Eugénio de Andrade. José Rodrigues - RETRATO DE UMA AMIZADE

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12 dezembro 2015 P 1 27— fevereiro 2016

Curadoria

Graça Martins Maria Bochicchio

Eugénio de Andrade/ José Rodrigues

Retrato de Uma amizade

EUGÉNIO DE ANDRADE/ JOSÉ RODRIGUES RETRATO DE UMA AMIZADE


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Eugénio de Andrade/ José Rodrigues Retrato de Uma amizade


Esta exposição, co-produzida pela Fábrica Social - Fundação Escultor José Rodrigues e pela Câmara Municipal do Porto, tenta desenhar os traços de uma amizade pensada na pluralidade de pessoas, factos poéticos, lugares de intimidade, vida transfigurada em arte, prestando, deste modo, homenagem ao poeta Eugénio de Andrade, por ocasião do décimo aniversário da sua morte. O significado excepcional desta co-produção resulta de se mostrar,

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pela primeira vez, o acervo artístico e literário de Eugénio de Andrade, incluindo poemas inéditos da colecção de Dario Gonçalves, correspondência da proveniência mais diversa, destacando-se a colecção de postais, euforicamente desenhados por José Rodrigues. Escolhemos incluir, também, objectos do quotidiano de Eugénio de Andrade porque é difícil resistir a dotar o poeta de alguma biografia visível, suspeitando, no entanto, que cada objecto lhe confere uma identidade entre biografia e mito.

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O que define os contornos de um rosto, quando este é o rosto de eugénio de andrade? A resposta imediata reside na sua poesia; porém, advém igualmente do diálogo que com ele travaram outras escritas, assim como esboços, pinturas, esculturas e manifestações que se cruzaram plasticamente com as palavras e os afectos.


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Anos de Aprendizagem

Fragmento para uma arte poética

Eugénio de Andrade não recebeu formação superior, especificamente literária ou outra, mas começou, ainda muito jovem, a frequentar, como «diletante de grande classe», a mais ilustre tradição poética portuguesa. Leu, desde cedo, os grandes nomes da poesia europeia. Sem contar os de língua inglesa, que adiante serão referidos, leu Novalis, Hoelderlin, Baudelaire, Mallarmé, Rimbaud, Apollinaire, António Machado, Ungaretti, Paul Éluard, René Char, Rilke, Kafka, Kavafis, Lorca e, entre os orientais, Bashô e Lao Tsé. Shakespeare e Shelley são referências muito antigas (cfr. a epígrafe e o poema XXV de As Mãos e os Frutos), e outros virão a ser referência ou alusão incorporadas no próprio texto dos poemas. Não devemos minimizar as influências de Cecília Meireles e da poesia brasileira que, por volta dos anos 40, era muito lida em Portugal. Eugénio de Andrade teve também contactos pessoais importantes com outros nomes da literatura francesa, nomeadamente Marguerite Yourcenar, Guillevic e Alain Bosquet, e da espanhola (Vicente Aleixandre, por exemplo). Foi um bom conhecedor do património poético e filosófico das literaturas clássicas e senhor de uma grande cultura literária e artística. João de Mancelos, que tem estudado minuciosamente as relações de intertextualidade de Eugénio, evidenciando relações até há pouco insuspeitadas, com a poesia de língua inglesa, salienta, entre as vozes canónicas desta, «de ambos os lados do Atlântico, que ecoam e rumorejam na obra de Eugénio», Shakespeare, Blake, Shelley, Keats, Melville, Whitman, Yeats, Wallace Stevens, Eliot e Dylan Thomas. E podemos acrescentar, pelo menos, W. H. Auden. As obras destes e de muitos outros autores foram as grandes companhias da sua vida.

Eugénio de Andrade questiona e desafia os códigos oficiais de leitura e interpretação da realidade. Na sua escrita, a memória e os símbolos, as emoções e as referências culturais, as circunstâncias vividas vão sendo entrelaçados por acção de uma palavra que convida o leitor a reencontrar-se e a reconhecer-se num imaginário poético que refaz o mundo. A arte poética de Eugénio de Andrade não se reconduz a nenhuma espécie de teoria do fingimento e das suas dialécticas, mas antes ao funcionamento de uma sinceridade mascarada pelo recurso sistemático à metáfora e à metonímia para uma permanente e obsessiva «confissão» pessoal, em que os dados e as emoções do mundo interior são verbalizados por transposição mais ou menos codificada e analógica - pela forma, pela cor, pelo paladar, pelo cheiro, pelo tacto - de elementos ou parte do corpo ou aspectos ligados ao seu funcionamento, para uma paleta lexical em que o poeta procura correspondências morfológicas ou metamorfoses de uma coisa nas outras. Isto pode ser relacionado com um facto biográfico importante.

Maria Bochicchio


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Manuscritos e Dactiloscritos de Eugénio de Andrade Colecção Biblioteca Pública Municipal do Porto.

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Fábrica Poética A orelha de Vincent. 1990. Várias versões. Colecção Biblioteca Pública Municipal do Porto.

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Os Cadernos de Eugénio de Andrade 1.Coração habitado: manuscrito. Julho 1954. Poemas incluídos em Até amanhã de 1956. 2.Mar de setembro: manuscrito. Não posterior a 1961. 3.Ofício de paciência: manuscrito. 1993. Inclui versões dos poemas Acordes, Harmónio e Coroa de lume. Colecção Biblioteca Pública Municipal do Porto.

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Manuscritos e Dactiloscritos de Eugénio De Andrade Entre o rasurado, o abandonado e o inédito. Colecção Dario Gonçalves

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No poeta coexiste uma particular combinação de forma e matéria, de espiritualidade e animalidade, de «carne e de sentidos» e o canto deveria ser uma ressonância ou uma vibração do corpo todo, como se os seres humanos fossem animais poéticos, porque suas as faculdades instintivas arrancam do entrelaçar de desejo e imaginação. O problema das artes poéticas de Eugénio de Andrade é que, por vezes, elas dificilmente se cingem à matéria de que se esperaria tratassem. O vício da metáfora corrompe os enunciados. Declarando enfaticamente no seu texto Poética que «o acto poético é o empenho total do ser para a sua revelação», o que não vai sem conotações pós-simbolistas, Eugénio de Andrade vê o homem como «animal triste que nos habita há milhares de anos […] fruto de uma desfiguração – acção de uma cultura mais interessada em ocultar ao homem o seu rosto do que trazê-lo, belo e tenebroso», e também como «animal de palavras». Esse animal de palavras vive uma pulsão motora, uma vertigem de identificação com os seres da natureza, um dinamismo que o habita, no arranque do voo poético e na escolha dos vocábulos, na economia e inventividade da sua distribuição, na estratégia, agilidade e versatilidade do movimento de um ritmo ao outro, de poema para poema. Eugénio de Andrade abandona-se a uma espécie de vitalismo instintivo que o faz sentirse parte do todo, da circularidade da vida, das tensões e da ciclicidade da natureza. Por uma relação metonímica, as “folhas breves” que somos, além das da vegetação onde dormem as “aves de sombra e solidão”, podem ser as páginas

O corpo e a escrita – e nesta vários campos semânticos se sobrepõem – confundem-se e identificam-se com um primitivo universo rural para depois se amalgamarem num composto verbal e poético. O autor opera, por um lado, uma dissolução do «eu», incrustando-se na sugestão das sensações do seu universo natural:

Deixa-me só, vegetal e só.

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Somos folhas breves onde dormem Aves de sombra e solidão. Somos só folhas e o seu rumor. Inseguros, incapazes de ser flor, Até a brisa nos perturba e faz tremer. Por isso a cada gesto que fazemos Cada ave se transforma noutro ser.

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O Schubert morreu [...]. Vai fazer-me falta, todas as manhãs acordava com ele a cantar. Era fabuloso: cantava com o corpo todo. Assim devia ser o poeta, pensava eu às vezes farto de tanto discurso onde o espírito assomava. Mas entre homem e pássaros há pelo menos esta diferença: um pássaro quando canta desce vertiginosamente à raiz; o homem, esse é muito raro que o ardor das vogais lhe queime a cintura.

onde se acolhe a escrita (também de sombra e solidão) e onde ocorre a trémula metamorfose do rumor e das aves no poema:

Por outro lado, define-se como criança, com tudo o que isso implica de inocência e de abertura espontânea ao real, o que favorece assim uma expressão artística com tanto de ingénuo como de surpreendente e provocatório. O revelar-se da infância ou da préadolescência («acordo às vezes com doze ou treze anos»), no signo de um renovado pasmo primigénio, através da memória voluntária e involuntária, tão cara a Proust, de um homem amargo, que constata objectivamente que o mundo existe («graças ao laço inextricável entre o adulto que lembra e a criança que é lembrada») permite-lhe mover-se «não só no interior da escrita», mas também na sua realidade pessoal, tornando-se um grande intérprete da modernidade novecentista e, como sublinha Carlo Vittorio Cattaneo, um xamã, de cada vez que recorre ao ofício poético para lembrar um tempo biográfico que transforma num tempo mítico. Maria Bochicchio

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A identidade entre biografia e mito


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Eugènio de Andrade Objectos do quotidiano Colecção Dario Gonçalves

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Do nome civil ao pseudónimo Eugénio de Andrade é um poeta quase sem biografia. Viveu uma vida discreta, caracterizada por uma solidão continuamente procurada e defendida. Habitou cidades como Castelo Branco, Lisboa, Coimbra e Porto. Sentiu-se sempre profundamente ligado ao lugar onde nasceu, Póvoa de Atalaia (Beira Baixa), e onde residiu até aos sete anos: «foi importante ter nascido numa pequena povoação do sul com grandes espaços abertos à poeira dos rebanhos […] ter sentido o ardor do vento e o cheiro da cal”. As suas raízes mergulham num universo rural e elementar, que ele celebrou nos seus textos e à qual dedica, algo tardiamente, em Escrita da Terra (1974), quatro poemas explícitos. A produção poética de José Fontinhas (nome civil de Eugénio de Andrade, que identificava o funcionário dos serviços médicosociais), nascido a 19 de Janeiro de 1923, estende-se ao longo de mais de seis décadas de vida literária do século XX, e até para aquém deste, isto é, desde 1939, ano em que, estimulado por António Botto, publica numa plaquette o poema «Narciso», ainda sob o seu nome civil, até ao último trabalho poético, Os Sulcos da Sede, que saiu em 2001. Passa a assinar Eugénio de Andrade logo nos livros que se seguiram àquela primeira publicação, Adolescente (1942) e Pureza (1945). Em As Mãos e os Frutos (1948), primeiro livro a constar da bibliografia oficial do autor, e por sinal um livro fundamental da poesia portuguesa do século XX, o poeta surge já perfeitamente senhor de um estilo muito pessoal e de uma voz inconfundível. A sua não muito vasta produção poética – uma escassa vintena de livros em mais de sessenta anos – define-se pela brevidade dos textos e dos poemas, que traduzem o rigor e o gosto de uma depuração muito exigente, e é caracterizada pela expressão de um lirismo muito puro, instintivamente ligado ao mundo da carne e dos sentidos e que pretende reconciliar-nos «com a natureza […] com o nosso corpo e com o corpo social». Incluem-se também na sua produção textos de prosa, contos para crianças. Eugénio de Andrade é um poeta não enquadrável em escolas ou correntes e nunca se quis representante de quaisquer

tendências ou movimentos: «nunca pertenci a nenhum grupo literário; não frequento tertúlias [...] não pertenço a Academias; não faço da poesia uma carreira; não frequento os homens de letras (et les putains, diria Claudel)». Próximo das individualidades poéticas envolvidas ou conotadas com os Cadernos de Poesia, entre as quais cumpre destacar Tomaz Kim, Ruy Cinatti e Sophia de Mello Breyner Andresen, Eugénio de Andrade surge num contexto cultural e literário de profunda crise do Modernismo e de fundas tensões entre o presencismo e o neo-realismo. A sua fixação em Coimbra permite-lhe privar com autores como o Torga dos primeiros volumes do Diário e o Carlos de Oliveira de Turismo (1942) e da Mãe Pobre (1945), que já então se definiam por uma relação com o mundo que não era nem romântica, nem simbolista, nem saudosista, nem presencista, e por uma busca da justeza poética, da contenção e do rigor, ao serviço de um novo sentido de ligação à terra e à natureza. A voz destes poetas, sem que eles reneguem um conjunto de aspectos ligados à tradição formal, faz-se ouvir como inovadora dentro do quadro de preocupações distintas de cada um. A eles se contrapõe a lírica formalmente mais áspera, mais empenhadamente angustiada e mais «vanguardista» no seu versilibrismo, de Adolfo Casais Monteiro (Canto da Nossa Agonia, 1941; Noite Aberta aos Quatro Ventos, 1943; Europa, 1946), e a eles virá a juntar-se, na década de 1940, Sophia de Mello Breyner Andresen (Poesia, 1944), cuja voz é inicialmente modelada por certa influência de Pascoaes e pela leitura de Rainer Marie Rilke, a que virão a agregar-se uma grande fascinação pela cultura grega clássica, um sentido pagão de religação a presenças, a paisagens e a forças elementares, e uma busca do equilíbrio na identificação com um mundo em que Mediterrâneo e Atlântico virão a combinarse. É neste quadro de tensões, realizações literárias, e também de fascinações, que Eugénio de Andrade publica As Mãos e os Frutos em 1948, com uma epígrafe de Shakespeare cuja escolha é significativa: «Let thy blood be thy direction till thy death». A partir desses anos, Eugénio de Andrade, atravessa a segunda metade do século XX, fiel ao seu

propósito inicial da busca de uma inalcançável perfeição, sem perder de vista a evolução das poéticas do seu tempo. E assim, conseguindo manter a plena autonomia da sua própria produção lírica, foi sensível ao influxo das mais importantes tendências literárias que caracterizam o século passado a partir do simbolismo e da sua vibração musical em Camilo Pessanha, estando também em certa sintonia com o neo-barroco da poesia espanhola, em particular da geração de 27, e ligando-se ainda a temas e motivos sacados do depósito das culturas clássicas e da lírica medieval, cujos ecos são frequentes ao longo da sua obra. Diga-se a tal respeito que a «Canção» com que abre a série dos «Primeiros Poemas» que veio a incluir na sua poesia reunida, reelabora uma curiosa forma paralelística inspirada nos cancioneiros medievais. Maria Bochicchio


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Ut Pictura Poesis, sabia-o Eugénio. Num tempo em que se confunde Arte com Ciência e Ciência com Arte, em que se procura justificar tudo, mesmo o que não tem justificação em parâmetros que só a humanidade comporta, aqui está esta oportuníssima Exposição evocativa de Eugenio de Andrade. Pois, que as ciências que não são das humanidades, não tratem nem tenham origem na mesma pessoa, mas que se confundam procedimentos e se ludibriem valores e sentidos, não é de todo aceitável. O que é a amizade, nenhuma ciência, nem nenhuma arte, podem alguma vez explicar cabalmente a sua dimensão, o seu alcance! Ora, esta exposição mostra-nos na Fundação José Rodrigues, um testemunho de uma amizade entre o patrono da Fundação e um dos poetas maiores da valiosa Poesia Portuguesa, Eugénio de Andrade. Através de uma criteriosa, amadurecida e inteligente leitura iconográfica de objectos dessa relação, nesta exposição muito bem comissariada por Maria Bochicchio e Graça Martins, viajamos com os olhos e o coração por entre lugares que o poeta construiu, ladeados pela sua colecção de pintura, entre os seus retratos e as outras pinturas que lhe serviram de companhia na vida e por isso também retrato, espelho também de si. Desenhando uma linha nos topos da sala, memórias fotográficas de tantos encontros, registam a história que se quer mostrar com eloquentes silêncios, que depois melhor ainda se compreendem nos objectos pinturas que se destacam e nos atraem, pelo seu valor intrínseco. Porquê? Ut Pictura Poesis sabia-o Eugénio, sensibilissimo à inteligência selectiva de qualquer encontro, repercussão de sentido criativo que lhe pudera interessar. Elegante e cautelosamente, prospectivamente se sabe o alcance de um encontro com um criador que lhe mereça respeito, admiração, confiança ou amizade. Está aqui dita a história desta colecção, quer de retratos, quer de pinturas que o acompanharam e que ele muito estimava profundamente. Uma só ou várias razões juntas, poderiam reclamar-se na avaliação da inteligência e sentido de oportunidade que cada objecto haveria de impor para existir.

Se não importa tanto significativa e criteriosa dimensão dos autores dos retratos que são neste documento devidamente identificados, importa saber o valor da sua qualidade plástica que, para Eugénio, não era menos relevante que o a da amizade. Assim, sentindo-se ele revisto nessa miragem, que constituiria halo e tributo a essa arte que ele muito bem sabia e sentia, a pintura, e de que nos legou brilhantes testemunhos, nomes de primeiro plano das Artes Plásticas Portuguesas lhe dedicaram a atenção ao culto da sua personalidade que admiravam, como muitos, mas que a eles não lhes estava negado o acesso ao tratamento de uma máscara, retrato que o tempo futuro haveria de recriar no duplo lugar e testemunho maior do retratado e de quem retratou. Em ultima instancia, um retrato é sempre um duplo retrato. Olhe-mo-lo sempre assim. Francisco Laranjo


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Artur Bual Óleo sobre tela, 1990 Dimensões 77 X 58

Emerenciano Técnica mista , 1988 Dimensões 55,5 X 45,5

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José Rodrigues Lápis sobre papel,1969-1971 Dimensões 68,5 X 53

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Júlio Pomar
 Tinta da china sobre papel, 1951 Dimensões 91,5 X 73,5

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Lagoa Henriques Carvão sobre papel,Fão 1963 Dimensões 93 X 76 cm

Eugénio de Andrade/ José Rodrigues

Lagoa Henriques
 Carvão sobre papel, 1968 Dimensões 101x71

Carlos Amado Lápis sobre papel, 1984 Dimensões 53 X 40,5

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Carlos Carneiro
 Lápis sobre papel, 1953 Dimensões 48,5 X 40,5

José Rodrigues Lápis sobre papel, 1978 Dimensões 78,5 X 68

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Graça Martins
 desenho a guache, 1987 Dimensões 40x30

Graça Martins Aguarela sobre papel, 1979 Dimensões 50 X 32


Augusto Gomes
 tinta da china sobre papel, 1953 Dimensões 56,5x46.5

Dórdio Gomes
 tinta da china sobre papel, 1969 Dimensões 60x52

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Júlio Resende 
 Óleo sobre tela, 1993 Dimensões 119,5 X 92,5

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Júlio Resende Tinta da china sobre papel, 1985 Dimensões 92,5 X 77

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Martins Correia
 carvão e pastel sobre papel, 1959 Dimensões 91,5x73,5

Fernando Lanhas
 Tinta da china sobre papel, 1987 Dimensões 120 X 89,5

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Jorge Ulisses Tinta da china sobre papel, 1980 Dimensões 76,5 X 76,5


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Correspondência As referências literárias da poesia universal são um elemento muito importante na escrita de de Eugénio de Andrade: uma discreta, mas permanente e segura relação de prática intertextual, quando não um diálogo feito de surpresas inteligentes e sensíveis em que se espelham referências a obras alheias ou aos seus autores, de que vale a pena destacar alguma da sua correspondência com importantes figuras do século XX, portuguesas e estrangeiras.

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4 — Carta de Mário Cesariny, 1968 maio 1: manuscrito autógrafo.

6 — Bilhete de Óscar Lopes: manuscrito autógrafo. 198-. Inclui os poemas Terra molhada e Porque te conheço, ambos dactilografados com emendas.

3 — Carta de Jean Cocteau para Eugénio de Andrade, 1951 agosto 29: manuscrito autógrafo.

13 Postal ilustrado de Sofia de Melo Breyner Andresen: manuscrito autógrafo.

12 2Carta de Carlos Drummond de Andrade para Eugénio de Andrade, 1952 março 12:

9 5 — Carta de Sofia de Melo Breyner Andresen, 1956: manuscrito autógrafo.

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9 — Carta de Ilse Losa: dactiloscrito assinado. Traduz os versos de Goethe, Niemand soll und wird es schauen

8 — Postal ilustrado de Sofia de Melo Breyner Andresen: manuscrito autógrafo.

7 — Carta de Herberto Helder, 1978 abril 25: fotocópia.

Colecção Biblioteca Pública Municipal do Porto.

14 — Carta de António Ramos Rosa, 1952 janeiro 2: manuscrito autógrafo.

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13 — Carta de Mário Botas, 1980 novembro 25: manuscrito autógrafo.

12 — Bilhete de Miguel Torga, 1958 novembro 5: dactiloscrito assinado.

11 — Carta de Luís Miguel Nava, dactiloscrito assinado.

10 — Carta de Teixeira de Pascoais, 1949 maio 13: manuscrito autógrafo

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1 — Carta de José Régio, 1959 fevereiro 5: manuscrito autógrafo.

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José Rodrigues O retrato de um artista é a sua obra e a sua obra é o seu rosto Autor de uma vasta obra nos domínios da escultura e do desenho, mas também da medalhística, da cerâmica, da ilustração e da cenografia, José Rodrigues atravessou fases de experimentação e momentos de puro virtuosismo, aguentou a pressão de muitas encomendas – a que continua a dar resposta – não recusou uma representação cultural activa nas mais diversas situações e enfrentou reparos generalizados a um narcisismo invasor e críticas a um alegado comodismo assente em modelos já ensaiados, repetidos de cor, a que começaria a faltar alguma alma. José Rodrigues distanciou-se dessa suposta sobranceria com a autoridade que lhe vem do domínio inegável de tantas técnicas, da imensa facilidade plástica com que submete os materiais, do incomparável talento para manobrar motivos e construir histórias. José Rodrigues renovou incontestavelmente a escultura em Portugal, evoluindo de situações de estaticidade para a criação de peças em movimento, do estatuto de escultura para o de objecto, para a justaposição de modos de actuar entre o desenho, a escultura e a instalação. Foram os anos 80 que lhe garantiram notoriedade fora dos círculos habituais da arte, com uma série de exposições em que abordou ciclos temáticos associados a figuras mitológicas. E do seio de uma obra inebriada de mitos e lendas saiu, na mais límpida lucidez, a denúncia vigorosa de uma guerra ou de todas as guerras, em séries de desenhos dos anos inaugurais do terceiro milénio. Seria quase inevitável que a substância humana da sua obra remetesse para uma ambivalência de sentidos, entre claridade e obscuridade, na diversidade de um trajecto artístico obrigatoriamente cruzado com o mundo em que vivemos. Em qualquer desses sentidos foi acentuada uma aura obsessiva e opulenta. Nada nunca foi frágil ou displicente; tudo foi grande, denso e poderoso. Uma parte significativa do seu trabalho foi e continua a ser uma dedicatória vigorosa ao erotismo e à sensualidade, inscritos em todos os corpos desenhados e esculpidos. Poetas e escritores solicitaram

os seus desenhos ao mesmo tempo que escreveram sobre eles. Eugénio de Andrade é uma das figuras com quem desenvolveu, ao longo do tempo, uma grande cumplicidade que motivaria os projectos conjuntos de que nos fala esta exposição. Os trabalhos destinados a esta colaboração, de uma manualidade precisa e de uma delicadeza intimista, que as circunstâncias exigem, não se alheiam da presença aguda que marca toda a produção de José Rodrigues. Laura Castro [Texto adaptado de “José Rodrigues: sinais de denúncia”. In O Sentimento Trágico da Vida. Porto: Edições ASA, 2003]


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Correspondência de José Rodrigues para Eugénio de Anrade

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Guardo recordações das muitas visitas que fiz ao Eugénio de Andrade, especialmente nos anos 80, quando ele ainda morava na rua Duque de Palmela. O Eugénio tinha acabado de se reformar e havia construído uma rotina, toda ela comandada pela sua única razão de viver: a poesia. Em geral encontrávamo-nos a seguir ao almoço. Os pontos de encontro sucederam-se; lembro-me especialmente dos Cafés Duque e Cifrão. Ele passava a manhã a trabalhar e esta saída era um lugar ritualizado nas suas rotinas. A seguir ao café, íamos até sua casa, onde continuávamos a conversa; ao fim de algum tempo, ele dizia-me que precisava de voltar para o trabalho dos seus versos. O parcimonioso aconchego do minúsculo apartamento, onde viveu tantos anos, espelhava o mundo que

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Carlos Mendes de Sousa

ele construíra. No espírito ordenado do lugar estavam contidas as casas que miticamente celebrizou na sua poética: a casa do Adro, a casa da Eira. Quando fui à terra do Eugénio, percebi como ele havia transportado para o lar luminoso e lúcido as casas da infância. Como na poesia, sempre ardia “o verão dentro da casa”, sempre na mesa a presença das estações: os frutos e as flores, pequenas coisas da terra. (…) Bateu-se por uma poesia luminosa onde se sentisse vibrar o coração vivo da natureza. Uma sensualidade aberta coabita admiravelmente com um apurado requinte mozartiano. Vivia a querer “transformar o mais vulgar dos dias numa substância feliz e sem mácula”. Ficou o seu legado. Rigoroso e transparente, como ele queria.

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Retratos que José Rodrigues fez de Eugènio de Andrade aquando da sua morte.

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Graça Martins

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Uma exposição é um lugar onde a luz sai da moldura para ser movimento, onde o silêncio sacode as suas crinas para se fazer ao mar, onde a palavra que outrora foi semente, é agora uma seara. Aproxima, pois, os teus olhos e a tua boca, e escuta estes rumores da alma que ficaram por contar. Em cada nicho há um silêncio, uma brancura insubmissa que desaba sobre a voluptuosa viagem das emoções. Os objectos que outrora eram sombra, hoje são lume que ardem na orla do teu olhar. Aqui, a mão que desenhou a nudez da palavra sublimada é a mesma que esculpiu os sulcos da sua sede, o coração do dia. Ora, «São coisas assim que tornam o coração vulnerável». Repara como as tuas mãos ondulam. Não tenhas pressa de aportar. Entre o ver e o tocar há sempre o mesmo desejo: o de reviver, de reencontrar.

Eugénio de Andrade/ José Rodrigues

A exposição “Retrato de uma Amizade” revela ao espectador a cumplicidade afectiva e cultural de um poeta e de um artista plástico. Dois nomes incontornáveis no panorama cultural português: Eugénio de Andrade e José Rodrigues. A sua relação de amizade foi estimulante para ambos na criação artística, numa espécie de ramificação circulatória, viva, dinâmica. A exposição é constituída por retratos do poeta realizados por artistas plásticos, manuscritos, correspondência, fotografias e por obras de arte da colecção do poeta Eugénio de Andrade. Como afirma José Rodrigues “palmas para o Eugénio”. Acrescento palmas para os dois.

Apontamentos Sobre Uma Exposição

António Oliveira

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Retrato de uma Amizade


Retrato de Uma amizade Eugénio de Andrade/ José Rodrigues

produção Câmara Municipal do Porto, Fundação José Rodrigues e Esad Idea - Investigação em Design e Arte curadoria Graça Martins Maria Bochicchio edição do catálogo Maria Bochicchio textos António Oliveira Carlos Mendes de Sousa Francisco Laranjo Graça Martins Laura Castro Maria Bochicchio design gráfico Esad Idea/Inês Nepomuceno nº exemplares 500

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agradecimentos Lucinda de Lurdes Resende Lopes Oliveira, Jorge Manuel do Vale Ferreira da Gesta, Sílvio Cândido Rodrigues da Costa, Dario Gonçalves, Alfredo Vieira, Maria Milano, Sérgio Afonso, Rosa Alice Branco. in memoriam Paulo Cunha e Silva.


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