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COMO A SAÚDE INTESTINAL É IMPACTADA PELO COLOSTRO?
by agriNews
Ygor Henrique de Paula1; Caio Correa Janardo Pereira1 e Vinícius de Souza Cantarelli2
1Pós-graduação em Produção e nutrição de não-ruminantes – UFLA. Membro da linha de pesquisa Animal Science and Intestinal Health – ASIH. 2Professor e Pesquisador no Departamento de Zootecnia da UFLA. Coordenador da linha de pesquisa Animal Science and Intestinal Health – ASIH.
Aingestão adequada de colostro se caracteriza como um dos principais fatores relacionados à sobrevivência neonatal de suínos (LE DIVIDICH et al., 2005). Os leitões nascem com baixa reserva energética e agamaglobulêmicos, por não receberem imunidade da mãe, devido o tipo da placenta da espécie (epiteliocorial difusa) que restringe a passagem de macromoléculas ao feto (OLIVIERO et al., 2019).
O colostro representa, portanto, a principal fonte de nutrientes e de anticorpos para os leitões, até que eles consigam produzir adequadamente as próprias imunoglobulinas em aproximadamente três a quatro semanas de idade (ROOKE; BLAND, 2002).
O colostro é a primeira secreção da glândula mamária, sendo constituído basicamente por:
A secreção de colostro, começa logo antes do parto e dura cerca de 24 horas após o início do mesmo (QUESNEL et al., 2012).
É responsável por garantir aos neonatos a energia necessária para termorregulação e crescimento corporal, imunidade passiva para proteção contra patógenos e fatores de crescimento que estimulam o crescimento e maturação intestinal (CHEN et al., 2018).
Quando comparado ao leite (Tabela 1), possui concentrações maiores de matéria seca e proteína bruta e baixas concentrações de gordura e lactose (LE DIVIDICH et al., 2005), além de altas concentrações de imunoglobulinas.
Tabela 1: Composição do colostro e leite maduro. Adaptado de: Theil et al., 2014.
O fornecimento adequado de colostro é um desafio enfrentado pela suinocultura devido às variações na produção entre as matrizes e no consumo entre os leitões de mesma leitegada (DEVILLERS et al., 2011), como consequência ao aumento da prolificidade das fêmeas, gerando uma alta variabilidade de peso ao nascimento e assim atuando na capacidade de ingestão do colostro.
Portanto, práticas de manejo que garantam aos leitões um acesso uniforme do colostro devem ser exploradas, agindo para reduzir a variabilidade no peso da leitegada e aumentar a chance de sobrevivência (ALEXOPOULOS et al., 2018).
Sob as questões imunes, o prolongamento deste período está ligado à gradativa redução da capacidade de absorção de imunoglobulinas no intestino do leitão (redução da permeabilidade da mucosa intestinal a grandes moléculas – gut closure).
Leitões devem ingerir, no mínimo, 200 gramas de colostro por quilo de peso vivo nas primeiras 24 horas de vida (FORMIGONI; FONTES, 2014).
Contudo, a ingestão é altamente variável, oscilando de zero a mais de 700 gramas. Essa ingestão reduzida de colostro nas primeiras 24 horas de vida promove um quadro de hipoglicemia e, consequentemente, hipotermia, levando a uma elevada taxa de mortalidade durante o período de lactação (principalmente nos primeiros três dias de vida) ou danos que podem permanecer durante toda a vida do leitão (OLIVIERO et al., 2019).
A ingestão do colostro deve ocorrer até no máximo 30 minutos após o nascimento, para o suprimento das demandas energéticas para manutenção das funções vitais.
Além disso, ocorrem mudanças na composição do colostro e sua transformação em leite, pois em apenas 12 horas após o parto, já há uma redução para 30% da concentração inicial de IgG/mL de colostro (FORMIGONI; FONTES, 2014).
A produção de colostro, em contrapartida à produção de leite, não aumenta proporcionalmente o número de nascidos, bem como o peso desses leitões. Deste modo, a disponibilidade de colostro por leitão é reduzida em leitegadas numerosas (DALLANORA et al., 2014).
Sempre é bom, e necessário, revisar conceitos básicos quanto a importância do colostro. Entretanto, quando é aprofundado o estudo, são gerados vários outros questionamentos referentes a este fator determinante na sobrevivência e desempenho da leitegada.
Desta forma, como esta secreção é capaz de impactar a saúde intestinal dos leitões?
Função de barreira intestinal
As funções fisiológicas do intestino vão além do processo de digestão e absorção dos nutrientes, sendo peça chave nas atividades imunometabólicas e neuroendócrinas para a manutenção da homeostase do suíno.
A saúde intestinal é um dos principais pontos que determinam a máxima expressão do potencial genético e nutricional dos animais. E assim, um excelente status de saúde intestinal se torna cada vez mais almejado.
Logo, a saúde intestinal se baseia em um tripé entre função de barreira intestinal, resposta imune e microbioma. E ambos estes fatores podem ser impactados, diretamente ou indiretamente, pelas taxas de ingestão de colostro.
O tecido intestinal é uma barreira física contra: Sangild et al (2006) investigando os efeitos da ausência da ingestão de colostro em leitões, demonstraram que animais alimentados com sucedâneo apresentaram atrofia das vilosidades, enquanto aqueles com colostro tiveram bons resultados na morfologia.
Desta forma, observa-se que o colostro impacta no desenvolvimento e maturação das células da barreira intestinal através das substâncias bioativa e os fatores de crescimento desta secreção.
Visando os efeitos a longo prazo, os benefícios proporcionados pelo colostro terão impacto nas fases posteriores, de modo que o desenvolvimento de um intestino saudável já na maternidade beneficiará o animal quando estiver nas fases subsequentes.
Resposta imune
Devido ao trato digestório ser uma região exposta ao meio externo, há grande fluxo de antígenos e patógenos nestes órgãos, e assim, as ações do sistema imune devem ser muito bem reguladas.
Uma resposta imunológica eficaz é aquela que se mantêm em alerta e é capaz de defender o organismo contra patógenos, sem que haja um quadro de hiperestimulação, com gasto energético desnecessário.
Microbioma
O trato gastrointestinal dos mamíferos abriga uma gama de espécies bacterianas que desempenham funções importantes na manutenção da saúde e crescimento do hospedeiro (LI et al., 2018), incluindo a determinação das taxas de incidência de doenças inflamatórias, infecciosas e imunológicas (SCHOKKER et al., 2014).
Digno de nota, é conhecido que leitões com adequada ingestão de colostro nas primeiras horas de vida obtêm uma melhor resposta imune sistêmica e na mucosa intestinal. Portanto, os anticorpos adquiridos no colostro não servem apenas para suprir a falta de imunoglobulinas do leitão, mas também para promover a formação do próprio sistema imunológico (GONÇALVES et al., 2016; OGAWA et al., 2016).
Assim, o cuidado com os primeiros colonizadores bacterianos do intestino são de total importância para a determinação de uma comunidade microbiana ideal, contribuindo para o metabolismo geral do organismo (GUEVARRA et al., 2018).
Morrissette et al. (2017) descreveram que um maior consumo de colostro está associado a obtenção de filos de bactérias benéficas para o intestino. Tais como:
Bacteroidetes que produzem metabólitos importantes para o suíno além de fornecer estabilidade na microbiota do leitão para a mudança de dieta no desmame e
Ruminococcaceae composto por bactérias com alta capacidade de produção de butirato, o qual é a principal fonte de energia dos colonócitos, assim como possui ação anti-inflamatória e contribui para a integridade da barreira intestinal.
Esta modulação positiva do microbioma por impacto do colostro foi correlacionada a suínos que obtiveram maior ganho de peso durante as fases de creche, crescimento e terminação, por Declerck et al. (2018).
Isto se deve ao colostro ter ajudado o suíno a aumentar o peso na maternidade, fornecendo uma microbiota capaz de mitigar os impactos do estresse pósdesmame, e assim influenciar na saúde intestinal para o crescimento das fases posteriores.
Desta forma, em meio a tantas tecnologias implementadas na suinocultura afim de se gerar uma condição ótima de saúde intestinal aos animais, é importante ressaltar o impacto proveniente de um correto manejo de colostragem.
Esse recurso oriundo da própria biologia dos suínos não pode ser negligenciado na busca por alcançar um leitão de maior desempenho. Como destacado, este é peça chave para o desenvolvimento estrutural do intestino, estabelecimento de um status imunológico seguro e modular/ colonizar positivamente este órgão com microrganimos benéficos.