis o destino que morressem no mesmo dia. Quando chegaram ao céu, São Pedro as esperava. - O teu nome? - Flávia - A freira? - Não, a taxista. São Pedro consulta as suas notas e diz: - Bem, ganhastes o paraíso. Leva esta túnica com fios de ouro. Pode entrar. A seguinte... - O teu nome? - Flávia - A freira? - Sim, eu mesma. - Bem, ganhastes o paraíso... Leve esta túnica de linho. Pode entrar. A religiosa diz: - Desculpe, mas deve haver algum engano. Eu sou Flávia, a freira! - Sim, minha filha, e ganhastes o paraíso. Leve esta túnica de linho... Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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- Não pode ser! Eu conheço a outra Flávia, Senhor. Era taxista, vivia na minha cidade e era um desastre! Subia as calçadas, batia com o carro todos os dias, conduzia pessimamente e assustava as pessoas. Nunca mudou, apesar das multas e repreensões policiais. E quanto a mim, passei 65 anos pregando todos os domingos na paróquia. Como é que ela recebe a túnica com fios de ouro e eu esta?

- Não há nenhum engano - diz São Pedro. É que, aqui no céu, adotamos uma gestão mais profissional do que a de vocês lá na Terra... - Não entendo! - Eu explico. Já ouviu falar de Gestão de Resultados? Agora nos orientamos por objetivos, e observamos que nos últimos anos, cada vez que tu pregavas, as pessoas dormiam. E cada vez que ela conduzia o táxi, as pessoas rezavam! Resultado é o que importa. Deliciosamente instrutiva, não? A distinção entre eficiência e eficácia, provavelmente, é um dos conhecimentos que se transmitem logo nos primeiros momentos a estudantes de administração. Do ponto de vista conceitual, é uma diferença muito simples. Eficiência está relacionada a fazer certo as coisas, enquanto que eficácia é fazer a coisa certa. O que isso quer dizer, é que ser eficiente significa realizar as atividades e processos em uma organização de forma a utilizar corretamente e sem desperdícios todos os recursos e ferramentas necessários para cada tarefa organizacional. Por outro lado, ser eficaz significa atingir os objetivos relacionados à existência da organização. No caso de uma empresa, ser eficaz é oferecer a um mercado produtos ou serviços que sejam realmente desejados. É claro que a situação ideal, do ponto de vista da administração, está na combinação constante dos dois Fernando Antonio Prado Gimenez


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aspectos: ser eficaz e ser eficiente. Nas grandes empresas, em geral, essa combinação não é tão difícil de ser mantida. Nas pequenas empresas, no entanto, isto é mais complicado! A falta de recursos, ferramentas ou, até mesmo competências pode afetar a eficiência. Mas, se temos que sacrificar algum dos dois, o aconselhável é abrir mão da eficiência. A eficácia não pode jamais ser abandonada.

Assim, nada mais natural que a taxista recebesse a túnica com fios de ouro. Para São Pedro, a eficácia das ações residia em conseguir um maior número de preces e orações. A freira não estava sendo nem eficiente, nem eficaz! Não conseguia pregar de forma a manter a atenção das pessoas e estas não se sentiam motivadas a orar. Por outro lado, a taxista, não era nem um pouco eficiente, mas, do ponto de vista da igreja, era eficaz: todo mundo rezava quando a via! É o que digo para minha professora de tênis, quando faço um smash todo torto: _ Não fui eficiente, mas fui eficaz. Ganhei o ponto! Mas, isso é história para outro texto. Ainda vou escrever algo sobre a relação entre tênis e administração. Aguardem.

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SUSTENTABILIDADE: REFLEXÕES SOBRE CHINESES E TRABALHO INTERNO, O FILME

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TEXTOS

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ois anos atrás, ganhei um livro de Telma, mas não puder dedicar-me à sua leitura então. Com o passar do tempo, ele se perdeu no meio de minhas bagunças e o reencontrei há cerca de três meses quando fui arrumar minha biblioteca, após a reforma em nosso apartamento. Selected writings of Li Shenzhi é uma publicação da Kettering Foundation Press, editado por Ilse Tebbetts e Libby Kingseed em 2010. Certa vez, arrumando minhas coisas para viagem a Maringá e Londrina, em função das festividades natalinas, decidi colocá-lo na bagagem. Comecei a leitura em Maringá, continuei em Londrina, e a concluí em Curitiba. Li Shenzhi, chinês que viveu entre 1923 e 2003, foi um acadêmico e membro do governo chinês que dedicou muito esforço na defesa da reforma política e democracia na China. Segundo os organizadores do livro, ele foi um dos principais estrategistas e conselheiros de relações exteriores na China, tendo exercido papel importante na promoção de atitudes moderadas da China e da política de Portas Abertas para o Ocidente. Ao tempo de Mao, foi conselheiro de relações exteriores para o Premier Zhou Enlai no começo da década de 50. Mais tarde, acabou sendo posto de lado, acusado de direitista, no período da Revolução Cultural dos anos 60. No final dos anos 70, foi procurado por Deng Xiaoping em busca de conselho sobre política de relações externas, em especial com os Estados Unidos. Acompanhou a visita de Deng aos Estados Unidos em 1979 e a do Premier Zhao Ziyang em 1984. O livro contém doze textos anteriormente publicados em chinês entre 1993 e 2002, além de uma entrevista originalmente publicada em Contemporary Chinese Thought (v. 33, n. 2, 2001). Raramente, tive a oportunidade de ler sobre a história desse país tão distante. Em muitos dos textos, Li Shenzhi comenta sobre sua visão de uma possível democracia na China, a partir de uma tradição liberal. Ao Fernando Antonio Prado Gimenez


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fazer isso, em seus textos nos ensina sobre a história chinesa de mais de 2.300 anos passados. Para ele, a principal dificuldade dessa evolução residia no Autoritarianismo (authoritarianism), uma tradição cultural que vem desde o período de Qin Xiao Gong que era o soberano do Estado de Qin de 361 a 338 AC, que unificou o país durante o período da Guerra dos Estados. Para Lin Shenzhi, o Autoritarianismo sustentou-se em duas escolas de pensamento: Confucionismo e Legalismo. Confúcio enfatizava uma filosofia humanista que ressaltava a importância da ética e educação para melhorar a sociedade humana, ao passo que o Legalismo, que surgiu do Confucionismo, defendia que o ser humano é essencialmente ganancioso e egoísta, devendo ser controlado por leis e o poder do Estado. Dessa forma, o autoritarianismo tem sobrevivido à longa história chinesa, devido à prevalência de três diretrizes que datam do primeiro século: o governante guia seus ministros; o pai guia seus filhos; e o marido guia sua esposa. Mais de 2.000 anos transformaram essas ideias em uma ideologia que, segundo Shenzhi, penetrou profundamente no modo de vida do povo chinês. Pelos seus textos, percebe-se que Li Shenzhi devotava certa admiração pelo sistema de vida do povo dos Estados Unidos. Ele foi um dos defensores da virada na política externa chinesa de afastamento da União Soviética e aproximação com os Estados Unidos. Foi, também, o organizador do Instituto de Estudos Americanos na Academia Chinesa de Ciências Sociais e fundador da Associação Chinesa de Estudos Americanos em 1988.

Entre as muitas coisas interessantes que descobri sobre a China, uma me deixou muito satisfeito. Lembro-me que nos anos 70, costumava-se falar sobre os países do terceiro mundo e do primeiro mundo. Nunca soube sobre a origem dessa classificação, mas a distinção para mim era muito clara. O primeiro mundo era representado pelos Estados Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Unidos, imperialista, e outros países europeus muito ricos; terceiro mundo eram os países da África, Ásia e América Latina. No texto em que comenta sobre a diplomacia da República Popular da China, Li Shenzhi informa que Mao foi quem criou estas categorias, que depois foi popularizada pela publicação de um artigo em todos os jornais da nação no dia primeiro de novembro de 1978. Nas palavras de Li Shenzhi, o campo capitalista com os Estados Unidos à frente como o primeiro mundo, o campo socialista liderado pela União Soviética como o segundo mundo, e todos os outros que não pertenciam a nenhum dos campos como o terceiro mundo (p. 146).

Mas, Shenzhi, conta que, de forma inesperada, em uma reunião com o Presidente Kaunda da Zâmbia, em 22 de fevereiro de 1974, Mao apresentou uma ideia diferente para as categorias. Conforme Shenzhi, nas palavras de Mao: _ Na minha opinião, os Estados Unidos e a União Soviética pertencem ao primeiro mundo. Aqueles no meio incluem Europa, Japão, Austrália, Canadá e outros, que não têm tantas bombas nucleares e não são tão ricos, mas ainda assim mais ricos que o terceiro mundo. O terceiro mundo tem uma população muito grande. Toda a Ásia, exceto o Japão, pertence ao terceiro mundo. Toda a África e toda a América Latina pertencem ao terceiro mundo (p. 146). É uma sensação tão agradável encontrar a origem de ideias que estavam em meu discurso no passado, mas que não sabia de onde tinham vindo! Os textos de Li Shenzhi trouxeram muita informação nova para mim. Outra que me deixou intrigado foi o movimento de revolta de dezoito camponeses que imprimiram suas mãos tingidas de sangue para registrar um acordo que fizeram sobre a divisão de uma parte de terra com o objetivo de iniciar pequenas fazendas individuais. Segundo Shenzhi, foi este acontecimento que levou à reforma e à abertura do Fernando Antonio Prado Gimenez


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regime comunista chinês. Muito consistente com suas ideias, o movimento obteve grandes resultados porque deu ao povo chinês alguma liberdade. Não pude deixar de pensar em como isto poderia ser explicado por uma teoria do empreendedorismo!

Mas, Li Shenzhi morreu em 2003. Não teve tempo de testemunhar a grande crise econômica ocorrida após os eventos de falência de grandes empresas financeiras em 2008, que estavam sediadas nos Estados Unidos que tanto admirava. O que teria pensado? Com certeza seria mais um estudioso a nos ajudar a entender o comportamento capitalista ganancioso e egoísta. Será que a escola de pensamento Legalista, derivada do Confucionismo, poderia reforçar a luta por uma regulação mundial dessas atividades? Fiquei refletindo sobre essas questões, após rever Trabalho interno, documentário escrito e dirigido por Charles Ferguson. Lançado em 2010, o filme relata a história da crise econômica de 2008 que custou ao mundo mais de US$ 20 trilhões de dólares, com muito sofrimento causado por perdas de empregos, casas e recursos de milhões de pessoas. A partir de entrevistas com profissionais da área financeira, políticos, professores universitários e, baseado em muita pesquisa, Charles Ferguson apresentou-nos um retrato realista e, ao mesmo tempo, revoltante da ganância e cinismo presente nos representantes de Wall Street, ou melhor, como um dos seus entrevistados disse, os representantes do governo de Wall Street, já que desde antes de Bill Clinton, os responsáveis pela área econômico-financeira do governo dos Estados Unidos têm saído e se revezado na ocupação de cargos a partir de sua atuação em Wall Street. Juntando tudo isso, continuo nessa minha jornada particular em busca do entendimento da evolução da humanidade. Sem perder a esperança, mantenho o desejo de que as frases complementares de Confúcio e Jesus, que aprendi com Li Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Shenzhi, possam ser ouvidas mais fortemente e ajudar a construir um mundo sustentável: Não faça a outros o que não deseja que seja feito a você (Confúcio).

Tudo o que quereis que lhe façam, faça-o também aos outros (Cristo). Talvez fosse essa a ideia de Shenzhi ao escrever em 1995: Nós chegamos a um ponto em que devemos assumir responsabilidade em formular um padrão de valor global efetivo. Esta é a era que chama por pensadores, estadistas, líderes religiosos e educadores (p. 126).

Fernando Antonio Prado Gimenez


REFLEXÕES LONDRINENSES SOBRE LONGEVIDADE

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Q

uatro dias de férias em Londrina. Nesse fim de férias, além de uma participação em banca de defesa da dissertação de mestrado do Paulo Paganini, orientado pelo amigo Mário Nei Pacagnan da UEL, visito amigos, vou aos sebos atrás de livros de bolso para minha coleção, passeio pelo centro de Londrina, ainda com o calçadão dilacerado, mas segundo notícia de jornal, em breve poderá ser feita licitação para a instalação de novos quiosques. Em frente ao Correio, ainda vejo destroços da antiga Banca do seu Pedro e da garapeira que refrescou muitas tardes de calor intenso. Aliás, fez falta nesses dias de verão tórrido! Hospedado em casa de minha mãe, longas conversas (monólogos em que sou o ouvinte, nem sempre atento!) com ela que se aproxima rapidamente dos 88 anos de vida. Longevidade que espero reproduzir. Entre tantas frases e histórias, muitas já contadas em outros momentos, algo novo que me faz gargalhar: _ Fernando, você sabe que quase todos os médicos que me diagnosticaram já morreram? Já imaginou se falo isso pro doutor Ramon? Ele fica louco! Entre os passeios, acabo fazendo duas visitas gastronômicas a pequenas empresas longevas também: Pastelaria da Sergipe e Kiberama. A primeira faz a melhor vitamina de abacate, com um pouco de outras frutas, que já tomei nesses meus cinquenta e seis anos, que deve ser também a idade da Pastelaria Sergipe. No Kiberama, em que uma placa informa o ano de criação com sendo 1965, a melhor esfirra de carne, servida quentinha, para clientes sentados em bancos que rodeiam um balcão. Continua a mesma desde meus tempos de adolescente, quando ganhei autonomia para andar sozinho pelas ruas londrinenses. Quem passar por Londrina não pode deixar de conhecer. As duas empresas estão localizadas na mesma quadra, uma à Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Rua Sergipe e a outra à Rua Mato Grosso. Pouco mais de duzentos metros da Concha Acústica e da Catedral de Londrina. Ah, o pastel da Pastelaria Sergipe é imperdível também! Mas, como optei pela esfirra do Kiberama, tomei só a vitamina. Cuidar um pouco da saúde, não faz mal a ninguém!

É claro que não poderia deixar de ir ao cinema nesses quatro dias de férias! Assisti a dois filmes que me fizeram refletir muito: Ninfomaníaca v. 1 de Lars von Trier e A grande beleza de Paolo Sorrentino. Lembro-me do livro de Julio Cabrera, professor de filosofia da UnB, O cinema pensa. E com ele eu penso também. Em A grande beleza, um escritor reflete sobre sua vida ao completar 65 anos. No filme de Trier, uma mulher é encontrada, caída em um beco, por um homem mais velho, muito machucada. Depois de ser levada para a casa deste, ela começa a contar sua vida, justificando porque se julga uma pessoa má. De comum, entre os dois filmes, além da beleza imagética de ambos, em estilos completamente diferentes, a presença de um personagem mais velho, nos contando ou ajudando a ouvir estórias. Seligman, interpretado por Stellan Skarsgard, é o idoso que resgata Joe vivida por Charlotte Gainsbourg, no filme de Lars von Trier. Duas cenas dele me despertaram reflexões sobre a longevidade, não das pessoas, mas de pequenas empresas. Em determinado momento, logo no começo da narrativa da vida de Joe, este comenta: _ Se você tem asas, por que não voar? Um pouco mais tarde, em uma cena um pouco mais longa, Seligman apresenta sua tipologia de pessoas: as que cortam primeiro as unhas da mão direita e as que cortam primeiro as unhas da mão esquerda. Para ele, essa escolha reflete a intenção de lidar com o mais fácil ou o mais difícil primeiro. (Fiquei pensando no caso dos canhotos, mas isso não importa agora!) Fernando Antonio Prado Gimenez


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Nessas frases vejo consequências ou razões que explicam porque pequenas empresas se tornaram longevas. A longevidade deve estar associada, é uma hipótese minha, à capacidade que os dirigentes de pequenas empresas têm de identificar as asas de seus empreendimentos e fazer pleno uso delas: voar!

Por outro lado, muitas vezes a longevidade, pode ser indicador de um caráter permanente na tomada de decisão presente nessas pequenas empresas. Creio que (é uma outra maneira de dizer hipótese), a longevidade dessas pequenas empresas está ligada ao cortar as unhas da mão esquerda primeiro! Fazer o mais difícil, o fácil é resolvido sem muito esforço. Eu ia escrever "o fácil é resolvido facilmente", mas alguém iria me acusar de pleonasmo inútil! Assim, usei "sem muito esforço" facilmente, que é a mesma coisa que facilmente! Mas, pelo menos mantive o estilo e pude brincar com você, leitora ou leitor. No domingo de manhã, mantendo o ritual com Dona Kilda, vou ler os jornais. Coisa que ela faz diariamente, logo após o café-da-manhã. No Jornal de Londrina, vejo uma reportagem, de Tatiane Salvatico que informa sobre a proposta do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina sobre a volta de quiosques em três pontos do calçadão de Londrina. Na mesma reportagem, há notícia de uma pequena empresa distribuidora de jornais e revistas que durou vinte e um anos, mas que praticamente se extinguiu quando houve a decisão da prefeitura na gestão de Barbosa Neto de retirar bancas e quiosques do calçadão e das ruas londrinenses. Esta história é um pequeno exemplo de que, muitas vezes, não basta usar as asas para voar ou cortar primeiro as unhas da mão esquerda. Há momentos, na vida das pequenas empresas, que o seu destino é ditado de fora. Assim, vou concluindo essas reflexões londrinenses nesta manhã de segunda, um pouco mais fresca do que os dias da semana passada. Escrevo esse post em uma lan-house na rua Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Piauí próxima ao prédio onde mora Dona Kilda. A Odissey, além de lan-house é também um estacionamento: dez vagas para carros e quinze computadores. Converso com um dos proprietários que me informa que estão há dez anos nesse local. Primeiro como estacionamento, a lan-house foi incorporada à empresa cinco anos depois. Na pequena empresa é possível ver a estratégia de diversificação. Pergunto por que fizeram isso. A resposta é na linha da asa para voar! Perceberam que havia demanda para esse tipo de serviço e resolveram utilizar as instalações de uma casa nos fundos do estacionamento. Será que se tornará uma pequena empresa longeva? Meus conhecimentos não me permitem arriscar uma resposta para essa última pergunta. Mas, ao menos o nome é o mesmo do poema épico atribuído a Homero. Está conosco há mais de 2.000 anos. Pode ser uma pista. O que inspirou o nome da empresa? Também não sei. Pode ter sido a Odisséia de Homero, ou pode ter sido algo mais prosaico como uma série de jogos eletrônicos! Aliás, aprendi a não fazer suposições apressadas com a Sara desde que, em Maringá, certa vez, ao indagar o nome de um jovem que me atendia em uma livraria, este respondeu: _ Sócrates. _ Que legal, como o filósofo. Eu comentei. Sara prontamente respondeu: _ Pela idade dele, deve ter sido uma homenagem que o pai fez ao jogador do Corinthians! Sábias palavras da Sara. As mulheres tem uma capacidade impressionante de me trazer de volta à realidade!

Fernando Antonio Prado Gimenez


A CUIDADORA DE SÓCRATES

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L

ara, biscatinha ou biscatona? Essa pergunta me pôs a pensar sobre a construção do sentido que damos às nossas vivências.

Paulo e eu estávamos tomando um chope na praça de alimentação de um shopping em Maringá, quando uma moça com uma bandeja na mão pediu licença para compartilhar nossa mesa: _ Posso sentar aqui? Daqui vinte minutos entro no trabalho. A praça está cheia. _ Fique à vontade, eu disse. Paulo e eu continuamos a botar o papo em dia. De repente, entre um gole de chope e uma batata frita, pergunto o nome da moça concentrada em seu almoço. _ Lara. E o seu? _ Eu sou o Fernando. Ele o Paulo. Você trabalha no shopping? _ Não. Estudo técnica de enfermagem e trabalho como cuidadora. Cuido de um senhor idoso. Começo meu trabalho daqui a pouco. Nesse ponto da conversa, o celular do Paulo toca. Era a esposa avisando que éramos esperados para almoçar na casa da sogra. Somos concunhados, o que significa que compartilhamos a sogra. Passa o dia, de noite ligo pro Paulo, perto das nove e meia: _ Paulo, já foi dormir? Eu perguntei. _ Ainda não. _ Então vou dar uma passada aí. Preciso comprar minha passagem de volta para Curitiba.

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Precisava usar a internet. Marinelva, nossa cunhada, vai comigo. Sara fica com a mãe, lhe fazendo companhia enquanto esperamos a chegada do corpo de Robinho que falecera em um acidente na Bahia.

Em casa de Paulo, conversamos sobre a morte. De repente surge a questão da velhice. Da velhice a conversa retorna à morte. Robinho, aos 44, morreu muito cedo. Mas, é a velhice que nos assusta mais que a morte. Nessa altura da conversa, Paulo se lembra da morte de Sócrates, o filósofo, não o futebolista. Para Paulo, o ato de Sócrates tomar cicuta poderia ser interpretado como uma escolha alternativa à velhice. Um sentido diferente àquele atribuído por muitos estudiosos, o de que Sócrates decidiu observar a lei, essa construção social que erigimos para tentar ordenar a vida coletiva. Para muitos, Sócrates era um legalista, o que justificaria sua escolha. Teria Sócrates decidido por sua morte ao invés dos riscos da velhice? Não temos resposta a essa pergunta. Mas, ela pode ser buscada em motivações distintas, razoavelmente verossímeis. Comento: _ Será que a escolha de Sócrates teria sido outra se naquela época houvesse cuidadoras? Minha pergunta surge da lembrança do encontro com Lara. Conto brevemente a história do encontro com Lara aos demais que participavam da conversa. De vozes femininas, surgem duas afirmações: _ Biscatinha! Uma disse. _ Biscatona! Ecoou outra. Lembrei-me da teoria de personalidade de George Kelly, que em 1955 propôs a Teoria dos Construtos Pessoais. Nesta teoria, Kelly defendeu a ideia de que os humanos constroem o significado de suas vidas por meio de um sistema de construtos. Esse sistema de construtos baseia-se na criação Fernando Antonio Prado Gimenez


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de categorias que usamos para classificar nossos eventos, coisas e pessoas com que convivemos.

As categorias surgem das similaridades e diferenças que percebemos no que vivenciamos. Uma forma de pensar parecida com a de um cientista. Os construtos que criamos são bipolares. Segundo Kelly, para o mundo ser compreensível, uma ideia só faz sentido se compreendemos o seu oposto. Gordo ou magro, bonita ou feia, triste ou alegre, limpo ou sujo, santa ou devassa, biscatinha ou... Desde os anos 90 do século passado, uso essa teoria para tentar compreender os modelos mentais que dirigentes de pequenas empresas desenvolvem para compreender o mundo de seus negócios e tomar decisões baseados neles. A beleza das ideias de Kelly - olha ai, eu em busca da beleza no conhecimento de novo - reside no dinamismo desse sistema de construtos. Cada um de nós desenvolve um sistema de construtos único, mas na interação com outros nossos sistemas vão sendo compartilhados e transformados, um vir a ser contínuo que só a morte interrompe. O que Lara seria? Muitas categorias poderiam lhe ser aplicadas, dependendo dos modelos mentais únicos de cada pessoa que pudesse presenciar a cena do shopping. Nesse momento senti falta do bom humor de Robinho. Resposta certa não importa agora! Talvez, essa poderia ser aproximada com um pouco mais de papo com Lara. Um telefonema abreviou essa conversa! A mesma coisa acontece nas minhas conversas com dirigentes de pequenas empresas. Alguém ou algo faz com que a conversa tenha que ser encerrada. Eu, pesquisador, fico com uma visão parcial de seus modelos mentais. Sempre tenho que reconhecer as limitações do que posso afirmar a partir dessas conversas. É a vida! É a condição constante da busca do conhecimento: a humildade de afirmar que a explicação dada faz sentido, mas pode ser outra. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Enfim, qualquer que seja a Lara, que seja feliz! Ao destino, meu muito obrigado por esse encontro. É provável que um dia, em um futuro muito distante, me lembre de Lara e busque os serviços de uma jovem cuidadora. Como ela mesmo disse em nosso curto encontro: _ Os homens preferem cuidadoras jovens! (Olha ai um modelo mental se exibindo a um cientista que queira enxergar). Prefiro isso à cicuta de Sócrates!

Fernando Antonio Prado Gimenez


A BELEZA NO EMPREENDER

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N

essa vida de pesquisador vou buscando ver além daquilo que me mostram os olhos e minha razão interpreta. Para isso, me apoio na emoção, essa experiência humana que os cientistas teimam em afastar da explicação científica. Mas, como sou teimoso, também, de vez em quando dou espaço para que a emoção me ajude na busca do entendimento do empreendedorismo. Uma das realizações humanas, que por ser conscientemente intencional, nos distingue de outros seres viventes. Pelo menos daqueles que compartilham nossa jornada nesse planeta Terra, que por enquanto são os únicos que conhecemos. Em um feriado nacional, estive em Londrina, cidade onde nasci e fiz meus estudos. Foi também nessa cidade que comecei minha carreira de professor e pesquisador da gestão de pequenas empresas e, depois, do empreendedorismo. Na Concha Acústica, próximo ao prédio de apartamentos no qual mora minha mãe teve uma apresentação da Orquestra de Londrina de Viola Caipira São Domingos Sávio. A orquestra é conduzida pelo maestro Edson, que na abertura do show comentou sobre a alegria de estarem se apresentando naquele espaço. A orquestra já conta com alguns anos de vida. Os ensaios semanais ocorrem em dois lugares. Um deles, por coincidência, é a antiga sede da Associação Médica de Londrina, hoje abrigando um espaço cultural do SESI, que fica em frente à praça onde está a Concha Acústica. Segundo o maestro, durante os ensaios da orquestra, ele, por muitas vezes, imaginou o dia em que os violeiros por ele conduzidos estariam na Concha Acústica que enxergava através das janelas da sala de ensaios. Para um bom observador, era visível nos olhos do maestro a emoção vivida naquela instante. Embalado pelas músicas que a orquestra ia tocando fui tomado por uma inspiração: há no empreender uma beleza! Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Entre tradicionais canções caipiras, o maestro nos apresentou outros ritmos: o batuque ou samba caipira, o valseado, o cururu e outros cujo nome não guardei. À minha frente, eu via a beleza se materializando e não pude deixar de associá-la à necessidade de realização.

Esta categoria foi sugerida por David McClelland no começo dos anos 60 do século passado, como um dos principais motivadores do comportamento empreendedor. Mas, minha ousadia quase sexagenária, me fez pensar que há algo antecedente que ajuda a explicar o comportamento empreendedor da qual não falou McClelland. Antes da necessidade de realização, passei a acreditar que empreender é guiado pela nossa constante busca da beleza. Esse conceito tão relativo que a sabedoria popular já imortalizou no velho ditado: quem ama ao feio, bonito lhe parece. Mas, a leitora ou leitor, com certeza me alertaria: _ Fernando, você está falando de um empreendimento cultural, que provavelmente não tem finalidade lucrativa. Além do mais é um empreendimento voltado para uma das artes que mais nos emocionam, a música. Assim é fácil enxergar a beleza no empreender. Mas, será que ela existe em outros tipos de empreendimentos mais tradicionais, vamos dizer, onde o dinheiro é a meta de resultado mais objetiva? Pois é, o problema de escrever para gente inteligente é esse: nunca se dão por satisfeitos! Teimam em colocar senões, poréns, noentantos, vejabens, contudos e todavias no meio da conversa! Deixando-me em uma sinuca de bico, leitor e leitora espertos! Será que consigo sair dessa! Vou tentar. O máximo que pode acontecer é eu gastar um pouco mais da bateria do computador, enquanto exerço essa deliciosa arte de refletir e escrever aguardando o voo que me levará de volta para Curitiba.

Fernando Antonio Prado Gimenez


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O que não escrevi no começo é que a apresentação da Orquestra de Viola Caipira estava acontecendo como uma das comemorações que marcavam os cinco anos de criação da Rota do Café. Esta é um roteiro turístico que foi criado no norte do Paraná por um conjunto de empreendedores rurais que preservam a história e cultura das antigas fazendas de café que fizeram a fama de Londrina e região nos anos 50 e 60. Café, o famoso ouro verde, que tanta riqueza trouxe para esta parte do Paraná e que uma geada negra dizimou em um inverno mais rigoroso.

Antes da apresentação da orquestra, a coordenadora desse grupo de empreendedores fez uma breve apresentação do que é a Rota do Café. Nesta apresentação, com a presença de sete representantes dos empreendimentos rurais, percebi nos olhos da oradora a mesma emoção que estava nos olhos do maestro. Ela discorreu sobre a Rota do Café de uma forma tão bela. De novo enxerguei em seu relato a busca da beleza guiando a necessidade de realização das mulheres e dos homens empreendedores ali presentes. A beleza dos objetivos e da forma como foi surgindo a Rota do Café. Mas, sei que o amigo leitor e a amiga leitora ainda não estão satisfeitos. Assim, faço mais um esforço de memória e vou buscar no passado momentos de conversas com empreendedoras e empreendedores. Reencontro nessas memórias, outros exemplos em que a beleza se exibiu para meus olhos, mas não dei muita bola. Por exemplo, as cinco empreendedoras de Cascavel que entrevistei sobre as suas jornadas, dois ou três anos atrás. Algumas delas me mostraram o belo no que estavam empreendendo. Enxerguei esta beleza na forma como tentavam cativar clientes, estimular colaboradores, envolver filhos e filhas na empresa, na busca de um diferencial que marcasse a trajetória empresarial. A busca da beleza guiou essas mulheres também em suas ações empreendedoras. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Quer mais um exemplo? Na semana passada conduzi um debate com três jovens empreendedores: o criador de uma revista de disseminação científica, um dos fundadores de uma escola de empreendedorismo e uma consultora de empresas. Isto foi durante o V encontro sobre Inovação e Empreendedorismo na UFPR. Na história de cada um deles houve momentos em que a beleza se manifestou. Cada um a seu jeito, com seus empreendimentos, buscava um mundo melhor. Mas, você já parou pra pensar o que significa um mundo melhor? Entre outras coisas, um mundo melhor tem que ser um mundo mais belo!

O argumento ainda está fraco, pouco racional, eu sei! Além do mais, está chegando a hora do embarque. Vou parar por aqui. Prometo que não vou escrever nada depois, nem revisar o texto antes de postá-lo em meu blog. Mas, você que me lê há de concordar: falar da beleza envolve muito mais a sensibilidade do que a razão. Não lhe convenci? Não importa, mas para mim, a partir de agora, tenho mais alguma coisa para observar em minhas conversas com as mulheres empreendedoras e com os homens empreendedores: a beleza no empreender. Afinal de contas, quem ama o feio, bonito lhe parece! P.S.: Meu voo foi atrasado em três horas! Mas mantive a promessa feita acima. O texto não sofreu edição antes de vir parar aqui.

Fernando Antonio Prado Gimenez


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A COBRADORA DE ÔNIBUS, O GUIA CEGO, A JOVEM ESTUDANTE DE CINEMA E O EMPREENDEDORISMO: COMO ELES SE ENCAIXAM?

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m quatro dias, vivenciei duas situações inusitadas que me fizeram refletir sobre como construímos nossa visão de mundo. Na literatura sobre empreendedorismo, encontram-se muitos estudos que procuram explicar as formas como esse fenômeno ocorre buscando explicações nos modelos mentais que homens e mulheres utilizam em momentos de decisão empreendedora. Um dos aspectos que é frequentemente tratado diz respeito à existência de modelos que guiam as escolhas feitas por empreendedoras e empreendedores nos momentos iniciais da criação de um empreendimento. Ora, a existência de alguém que serve de guia sobre como agir durante o processo empreendedor nada mais é do que um modelo mental que as pessoas desenvolvem, ao longo de sua vida, sobre o que significa ser empreendedor. São muitos os possíveis modelos que são citados em pesquisas com empreendedores. As figuras maternas e paternas, quando empreendedoras, costumam estar entre os mais citados. Modelos podem ser construídos, também, a partir do convívio com outros empreendedores, muitas vezes em uma relação de emprego. Outros são pessoas que são apresentadas na mídia de negócios como empresários bem sucedidos. Relações de amizade são fonte de inspiração para modos de agir empreendedores. Na verdade, os indivíduos que são citados em levantamentos com homens e mulheres que criaram empresas ou outras organizações são tão diversificados quantos são os papéis que pessoas podem exercer em nossa vida. Isso implica, na minha percepção, que ao invés de elencarmos quais são os possíveis modelos, seria mais útil tentar entender por que praticamente todos aqueles que empreenderam reconhecem a existência de referências Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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empreendedoras em seus modelos mentais. A busca desse porquê deve nos revelar, é minha hipótese, que os modelos são percebidos como indicadores de escolhas bem sucedidas e a imitação de seus passos causa uma sensação de maior segurança ou menor incerteza para aqueles que empreendem. Uma situação interessante é quando alguém nos aponta um modelo negativo ou um anti-modelo. Isto é, uma referência que é tida como o oposto daquilo que a empreendedora ou empreendedor pensa que deva ser a forma mais correta de agir. De qualquer forma, o ant-imodelo não deixa de ser uma referência que guia decisões no processo empreendedor. Por outro lado, obviamente, seja um modelo ou um antimodelo, os dois são fontes limitadas de orientações, pois a complexidade do processo empreendedor impede sua emulação integral, assim como a impossibilidade de alguém conhecer toda a trajetória empreendedora de seu modelo acarreta momentos de decisão em que não há como se inspirar nos modelos. Aliás, você há de convir comigo, se o processo empreendedor fosse apenas uma questão de imitação seria muito chato! Mas, de qualquer forma meu caro leitor, os modelos existem, e são parte do modelo mental mais amplo de empreendedores e empreendedoras. E, ainda mais, é prática comum na literatura mais prescritiva e nos programas de fomento ao empreendedorismo a utilização de empreendedores mais experientes como tutores de empreendedores iniciantes que dão sugestões de como os noviços devem se posicionar em suas escolhas empreendedoras. Essa prática faz sentido porque temos a crença de que muitas situações no processo empreendedor se repetem nas diversas trajetórias empreendedoras e ao sugerir a adoção de tutores, a literatura reforça essa noção de que modelos são relevantes no processo empreendedor. A vantagem é que com tutores o modelo ganha voz. É possível dialogar com um tutor ao passo que com um modelo abstrato as decisões são guiadas por Fernando Antonio Prado Gimenez


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uma percepção ou imaginação de como o modelo agiria em cada situação.

Nessa altura do texto, é quase visível algo que deve estar na sua mente minha cara leitora e meu prezado leitor. E não é um modelo mental! É uma pergunta: _ Mas afinal Fernando, quais foram as duas situações que você vivenciou em quatro dias? E o que elas têm a ver com essa lenga-lenga sobre modelos, anti-modelos e tutores empreendedores? Calma, já vou falar disso! Na verdade, o que me aconteceu, foi que essas duas situações me levaram a questionar a utilidade de tentarmos entender o papel de modelos mentais que são referência para empreendedoras e empreendedores. Se você pensar bem, talvez concorde mais uma vez comigo, espero não estar pedindo muito de você. Mas, indo direto ao ponto, depois do que vivi nessas situações separadas por um período de quase 100 horas, cheguei à conclusão que a necessidade de referências que nos guiem, fazem parte de toda nossa existência. Não há utilidade nenhuma em investigarmos a existência e o papel que modelos exercem no processo empreendedor. Se na nossa vida sempre precisamos de modelos, essas referências não nos ajudam a esclarecer o empreendedorismo em particular. Energia desnecessária sendo gasta em pergunta de pesquisa irrelevante! Antes que você se irrite ainda mais, vamos às situações. Outro dia, precisei descobrir como chegar de ônibus até próximo do estádio do Atlético tendo como ponto de partida a estação tubo em frente ao Museu Oscar Niemeyer. Poderia ter perguntado ao Google, mas entrei na estação tubo e perguntei à cobradora, que em meu modelo mental, era e melhor pessoa para me guiar. Ela não soube me dizer! Mas, para minha sorte, estava na estação tubo um passageiro cego que me disse: Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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_ Desça na estação Comendador Franco, peque o Santa Cândida Pinheirinho e vá até a estação Água Verde. É o mais próximo que você pode chegar sem pagar outra passagem de ônibus. Fui guiado por um cego! Legal, né? O cego conhecia mais dos trajetos do que uma cobradora aparentemente bem dotada de visão. O que aprendi com isso? Algumas vezes, nosso modelo de referência pode ser inútil! Em sua trajetória de vida pode não ter passado pela experiência na qual precisamos de orientação. Tenho certeza que muitas empreendedoras e muitos empreendedores já enfrentaram situação semelhante: o modelo falhou! Espero que tenham encontrado um cego com conhecimento para ajudá-las ou orientá-los.

A outra situação me sugeriu a suspeita de que modelos e referências podem ser onipresentes em nossa vida. Ou seja, sempre há referências que assumimos como modelos dos quais tentamos nos aproximar por meio da imitação de seus atos. Como cheguei a essa conclusão? Por meio de uma pergunta que me fez uma jovem estudante de cinema quatro dias depois. Dava uma palestra para um grupo de jovens que estão participando de um programa que os está capacitando para atuação na produção de audiovisual. Falei sobre Economia Criativa, Sustentabilidade, Cinema e Empreendedorismo. Foi uma experiência ímpar para mim, pois foi a primeira vez que falei sobre Cinema, este campo de atividade para o qual aos poucos vou me direcionando. Ao final da palestra, quando estávamos conversando e trocando impressões sobre o mundo do cinema e as possibilidades de empreender no setor de audiovisual, Camila me fez uma pergunta: _ Fernando, quais são suas referências? Na música, na literatura, no cinema? Veja você, foi a primeira vez que alguém me perguntou sobre minhas referências e não se referia ao campo da Administração. De repente, com essa pergunta, percebi que Fernando Antonio Prado Gimenez


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há modelos na minha mente que não têm nada a ver com empreendedorismo e gestão de pequenas empresas. Não sei se você é capaz de imaginar o quanto essa pergunta da jovem Camila me fez bem! Poder falar de referências que não eram Mintzberg, Schumpeter, Miles e Snow, Filion, entre outros. De repente, lá estava eu falando de Jornada nas Estrelas, Chico Buarque, Dalton Trevisan, Kubrick, Buñuel, Vinicius de Moraes, Domingos Pellegrini. Machado de Assis... Há modelos em minha mente que não têm nada a ver com a forma com que lido com o processo de pesquisa em empreendedorismo e gestão de pequenas empresas. Deve haver outros! É só alguém fazer a pergunta certa! Mas, se modelos fazem parte de todas as facetas de minha vida, eles devem fazer parte de todas as facetas da vidas de homens e mulheres que empreendem. Não é nada peculiar dos empreendedores! Assim, o ganho de conhecimento que essa informação pode nos trazer é muito pequeno! Deve haver outras perguntas melhores a serem feitas para que compreendamos mais sobre o processo empreendedor.

Enfim, essa história ficou mais longa do que eu esperava. No entanto, consegui fazer algo que estava na minha cabeça desde que entrei naquela estação tubo: tenho que usar a situação do guia cego em algum texto sobre empreendedorismo! Graças à pergunta da Camila, as coisas se encaixaram, e a vida mais uma vez fez sentido!

Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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DE COMO A MORTE DE DONA DUARTINA ME MOSTROU A IMPORTÂNCIA DA VISÃO SISTÊMICA

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o final dos anos 70 do século passado, eu trabalhei durante alguns meses em um laboratório de análises clínicas em Londrina. Ainda estudante de Administração, depois de um desentendimento com meu pai, decidi deixar de trabalhar na empresa familiar - o Supermercado Gimenez - e fui à busca de alguma alternativa. Sem demora, graças a contatos quase familiares (mais abaixo você vai entender), fui contratado para um trabalho administrativo em um laboratório que prestava serviços para todos os hospitais de Londrina. Minha tarefa inicial era montar um procedimento de registro e controle dos serviços de laboratório que eram feitos para os pacientes internados nos hospitais. Eram tempos em que as facilidades da Internet e outras tecnologias de informação e comunicação não existiam. Não tinha nem computador! Se não me falha a memória, nessa época era tudo feito em máquinas de escrever, calculadoras e folhas de papel. Computador pessoal não tinha sido inventado ainda. Mirian, irmã de minha namorada (Telma) e administradora formada pela Universidade Estadual de Londrina, era gerente do laboratório e me deu muita autonomia para desenvolver o trabalho. Os exames feitos nos pacientes internados nos hospitais eram solicitados a partir do preenchimento de um formulário onde constavam nome do paciente, nome do hospital e médico solicitante e exames necessários. Preenchido em várias vias, não me lembro de quantas, uma dessas vias passou a ser encaminhada para que eu fizesse o registro e, periodicamente, enviasse as informações para que os valores fossem cobrados dos hospitais. Nada complicado! O que eu tinha que fazer era montar um relatório de cada paciente que deixasse o hospital com as informações sobre exames realizados de forma que o setor de faturamento do laboratório pudesse efetuar a cobrança. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Minha primeira tarefa foi criar uma maneira de receber a informação sobre os pacientes que deixassem os hospitais. Como disse, não havia internet naquela época. Assim, a forma que melhor resolvia meu problema era buscar essa informação nos hospitais. Todo dia de manhã, eu fazia a ronda dos hospitais que tinham pacientes atendidos pelo laboratório e pegava uma cópia da relação dos pacientes em alta. Esse giro diário pelos hospitais, de segunda a sexta, era feito na companhia do Cido, motorista do laboratório. Cido era uma companhia agradável e me divertia muito com as histórias de hospital que ele contava. Era ele quem levava os profissionais do laboratório para fazer coleta de materiais para exames. Naquela época, Londrina não era uma cidade tão grande como hoje. Como londrinense, originário de uma família que veio para Londrina no começo dos anos 40, e filho de comerciantes, conhecia muita gente. Era inevitável que muitos dos pacientes que passavam pelos hospitais e recebiam os exames do laboratório tivessem nomes conhecidos. Particularmente, aqueles que eram fregueses do Supermercado Gimenez. Foi assim, que certo dia, descobri que Dona Duartina, uma simpática velhinha que morava na vizinhança do supermercado de meus pais, cliente que fazia compras quase que diariamente, estava internada na Santa Casa de Londrina. Não pude visitá-la, mas sua passagem pelo hospital mostroume que o sistema de registro e controle que montara estava falho. Com o passar dos dias, muitos exames foram solicitados pela equipe médica que cuidava de Dona Duartina. Os formulários foram se acumulando, até que um dia deixaram de chegar solicitações de exames para Dona Duartina. Mas, o nome dela não aparecia na relação de alta que diariamente eu colhia na Santa Casa. Depois de mais de uma semana, lendo o obituário da Folha de Londrina, descobri que Dona Duartina havia falecido. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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E descobri um erro grave de meu sistema! Eu não estava pegando a lista completa dos pacientes que saíam dos hospitais. Eu havia me esquecido que além da alta, havia outra forma de deixar um hospital, o óbito!

Se eu tivesse aplicado a visão sistêmica que eu havia aprendido nas minhas aulas da graduação em administração de forma mais competente não teria feito esse erro. Eu havia aprendido que todo sistema aberto tem entradas e saídas e, para entendê-lo, temos que conhecer tudo que o sistema recebe do seu ambiente (suas entradas) e tudo que devolve para o ambiente (suas saídas). Minhas informações sobre as formas de saídas de pacientes de hospitais eram incompletas e, portanto, meu sistema de registro e controle também era. Simples assim! Fiquei mais alguns meses trabalhando no laboratório, mas o apelo da empresa familiar foi mais forte. Acabei retornando para o Supermercado Gimenez. Pouco mais de um ano depois, terminei a graduação, comecei minha carreira de professor no Departamento de Administração da UEL, e comecei meu mestrado em Administração na USP em 1982. Foi lá que aprendi uma forma de descrever um sistema que nunca mais esqueci. Já contei isto em outro texto, mas vale a repetição. Foi em uma disciplina de Sistemas Administrativos, que o Professor Oswaldo Scaico nos mostrou uma forma de descrever um sistema que tem me ajudado a lidar com as diferentes organizações nas quais trabalhei ao longo das últimas três décadas. Como nos ensinou o Professor Scaico, para entender um sistema temos que pintar suas CORES. Um sistema é um conjunto de Componentes interligados, que tem um Objetivo, transformando sob Restrições, Entradas em Saídas. Como você percebeu, as CORES de um sistema dizem tudo sobre ele. De forma resumida, é claro!

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NAMOROU, PERDEU VIDA! OU, A ADMINISTRAÇÃO, TESTEMUNHA OCULAR DO EMBATE ENTRE SUSTENTABILIDADE E COMPETITIVIDADE

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a tarde em que dei início à série de quinze encontros de minha nova disciplina no Doutorado em Administração da Universidade Federal do Paraná, recebi Thálita, Rodrigo, Eduardo e Luiz Aurélio, doutorandos, que se juntaram a mim nessa jornada de estudos sobre Empreendedorismo, Sustentabilidade e Inovação. Nosso objetivo era usarmos as quinze semanas para ler, discutir e refletir sobre textos que tratem das possíveis relações entre os três temas. Adotamos uma dinâmica que venho sugerindo aos meus alunos há algum tempo: cada um de nós é responsável pela leitura de um conjunto de textos, elaboração de um resumo, e apresentação do conteúdo para os demais. Em conjunto, passamos por sessenta textos publicados no Brasil e exterior nos últimos quinze anos. No primeiro encontro, tratamos dos primeiros cinco textos: dois brasileiros e três estrangeiros. Entre as discussões que os artigos suscitaram, acabei sugerindo que parece haver uma tensão entre as noções de sustentabilidade e competitividade que precisa ser resolvida. A sustentabilidade pode ser vista como um estado futuro desejado, resultante de um processo de desenvolvimento sustentável, que reflete um equilíbrio entre as dimensões sociais, ambientais e econômicas da vida organizacional e, de forma mais ampla, da sociedade. Ora, conciliar justiça social no acesso aos frutos do labor humano, com a preservação do ambiente em que vivemos e, ao mesmo tempo, ser eficiente na utilização de recursos financeiros, fazendo com que ganhos econômicos sejam maiores que os gastos, não é tarefa trivial. Em um dos textos que lemos, os autores sugeriram a articulação da sustentabilidade com modelos de negócios inovadores. Na essência, o argumento deles pode ser sintetizado na ideia de que a sustentabilidade será uma Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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maneira de tornar os negócios mais competitivos. Mas, é a competitividade consistente com a busca da responsabilidade social, um dos pilares do desenvolvimento sustentável? Em minha opinião, não! Ser competitivo, no limite, é tentar atrair o máximo de riqueza gerada em determinada atividade empresarial para um empreendimento. Ora, essa lógica, pode levar, por exemplo, à eliminação de concorrentes, à geração de oligopólios ou monopólios. Essa eventualidade pode ser vista como uma realidade socialmente justa? Penso que não! Naquele dia, fiz esta provocação, ainda pouco elaborada, para os meus companheiros de estudo nesses temas. No mínimo, merece uma reflexão, embora deva reconhecer que há muitos aspectos a serem analisados. No entanto, minha intuição me leva a confiar muito nesse sentimento que brotou em meu cérebro naquela tarde.

Em outro texto, quatro pesquisadores brasileiros abordaram a questão da inovação sustentável a partir de uma perspectiva centrada na Teoria Institucional. Ao comentarem sobre o que levaria as organizações a agirem de forma sustentável, sugeriram duas explicações. Estas são baseadas na ideia do isomorfismo organizacional. Para nossos colegas, as empresas fazem ações de responsabilidade social e ambiental motivadas por pressões coercitivas da sociedade ou de outras organizações mais poderosas, o chamado isomorfismo coercitivo. Outra fonte é o chamado isomorfismo mimético, ou seja, algumas organizações imitam o comportamento de outras que, aparentemente, foram bem sucedidas em ações dessa natureza. Não sou um profundo conhecedor da Teoria Institucional, mas me chamou a atenção que os pesquisadores não fizeram nenhuma menção a um terceiro tipo de isomorfismo que, se não me engano, é um dos pilares das explicações institucionais dadas à vida organizacional: isomorfismo cognitivo/normativo. As organizações podem se tornar semelhantes em suas ações devido à ação de grupos de pessoas que tiveram processos formativos semelhantes em Fernando Antonio Prado Gimenez


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que foi dada ênfase a determinadas normas que devem ser observadas na realização de atividades empresariais. É o caso, por exemplo, de uma formação superior em determinado campo de conhecimento que acaba uniformizando a forma de agir dos profissionais, mesmo que em diferentes organizações.

Foi nesse momento, que um segundo incômodo em relação à sustentabilidade voltou a se manifestar em meu cérebro. É um incômodo quase físico! Ora, se pretendemos levar as empresas a se comportarem de forma sustentável, precisamos convencer os futuros administradores que sua prática profissional deverá ser orientada por princípios consistentes com o desenvolvimento sustentável. Esse é o papel principal das escolas de Administração! Estamos conseguindo fazer isso? Acho que não! Nosso encontro terminou às cinco horas da tarde. Passei em minha sala, terminei um trabalho que estava fazendo, fui para o ponto de ônibus, embarquei no Portão/Cabral, chegando ao Terminal Cabral, e às seis e quinze estava a caminho de casa em um Inter2. Coloquei-me em pé, próximo a uma das portas, pois desembarcaria no próximo tubo. Não pude deixar de ouvir a conversa de dois adolescentes, perto dos seus 16 anos. Um deles comentava com o outro como estava super atarefado. Tanta coisa para fazer, estudar inglês, aprender computação, tarefas das disciplinas, a importância de dominar o Excel, o Office, mesmo que só o básico. Contou para o amigo: _ Meu pai trabalha em uma grande empresa. Sempre tem oportunidades de estágio. Outro dia, tinha dois candidatos em iguais condições, mas um deles dominava o Excel, a outra não. Quem ficou com a vaga? O rapaz que sabia Excel. A menina dançou! O amigo só ouvindo. O outro continuou: Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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_ 24 horas é pouco. Se você dorme, não faz! Se faz, não dorme! _ É. Disse o outro. O tempo é curto. Ainda mais agora que estou com namorada. _ Namoro? Namorou, perdeu vida!

Fiquei estupefato com a resposta do primeiro. Chegamos ao tubo onde eu desceria. O jovem com namorada desceu à minha frente. A namorada esperava por ele na saída do tubo. Ela até que não era muito bonita, mas pensei comigo: _ Quem está perdendo vida é o idiota que ficou no ônibus! Estamos fazendo muito mal aos nossos jovens com essa conversa de competitividade. Vamos falar mais de sustentabilidade para eles?

Fernando Antonio Prado Gimenez


O SEXTO P DO EMPREENDEDORISMO: PRAZER

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H

á dias estava com uma ideia na cabeça. Ao ouvir uma frase dita por uma personagem de seriado na televisão brasileira que dissera fazer algo por prazer e não por necessidade, imediatamente lembrei-me da oposição necessidade versus oportunidade no empreendedorismo. Foi o momento da inspiração em que surgiu a possibilidade de juntar empreendedorismo com prazer. Mas, não avancei na ideia naquele momento. Passando férias em São Francisco do Sul, fui ao Café da Praia na Prainha. Na companhia de Sara, sua mãe, Dona Aparecida, e suas irmãs, Nezilda e Marinelva, saímos em busca de um café e nos dirigimos à Prainha. Já havíamos visto o Café da Praia outro dia pela manhã, quando estava fechado. Decidimos experimentar o lugar. O Café da Praia fica em um conjunto de pequenos empreendimentos em uma esquina. De um lado, há um restaurante especializado em tacos, nachos e burritos. No outro, uma loja de artesanatos. Depois de nos acomodarmos, esperamos algum tempo pelo nosso pedido. Houve certa demora na elaboração dele, mas em férias, ninguém tem pressa. Depois de algum tempo, minhas companheiras de viagem resolveram entrar na loja de artesanato. Eu fui pagar a conta. Depois caminhei um pouco pela pequena orla da Prainha. Sabia que a visita à loja de artesanato não seria de curta duração! Como o movimento estava mais tranquilo, ao pagar a conta, perguntei a Fernanda desde quando o Café da Praia existia. Fernanda é uma das proprietárias e minutos antes estivera em nossa mesa perguntando sobre como tinha sido a experiência de consumo. Em especial, queria saber se havíamos apreciado o Café da Casa, uma criação dela feita com um tipo de café originário de Minas Gerais, com creme, canela e temperado, também, com cardamomo. Apresentouse e pediu desculpas pela demora. Em uma breve conversa Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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com ela e o companheiro, cujo nome não guardei, descobri que o Café da Praia ainda não tinha um mês de existência. A ideia surgiu a partir da prática de Fernanda e seus familiares de fazerem tortas, salgados e doces que os amigos gostam muito. Em um mês, os dois e mais uma sócia aproveitaram a disponibilidade do espaço para alugar e resolveram criar o Café da Praia. Os dois são formados na área da Biologia. Ela tem mestrado e ele doutorado em Oceanografia. A terceira sócia não conheci. Ao indagar sobre a continuidade das atividades no campo da biologia, ele me respondeu que Fernanda se dedicará integralmente ao Café da Praia junto com a outra sócia que não conheci, enquanto que ele manterá suas atividades profissionais. Para quem estuda empreendedorismo, esta é uma história comum. Alguém que sabe fazer algo muito bem, resolve ofertar os resultados de sua prática em alguma forma de empreendimento. Mas, nessa breve conversa que tive com esses jovens empreendedores, uma frase de Fernanda me fez pensar na questão do prazer no empreender. Ao final da conversa, ela disse, não exatamente com essas palavras, algo assim: _ Nós não colocamos muitas mesas no espaço externo, pois sabemos que ainda temos uma capacidade de atendimento limitada. Gosto de passar pelas mesas e conversar com os clientes. Essa frase junto com a maneira com que Fernanda nos abordou em nossa mesa e a descrição que fez do Café da Casa, curiosa em saber nossa reação, me dizem que há no empreender um sexto P que não me ocorreu quando escrevi sobre os Cinco Ps do Empreendedorismo. Estes passam agora a ser seis. Na prática do empreendedorismo há uma fruição do prazer que se origina de muitas possibilidades. Entre elas, há sem dúvida, o prazer de fazer algo de que se gosta e que agrada a Fernando Antonio Prado Gimenez


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outras pessoas. Outra forma de prazer tem a ver com a noção de que a pessoa que empreende é motivada pelos resultados que obtém. Como bem disse McClelland, resultado não é apenas uma questão de dinheiro, embora esta seja a forma mais objetiva de mensurar resultados em um empreendimento comercial.

Fernanda, ao buscar nossa impressão, estava na verdade em busca da confirmação de que o que fizera com prazer proporcionara prazer a outros. Se pensarmos bem, esta é uma das motivações principais que levam as pessoas a empreenderem. Em muitas conversas com mulheres e homens que empreendem observo a satisfação com que falam sobre seus empreendimentos. Ora, para mim, satisfação é uma decorrência do prazer. Não se fica satisfeito se não existe o prazer. Concorda comigo?

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CAPACIDADES SUPERCALIFRAGILISTICEXPIALIDOCIOUS: MARY POPPINS E A QUASE MÁGICA DA ADMINISTRAÇÃO

L

endo uma dissertação, da qual seria um dos examinadores, comecei a refletir e entrei em um looping aparentemente infinito:

Vantagens renovadas.

competitivas

precisam

Para isso, os administradores capacidades dinâmicas.

ser

constantemente

precisam

desenvolver

Mas, para desenvolver capacidades dinâmicas necessárias capacidades distintas, as superdinâmicas.

são

Para construir capacidades superdinâmicas são utilizadas as capacidades ultradinâmicas. Por sua vez, para desenvolver capacidades ultradinâmicas, creio que os administradores precisam das capacidades hiperdinâmicas. Mas, como desenvolver capacidades hiperdinâmicas? Óbvio! Pela aplicação de capacidades megadinâmicas. As capacidades megadinâmicas se tornam reais quando os administradores fazem uso das capacidades macrodinâmicas. Mas, estas só existirão se os administradores conseguirem criá-las pela aplicação de capacidades gigadinâmicas. E as gigadinâmicas como surgem? Pelo uso das capacidades megablasterdinâmicas. E por aí vai... Até que os administradores precisem pedir ajuda a Mary Poppins com as capacidades supercalifragilisticexpialidocious. Afinal de contas a Administração é quase uma mágica! Vocês não imaginam o que é possível fazer com um piscar de olhos. A propósito, a dissertação era muito boa. Leitura prazerosa e útil! Sempre aprendo com as dissertações que leio. De vez em quando, até divago! Fernando Antonio Prado Gimenez


VONTADE JUNTA NECESSIDADE COM OPORTUNIDADE?

C

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hove. Céu nublado. Um cinza quase branco. Trovoadas discretas, junto com o barulho da chuva, me despertam.

Basta uma palavra. Hoje foi chove. Em meu celular, faço o registro. Outras se juntam. São como a chuva e as trovoadas. Necessidade ou vontade? O que motiva a escrita? Rio sozinho. Ainda bem que é cedo. Fora de casa. Ninguém para comentar: _ Ficando maluco? Rindo à toa! Logo cedo! Explico. Quem me conhece já sabe. Você, talvez não. Estudo empreendedorismo. Necessidade ou vontade me fizeram lembrar uma pergunta que se faz nesse campo: necessidade ou oportunidade? São tidas como as duas principais motivações do ato de empreender. Para alguns, são como o dia e a noite, ou vampiro e luz do sol. Nunca estão juntas. Mas, eu acho que são como a chuva e as trovoadas. Às vezes estão juntas. Nem sempre, mas pode acontecer. Quer um exemplo? A busca da oportunidade vem com a necessidade de empreender. Juntas elas dão uma vontade de agir na pessoa que é quase irresistível. Pronto juntei as três! Nada mal para um texto que começou meio molhado. Nesse domingo de manhã, me sinto à vontade para juntar palavras. Mas, essa é outro tipo de vontade. Ou não? Chuva parando. Aproveito a dica. Vou parando por aqui. Só faltava o título. Foi o que você leu primeiro, mas foi o que escrevi por último. Quando escrevi chove, não tinha a mínima ideia do que vinha pela frente. Mais uma leve trovoada se junta ao ponto final. Ponto.

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NITIS JACON, UMA EMPREENDEDORA CULTURAL

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P

assando férias em São Francisco do Sul, na casa de minha irmã Kilda, encontrei um livro escrito por Nitis, Memória e recordação Festival Internacional de Londrina - 40 anos. Nele, uma dedicatória de Nitis para Kilda. Sem data. Apaixono-me pelo relato de Nitis e decido, após sua leitura, escrever esse texto. Em férias, deixo a imaginação e emoção me guiarem. Inspirado pelo relato de Nitis, quero registrar a minha percepção dela enquanto empreendedora cultural à frente do Festival Internacional de Londrina (FILO). Me vem à mente, meu primeiro escrito sobre o tema. Foi, também, inspirado por uma mulher. Uma cineasta. Registrei minha reação às palavras de Lucia Murat quando, alguns anos atrás, em maio de 2013, ao assistir a sua palestra em Curitiba, antes da exibição do making of do filme A memória que me contam, inspirei-me na possibilidade dela ser vista como empreendedora cultural. Você deve ter lido este texto neste livro; Fui professor da Universidade Estadual de Londrina durante 17 anos. Entre 1981 e 1998, tive a oportunidade de ver muitas apresentações teatrais que aconteciam anualmente nas edições do FILO. Era inevitável ver a figura marcante de Nitis durante as realizações do FILO. Todavia, nunca fomos próximos. Eu admirava o trabalho que ela realizava, mas como professor do Departamento de Administração havia poucas chances de contato com ela. Ademais, minha timidez impedia uma aproximação a esta mulher forte. O que podia eu falar a alguém que fazia tanto? Compromissos universitários acabaram nos levando a conviver, ainda que por períodos curtos. Certa vez, eu era chefe do departamento e Nitis, como vice-reitora, foi à abertura de um evento de nosso curso. Naquele dia, usei uma metáfora sobre o cinema para falar sobre o ensino de Administração. Nitis reforçou minha metáfora usando a Fernando Antonio Prado Gimenez


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poesia em sua fala. Foi um momento em que, juntos, misturamos razão e emoção. Lembro-me de um encontro com Nitis, também quando era vice-reitora da UEL e eu, por apenas seis meses, fui coordenador de ensino de graduação da UEL. Este era um cargo semelhante a Pró-reitor que na estrutura administrativa da UEL tinha um nome diferente. Portanto, segundo escalão. Eu fora convidado pelo reitor Jackson Proença Testa para assumir esta função devido ao falecimento do Professor Abdo, que era o coordenador anterior. Logo no começo, certo dia, eu estava chegando para trabalhar na minha sala da CAE e Nitis me abordou no estacionamento. Veio me abraçar e dizer que estava muito feliz por minha indicação para o cargo. Ela ficara curiosa em saber quem eu era e descobrira que era irmão de Kilda. Minha irmã, também professora na UEL, auxiliava nas atividades do FILO na condição de tradutora e intérprete para os convidados estrangeiros por meio de seu domínio da língua inglesa de que era professora. Minha curta estadia na CAE me aproximou um pouco de Nitis. Alguns anos depois, quando ela foi presidenta do Centro Cultural Teatro Guaíra, entre 2003 e 2005, eu estava em Curitiba como diretor de Administração da Fundação Araucária. Tivemos a oportunidades de nos encontrarmos algumas vezes. Caminhos diferentes acabaram nos afastando geograficamente. Fiquei em Curitiba e ela voltou para o norte do Paraná. O empreendedorismo cultural tem me atraído recentemente. É um tema de estudo que me cativa devido ao que chamo de dupla lógica de atuação. Aquelas(es) que empreendem culturalmente, ao mesmo tempo em que seguem uma lógica criativa nas suas ações, precisam desenvolver, também, habilidades de negócios, visto que seus empreendimentos culturais estão imersos em uma sociedade capitalista e Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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dependem de recursos financeiros. É um campo de ação onde emoção e razão convivem diuturnamente. É um processo contínuo de construção de uma identidade empreendedora, em que o sentimento de realização vem de uma capacidade de se comunicar criativamente de forma a atingir metas artísticas e viabilidade econômico-financeira. No livro de Nitis encontrei um relato sincero em que as emoções, frustrações, alegrias, desejos, dúvidas e dívidas foram os personagens ocultos de um drama que se repete anualmente, quase sempre com final feliz. O que vi foi um relato que reforçou minha crença na noção de que o empreendedorismo, em geral, e o cultural, em particular, é uma maneira que temos de nos expressar para o mundo. Seja nos seus estágios iniciais, quando o empreendimento está se formando, seja mais tarde quando este se estabiliza, mas, paradoxalmente, demanda ajustes contínuos, algumas mudanças, inovação e transformação, os que empreendem parecem afirmar: é isso o que eu enxergo e assim que quero participar desse mundo! Foi isto que vi Nitis fazendo, nos momentos em que pude ser espectador do FILO e lendo, nesses dias, o livro de Nitis. Para finalizar, reproduzo trecho de uma carta escrita por Nitis ao governador do estado em 1996, em que ela, a meu ver, sintetiza o que quero dizer quando a qualifico como empreendedora cultural: Todos os anos, inevitavelmente, sofro a angústia da imponderabilidade do acaso e da concretude dos obstáculos que configuram a incerteza de que, afinal, o Festival acontecerá mais uma vez. Choro, me lamento, rodo a baiana, chuto o pau da barraca, imagino crimes hediondos nas minhas noites de insônia... Depois, na abertura do festival, esqueço tudo e agradeço. Agradeço a deus e ao diabo..." (p. 349). Lindo de viver! Fernando Antonio Prado Gimenez


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A JOVEM TINA E O TETO DE VIDRO NA PEQUENA EMPRESA

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ive a oportunidade de participar por dois dias do IV Colóquio Internacional de Cinema e História na UFPR. Obviamente, não esperava encontrar nada que fosse relacionado ao empreendedorismo ou a pequenas empresas no evento. Meu interesse era acompanhar o evento, apenas como ouvinte, na esperança de aprender um pouco mais sobre o campo dos estudos em cinema que também me interessam muito. O esperado era que, talvez, eu estivesse escrevendo um post em meu blog Leituras em Cinema (https://leiturasemcinema.blogspot.com/), após uma noite e um dia imerso em apresentações, palestras e conferências sobre cinema. Mas, não. Acabei escrevendo este texto que publiquei no blog de Empreendedorismo e Estratégia em Pequenas Empresas! Pois é! Quem poderia imaginar que um trabalho sobre mulheres, personagens e gênero no cinema poderia me inspirar um texto sobre pequena empresa. Às vezes, me impressiono com as conexões que nossa mente faz, nos trazendo à lembrança memórias de décadas atrás. Um dos trabalhos que assisti foi o Modos de subjetivação de mulheres negras em adaptações cinematográficas da literatura de Jorge Amado nos 1970 e 1980. De autoria de Renata Melo Barbosa do Nascimento, da UNB. O trabalho me trouxe à memória lembranças muito vívidas de alguns dos filmes que Renata usou para fazer sua análise. No entanto, mais que isso, foi no discurso de Renata que surgiu algo que me fez lembrar um episódio que envolveu uma das trabalhadoras do Supermercado Gimenez - a Tina - e eu, um dos filhos dos donos daquela pequena empresa. Tina não é o verdadeiro nome dela, mas no título desse texto, faço uma brincadeira com o nome de Tina e, aqueles que a conheceram, vão imediatamente lembrar o nome correto. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Na introdução de sua fala, Renata abordou a questão dos vários feminismos. Isso mesmo, no plural. E, em especial, fez uma distinção entre o feminismo geral e o feminismo negro. Não pretendo aqui sintetizar a fala dela, mas o que foi marcante para mim, foi a ideia de que as mulheres negras, além de terem de lidar com a discriminação de gênero, lidam ainda com a discriminação de raça. Foi nesse momento da fala de Renata que me veio à lembrança o episódio com Tina. Vamos a ele, então.

Isto deve ter ocorrido entre o final dos anos 70 ou começo dos anos 80 do século passado. Ou seja, lá já se vão perto de quatro décadas de história. Naquela época, eu ainda era estudante de administração, que havia decidido cursar porque tinha planos de ficar trabalhando com meus pais e irmãos no Supermercado Gimenez. Tina estava trabalhando conosco e, assim como eu, também era estudante de administração na UEL. Até onde eu me lembro, Tina foi uma das poucas trabalhadoras do Supermercado Gimenez que fez um curso universitário. Tina era um pouco mais jovem que eu e negra. Na época eu estava entre 23 e 24 anos. Pode ser que esta história tenha ocorrido no segundo semestre de 1981. Mas, não tenho certeza. Nesse momento, recém-graduado, eu já estava atuando como professor. De qualquer forma, o ano preciso não afeta muito o significado da história. Embora Tina não tivesse nenhum cargo formal de comando naquela pequena empresa, devido à sua formação em andamento, ela já nos ajudava na coordenação de algumas tarefas. Pois então, certo dia, Tina e eu estávamos conversando e ela me informou que estava planejando pedir demissão da empresa. Eu fiquei surpreso com a notícia e tentei dissuadila. Falei dos planos que tínhamos e da ideia de uma possível filial para o supermercado em outro bairro da cidade. Na época, meus pais tinham adquirido alguns terrenos com o propósito de construir um prédio para a primeira filial do Supermercado Gimenez. Tinham até feito um esboço de Fernando Antonio Prado Gimenez


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planta. Mas, a ideia acabou não acontecendo. No entanto, naquele momento da conversa entre nós, ainda era uma possibilidade.

Falei para Tina que, quando ela concluísse seu curso, talvez pudesse vir a ocupar algum cargo de chefia na empresa. A resposta dela foi contundente. Tanto é que, quase 40 anos depois, ainda não esqueci. Não foram exatamente essas palavras, mas ela disse algo assim: _Fernando, aqui eu nunca vou ter uma chance. Tem seus pais, tem você, tem seus irmãos! Nunca vou conseguir ser chefe aqui! De fato, depois de algum tempo, ela pediu demissão. Muitos anos atrás, ouvi dizer que ela tinha falecido. Mas, para ser honesto com você, não tenho certeza. A memória da gente, às vezes, nos engana! Mas, a essa altura, você deve estar se perguntando: _ E daí? O que é esse teto de vidro? O que isso tem a ver com feminismo? E com a Tina? Então, vamos por partes: Teto de vidro é uma expressão usada nos estudos de gênero no campo das organizações que, de forma resumida, significa que há uma barreira transparente (teto de vidro) que impede que as mulheres subam além de determinado nível hierárquico nas grandes organizações. Elas são até capazes de "ver" os níveis superiores, já que o teto de vidro é transparente, mas não são promovidas para ocupar cargos nesses níveis. Em geral, este fenômeno é tratado em estudos sobre grandes empresas. Não me lembro de ter visto alguém discutindo essa ideia no âmbito de pequenas empresas. O caso de Tina veio à minha memória quando ouvi a ideia dos feminismos múltiplos, em especial o feminismo negro. Tina era uma jovem mulher negra trabalhando em uma pequena Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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empresa. No seu discurso, na época, só ouvi o lamento de alguém que não pertencia à família proprietária daquela pequena empresa. Mas, certamente, hoje, tenho certeza que o teto de vidro que Tina enxergava era tríplice: não ser da família, ser mulher e ser negra! Ou seja, apesar de transparente, muito mais difícil de romper!

A essa altura da minha vida, fica esse resgate de mais um episódio na história do Supermercado Gimenez, personagem frequente de meus textos. E como sempre ocorre, a história acabou sendo muito diversa dos planos. Eu deixei de trabalhar com meus pais e me tornei professor. Tina, provavelmente, já morreu, mas trabalhou durante alguns anos em outras organizações de Londrina. Algumas poucas vezes, nos encontramos pelos caminhos da pequena Londrina dos anos 80. E o Supermercado Gimenez foi vendido há muitos anos também.

Fernando Antonio Prado Gimenez


ALGUMAS LEMBRANÇAS SUPERMERCADO GIMENEZ

E

MEMÓRIAS

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DO

M

omentos de minha primeira vida profissional. Em 1977, retornei a Londrina. Antes, em 1974, conclusão do colegial (antigo ensino médio) e cursinho. Na Rua Tamandaré na Liberdade em São Paulo. Pensão da dona Genoveva e seu Orlando e cursinho Anglo. Do começo de 1975 até meados de 1976, engenharia no ITA. Dedicava-me mais ao basquete que aos estudos. Depois de muitos anos, um calouro se juntava ao time principal do ITA. Sem muita modéstia, tinha minhas qualidades no esporte. Desenvolvidas no Canadá. Clube da minha infância e adolescência de classe média. Em meados de 1976, desencantado com o curso de engenharia, fui para Campinas. Estudar Física. Durou apenas um semestre. Valeu mais pelas apresentações da Orquestra Sinfônica de Campinas que assistia no teatro da cidade uma vez por semana. À noite. Apreciava as viagens de ônibus gratuitas do centro até o campus em Barão Geraldo Sinal evidente de valorização do ensino superior. Tão diferente dos dias atuais! Final de 1976, o retorno a Londrina. Em fevereiro de 1977, a pergunta: quando volta para Campinas? A difícil resposta: não voltaria. Decidido a ficar em Londrina. Comecei a trabalhar com meus pais. No meio do ano, vestibular para Administração. Bem sucedido. Quatro anos depois, me torno professor após a graduação. Nove dias depois da formatura. Nesses anos, a vida de trabalho na empresa familiar. Um breve afastamento de alguns meses. Mas, a pressão de pai e mãe levou ao retorno. Uma experiência única. Em um breve período, sem a presença do pai. Fundador da pequena empresa, a nosso pedido, se afastara da gestão. Com mãe e irmãos, uma tentativa de independência da autoridade paterna. Depois de alguns meses, o inevitável retorno desta autoridade. O convívio se manteve até o afastamento para o Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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mestrado. Entre 1982 e 1983. Depois, a escolha da carreira universitária. A princípio concomitante com a empresa familiar. Passados poucos anos, se tornou exclusiva.

Um período de duração imprecisa, esse meu trabalho na pequena empresa dos pais. A memória pode enganar. Além disso, como escrevi na introdução de meu primeiro livro - O estrategista na pequena empresa - na infância e adolescência houve a vivência no espaço da empresa dos pais. Espaço de brincadeiras e pequenos trabalhos. Ajuda que alguns desavisados condenariam como trabalho infantil. Nada disso! Preparação para a vida, assim como a escola que frequentávamos. Memórias de minha história. Memórias, também, que me contaram. Lembro-me do Professor Hermas, da matemática no colegial. Depois, colega da Universidade Estadual de Londrina. Ele na Economia. Eu na Administração. Volta e meia me contava da lembrança de meu pai, carroceiro, vendendo bananas no bairro. Lembro-me de minha mãe falando do “tubarão” da Rua Paranaguá. Alcunha que um jornalista deu ao meu pai em algum momento dos anos 50 do século passado. Tempos de racionamento. Seu Gimenez escondia alguns produtos essenciais - arroz, feijão, óleo, farinha, açúcar - para seus clientes mais fiéis no bairro. Um dia, uma cliente chata e não atendida fez a denúncia. Não deu em nada, além da breve nota no jornal. Não era a Folha de Londrina. Outro jornal cujo nome não me recordo. Outra história que minha mãe contava. Sobre a freguesa cujo filho trabalhava na prefeitura. Apareceu oferecendo materiais escolares. De uma campanha escolar do governo do estado. Oferta polidamente recusada. Não dava para vender os produtos com marcas da campanha que algum funcionário subtraíra indevidamente das crianças em idade escolar. Mas, nem sempre se conseguia resistir à corrupção. Lembrome de um funcionário de uma empresa estatal. Comprava em Fernando Antonio Prado Gimenez


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nome da empresa, produtos de uso cotidiano - limpeza, café, açúcar. Pedia para superfaturar. Tirava a diferença em mercadorias para uso próprio. Eu fazia a nota fiscal. Com certo desconforto! Mas, sobrevivi a esta culpa. Tão pequena em comparação a outras culpas não minhas. E o caso do fiscal da receita estadual! Conhecido da família. Freguês do mercado. A mordida foi grande. Em troca de uma multa menor, alguns meses de compra mensal. Gratuita e entregue na casa do próprio. E a do marido fazendeiro. Também amigo da família. Parente de parentes. Machista, mantinha a mulher quase presa em casa. Ela raramente podia sair pra visitar as amigas. Uma vez por mês, ele ia fazer compras. Duas compras praticamente iguais. Uma para a casa da família na cidade. Outra para a teúda e manteúda. Antiga denominação de amante. Esta vivia na fazenda. A primeira compra mandava entregar. A segunda, ele mesmo levava na caminhonete de fazendeiro. Esta memória era contada por minha mãe. Amiga da mulher. Há outras memórias. Quer conhecer mais uma? Me lembro de meu irmão mais velho - Christovam. Ensinando Sebastião, entregador de bicicleta, a dirigir a Kombi do mercado. Sebastião, todo confiante, entrou com a Kombi na árvore que ficava na calçada. Bem na esquina. Ainda bem que os estragos materiais foram poucos. E nenhum dano corporal. Christovam, também, misteriosamente, gostava de fazer algumas entregas. No lugar de José, o motorista. Em especial, quando as entregas eram na casa de uma loura da Juscelino Kubitschek. Eu não entendia. Ingênuo, perguntei para Graça o porquê. Ela atuava no caixa e era uma das mais antigas funcionárias do mercado. De confiança. Ela riu e me disse: _ Não percebeu como demora essa entrega! Algo mais acontece além da entrega. Graça não precisou dizer mais nada. Eu era ingênuo, mas não era tonto! Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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O convívio com meu pai nem sempre era pacífico. Algumas vezes, nos desentendíamos. Em poucas vezes, ele cedia a meus argumentos. Na maioria das vezes, encerrava o assunto com a frase que você já leu neste livro: você tem muita gramática, mas pouca prática! Eu só podia me calar. Fazer o quê? Certa época, todos os filhos casados, era necessário manter um esquema de remuneração adequada para cada um. Tentei convencer meu pai disso. Ele não aceitava. Dizia que podia ir pagando as despesas de cada filho conforme fosse necessário. Coisa de empresa familiar! Onde os dinheiros se misturam. Eu, na vã esperança de profissionalizar um pouco a empresa, combinei com meus irmãos uma retirada semanal para cada um. Nos sábados à noite, após o fechamento do mercado, eu recolhia o dinheiro dos caixas e fazia o registro do faturamento diário. Tirava a parte de cada um. Meu pai, contrariado, fingia que não via. Funcionou bem. Mas, algum tempo depois decidi ir para São Paulo fazer mestrado em Administração na Universidade de São Paulo. Quando voltei, acho que ainda trabalhei com meus pais e irmãos por algum tempo. Mas, a carreira universitária estava me chamando. Já contei acima. São memórias que guardo comigo. Algumas vividas. Outras contadas. Histórias de uma vida pequeno burguesa, que um intelectual pedante não hesitaria em assim adjetivar. Para mim, acima de tudo, são memórias de vida. Sem adjetivos. Que registro para que minhas filhas - Paloma e Fernanda- e meus enteados - Amanda e Marcelo - possam passar à frente. Memórias que fazem parte de minha trajetória e que ajudam a compreender o homem que as viveu.

Fernando Antonio Prado Gimenez


MUITO ANTES DESSE TAL DE DELIVERY

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N

esse momento de pandemia do Covid 19, a ideia do delivery se tornou obrigatória para a maioria dos empreendimentos comerciais. A imposição ou recomendação de isolamento social em muitas cidades fez com que essa forma de venda se expandisse muito. Com a disponibilidade dos aplicativos e dos sites de vendas online, se multiplicaram as possibilidades de atendimento às necessidades de consumo da população. Mas, todo mundo sabe que isto já estava acontecendo há, pelo menos, uns cinco anos ou mais. O delivery, com esse nome, pode ser uma novidade. Mas, com outro nome, ele já acontecia há décadas. Nesses dias que tenho permitido à minha mente viajar por lembranças do tempo em que trabalhei com meus irmãos e meus pais no Supermercado Gimenez, me veio à mente mais uma história envolvendo o José, um dos motoristas que trabalharam no Supermercado Gimenez. A principal função dos motoristas era fazer entregas a domicílio com a Kombi do mercado, mas ajudavam em outras tarefas quando não havia entregas a serem feitas. Essas entregas surgiam de duas maneiras: fregueses que faziam compras presencialmente e solicitavam que fossem levadas para suas casas; ou compras feitas pelo telefone, que eram preparadas por alguma de nossas funcionárias e depois encaminhadas às casas dos clientes. Esse serviço de entrega a domicílio, o que hoje chamam delivery, era comum no comércio daquela época. Certo dia, José chegou para mim, ou para minha tia Amélia, que trabalhou conosco por algum tempo, e disse: _ Não vou mais fazer entrega na casa da fulana (não vou usar os nomes verdadeiros, para não criar nenhum constrangimento, apesar da fulana já estar morta há muito tempo). Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Essa decisão do José foi uma surpresa para nós. O que será que teria acontecido? Foi a pergunta feita a ele, que respondeu:

_ Então, lá naquela casa as pessoas andam só de calcinha e cueca. Eu não posso ir fazer entregas lá. José era devoto de uma denominação religiosa muito rigorosa. E a casa da fulana era conhecida por ser frequentada por muitos jovens, homens e mulheres, que eram adeptos de uma vida mais livre, sem muito apego às convenções sociais. A fulana era filha de um empresário bem sucedido da cidade. E as compras daquela casa sempre eram muito volumosas. Além disso, eram compras feitas no velho sistema de “assinar as notas” que seriam pagas no começo do outro mês pelo pai. “Assinar as notas” era uma evolução das antigas cadernetas de fiado usado pelo comércio varejista. Uma prática que meu pai e minha mãe adotaram por muito tempo na época da Casa Gimenez. Dia sim, dia não, a fulana ligava para o Supermercado Gimenez e fazia um pedido de entrega. Pois então, não dava pra gente dizer para a fulana ou o pai dela que não faríamos mais entregas naquela casa. No começo do mês a conta paga pelo pai da fulana era significativa. Não podíamos abrir mão daquele faturamento. Felizmente, naquela época Christovam, Arlindo e eu – os três irmãos – já éramos motoristas e passamos a levar as compras na casa da fulana. Pelo menos no meu caso, não me lembro de ver os jovens circulando pela casa de cueca ou calcinha. Em geral, a empregada da casa era quem recebia as entregas. E, sempre, devidamente vestida, até uniformizada! Assim, preservamos os princípios religiosos do José, que continuou fazendo as demais entregas, exceto quando, como já contei em outro texto, meu irmão mais velho fazia questão de fazer alguma entrega mais especial. Tem outra coisa relacionada às entregas a domicílio que me fez refletir sobre os tempos do Supermercado Gimenez. Hoje a prática do delivery é tão comum, que não penso ser possível Fernando Antonio Prado Gimenez


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algum negócio deixar de utilizá-la. Mas, naquela época os pedidos por telefone e posterior entrega a domicílio foram foco de muito debate entre os supermercadistas de Londrina.

Nosso supermercado era vinculado à associação de supermercados. Pelo menos uma vez por mês, participávamos de reuniões com os demais para discutir assuntos da classe. Volta e meia, a questão das vendas por telefone, que continuávamos fazendo, era lembrada e criticada. A lógica dessa crítica residia no fato de que a criação das então chamadas “lojas de autosserviço” era uma inovação que deveria estimular o cliente, ao circular livremente pela loja, fazer compras mais volumosas. Nas antigas mercearias, o balcão que separava clientes e vendedores, impedia o acesso mais amplo dos clientes às mercadorias. Os supermercados tentavam estimular as chamadas compras por impulso. Algo que o cliente ao ver se lembraria da necessidade ou compraria por ter despertado o desejo por aquele produto. Foram inúmeras as ocasiões em que tivemos, eu ou meu pai, de discordar dos demais supermercadistas e manter o atendimento por telefone. Era um serviço que marcava nosso supermercado por um atendimento personalizado às freguesas e fregueses. Estes, muitas vezes, eram conhecidos e amigos de décadas do seu Gimenez e da dona Kilda. Não dava para deixa-los na mão!

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REFLEXÕES DE UM EDITOR DE DOIS PERIÓDICOS QUASE MARGINAIS E QUASE ANÁRQUICOS

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primeira edição da Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo foi publicada ao final de abril de 2016. Naquele momento, eu já contava com uma experiência de dois anos como editor da Revista Livre de Cinema, cuja história de criação contei em um artigo publicado na Revista de Empreendedorismo e Inovação Sustentáveis, que pode ser acessado em http://revista.isaebrasil.com.br/index.php/EGS/article/view /15). As duas publicações compartilham um princípio editorial que expressei, pela primeira vez, ao conceber a Revista Livre de Cinema. Naquele momento, em 2014, eu era aluno de um curso de especialização em cinema na Universidade Tuiuti do Paraná. Refletindo sobre minha trajetória acadêmica até então, concentrada nos campos do empreendedorismo e da gestão de pequenas empresas, havia algo que me incomodava. Esse incômodo estava associado à questão da prática usual de avaliação ad hoc dos textos publicados em periódicos dessas duas áreas. Como em outras áreas de conhecimento, os textos antes de serem publicados em periódicos passam por uma tripla avaliação. Em primeiro lugar, em geral, um editor faz uma avaliação prévia. Caso o texto esteja adequado aos requisitos do periódico e tenha qualidade suficiente, na opinião do editor, este vai para uma segunda etapa de avaliação. Nesta etapa, em geral, dois avaliadores tidos como experts no tema do texto, são convidados a avaliarem o trabalho e emitirem uma recomendação ao editor. Esta recomendação, em geral também, pode ser uma, entre três alternativas: a) rejeitar o trabalho, pois não tem qualidade para ser publicado; b) solicitar alterações, correções ou complementações no trabalho, para uma posterior reavaliação; e c) aceitar o texto para publicação como foi submetido. Fernando Antonio Prado Gimenez


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Esses procedimentos, se acredita, aumentam a qualidade daquilo que é publicado pelos periódicos, pois só serão publicados textos que tenham sido aprovados por três experts e que atendam requisitos mínimos de qualidade de redação e de rigor na construção do conhecimento.

Mas, qual era o meu incômodo com isso? Pois é, como estudioso dos campos que mencionei acima, por dever de profissão, ao longo dos últimos 40 anos, tenho lido muita coisa que foi publicada em periódicos brasileiros e estrangeiros. Muita vezes, encontrei conhecimento novo e valioso! No entanto, também, muitas vezes, me deparei com textos que deixavam muito a desejar em termos de qualidade de redação e rigor de construção de conhecimento. Ou seja, em minha experiência, o sistema não funciona muito bem! Assim, em determinado momento do ano de 2013, comecei a pensar na possibilidade de criar, com recursos próprios, um periódico no campo do Cinema, cujo estudo estava me atraindo fortemente. Mas, sendo novato no campo – um ilustre desconhecido – resolvi fazer algo diferente: criar um periódico onde não haveria avaliação dos textos submetidos para publicação. O princípio central do periódico seria este: O leitor é o juiz da qualidade de qualquer texto que leia. E, com duas consequências desse princípio. Se o leitor não gostar do texto, ele será esquecido. Se o leitor gostar, pode ser que o texto seja citado por ele em algum momento. Dessa forma, meu papel enquanto editor se restringiria a decidir se os textos que fossem encaminhados à Revista Livre de Cinema estavam no escopo editorial da mesma. Caso positivo, os textos seriam publicados em ordem de recebimento. Por outro lado, se o texto não fosse consistente com o escopo editorial da revista, este seria rejeitado. A ideia era posicionar a Revista Livre de Cinema à margem do sistema tradicional de publicação de periódicos. Um empreendimento quase marginal! Mas, ao longo do tempo, você vai ver, o sistema é forte e acabaria arrastando o Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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periódico para suas franjas. O mesmo aconteceria com a Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo.

Ao mesmo tempo, penso que esta experiência era quase anárquica! Quase sem regras! No entanto, havia um mínimo necessário de regras próprias criadas por mim, bem como externas, que tinham que ser seguidas para que a Revista Livre de Cinema pudesse ser reconhecida como um periódico. Entre estas, por exemplo, a existência de um comitê editorial e periodicidade regular para obter o ISSN. Entre as primeiras, algumas regras de formatação dos textos, extensão e categorias de textos a serem publicados. A experiência foi bem sucedida. A Revista Livre de Cinema entrou, em 2020, no seu sétimo volume, com publicações ininterruptas de três edições regulares ao ano. Entre 2014 e 2019 foram 18 edições regulares (quadrimestrais) e uma edição especial em 2017. No momento que publico este texto, houve mais duas edições, das três previstas para 2020. Contando com estas duas edições, foram publicados 176 artigos, resenhas ou notas e comunicações, cujo conteúdo integral foi acessado em torno de oito mil vezes. Estes artigos foram escritos por cerca de 200 autores, entre os quais alguns publicaram mais de um texto. Em 2016, já com dois anos de experiência com a Revista Livre de Cinema, decidi replicar a ideia no meu campo de atuação acadêmica principal. Foi então que surgiu a Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo. A princípio segui a mesma estrutura: periodicidade quadrimestral, com muitos amigos e amigas convidados para comporem o comitê editorial, e, assim, obtendo ISSN e existência formal como periódico. Mas, aqui havia um risco maior. Eu não sou um ilustre desconhecido nesse campo! Como meus colegas da academia encarariam esse novo empreendimento? Tive reações mistas. Alguns gostaram e apoiaram. Outros se mantiveram distante. Mas, não me lembro de nenhuma condenação da ideia. Pode ser que tenham enxergado a Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo como Fernando Antonio Prado Gimenez


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uma excentricidade de um velho professor titular do campo. E, embora estranha, deveria ser ao menos tolerada!

Talvez devido a meu reconhecimento nos campos do empreendedorismo e gestão de pequenas empresas, logo ao final do primeiro ano, percebi que havia espaço para alterar a periodicidade da revista. Tinha um grande número de textos submetidos. Assim, no segundo volume, a periodicidade passou a ser trimestral. Ao final do segundo ano, o estoque de textos submetidos estava bem grande. Nova alteração de periodicidade! Dessa vez, passou a ser bimestral. Entre 2016 e 2019, foram publicadas 19 edições regulares. Além disso, em 2018 houve uma edição especial e em 2019, foram duas edições especiais. Em 2020, já foram publicadas três edições. No momento que escrevo este texto, há em estoque textos suficiente para mais cinco edições. O mesmo ocorre com a Revista Livre de Cinema, embora com menor intensidade. Penso que não podem deixar de serem vistas como experiências bem sucedidas! Também contando com as últimas edições, foram publicados 259 artigos, resenhas ou notas e comunicações em todos os números da Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo. Nela, o número de acessos aos textos integrais passou de vinte mil. Nesse período, foram quase 600 autores, vinculados a 140 instituições de ensino e pesquisa, das quais onze estrangeiras. A maioria dos autores com apenas um artigo. Mas, observei algo que denomino uma disfunção: alguns autores começaram a submeter inúmeros textos para publicação. Assim, acabei criando uma regra adicional para a revista, limitando o número de artigos por autor a um por ano, exceto se for o caso de alguma chamada temática. Mais uma quebra da minha vontade de ser quase anárquico! Contudo, penso que agi de forma acertada. Minha ideia com ambas as revistas é que elas se tornassem canais de divulgação de textos que não conseguem furar a barreira da Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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tripla avaliação. E, assim, gosto de pensar que esta oportunidade deve ser amplamente utilizada e não se concentrar em poucos autores. Quando um autor resolve concentrar suas publicações em minha revista, está tirando a oportunidade de outros. Uma regra útil!

Quando iniciei a Revista Livre de Cinema e, depois, a Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo, não tinha nenhuma preocupação ou intenção de que ambas fizessem parte do famigerado Qualis da CAPES. Mesmo porque, imaginava que seriam periódicos marginais ao sistema. No entanto, como as duas revistas publicaram alguns textos cujos autores estavam vinculados a programas de pósgraduação brasileiros, o inevitável aconteceu! Em 2017, as duas revistas foram incluídas no Qualis 2013-2016. As qualificações variaram entre B4 e B5 para a Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo, e B4, B5 e C para a Revista Livre de Cinema, dependendo da área de conhecimento. Independente dessa qualificação, mantive o princípio básico das duas revistas: o leitor é o juiz da qualidade dos textos que lê. Assim, se um texto for bom, este será disseminado pelos leitores. Caso contrário, este cairá no esquecimento. Aliás, como ocorre com muitos textos em periódicos mais ortodoxos. Apesar disso, recentemente, fiquei curioso em avaliar qual tem sido a recepção dos textos das duas revistas junto aos leitores. Outra curiosidade minha, dizia respeito aos motivos que levaram os autores a buscarem essas duas revistas “quase marginais” para publicarem seus textos. Com isso em mente, fiz dois levantamentos. O primeiro, no Google Acadêmico, para verificar se havia textos das duas revistas que teriam recebido citações em outras produções científicas. O segundo, por mensagem de correio eletrônico para autores dos textos publicados, indaguei sobre os motivos que levaram a escolher a revista para disseminação de seus textos. Os resultados, pelo menos para mim, parecem interessantes! Vamos a eles. Fernando Antonio Prado Gimenez


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No caso da Revista Livre de Cinema, 22 artigos tiveram pelo menos uma citação. O total de citações que estes artigos receberam chegou a 50, das quais treze foram em outros artigos publicados em periódicos. Em segundo lugar, foram onze citações em trabalhos apresentados em eventos científicos e onze citações em dissertações de mestrado. Outras citações ocorreram em trabalhos de conclusão de curso, monografias de graduação, teses de doutorado e capítulos de livro.

O artigo mais citado da Revista Livre de Cinema e, também, um dos mais acessados da revista foi O empreendedorismo no campo da produção cultural: analisando a dimensão privada da ação empreendedora no audiovisual. Por incrível que pareça é um artigo no meu campo preferido de pesquisa – empreendedorismo – que trata do setor de cinema. Excelente coincidência e um privilégio meu poder ter sido seu editor. Por outro lado, no caso da Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo, os números foram um pouco maiores. Foram 56 artigos citados 104 vezes em outras publicações. O maior número de citações foi em artigos de outros periódicos (43), seguido por 24 citações em trabalhos apresentados em eventos científicos. A seguir com 16 citações surgiram as dissertações de mestrado e igual número em monografias de graduação. Também houve citações em capítulos de livros e teses de doutorado. O artigo - A gestão ambiental em Minas Gerais: uma análise do sistema de gestão ambiental e do rompimento da barragem de rejeitos em Mariana - foi um dos mais acessados e o mais citado, até o momento, entre os publicados na Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo. Em termos de percentuais, 13,7% dos artigos da Revista Livre de Cinema já apresentaram algum impacto em termos de citação. Na Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo, foram 24,5%, ou seja, quase um quarto dos artigos repercutiu em outra publicação. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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Por fim, quanto às motivações para publicar nas duas revistas, os autores foram inquiridos com estas alternativas: 1. Para atender convite do editor; 2. Porque a revista está incluída no QUALIS; 3. Por sugestão de um(a) colega de pesquisa ou de co-autor; 4. Porque seu texto foi indicado para fast track de algum evento científico; 5. Em função dos temas indicados pelo título da revista; 6. Porque os textos submetidos à revista não passam por avaliação duplo-cega e são publicados, após decisão do editor, caso estejam no escopo da mesma; 7. Para atender algum requisito de avaliação da instituição à qual você está(va) vinculado. O motivo de número 4 foi perguntado apenas para os autores da Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo que já integrou o fast track de alguns eventos. Mais uma forma de entrar nas franjas do sistema! Devo confessar que esperava que o motivo “6 - Porque os textos submetidos à revista não passam por avaliação duplocega e são publicados, após decisão do editor, caso estejam no escopo da mesma”, estivesse entre os mais frequentes. Mas, ao mesmo tempo, de vez em quando percebo que os autores dos textos encaminhados ás duas revistas nem sempre se dão conta dessa regra. Apesar de ela ser explícita no site das duas revistas, Muita gente submete textos sem ler as normas dos periódicos, não é? Mas, então quais foram os resultados dessa enquete? Cada autor poderia indicar até três motivos para ter enviado textos para publicação nas revistas. A amostra de autores que responderam não foi muito grande, mas me sinto satisfeito, pois parece indicar um padrão. Apesar de surpreendente!

O motivo mais citado foi em função dos temas sugeridos pelos títulos das revistas (32,7%) do total. Isto me parece ser um bom resultado. As revistas conseguem atrair interessados em seus campos de conhecimento. Mas, o segundo motivo, com 27,9% do total foi o fato das revistas estarem no Qualis. Olha o sistema puxando as revistas para suas franjas! Em terceiro Fernando Antonio Prado Gimenez


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lugar vieram as submissões de texto por sugestão de colega de pesquisa ou co-autor (15,4%).

Em quarto lugar, há o motivo de atender algum requisito de avaliação da instituição de vínculo dos autores (8,6%). Tenho percebido que, no caso da Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo, tem havido alguma concentração de textos oriundos de algumas instituições. Parece-me que são instituições exigindo que seus pesquisadores, em diferentes níveis de atuação, comprovem publicações em periódicos. Por esse motivo, também, tenho controlado o número de artigos publicados por autores de uma mesma instituição ao longo do ano. Mais uma regra! É difícil ser anárquico! O antepenúltimo motivo na lista foi o atendimento de convite do editor com 6,7% das respostas. Esta é uma prática que exercito de forma regular nos dois periódicos. Quando leio textos apresentados em evento científico que julgo interessantes para minhas revistas, mando mensagem de correio eletrônico convidando os autores para submeterem seus textos. Mas, o motivo ligado ao princípio central das revistas veio em penúltimo lugar dos indicados. O fato dos textos submetidos às revistas não passarem por avaliação duplo-cega e serem publicados, após decisão do editor, foi apontado em apenas 5,8% das respostas. Será que os autores ficaram constrangidos de indicar esta resposta? Por fim, a indicação para fast-track foi o último motivo apontado. Mesmo porque, ainda foram poucos os eventos em que a Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo integrou o conjunto de periódicos para fast track. Encerrando este texto, devo registrar que esta jornada empreendedora de criação, manutenção e edição de dois periódicos quase marginais e quase anárquicos tem sido uma experiência de vida gratificante. Quase todo dia, dedico algum tempo a essa tarefa que me atribui. Quando me perguntam sobre o que me leva a fazer isso, penso na famosa oposição Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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entre razão instrumental e razão substantiva. A vida é muito melhor quando conseguimos guiá-la por motivações substantivas, não é? As duas revistas têm acesso livre e não cobram nenhuma taxa dos autores para publicação de seus textos. Não há motivação instrumental para fazê-las. Por outro lado, são as motivações substantivas que são gratificadas quando autores, ao serem indagados sobre outros motivos para submeterem seus textos às revistas, fazem comentários como estes:

Gosto muito do escopo da sua revista. Creio que tem um potencial muito bom para disseminar conhecimento científico (um autor da Revista Livre de Sustentabilidade e Empreendedorismo). Porque sempre gostei de ler os textos publicados na RELICI e queria compartilhar alguns pensamentos nela (um autor da Revista Livre de Cinema).

Fernando Antonio Prado Gimenez


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POSFÁCIO

“Quem irá me valer? São pessoas, é a caminhada. Quem irá me valer? São meus sonhos no pó da estrada. Quem irá me valer? É o sorriso que guardo comigo. Quem irá me valer? É segredo de fazer amigo” Milton Nascimento, Pra eu parar de me doer.

oi com imensa alegria que recebi o convite de Fernando Gimenez para escrever o Posfácio deste seu livro. FFrancamente, jamais imaginei que de leitor assíduo do Blog Empreendedorismo e Estratégia em Empresas de Pequeno Porte eu passaria à condição de escritor do Posfácio de um livro que colige os textos divulgados primeiramente como posts em seu Blog. Quanta honra foi para mim receber o convite. Mais honrado e feliz fiquei quando ele me disse que caberia a João Marcelo Crubellate a escritura do Prefácio. Saibam que Fernando e Crubellate são para mim pessoas da mais alta estima e admiração, desde quando os conheci, entre 1997 e 1998. Gravar meu nome ao lado dos deles sempre me enche de orgulho. Digo “sempre” porque já tivemos a oportunidade de assinar juntos alguns textos acadêmicos. Quanta saudade sinto daquele processo que era refletir e escrever conjuntamente com ambos! Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários ou de autoajuda é o título que Fernando atribuiu ao livro. Confesso que o título em si não me agradou muito. Eu o teria invertido. Coisas que você não vai ler em livros universitários ou de autoajuda sobre empreendedorismo e pequenas empresas me parece que ficaria melhor, mesmo porque, na própria trajetória pessoal de Fernando, cinema, literatura e existência cotidiana – essas Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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“coisas” – foram, aos poucos, assumindo a predominância de seu interesse e curiosidade. Lógico que empreendedorismo e pequenos negócios sempre o acompanharam, mas hoje, acredito, são assuntos mais reservados àquela condição de “dever cumprido”, como atestam parte dos seus livros publicados como autor (O Estrategista na Pequena Empresa, 2000; Empreendedorismo: bibliografia de artigos publicados em periódicos brasileiros, 2017) ou coorganizador (Empreendedorismo e Estratégia de Empresas de Pequeno Porte, 2010; Economia Criativa: conhecimento, criatividade e empreendedorismo para uma sociedade sustentável, 2013; Educação para o empreendedorismo, 2014; Inovação e cooperação: a relação universidade-empresa, 2015). Outros livros de sua autoria (Empreendedorismo, sustentabilidade e a vida de professor: prosa e poesia, 2015; Empreendedorismo e pequena empresa: dezesseis haikais, um pouco de prosa e outros versos, 2013), embora também tenham tratado daqueles assuntos, podem, seguramente, ser vistos mais sob o ângulo do desejo de expressão poética buscado pelo autor do que pelo conteúdo mesmo de empreendedorismo e pequena empresa que carregam. Esses são livros que patenteiam o inconformismo que carrega consigo Fernando Gimenez, no caso, o desconforto com sua própria escrita academicamente adestrada, da graduação ao doutorado. São esses livros manifestação de sua subversão acadêmica, subversão tanto de forma quanto de conteúdo, cujos laivos vieram a lume no livro Janelas, escadas e esculturas e outros escrito, de 2012. Como podem perceber, Fernando é esse reinventor interno de si, porque sua aparência, não fossem os cabelos brancos, pouco mudou ao longo dos anos em que o conheço. Ele é, nesse sentido, um conservador. Enquanto tal, vive um tipo de tensão muito particular sua entre o mudar e conservar a si mesmo. Eu arriscaria até a dizer que, como eu, ele também tem medo do abandono completo e absoluto de si e dos outros, por isso manter consigo muitas coisas. Não à toa, temas como mudança e permanência, instabilidade e estabilidade, Fernando Antonio Prado Gimenez


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ruptura e continuidade são recorrentes em sua abordagem dos próprios pequenos negócios.

Voltando ao título deste livro que, como dito, tenho discordância, o certo é que o direito por ofício de intitular um livro pertence a quem o escreve – isso quando os agentes de marketing das editoras assim o permitem. Mas eu não quero tratar do título do livro. Chamou-me mais atenção a definição que lhe foi conferida pelo autor lá na Apresentação: “é uma espécie de livro-testamento”. Quanta simbologia traz essa definição essencial: livro-testamento. Testamento é testamentu, em latim, e juridicamente é um documento formal onde determinado indivíduo deixa expressa sua última vontade a respeito da destinação de seus bens, em parte ou no todo. Via de regra, o testamento é um documento. No caso de Fernando, não se trata exatamente de um documento que é testamento, mas de um livro, um livro que se pretende testamento. Qual é esse “bem” e qual é o destinatário a quem Fernando quer destiná-lo? Não pensem que vou aqui enveredar pelos artigos do Código Civil Brasileiro em busca de apoio à interpretação desse livrotestamento. Não, não tenho a mínima pretensão de averiguar as possibilidades de interpretação que cláusulas testamentárias do livro possam conter, de modo a melhor observar a fiel vontade do testador. Serei mais simples e direto: a sabedoria é o bem, e o leitor, o destinatário. Suponho que assim seja. Essa suposição está baseada nos anos de convivência que mantive com Fernando, está baseada em nossa proximidade, melhor dizendo, em nossa amizade de longos anos. Explico. Porém, para explicar, terei que transformar o livro-testamento em livro-testemunho. Sim, tes-te-mu-nho. Testemunho é testimoniu, em Latim, e como todo e qualquer testemunho, sua validade está condicionada à crença que se tem em alguém ser capaz de dizer a verdade. Epistemologicamente, testemunhar implica a passagem do fato (presenciado) ao valor (confiança depositada nas palavras de quem presenciou). Fenomenologicamente pode ser dita Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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uma ação social intersubjetiva, cujo núcleo de sustentação não está exatamente na relação do sujeito que presenciou o aparecer ou mostrar-se do fenômeno como ele próprio é, mas na confiança e no compromisso entre aquele que esteve com o fenômeno e relata o que viu, o que ouviu, o que sentiu, em suma, o que experienciou, e aquele ou aqueles que ouvem ou leem seu testemunho. Quem testemunha tem que ser digno da confiança de quem ouve ou lê seu relato. Conto, portanto, com a fé do leitor. Características marcantes do caráter de Fernando Gimenez são a generosidade e a gratidão. Não somente para com a minha pessoa, mas com diversas outras, Fernando sempre foi generoso e grato. Em meu caso específico, ele expressou essas qualidades quando, em dezembro de 1997, na qualidade de membro de minha banca de mestrado, teceu a mim vários elogios e aprovou minha dissertação; quando, na mesma oportunidade, ao saber que eu seria mais um mestre sem destino e trabalho, me incentivou a prestar exames para o cargo de professor substituto na Universidade Estadual de Maringá, universidade para aonde ele estaria sendo transferido; quando, em 1998, tendo eu sido aprovado nos exames naquela universidade, mas não tendo condições financeiras iniciais para alugar um lugar onde morar, prontificou-se a compartilhar comigo seu apartamento; quando, ciente dessa minha condição, emprestou-me dinheiro para que eu pudesse dar conta de minha sobrevivência no primeiro mês; quando, percebendo meus dias de isolamento social sem amigos locais, tratou de me inserir em sua rede de amigos e familiares. Foram muitas e diversas situações que pude contar com a gratidão e generosidade de Fernando Gimenez. Ao trabalharmos juntos, pude constatar que sua didática professoral é toda ela calcada nessas suas duas características. Sua escrita também o é. Relembre, caro leitor, que nos textos lidos há a presença marcante de pessoas às quais ele também é grato e generoso. Grato porque foi ensinado, generoso porque ensinou. Por exemplo, ele menciona ex-professores Fernando Antonio Prado Gimenez


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(Zaccarelli, Beer, Scaico, Fischmann), ex-alunos (Edmundo, Jane, Thálita, Rodrigo, Eduardo, Luiz Aurélio), amigos e amigas (Paulo Grave, Ariston Azevedo, Mário Pacagnan, José Brunelli, Simone), filhas e enteados (Fernanda e Paloma, Marcelo e Amanda), pais e irmãos (Dona Kilda, Seu Gimenez, Christovam, Kilda e Arlindo), cunhados (Marinelva, Robinho, Nezilda) e tantas outras pessoas que protagonizam os textos. Em diversos momentos, ele deixa claro nos textos que são essas pessoas as principais protagonistas nas ideias, e não exatamente ele. Ele, com sua intelectualidade, arremata, digamos assim, elaborando suas hipóteses de pesquisa e observações sobre empreendedorismo. É também de modo generoso e grato que ele se refere aos empreendedores e seus empreendimentos com os quais manteve contato espontâneo, como Candidu’s Restaurante, Salão King’s, Salão Fleischmann, Salão Vitalício, Pastelaria da Sergipe, Kiberama, Café da Praia, Trailer de Cachorro Quente, entre outros. Embora dado às abstrações, nesses escritos aqui publicados seu pensamento caminha a partir do concreto, a partir das experiências vividas e ocorridas desde sua infância e juventude. As situações narradas deixam claro que ele também é um grande observador da vida cotidiana. As coisas da vida não lhe passam impunes de reflexão e questionamentos. Até mesmo informações e contatos corriqueiros ocorridos em um ônibus são chamados à razão. Esses fatos emergem com força e autoridade sobre as ideias, levando-o a discutir, com os pés no chão, sobre conceitos como vantagem competitiva, empreendedorismo, trajetória empresarial, gênero, visão sistêmica, modelos mentais, crowdfunding, responsabilidade social, cooperação, inovação, sustentabilidade, stakeholders, estilo do estrategista, eficiência e eficácia, organizações como esponjas, mudança e permanência, continuidade e estabilidade, localização de um negócio, e tantos outros assuntos e objetos que dizem respeito à condução de micros e pequenos negócios. Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda


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E ainda que possa parecer que a relação entre a vida concreta e o pensamento se dão de maneira descomprometida com a ciência, uma vez que nem mesmo bibliografia o livro possui ao seu final, um rápido reviver dos textos pode indicar o quanto suas observações, notas e hipóteses estão também dialogando com outras pesquisas sobre aqueles assuntos elencados acima. Os livros e revistas citados são muitos, valendo destacar a principal revista sobre empreendedorismo, Entrepreneurship theory and practice, e os livros: The heart of enterprise e The brain of the firm, de Anthony Stafford Beer; Os deuses da administração, de Charles Handy; Criando organizações eficazes e The structure of organizations, de Henry Mintzberg; Estratégia e sucesso nas empresas, de Sergio Baptista Zaccarell; Ecologia de empresas: um estudo do ambiente empresarial, de Sérgio Baptista Zaccarelli, Adalberto Fischmann e Ruy Aguiar Leme. Cinema, literatura, poesia e vida, eis o quarteto que transpassa o livro. Conferi a referência a mais de 37 filmes e documentários. Não vou aqui elencá-los sob pena de tornar-me enfadonho. Também são muitos os literatos e poetas que povoam seus textos, todos eles mencionados de modo não leviano, como fazem pessoas que, arrogantemente, querem dar demonstração de eloquência e intelectualidade. Pablo Neruda, Ítalo Calvino, Julio Ribeyro, José Saramago, Eça de Queiroz, Affonso Sant’Anna aparecem para dialogar com os fatos, com teóricos do empreendedorismo e das organizações, com gente comum, com seus amigos, em suma, com o próprio leitor. Embora por vezes repita, por questão mesma de estilo de escrita, uma métrica de abordagem e apresentação dos assuntos, isso não torna a leitura dos textos enfadonha. É certo que a compreensão de alguns deles exige do leitor indagação sobre quem são, em sua teia de relacionamento pessoal, algumas pessoas mencionadas. Isso me parece uma boa “deixa” para iniciar agradáveis conversas com Fernando Gimenez. Afinal, o livro me parece ter sido escrito para os próximos e íntimos, como uma dádiva de gratidão e generosidade.

Ariston Azevedo - Prof. Dr. da Escola de Administração Universidade Federal do Rio Grande do Sul Fernando Antonio Prado Gimenez


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Fernando Antonio Prado Gimenez é londrinense, professor universitário e escritor. Atualmente, publica seus escritos, principalmente, em dois blogs: https://umhaikaiaodia.blogspot.com/ https://brevestextos.blogspot.com/ Fotografia da capa e contracapa: acervo gratuito de Canva.com Empreendedorismo e pequenas empresas: coisas que você não vai ler em livros universitários e de autoajuda




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