PUBL I C A Ç Õ E S D A F U N D A Ç ÃO R O B INSO N
Perguntas a São Francisco Questions to São Francisco
ISSN 1646-7116
PUBL I CAÇÕ E S D A F U N D AÇÃO R O B I N S O N
Perguntas a São Francisco Questions to São Francisco
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PUBLICAÇÕES DA FUNDAÇÃO ROBINSON N.º 19 ROBINSON FOUNDATION PUBLICATIONS No. 19 Perguntas a São Francisco Questions to Saint Francis Portalegre, Outubro de 2010 Portalegre, October 2010
Fundação Robinson Robinson Foundation CONSELHO DE CURADORES COUNCIL OF CURATORS
José Fernando da Mata Cáceres (Presidente) (Chair), Ana Manteiga, Antero Teixeira, Joaquim Mourato, António Ceia da Silva, Rui Cardoso Martins, Sérgio Umbelino CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO ADMINISTRATIVE COUNCIL
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Gráfica Maiadouro DEP. LEGAL 264 028/07 ISSN 1646-7116
Na capa, fotografia de Cover photograph by Fundação Robinson
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Uma mão cheia de perguntas A handful of questions Un cajón lleno de preguntas Presidente do Conselho de Curadores | Chair of the Council of Curators
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Perguntas a “São Francisco” Questions to “São Francisco” Preguntas a San Francisco António Camões Gouveia
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25 perguntas à igreja de São Francisco de Portalegre 25 questions for the church of São Francisco in Portalegre 25 preguntas a la iglesia de São Francisco Nuno Senos
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Revestimentos de imitação da estereotomia do aparelho construtivo Faux coverings for the stereotomy of the brickwork Revestimiento de imitación de la estereotomía del aparato constructivo Joaquim Inácio caetano
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O retábulo da capela de Gaspar Fragoso na igreja de São Francisco em Portalegre The altar piece of the chapel of Gaspar Fragoso in the church of São Francisco in Portalegre El retablo de la capilla de Gaspar Fragoso de la iglesia de São Francisco, Portalegre Maria de Lurdes Craveiro
20
Retábulos fingidos da igreja do convento de São Francisco (Portalegre) Faux altar pieces of the church of the convent of São Francisco (Portalegre) Retablos fingidos de la Iglesia del Convento de São Francisco Patrícia Alexandra Rodrigues Monteiro
24
Dos azulejos da capela-mor, desta, do seu retábulo e da igreja do convento de São Francisco de Portalegre The tiles of the chancel, its altarpiece and the church of the convent of São Francisco of Portalegre Donde se habla de los azulejos de la capilla mayor, de esta, de su retablo y de la Iglesia del Convento de São Francisco, Portalegre António Filipe Pimentel
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Os trabalhos de restauro. Igreja do convento de São Francisco de Portalegre The restoration work. Church of the convent of São Francisco of Portalegre Las labores de restauración – iglesia del convento de São Francisco de Portalegre Fátima de Llera, Telma Teixeira, Belany Barreiros
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Síntese: resumos e palavras-chave Abstracts and key-words Resúmenes y palabras clave
Uma mão cheia de perguntas A handful of questions
José Fernando da Mata Cáceres PRESIDENTE DO CONSELHO DE CURADORES CHAIR OF THE COUNCIL OF CURATORS
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 4-5, ISSN 1646-7116
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Qualquer pretexto é bom para falar na Igreja do Convento de São Francisco. Primeiro foram as obras, a história, as particularidades do edificado e do restauro, a Colecção Sequeira… Agora, mais uma acção, o “Aberto para Estudo”, pretendeu ser um aprofundamento de conhecimentos em distintas áreas da Igreja de São Francisco, nomeadamente na vertente histórica e evolução artística deste espaço singular. O que nos motivou desde o primeiro momento foi proporcionar às pessoas a redescoberta deste espaço patrimonial que em breve irá abrir na cidade. Para isso chamámos especialistas de várias áreas, desde a arquitectura aos frescos, dos altares de talha e de massa aos azulejos, incluindo ainda os trabalhos de restauro e transformação do edifício num espaço público, e abrimos as portas à população. Em conversa, partilharam-se conhecimentos e hipóteses, percorremos a Igreja guiados pelos diferentes saberes, e do diálogo com estes técnicos saíram esclarecimentos revestidos de mais dúvidas, informações novas que levantaram novas questões, associações e interpretações mais ou menos esclarecedoras, mais ou menos ambíguas. O pouco que sabíamos sobre esta Igreja foi objecto de estudo durante as obras, aprendemos bastante, fizemos algumas descobertas inesperadas e hoje, o somatório daquilo que temos, continua a levantar interrogações, as que aqui deixamos e outras…
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Any excuse is good to speak of the Church of the Convent of São Francisco. First came the building works, then its history, the particularities of the building and its restoration, then the Sequeira Collection... This is now followed by a further activity, “Open for Study”, aimed at deepening our knowledge of the Church of São Francisco in distinct areas , particularly the historical context and the artistic evolution of this unique space. What has motivated us from the very beginning has been enabling people to rediscover the value of this space which is shortly to be opened in Portalegre. We have undertaken this by drawing on experts from various areas, from architecture to frescoes, from carved altars and mortar tiles, including as well the restoration work and the conversion of the building into a public space, and we have opened its doors to the public. Through dialogue, knowledge and assumptions have been shared, and we have reconsidered the church through the eye of different branches of knowledge, and this technical dialogue has provided further clarification and new information that has produced new questions, associations and interpretations - somewhat informative, somewhat ambiguous. What little we knew about this church has been the subject of study during the building works. We learned a lot, made some unexpected discoveries and today, the sum of what we know continues to raise questions, which we offer here, to raise others ...
Perguntas a “São Francisco” Questions to “São Francisco”
António Camões Gouveia COORDENADOR CIENTÍFICO DA FUNDÇÃO ROBINSON SCIENTIFIC COORDINATOR OF THE ROBINSON FOUNDATION
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 6-7, ISSN 1646-7116
Ponto de partida: a dúvida. O que perguntar? Como perguntar? Porquê perguntar? A dificuldade está, normalmente, na formulação das questões. Isto porque cada pergunta destas, e todas as muitas outras que a imaginação construa, nascidas no âmbito do inquérito necessário aos saberes nas Ciências Sociais e Humanas, obrigam aqueles que nesta área trabalham a um preciso saber prévio, uma apreciação objectiva dos conteúdos, uma integração de metodologias de actuação e um conhecimento do objecto a submeter-lhe. A partir destas premissas, foi lançado o desafio a vários especialistas para publicitarem as suas dúvidas de leitura e de necessidade e estudos futuros que lhes são suscitadas pelo objecto: a Igreja do Convento de São Francisco. Aqueles que a tal desafio acederam originaram os conteúdos interrogativos e o lançamento de hipóteses que agora se imprimem. Ficam as Publicações da Fundação Robinson enriquecidas com mais uma série temática, nela se inserirá, tão breve quanto possível, a edição do número Perguntas à Fábrica Robinson.
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Starting point: doubt. What to ask? How to ask? Why ask? The difficulty usually lies in formulating the questions. This is because each of these questions, and all the many other questions which our imagination provides, are born from a spirit of necessary enquiry for knowledge within the Social Sciences and Humanities, and this forces those who work in this area to possess precise prior knowledge, an objective assessment of content, and the ability to bring together ways of working and knowledge of the subject under consideration. Starting from these premises we challenged a number of specialists working in this area to express their doubts concerning their analysis of the subject being discussed, the Church of the Convent of São Francisco. This has enriched the Publications of the Robinson Foundation in this new thematic issue to which will be added, as soon as possible, the number entitled Questions for the Robinson Factory.
25 perguntas à igreja de São Francisco de Portalegre 25 questions for the church of São Francisco in Portalegre
Nuno Senos INVESTIGADOR, CHAM (CENTRO DE HISTÓRIA DE ALÉM-MAR) / UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA RESEARCHER, CHAM (CENTRE FOR OVERSEAS HISTORY) / UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 8-11, ISSN 1646-7116
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dos trabalhos de restauro a que a igreja do Convento de São Francisco de Portalegre foi submetida resultou um edifício recuperado, de novo aberto ao público, com novas funcionalidades. Além disso, resultou também um edifício que conhecemos e compreendemos melhor. Para além de poder estudar aquilo que ficou à vista, tive ainda o privilégio de acompanhar a obra de recuperação, podendo assim analisar e interpretar o que se ia tornando visível, e ajudar a tomar decisões relativamente às escolhas que todos os trabalhos de restauro têm de fazer. Este processo trouxe-nos muita informação nova, há muito tempo escondida por baixo de rebocos antigos, ou emparedada aquando de uma das sucessivas transformações a que a igreja foi sujeita. Sobre estas novidades já tive oportunidade de escrever. Mas este processo também deu lugar a novas dúvidas, algumas a que provavelmente nunca seremos capazes de responder, mas que, apesar disso, são estimulantes. Ficam aqui algumas destas dúvidas.
following the conservation work carried out on the church of the Convent of São Francisco in Portalegre, the restored building, with its new amenities, has once again opened to the public. What is more, this has led to a greater understanding of the building that we have known so well. Apart from being able to study what was laid bare, I also had the privilege of following the conservation work, and so was able to analyse and interpret what was uncovered, and help to make decisions regarding the choices which have to be made in any conservation work. This process has given us a lot of new information, long hidden beneath the ancient plaster or walled in during one of the successive transformations to which the church has been subjected. I have already had the chance to write about these innovations. In addition, this process also gave rise to new questions, some that we will probably never be able to answer, but are nonetheless stimulating. Here are some of these questions.
1. 2.
3.
4. 5. 6. 7.
9
Quando foram iniciadas as obras do primeiro edifício da igreja? Onde está a inscrição epigráfica referida por Frei Manuel da Esperança que atribuía o edifício à iniciativa de D. Dinis? E porque foi ela retirada? A inscrição que hoje se guarda no Museu de Portalegre diz respeito a esta igreja? E onde se encontrava originalmente? Como se configurava (e como estava decorada) a capelamor original? Que funções servia o pilar que ainda subsiste na capela colateral, do lado da Epístola? A abertura, hoje emparedada, na capela colateral, do lado do Evangelho dava para onde? Para a sacristia, como julgo? E desta sacristia (que ali ou noutro sítio qualquer tinha de existir), ainda há vestígios?
1.
When were the works of the first church building started?
2.
Where is the inscription referred to by Frei Manuel da Esperança that attributes the building to D. Dinis? Why was it removed?
3.
Does the inscription nowadays kept in the Museum of Portalegre refer to this Church? And where was it originally located?
4.
How was the original chancel laid out (and how was it decorated)?
5.
What were the functions of the pillar which still remains in the lateral chapel on the Epistle side?
6.
The opening in the lateral chapel on the Gopel side, which is now walled up, led to where? To the sacristy, as I believe?
8.
9. 10. 11.
12. 13. 14. 15. 16. 17. 18.
19. 20. 21. 22.
Para quem foram abertos os dois arcosólios na colateral do lado da Epístola? E quando foram retirados estes túmulos? Quando Gaspar Fragoso, por sua vez, ali foi tumulado? Quando e por que razão foi encurtado o transepto? Como era a cobertura original da nave? De madeira, como parece ter sido o caso? Quantas eram, originalmente, as capelas da nave? Apenas uma, como hoje se pode adivinhar? E como se configuravam? Quando foi construída a capela lateral mais perto da porta da igreja? Como era a fachada da igreja original? E onde era, isto é, a igreja gótica tinha a extensão que tem hoje a igreja? E a galilé, será original e assim a mais antiga galilé a sobreviver em Portugal? O coro alto, fazia parte do primeiro edifício ou foi-lhe acrescentado? E se sim, quando? De quando data a actual cobertura do cruzeiro? Qual a sua exacta cronologia? De quando data o altar da capela colateral do lado da Epístola? E o túmulo de Gaspar Fragoso? Quando foi construído o arco mais interior, de volta perfeita e almofadado, que dá acesso à capela lateral mais perto da porta? Será contemporâneo da capela a que dá acesso, ou ser-lhe-á posterior? De quando data o fresco da Anunciação, nesta capela? E quem foram os seus autor e encomendante? E a capela lateral do meio, quais as suas cronologia e configuração original? Qual a cronologia exacta das campanhas do século XVIII? Terão começado ainda no XVII? E como evoluíram? Como se configurava a capela-mor setecentista, antes de ter sido de novo alterada para adquirir o aspecto que hoje tem?
7.
And do any traces of this vestry, which either there or somewhere else had to have existed, still remain?
8.
For whom were the two arcosolia on the Epistle side opened? And when were these tombs removed? When Gaspar Fragoso, in turn, was buried there?
9.
When and for what reason was the transept shortened?
10. What was the original form of the roofing of the nave? Wooden, as seems to have been the case? 11. How many nave chapels were there originally? Only one, as it would seem today? How were they laid out? 12. When was the side chapel closest to the door of the church built? 13. What was the original facade of the church like? And where was it located – that is to say, did the Gothic church possess the same dimensions as the presentday Church? 14. Is the porch the original one and thus the oldest surviving church porch in Portugal? 15. Did the high choir form part of the first building or was it added later? If so, when? 16. When was the current roofing of the crossing constructed? What is its exact chronology? 17. What is the date of the altar in the secondary chapel on the Epistle side? And the tomb of Gaspar Fragoso? 18. When was the innermost rounded panelled arch constructed, which leads to the side chapel near the door? Does it date from the same period as the chapel to which it provides access, or was it built at a later stage? 19. The Annunciation fresco in this chapel dates from which period? And who commissioned and who carried out the work? 20. What was the original configuration and development over time of the middle side chapel?
10
23. Foram instalados outros altares de talha, para além daquele que sobrevive no transepto? Como eram? Onde estavam? 24. A quem era dedicado o primeiro altar do lado do Evangelho, cujos frescos ainda são visíveis? 25. E o seguinte, esse já sem leitura possível?
21. What was the exact chronology of the building works
Como se pode perceber, as campanhas de restauro a que a igreja de São Francisco foi sujeita forneceram-nos muita informação nova. Mas com estas vieram novas perguntas, como é próprio do processo de estudo de um edifício, umas mais importantes do que outras. Para algumas talvez venhamos a encontrar resposta, através de documentos que possam vir a surgir ou futuras intervenções nas demais dependências conventuais. Outras, pelo contrário, ficarão para sempre sem resposta. Estas novas perguntas, contudo, e por paradoxal que pareça, são o resultado de um avanço no nosso conhecimento, e não o produto frustrante do seu recuo. Sabemos mais sobre esta igreja e isso permitiu fazer uma intervenção mais informada e por isso mais responsável.
23. Were there other carved altars, besides that which
of the Eighteenth century? Would they have already begun in the seventeenth century? And how would they have evolved? 22. What would have been the layout of the sixteenthcentury chancel, before it was once again changed to give it its present-day aspect?
survives in the transept? What were they like? Where were they? 24. To whom was the first altar on the Gospel side dedicated, the frescoes of which are still visible? 25. And the next, which can no longer be read?
As can be seen, the restoration works to which the church of São Francisco has been subjected have provided us with a lot of new information. But along with this have appeared new questions, characteristic of the process involved in studying a building, some of which being more important than others. For some perhaps we will find the answer, through documents that may be found, or in future work in other convent related works. Others, however, will remain forever unanswered. These new questions, however, as paradoxical as it may seem, are the result of an advance in our knowledge, not the frustrating result of a setback. We now know more about this church and this has allowed us to carry out more informed and therefore more responsible decorative repairs.
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Revestimentos de imitação da estereotomia do aparelho construtivo Faux coverings for the stereotomy of the brickwork
Joaquim Inácio Caetano CONSERVADOR RESTAURO, DOUTORANDO NO INSTITUTO DE HISTÓRIA DE ARTE DA FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA CONSERVER-RESTORER, CARRYING OUT DOCTORAL STUDIES AT THE INSTITUTE FOR THE HISTORY OF ART AT THE FACULTY OF LETTERS OF THE UNIVERSITY OF LISBON
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 12-15, ISSN 1646-7116
de um modo geral, os paramentos de uma construção são revestidos por uma camada de reboco cuja função principal é de protecção podendo, também, ter associada uma função decorativa com recurso à cor ou a outras técnicas decorativas. No entanto, existem determinadas construções que pela sua tipologia construtiva dispensam, ou não é habitual, a existência de um revestimento de protecção, sendo constituídas por aparelhos regulares de granito ou calcário. Contudo, as juntas das pedras destes aparelhos são zonas sensíveis por onde a água poderá entrar mais facilmente. Para resolver esta situação, as juntas são refechadas com argamassas de cal e areia muito fina, de modo a diminuir a sua porosidade e, consequentemente, a possibilidade de entrada de água na estrutura, sendo essas massas aplicadas de modo a criar um plano mais saliente que o da pedra. Esta situação encontra-se também no interior dos edifícios correspondendo, portanto, a uma preocupação estética e não funcional. Trata-se, pois, de um gosto, diríamos de uma moda, que antecede o período da grande difusão da pintura mural em Portugal, primeira metade do século XVI, que em muitos casos vem esconder ou destruir este tipo de leitura dos paramentos. Este gosto pela exaltação da estereotomia do aparelho construtivo não se confina aos edifícios construídos com um aparelho regular e sem revestimento. Quando a estrutura dos edifícios é em alvenaria vulgar, não tendo as pedras um corte regular, aplicavam-se revestimentos que imitam essa situação. O modo de fazer está muito próximo da técnica do esgrafito que joga com contrastes cromáticos e de planos - sobre um reboco constituído por cal e areia escura, ou ao qual se juntou pigmento preto ou castanho, é aplicada uma camada de cal; sobre esta camada é inciso o desenho da decoração pretendida e, de seguida, são raspadas as zonas que se querem escuras, ficando o escuro como fundo da decoração branca. Encontram-se ainda 13
the front and partition faces of a building are generally covered with a layer of plaster, the primary function of which is that of protection; it may also have a decorative function when associated with the use of colour or other decorative techniques. However, less frequently there are certain constructions which, due to their building shape, do not use a protective coating, and are made up of regular granite or limestone brickwork. However, the stone joints of this brickwork are sensitive areas where water may easily enter. To address this situation, the joints are grouted with fine sand and lime mortars, in order to decrease their porosity as a result the possibility of water entering the structure. These mortars are applied so as to create a more protrusive plane than that of stone. This also occurs inside buildings with regard to aesthetic rather than functional considerations. This was a taste, let us say a fashion, prior to the widespread use of mural painting in Portugal in the first half of the 16th Century which would later hide or even destroy this application on the front and partition faces. This preference for stereotomy of the brickwork was not confined to buildings constructed with regular uncovered construction material. When the structure of the buildings was that of regular masonry, and the blocks of stone were not cut in a regular form, faux coverings were applied in such situations. The way this was done was very similar to the sgraffito technique, and involved playing with colour contrasts and planes – on a plaster made of lime and dark sand, to which was added black or brown pigment, followed by the application of a layer of lime. The intended design was then carved on top of this, and the darker areas scratched out, with this darkness functioning as a background to the white ornamental element. Some
alguns edifícios onde este tipo de decoração ainda se conserva quase íntegra, ou como resultado de uma manutenção ao longo dos tempos, como é o caso da igreja de São Francisco de Évora. Além das situações remanescentes, como testemunho do gosto pela exaltação da estereotomia do aparelho, temos outras fontes de informação de igual importância que são as pinturas coevas deste gosto, portanto até meados do século XVI, onde, quando aparece representado um aparelho regular, as suas juntas são representadas como as temos descrito – refechadas com massas claras e num plano saliente ao da pedra. Podemos incluir este “saber fazer” nas Artes da Cal que, até ao aparecimento do cimento como material de eleição na construção dos edifícios, foram dando forma a outras decorações ligadas ao edifício, como a imitação de tijolo, de pedra nos cunhais e nas cornijas, assim como nas guarnições de vãos de portas e janelas. Portalegre conserva ainda belíssimos exemplares desta arte que urge inventariar, conservar e divulgar como património ímpar.
buildings still exist where this type of decoration has been almost fully conserved, or as a result of long-term maintenance, such as the church of São Francisco of Évora. In addition to these other existing examples which bear witness to the preference for stereotomy of the brickwork, there are other sources of information which are equally important, namely the coeval paintings of this fashion, produced until early on in the 16th Century, which had their joints formed as described above – grouted with light mortars and a protrusive plane with regard to the stone. We can include this savoir faire in the Artes da Cal which, until the appearance of cement as the material of choice in the construction of buildings, shaped the other decorations attached to the building, such as the imitation of brick, stone in the corners and cornices, as well as the decorations in the door and window recesses. Portalegre still conserves beautiful examples of this art which require inventorying, preserving and dissemination as the singular patrimony which they constitute.
25 Perguntas sobre os revestimentos de imitação da estereotomia 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9.
O que é a estereotomia de um aparelho construtivo? O que são as juntas de um aparelho? Para que servem as massas aplicadas nas juntas desses aparelhos? O que é um revestimento? Todos os aparelhos precisam de revestimento? O que é um revestimento tradicional? Quais as suas funções? O que é um revestimento de imitação da estereotomia da pedra? De que materiais é feito?
25 Questions about the faux stereotomy coverings
1.
What is stereotomy of brickwork?
2.
What are the joints of this brickwork?
3.
What is the purpose of the mortars applied to the joints of this brickwork?
4.
What is a covering?
5.
Does all brickwork need a covering?
6.
What is a traditional covering?
7.
What are its functions?
8.
What is a covering which imitates the stereotomy of the stone?
9.
What materials is it made of?
14
10. Como se obtém o efeito de bloco de pedra e de argamassa nas juntas? 11. Estes revestimentos existem no interior e exterior do edifício? 12. Desde quando se fazem? 13. Até quando se fizeram? 14. A igreja de São Francisco de Portalegre seria toda rebocada com este tipo de revestimento? 15. Estes revestimentos são anteriores ou posteriores à pintura mural existente na igreja? 16. Porque desapareceram visualmente? 17. Vale a pena conservá-los? 18. Quem o deve fazer? 19. A situação existente na igreja de São Francisco de Portalegre é única? 20. Que outros casos semelhantes se conhecem? 21. Em Portalegre existem outros casos iguais ou semelhantes de revestimentos a imitar a estereotomia da pedra? 22. Em que locais? 23. Devemos promover a sua conservação? 24. Que importância têm? 25. Este “saber fazer” já se perdeu?
10. How do you get the effect of a block of stone and mortar in the joints? 11. Are these coverings to be found inside and outside a building? 12. From when were they made? 13. Until when were they made? 14. Would the church of São Francisco de Portalegre as a whole have been covered with this type of covering? 15. Do these coverings date to before or after the presence of mural paintings in the church? 16. Why did they disappear from sight? 17. Is it worth conserving them? 18. Who should do this? 19. Is the present situation in the church of São Francisco de Portalegre unique? 20. Which other similar cases are we aware of? 21. Are there other identical or similar examples of faux stereotomy stone coverings in Portalegre? 22. Where are they located? 23. Should we promote their conservation? 24. How important are they? 25. Has this “savoir faire” been lost?
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O retábulo da capela de Gaspar Fragoso na igreja de São Francisco em Portalegre The altar piece of the chapel of Gaspar Fragoso in the church of São Francisco in Portalegre
Maria de Lurdes Craveiro FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA / CENTRO DE ESTUDOS ARQUEOLÓGICOS DAS UNIVERSIDADES DE COIMBRA E DO PORTO FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA / CENTRO DE ESTUDOS ARQUEOLÓGICOS DAS UNIVERSIDADES DE COIMBRA E DO PORTO
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 16-19, ISSN 1646-7116
o retábulo em análise situa-se na capela à Epístola, na cabeceira da igreja de São Francisco de Portalegre. Aí se encontra também o túmulo de Gaspar Fragoso, datado de 1571 em inscrição na arca. A historiografia alia, de há longo tempo, o retábulo e o túmulo em cujo epitáfio se grava a indicação de que o tumulado mandou fazer “este retábulo”. Partindo sempre de um princípio de associação entre os dois objectos tem-se colocado o retábulo numa faixa cronológica remetida aos anos 60-70 do século XVI, tanto mais que a concepção e os motivos decorativos presentes apontam para um tempo também formatado pelas influências flamengas que aqui se detectam. Assim, as indicações epigráficas ajustavam-se com tranquilidade ao tempo contaminado por uma plasticidade onde dominam ainda os critérios veiculados pela cultura clássica e humanista da primeira metade do século, ajustados às correntes flamenguizantes e à organização retabular ditada pela Contra Reforma. Por outro lado, a suposta anterioridade do retábulo face ao túmulo ficava estabelecida a partir da articulação entre os dois. De facto, a sua junção realiza-se no ângulo que mutila a simetria do retábulo pela interferência da estrutura tumular, em prolongamento simulado pela continuidade dos frisos. A aparente serenidade que decorre de uma leitura iconográfica e formal do retábulo, coincidente com as referidas datações, com a encomenda “explícita” de Gaspar Fragoso, com uma iconografia normalizada à época e com grande ingenuidade no tratamento plástico estendida à generalidade do retábulo, não esconde, mesmo assim, um conjunto de questões perturbadoras que interferem na estabilidade da observação. Com efeito, nada garante que Gaspar Fragoso tenha, de facto, encomendado o retábulo que se preserva na capela; da mesma forma que a relação física que se estabelece entre o retábulo e o túmulo pode também ser interpretada a partir de 17
the altar piece in question is located in the chapel on the Epistle side at the top of the nave of the church of São Francisco. The tomb of Gaspar Fragoso is also located here, with an inscription on the sarcophagus dating from 1571. Historiography has over a long period linked the altarpiece and the tomb containing the inscription indicating that the entombed individual ordered the construction of “this altar piece”. The ongoing presumption that the two objects are linked has placed the altar piece within a 60-70 year chronological period in the sixteenth century, especially since the design and decorative motifs present also point to a period marked by the Flemish influences which can be noted here. Thus, the written inscription peacefully fit into a period imbued with a plasticity dominated by criteria encapsulated by the classical and humanistic culture of the first half of the century, adjusted to the Flemish influences and to the altar piece configuration dictated by the Counter Reformation. Moreover, the alleged prior existence of the altar piece to the tomb was established by considering the relationship between the two. In fact, their junction takes place at an angle which mutilates the symmetry of the altar piece due to the interference of the structure of the tomb, and through extending the continuity of the frieze. The apparent serenity that results from a formal iconographic reading of the altar piece, which is coincident with those dates, with the “explicit” commissioning by Gaspar Fragoso, along with the standard iconography of the period and great ingenuity in the plastic treatment extended to most of the altar piece, does however hid a disturbing set of questions which prejudice the stability of this observation. Indeed, nothing guarantees that Gaspar Fragoso had in fact commissioned the altar piece which is preserved in the chapel, just as the physical link established between
novos contributos historiográficos que encontrem uma datação precisa para a colocação do túmulo na capela. Ou seja, a possibilidade, por exemplo, da deslocação do túmulo para a capela em data tardia arrasta consigo a descodificação plausível da solução encontrada para a “união” dos dois objectos. E, a verdade é que esta circunstância também não determina uma datação retabular remetida ao século XVI. A natureza do material utilizado e o completo afastamento das práticas de erudição seguidas, desde logo, na cidade a partir do exemplo da estrutura tumular de D. Jorge de Melo, envolvem de suspeitas semelhante datação. Para resolver esta questão seria muito importante seguir o rasto das obras, de maior ou menor envergadura, que não poderiam deixar de ocorrer ao longo de um tempo que, não se esgotando na extinção das Ordens, se prolonga aqui até 1910. Por outro lado, não sendo obrigatória a presença de São Francisco num retábulo de uma igreja de que é padroeiro, não pode deixar de se estranhar a sua ausência numa iconografia que contempla os temas da Piedade, da Anunciação, do Padre Eterno, de um bispo (desconhecido) e de São Jerónimo, diferente (em parte) do programa iconográfico denunciado em 1943 por Keil do Amaral no Inventário Artístico de Portalegre. A possibilidade de resposta às questões que a seguir se elencam conduziria a nova luz sobre a identidade do retábulo mas, e a partir dos circuitos plásticos e artísticos em presença, traçaria também uma dimensão de maior consistência sobre a relação social de São Francisco com a comunidade envolvente.
the altar piece and the sepulchre may also be interpreted
1.
1.
2.
Quem foi Gaspar Fragoso e qual a sua relação com a igreja/ Convento de São Francisco de Portalegre. A relação entre Gaspar Fragoso e o retábulo.
using new historiographical information to more precisely date the placing of the sepulchre in the chapel. That is, the possibility of, for example, the placing of the sepulchre in the chapel at a later date brings with it the decoding of a plausible solution to the “junction” of the two objects. And the truth is that this does not result in the dating of the altar piece within the 16th century. The nature of the material used and the complete absence of scholarship practices being followed, from the outset, in the city from the example of the structure of the tomb of D. Jorge de Melo, involve similar problems of dating. To resolve this issue it would be very important to trace these works to a larger or smaller extent, down through a time span including the extinction of the Orders and continuing until 1910. Furthermore, the fact that the absence of Saint Francis on an altar piece in a church of which he is the patron saint must be considered strange when the images include themes relating to Compassion, the Annunciation, the Eternal Father, an (unknown) bishop and Saint Jerome, (partially) different from the images recorded by Keil do Amaral in 1943 in the Artistic Inventory of Portalegre. The possibility of answering the questions below would shed new light on the identity of the altar piece but it would also, using extant artistic and plastic networks, enable a more consistent outline of the social relationship of São Francisco with the surrounding community.
Who was Gaspar Fragoso and what was his relationship with the church/Convent of São Francisco of Portalegre?
2.
The relationship between Gaspar Fragoso and the altar piece.
18
3. 4. 5. 6.
7.
8. 9.
10.
11. 12. 13. 14. 15. 16.
O momento concreto da colocação do túmulo de Gaspar Fragoso na capela. A percepção das soluções de junção entre o túmulo e o retábulo. Os ciclos económicos em São Francisco de Portalegre entre o século XVI e o século XIX. A identificação das obras eventualmente executadas entre a extinção das Ordens religiosas e 1910, ano em que o culto foi desactivado na igreja. A relação entre o trabalho de massa presente no retábulo e procedimentos idênticos remetidos a outras áreas geográficas, nomeadamente ao território espanhol. A articulação entre o retábulo e a superfície parietal a que se encosta. Os critérios para a datação do retábulo: definição formal; programa iconográfico; técnicas e materiais utilizados; documentação existente. O confronto entre a qualidade do trabalho executado e outros elementos materiais afins em espectro temporal largo. A identificação da encomenda. A identificação da mão-de-obra envolvida. A identificação do programa iconográfico no retábulo. A justificação da ausência de São Francisco na iconografia do retábulo. A identificação das fontes de referência utilizadas no retábulo. A relação entre a natureza do retábulo e as pressões do seu próprio tempo.
19
3.
The actual date the tomb of Gaspar Fragoso was placed in the chapel.
4.
Understanding of the methods used to join the tomb and the altar piece.
5.
The economic situation of São Francisco of Portalegre between the 16th Century and the 19th Century.
6.
The identification of any building works carried out between the extinction of the religious Orders and 1910, the year the Order was dissociated from the church.
7.
The relationship between the mortar work in the altar piece and other similar works in other geographical areas, Spain in particular.
8.
The joint between the altar piece and the surrounding walled surface.
9.
The criteria used to date the altar piece: formal definition; iconographic programme, techniques and materials used, existing documentation.
10. The opposition between the quality of work performed and other related material factors, within a broad time spectrum. 11. Identifying the commission. 12. Identifying the workforce involved. 13. Identifying the images on the altar piece. 14. The reason why Saint Francis does not appear in the images in the altar piece. 15. Identifying the reference sources used in the altar piece. 16. The relationship between the form of the altar piece and the pressures within its own time.
Retábulos fingidos da igreja do Convento de São Francisco (Portalegre) Faux altar pieces of the church of the Convent of São Francisco (Portalegre)
Patrícia Alexandra Rodrigues Monteiro DOUTORANDA EM HISTÓRIA DE ARTE PELA FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA (BOLSEIRA DA FCT) PHD STUDENT OF HISTORY OF ART IN THE FACULDADE DE LETRAS OF THE UNIVERSITY OF LISBON (SCHOLARSHIP STUDENT OF FCT)
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 20-23, ISSN 1646-7116
um dos elementos que maior sucesso conheceu no Alentejo enquanto objecto simulado foi o “retábulo fingido” por substituir, de uma forma prática, concepções artísticas mais dispendiosas, como os verdadeiros altares de talha dourada ou de mármore. A primeira capela do lado da Epístola está identificada como sendo de Nossa Senhora da Conceição. Do ponto de vista estilístico, este retábulo fingido encontra-se na transição dos altares maneiristas (na linha do altar, em massa, da Capela de Gaspar Fragoso) para os altares do primeiro Barroco português. Destaca-se pela sua estrutura bidimensional, com simulações de talha dourada, almofadões de mármore e pontas de diamante, bem como cartelas integrando simulações de baixos-relevos representando elementos iconográficos alusivos à Virgem (Cântico dos Cânticos). Ao centro destaca-se um nicho, em trompe l’oeil, destinado a exibir a imagem do orago desta capela. A mesa de altar que se situaria no registo inferior foi, entretanto, apeada. Sobre o retábulo vemos uma composição, de provável inspiração em gravuras flamengas, representando A Anunciação e que ocupa todo o espaço do tímpano até ao arranque da abóbada. De cada lado do retábulo estão duas cortinas recolhidas, de grande efeito teatral, permitindo ao observador visualizar não só estrutura do retábulo, mas também a imagem (de vulto) que lhe estaria sobreposta. A primeira capela do lado do Evangelho teria a evocação de São Francisco e apresenta outro retábulo fingido com todas as características do primeiro Barroco português (o Barroco Nacional). Estruturalmente é composto por pares de colunas fingidas, decoradas com marmoreados, a partir das quais se desenvolvem arquivoltas concêntricas. Ao centro temos um nicho inserido na parede para a colocação de uma imagem. As cortinas que se encontram suspensas do baldaquino permi21
one of the most successful simulated objects in the Alentejo was the “faux altar piece” which in a practical manner substituted more expensive artistic designs such as an actual gold leaf or marble altar. The first chapel on the side of the Epistle was identified as that of Nossa Senhora da Conceição. From a stylistic point of view, this faux altar piece can be located in the transition from Mannerist altars (in line with the altar made of mortar in the Chapel of Gaspar Fragoso) to the altars of the first Portuguese Baroque period. Of note is its two-dimensional structure, with faux gold leaf, marble bolsters and diamond points, as well as memorial panels which include faux basreliefs depicting images alluding to the Virgin (Song of Songs). At the centre there is a niche, in the form of a trompe l’oeil, designed to display the image of the patron saint of the chapel. The altar table that would have been situated in the lower part was, however, removed. We can see a composition on the altar piece probably inspired from Flemish prints, representing The Annunciation, which occupies the entire space of the tympanum until the start of the vaulting. On each side of the altar piece there are two drawn curtains producing a great theatrical effect, and which allow the observer to see not only the structure of the altar piece, but also the (important) image which would have been superimposed on it. The first chapel on the side of the Gospel would have been a reminder of Saint Francis and contained another faux altar piece showing all the features of the first Portuguese Baroque period (the National Baroque period). Structurally it is made up of pairs of fake columns, decorated with marble, from which stretch concentric archivolts. At the centre there is a niche inserted in the wall where an image can be placed. The curtains suspended
tiriam, precisamente, contemplar o interior do nicho com a sua imagem. A estrutura retabular sugere uma tímida noção da perspectiva. Cada um destes retábulos fingidos pertenceu a uma confraria ou irmandade, dentro da igreja, responsável pela sua manutenção. As pinturas poderão pertencer ao ciclo de campanhas de obras que teve lugar na igreja entre 1711 e 1719 desconhecendo-se, até ao momento, a sua autoria.
from the baldachin would enable us to focus our attention on the interior of the niche and its image. The structure of the altar piece suggests a tentative sense of perspective. Each of these faux altar pieces belonged to a brotherhood or sisterhood within the Church, which was responsible for its maintenance. The paintings might belong to the cycle of building works which took place in the church between 1711 and 1719, with their authorship up to now being unknown.
25 perguntas a colocar à obra de arte: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15.
Quais foram os seus encomendantes? Quais foram os artistas que trabalharam nestes retábulos fingidos? Qual era a origem desses artistas? Se eram locais, existiria uma “escola” de pintura em Portalegre? Se vieram de outras regiões, o que os levou a deslocarem-se até aqui? Existirá (ou não) alguma ligação com o lado espanhol? Quando foram realizadas as pinturas? Qual a sua filiação estilística? Que comparações se podem estabelecer com outras obras semelhantes em Portalegre? Que comparações se podem estabelecer com outras obras semelhantes em concelhos vizinhos? Quais os modelos de inspiração para os artistas? Que fontes iconográficas utilizaram? Que alterações (conservação/restauro) sofreram as pinturas ao longo do tempo? Qual a ligação da pintura A Anunciação com o resto da capela? Qual a verdadeira extensão das pinturas?
25 questions to put to the work of art:
1.
Who commissioned it?
2.
Which artists worked on these faux altar pieces?
3.
Where did these artists come from?
4.
If they were local, would there have been a “school” of painting in Portalegre?
5.
If they came from other regions, what led them to move here?
6.
Would there (or not) have been some connection with the Spanish side of the frontier?
7.
When were the paintings made?
8.
Which style do they belong to?
9.
Which comparisons can be established with other similar works in Portalegre?
10. Which comparisons can be established with other similar works in neighbouring counties? 11. What served as models of inspiration for the artists? 12. Which sources of images were used? 13. What changes (in terms of conservation/restoration) did the paintings undergo over time? 14. What connection does the painting The Annunciation have with the rest of the chapel? 15. What is the true extent of the paintings?
22
16. Would there have been other paintings inside the chapel? 17. Is the invocation to “Nossa Senhora da Conceição” correct? 18. How many brotherhoods existed in the Church? 19. What happened to the right side of the altar piece where The Annunciation is located? 20. What is the reading and interpretation of each of the symbols on the left hand side? 21. What iconological reading should be taken as a whole from this? 22. What technique is used in the execution of the two altar pieces? 23. What is the date of the chapel on the side of the Epistle? 24. What was the true extent of the mural painting inside the church? 25. What functions and values do these visual records still hold today?
16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25.
23
Existiriam outras pinturas no interior da capela? A evocação “Nossa Senhora da Conceição” está correcta? Quantas irmandades existiam na Igreja? O que aconteceu com o lado direito do retábulo onde se encontra A Anunciação? Qual a leitura e interpretação de cada um dos símbolos iconográficos do lado esquerdo? Qual a leitura iconológica a retirar do conjunto? Qual a técnica utilizada na execução dos dois retábulos? Qual a datação da capela do lado da Epístola? Qual a verdadeira extensão da pintura mural no interior da Igreja? Que funções e que valores mantêm ainda hoje estes registos pictóricos?
Dos azulejos da capela-mor, desta, do seu retábulo e da igreja do convento de São Francisco de Portalegre The tiles of the chancel, its altarpiece and the church of the Convent of São Francisco of Portalegre
António Filipe Pimentel INSTITUTO DE HISTÓRIA DA ARTE - FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA INSTITUTO DE HISTÓRIA DA ARTE - FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 24-29, ISSN 1646-7116
o revestimento azulejar da capela-mor da Igreja do antigo Convento de São Francisco de Portalegre, rematando de cintilações azuis a perspectiva do templo finalmente reabilitado, constitui inegavelmente um dos traços mais impressivos do património integrado nele sobrevivente. Uma visão superficial basta, na aparência, para lhes descodificar o significado: oriundos de oficina lisboeta e da corrente designada de grande produção joanina, destinavam-se a providenciar o enriquecimento visual do templo, dentro da lógica das ricas igrejas mendicantes e, especificamente, do desígnio de outorgar uma visualidade cénica (de palco) às celebrações litúrgicas, enquadrando-as, simultaneamente, de um programa iconográfico de exaltação da Ordem, por intermédio dos seus patriarcas, São Francisco e São Domingos. Em conformidade, a ousia receberia ainda um rico retábulo de mármores alentejanos, na esteira do prestigioso modelo divulgado por João Frederico Ludovice na capela-mor da Sé de Évora, remodelada a partir de 1718 e posto em moda – em variantes mais ornamentais e borrominianas – por José Francisco da Silva, seu discípulo do estaleiro mafrense, um pouco por todo o interior do Alentejo, de Vila Viçosa a Elvas: ou, mais especificamente, por um seu mais modesto epígono. No todo, a reforma teria ocorrido, com boa probabilidade, entre os anos de 30/40 e 50/60 do século de Setecentos. Porém, um olhar mais detido não tardaria a notar incongruências nesta leitura superficial. Efectivamente, não se trata de um programa azulejar, mas de dois (mesmo que em próxima contemporaneidade), constituído o primeiro pelo silhar, ao qual, surpreendentemente, seria depois (como justifica o desfasamento da reticula azulejar, em ambos os flancos e entre ambos os conjuntos) acrescido um rodapé, ainda que parcial, por decorrência do soco que sobreleva o altar-mor. Pior: o programa não estaria relacionado com esta capela-mor (tal 25
the tiles lining the chancel of the Church of the former Convent of São Francisco of Portalegre, topped off by the blue flickers of light from the finally restored temple, is undeniably one of the most impressive features of the surviving patrimony located within. It would appear that merely a superficial look will suffice to decode their meaning: made in a Lisbon workshop as part of the major Johannine production of the period, intended to bestow visual enrichment on the temple, within the logic of rich mendicant churches, and specifically with the purpose of bestowing a scenic backdrop (from the stage) to the liturgical celebrations by simultaneously framing them within an iconographic programme exalting the Order through the intermediaries of their Patriarchs, Saint Francis and Saint Dominic. The Order would have furthermore received a rich altar piece made of Alentejan marble, in the wake of the prestigious model unveiled by João Frederico Ludovice in the chancel of the Cathedral of Évora, rebuilt from 1718 to become fashionable – in more ornamental and Borrominian forms – by José Francisco da Silva, his apprentice from the Mafra workshop, here and there throughout rural Alentejo, from Vila Viçosa to Elvas: or, more specifically, by his more modest epigone. All in all, the reform would have probably occurred between the years 1830/40 and 1850/60. However, a closer look would soon notice inconsistencies in this superficial reading. Indeed, this is not a single tiling work, but two (even if carried out in close proximity), made up of the first ashlar, to which, surprisingly, would later (thus explaining the difference in the tiling pattern on both sides and between both sets) be added a skirting board, albeit partial, because of the socle raising the main altar. Worse: the decorative work would not have been connected to this chancel (as it now appears), but with another where, within this logic,
como hoje surge modelada), mas com outra que lhe terá préexistido, na lógica também de um retábulo-outro, cujo avanço ocuparia o último tramo, por isso desguarnecido de azulejos, marcado por pilastra de argamassa e rematado ao nível da cornija por uma objectiva solução de disfarce: tudo indica, assim, que a primeira campanha azulejar (à cota hoje marcada pelo patamar) se relacionaria com um retábulo de talha de estilo nacional, cuja data de conclusão poderia rondar por 1720/25 e cuja planta dinâmica absorveria (entre as arquivoltas e o camarim) o tramo final, hoje livre de azulejos, por encostar-se ao topo (por essa via ganhando espaço útil – e cénico) o retábulo actual, dotado também de camarim mas não de arquivoltas reentrantes. Enfim, a surpreendente colocação de um rodapé de azulejos sob um silhar pré-existente, claramente trai a existência de obras amplas de remodelação do pavimento da capela-mor, onde o recuo do patamar ao nível actual colocaria a necessidade de o preencher esteticamente: em mais uma solução de disfarce. Mas é certo que também este conjunto azulejar (o silhar: o rodapé é meramente cenográfico) de interpretação aparentemente singela, no seu programa-tipo de exaltação franciscano-domínica, parece revelar outra complexidade, a despeito de uma ingénua teatralidade, que exprimem os originais frades-convite que constituem os pés-direitos de abertura. Como quer que seja, nada de simples – e muito menos uma campanha ou duas (azulejos e retábulo) – , no quadro-paradigma das ricas igrejas mendicantes, se ostenta aqui: antes parece ilustrar-se uma sucessão quase contínua de campanhas de ambições relativamente modestas, articuladas em programas que se encastelam na lógica do seu próprio desenvolvimento:
there would also have pre-existed another altar piece , the ad-
t TJMIBS EF B[VMFKPT DPN QSPCBCJMJEBEF BTTFOUF OB EÏDBEB de 1730, na sequência da colocação do retábulo de estilo
t
vancement of which would taken up the last tranche, of uncovered tiles, marked by a pilaster made of mortar topped off at the cornice by a solution the purpose of which was aimed at disguise: everything therefore points to the first tile work (at the level nowadays marked by the landing) being related to an altar piece carved in the national style, whose completion date could be around 1720/25, the dynamic shape of which would include (amongst the archivolts and the cabinet) the final tranche, nowadays free of tiles with the present-day altar piece leaning against the top (and thus gaining useful and scenic space), also containing a cabinet but without recessed archivolts. Finally, the surprising placement of a skirting board of tiles under a pre-existing ashlar clearly betrays the existence of extensive renovation works to the floor of the chancel, where the withdrawal of the landing to its present level would have created the need to aesthetically fill this space: using once more a solution involving disguise. But it is also true that this set of tiles (the ashlar: the skirting board is merely ornamental) with a seemingly simple interpretation in its design – of the Franciscan-Dominican exaltation form, which appears to reveal another complexity, despite a naive theatricality, as expressed by the original inviting-monks that constitute the pillars of the opening. In any event, nothing simple – let alone a building work or two (tiles and altarpiece) – in the paradigm-framework of the rich mendicant churches, is shown here: this rather seems to illustrate a series of almost continuous building works of relatively modest levels, focused on work that is fortified by the logic of its own development:
BO BTIMBS PG UJMFT QSPCBCMZ MBJE BSPVOE GPMMPXJOH the placement of the altar piece in the national style
26
(commissioned around 1720) and along with the complete paving of the chancel, up to the triumphal arch, as would have been laid out at the end of the 17th Century; t
SFEFTJHO BSPVOE PG UIF QBWJOH PG UIF DIBQFM DSFating the need to provide a partial socle of tiles, placed underneath the ashlar up to the landing for purely ornamental purposes;
t
GJOBMMZ JO UIF T SFQMBDFNFOU PG UIF OBUJPOBM altar piece by a new one in the Roman, made by a modest artisan, involved in the building works being carried out by José Francisco da Silva, and to whose school this clearly belongs, complemented by an ornamental work in mortar in a rococo style, aggiornando the pilasters and the intradoses of the whole arcade system, and also showing the reform which, at the end of the 17th/beginning of the 18th Century, while the chão style was still falling from favour would - ironically - be responsible for the baroquisation of the period: and whose point of arrival (in both the carving and the fresco) would be the
nacional (encomendado por 1720) e ainda com o pavimento completo da capela-mor, até ao arco-triunfal, tal como seria delineado em finais do século XVII; t SFNPEFMBÎÍP QPS EP QBWJNFOUP EB DBQFMB HFSBOEP a necessidade de providenciar um soco parcial de azulejos, sotoposto ao silhar até ao patamar e de finalidade puramente ornamental; t QPS GJN OB EÏDBEB EF TVCTUJUVJÎÍP EP SFUÈCVMP nacional por novo, à romana, materializado por um mestre modesto, disponibilizado pelas campanhas em que, ao redor, se ocupava José Francisco da Silva, a cuja escola formativa claramente pertence, complementada por um trabalho ornamental em massa e em gosto rococó, aggiornando as pilastras e intradorsos de todo o sistema de arca27
national altar pieces.
Overall, therefore, a list of small scale building works, which greatly contribute to contradicting the simplistic mythography that long has surrounded this monastic art and, in particular, that of the Franciscan order, which it becomes necessary to extensively question – from a perspective ranging from History to the History of Art – using the notable case study of the church of the Convent of São Francisco: Questioning the life and resource cycles, cultures and exegeses and, in general, everything laid out around the complex problem of the commissioning of a work of art. More darkness than lightness, however – which, above all, raises a set of questions (which can be stated in the following way):
ria, marcado ainda pela reforma que, em finais do século XVII/inícios do XVIII, ainda em declínio do gosto chão, seria – por ironia – responsável pela barroquização do tempo: e cujo ponto de chegada (na talha como no fresco) serão os retábulos nacionais. No conjunto, pois, um somatório de intervenções de pequena monta, que poderosamente contribuem para contraditar a mitografia simplista que, por longo tempo, tem rodeado a arte monástica e, em particular, a franciscana, que se torna necessário questionar – do plano da História ao da História da Arte – em toda a extensão, neste notável case study que constitui a igreja do Convento de São Francisco: indagando ritmos de vitalidade e ciclos de recurso, culturas e exegeses e, em geral, tudo quanto se perfila em torno do problema complexo da encomenda artística. Mais sombras que claridades, pois – suscitando, acima de tudo, um feixe de questões (que se reduz ao cânone indicado):
1.
the centuries? 2.
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8.
De que recursos económicos dispunha efectivamente o Convento no decurso dos séculos? E como se comportaram estes entre o declinar do século XVII e o final da centúria seguinte? Qual o comportamento demográfico da comunidade no decurso do tempo? E no lapso evocado? Que cultura se abrigava sob as suas paredes? Que sabemos da sua biblioteca? Que importância tinha o Convento na rede de implantação da Ordem? Que benfeitores/mecenas com ele interagiram no decurso do tempo (e que relação tinham com os sepultamentos)?
What economic resources did the Convent have over
And how did these change towards the end of the 17th Century and the 18th Century?
3.
How did the number of people in the community change over time?
4.
And in the period mentioned?
5.
What culture was housed under its walls?
6.
What do we know about its library?
7.
How important was the Convent within the network established by the Order?
8.
What benefactors/patrons interacted with it throughout its history (and what was their relation to the entombments)?
9.
And in the period mentioned?
10. What were the artistic resources in Portalegre during this period?
28
9. E no lapso evocado? 10. Que recursos artísticos existiam em Portalegre no período referido? 11. Que redes estabelecem com os grandes centros? 12. Que redes estabelecem com a região ? 13. Que redes estabelecem com a raia? 14. Que nexos estabelece o programa arquitectónico da capela-mor/nave com outros programas afins naregião? 15. Qual a sua cronologia? 16. Que equipas podem ser aduzidas a eles? 17. Que levantamento pode ser feito em Portalegre de situações afins? 18. A que oficina podem ser indexados os azulejos do silhar? 19. A que oficina podem ser indexados os azulejos do rodapé? 20. Que distanciamento cronológico é possível estabelecer entre eles? 21. Qual o verdadeiro significado do programa iconográfico do silhar? 22. Qual a extensão da rede em que se inscreve o retábulo da capela-mor? 23. Que ritmos cronológicos se podem estabelecer no seu interior? 24. Qual o impacte regional da “escola” desenvolvida em redor de José Francisco da Silva? 25. É possível reconhecer outros oficiais trabalhando na sua esteira – e, nesse contexto, apurar uma autoria para o retábulo de São Francisco?
11. What kind of networks did they establish with the major centres? 12. What kind of networks did they establish with the region? 13. What kind of networks did they establish with the frontier? 14. What links did the architectural works of the chancel/ nave form with other related works in the region? 15. What was their chronology? 16. Which working teams can be adduced to them? 17. What type of survey of related works could be carried out in Portalegre? 18. To which workshop can the ashlar tile work be linked? 19. To which workshop can the skirting-board tiles be linked? 20. What chronological distance is it possible to establish between them? 21. What is the true meaning of the images present on the ashlar? 22. What is the extent of the network to which the altar piece of the chancel is connected? 23. What chronological cycles is it possible to establish in its interior work? 24. What was the regional impact of the “school” which developed around José Francisco da Silva? 25. Is it possible to discover other workshops carrying out building works within its wake – and within that context, to establish authorship for the altar piece of São Francisco?
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Os trabalhos de restauro. igreja do Convento de São Francisco de Portalegre The restoration work. Church of the Convent of São Francisco of Portalegre
Fátima de Llera Telma Teixeira Belany Barreiros IN SITU – CONSERVAÇÃO DE BENS CULTURAIS, LDA. IN SITU – CONSERVAÇÃO DE BENS CULTURAIS
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 30-33, ISSN 1646-7116
os trabalhos desenvolvidos na Igreja do antigo Convento de São Francisco de Portalegre permitiram uma viagem para dentro de seis Séculos da sua História. Este privilégio, apenas possível através da leitura material e formal de todos os vestígios arquitectónicos e decorativos postos a descoberto durante a intervenção de conservação e restauro, possibilitou o reconhecimento de alterações realizadas à sua estrutura arquitectónica original, como também, uma sucessão de campanhas decorativas que marcaram partes da história do conjunto edificado e do gosto artístico reinante em Portugal em cada uma das épocas. Lendo o edifício e ouvindo a sua história, foi possível passar para palavras aquilo que a cal, a pintura, a pedra, a madeira e os azulejos contam. Por vezes de uma maneira pouco contínua, pouco esclarecedora, levando à interpretação, à associação. Histórias por vezes esclarecedoras, outras ambíguas. Em suma, lançando dúvidas, objecto de muitas perguntas mas também de muitas surpresas.
the works carried out on the Church of the former Convent of São Francisco of Portalegre enabled us to carry out a journey into six Centuries of its History. This privilege, which was only possible through carrying out a formal material reading of all the architectural and decorative vestiges uncovered during the conservation and restoration decorative repair work, enabled the recognition of changes made to the original architectural structure, as well as a succession of decorative building works which marked parts of the history of the construction as a whole and the artistic taste prevalent in Portugal in each of these periods. Reading the building and listening to its story, it is possible to translate into words what the lime, paint, stone, wood and tiles have related. Sometimes this occurred in an interrupted and hardly enlightening manner, leading to interpretation and conjecture. Stories which were hardly enlightening, and others rather ambiguous. In short, casting doubts, and the subject of many questions but also many surprises.
Perguntas a São Francisco: 1. A intervenção nos paramentos e tectos da Igreja pôs a descoberto revestimentos com estereotomia da pedra ou junta fingida, nomeadamente nas abóbadas do Cruzeiro, nas capelas colaterais e na capela do lado da Epístola – Nossa Senhora da Conceição. Serão estes fingidos contemporâneos? Ou serão estes reveladores de um gosto pela arquitectura fingida predominante nos acabamentos dos séculos XVI e XVII? 2. As alterações na arquitectura fingida sentiram-se também nas pilastras, sanca, arcos da nave e Capela-mor, alterações estas que consistiram igualmente na sobreposição de campanhas decorativas durante os Séculos XVIII, XIX e XX. 31
Questions to São Francisco:
1.
The decorative repair work in the front and partition faces and ceilings of the Church uncovered stereotomy coverings of stone or faux joints, specifically in the vaulting of the Crossing, in the lateral chapels and the Nossa Senhora da Conceição chapel on the side of the Epistle. Is this faux architectural work contemporary? Or does it show a taste for the faux architecture prevalent in the finishings in the 16th and 17th Centuries?
2.
Changes in faux architecture can also be noticed in the pillars, cove, nave arches and Chancel, which were also superimposed during the decorative building works of the 17th, 19th and 20th Centuries. Was the successive mar-
3.
4.
5.
6.
As sucessivas imitações de mármore nas pilastras, sancas e arcos da Igreja, recorrendo a argamassa e pintura, em alguns casos utilizando a técnica da scagliola ou stucco Veneziano foram assim realizadas por falta de averbamento para continuar a campanha iniciada no Barroco tardio, visível no altar em mármore da Capela-mor? As campanhas fingidas de mármore decorativo que se sobrepõem às campanhas de junta fingida (imitando alvenaria regular de pedra) usam como pano de fundo nas paredes a pintura branca? Com retábulos pintados nos nichos? Qual seria o acabamento dado às paredes no programa original do Século XIV e XV? Sabemos que na época Renascentista/Maneirista o revestimento já apresentava juntas fingidas. E na época gótica? Será o revestimento existente nas capelas colaterais de abóbada ogival contemporâneo? E quanto à dimensão da primitiva Igreja? E à configuração da sua planta? De cruz latina certamente. Mas aparentemente mais alta, como denotam os cachorros e vestígios dos contrafortes exteriores do lado Sul. Com que tipo de cobertura? De madeira? Duas águas? A largura da parede original, em alvenaria de pedra irregular, não suportaria uma abóbada em pedra? Apresentaria a Igreja uma galilé ou nártex? No mesmo local da actual antecâmara? Ou estaria o nártex no local do actual coro, inexistente na altura? E a torre? Estaria isolada da fachada? Desviada? Sabemos que o comprimento do transepto era maior. Muito próximo da cerca medieval para o lado Sul. E para o lado Norte? Qual era a articulação espacial entre a parte conventual e a Igreja? Havia passagem entre a cabeceira e salas anexas?
ble imitation work in the pillars, coves and arches of the Church, using mortar and paint, and in some cases using the scagliola technique or Venetian stucco, carried out due to lack of funds to continue the building work started in the Late Baroque, which is visible on the marble altar in the Chancel? Were the marble imitation works which superimposed the faux joint works (imitating the regular stone masonry) used as a backdrop on walls painted white? With altar pieces painted in the niches? 3.
What would have been the finishing applied to the walls in the original 14th and 15th century building works? We know that coverings in the Renaissance/Mannerist period had faux joints. What about the Gothic period? Is the existing covering in the ogival vaulting of the lateral chapels contemporary?
4.
What about the size of the original Church? And its layout? Certainly in the form of a Latin cross. But apparently higher, as shown through the traces of the buttresses of the Southern side And with what kind of roofing? Wooden? Sloping inverted-V shape? The width of the original wall, made of irregular stone masonry, would surely not have supported stone vaulting?
5. Would the Church have had a narthex or a porch? In the same place as the present-day antechamber? Or would the narthex have been situated at the place of the present-day choir, which did not exist at that time? And the tower? Would it have been separate from the facade? Apart? 6.
We know that the length of the transept was greater. Very close to the medieval fence on the South side. And to the North side? What was the spatial relationship between the Convent and the Church? Was there a passageway between the chancel and the adjoining rooms?
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7. Em que época se deu a grande transformação arquitectónica do espaço? No Século XVII? Poderemos atribuir todos os acrescentos e alterações em tijolo maciço a esta época? Tais como, o espessamento das paredes da nave para o lado interior a fim constituir apoio para o lançamento da abóbada de berço, também ela em tijolo burro; o encurtamento dos braços do transepto e a construção da abóbada nervurada? 8. E o retábulo em argamassa da Capela Funerária de Gaspar Fragoso? Também aqui foi identificado reboco com junta fingida sob o retábulo e sob o reboco da edícula do túmulo jacente do cavaleiro, datado de 1571. Qual a “origem” do Túmulo de Gaspar Fragoso? A construção da edícula tumular terá sido uma adaptação àquele espaço? Será contemporânea do retábulo? Os revestimentos subjacentes ao túmulo serão do mesmo período que os da parede do retábulo e da abóbada? Esta capela funerária seria toda rebocada com este tipo de revestimento? Assim como a Igreja? Quais os materiais e técnicas utilizados na execução do retábulo? Porquê a sua execução em argamassa? Terá na sua constituição apenas cal, ou haverá gesso? Este tipo de trabalho em argamassa terá semelhanças com outros, quer em Portalegre, na região ou quer no território vizinho? Como seria a mesa de altar do retábulo? Qual a sua dimensão? Será a actual original? A policromia encontrada na superfície do retábulo será original, ou haverá repinte? As perguntas reunidas, reveladoras do interesse pelo conhecimento e pela interpretação total da obra do conjunto de autores, permanecerão em aberto, sem conciliação, tendo como fim a contínua procura de uma memória histórica perdida. 33
7.
In which period did the major architectural changes take place? In the 17th Century? Can we assign all the solid brickwork additions and alterations to this period? For example, including the thickening of the nave walls on the inner side to provide support for the barrel vault, also in solid brickwork; the shortening of the arms of the transept and the construction of the ribbed vault?
8.
And the altar piece in mortar in the Funeral Chapel of Gaspar Fragoso? Plaster with faux joints was also identified here under the altar piece and under the plaster of the alcove of the tomb of the recumbent knight, dated 1571. What was the “origin” of Gaspar Fragoso’s tomb? Was the alcove housing the tomb built by adapting that space? Was it made at the same time as the altar piece? Are the coverings underlying the tomb from the same period as the wall of the altar piece and the vaulting? Would this type of finish have been applied to the funeral chapel? And the Church as well? What materials and techniques were used in the making of its altar piece? Why was it made using mortar? Would there have been just lime or gypsum as well? Are there any similar works which used this type of mortar, whether in Portalegre, the region or in the neighbouring country? What would the table for the altar piece have been like? What size? Is the current one the original one? Are the colours to be found on the surface of the altar piece original, or was it repainted?
As a whole these questions show our interest in knowledge and in interpreting the work carried out by various artists, and will remain open, without resolution, and have the effect of continuing the quest to find a lost historical memory.
Resumos e palavras-chave Abstracts and key-words Resúmenes y palabras clave
Publicações da Fundação Robinson 19, 2010, p. 34-35, ISSN 1646-7116
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PORTUGUÊS
ENGLISH
E S PA Ñ O L
Perguntas a São Francisco
Questions to “São Francisco”
Preguntas a San Francisco
A Igreja do Convento de São Francisco abriu uma vez mais as portas, desta feita para ser objecto de estudo e de debate. Vários especialistas, de diversas áreas do conhecimento, puseram em comum as conclusões a que chegaram nas suas investigações sobre este espaço, sobre a sua evolução histórica e sobre os seus elementos artísticos e arquitectónicos. Discutiram e analisaram hipóteses e suscitaram ainda mais questões, abrindo novas possibilidades de estudo que ficam aqui registadas.
The Church of the Convent of São Francisco has opened its doors once again, this time for further study and debate. Several experts from various fields of knowledge have together written down the conclusions they reached as a result of their research into this space, with regard to its historical evolution and its artistic and architectural aspects. They have discussed and considered hypotheses and raised even more questions, thus opening new possibilities for study that are listed here.
La Iglesia del Convento de São Francisco ha abierto sus puertas una vez más, aunque ahora tiene como principal objeto su estudio y debate. Varios expertos de distintas áreas del conocimiento han recopilado las conclusiones de sus investigaciones en este mismo espacio: su evolución histórica y sus elementos artísticos y arquitectónicos. Se han discutido y analizado hipótesis que han planteado aun más temas, ampliando nuevas oportunidades de estudio que registramos aquí.
palavras-chave Igreja do Convento de São Francisco de Portalegre Aberto para estudo História História de Arte Conservação e Restauro
keywords Church of the Convent of São Francisco in Portalegre Open for study History History of Art Conservation and Restoration
palavras clave Iglesia del Convento de São Francisco, Portalegre Abierto para su estudio Historia Historia del Arte Conservación y Restauración
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19 PU BLIC A Ç ÕES D A FU N D A Ç ÃO R OBINS ON União Europeia FEDER Investimos no seu futuro
NETUR