Encontro da
diversidade do Cerr ado Fotorreportagem de Bรกrbara de Almeida
o evento
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VIII Encontro e Feira dos Povos do Cerrado O VIII Encontro e Feira dos Povos do Cerrado aconteceu em Brasília (DF) entre os dias cinco a oito de junho. Organizado pela Rede Cerrado, organização da sociedade civil que atua na promoção do desenvolvimento sustentável e na conservação do bioma, o Encontro reuniu cerca de 700 líderes e representantes das populações tradicionais do Cerrado.
O Complexo Multicultural Funarte, sede do VIII Encontro e Feira dos Povos do Cerrado.
O evento começou no Dia Mundial do Meio Ambiente e visava garantir a aliança dos povos do Cerrado, em favor do território, água, biodiversidade e cultura, por meio de debates, mesas redondas e seminários, além de atrações culturais e feira de artesanato. Gratuito e aberto ao público, o Encontro
também contou com um espaço gastronômico, onde chefs de cozinha promoveram oficinas sobre a importância de incluir os produtos típicos do bioma na alimentação. O objetivo dos povos participantes era clamar por seu direito à terra e ao território. Eles querem, na prática, que o governo garanta o direito de usar os recursos naturais do bioma legalmente. Indígenas e quilombolas já gozam desse reconhecimento e têm parte de seus territórios demarcados. A situação não é a mesma para os demais povos do Cerrado, que abrange diversas outras comunidades tradicionais como quebradeiras de coco, geraizeiros, raizeiros, vazanteiros, extrativistas, pescadores artesanais, apanhadoras de flores e agri-
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o evento cultores familiares. Eles sequer estão mapeados pelo governo e essa invisibilidade no radar social fez que o Estado abrisse espaço para o agronegócio, a mineração e a grilagem de terras públicas – historicamente ocupadas pelos tradicionais. Além de entrar para o mapa, esses povos querem a autonomia para definir seu próprio território, fazendo parte da equipe designada para formulação de tais mapeamentos. Ao final do evento, foi aprovada uma pauta curta e incisiva com três pontos básicos: acesso à terra e aos territórios, reconhecimento e valorização dos seus modos de vida, usos e costumes e a opção pela produção agroecológica em suas áreas. A lista é o resultado de intensas discussões e manifestações ocorridas durante o encontro, entre os proprios represetantes
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dos povos tradicionais, do governo e do Ministério Público. Os povos do Cerrado também decidiram se unir contra emendas constitucionais, portarias e regulamentações que ameaçam o direito aos territórios. “Queremos a valorização dos nossos modos de vida, usos, costumes, saberes, que são a nossa característica”, disse a representante da comunidade quilombola de Mumbuca, no Jalapão (TO), que leu a carta com as reivindicações do grupo ao final do evento. Mato Grosso do Sul Das comunidades indígenas sul-mato-grossenses, apenas nove lideranças estavam presentes no evento. “O desejo era que nós touxessemos todas as etnias, so que nós tivemos uma dificuldade em levantar recursos”, disse Agnaldo Terena, um dos organizadores.
Em dinâmica voluntária, criada pelos prórprios participantes do evento, representantes de diversas comunidades tradicionais do cerrado cantam antes da plenária final acontecer.
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MATO GROSSO DO SUL Agnaldo (foto ao lado) explica a ausência das comunidades indígenas de Mato grosso do Sul: “tem Estados que possuem muitas associações e organizações indígenas. As do nosso Estado estão com problemas burocráticos”. Além da questão financera, Agnaldo aponta que outros eventos simultâneos impediram de maior participação do indígenas de MS na Feira: muitos terenas foram para o Rio de Janeiro para um protesto anti-Copa, e a comunidade Guarani não pode sair de suas terras por problemas latifundiários. Cacique Pires, da comunidade Terena de Miranda (MS), foi uma das lideranças que se mobilizou para participar do encontro (ao lado, foto embaixo). Junto de sua família, Pires demonstrou-se frustrado pela organização do evento, “esperava mais representantes da FUNAI para
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falarmos realmente sobre nossas lutas”. Greve de fome e de sede Paralelamente ao evento, cerca de 110 integrantes de comunidades tradicionais das serras e planaltos de Minas Gerais participavam de um protesto popular, a qual resultou em greve de fome e sede de 16 pessoas na Praça dos Três Poderes, na Esplanada dos Ministérios. Os manifestantes reivindicavam a criação imediata da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Nascentes dos Gerais, localizada nos municípios de Montezuma, Rio Pardo de Minas e Vargem Grande do Rio Pardo. Em atendimento ao protesto, a atual Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, prometeu destravar o processo da RDS, o que acarretou uma paralisação momentânea da greve.
greve de sede e de fome
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documento lido na plenária final
Minutos antes de ocorrer a Plenária final do evento, diversos músicos do cerrado brasileiro se reuniram para cantar músicas nacionais, de forma voluntária. “Somos os bahianeiros, aqui tem de tudo”, disse Josendalva, de Agogo da Malha da Bahia.
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Carta de Aliança dos Povos do Cerrado “Nós, Povos do Cerrado, somos os que sempre estiveram aqui. Somos também os que chegando depois, criaram raízes profundas nessa terra. Somos o encontro entre culturas, que deu origem a novos e diferentes modos de vida. Somos aqueles que, organizados, lutamos por esta terra e para nela permanecer. Somos aqueles que por gerações aprenderam os mistérios do Cerrado, em campos, veredas e florestas, seus ciclos, sua força criadora, mas também os seus limites. Somos os que dessa terra extraem o alimento saudável e a cura. Somos aqueles que, como o próprio Cerrado, resistem à opressão e à exploração gananciosa dos que acumulam, degradam e excluem. Somos povos indígenas, quilombolas, quebradeiras de coco, geraizeiros, raizeiras e raizeiros, vazanteiros, fecho de pasto, extrativistas, pescadores artesanais, apanhadoras de flores, agricultores familiares e trabalhadores rurais. Juntos, durante o VIII Encontro e Feiras dos Povos do Cerrado, reafirmamos entre nós uma aliança de solidariedade e de luta por nossas causas comuns: 1. O direito à terra e ao território, como espaço de vida e condição fundamental para a conservação da biodiversidade, das águas e de nossas culturas, repudiando, assim todas as emendas constitucionais, portarias, e regulamentações que possam ameaçar esse direito, a exemplo da PEC 215 e da ADIN 3.239-9, que investem contra as formas já estabelecidas pelo Estado brasileiro de reconhecimento formal de terras indígenas e terras de quilombos. 2. O reconhecimento e valorização dos nossos modos de vida, usos e costumes, saberes e fazeres, construindo e fortalecendo os instrumentos legais e políticos para tanto, a exemplo da Convenção 169 da OIT, que trata dos direitos de autodeterminação de povos indígenas e tribais, e o Decreto 6.040, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais. 3. O fortalecimento de nossa opção pela agroecologia, como prática e princípio integrador entre natureza e cultura, em oposição ao modelo degradador do agronegócio e à mercantilização da vida. Trabalharemos, unidos na luta e fortalecidos na união, para defender o Cerrado, suas águas e sua gente. Viva o Cerrado, viva os Povos do Cerrado!”
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feira O encontro também reuniu os povos e etnias para uma feira de artesanatos e venda de alimentos característicos do Cerrado, que ficou aberta ao público durante toda a realização da programação. Com objetos caracteristicos de cada grupo participante, a feira possuia extensa diversidade de artefatos, provinientes de todos os estados abrangidos pelo bioma Cerrado no Brasil. Maria e Maruta, indígenas da etnia Xingu, provenientes de Mato Grosso, vendiam colares e arcos típicos de seu povo (acima). Também havia diversas tribos indígenas que realizavam pinturas tradicionais nos participantes (centro). Rosangela, Ancelma e Marisa são da Central da Economia Solidária, localizada em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Elas levaram peças de diversos artesãos do estado para a comercialização no local, e revezavam a presença na tenda para participarem dos demais atividades previstas na programação.
Pedro Machado, de Campo Grande/MS, foi ao evento junto a sua familia para comercializar produtos que fabricam a base de mel. “Infelizmente não pudemos participar dos debates, por que tínhamos que nos revezar na feira. Na próxima iremos trazer mais gente, pra podermos ir nas discussoes”
produtos do cerrado
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Trabalho apresentado pela acadêmica Bárbara de Almeida, como parte integrante para avaliação da disciplina “Prática em Reportagem Fotográfica”, ministrada pelo Prof. Me. Silvio da Costa Pereira, no curso de Comunicação Social - habilitação em Jornalismo na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS. - Julho de 2014 -