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Guia Cultural
from Flash Vip #94
by Flash Vip
Homem, és capaz de ser justo? Olympe de Gouges
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Aobra Homens justos: Do patriarcado às novas masculinidades é o primeiro livro do historiador francês Ivan Jablonka publicado no Brasil. Mescla de ensaio erudito com manifesto, discorre sobre a longa história do patriarcado, em diferentes tempos e sociedades, para ao final, condená-lo e propor como saída, a criação de novas masculinidades. Para ele, é preciso transformar o masculino para que se torne compatível com os direitos das mulheres e incompatível com as hierarquias patriarcais. Essa seria a próxima utopia necessária. Se até agora, os homens travaram todas batalhas, sonharam com inúmeras formas de emancipação, teria chegado a vez de condenar os privilégios do masculino. A estes homens, inspirado nas palavras revolucionárias de Olympe de Gouges, Jablonka chama de Homens justos.
Não precisaríamos ir tão longe para chegar a tais conclusões. Bastaria olhar para o legislativo e o executivo, para dentro das casas, para o setor empresarial, para os movimentos sociais. Onde existe poder, há predomínio masculino. Ainda assim, Jablonka recua no tempo para mostrar a longa duração dessa estrutura. Nos mostra como o masculino passou a ser associado à virilidade, à violência e à dominação. Pouco a pouco, o patriarcado se define como um sistema em que o masculino encarna tanto o superior quanto o universal, em proveito de uma maioria de homens e de uma minoria de mulheres. Ele é o sexismo institucionalizado na forma de prestígios e transcendência.
Ainda que, na maioria das vezes, acomodados na dinâmica da sociedade patriarcal, nós homens, sabemos das inúmeras violências que nossas mães, nossas amigas e filhas sofrem cotidianamente. Os dados e as formas de feminicídio, de todo o tipo de violência física e simbólica contra as mulheres, fruto do machismo e da misoginia, estão tão disponíveis, que exige criatividade para aqueles homens que legitimam seus privilégios em argumentos negacionistas.
A cultura patriarcal, nós homens, sentimos na pele. Desde a infância somos coagidos a adotar atitudes violentas, muitas vezes, estúpidas, nessa distribuição de papéis de gênero. Excluídos de uma cultura do cuidado, aprendemos a lutar, a fazer guerra, a sermos líderes, mas nunca a proteger, a amar e a agir com ternura. Paradoxalmente, para Jablonka, a cultura viril revela uma masculinidade intrinsecamente frágil, que duvida de si mesma, que teme não estar à altura, por isso, exige uma constante afirmação, justificando todas as provocações e ostentações da virilidade. O masculino nunca está suficientemente provado: porque quando se é homem, é preciso sê-lo o tempo todo, e sempre mais. A masculinidade de dominação paga, mas também cobra. Seu custo é a insegurança do ego, a vaidade pueril, exposição à situações de risco e a diminuição da expectativa de vida. Não é à toa que as formas de populismo autoritário se sustentam em um tipo de masculinidade de ostentação, destruidora de si e dos outros. Uma masculinidade caricata que revela a fragilidade de homens que se sentem ameaçados pelas transformações do presente, à procura da restauração de um passado em que o patriarcado era inquestionável. No Brasil atual, mais do que nunca, o orgulho da virilidade se revela como catástrofe.
No final do livro, Jablonka insiste na necessidade de criarmos outras formas de existirmos como homens, junto com as mulheres feministas, combatendo o patriarcado. Novas masculinidades podem curar o masculino do seu complexo de superioridade? Podemos viver como alguém que respeita a igualdade entre homens e mulheres, assim como entre diferentes masculinidades e feminilidades? Homem, és capaz de ser justo?
RICARDO MACHADO doutor em história, professor na UFFS e curador da Livraria Humana, em Chapecó.
Vale a pena ouvir de novo
Uma história de 50 anos que chega ao “fim”.
Já que o momento é de nostalgia, vamos voltar ao tempo, mais precisamente em 2003, ano que nascia a Revista Flash Vip. Aproveito para mudar um pouco a minha coluna nesta edição. Ao invés de dar dicas de LP, CD, K7 e digital, vou dedicar estas poucas linhas e fazer uma homenagem aos colecionadores de trilhas de novelas e o que foi sucesso musical naquele ano. No mês de setembro foi comunicado oficialmente o fim da produção das trilhas de novelas pela Rede Globo. Foram 50 anos de história, que começou em novembro de 1970, quando foi criada a gravadora Som Livre. A partir de 1971, a TV Globo passou a produzir suas próprias trilhas, inaugurando com o disco da novela O Cafona, que alcançou a marca de 200 mil cópias vendidas, sendo o 14º álbum mais vendido daquele ano.
Mas vamos falar de 2003, ano que nasceu a FV? Entre os 20 CDs mais vendidos no Brasil naquele ano, estão três trilhas sonoras, sendo duas lançadas em formato duplo, que totalizam cinco discos no topo das paradas. Começando pelo 20º lugar, está o Volume 2 da novela Mulheres Apaixonadas. Nesta seleção, hits de Skank Dois rios e Jota Quest Amor maior (quarto e quinto lugar como as músicas mais executadas nas rádios daquele ano); Renato Russo Mais uma vez; foram os destaques, juntamente com grandes nomes internacionais como Rod Stwart, Diana Krall e Natalie Cole.
O quinto mais vendido foi a trilha de Celebridade, lançada em CD duplo (nacional e internacional). Foi a segunda experiência nesse formato e mais uma vez um sucesso absoluto, assim como a novela. Amor e sexo da Rita Lee; Nossa canção de Vanessa da Mata; Encostar na tua de Ana Carolina; Offer de Alanis Morissette; Bigger than my body de John Mayer e uma seleção que contou com mais de 30 músicas!
O primeiro lugar volta a ser da novela Mulheres Apaixonadas, mas com o lançamento em CD duplo (nacional e internacional), que aconteceu pela primeira vez na história das trilhas de novelas. O sucesso foi tanto que chegou à marca de 1 milhão de cópias vendidas. Velha infância dos Tribalistas foi um dos grandes hits, sendo a segunda música mais tocada nas rádios daquele ano. Na nacional, ainda vale destacar o tema de abertura Quando a luz dos olhos teus de Tom Jobim e Miúcha. Inesquecível tema que remete ao novelão de Manoel Carlos. A trilha internacional é um show a parte. Norah Jones com seu primeiro grande sucesso Don't Know Why; Avril Lavigne com I'm with you; Maná com Vivir sin aire; Missunderstood do Bon Jovi; Sexed up de Robbie Williams; Imbranato de Tiziano Ferro e ainda Shakira e Jennifer Lopez.
Se teremos ou não algum lançamento esporádico, só o tempo dirá. O que fica são as grandes trilhas que embalaram e marcaram muitos personagens nesses 50 anos. Babalu, Jade, Diná, Berdinazzi, Mezzenga, Nazaré, Carminha, Helenas… personagens e temas que ficaram imortalizados nas nossas memórias, e claro, na minha coleção!
NANDO SBRUZZI é publicitário, especialista em Merchandising, colecionador de lp's e cd's que embalam a trilha sonora da sua vida.
Voltando ao passado – o cinema em 2003
Parabéns, Revista Flash Vip, pelos 18 anos! Entrei no clima da comemoração e resolvi olhar para 2003 e analisar os maiores filmes daquele ano, de acordo com a bilheteria mundial.
O SENHOR DOS ANÉIS – O RETORNO DO REI
Lançado em 2003, o filme terminou a trilogia d’O Senhor dos Anéis, e fez o que muitas franquias cinematográficas já tentaram sem sucesso (e continuam tentando): fazer um filme grandioso, intenso e que consegue fechar todas as pontas de uma história sem subestimar quem está assistindo. O filme foi a maior bilheteria mundial no ano de 2003 e venceu 11 Oscars em 2004, inclusive de Melhor Filme (importante lembrar que a trilogia é baseada em livros e deve muito do sucesso ao incrível mundo que o autor J. R. R. Tolkien criou). Hoje, 18 anos depois, os filmes continuam deslumbrantes visualmente e as nove horas necessárias para assistir a trilogia valem muito a pena, tanto para quem já viu os filmes no lançamento, quanto para quem nunca o fez.
PROCURANDO NEMO
O segundo maior filme de 2003 (vencedor do Oscar de Melhor Animação em 2004), é mais um da parceria Disney + Pixar que foi um grande sucesso. Pouco após o lançamento, todos queriam falar “baleiês” como Dory e se apaixonaram pela família de peixes palhaços, que inclui Nemo. Grande qualidade nos visuais e história que envolve adultos e crianças, foi mais uma produção que consolidou a Disney e Pixar como referências em animação e que até hoje mantêm o interesse dos fãs a cada novo lançamento.
MATRIX RELOADED
Matrix teve um ótimo início com um filme mostrando uma história inovadora e efeitos nunca vistos antes, mas as duas sequências — ambas lançadas em 2003 — ficaram longe da qualidade que todos estavam esperando, infelizmente. Para se ter uma ideia, o filme final da franquia (Matrix Revolutions), lançado seis meses após Reloaded, faturou 42% menos que seu antecessor, já que muitos perderam o interesse pela história.
Em 2021, 18 anos depois, o quarto filme está chegando (lançamento previsto para dezembro) — Matrix Resurrections é dirigido por Lana Wachowski e traz Keanu Reeves e Carrie-Anne Moss de volta aos papéis principais — e acredito que, assim como eu, muitos estão tentando não ter tantas expectativas para poder aproveitar a experiência de voltar para a Matrix após tanto tempo sem muitas decepções.
GUILHERME BONAMIGO é gestor de projetos e mora em Toronto, Canadá. É provavelmente tarde demais para perceber que assiste filmes e séries mais do que deveria.
Não olhe pra trás agora
O fascínio pelo terror.
O.terror sempre me intrigou. O medo tem uma perspectiva evolutiva bastante pertinente, mas também açoita o entretenimento da humanidade desde os primórdios, com contos e narrativas que nos dão calafrios.
Porém, passo por um fenômeno curioso que, empiricamente, percebo que muita gente passa também: tenho muito mais medo de jogos de terror do que em qualquer outra mídia. Hoje vamos falar um pouco desses.
Adoro filmes de terror, mas jogos de terror me desgraçam a cabeça de um jeito que, olha… A experiência é muito mais imersiva e a tensão aumenta exponencialmente. Enquanto filmes nos colocam em papel de espectador, o jogo nos coloca como um protagonista, onde suas escolhas e interações determinam o prosseguimento da narrativa. Ao menos à minha experiência pessoal, jogos de terror estão entre as experiências mais imersivas que podemos ter no gênero.
Em 2011, Dead Space nos trouxe uma das melhores experiências de action horror dos últimos anos. Inserido em uma temática de terror espacial e com uma narrativa que nos traz criaturas oriundas dos mais profundos pesadelos, o jogo nos faz mergulhar em cenários apavorantes em que não há esquina segura, não há porta aberta sem um novo horror. As duas sequências lançadas ainda em 2011 e 2013, apesar de terem sua qualidade variável, ainda são notáveis representantes de jogos de terror de ação com fortes características de jogo de sobrevivência.
A franquia Silent Hill é uma das mais clássicas e reverenciadas dos jogos. Com direito a adaptações cinematográficas, os jogos têm algumas das obras primas do terror nos nos games. Mesmo com tantos exemplos bons, hoje vamos falar de uma raridade. De um “quase” jogo…
Em 2014, os usuários de Playstation 4 foram surpreendidos por um “trailer jogável” denominado P.T. – Playable Teaser. O jogo consistia de uma história aterrorizante que se passava em um ambiente onde o jogador passava sempre pelo mesmo local, com pequenas diferenças entre eles. Após vencer uma série de puzzles encardidos, descobriu-se que esse trailer jogável se tratava de uma prévia do jogo Silent Hills (com ‘s’ mesmo), dirigido pelo lendário produtor Hideo Kojima (notavelmente conhecido pela série Metal Gear) e pelo produtor e diretor de cinema Guillermo Del Toro.
A produtora Konami cancelou o jogo e removeu a possibilidade de download e reinstalação de P.T. da loja da Playstation, a ponto de os consoles com o jogo instalado tornarem-se raridade. Mesmo com a obra cancelada, muitos jogadores (eu incluso) consideram esta uma das obras primas do terror nos jogos.
A série Resident Evil é uma das mais clássicas franquias de jogos de todos os tempos. No decorrer dos anos, a série se metamorfoseou tanto que constantemente se afastou da ênfase ao terror e ganhou características prevalentes de jogo de ação e sobrevivência. Resident Evil 7, no entanto, busca trazer a série de volta às origens e traz uma narrativa imersiva e apavorante.
Já que falamos tanto de imersão, jogar Resident Evil 7 em realidade virtual (àqueles que tiverem essa possibilidade) é uma das experiências mais apavorantes que já passei na minha vida. Olha… 10/10.
Halloween tá aí. Aproveita essa data pra um bom jogo de terror com a galera. Não tenha dúvidas que vai render junto dos sustos, ótimas risadas.
ANGELO PARISOTTO é professor universitário. Joga mais do que é saudável, mas menos do que gostaria.
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