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por um mundo
Melhor
ANO II Abr/Mai/Jun 2018 BRASÍLIA - DF EDITORA PALOMITAS
ISSN: 2358-3207
Porque o MUNDO também é repleto de BOAS NOTÍCIAS e PESSOAS EXTRAORDINÁRIAS
Ciência
Change Org Brasil
SENTIMENTOS NOBRES CURAM GENES
O EMPODERAMENTO SOCIAL DAS
PETIÇÕES VIRTUAIS
DOENTES Educação
UBUNTU E OS NOVOS PARADIGMAS
PEDAGÓGICOS
Bombeiro amigo da criança
PREMIAÇÃO COMPLETA 1
20 ANOS
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Editorial
QUAL É A SUA PEGADA DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL? “Você não muda as coisas lutando contra a realidade atual. Para mudar algo, é preciso construir um modelo novo, que tornará o modelo atual obsoleto” (Buckminster Fuller)
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elhor
Expediente M
ossa civilização alcançou um progresso tecnológico sem paralelo nos últimos séculos, com transformações observadas em quase todas as áreas do conhecimento. Mas por que tal progresso não é verificado no desenvolvimento consciencial da humanidade? As guerras, a violência, o preconceito, a corrupção e a esmagadora concentração de renda nas mãos de poucos indivíduos, em detrimento do bem-estar geral, são tristes constatações de que a consciência humana precisa acompanhar sua evolução tecnológica. Caso contrário, tal avanço científico perde seu sentido original (que deveria ser de cooperação, mas não de competição) e continua a ser usado para a área militar e bélica, para servir aos interesses do mercado, de banqueiros, de investidores rentistas e de políticos inescrupulosos, bem como, também, para que nações desenvolvidas perpetuem seu controle social, econômico, político e ideológico sobre o terceiro mundo.
De igual modo, falamos de três jovens que deixam suas pegadas de transformação social bem marcadas, sinalizando caminhos para os que vêm atrás: trata-se da equipe da Change Org Brasil, que vem realizando um notável trabalho de empoderamento social e (de forma tão singular quanto) salvando muitas vidas. Isso sem que as pessoas precisem sair de casa, pois lhes basta uma conexão com a internet, que suas histórias ultrapassam fronteiras, atraindo a solidariedade alheia e a vocação para ajudar.
A realidade mostra, ainda, que uma vida inteiramente voltada para a manutenção do sistema capitalista é vazia, escravizante, alienante e perpetuadora dos pungentes e cíclicos problemas que assolam o planeta. Prova disso é que, em todas as pesquisas realizadas sobre a satisfação no trabalho, em todos os lugares do mundo, o trabalho é visto majoritariamente como algo penoso, infeliz, contrário à vida pessoal, não alinhado com propósitos maiores, desconectado das necessidades reais do planeta.
Ainda na contramão dos exemplos citados, apresentamos uma matéria sobre um documentário que alerta a sociedade brasileira a respeito do uso indiscriminado dos agrotóxicos nas lavouras. Um filme que mostra, ainda, um dos lamentáveis sintomas do lucro em detrimento da vida. Em um especial sobre a educação, também falamos sobre os valores que devem estar no centro do saber pedagógico, outra área da civilização marcada pela necessidade de formar jovens vidas para o mercado de trabalho, mas (muitas vezes) não para a vivência dos princípios essenciais do ser humano.
Um exemplo desse total descompasso do que é praticado em relação ao que deveria ser é o atual modelo de agricultura extensiva. A atual produção de grãos para exportação e para a pecuária – com o uso maciço e predominante de agrotóxicos, terrivelmente danosos para a saúde humana e animal e para o meio ambiente como um todo – mostra a face indisfarçável da vitória (parcial) do sistema capitalista sobre o bom senso, o bem comum e o bem viver.
Por fim, entre outras tantas novidades, apresentamos uma matéria comemorativa ao título de “Corpo de Bombeiros Amigo da Criança”, concedido pelo Unicef ao CBMDF, por seu elogiado Programa de Aleitamento Materno, em verdadeiro reconhecimento internacional pelos méritos indiscutíveis da iniciativa, surgida em pleno Planalto Central.
Dissemos “vitória parcial” porque toda uma consciência alinhada com as Leis da Vida e com os princípios evolutivos brota em meio ao lodo da nossa atual civilização. Na contramão tanto do desenvolvimento científico voltado para objetivos antievolutivos quanto de uma rotina profissional vazia, a serviço de um sistema que não distribui bem-estar social e não ampara os direitos básicos do indivíduo, apresentamos – nesta quarta edição da revista Por Um Mundo Melhor – uma entrevista com um cientista americano que comprova, com suas pesquisas, que sentimentos nobres curam genes enfermos e aliviam o progresso de enfermidades em pessoas que exercitam, em si, essas emoções superiores, tais como a compaixão, a empatia, o perdão, o amor não egoísta.
Até a próxima edição!
A revista Por Um Mundo Melhor é uma publicação trimestral da Editora Palomitas e não tem fins lucrativos. Todos os recursos advindos da comercialização de seus anúncios se destinam à sustentabilidade do periódico, à remuneração de seus profissionais e ao apoio a projetos sociais, ambientais e de defesa dos vulneráveis. CNPJ: 19.920.208/0001-57 Contato: revistaporummundomelhor@gmail.com Tel.: (61) 99819-9828 Fundador e editor-chefe: Paulo Henrique de Castro e Faria (RP MTb: 4136/DF) (paulo.castro.jornalista@gmail.com) Facebook: Revista Por Um Mundo Melhor
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Boa leitura!
Projeto gráfico: Paulo Moluap Diagramação: Eward Bonasser Jr. Representação comercial, consultoria em produção gráfica: Cleber de Albuquerque Colônia Editora Independente CNPJ: 24.206.387/0001-03 www.coloniaeditora.com.br Tel.: (61) 99964-7263 Consultoria editorial: Neuza Castro e Silva Impressão: Qualidade Gráfica e Editora Tiragem: 2.500 exemplares ISSN: 2358-3207 Distribuição gratuita
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A mudança ao alcance das mãos
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Um modelo de produção que põe em risco a saúde da população
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Que importância você dá ao seu coração?
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Amigo do peito e das crianças
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Ubuntu: O que a África tem a nos ensinar?
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Uma alegoria da condição humana
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A falta de uma pedagogia voltada para os valores
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A importância do equilíbrio para a vida
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Sumário
Entrevista: Richard J. Davidson
ENTREVISTA
RICHARD J. DAVIDSON
“A base de um cérebro saudável é a bondade, e pode-se treinar isso”
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“Fiz a promessa ao Dalai Lama de que faria todo o possível para que a gentileza, a ternura e a compaixão estivessem no centro da minha pesquisa”. Com tais palavras, o americano Richard J. Davidson, PhD em neuropsicologia e pesquisador na área de neurociência afetiva, evidencia o serviço incomensurável de seu trabalho científico para o bem da humanidade. Algo raro, considerando-se a desconfiança que a área acadêmica e científica em âmbito mundial tem para com a metafísica e o estudo dos sentimentos. A pesquisa de Richard Davidson está centrada nas bases neuronais da emoção e nos métodos para promover, por meio da ciência, o florescimento humano, incluindo a meditação e as práticas contemplativas. Ele fundou e preside o Centro de Investigação de Mentes Saudáveis, na Universidade de Wisconsin-Madison, onde são realizadas pesquisas interdisciplinares com rigor científico sobre as qualidades positivas da mente, como a gentileza e a compaixão. Richard Davidson já acumula prêmios importantes e é considerado uma das cem pessoas mais influentes do mundo, segundo a revista Time. É autor de uma quantidade imensa de pesquisas e tem vários livros publicados. No ano passado, ele conduziu um seminário para estudos contemplativos em Barcelona, Espanha. Nesta entrevista, Richard J. Davidson fala de suas motivações e conta como umas das coisas mais importantes que ele descobriu sobre a gentileza e a ternura “é que se pode treiná-las em qualquer idade”. IMA SANCHÍS
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asci em Nova Iorque e moro em Madison, Wisconsin (EUA), onde sou professor de psicologia e psiquiatria na universidade. A política deve basear-se naquilo que nos une. Só assim poderemos reduzir o sofrimento no mundo. Acredito na gentileza, na ternura e na bondade, mas temos que nos treinar
nisso. Eu estava investigando os mecanismos cerebrais ligados à depressão e à ansiedade. E acabou fundando o Centro de Investigação de Mentes Saudáveis. Quando eu estava no meu segundo ano na Universidade de Harvard, a meditação cruzou o meu caminho e fui para a Índia investigar como treinar a minha mente. Obviamente, meus professores disseram que eu estava ficando louco, mas aquela viagem marcou meu futuro.
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bertas muito úteis para tratar a depressão. Contudo, em 1992, conheci o Dalai Lama e minha vida mudou. Um homem muito encorajador. “Admiro seu trabalho – ele me disse –, mas acho que você está muito centrado no estresse, na ansiedade e na depressão. Nunca pensou em focar suas pesquisas neurocientíficas na gentileza, na ternura e na compaixão?”. Um enfoque sutil e radicalmente distinto. Fiz a promessa ao Dalai Lama de que faria todo o possível para que a gentileza, a ternura e a compaixão estivessem no centro da minha pesquisa. Palavras jamais citadas em um estudo científico.
É assim que começam as grandes histórias. Descobri que uma mente calma pode produzir bem-estar em qualquer tipo de situação. E quando me dediquei a investigar, por meio da neurociência, quais são as bases para as emoções, fiquei surpreso por ver como as estruturas do cérebro podem mudar em tão somente duas horas. Em duas horas! Hoje, podemos medir com precisão. Levamos meditadores ao laboratório e, antes e depois da meditação, tiramos uma amostra de sangue deles para analisar a expressão dos genes. E a expressão dos genes muda? Sim. E vemos como as zonas com inflamação ou com tendência à inflamação tinham uma abrupta redução disso. Foram desco-
O que você descobriu? Que há uma diferença substancial entre empatia e compaixão. A empatia é a capacidade de sentir o que sentem os demais. A compaixão é um estado superior. É ter o compromisso e as ferramentas para aliviar o sofrimento. E o que isso tem a ver com o cérebro? Os circuitos neurológicos que levam à empatia ou à compaixão são diferentes.
“Tenho mostrado o resultado de uma pesquisa que temos realizado em diversas culturas diferentes: se interagirmos com um bebê de seis meses usando dois fantoches, sendo que um deles se comporta de forma egoísta e o outro de forma amável e generosa, 99% dos bebês preferem o boneco que coopera”.
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Forma uma parte do circuito da compaixão. Umas das coisas mais importantes que descobri sobre a gentileza e a ternura é que se pode treiná-las em qualquer idade. Os estudos nos dizem que estimular a ternura em crianças e adolescentes melhora os resultados acadêmicos, o bem-estar emocional e a saúde deles. E como se treina isso? Primeiro, levando a mente deles até uma pessoa próxima, que eles amam. Depois, pedimos que revivam um momento em que essa pessoa estava sofrendo e que cultivem o desejo de livrar essa pessoa do sofrimento. Logo, ampliamos o foco para pessoas não tão importantes e, por fim, para aquelas que os irritam. Estes exercícios reduzem substancialmente o bullying nas escolas.
Umas das coisas mais interessantes que tenho visto nos circuitos neurais da compaixão é que a área motora do cérebro é ativada: a compaixão capacita a pessoa a agir para aliviar o sofrimento do outro.
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Da meditação à ação há uma distância.
Agora você pretende implementar no mundo o programa Healthy Minds (“Mentes Saudáveis”). Esse foi outro desafio que o Dalai Lama me deu. Temos elaborado uma plataforma mundial para disseminá-lo. O programa tem quatro pilares: a atenção; o cuidado e a conexão com os outros; o contentamento de ser uma pessoa saudável (fechar-se nos próprios sentimentos e pensamentos é uma das causas da depressão)… É preciso estar aberto e exposto. Sim. E, por último, ter um propósito na vida, que é algo que está intrinsecamente relacionado ao bem-estar. Tenho visto que a base para um cérebro saudável é a bondade. Treinamos a bondade em um ambiente científico, algo que nunca tinha sido feito antes. Como podemos aplicar esse treinamento em nível global? Por meio de vários setores: educação, saúde, governo, empresas internacionais… Por meio desses mesmos agentes que têm potencializado este mundo de opressão em que vivemos? Você tem razão. Por isso, sou membro do Conselho do Fórum Econômico Mundial de Davos, para convencer os líderes de que é preciso levar às pessoas o que a ciência sabe sobre o bem-estar.
“Treinamos a bondade em um ambiente científico, algo que nunca tinha sido feito antes”. http://tudosobreobudismo.blogspot.com.br/2017/05/ pesquisas-laboratoriais-por-imagens-do.html
E a ternura?
Richard J. Davidson fez pesquisas laboratoriais por imagens do cérebro do monge budista Matthieu Ricard, em várias formas de meditação, incluindo meditação de compaixão.
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http://tudosobreobudismo.blogspot.com.br/2017/05/ pesquisas-laboratoriais-por-imagens-do.html
E como convencê-los?
www.goalcast.com
Por meio de provas científicas. Tenho mostrado a eles, por exemplo, o resultado de uma pesquisa que temos realizado em diversas culturas diferentes: se interagirmos com um bebê de seis meses usando dois fantoches, sendo que um deles se comporta de forma egoísta e o outro de forma amável e generosa, 99% dos bebês preferem o boneco que coopera. Cooperação e amabilidade são inatas.
Richard J. Davidson comprova que a gentileza, a ternura, a compaixão e a bondade podem ser treinadas e podem mudar o mundo.
Sim, mas são frágeis. Se não são cultivadas, se perdem. Por isso, eu, que viajo muitíssimo (o que é uma fonte de estresse), aproveito os aeroportos para enviar mentalmente bons desejos a todos com quem cruzo no caminho, e isso muda a qualidade da experiência. O cérebro do outro percebe isso.
www.veganpolice.com.au
Em apenas um segundo, seguem o seu exemplo. A vida é só uma sequência de momentos. Se encadearmos essas sequências, a vida muda. Hoje, a “mindfulness” (“atenção plena”) tornou-se um negócio. Cultivar a gentileza é muito mais efetivo do que se centrar em si mesmo. São circuitos cerebrais distintos. A meditação
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Richard J. Davidson e Matthieu Ricard, secretário particular do Dalai Lama e autor do livro: “O Monge e o Filósofo”, feito em parceria com o pai do monge budista, o célebre filósofo francês ateu Jean-François Revel.
em si não interessa para mim. O que me importa é como acessar os circuitos neurais para mudar o seu dia a dia, e sabemos como fazer isso.
“Há uma diferença substancial entre empatia e compaixão. A empatia é a capacidade de sentir o que sentem os demais. A compaixão é um estado superior. É ter o compromisso e as ferramentas para aliviar o sofrimento”. Fonte: entrevista publicada originalmente no site do jornal espanhol La Vanguardia, em 27/03/2017. Disponível em: <http://www. lavanguardia.com/lacontra/20170327/421220248157/ la-base-de-un-cerebro-sano-es-la-bondad-y-se-puede-entrenar. html>. Tradução: Tibet House Brasil.
Conhecer para transformar
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MUDANÇA AO ALCANCE DAS
MÃOS
Saiba como a plataforma de petições virtuais Change Org Brasil vem realizando, no País, uma verdadeira atuação social sem precedentes na internet, mostrando que as pessoas que têm seus direitos cerceados têm também, em suas mãos, o poder da mudança. PAULO CASTRO
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À
s vezes, a quantidade e a diversidade de coisas erradas no mundo nos parecem tão numerosas, dolorosas e inacessíveis, além da nossa capacidade de impedi-las, que normalmente o desânimo e o sentimento de impotência são a tônica de nossos dias. Muitas pessoas se perguntam o que poderiam fazer para mudar tanta injustiça, mas ficam sem respostas, presas a um cotidiano que exige delas o máximo de empenho para garantir o sustento da família, além do seu próprio, em insana rotina, que implora por tudo de nós e nos afasta do que realmente nos traria realização, plenitude e sensação do dever social cumprido. De modo a propiciar uma forma eficaz de pressão política e ampla atuação social, com a exigência de pouquíssimo tempo e mínimo esforço das pessoas
empenhadas em uma mudança efetiva de realidades tão distorcidas da nossa civilização, aproveitando-se das facilidades da internet, surgiram as petições virtuais nos anos de 1990 nos EUA. Embora informalmente tenham mais de duas décadas de existência, somente nos últimos seis anos, no Brasil, as petições on-line se popularizaram e têm mostrado seu imenso alcance social. No meio jurídico, a petição é um instrumento legal utilizado pelo advogado para conseguir uma decisão favorável dada pelo juiz. Porém, na linguagem popular, seu significado se apresenta de forma mais ampla, sendo a petição entendida como uma mensagem assinada por muitas pessoas. Neste sentido mais amplo, uma petição tem a mesma importância de um abaixo-assinado, só que com alcance muito maior, podendo ser resumida como um documento contendo uma solicitação coletiva. São diversas e diversificadas “cobranças”, que abarrotam e-mails de entes públicos e privados e de cidadãos comuns, com exigências de mudanças, solicitações e (muitas) denúncias. Os mais conhecidos sites formuladores de petições no mundo são a Avaaz e a Change, sendo que esta última tem uma atuação mais próxima dos brasileiros, a partir da Change Org Brasil. Enquanto a Avaaz escolhe apenas causas políticas e sociais, a Change é uma organização que, além de pressão social e política, também proporciona que indivíduos mobilizem suas próprias demandas embasadas, muitas vezes, em histórias pessoais, desde que não violem algum tipo de direito e nem a lei.
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Com baixo peso e outros problemas de saúde, o bebê de Aline Rocca Vizoni ficou mais de cinco meses na UTI e precisava de cuidados da mãe, mas o INSS negou o pedido de prorrogação da sua licença-maternidade, embora vários laudos médicos atestassem a necessidade de uma presença mais próxima de Aline junto ao seu filho. Por conta disso, ela fez uma petição na Change Org Brasil, a fim de pressionar o governo a lhe conceder uma prorrogação do benefício previdenciário.
Classificada como empresa do Sistema B (que é constituído por organizações que trabalham por uma economia cujo êxito é medido pelo bem-estar das pessoas, das sociedades e da natureza), certificação americana para empresas que não têm lucro e reinvestem toda sua receita em melhorias, a Change tem seu modelo de negócio voltado para o bem social. Há duas formas de geração de renda: campanhas patrocinadas e doações em dinheiro (de R$ 5,00 a R$ 100,00). Grandes organizações, como Greenpeace, WWF e Anistia Internacional, patrocinam campanhas e, a cada assinatura conquistada, a Change é remunerada.
e o hospital Dante Pazzanese a fazer a cirurgia cardíaca e salvar o pequeno Beny. Casos semelhantes de pessoas que conseguem um tratamento de saúde graças à pressão de internautas são numerosos na história da Change Org Brasil, mas não só em situações assim as
Só quem teve um caso grave para resolver (como a delicada situação de saúde de alguém querido), sem qualquer apoio de autoridades e das instituições, sabe a importância de um canal de comunicação direta que tenha o poder de mobilizar a opinião pública em busca da melhoria substancial de uma realidade difícil, sendo – muitas vezes – a diferença entre a vida e a morte. Que o digam Gabriela e Moisés Pereira, moradores de Sorocaba (SP), que há dois anos se viram desesperados quando Benyamin Luiz, o filho do caO pequeno Lorenzo, então com 9 anos, sofre de uma epilepsia muito grave e precisava de tratamento com um princípio ativo até então proibido no País, o canabidiol (CBD). Caso contrário, poderia morrer. Um abaixo-assinado da Change Org Brasil solicitava que a Anvisa liberasse o uso medicamentoso do CBD no País. Em reunião deliberativa, a petição – com duas mil páginas e 77 mil assinaturas em favor da liberação do princípio ativo – foi entregue nas mãos do então presidente da Anvisa, que liberou o uso médico do CBD.
sal, nasceu antes do tempo e com um problema no coração. Juntos, Gabi e Moisés passaram por hospitais em três cidades, foram “esquecidos” para fora da fila da operação que salvaria o filho Beny e só obtiveram uma resposta positiva quando ambos iniciaram um abaixo-assinado na Change Org Brasil. A mobilização do casal alcançou mais de 250 mil assinaturas e convenceu a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo
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Beny é salvo pela pressão de internautas
O médico Henrique Aquino criou uma petição na Change Org Brasil para salvar o Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE), no Rio de Janeiro, que estava à beira do encerramento de suas atividades. Após a pressão popular, o governador do estado se comprometeu a evitar o fechamento do estabelecimento hospitalar.
petições são eficazes. À exceção de pedidos que violam os princípios da integridade alheia e a lei (como pornografia, bullying ou ações que prejudiquem os direitos humanos), vale de tudo: de pedidos de pavimentação de rua à mobilização para aprovar ou derrubar leis. Foi o caso da petição contra a PEC 37, que
restringia o poder de investigação do Ministério Público e acabou arquivada pelo Congresso Nacional na esteira das manifestações de rua de 2013, na época do governo de Dilma Rousseff.
tão de dias, que a prefeitura consertasse um semáforo desregulado na rua onde ele trabalha, na Lapa. Contente com o resultado, ele elaborou uma segunda petição, na qual pedia que a praça em frente ao semáforo fosse iluminada. Resultado: recebeu cerca de 8.476 assinaturas, graças à própria Change, que levou o caso à TV.
Resultados expressivos
Alguns defensores dos direitos animais também têm os abaixo-assinados on-line como aliados de sua militância. Um exemplo disso é o caso de Kelly Thimoteo. Moradora de Passo Fundo (RS), onde atuava como brigadiana (PM), ela era a responsável por Nanquin, cavalo-policial que pertence ao governo do estado e deveria ser leiloado, após a policial deixar a corporação, onde trabalhava com o animal há sete anos. Já velho, Nanquin certamente viraria propriedade de carroceiro ou iria para o abate. Por sete anos, Kelly tentou a guarda de Nanquin, mas o comandante não aprovava o pedido. A única saída da ex-PM foi apelar para a Change Org Brasil. Sua petição viralizou na internet e conseguiu o apoio de mais de 80 mil pessoas. O fim da história foi surpreendente: em 2017, os deputados do RS aprovaram a Lei Nanquin, que regulamenta o processo de adoção de cães e cavalos aposentados da segurança pública, com preferência ao servidor público que trabalhou junto com o animal.
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Um exemplo prático desse poder está em uma notícia publicada em outubro de 2014. Naquele ano, a justiça paulista proibiu a PM de usar balas de borracha para reprimir manifestações no estado. Tudo se deu a partir da iniciativa do fotojornalista Sérgio Andrade da Silva, que perdeu o olho esquerdo, ao ser atingido pelo artefato, enquanto cobria uma das muitas manifestações de 2013 em São Paulo. Ele criou a petição na Change, que reuniu mais de 45 mil assinaturas. Deu certo: a pressão acarretou a decisão judicial. Mas se engana quem pensa que um número alto de assinaturas é fator decisório. Com 700 delas apenas, um designer paulistano conseguiu, em ques-
Há pouco tempo, uma petição semelhante da Change Org Brasil pedia a proibição de testes com animais para a confecção de produtos cosméticos no País. Os ambientalistas também utilizam a plataforma virtual. Atualmente, uma votação da Change Org Brasil mobiliza os internautas para a criação de petições que exijam
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Números representam muito para uma plataforma de abaixo-assinados on-line como a Change, que surgiu nos EUA e chegou ao Brasil em 2012. Por aqui, em apenas dois anos, já eram 2,5 milhões de brasileiros que criavam e apoiavam campanhas de petições virtuais (no mundo, até 2014, eram 78 milhões de usuários). Apesar dos números grandiosos, o maior valor da Change é outro: a capacidade de empoderar individualmente qualquer pessoa.
Causas animais e ambientais também são alvos das petições
Manifestantes criaram uma petição na Change Org Brasil para que senadores e deputados alterem o PL 497/2013, para permitir apenas o uso de fogos de artifício sem ruído no Brasil, em prol da saúde e do bemestar dos animais. O abaixo-assinado não alcançou o número de adesões necessário, mas o grupo afirmou que continuaria a buscar apoio popular à causa.
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da justiça a punição para empresas que poluem o meio ambiente, como mostrou um caso recente no município de Barcarena (PA), cujo rio enfrenta uma contaminação devastadora provocada pelo vazamento de rejeitos de bauxita vindos da barragem da mineradora Hydro, empresa norueguesa instalada na região. Equipe reduzida, mas incrivelmente empenhada em deixar sua marca social Sabemos que assinar uma petição apenas não é o suficiente para mudar toda uma ordem distorcida das coisas, mas é o mínimo que se pode fazer e é o início de um trabalho para unir forças, porque sem a pressão coletiva da sociedade civil e do cidadão comum nada pode ser feito. Com essa crença, três jovens idealistas deixam suas pegadas de transformação cidadã na sociedade brasileira com o seu ativismo notável: os paulistas Graziela Tanaka, diretora da Change Org no Brasil; Rafael Sampaio, coordenador de campanhas; e o carioca Pedro Prata, diretor de comunicação da organização.
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Este exército de três soldados faz um trabalho admirável: eles fazem a triagem, o contato com os autores das petições e os even-
cipantes por mês, sendo que mais de 800 mil pessoas já haviam assinado pelo menos uma petição vitoriosa. Problemas locais que interferem no dia a dia das pessoas estão entre os principais alvos das mobilizações. “O prefeito de uma cidade pequena recebe, da noite para o dia, 200 e-mails. É pressão política”, afirma Graziela. “É como se falássemos para as pessoas que, mesmo não pertencendo a um movimento, uma organização ou não tendo uma assessoria de imprensa, ainda assim elas têm poder de mudança”, sintetiza Pedro Prata, como a reafirmar a confiança na profissão de fé desse grupo de ativistas virtuais, que vem transformando vidas e mostrando que o empoderamento social é possível e não uma meta inalcançável.
EXEMPLOS DE CAMPANHAS: <https://www.change.org/ptBR/peti%C3%A7%C3%B5es>
Rafael Sampaio, Graziela Tanaka e Pedro Prata: os ativistas sociais e virtuais da Change Org Brasil.
tuais ajustes nas campanhas, como indicação de um alvo menos genérico ou a melhoria do texto. “Nosso trabalho é de bastidores, pois a campanha é do peticionário”, diz Graziela. “É uma ideia que estamos construindo aos poucos e que está crescendo. Acreditamos que vai haver cada vez mais cobrança a governos e empresas via petição on-line”, afirma Pedro. Ele tem razões para acreditar: em 2014, com apenas dois anos de funcionamento da plataforma virtual no Brasil (sua versão em língua portuguesa data de outubro de 2012), tal serviço de ativismo on-line já contabilizava 1,5 milhão de usuários e um ritmo de crescimento de 106 mil novos parti-
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Fontes:<https://www.change. org/l/br/o-final-feliz-dahistoria-de-gabriela-moisese-beny>, <https://g1.globo. com/rs/rio-grande-do-sul/ noticia/ex-policial-militartenta-adotar-cavalo-que-eraseu-companheiro-e-deve-serleiloado-pelo-governo-do-rs. ghtml>, <https://extra.globo. com/noticias/brasil/ plataforma-de-abaixoassinados-virtuais-changeorgcontabiliza-15-milhao-deusuarios-no-brasil-10835288. html>, <https://projetodraft. com/change/>.
Cultura
UM MODELO DE
PRODUÇÃO
QUE PÕE EM RISCO
A SAÚDE DA POPULAÇÃO Documentário brasileiro mostra a inconcebível realidade do uso de pesticidas nas lavouras do País e os danos muitas vezes irreversíveis (e fatais) aos seres humanos, aos animais e ao meio ambiente.
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ocê já perdeu algum parente com câncer? Ou com alguma doença degenerativa? Ou talvez, ainda, até suicídio, como parte de um agravamento de crises de depressão profunda? Pode parecer que não há relação alguma entre essas (e muitas outras) questões de saúde, mas existe, sim. E ela pode ser resumida em uma simples palavra: agrotóxico. Diversos estudos sérios mundo afora comprovam que a utilização de defensivos agrícolas está diretamente relacionada ao aumento exponencial de vários problemas de saúde (muitos fatais) recorrentes na população, principalmente do Brasil, um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Enquanto diversos países europeus já baniram, há décadas, alguns dos piores defensivos agrícolas, o Brasil ainda continua aceitando sua importação, devido ao lobby predador de várias indústrias produtoras estrangeiras.
Enquanto isso, muitos pesquisadores ainda atestam que não há unanimidade entre cientistas sobre a ação nociva dos agrotóxicos. A razão da não concordância uníssona em relação ao tema se deve a uma controversa e abominável prática: muitas universidades são financiadas com recursos de empresas químicas multinacionais para “maquiar” resultados e esconder os danos devastadores causados pelos agrotóxicos no organismo humano e dos animais, de modo que até lençóis freáticos e rios são condenados e têm seus biomas copiosamente comprometidos. Mas até governos participam dessa prática abominável, o que atesta a incoerência criminosa de tudo isso: enquanto o Sistema Único
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de Saúde (SUS) gasta milhões de reais para tratar milhares de pacientes vítimas de câncer e de doenças degenerativas, os estados lucram com os impostos de tais produtos. Neste sentido, um filme do cineasta carioca Silvio Tendler coloca o dedo na ferida e expõe suas pústulas. O documentário “O Veneno está na Mesa” (partes 1 e 2) traz o relato de especialistas e agricultores e coloca em xeque o atual modelo de produção de alimentos no país. “O que me motivou a falar sobre o tema foi ter descoberto que o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos [do mundo]. Cada brasileiro consome, em média, 5,2 litros por ano”, diz o documentarista. Tendler nunca foi ligado à causa agroecológica. Um alerta do escritor uruguaio Eduardo Galeano, há alguns anos, fez o cineasta ter maior interesse pelo tema. Depois de percorrer o Brasil, recolhendo depoimentos em diversos estados brasileiros, o documentarista faz a defesa ardorosa de um novo modelo de agricultura. “A grande conclusão do filme é que, se a gente quer continuar vivendo e salvar o planeta, temos que buscar outro modelo, como a agricultura orgânica. Temos que abandonar os transgênicos e os defensivos agrícolas, que nada mais são do que agrotóxicos”, afirma. O cineasta revela que “estamos sujeitos a um envenenamento” e chamou a atenção para o fato de que, muitas vezes, o consumidor pensa no agrotóxico apenas quando vai escolher verduras ou legumes, mas “por estar no trigo e na soja, o agrotóxico está em muitos outros produtos, como pães e pizzas”. Entre os depoimentos mais estarrecedores, o documentário destaca o que ocorreu com uma agricultora que sofreu uma esclerose múltipla gravíssima com apenas 32 anos de idade. Desde os 12 anos, ela trabalhava na lavoura de fumo no Rio Grande do Sul. Segundo Tendler, é bem mais difícil estabelecer quais são os efeitos dos agrotóxicos para os consumidores do que nos agricultores que manejam os mesmos produtos. Mas ele afirma que o crescimento da incidência de algumas doenças, como o mal de AlzheiAssista ao documentário na íntegra, gratuitamente, em: <https://www.youtube.com/watch?v=k--6BPWApNo>. FILMES DA “TRILOGIA DA TERRA” (DE SILVIO TENDLER):
mer e alguns tipos de câncer, indica uma relação, defendida por especialistas, embora ‘não haja provas conclusivas disso’ (leia-se: embora não haja um interesse – de vários grupos sujeitos ao lobby do agronegócio – de que haja provas). “Acho que não vale a pena pagar para ver”, sentencia o cineasta. O filme mostra, ainda, uma pesquisa realizada com 62 mulheres, no Mato Grosso, que demonstrou que todas elas tinham resíduos de agrotóxico no leite que ofereciam aos seus bebês. Além disso, o documentário apresenta alternativas ao atual modelo de produção, como a história de um pequeno agricultor e a experiência da Argentina, onde foi aberta uma investigação oficial sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde da população. Silvio Tendler acredita que o documentário não ficará restrito a um grupo pequeno de militantes das causas ecológicas e de esquerda. “Acho que este filme não tem clivagem entre direita e esquerda. Todos podem se interessar por este tema. Ninguém, apenas por ser de direita, vai querer gerar um monstro”, diz. Para que a divulgação do tema fosse efetiva, ele fez questão de disponibilizar “O Veneno está na Mesa” na internet e distribuí-lo gratuitamente. “O importante é que as pessoas assistam a ele”, resume.
• “O Veneno está na Mesa” (2011). • “O Veneno está na Mesa 2” (2014).
Fonte: <http://despertarcoletivo. com/o-veneno-esta-na-mesa/>.
• “Agricultura Tamanho Família” (2014).
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Se a natureza não tiver futuro, nós também não teremos.
NOS AJUDE A por um mundo
Melhor
PROTEGER A VIDA O WWF-Brasil desenvolve, há mais de 20 anos, projetos e iniciativas de conservação do meio ambiente para que a sociedade brasileira conviva em harmonia com a natureza, em benefício das gerações atual e futura.
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Gesto solidário
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QUE
IMPORTÂNCIA
VOCÊ DÁ AO SEU
CORAÇÃO
Médica tenta salvar vida de ladrão ferido por policial, alheia ao fato de que havia acabado de ser assaltada e ameaçada e mesmo ainda sob o impacto do medo e da impotência diante da violência PAULO CASTRO
e alguém se basear apenas pela manchete, pode ter a noção equivocada de que se trata de uma matéria sobre saúde e sobre os cuidados que devemos ter para garantir um coração saudável. Bem, é de coração saudável que ela trata, mas não no sentido que muitos podem pensar. Se pela noção de saudável entendemos um coração alheio ao ódio e ao sentimento de vingança, sim, pode-se entender que o texto salienta quão fundamental é ter um coração saudável. Esta é uma daquelas histórias que não envelhecem, pois transcendem o tempo e as fronteiras geográficas e, volta e meia, nos fazem refletir a respeito da fidelidade que temos (ou deveríamos ter) às nossas próprias consciências, mesmo a despeito do medo, da sujeição ao julgamento dos outros, da ânsia alheia pela revanche e da sede da sociedade por justiça, ainda que feita pelas próprias mãos. Além disso, é uma história que nos mostra como a vida real é recheada de mais enredos inusitados do que a própria ficção. Há pouco mais de dois anos, a médica Simone Soares de Souza fazia um trajeto usual de casa para o trabalho, de ônibus. Parecia ser mais um dia como outro qualquer. Às 6h30 daquele dia 10 de julho de 2015, próximo ao terminal Alvorada, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro, três passageiros, que já estavam dentro do ônibus, anunciaram o assalto. “Na hora, [um dos assaltantes] botou a arma na cabeça do motorista e disse que era assalto e que o motorista não fizesse nada”, lembra a médica. Além de pistolas, os assaltantes tinham uma granada e faziam ameaças.
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Ela estava sentada no primeiro banco, bem atrás do motorista, e presenciou toda a ação. Todavia, dentro do ônibus estava um policial civil, que também acompanhava o desenrolar do assalto e esperou o momento certo de agir. Quando o agente percebeu a ocasião precisa, sacou a arma e atingiu o assaltante G1
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A médica Simone Soares de Souza relembra o caso.
Gabriel de Paiva/Agência O Globo
G1
O assaltante ferido é retirado do ônibus pelos bombeiros.
As manchas de sangue do assaltante podiam ser vistas nas roupas da médica quando os policiais chegaram.
que estava mais próximo à médica, que minutos antes havia recolhido a carteira de Simone Souza e, alvejado, caiu no colo dela, desfalecido. Um outro ladrão também foi baleado e, juntamente com o terceiro assaltante, ambos conseguiram sair do ônibus, ainda em movimento. Quando a polícia chegou, todos os passageiros saíram do ônibus, mas – ao ver o estado do assaltante que havia caído sobre o seu colo – a médica não hesitou e resolveu voltar ao ônibus para prestar-lhe os primeiros socorros. “Quando percebi que ele estava vivo, pedi para o policial me emprestar uma luva. Ele me emprestou e pedi para ele ligar para os bombeiros, que chegaram logo. E ele [o assaltante] estava com vida ainda e onde tem vida a medicina tem que atuar”, contou Simone Souza. “Voltei e voltaria de novo”
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Pouco depois de ajudar o homem que ameaçara matá-la, a médica disse aos repórteres que apenas cumpriu o seu dever e que não hesitou, nem hesitaria, em socorrer qualquer pessoa, fosse ela quem fosse. Apesar de tanta violência em sua cidade e em todo o país, em verdadeira convulsão social, como um indivíduo na UTI, a médica acredita que a sociedade tem cura.
“Antes de tudo, somos seres humanos e a gente tem que lutar pelo outro. Se a gente levanta uma bandeira pela paz, a gente tem de atuar pela paz, pelo outro, acreditar que dá para mudar. Algumas pessoas acham que eu não deveria ter voltado [para socorrer o assaltante]. Opinião e juízo têm que ser respeitados. O importante é a gente seguir o nosso coração. Enquanto a gente seguir o nosso coração, acho que a gente está no caminho certo. Voltei e voltaria de novo, independentemente do julgamento que eu vou ter. Havia uma vida ali e, se há vida, a gente tem de estar junto”, afirmou Simone Souza. Foi, então, que uma repórter perguntou à médica: “Não importa de quem seja [a vida]?”. “Não sou eu que vou julgar”, respondeu Simone Souza. “Havia um ser um humano ali que havia tomado uma opção errada na vida, mas [acima de tudo] havia uma vida ali que estava agonizando. Eu acredito no Rio de Janeiro, no carioca, no brasileiro. A gente tem jeito”, finalizou ela. Fonte: <http://g1.globo.com/ rio-de-janeiro/noticia/2015/07/ vitima-de-assalto-onibus-no-rio-medica-socorreu-criminoso-baleado.html>.
G1
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A câmera de segurança do ônibus registra o momento em que a médica retorna para dentro do veículo, calçando as luvas, a fim de atender o assaltante alvejado.
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Ação Social
AMIGO DO PEITO E
DAS CRIANÇAS
Há 20 anos, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) concedeu o título de “Corpo de Bombeiros Amigo da Criança” ao CBMDF. A premiação tornou a Corporação do Distrito Federal a única instituição não hospitalar do Brasil a receber a referida comenda, feito que perdura até hoje. Era o reconhecimento internacional do Programa de Aleitamento Materno do Corpo de Bombeiros do DF, realizado em parceria com a Secretaria de Saúde. O trabalho pioneiro, que nasceu em Brasília no final da década de 1980, destina-se às mães que têm dificuldades de produzir leite em qualidade e volume suficientes para poder amamentar seus bebês. A iniciativa fez a cidade atingir, já na década de 90, uma condição de autossuficiência, ao coletar, anualmente, cerca de 20 mil litros de leite materno, marca que representa, ainda hoje, 95% de todo o leite coletado no DF (e no Entorno) e 15% de todo o volume obtido no País. Os resultados de Brasília inspiraram estados e cidades brasileiras a desenvolver ações semelhantes, salvando vidas precoces, garantindo-lhes o sustento. PAULO CASTRO
esde 1991, a Organização Mundial da Saúde (OMS), em parceria com o Unicef, empreende um esforço mundial no sentido de proteger, promover e apoiar a amamentação. Segundo as recomendações da OMS, todas as crianças devem receber o aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade. Ou seja, até essa idade, o bebê deve tomar apenas o leite materno, de modo que não se deve dar à criança nenhum outro alimento complementar ou bebida.
Em 2014, o estudo “Breastfeeding and Risk of Infections at 6 Years”, publicado na revista Pediatrics, encomendado pelo Instituto Nacional de Saúde e pelo Centro para Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, comprovou que o leite
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Soldado mostra o resultado da coleta, juntamente com a doadora e seu filho.
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Divulgação/CBMDF
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Divulgação/CBMDF
Divulgação/CBMDF
Acondicionamento e refrigeração dos frascos com leite, para garantir sua integridade.
Presente de Natal para crianças em UTI: garantia de sobrevida e sobrevivência.
materno é rico em fatores imunológicos e evita até 70% das infecções na infância. De forma inusitada, o estudo também mostrou que a intensidade do aleitamento materno influenciou a saúde das crianças ao longo dos anos. Ou seja, inexplicavelmente, o leite da mãe continua protegendo a criança mesmo após o desmame. Os achados da pesquisa evidenciam a extrema importância do leite materno na tenra infância, o que mostra que todos os esforços empreendidos no sentido de garantir tão precioso alimento a todas as crianças não têm preço. Pensando nisso antes mesmo da recomendação oficial da OMS, o que mostra o pioneirismo de sua relevante e inestimável ação social, o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF), no ano de 1989, instituía o Programa de Aleitamento Materno, em parceria com a Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SESDF). Tudo começou a partir da iniciativa individual de um capitão, que viu a dificuldade que a Secretaria de Saúde tinha para a realização da coleta, que, na época, era feita pela Fundação Hospitalar do DF. O gesto aparentemente isolado do oficial arrebatou toda a corporação em verdadeira corrente de solidariedade, tornando-se uma marca histórica da atuação social do CBMDF, amparada desde 1993 pela Lei Distrital no 454.
Divulgação/CBMDF
Desde meados de 1991, os bombeiros militares começaram a realizar, então, a coleta e o transporte de leite humano, em trabalho
iniciado no então Hospital Regional da Asa Sul. Além da coleta domiciliar e do transporte, os bombeiros também orientam as doadoras sobre os procedimentos de higienização, extração manual e congelamento do leite. Graças à parceria inestimável com o CBMDF, em termos de volume de leite humano processado, a Rede Brasileira de Banco de Leite Humano (Rede BLH-BR) passou a conviver não apenas com a autossuficiência, mas também com uma nova realidade: alcançou a inusitada marca de 17.509 litros de leite humano por ano, o que sem dúvida constitui um recorde imensurável também em vidas amparadas pela iniciativa. “A questão da autossuficiência se dá em função das crianças internadas em UTI neonatal. Isso persiste porque as crianças da UTI neonatal precisam receber leite materno. Entretanto, é sempre necessário coletar mais, para que todas as crianças que necessitarem de leite humano doado o recebam, independentemente de onde estejam internadas”, salientou o tenente Wanilson, um dos responsáveis pela área de programas sociais do CBMDF. Ao ser questionado se não havia desabastecimento de leite humano em épocas de férias, o tenente explicou. “Em geral, nos meses de férias escolares, como julho, janeiro e fevereiro,
Bombeiros se preparam para realizar coleta.
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existe uma baixa na coleta. Nesses meses, é feito um esforço maior para manter os estoques”, garantiu ele. Segundo o oficial, a maior dificuldade para o CBMDF realizar a coleta consiste na necessidade de maior número de pessoal para cobrir todas as demandas, mas sempre se faz um esforço maior e tudo se resolve.
Matheus Oliveira/Agência Saúde
Conforme ele explica, “o leite materno é o melhor alimento que qualquer criança pode receber. Para as crianças internadas em UTI neonatal, o leite humano é um fator essencial para a sobrevida. Be-
“Você certamente conhece o lema militar: ‘Missão dada é missão cumprida’, não é? Então, o Corpo de Bombeiros leva esse lema a sério. É inestimável agradecer todo o empenho do CBMDF em manter e garantir o programa”, diz a médica. Para as mães que não sabem se a doação delas surtirá efeito futuro para alguma criança, a doutora diz que um simples frasco de leite humano alimenta até 10 bebês por dia. Apenas 1.500 litros por mês são suficientes para atender à demanda do DF e do Entorno. “É um trabalho social de vital importância”, finaliza ela.
Dra. Miriam Santos, coordenadora do BLH/DF: “Sem o CBMDF, a iniciativa jamais teria o mesmo alcance”.
bês prematuros e com baixo peso são alguns dos principais motivos [para todo esse esforço social], mas pode haver outras crianças internadas que necessitam de leite materno doado”, ressalta o oficial.
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Atuação inestimável do CBMDF Há 10 anos como coordenadora do BLH/DF, a médica Miriam Santos não poupa elogios à atuação do Corpo de Bombeiros do DF no Programa de Aleitamento Materno. “Sem o CBMDF, a iniciativa jamais teria o mesmo alcance”, diz ela. E vai além: “o Corpo de Bombeiros é, notoriamente, a instituição que conta com praticamente 100% da confiança da população, o que é fundamental para a adesão popular à iniciativa”, ressalta. Segundo ela, o reconhecimento popular ao programa é tão claro que muitas mães ligam direto para o serviço 193 (de emergência do CBMDF) quando querem doar leite, em vez de ligarem para o serviço 160, opção 4, que é o canal exclusivo da corporação para realizar a doação de leite humano.
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Placa de premiação do Unicef em reconhecimento ao trabalho realizado pelo CBMDF em prol do aleitamento materno. Serviço: Disque 160, opção 4. Ou acesse o site: <http:// amamentabrasilia.saude. df.gov.br/>.
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Especial: Educação Melhor por um mundo
“UBUNTU”:
O QUE A ÁFRICA TEM A NOS ENSINAR?
A alegoria é muito conhecida e há anos já foi repetida e compartilhada à exaustão nas mídias sociais e mesmo em outros canais de comunicação, até na TV aberta. O que pouco foi debatido desde então publicamente por movimentos ligados à educação – embora a pedagogia seja uma permanente pauta de debates (até acalorados) e de militância, como bem mostram os movimentos de ocupação de escolas públicas que há pouco mais de um ano tomaram conta do País, principalmente em oposição ao projeto Escola Sem Partido – é como outros modelos da educação, como a filosofia do Ubuntu, pode auxiliar a cultura da paz nas escolas e servir como referencial teórico para o debate sobre a criação de novos paradigmas pedagógicos. Mestre em História Social pela PUC-SP, a professora Joelza Ester Domingues toca neste espinhoso (mas necessário) assunto para explicar como é fundamental a sociedade civil se abrir para contribuições de uma nova maneira de educar que repense o atual modelo de formar indivíduos para o mercado de trabalho, em vez de investir na formação de valores que são a base do viver humano. Uma nova maneira de educar tão necessária em tempos nos quais dominam a pauta pública da educação questões tão complexas como o incentivo à competição acadêmica e profissional (e não à cooperação), a violência nos colégios e no seu entorno, a ausência de uma cultura de incentivo governamental, a falta de investimentos em uma educação pública de qualidade, o modelo único centrado na predominância da iniciativa privada, a carência de recursos (materiais e humanos) e a cultura do individualismo. JOELZA ESTER DOMINGUES
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buntu é uma palavra existente nas línguas zulu e xhosa, faladas na África do Sul, que exprime uma profunda consciência da relação entre o indivíduo e a comunidade. É, ao mesmo tempo, um conceito moral, uma filosofia e um modo de viver que se opõe ao
narcisismo e ao individualismo tão comuns em nossa sociedade ocidental capitalista. Enquanto a ideia europeia sobre a natureza humana baseia-se na ideia de liberdade, de que os indivíduos têm o poder da livre escolha, a ideia africana do Ubuntu repousa sobre a ideia da comunidade, de que pessoas dependem de outras pessoas para que sejam pessoas. Pode ser uma alternativa ecopolítica para uma convivência social e planetária pautada pelo altruísmo, pela fraternidade e pela colaboração entre os seres humanos.
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A jornalista e filósofa argentina, radicada no Brasil, Lia Diskin – durante o Festival Mundial da Paz, ocorrido em Florianópolis, em 2006 – contou o seguinte caso de uma tribo na África: Segundo a filosofia do Ubuntu, as pessoas não devem levar vantagem pessoal em detrimento do bem-estar do grupo. Para que uma pessoa seja feliz será necessário que todas as pessoas do grupo se sintam felizes. Estamos conectados uns com os outros e essa relação estende-se aos ancestrais e aos que ainda nascerão. Ubuntu é, assim, um sistema de crenças, uma ética coletiva e uma filosofia humanista e espiritual pautada pelos valores essenciais do ser humano, em estreita relação com o outro e a natureza, da qual somos parte. Do ponto de vista político, o conceito de Ubuntu é usado para enfatizar a necessidade da união e do consenso nas tomadas de decisão. É a síntese de um conhecido provérbio xhosa da África do Sul que diz o seguinte: “Umuntu Ngumuntu Ngabantu”, que significa: “Uma pessoa é uma pessoa por causa das outras pessoas”. VALOR DE PERTENCIMENTO A educadora sul-africana Dalene Swanson, professora da University of British Columbia, em Vancouver, Canadá, fala o seguinte a respeito do Ubuntu: “Diferentemente da filosofia ocidental derivada do racionalismo iluminista, o Ubuntu não coloca o indivíduo no centro de uma concepção do ser humano. Este é todo o sentido do Ubuntu e do humanismo africano. A pessoa só é humana
“Um antropólogo estava estudando os usos e costumes da tribo Ubuntu e, quando terminou seu trabalho, teve que esperar pelo transporte que o levaria até o aeroporto de volta para casa. Como tinha muito tempo ainda até o embarque, ele propôs, então, uma brincadeira para as crianças que achou ser inofensiva. Comprou uma porção de doces e guloseimas na cidade, colocou tudo em um cesto bem bonito com laço de fita e colocou debaixo de uma árvore. Aí, ele chamou as crianças e combinou que, quando ele dissesse ‘já!’, elas deveriam sair correndo até o cesto e a que chegasse primeiro ganharia todos os doces que estavam lá dentro.
As crianças se posicionaram na linha demarcatória que ele desenhou no chão e esperaram pelo sinal combinado. Quando ele disse ‘já!’, instantaneamente todas as crianças deram-se as mãos e saíram correndo em direção à árvore com o cesto. Chegando lá, começaram a distribuir os doces entre si e a comerem felizes. O antropólogo foi ao encontro delas e perguntou por que elas tinham ido todas juntas, se uma só poderia ficar com tudo o que havia no cesto e, assim, ganhar muito mais doces. Elas simplesmente responderam: – Ubuntu, tio. Como uma de nós poderia ficar feliz, se todas as outras estivessem tristes? Ele ficou pasmo. Meses e meses trabalhando nisso, estudando a tribo e ainda não havia compreendido, de verdade, a essência daquele povo. Ou jamais teria proposto uma competição, certo? Ubuntu significa: “eu sou porque nós somos” ou, em outras palavras, “eu só existo porque nós existimos”. “Como uma de nós poderia ficar feliz, se todas as outras estivessem tristes?”. A resposta singela da criança é profunda e vital, pois está carregada de valores como respeito, cortesia, solidariedade, compaixão, generosidade, confiança – enfim, tudo aquilo que nos torna humanos e garante uma convivência harmoniosa em sociedade”.
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Justin Ide/HPAC
Ao ser questionada em torno de quais aspectos o Ubuntu poderia contribuir para a ética ocidental, Dalene Swanson respondeu: “Vivemos em uma era de globalização econômica profundamente perturbadora. Nossas pautas de desenvolvimento foram sequestradas por esse modelo econômico que se apresenta como a forma ‘certa’ ou única de promover o desenvolvimento. Moldado por relações capitalistas de produção, esse modelo é subscrito pelo materialismo, pelo individualismo e pela competição e normaliza uma elite rica sobre os pobres privados de direitos. Para se maximizarem os lucros, pensa-se que algo tem de ser explorado. Em termos ecológicos, também inclui a devastação do meio ambiente em sua esteira”.
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“Se você acha que a educação é cara, experimente a ignorância” (Derek Bok)
mediante o seu pertencimento a um coletivo humano. A humanidade de uma pessoa é definida por intermédio da sua humanidade para com os outros. O valor de sua humanidade está diretamente relacionado à forma como ela apoia ativamente a humanidade e a dignidade dos outros. A humanidade de uma pessoa é definida pelo seu compromisso ético com sua irmã e seu irmão”.
A seguir, Dalene Swanson continua: “Visto que o princípio central do Ubuntu é o respeito mútuo, ele está em consonância com a epistemologia africana de modo mais geral, que é circular em sua compreensão e, consequentemente, está mais em harmonia ecológica com a Terra do que a epistemologia do racionalismo ocidental, que é linear, exploradora e insustentável. O Ubuntu, como contribuição para uma filosofia nativa, é uma expressão viva de uma alternativa ecopolítica. Em um mundo crescentemente movido à vigilância, o futuro dos direitos humanos (e ecológicos), da dignidade humana e da sobrevivência de nosso planeta, em termos amplos, depende de noções filosóficas e ideológicas nativas como o Ubuntu”.
Fonte: <http://www.ensinarhistoriajoelza.com.br/ubuntu-o-que-aafrica-tem-a-nos-ensinar/> (com adaptações).
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Especial: Educação
UMA ALEGORIA DA CONDIÇÃO
HUMANA Em 2011, o cineasta americano Tom Shadyac, conhecido por dirigir diversas comédias, passou por uma experiência traumática, que o fez repensar sua vida e seus valores. Sua reflexão o levou a dirigir um documentário chamado “I Am”. O filme apresenta diversos depoimentos de filósofos, cientistas, religiosos, artistas, agnósticos e pessoas que passaram por situaçõeslimite e receberam notáveis ensinamentos a partir de suas experiências. O documentário fundamenta-se nessas entrevistas e nas reflexões de Tom Shadyac e é norteado por uma pergunta-síntese: “qual é o sentido da vida para você?”. Em determinado trecho do filme, Tom Shadyac narra uma alegoria que não só é um espelho da condição humana no nosso planeta, mas também é uma narrativa que tem muito a dizer a respeito dos paradigmas atuais da educação na nossa civilização. TOM SHADYAC
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is uma história verídica para mostrar em quem nos tornamos. Era uma vez uma tribo de nativos que vivia em paz e harmonia há milhares de anos e, todos os dias, a rotina era a mesma. Os caçadores afastavam-se da tribo e, quando regressavam, o resultado da caça era partilhado em partes iguais por todos os membros. Quando havia comida, ninguém passava fome, nem os mais fracos, nem os doentes, nem os mais velhos. Um dia, o caçador mais experiente disse: ‘Eu sou o melhor caçador. Eu mato mais antílopes do que deveria. Por que devo partilhar o resultado da minha caçada?’. E, desse dia em diante, começou a armazenar a carne numa gruta na montanha. Outros caçadores também disseram: ‘Nós também matamos mais antílopes do que deveríamos. Não temos o direito de ficar com o resultado da nossa caçada?’. Então, também eles começaram
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a armazenar carne em grutas na montanha. Depois, na tribo, começou a acontecer algo que nunca havia acontecido. Alguns, principalmente os velhos, os fracos e os doentes começaram a passar fome, enquanto outros estavam bem alimentados. Aliás, isso passou a ser tão comum que ninguém achou estranho o fato de alguns passarem fome e outros terem mais do que precisavam. Todavia, o mais estra-
nho é que os anciãos da tribo começaram a ensinar os mais novos a imitar esses hábitos egoístas. Esta história não é verídica por ter acontecido: é verídica porque está acontecendo. Nós somos essa tribo. Eu faço parte dessa tribo. A natureza é muito clara nisso. Aliás, há uma lei fundamental à qual toda a natureza obedece e que a humanidade desrespeita todos os dias. É uma lei que se desenvolveu ao longo de bilhões de anos, que é: nada na natureza absorve mais do que precisa. Mas, se isso acontecer, sujeita-se a essa lei e acaba por morrer. Um oceano, uma floresta tropical, o corpo humano, todos são estruturas cooperativas. Uma sequoia não absorve todos os nutrientes do solo, pois só absorve aquilo do que precisa para crescer. O leão não mata todas as gazelas, mata apenas uma. Existe um termo criado para algo no corpo quando ele absorve mais do que deve. Nós o chamamos de “câncer”. Fonte: “I Am”. Direção: Tom Shadyac. Shady Acres Entertainment. Produção: Flying Eye Produtions e Homemade Canvas Production (Dagan Handy e Jacquelyn Zampella). [S.l.]: EUA, 2011. 75 min. Som e cor. Formato: digital.
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Especial: Educação
A FALTA DE UMA PEDAGOGIA VOLTADA PARA OS VALORES Em 1972, o israelense Haim Ginott, educador, psicólogo infantil, psicoterapeuta e educador de pais, publicou em seu livro “Teacher and Child” um trecho de uma carta, dirigida aos educadores de uma forma geral, escrita por um sobrevivente do holocausto, encontrada em um campo de concentração nazista. A narrativa evidencia como pode ser destrutiva uma educação que não tem, como base de sua sustentação conceitual, a formação dos valores essenciais do indivíduo. HAIM GINOTT
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rezado professor, sou sobrevivente de um campo de concentração. Meus olhos viram o que nenhuma pessoa deveria testemunhar: câmaras de gás construídas por engenheiros formados e cultos. Crianças envenenadas por médicos diplomados. Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês fuzilados e incinerados por graduados de colégios e universidades. Assim, tenho minhas suspeitas sobre a educação. Meu pedido é: ajude seus alunos a se tornarem humanos. Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados, psicopatas hábeis ou Eichmanns educados [referência ao comandante nazista Adolf Eichmann, um dos principais responsáveis pelas deportações em massa de prisioneiros e o grande idealizador da logística e da engenharia dos campos de extermínio]. A leitura, a escrita e a aritmética são importantes apenas se servirem para tornar nossas crianças mais humanas.
“Não é desejável cultivar o respeito às leis no mesmo nível do respeito aos direitos” (Henry David Thoreau)
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Melhor
Fonte: <http://acervodeprofessor.blogspot.com.br/2012/11/cartadirigida-professores-encontrada.html>.
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“A importância da educação já foi compreendida, mas cérebros brilhantes também podem produzir grandes sofrimentos. É preciso educar os corações” (Dalai Lama)
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PARA A VIDA
TARTHANG TULKU
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instabilidade é a essência da nossa condição humana. Ela controla muito mais do que simplesmente as nossas vidas: influencia todo o cosmos – todas as estrelas e os planetas, bem como o nosso meio terrestre. Podemos ver os efeitos da instabilidade observando a ascensão e a queda das nações, da nossa sociedade e até do mercado de ações. A instabilidade impregna toda a existência. Podemos observar as mudanças em nossa vida e na vida de nossos amigos e famílias, mas a mudança mais devastadora da vida humana – a morte – está sempre nos pegando de surpresa.
Nesta sociedade, quase toda a gente tem medo da morte – mas, para apreciar plenamente a vida, precisamos enfrentar a realidade. A instabilidade e a morte são artes integrantes do estar vivo; essa realização pode vibrar dentro de nós e despertar-nos. Vemos que, embora as nossas vidas nos sejam muito caras, não duram para sempre. Nascer como ser humano é privilégio muito raro, e é importante que apreciemos nossas vidas e tiremos proveito dessa oportunidade.
Com a compreensão da instabilidade, muitos aspectos da vida que comumente achamos fascinantes já nos parecem menos atraentes. Tornamo-nos capazes de ver através deles e descobrimos que, na realidade, não são tão satisfatórios. Podemos, então, mais facilmente largar nossos apegos e medos, assim como a nossa pequena casca de proteção. Pensar na instabilidade da vida nos desperta. Damo-nos conta de que, neste exato momento, estamos de fato vivos! Ainda assim há luta, pois nos vemos desejando coisas que sabemos capazes de causar-nos dor ou frustração. Nossos padrões de hábitos são muito difíceis de quebrar e, quando o tentamos, sempre parecem surgir obstáculos. Nossos desejos e apegos nos induzem a repetir os mesmos obstáculos. Nossos desejos e apegos nos induzem a repetir os mesmos modelos destrutivos. Nossas necessidades emocionais não somente nos habituaram às coisas materiais, mas também, muito sutilmente, à nossa autoidentidade. Não desejamos perder nosso sentido de controle sobre nós mesmos, sobre o nosso meio e até sobre outras pessoas. Mas enquanto não nos soltarmos de nossos apegos à personalidade e à autoimagem, será difícil até ver esses padrões de vida, quanto mais mudá-los.
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Espiritualidade
A IMPORTÂNCIA DO EQUILÍBRIO
Porque existem certas atitudes e preferências de que gostamos de largar, envolvemo-nos em situações difíceis e experimentamos conflitos interiores. Às vezes, renunciamos a coisas importantes – nosso dinheiro, nosso lar, nossas propriedades – sem muita dificuldade. Mas os apegos emocionais – tais como o elogio e a censura, o ganho e a perda, o prazer e a dor, as palavras bondosas e as ásperas – são muito sutis. Estão além do nível físico. Existem na personalidade ou na autoimagem e não estamos dispostos a deixá-los partir. Temos também certas atitudes e preconceitos, geralmente escondidos, de que não gostamos nem sequer de tomar conhecimento. Nossos apegos exercem uma influência magnética, que nos retém num lugar como se estivéssemos na prisão. É difícil dizer se essa força controladora provém de nossos atos passados, do nosso medo da morte ou de alguma origem desconhecida. O fato é que não podemos nos mover e, assim, toda a sorte de frustrações e conflitos nos ataca, criando mais frustração e mais sofrimento.
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As pessoas estão dispostas a ir para a guerra e até a renunciar à vida por uma causa, mas não conseguem renunciar às causas do seu sofrimento. É um mistério o modo com que certas fixações psicológicas nos dominam com tanta força que não podemos abnegar delas. Até quando compreendemos intelectualmente o sofrimento que elas trazem consigo? Perguntamos a nós mesmos: “por que acontece isso?”. Por que precisamos aferrar-nos com tamanha firmeza a esses padrões e hábitos, a essas atitudes, a essa determinada autoimagem? Podemos observar cuidadosamente nossos padrões de vida e até podemos vir a aceitar a maneira como os mais sutis apegos e negatividades nos causam sofrimento. À proporção que crescem nossa compreensão e nossa percepção, vemos a importância de trabalhar com as nossas emoções, os apegos e as negatividades e vemos também que a solução final vem de dentro. Nesse momento, em que de fato despertamos para a nossa penosa condição, começamos a mudar nossas atitudes mais íntimas e pode operar-se algum progresso verdadeiro. Embora frequentemente seja difícil reconhecer o que é saudável ou íntegro, porque o nosso ambiente e a nossa experiência diária são tão artificiais, quando finalmente decidimos agir de maneira saudável e equilibrada, nossas vidas caem naturalmente nesse novo padrão. Não precisamos sequer deixar nossos lares e famílias para efetuar tais mudanças, pois as mudanças estão dentro de nós. Talvez decidamos percorrer um caminho de desenvolvimento interior, mas titubeamos, sentindo que precisamos primeiro terminar o nosso trabalho, depois abandonaremos nosso emprego ou posição e só depois praticaremos. E, no fim, simplesmente nunca chegamos a fazer nada disso. Podemos ter muitos sonhos bonitos, embora realizemos muito poucos em toda a nossa vida espiritual ou material. Em toda parte do mundo, as pessoas passam a vida sonhando em
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desenvolver-se espiritualmente, sem jamais fazer muita coisa nesse sentido. Neste país, sobretudo, é preciso muita força de vontade para que alguém se desenvolva interiormente. Somos apanhados na competição pelas vastas reservas não exploradas de poder que a tecnologia moderna colocou à nossa disposição. Nós vivemos sob intensa pressão para nos conformarmos com as regras e as restrições da nossa sociedade urbana “civilizada”. A estrutura está organizada de tal maneira que, se não nos conformarmos, nos será difícil sobreviver. Assim, muitos de nós nos sentimos constrangidos, embora sejam poucas as pessoas capazes de tornar a decisão de mudar suas vidas e menos ainda os que têm o poder de fazê-lo. No entanto, quando seguimos apenas um caminho material, vivenciamos finalmente uma espécie de vazio espiritual que não podemos ignorar para sempre. Quando começamos a mudar, é difícil voltar ao nosso modo de vida antigo, ainda que o desejemos. Alguma coisa despertou dentro de nós, e a força positiva da mudança cria um momentum que nos impele a continuar. Descobrimos, então, o que o caminho espiritual está justamente aqui, seja o que for que estejamos fazendo. Podemos não ter sido capazes de percorrer o caminho deliberadamente; por isso, o caminho veio até nós. E acreditar nisso faz parte do caminho em nós. Fonte: “Gestos de Equilíbrio”, de Tarthang Tulku. Editora Pensamento, São Paulo, 1999 (com adaptações).
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por um mundo
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