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Os caminhos da arquitetura brasileira nos anos 1950 a 1960
Os caminhos da arquitetura brasileira nos anos 1950 a 1960
Arquitetura moderna brasileira e arquitetura no segundo pós-guerra Identidade Nacional Na disputa entre qual arquitetura representaria melhor a identidade nacional, o Neocolonial e o Moderno entram em disputa. José Mariano, grande defensor do Neocolonial, dizia que a arquitetura moderna era comunista, sionista e ainda exótica, ou seja, não era natural ao Brasil. Lucio Costa, já adepto do modernismo, em combate a essa “justificativa” irá defender que a arquitetura moderna tinha forte relação com a arquitetura nacional feita na colônia. Lucio Costa chega a relacionar o concreto armado como as construções em taipa de pilão. A arquitetura moderna brasileira seria a legítima porque dialoga com a matriz latino-europeia, a nossa cultura nasceu na bacia do mediterrâneo e a arquitetura moderna aqui se desenvolve como a cultura mediterrânea.
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A ideia de arquitetura moderna no Brasil e do Brasil irá marginalizar uma grande produção, por não ser vista como legítima brasileira, mas sim feita no Brasil. Como o caso de Warchavchik e Rino Levi. Gregori Warchavchik foi “atacado” por todos os lados: os tradicionalistas descrentes na arquitetura moderna, eram contra o arquiteto por discordar de seus ideais modernos.
Apesar da arquitetura moderna não ser a apresentada na semana de arte moderna, Lucio Costa teve influência da semana de arte para formular seu discurso moderno. O discurso de Lúcio Costa está diretamente associado ao pensamento da época, criar um passado era necessária em diversas áreas. Surgia a “necessidade” de definir um herói, um artista principal. Dessa forma, Costa irá tentar relacionar a arquitetura de Niemeyer com as obras barrocas de Aleijadinho, porém, ambos faziam sua arte de maneira própria. em que artista tinha uma obra barroca própria, Niemeyer também fazia uma arquitetura moderna própria.
O livro de Mindlin lançado em 1956 com uma versão em Português só na década de 90, irá apresentar várias obras de qualidade e a produção arquitetônica de arquitetos que não estavam no centro do debate. Funcionou como uma propaganda da arquitetura brasileira. No livro a arquitetura moderna de habitação social é mais explorada. O livro apresenta muitas obras de Oscar Niemeyer, como o Copan.
Rino Levi também é apresentada de forma ampla no livro. Há também obras de arquitetos estrangeiros no Brasil.
O hotel de Nova Friburgo de Costa é uma das obras apresentada no livro, tem como referência a obra Maison Errázuriz de Le Corbusier. Utilizando de materiais locais, madeira, telha, etc. A obra visa demonstrar que é possível fazer arquitetura moderna com materiais que vão além do concreto, aço e vidro, o que importa é a concepção.
Foi sendo criada a ideia de uma hegemonia da arquitetura moderna brasileira. o Desenvolvimentismo ganhou forças após a segunda guerra mundial. Devido a possibilidade concreta de tornar executável aquilo que antes era difícil. O pensamento desenvolvimentista era baseado na CEPAL, já que o excedente do lucro do café de São Paulo, usado para montar as indústrias nacionais, não era suficiente para promover o desenvolvimento industrial esperado. O desenvolvimento industrial representa, ao invés de exportar matéria prima, ser exportador de mercadorias manufaturadas. O Partido comunista nesse momento apoiava o setor moderno, da
burguesia, pois não era o momento para se contrapor ao industrial. Isso gerou uma crise, levando a diversas denúncias de corrupção no governo Vargas, que teve como consequência o suicídio de Getúlio Vargas e a crise governamental que se deu após tal fato. As políticas desenvolvimentistas só voltam com o governo de Juscelino Kubitschek.
Vilanova Artigas, se formou como engenheiro arquiteto pela Politécnica. A primeira fase moderna de Artigas é Wrightiana. A arquitetura de Wright tem grande adesão na américa latina, pois era muito semelhante com o ideal de uma arquitetura “tropical”. Artigas se associa com o Partido Comunista e deixa de fazer arquitetura com características imperialistas com influência Wrightiana e começa a fazer arquitetura da escola carioca ligada as questões nacionais com influência Corbusiana. O Partido Comunista era contra a arquitetura moderna, criando um questionamento aos arquitetos modernos brasileiros. (PCB Manifesto de Agosto de 1952, chamando para a revolução.) Artigas se posiciona mais firmemente com o PCB, ocupando o cargo de formador. Foi um arquiteto moderno que opta pelo modernismo, mas entra em contradição com sua posição política que negava o modernismo.
Picasso dizia que sua arte não podia ser discutida no âmbito político, pois sua posição política era diferente. Niemeyer irá defender a ideia de que, na sociedade capitalista não tinha como fazer uma arquitetura social.
Em sua obra “A casa Baeta” de 1956, Artigas associa a casa com sua infância no interior do Paraná. Mesmo com o PC rompendo com o Realismo Socialista nesse momento, o arquiteto faz uma articulação entre o realismo e o modernismo. A partir dessa obra, Artigas supera sua contradição e começa a constituir a chamada Escola Paulista, caracterizada pelo concreto aparente, monobloco, ampliando os espaços comuns, trabalhando com desníveis, circulação, etc. fazendo da obra uma “mini cidade”. A casa é uma alternativa ao mundo agressivo e injusto, procura ensinar a morar de forma democrática.
A arquitetura da escola paulista irá pensar o edifício como uma cidade, utilizando de elementos construtivos como forma de reformatar e reconstruir, por vezes, o natural, imbuir a arquitetura de uma complexidade urbana (ligação com o TEAM X). Artigas é quem repõe a discussão da função social da arquitetura, é o motivo do brutalismo brasileiro ser chamado de paulista, por ele ter desnudado.
Ao mesmo tempo, Sérgio Ferro e o grupo Arquitetura Nova, fazem as críticas ao desenho como modificador, reconhecendo a história da arquitetura e da construção, levando a uma reflexão sobre a história das construções informais feitas nas periferias.
Cultura arquitetônica latino-americana no pós-Guerra
A forma construída de uma casca de concreto com toda sua rugosidade representada nas obras aponta, de uma forma gráfica, a dimensão de uma etapa de desenvolvimento ainda em processo, denotam para uma técnica ainda em evolução e transformação, não consolidada ainda no Brasil.
Em Artigas e também no caso de Redi e outros arquitetos modernos dos anos 50, o uso de concreto armado ganha maior visibilidade e a crueza do acabamento faz um paralelo muito fiel a ideia de um país ainda em desenvolvimento, como um momento de transição e transformação, não se pode considerar arcaico mas também não é inteiramente moderno.
As obras de Niemeyer para Brasília apresentam um esforço para dissimular essa ideia de “em desenvolvimento”. Ao envolver uma grande estrutura branca de concreto com mármore polido, Niemeyer faz o oposto de Le Corbusier nos anos 50 - quando explicita as técnicas construtivas - ele tenta esconder o processo e potencializar a obra final. Há uma tentativa de apagar o processo de produção e mãode-obra e tenta criar uma imagem de nação em que as tensões entre arcaico e moderno já estariam superadas, levando a uma visão otimista para o futuro em relação ao desenvolvimento do Brasil. Ou seja, dá a obra a concepção plástica e aponta para um país mais consolidado, maquiando uma certa perspectiva dualista do desenvolvimento do Brasil nesse período de modernização, principalmente nas obras do primeiro momento da construção. O que reflete em edifícios icônicos logo de início, com grande carga simbólica. Sendo este um traço forte de Niemeyer, criador de ícones ou obras icônicas.
Brasília e a cultura moderna brasileira teve um rápido apelo popular, principalmente porque a arquitetura moderna se projeta como um fenômeno de massa e ganha essa dimensão usando como estratégia a publicidade e os meios de comunicação. A arquitetura brasileira nos anos 40 e 50 vai aparecer em inúmeras revistas pelo mundo, principalmente com a construção de Brasília até ir perdendo espaço no interesse internacional. Esse grande interesse no Brasil vai dar espaço para várias discussões internacionais, particularmente na américa latina possui um importante papel de trazer o olhar para a cultura arquitetônica brasileira, abrindo espaço mundialmente para arquitetos nacionais atuarem internacionalmente.
A arquitetura formalista de Rino Levi e os irmãos Roberto e o paisagismo de Burle Marx ganham mais notoriedade com projetos no Chile e Uruguai do que o próprio Niemeyer.
Em 1955 acontece a exposição Latin American Architecture Since 1945, no MoMA e tem como curador Hitchcock, o mesmo curador da exposição International Style em 1932. O Brasil tem um grande peso na exposição com seus aspectos principais, como a liberdade formal, a sensualidade formal, etc. além de fazer outras conexões como a dimensão tecnológica, a relação com a história, a relação com a indústria da construção civil norte-americana. Mas não é o foco, a exposição não coloca o Brasil em segundo plano, mas também não é o elemento central. Dessa forma, procura apresentar um leque de arquitetos, construindo uma outra narrativa visando o principal da arquitetura moderna por toda a América Latina. A recepção da arquitetura moderna brasileira é muito mais abrangente do que a exposição do MoMA mostra. A exposição apresenta desde o olhar do passado pré colombiano, passando pelo colonialismo e chegando no mundo moderno dos anos 50, a relação da
arquitetura com a paisagem, que é um traço diferencial da arquitetura brasileira com relação a outros países, trazendo obras no México que continham esse traço, como a obra em Pedregal, são projetos que exprimem certa coexistência entre paisagem e a concepção formal do movimento moderno, pode-se dizer que é tal relação é um elemento construtivo como uma resposta cultural latino-americana e possui configurações diferentes em cada lugar. Nesse contexto a relação do homem com a natureza é bem típico.
Enquanto as obras de Wright apresentam uma certa diluição do projeto na paisagem, Niemeyer e outros arquitetos mexicanos vão criar arquiteturas que variam o foco, alguns projetos estão inseridos na paisagem, outros mudam a paisagem a partir do mesmo, de certo modo capturam a paisagem mas também geram paisagem e não busca a neutralidade do projeto com relação à paisagem, há um certo jogo de domínio e submissão da paisagem.
Paulo Mendes da Rocha, por exemplo, possui outra visão da paisagem, diz que “a natureza é um trambolho”, ou seja, é um elemento à qual se deve lidar e encontrar uma maneira de resolver, faz alguns projetos onde muda completamente a paisagem, esse traço é marcante em alguns arquitetos contemporâneos que seguem essa ideia da relação entre arquitetura e natureza onde tanto o arquiteto pode criar a paisagem, como é o caso do MuBE (Museu Brasileiro da Escultura, SP) de Paulo Mendes da Rocha, quanto ter uma posição de confronto com a natureza.
Nas primeiras décadas do século XX a ideia de identidade nacional ganha uma grande relevância no mundo todo. Onde cada qual buscava construir sua identidade considerando traços históricos, culturais, tradicionais, etc. reinterpretado e acrescido de alguns traços modernos que encaixasse perfeitamente como a expressão arquitetônica de seu país.
Na década de 20 e 30 começam a circular as ideias modernas e Paris era o centro cultural onde várias ideias do momento estavam sendo discutidas e experimentadas, de onde consequentemente, grande parte delas tomaram reconhecimento e foram difundidas pelo mundo, vários artistas, arquitetos e engenheiros do mundo todo passam por lá.
Nesse período elementos secundários ganham um certo protagonismo, como escadas, rampas, sacadas e outros elementos que fazem parte da obra, mas na tradição ficavam em segundo plano, nessa nova fase ganham visibilidade e importância nos projetos, com a escadaria, sacada no estilo da Bauhaus. Tal fato possibilitou um leque maior de elementos a serem explorados pelos arquitetos.
Na década de 50, Paris já não servia como único polo cultural difusor da arquitetura moderna já que a ideia era transpor os elementos desse estilo para o projeto de cada lugar com suas particularidades. Ou seja, a realidade social, política, econômica e cultural europeia não era a mesma na américa latina ou em outros lugares. Os elementos modernos são os mesmos, mas as formas com as quais as soluções são colocadas dependem de um estudo específico para cada lugar. Dessa forma, o Brasil acabou servindo como influência para países da américa latina, por meio de livros da arquitetura brasileira como Goodwin e Mindlin, revistas de arquitetura, além dos congressos pan-americanos que ocorreram até a década de 40.
Nos anos 50, a Venezuela passava por várias mudanças sociais e políticas principalmente ligadas ao desenvolvimento do mercado de petróleo do país, como consequência, houve um grande desempenho econômico bastante revertido para questões de melhoria social, consequentemente, a indústria da construção civil foi
muito beneficiada entre as décadas de 50 e 60, com um amplo aumento na produção de habitação. E a escola carioca nesse momento serviu como influência para o pensamento arquitetônico, principalmente pela semelhança cultural, política, territorial, climática, entre outros fatores.
Carlos Raúl Villanueva, é venezuelano, mas viveu muito tempo na Europa, inclusive se formou em Paris e volta para a Venezuela e começa a fazer vários projetos no país. Procura criar uma identidade nacional em seus projetos, considerando toda a história da colonização espanhola, tanto os traços dos colonizadores quanto dos nativos. Busca conectar a ideia de modernidade e tradição, principalmente por meio da experimentação, é possível observar uma certa influência de Lúcio Costa em seus projetos.
Pelos anos 30, ele se afasta um pouco das práticas acadêmicas e segue uma linguagem mais moderna, como pode-se observar em seu projeto de 1939 da “Escuela Gran Colombia”, em Caracas que aponta para um traço moderno mais diluído, ou seja, possuía influência moderna mas também traços tradicionais, já que o movimento moderno ainda era visto como uma tendência que poderia ser passageira. Em suas obras ele tanto evidencia o uso dos materiais construtivos e formas da arquitetura moderna como terraço jardim e janela de canto, mas também possui influências de arquitetos franceses como Auguste Perret e Tony Garnier, como no caso da entrada marcante da “escuela Gran Colombia”.
A arquitetura dos anos 40 de Villanueva apresenta uma liberdade bem maior. Em seu projeto da “Habitación Social El Silencio”, de 1941 observa-se certa diluição de linguagens, com toques clássicos na fachada pública e toques modernos na fachada posterior. Nos anos 50 sua mudança tem como marco o contato com a experiência brasileira, da escola carioca, que tem uma grande relação com o modelo que começava a ser difundido no Brasil e no mundo nesse período e apontava para a ideia de que era possível encontrar soluções modernas com os meios mais específicos de cada lugar.
Muitos arquitetos dos anos 30 que vinham de um pensamento mais ligado à academia, buscavam se mostrar como modernos seguindo influências de arquitetos que não rompem abruptamente o laço com o tradicional, deixando essa mudança de estilo menos brusca, pois se ancoram em um traço que já é consolidado, diferentemente da forma como Le Corbusier, Gropius e Mies rompem com esse laço e se aventuram nessa nova tendência.
Nesse período de busca pela identidade nacional, a arquitetura neocolonial ganha grande repercussão nos países colonizados. No caso do México, no começo do século XX, se deu a revolução mexicana (década de 10 a 20), promovendo várias mudanças no país, gerando uma preocupação social e coletiva do estado, dessa forma, foram construídos hospitais, escolas, instituições públicas, etc. Esse cenário causou grande impacto na forma de projetar dos arquitetos modernistas, onde estes assumem um compromisso com a modernidade no sentido de apresentar o país com uma nova cara pós revolução, lá pelos anos 20 e 30. A complexidade maior desse país também se deve à natureza da cultura mexicana, derivada de vários povos diferentes e esse caldo antropológico permeia muitos aspectos, tais quais cultura, arte, literatura e arquitetura, dessa forma, a criação da identidade nacional reflete essa grande pluralidade. Arquitetos como Juan Legarreta e Juan O’Gorman são destaques no cenário mexicano.
Hannes Meyer foi um arquiteto socialista de extrema importância na Bauhaus, ele seguia a ideia de arquitetura moderna construtivista, foi quem introduziu a arquitetura como disciplina.
Juan O’Gorman ganha destaque na década de 30 por sua conexão com a esquerda, buscando soluções para questões sociais ao mesmo tempo que se preocupava com a identidade nacional. Teve muita influência do arquiteto socialista Hannes Meyer, quem introduziu a arquitetura como disciplina na Bauhaus nos anos 20. O’Gorman não compactua com a ideia de arquitetura como arte mas sim como construção. Essa forma de pensamento está muito ligada à ideias europeias de Nova Objetividade, associadas à arquitetura holandesa, soviética, suíça, alemã, austríaca. Sua crítica à arquitetura moderna se assemelha às críticas de arquitetos de esquerda europeus que falam da falta de identidade regional no movimento devido à ideia de criar uma linguagem internacional.
Dois dos projetos de O’Gorman de 1932 apontam para uma maior preocupação funcional e não artística de seu pensamento arquitetônico, na “casa para obreiros mexicanos” e na “escola primária Cuautepec”, cuja estética industrial e brutalista refletem a ideia de arquitetura como construção.
O’Gorman era artista e arquiteto, então tinha ligação com várias figuras emblemáticas, como Frida Kahlo e Diego Rivera, para quem faz para cada um uma casa atelier e em cada uma o arquiteto buscou projetar de forma que a obra assumisse a personalidade da pessoa para quem estava sendo feita.
A casa de Diego é marcada por tons terrosos, sua forma e caráter passa um ar mais rigoroso, duro, enquanto que a da Frida em tons azulados com detalhes em vermelho, possui um visual mais delicado, as duas casas são autônomas e se conectam por uma ponte. Os limites espaciais são delimitados por cactos, traço tradicional do México, dando o elemento tradicional e ao mesmo tempo bruto do projeto.