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Saberes O relato de quem regressou às aulas presenciais
Milhares de alunos do Ensino Secundário regressaram às aulas presenciais. Falámos com estudantes de todo o país, para que nos contassem a sua experiência.
«Como um filme de ficção científica». Ir à Escola durante uma pandemia
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Foi minutos antes da sua primeira aula presencial em dois meses que o estudante Júlio Faria falou à FORUM. “Estou ansioso e curioso”, escreveu no WhatsApp. Já depois de três horas de aulas, durante as quais não saiu da sala, o aluno do 12.º ano da Escola Secundá ria D. Maria II, em Braga, relatou mais detalhadamente a sua experiência:
“Correu bem. Ao longo do dia, fui-me
acalmando”. Os corredores desertos ou com poucas pessoas contribuíram para uma sensação de estranheza, bem como o facto de existir ainda a incerteza das primeiras vezes, conta:
“Parecia o primeiro dia de aulas outra vez. Tudo era uma novidade”.
A partir de segunda-feira, dia 18, as es colas secundárias voltaram à atividade letiva presencial, juntando novamente colegas e professores separados há cerca de dois meses. Os contornos deste regresso são, contudo, muito diferentes dos habitualmente associa dos ao ambiente escolar, como explica o estudante de 17 anos, Alexandre Jorge, da Escola Secundária de Porto de Mós: “Senti algum nervosismo, por
saber que iríamos regressar a uma escola que, sendo a mesma, era uma escola diferente, por estarmos sujeitos a condições que nunca tínhamos
experienciado”. As normas de segurança foram comunicadas pela Direção Geral dos Estabelecimentos Escolares (DGEstE)
e vão da divisão de turmas à criação de percursos sinalizados no espaço
escolar, passando pelo encerramento de espaços comuns como salas de convívio ou de apoio. De igual forma, em muitos dos casos dos estudantes entrevistados pela FORUM, foi rea
lizada a medição de temperatura à
entrada do espaço escolar, bem como feita a desinfeção das mãos. As mudanças, contudo, começaram ainda antes do momento em que são cruzados os portões da escola. Para alguns dos estudantes, o próprio portão é uma mudança. É o caso de Marta Freitas, estu dante de 16 anos de Matosinhos. “Entrei
na escola por um portão completamente
diferente, que está sempre fechado”, conta, explicando que a escola multipli cou os pontos de entrada, para garantir uma maior dispersão dos alunos. A estranheza, conta, durou até ao momento em que viu a professora de máscara: “Foi
aí que disse a mim mesma – ‘Marta, a partir de agora vai ser sempre assim, não pode ser estranho’”.
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De volta à sala
Para os alunos entrevistados pela Forum, os nervos e a ansiedade diminuíram assim chegaram à sala de aula. O que não quer dizer que o contexto não cause desconforto e estranheza, ao ver “cada um no seu cantinho”, como descreve Marta Freitas. Por norma, os estudantes permanecem na sala de aula, aí passando os intervalos e co mendo os seus lanches, por exemplo.
São os professores que se deslocam entre salas, fazendo avançar o
horário. Os estudantes sentam-se, um por secretária, mantendo a máscara colocada durante todo o tempo e, na maioria dos casos, sem possibilidade de, por exemplo, acender um inter ruptor ou ir à casa de banho sem ser acompanhado. “No início, damos por nós a olhar para aquele cenário como alguém externo e sentimos que, se o tivéssemos imagi nado há três meses, acreditaríamos
que se tratava de um filme de ficção
científica”, conta Alexandre Jorge. O estudante destaca a importância destas condições de segurança, com impacto no estado de espírito dos
estudantes: “O cenário que encontrei foi tranquilizador – encontrei uma escola, acima de tudo, segura e muito bem preparada para o que estava a acontecer”.
Alexandre Jorge, estudante
A mesma ideia é partilhada por Inês Sousa, estudante de 18 anos da Escola Básica e Secundária Coelho e Castro, em Fiães, Santa Maria da Feira. “O facto de termos aulas a manhã [ou tarde] toda na mesma sala, dá-nos alguma segurança, por termos a cer teza de que ninguém esteve sentado no nosso lugar imediatamente antes, por exemplo”. Também por essa razão, para Inês, dentro das condicionantes que imagina, a experiência “acabou
por ser mais fácil do que estava à espera”.
O reencontro
Esta semana marcou também o regresso de muitos estudantes ao contacto social, depois de cerca de dois meses de isolamento. O primeiro impacto, conta Alexandre Jorge, chegou com a divisão da turma – “desta forma, muitos colegas que são próximos acabaram por não se encontrar”. Foi esse o caso de Teresa Silvestre, estudante de Arouca: “A maioria dos meus amigos
são de outras turmas e acabei por não os ver”.
Mesmo que com as condicionantes descritas, estar com os amigos foi “uma melhoria”, destaca Inês Sousa – “Es távamos com saudades, conversamos nas redes sociais mas podermos ver os amigos foi bom”. Há uma “sensação de tristeza”, descreve, que resulta do conhecimento e compreensão de que os estudantes não se podem abraçar ou sequer estar próximos. Ainda assim,
“foi melhor do que ver através de um ecrã”.
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“Mesmo que afastados, é bom
estarmos juntos”, concorda a estudan te Marta Freitas. Ainda que existam saudades, conta a estudante de 16 anos, Maria João Saraiva, de Oliveira de Azeméis, é necessário “medir as brincadeiras”. No caso da sua escola, durante um dos intervalos, foi permiti do a um grupo de cerca de 10 estudantes passar alguns minutos no exterior, num espaço circunscrito e com um responsável a vigiar a proximidade entre alunos. A solução encontrada
pelos estudantes, conta Maria João, foi realizar alguns jogos que permitem
“garantir o distanciamento”. “Fizemos jogos um pouco infantis, como o jogo da macaca”, conta. A importância do contacto entre colegas não se resume, contudo, aos que estão presentes no espaço escolar, acrescenta a estudante. No caso da sua turma, uma colega não regressou às aulas presenciais, por opção dos encar regados de educação cujo agregado familiar inclui doentes de risco. As instruções do Ministério da Educação ditam que a escola não tem a obriga ção de continuar a garantir o ensino à distância a quem se ausentar. No caso da colega de Maria João, são os
CTeSP e LICENCIATURAS CURSOS TÉCNICOS SUPERIORES PROFISSIONAIS (CTeSP)
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ESCOLA SUPERIOR AGRÁRIA Análises Químicas e Biológicas Cuidados Veterinários Energias Renováveis Produção Agrícola Proteção Civil Recursos Florestais
ESCOLA SUPERIOR AGRÁRIA Agronomia Biotecnologia Alimentar Enfermagem Veterinária Engenharia de Protecção Civil
ESCOLA SUPERIOR DE ARTES APLICADAS
Design de Comunicação e Audiovisual Design de Interiores e Equipamento Design de Moda e Têxtil Música variante de: Canto / Formação Musical / Instrumento / Música Electrónica e Produção Musical
ESCOLA SUPERIOR DE EDUCAÇÃO Assessoria e Comunicação Empresarial Desporto Recreação Educativa para Crianças
ESCOLA SUPERIOR DE GESTÃO Gestão Empresarial Restauração e Bebidas
LICENCIATURAS
ESCOLA SUPERIOR DE EDUCAÇÃO Desporto e Actividade Física Educação Básica Secretariado Serviço Social
ESCOLA SUPERIOR DE GESTÃO
Gestão (ramo de Contabilidade ou ramo de Recursos Humanos) Gestão Comercial Solicitadoria Turismo
ESCOLA SUPERIOR DE TECNOLOGIA
Automação e Gestão Industrial Comunicações Móveis (em parceria com a Altran – Fundão) Desenvolvimento de Produtos Multimédia Instalações Elétricas e Telecomunicações Reabilitação do Edificado Redes e Sistemas Informáticos Tecnologias e Programação de Sistemas de Informação
ESCOLA SUPERIOR DE SAÚDE DR. LOPES DIAS Ciências Biomédicas Laboratoriais Enfermagem Fisiologia Clínica Fisioterapia Imagem Médica e Radioterapia
ESCOLA SUPERIOR DE TECNOLOGIA Engenharia Civil Engenharia das Energias Renováveis Engenharia Electrotécnica e das Telecomunicações Engenharia Industrial Engenharia Informática Tecnologias da Informação e Multimédia
colegas que partilham os apontamentos e outros materiais utilizados, conta.
“A nossa escola também recomenda e pede aos professores que facilitem os materiais a esses alunos, por e-mail ou
pela nossa plataforma”, acrescenta a estudante.
Cumprir as regras
Para Alexandre Jorge, foi uma “agradável surpresa” perceber que todos os alunos “estão despertos para a
gravidade do que está a acontecer,
cumprindo todas as regras”, exce tuando algumas distrações iniciais. De igual forma, a maioria dos estudantes contactados destaca a forma como, durante esta primeira semana, as regras foram cumpridas pela maioria dos estudantes.
Contudo, conta Teresa Silvestre, as exceções existem. Para a estudante, que viu alguns estudantes a infringir normas de distanciamento e segu rança, a “falta de funcionários poderá ter impacto”. “Há ideia de que os estudantes do 11.º e 12.º ano poderão
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ser mais conscientes e responsáveis, mas não será o caso de todos”, realça, destacando a importância de existir uma autoridade, em certos casos. “Há
um choque de ideias, de informação,
de mentalidades”, alerta, relatando os casos de estudantes que não querem cumprir normas por acharem que tudo vai passar. “Eu também acho que
vai passar, mas acho que passa mais
rápido se as regras forem cumpridas”, sublinha.
E a aprendizagem?
“Na sala, não há quebras de ligação”, resume Teresa Silvestre, quando questionada sobre a eficácia da apren dizagem presencial no contexto atual. “Podemos colocar dúvidas de imediato, permite uma melhor participação. É muito melhor, mesmo que com as condicionantes”, sublinha.
Essa é a opinião de todos os estu dantes contactados, para quem o contexto desconfortável não impacta irremediavelmente a aprendizagem.
“Penso que vale 100% a pena [ter aulas presenciais], tendo a noção dos riscos, que minimizamos com as
normas de segurança”, destaca Inês Sousa, sublinhando a possibilidade dos professores terem “outro feedback dos alunos e poderem reformular ou reajustar a explicação”. A turma de Maria João Saraiva está habituada a uma modalidade de aprendizagem que está “fora da mesa”, neste momento, conta a estudante: os trabalho de grupo. Ainda assim, ressalva, esta experiência presencial “está a valer a pena”, ao permitir aos estudantes fazer perguntas e trocar ideias, algo que con sidera “um importante complemento à
aprendizagem”.
Marta Freitas, estudante
Para Marta Freitas, o facto de todas as possíveis e clássicas distrações de um estudante em sala de aula estarem proibidas – como os clássicos “bilhe tinhos” ou as intemporais “conversas paralelas” – facilita a aprendizagem.
“Estou a absorver melhor a matéria agora do que em casa. Está a resultar
bem”, resume.
Olhar o futuro
A totalidade dos estudantes contactados olham este regresso como uma necessidade. Alguns, pela importância da aprendizagem e de garantir a melhor preparação. Outros, como Maria João Saraiva, estudante do 11.º ano, “estão a ver para além deste mês e meio” – “Estamos a aprender como tudo isto funciona para, no próximo ano, ser uma coisa normal e já estarmos adaptados”. A mesma ideia é destacada por Marta Freitas: “Já interiorizei que [a Escola]
vai ser assim num futuro próximo – vamos ter de nos habituar e quanto mais cedo, melhor”.
O regresso é importante, mas ainda mais essencial é que as regras de seguran ça sejam cumpridas, destaca Teresa Silvestre. Se é verdade que os estudos apontam para uma menor taxa de letalidade do novo coronavírus nos mais jovens, a infeção não termina em nós mesmos, recorda. “Eu sinto que, mesmo que a consequência não seja tão forte em nós [jovens], passamos a ser um vírus andante. Os jovens podem acabar
por ser uma arma, se não nos proteger
mos”, sublinha, antes de concluir: “É a
partir de nós que as coisas vão mudar. Gostava que as pessoas interiorizassem isso”.
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