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Homens Justos.
Do patriarcado às novas masculinidades, de Ivan Jablonka
história, professor na UFFS e curador da Livraria Humana, em Chapecó.
à situações de risco e a diminuição da expectativa de vida. Não é à toa que as formas de populismo autoritário se sustentam em um tipo de masculinidade de ostentação, destruidora de si e dos outros. Uma masculinidade caricata que revela a fragilidade de homens que se sentem ameaçados pelas transformações do presente, à procura da restauração de um passado em que o patriarcado era inquestionável. No Brasil atual, mais do que nunca, o orgulho da virilidade se revela como catástrofe. No final do livro, Jablonka insiste na necessidade de criarmos outras formas de existirmos como homens, junto com as mulheres feministas, combatendo o patriarcado. Novas masculinidades podem curar o masculino do seu complexo de superioridade? Podemos viver como alguém que respeita a igualdade entre homens e mulheres, assim como entre diferentes masculinidades e feminilidades? Homem, és capaz de ser justo?
RICARDO MACHADO doutor em
obra Homens justos: Do patriarcado às novas masculinidades é o primeiro livro do historiador francês Ivan Jablonka publicado no Brasil. Mescla de ensaio erudito com manifesto, discorre sobre a longa história do patriarcado, em diferentes tempos e sociedades, para ao final, condená-lo e propor como saída, a criação de novas masculinidades. Para ele, é preciso transformar o masculino para que se torne compatível com os direitos das mulheres e incompatível com as hierarquias patriarcais. Essa seria a próxima utopia necessária. Se até agora, os homens travaram todas batalhas, sonharam com inúmeras formas de emancipação, teria chegado a vez de condenar os privilégios do masculino. A estes homens, inspirado nas palavras revolucionárias de Olympe de Gouges, Jablonka chama de Homens justos. Não precisaríamos ir tão longe para chegar a tais conclusões. Bastaria olhar para o legislativo e o executivo, para dentro das casas, para o setor empresarial, para os movimentos sociais. Onde existe poder, há predomínio masculino. Ainda assim, Jablonka recua no tempo para mostrar a longa duração dessa estrutura. Nos mostra como o masculino passou a ser associado à virilidade, à violência e à dominação. Pouco a pouco, o patriarcado se define como um sistema em que o masculino encarna tanto o superior quanto o universal, em proveito de uma maioria de homens e de uma minoria de mulheres. Ele é o sexismo institucionalizado na forma de prestígios e transcendência. Ainda que, na maioria das vezes, acomodados na dinâmica da sociedade patriarcal, nós homens, sabemos das inúmeras violências que nossas mães, nossas amigas e filhas sofrem cotidianamente. Os dados e as formas de feminicídio, de todo o tipo de violência física e simbólica contra as mulheres, fruto do machismo e da misoginia, estão tão disponíveis, que exige criatividade para aqueles homens que legitimam seus privilégios em argumentos negacionistas. A cultura patriarcal, nós homens, sentimos na pele. Desde a infância somos coagidos a adotar atitudes violentas, muitas vezes, estúpidas, nessa distribuição de papéis de gênero. Excluídos de uma cultura do cuidado, aprendemos a lutar, a fazer guerra, a sermos líderes, mas nunca a proteger, a amar e a agir com ternura. Paradoxalmente, para Jablonka, a cultura viril revela uma masculinidade intrinsecamente frágil, que duvida de si mesma, que teme não estar à altura, por isso, exige uma constante afirmação, justificando todas as provocações e ostentações da virilidade. O masculino nunca está suficientemente provado: porque quando se é homem, é preciso sê-lo o tempo todo, e sempre mais. A masculinidade de dominação paga, mas também cobra. Seu custo é a insegurança do ego, a vaidade pueril, exposição
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Homem, és capaz de ser justo? Olympe de Gouges