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Destaques

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Como anda a sensibilidade do fungo causador da mancha-alvo em soja à aplicação de fungicidas

Risco anunciado

Antes restrito aos cultivos da cana-deaçúcar, pulgão Melanaphis sacchari vira ameaça também em sorgo

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@RevistaCultivar

Índice

Fungicidas ao alvo

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Leiteiro resistente

Euphorbia heterophylla se soma aos problemas de resistência ao herbicida

Cultivar Grandes Culturas • Ano XX • Nº 253 Junho 2020 • ISSN - 1516-358X Crédito de Capa: Eduardo Lima do Carmo

Diretor Newton Peter www.grupocultivar.com contato@grupocultivar.com Assinatura anual (11 edições*): R$ 269,90 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)

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Gesso agrícola em algodão

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Pulgão Melanaphis sacchari em sorgo

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Identificação e controle da mancha-branca

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Identificação da ferrugem-asiática

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Capa - Fungicidas contra a mancha-alvo

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Soja convencional ganha espaço

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Leiteiro resistente a glifosato

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Percevejo-marrom em soja

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Informe - Aplicação eficiente

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Nanismo-amarelo em trigo

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Produção diversificada de trigo

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Coluna Agronegócios

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Coluna Mercado Agrícola

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Coluna ANPII

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Expediente Fundadores: Milton Sousa Guerra, Newton Peter e Schubert Peter

glifosato no Brasil

Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CNPJ : 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro, 160, sala 702 Pelotas – RS • 96015-300

Diretas

Números atrasados: R$ 22,00 Assinatura Internacional: US$ 150,00 Euros 130,00 Nossos Telefones: (53) • Geral 3028.2000 • Comercial: • Assinaturas: 3028.2065 3028.2070 3028.2066 • Redação: 3028.2067 3028.2060

Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: contato@grupocultivar.com Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.

REDAÇÃO • Editor Gilvan Dutra Quevedo

COMERCIAL • Coordenação Charles Ricardo Echer

• Redação Rocheli Wachholz Karine Gobbi Cassiane Fonseca

• Vendas Sedeli Feijó Miriam Portugal

• Design Gráfico e Diagramação Cristiano Ceia

CIRCULAÇÃO • Coordenação Simone Lopes

• Revisão Aline Partzsch de Almeida

• Assinaturas Natália Rodrigues

GRÁFICA: Kunde Indústrias Gráficas Ltda.

• Expedição Edson Krause


Diretas Academia

A Academia de Liderança das Mulheres do Agronegócio, curso gratuito promovido por iniciativa da Corteva Agriscience, em parceria com a Fundação Dom Cabral (FDC) e a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), terá nova turma. A 2ª edição da Academia contará com 46 horas de aulas on-line e prevê um encontro presencial em outubro, quando as participantes também serão convidadas a acompanhar a 5ª edição do Congresso Nacional das Mulheres do Agronegócio (CNMA), agendado para os dias 27 e 28 de outubro, no Transamerica Expo Center, em São Paulo.

Crescimento

Nematicida

A FMC anunciou os dados de negócios do primeiro trimestre de 2020, com crescimento de 5%, e faturamento mundial de US$ 1,250 bilhão. No Brasil a companhia cresceu 19% no faturamento em relação ao mesmo período do ano passado. O destaque ficou por conta da soja, com vendas maiores que em 2019. “Soja e milho são culturas nas quais a FMC tem dado maior foco nos últimos anos. Fortalecemos nosso portfólio e temos buscado aproximação com o produtor para entender suas necessidades e ofertar soluções adequadas para cada realidade”, explicou o diretor de Negócios do Brasil, Marcelo Magurno. Com esses resultados, a empresa também manteve a liderança em cana-de-açúcar e algodão.

Jon Parr

A Syngenta apresenta a marca da plataforma tecnológica Tymirium, uma nova tecnologia de nematicida e fungicida em desenvolvimento para usos aplicados em sementes e no solo. Com base no ingrediente ativo cyclobutrifluram, oferece controle de nematoides e doenças transmitidas pelo solo, especialmente espécies de Fusarium. “Estamos investindo significativamente na saúde do solo na Syngenta, e o desenvolvimento da tecnologia Tymirium é um grande passo adiante neste espaço. Isso dará aos agricultores a liberdade de maximizar seus rendimentos sem comprometer a sustentabilidade”, avaliou o presidente da Global Crop Protection, Jon Parr. Os primeiros lançamentos de produtos baseados nessa tecnologia estão planejados para a América Latina em 2021/2022.

Aplicativo

Marcelo Magurno

O aplicativo Basf Agro ganha uma nova funcionalidade no Brasil. Os agricultores poderão conferir todo portfólio de sementes de soja e algodão das marcas Soytech, Credenz e Fibermax, além de todo catálogo já disponível em proteção de cultivos. “A Basf está comprometida com o legado do agricultor e busca oferecer soluções integradas e de acordo com as necessidades de cada um. Nós sabemos que o agricultor busca maiores produtividade e o aplicativo Basf Agro veio para oferecer também todo o portfólio de sementes”, opinou o diretor de Sementes da Basf, Hugo Borsari.

Monitoramento

A Granular, empresa de agricultura digital adquirida pela Corteva Agriscience em 2017, liberou o acesso completo ao Granular Insights para produtores de todo o Brasil, ao longo dos meses de abril e maio. A solução permite direcionar o monitoramento no campo para identificar mudanças nas lavouras. A liberação tem o objetivo de contribuir com o trabalho do produtor e seus parceiros de confiança nesse momento de incentivo às medidas de distanciamento social. Para ter acesso ao Granular Insights o produtor deve realizar cadastro e criar uma propriedade na ferramenta, que está disponível por meio do site br.granular.ag ou do aplicativo para iOS e Android.

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Hugo Borsari

Correção

No artigo Choque Tecnológico, sobre uso de fungicidas em cana-de-açúcar, publicado às páginas 5 a 9 da edição 252, nas figuras onde constou clone SP 813250 leia-se RB-867515. Nas tabelas dos clones a primeira se refere à renovação do canavial e a segunda à área dos mais plantados no Brasil. Nas conclusões, onde se lê apenas SP-813250, acrescente-se RB-867515.


Algodão

Resposta à O aplicação Importante método de correção do solo, o uso de diferentes doses de gesso agrícola em áreas cultivadas com algodoeiro no Cerrado brasileiro demanda atenção e conhecimento sobre os efeitos e resultados na cultura

algodão Gossypium hirsutum L. é a mais importante fonte de fibra vegetal para a confecção têxtil, tanto no Brasil como nas demais regiões produtoras do mundo. É também responsável por uma grande parcela de empregos no agronegócio tanto diretos como indiretos. No Brasil o algodão é explorado economicamente em vários estados brasileiros como Mato Grosso, Goiás, Bahia e Mato Grosso do Sul, com o uso de técnicas de produção que permitem alcançar elevadas produtividades, dependendo da cultura, do tamanho da propriedade e também da consorciação com outras culturas. O algodoeiro é uma planta muito

Leonardo Quirino de Oliveira

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exigente quanto à fertilidade do solo, sendo sensível à acidez, à presença de alumínio e manganês tóxicos, à salinidade e à compactação, preferindo solos de textura média profundos, ricos em matéria orgânica, permeáveis, bem drenados e de boa fertilidade. Os solos ácidos são muito prejudiciais a qualquer cultura, pois são normalmente pobres em cálcio, magnésio e potássio, essenciais para a germinação das sementes e o desenvolvimento da parte radicular da planta. Isso afeta diretamente o algodoeiro, limitando seu rendimento. O enxofre é um elemento com baixa concentração devido à alta intemperização da maioria dos solos de Cerrado, além das perdas por volatização durante as queimadas. Neste contexto vem sendo realizados vários estudos para análise do seu comportamento, bem como doses, fontes e modos de aplicação, fatores que dependem muito da característica do solo a ser trabalhado. A utilização do gesso agrícola é recente, talvez devido ao pouco conhecimento da sua importância no desenvolvimento

Figura 1- Desenvolvimento radicular do algodoeiro sob efeito do pH no solo

tes porque possui alto efeito residual, podendo permanecer até cinco anos depois da primeira aplicação. Isso se deve à elevada capacidade de absorção de sulfato nas camadas subsuperficiais do solo do Cerrado, agindo também como condicionador do solo.

CALAGEM E GESSAGEM

vegetativo. Aliado à aplicação de calcário, o gesso também é um importante método de correção do solo, já que, ao contrário do calcário, apresenta grande solubilidade no solo. Portanto, consegue atingir camadas mais profundas no solo, para a correção dos teores de alumínio e como fonte de enxofre, na forma de sulfato e cálcio para estas camadas, já que o aumento da exploração do sistema radicular da cultura possibilita maior aproveitamento dos nutrientes e das condições hídricas do solo. Nas adubações realizadas com o enxofre, outras culturas também podem aproveitar o nutriente nos anos seguin-

O nível de pH do solo pode ter efeitos significativos sobre o crescimento radicular relativo. Em pH abaixo de 5, as raízes podem parecer amareladas, com algumas pontas enegrecidas. Com nível de pH mais desejável até o patamar de 6,5, as raízes serão mais longas e exibirão mais ramificações. Na Figura 1 é possível observar o desenvolvimento radicular mostrando os efeitos do pH do solo mais baixo (maior acidez do solo) sobre o comprimento e o crescimento radicular. O teor de argila é diretamente ligado com a capacidade de absorção do sulfato, pois nela está contida a maior parte dos nutrientes, visto que o cálculo da quantidade de gesso se mede através da verificação da porcentagem de argila

Figura 2 - Médias de altura de plantas em relação a tempo e dose. Sendo: T1, T2, T3, T4, T5, T6 respectivamente 0, 1, 2, 4, 8, 16 T de gesso ha-1

Figura 3 - Peso de matéria seca da raiz. Sendo: 0, 1, 2, 4, 8, 16 T de gesso ha

Figura 4 - Número de maças por tratamento em relação as doses aplicadas em T ha-1. Sendo T1, T2, T3, T4, T5, T6 respectivamente 0, 1, 2, 4, 8, 16 T de gesso ha-1

Figura 5 - Estimativa da produção em kg/ha em relação às doses aplicadas. Sendo T1, T2, T3, T4, T5, T6 respectivamente 0, 1, 2, 4, 8, 16 T de gesso/ha

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EXPERIMENTO

Com o objetivo de testar diferentes dosagens de gesso no desenvolvimento e produtividade da cultura do algodão, um trabalho foi conduzido na Fazenda Córrego da Onça, no município de São Luís dos Montes Belos, Goiás. O tipo de solo utilizado foi um Latossolo Vermelho Amarelo. A adubação empregada foi calculada em função da análise de solo conforme metodologia da Embrapa (1997). O solo foi homogeneizado e colocado em vasos de 15dm3. A semeadura foi realizada com a cultivar BRS 201, após o tratamento das sementes com inseticida piraclostrobina, em vasos de 15dm3, com semeadura de três sementes por vaso, que posteriormente foi selecionada, deixando apenas uma planta por vaso. Cada parcela experimental foi composta por quatro plantas, com média analisada de acordo com os tratamentos: T1, T2, T3, T4, T5, T6, respectivamente 0, 1, 2, 4, 8, 16 T de gesso/ha. As variáveis analisadas foram altura de planta, peso de raiz, número de maçãs por planta, com produtividade estimada para uma população de 250 mil plantas por hectare. O gesso (CaSO4.2H2O) foi aplicado uma semana antes da semeadura, com as suas respectivas doses no solo e homogeneizado dentro dos baldes. Foi usado gesso contendo 16% de enxofre. Também foi realizada adubação de cobertura com aplicação de nitrogênio usando ureia (44% N) no estádio R1, na dose 75kg/ha por meio da aplicação de 50ml de solução por vaso, e uma solução de boro a 10,5% em uma dose de 3kg/ha utilizando bórax. Foram realizadas aplicações de forma preventiva de inseticidas imidacloprid; flubendiamida; fenpropatrina; fungicidas pyraclostrobina; azoxystrobin; carbendazim e acaricida acefato. O delineamento estatístico foi o de blocos casualizados subdividido no tempo, com cinco repetições compostas por quatro plantas cada, e seis tratamentos (doses), totalizando 30 parcelas experimentais com um total de 120 plantas, avaliadas a cada 15 dias, com total de dez tempos. Foi realizada análise de variância e de regressão de duas variáveis: dose e tempo, por meio de superfície de resposta utilizando o software SAS. A análise de variância demonstrou haver interação entre o tempo e as doses de gesso

Tabela 1 - Análise de variância para altura, nº de folhas e diâmetro FV BL Dose Tempo Tempo*Dose TOTAL CV1(%)= CV2(%)= Média

GL 4 5 9 45 299

ALTURA 423.58NS 131.10NS 11795.80** 26.50* 61.07 15.17 32.42

** significativo ao nível de 1% de probabilidade (p < .01), * significativo ao nível de 5% de probabilidade (.01 =< p < .05), ns não significativo (p >= .05). FV=Fonte de variação, GL= Grau de Liberdade, BL= Bloco, CV= Coeficiente de variação.

aplicadas à altura com significância de 5%, de acordo com a Tabela 1. Por ser o algodão uma planta perene, o ciclo é interrompido com a aplicação de maturador, forçando a sua senescência ao atingir 70% a 80% dos capulhos abertos. Para a altura de plantas, a melhor dose encontrada foi de 2t/ha (T3). A utilização do teor de argila como base para o cálculo sugere um valor de 1.600kg/ ha. Uma alta dose de gessagem pode prejudicar o desenvolvimento da cultura por levar ao desequilíbrio nutricional, sendo em T3 a dose ajustada em função do tempo. Apresentou 77,1cm de altura para uma dose de 1.920kg/ha, com valores máximos aos 133 dias. Foi aplicado maturador por conta do crescimento indeterminado e ciclo anual por indução (Figura 2). A análise do peso de raiz demonstra alta resposta do algodoeiro nos tratamentos T1, T2 e T3 e uma redução drástica nos tratamentos T4, T5 e T6, demons-

trando um efeito negativo no crescimento radicular pela sua possível toxidez na planta (Figura 3). O número de maçãs está diretamente ligado à produção do algodoeiro. Neste caso houve o aparecimento das primeiras maçãs aos 107 dias após a emergência, com seu ápice ocorrendo aos 119 dias. A abertura de 70% das maçãs se deu aos 133 dias, tendo sido realizada aplicação de maturador em todos os tratamentos. O número de maçãs em relação aos tratamentos mostra valores crescentes entre T1 (Figura 4), T2 e T3, porém com decréscimo acentuado para os demais tratamentos. A análise de produção também revela um aumento crescente em relação às doses T1, T2 e T3 com decréscimo acentuado para os demais. Os valores ajustados são de 1.269,9kg/ha para uma dose de 3,48t/ha (Figura 5). Na região Nordeste do País, o valor de produtividade média da cultivar BRS 201 é de 1.942kg em área irrigada. O algodoeiro apresentou resposta crescente à aplicação de gesso para os tratamentos T1, T2 e T3, com doses próximas a 2t/ha corroborando com os valores calculados segundo o teor de argila para culturas anuais. A produtividade ficou abaixo da média registrada para a cultivar BRS 201 nas C condições avaliadas. Leonardo Quirino de Oliveira, Marciana Cristina da Silva e Fernando Rezende Costa, Faculdade Montes Belos

Leonardo Quirino de Oliveira

contida no solo.

Semeadura foi realizada com a cultivar BRS 201, após o tratamento das sementes com inseticida piraclostrobina, em vasos de 15dm3

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Pragas Fotos Cecilia Czepak

Risco anunciado Anteriormente restrito aos cultivos da cana-de-açúcar, o pulgão Melanaphis sacchari passa a ser uma realidade também nas lavouras de sorgo. Depois de causar problemas em Minas Gerais, São Paulo e no Distrito Federal, índices alarmantes de populações do inseto são registrados também em várias regiões de Goiás

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E

xistem quatro tipos de sorgo [Sorghum spp] no Brasil, o sorgo vassoura, o forrageiro, o sacarino e, finalmente, o sorgo granífero, que é o mais comumente cultivado, pois seus grãos são utilizados para a fabricação de ração animal, em substituição ao milho. A produção de sorgo no Brasil está concentrada, em sua maior parte, na região Centro-Oeste. Com produção estimada de 1,09 milhão de toneladas, em dezembro de 2019 o Estado de Goiás se consolidou como o maior produtor de sorgo do Brasil, representando, portanto, 40% da produção nacional de sorgo. Esse quantitativo é 20,3% maior do que a produção registrada em dezembro de 2018 (912,9 mil toneladas), segundo os dados divulgados em janeiro de 2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por ser uma cultura rústica e tolerante ao estresse hídrico, sem perdas significativas de qualidade nutricional, o sorgo, tanto para grãos como para forragem, vem sendo utilizado como uma cultura alternativa ao milho de segunda safra, pois possui uma “janela de plantio” mais estendida para um bioma tão específico como o Cerrado, além do que, seu valor de mercado pode alcançar até 80% do valor do milho. A instabilidade climática, o custo de produção mais baixo, o alto índice de produtividade, a boa cobertura de palhada oferecida para os plantios de verão, entre outras vantagens, são aspectos importantes que os produtores, de diferentes regiões, levam em conta no momento de adotar com mais frequência essa cultura no período da entressafra. Além disso, até bem pouco tempo cultivar sorgo tinha como “vantagem”, também, o uso mínimo ou, até mesmo, nenhum de agroquímico. Atualmente, a realidade é outra e para produzir cada vez mais, os produtores rurais passaram a aumentar as áreas cultivadas e a investir em tecnologias mais adequadas para a cultura do sorgo, como adubação, cultivares mais produtivas e tratos fitossanitários. Este aumento de áreas cultivadas com o sorgo e sua proximidade com áreas cultivadas com cana-de-açúcar

Área de sorgo (Sorghum bicolor) com danos irreversíveis apresentados após ataque generalizado de Melanaphis sacchari. Indiara, GO, 2020

trouxeram preocupações além daquelas relacionadas ao aumento de produtividade. É o caso da elevação do número de intervenções químicas, pois se depararam com limitações fitossanitárias, principalmente relacionadas aos artrópodes-praga, como a espécie Helicoverpa armigera, o complexo de Spodoptera spp, além de sugadores, como pulgões de diferentes espécies, particularmente Melanaphis sacchari (Zethner) (Hemiptera: Aphididae), praga anteriormente restrita aos cultivos da cana-de-açúcar. Essa possibilidade de expansão e o potencial de dano causado pela espécie M. sacchari foram alertados em 2016 por um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco, e bastaram três anos para que isso se tornasse uma realidade, pois em 2019 essa praga foi alvo de inúmeras aplicações de defensivos agrícolas em lavouras dos estados de Minas Gerais, São Paulo e no Distrito Federal. Na atual safra, cultivos de sorgo nas regiões, Sul, Sudoeste, Entorno e Central do estado de Goiás também apresentaram índices alarmantes de populações deste pulgão, exigindo que produtores fizessem até cinco intervenções com defensivos na cultura para controlar o alvo e, em alguns casos mais críticos, a alternativa foi a destruição dos restos culturais da área, considerando-se a intensidade das infestações e os danos provocados. Além disso, há um agravante nessa questão no que

se refere à ausência de produtos agroquímicos registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para o controle dessa praga na cultura do sorgo. Portanto, as intervenções químicas foram baseadas apenas em informações obtidas de outros países ou utilizando-se das recomendações para outras espécies de pulgões e/ou, cultivos. A confirmação da presença de M. sacchari nas lavouras de sorgo no estado de Goiás baseou-se em amostras de indivíduos desta espécie coletados em algumas áreas cultivadas com sorgo no município de Indiara e enviadas pelo Laboratório de Manejo Integrado de Pragas da Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás (EA/UFG) ao Laboratório de Diagnóstico e Biotecnologia/Laboratório Nacional Agropecuário de Goiás (LDB/Lanagro-GO) do Mapa, sendo a identificação realizada através de técnica molecular (Sequenciamento de Região Conservada). M. sacchari é uma praga da cana-de-açúcar presente na América, Ásia, África e Oceania, reconhecida como praga invasiva, em razão da alta taxa de disseminação, favorecida pelas correntes de ar. Sua presença foi relatada na década de 1970 na América do Norte e na América Central e se manteve até então nessas regiões como praga comum da cana-de-açúcar e importante vetor de algumas doenças de etiologia viral da cultura. Porém, em 2013, foram registrados no Texas, Louisiana, Oklaho-

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ma e Mississippi surtos de um biótipo de M. sacchari, em sorgo, e dois anos depois, todos os 17 estados produtores dos Estados Unidos da América (EUA) relataram grandes infestações dessa praga. Algumas lavouras no Texas e Louisiana chegaram a apresentar, em média, 900 pulgões por folha das plantas atacadas, com reduções de até 100% na produtividade, obrigando produtores a realizar inúmeras aplicações de defensivos para o controle da praga.

DESCRIÇÃO E BIOLOGIA

O pulgão da cana-de-açúcar (M. sacchari) foi descrito, inicialmente, como Aphis sacchari e Longiunguis sacchari an-

tes de ser colocado em seu gênero atual. Alimenta-se de várias plantas da família Poaceae e é, atualmente, uma praga-chave da cana-de-açúcar (Saccharum officinarum) e do sorgo (Sorghum spp). Apresenta-se como um pequeno pulgão (< 2mm), de corpo mole, piriforme geralmente de cor bege, mas exibe variação significativa de cor com tons de rosa, marrom e amarelo, dependendo das plantas hospedeiras e das condições climáticas. Seus indivíduos são reconhecidos por apresentarem os tarsos, os sifúnculos e parte das antenas de coloração escura, distinguindo-os de outras espécies que infestam as Poaceae. Dentro de uma população de M. sacchari estabelecida são encontrados ninfas

Área de sorgo (Sorghum bicolor) com danos irreversíveis apresentados após ataque generalizado de Melanaphis sacchari. Indiara, GO, 2020

Plantas de sorgo (Sorghum bicolor) com inúmeras colônias de Melanaphis sacchari e folhas com aspecto pegajoso e brilhante devido à substância adocicada expelida pelos indivíduos da praga. Piracanjuba, GO, 2020

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e adultos, estes últimos se apresentam nas formas aladas, responsáveis pela disseminação de sua população na lavoura, e ápteras, responsáveis pela reprodução dentro da mesma colônia. A reprodução em regiões tropicais como a nossa é por partenogênese telítoca, isto é, fêmeas originando novas fêmeas, portanto, podem acumular grandes populações em um período de tempo relativamente curto. Alguns relatos citam picos populacionais de mais de 30 mil pulgões em apenas uma planta, porém, rapidamente, em duas a três semanas de abundância populacional as densidades de pulgões diminuem, restando apenas as exúvias e a fumagina, sendo que este declínio ocorre por dispersão dos indivíduos alados induzida pela própria densidade e em consequência das más condições nutricionais do hospedeiro devido à alta infestação. Em Goiás, a espécie M. sacchari foi encontrada em lavouras de sorgo, especificamente entre os meses de março e maio, principalmente na fase


Fotos Cecilia Czepak

de controle, para as regiões afetadas, devendo ser efetuados, também, levantamentos sobre a ocorrência dessa praga em todas as possíveis culturas hospedeiras. As táticas de controle de M. sacchari a serem recomendadas, tendo como referência o que tem sido adotado em outros países, consistem na utilização de materiais resistentes, na destruição de restos de cultura, na eliminação de gramíneas espontâneas e com potencial para hospedar a praga, no estabelecimento de uma distância segura entre as áreas de cultivo de sorgo e aquelas cultivadas com cana-de-açúcar, em aprimorar tecnologias de aplicação adequadas para alcance do alvo e, por fim, no estudo para uso de inseticidas químicos e biológicos, considerando a localização da praga e, também, a seletividade, visto que inimigos naturais, como predadores e parasitoides, apresentam grande associação à espécie M. sacchari nas áreas agrícolas, sendo de fundamental importância, também, o estudo da adoção de diferentes mecanismos de ação dos agroquímicos, com o propósito de reduzir a pressão de seleção dos ingredientes ativos, haja vista a possibilidade do desenvolvimento de C populações resistentes dessa espécie.

final do ciclo vegetativo, atingindo, em muitas lavouras, 100% das plantas, com média aproximada de mil pulgões por folha. O sorgo granífero foi o mais atingido, além de outras espécies de sorgo e gramíneas próximas, como o milho e o milheto, que apresentaram infestações mais leves. O ataque desses insetos ocorre nas folhas, onde tanto as ninfas quanto os adultos se alimentam sugando a seiva, principalmente na face abaxial, de modo que é comum a infestação se iniciar das folhas mais velhas para as mais novas (de baixo para cima). Causam danos diretos por sucção da seiva da planta, e indiretos por serem vetores importantes de doenças virais, além do que a sucção contínua os faz excretar grandes quantidades de substâncias adocicadas, chamadas de “honeydew” (melado), que são alimento preferido de certas espécies de formigas. Essas substâncias deixam as superfícies das folhas pegajosas e de aspecto brilhante, com o tempo escurecem devido ao desenvolvimento da fumagina, impedindo a realização da fotossíntese e induzindo, por fim, ao amarelecimento, ao secamento e à queda da folha. Além disso, pode haver um comprometimento total ou parcial da produção de grãos, devido a esse depauperamento da planta provocado pela praga em questão. Sabe-se, atualmente, que essa praga tem potencial para provocar o declínio da cultura do sorgo em diversas regiões do País, principalmente no estado de Goiás, onde atingiu inúmeras localidades em um curto espaço de tempo, com fácil dispersão e um rápido crescimento populacional. Ressalta-se, ainda, que existe a possibilidade de transmissão de importantes doenças, tanto para a cultura do sorgo como para as culturas da cana-de-açúcar e do milho. Assim, estudos sobre a bioecologia de M. sacchari devem ser estabelecidos de forma urgente como subsídios para as tomadas de decisão sobre as melhores táticas

Cecilia Czepak, Jácomo D. Borges, Vinicius O. Magalhães, Anderson de S. Zandomenighi, Lucas G. Santos, Leonardo Y. S. Schmidt e Murillo A. Gomes, Escola de Agronomia/UFG/Goiânia/GO Regina M. S. Coelho, Maria da Gloria Trindade e Abmael M. de Lima Junior, LDB/Lannagro/Mapa/Goiânia/GO Marcos Vieira, Accura - Tecnologias Integradas no Agronegócio

Colônias de Melanaphis sacchari na folha do sorgo (Sorghum bicolor) e em destaque no círculo estão apresentadas as principais características que diferenciam a espécie dos demais pulgões (parte das antenas, os sifúnculos e os tarsos de coloração escura). Piracanjuba, GO, 2020

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Milho Silva, M. A.; Debortoli, M. (2017) • elevagro.com

Atenção aos sinais

Confundida muitas vezes com lesões provocadas pela fitotoxidade de herbicidas, a mancha-branca é uma doença cuja severidade tem aumentado nas lavouras de milho. A segunda safra demanda ainda mais cuidado, pois é o período em que o clima se mostra mais úmido e propício ao desenvolvimento desta enfermidade

O

milho é o cereal mais produzido no mundo. O Brasil é atualmente o terceiro maior produtor, atrás somente dos Estados Unidos e

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da China. A maior parte da produção brasileira vem do chamado milho safrinha ou de segunda safra, que já possui a maior área plantada em relação ao

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milho safra. Para ambos os sistemas de produção, há uma constante busca pelo incremento da produtividade e, dentro deste contexto, as preocupações com


Fotos Madalosso, M.; Ortiz, S. 2017 • elevagro.com

Picnídios (sinais) indicando a presença de P. maydis em folhas de milho

Mancha de feosféria ou mancha-branca

doenças tornam-se muito importantes, devido aos danos que podem causar na cultura. Dentre as doenças mais importantes da cultura do milho, a mancha-branca vem se destacando, com altas severidades e redução de produtividade. O agente causal da doença por muitos anos foi considerado como sendo o fungo Phaeosphaeria maydis, porém trabalhos mais recentes defendem que a doença é provocada pela bactéria Pantoea ananatis. Muitos pesquisadores relatam que a causa da doença está relacionada com a interação do fungo e a bactéria, porém ainda não há unanimidade. Os produtores têm se preocupado cada vez mais com o aumento da severidade da mancha-branca no campo e a sua identificação é muito importante para a tomada de decisão em relação ao melhor manejo. Nesse sentido, um dos principais fatores para diagnose é a identificação de sinais nas lesões. Sinais são estruturas de desenvolvimento ou reprodução do patógeno que permitem identificá-lo. Por exemplo, em lesões mais evoluídas, a presença de picnídios (pontos pretos) no centro das lesões caracteriza-se como sinais de Phaeosphaeria maydis. No campo, é muito comum entre produtores e técnicos a dificuldade de se diferenciar corretamente os sintomas causados pela doença de lesões por injúrias da fitotoxidade de herbicidas como o paraquate. Os sintomas resultantes da deriva de herbicidas à base de paraquate caracterizam-se por

áreas cloróticas, esbranquiçadas, com aspecto seco e margens de cor marrom. Assim, com frequência, as lesões produzidas pela deriva têm sido confundidas com a mancha-branca. De maneira geral, a mancha-branca começa com pequenos sintomas nas folhas e vai evoluindo, tomando maiores proporções. Por outro lado, os sintomas de fitotoxidade ocorrem de forma repentina, horas ou dias após a exposição das plantas ao herbicida. Tipicamente a mancha-branca está associada a períodos úmidos, de alta pluviosidade, dias nublados, molhamento foliar e solo bastante úmido.

Figura 1 - Incremento produtivo de milho (AG 9000) (sc/ha) pela aplicação de fungicidas (Tz - Triazol; St - Estrobilurina; Dtc - Ditiocarbamato). Fonte: elevagro.com

Figura 2 - Suscetibilidade de quatro híbridos de milho para mancha-branca, com base nos valores da Área Abaixo da Curva de Progresso da Doença (AACPD)

EPIDEMIOLOGIA E SINTOMATOLOGIA

Algumas condições têm tornado o ambiente de cultivo favorável à ocorrência da doença, como a sucessão de culturas e o aumento das áreas de milho safrinha. O milho cultivado sempre na mesma área (safra-safrinha-safra) faz com que o patógeno encontre uma ponte verde e o inóculo aumente na área de cultivo. Algumas condições ambientais são mais favoráveis à ocorrência do fungo, como umidade relativa acima de 60%, alta precipitação e temperaturas noturnas mais amenas (14°C). A produtividade pode ser reduzida em mais de 60%, em ambientes favoráveis, combinado com o uso de cultivares mais suscetíveis. Normalmente, o maior período de ocorrência e severidade da doença ocorre a partir da primeira quinzena de

*AACPD é uma variável que estima o acúmulo da doença ao longo do ciclo da cultura. Fonte: UEBEL, 2015.

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Debortoli, M. (2014) • elevagro.com

Área de milho com severidade elevada de mancha-branca (P. maydis)

novembro e vai até março. O inóculo primário do fungo P. maydis está associado aos restos culturais, pois é um fungo necrotrófico. A disseminação do patógeno se dá por meio do vento e respingos de chuva no solo, que posteriormente entram em contato com as folhas das plantas. O florescimento da cultura é o período de maior sensibilidade da planta ao ataque do patógeno e, consequentemente, os sintomas são mais severos. No início da incidência da doença são observados sintomas nas folhas basais, que rapidamente progridem para a parte superior da planta. As lesões são cloróticas e têm forma oblonga, que com o passar do tempo evoluem e tornam-se esbranquiçadas. Posteriormente passam para a coloração pardo-escura. A ocorrência mais severa do fungo causa problemas no enchimento de grãos (tamanho e peso), redução do ciclo, o que pode levar à secagem prematura da planta. As folhas do terço inferior são as mais afetadas pela doença.

produtivo. Mais cuidados devem ser observados na produção de milho de segunda safra, época em que o clima é mais úmido e propício para o desenvolvimento da mancha-branca. Períodos com condições climáticas favoráveis, especialmente após o florescimento da cultura, tornam as plantas mais suscetíveis ao ataque do patógeno. Grande ênfase tem sido dada à aplicação de fungicida como estratégia de controle de mancha-branca. No entanto, fatores como a intensidade da doença e a época de sua ocorrência devem ser considerados na tomada de decisão sobre a primeira aplicação. Melhores resultados são observados com aplicações preventivas de fungicidas, que contribuem para manter a planta verde por mais tempo no campo e possibilitam maior enchimento de grãos. Além disso, o uso de fungi-

cidas com misturas de triazóis, estrobilurinas e carboxamidas associados com multissítios apresenta resultados mais expressivos no controle da doença, resultando em incremento produtivo (Figura 1). Uma estratégia de manejo para a doença é a utilização da tolerância genética de cada híbrido. No entanto, sabe-se que os híbridos comercialmente distribuídos no mercado apresentam diferenças em relação à suscetibilidade para mancha-branca (Figura 2). Quanto maiores os valores de AACPD, mais suscetível é o híbrido de milho. Dessa maneira, é importante considerar a época de plantio para o correto posicionamento das aplicações de fungicida de acordo com cada híbrido utilizado na propriedade. Desse modo, as principais medidas recomendadas para o manejo da mancha-branca são a rotação de culturas, o uso de cultivares resistentes, a aplicação de fungicidas e a adequação do posicionamento de fungicidas em função desses três fatores. Em áreas onde há histórico da ocorrência da doença, a rotação de culturas com espécies não suscetíveis torna-se uma prática amplamente recomendada, pois objetiva diminuir o inóculo inicial na área de cultivo, por se tratar de um patógeno que sobreC vive em restos culturais. Nédio Tormen, Phytus Group Centro-Oeste Elevagro Marlon Stefanello e Daiane Dalla Nora, Elevagro

MANEJO DE MANCHA-BRANCA

Com a produtividade cada vez maior dos novos híbridos e a necessidade da manutenção de toda a sua área foliar até o final do ciclo para que expressem toda a sua capacidade produtiva, surge o desafio de manejar as doenças para proteger o potencial 14

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Daiane, Stefanello e Tormen alertam para o aumento da mancha-branca em milho



Soja

Visão computaci Identificar e quantificar corretamente a severidade das doenças é essencial para a escolha da estratégia de manejo adequada. No caso da ferrugem-asiática esse processo ainda é realizado majoritariamente in loco. Mas resultados obtidos de estudos com uso de imagens digitais do limbo foliar e aéreas de parcelas experimentais capturadas por drones mostram precisão acima de 80% na detecção e quantificação da doença

Carolina Deuner

O

potencial de cultivo da soja no Brasil tem sido impulsionado por meio de adaptações tecnológicas, práticas de manejo e introdução de novas cultivares nas diversas regiões. Mesmo assim, estes avanços não impedem a ocorrência de problemas fitossanitários. Estimam-se perdas em torno de 75% da produtividade das lavouras em função de doenças, dentre as quais destaca-se pelo potencial de infecção, pressão e distribuição nas regiões produtoras a ferrugem-asiática, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi. Identificar e quantificar corretamente a severidade das doenças é essencial para a escolha da estratégia de manejo adequada, isto é, eficaz, sustentável e viável. Há anos várias ferramentas de fitopatometria têm sido estudadas para essa função, mas algumas com praticabilidade baixa e pouco utilizadas atualmente. Em geral, a avaliação da severidade da ferrugem é feita in loco, quantifican16

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do visualmente a porção da área de alguns folíolos coletados dos terços inferior, médio e superior das plantas, por meio de escala diagramática, o que necessita, obviamente, de certo treinamento por parte do avaliador. Não deixando de ser um serviço laborioso. Resultados obtidos de estudos com uso de imagens digitais do limbo foliar (Figura 1) e imagens aéreas de parcelas experimentais (Figura 2) capturadas por Vants (veículos aéreos não tripulados – os populares drones) têm apontado precisão acima de 80% na detecção e quantificação da ferrugem. O sucesso e a viabilidade de uso dessas tecnologias estão associados ao desenvolvimento de novos sensores remotos, em especial câmeras digitais, de alta resolução ótica e baixo custo relativo, sendo de mais baixo custo os que se utilizam apenas de bandas espectrais do visível ao olho humano: vermelho, verde a azul (câmeras RGB – red, green, blue, do inglês). Não obstante, diversas são as opções no mercado de sensores equipados com bandas mais sensíveis a variações de clorofila, como a banda do infravermelho próximo (do inglês, near infrared - NIR), que é invisível ao olho humano. A propósito, esta banda espectral é fundamental para a determinação de um índice bastante recorrente atualmente em análise de imagens aéreas de lavouras, o NDVI (do inglês, normalized difference vegetation index). A maioria das câmeras utilizadas para este tipo de serviço é projetada para poderem ser acopladas nos Vants. É claro, o preço varia conforme a sofisticação do sensor, basicamente em termos de resolução ótica e número de bandas espectrais. Atualmente é possível adquirir câmeras RGB acopláveis a Vants por menos de R$ 3 mil. Câmeras com a banda NIR por menos de R$ 5 mil. As ditas multiespectrais, a maioria contendo de quatro a 20 bandas, custam, em geral, mais que R$ 25 mil. Muitas fazem uso da banda termal (8μm – 14μm de comprimento de onda), capaz de identificar alterações fisiológicas antes mesmo da planta apresentar sintomas visuais. Especialmente em nível de pesquisa, vem se tornando comum a captura de imagens de câmeras hiperespectrais, com mais de 100 bandas, cujo poder de detecção de diferenças na superfície foliar é altíssimo. Porém, há ainda certa dificuldade no processamento computacional destas imagens. O processamento digital de imagens é provavelmente a parte-chave do sucesso na detecção e quantificação de ferrugem da soja. Pesquisas recentes com o uso de imagens RGB de baixo custo apontam resultados promissores na quantificação da severidade


Fotos Divulgação

onal foliar da ferrugem da soja, fazendo uso de índices baseados em diferenças de cor de áreas lesionadas, ditos: LCI (lesion color index), RSI (rust severity index), RIA (ratio of infected area) e outros. A quantificação de ferrugem em folhas é realizada com a captura de imagens do limbo foliar em fundo contrastante, em geral branco ou preto. A próxima etapa consiste da segmentação ou separação dos pixels de folha e fundo por meio de índices de cor que são obtidos através de combinações lineares entre os valores dos pixels R, G e B. Nesta etapa, é comum a aplicação de métodos de segmentação como o método de Otsu (1979) sobre o índice de cor. Em seguida, sobre os pixels de folha apenas, aplica-se um índice de lesão específico para ferrugem-asiática, como LCI. A detecção de puncturas ocorre, por exemplo, segmentando pixels com valores positivos de LCI. Existe uma relação positiva entre os valores de índice de cor de ferrugem e a severidade visual da doença. De fato, é possível ajustar equações que modelam a resposta da severidade visual em função dos valores de LCI, RSI e RIA, embora melhores resultados tenham sido obtidos para certos intervalos de ferrugem variando de 20% a 80% de severidade. Na captura de imagens aéreas, há alguns pontos a serem considerados em relação à altura de voo em função de ângulos FOV (field of view) das câmeras e tamanho da área. Imagens de satélite, algumas gratuitas como do Landsat-8 (Nasa, EUA), apesar de serem constituídas por diversas bandas espectrais, não são em geral utilizadas para fins de detecção e quantificação de ferrugem devido à baixa resolução espacial (30m) e temporal (16 dias). Há imagens de satélite disponíveis com resolução espacial de cerca de 1,2m, como o WorldView-4 (DigitalGlobe, Inc.), mas que ainda assim são consideradas de baixa resolução espacial para a predição de ferrugem, para a qual tem sido recomendada resolução de 4cm/pixel ou

A

C

B

Figura 1 - Folíolos de soja (A) sem sintomas de ferrugem-asiática, (B) com 12% de severidade e (C) com 35% de severidade

Figura 2 - Parcelas experimentais de soja a campo. Imagens capturadas por Vant a 15m de altura com câmeras RGN (red, green, near-infrared) e RGB (red, green, blue) ilustrando a eficácia de quatro tratamentos de fungicidas (T1 a T4) para o controle da ferrugem. As imagens foram processadas para determinação de NDVI e LCI. Valores positivos de NDVI indicam uma maior retenção de folhas, ou seja, menor severidade da doença na parcela. LCI positivo indica maior severidade

A

B

C

Figura 3 - (A) Folíolo de soja em estádio de vegetação V2 com pontuações de ferrugem-asiática. (B) Segmentação de folha e fundo. (C) Segmentação de puncturas de ferrugem no limbo foliar

menos. O processamento digital é similar ao das imagens foliares, com algumas peculiaridades de pré-processamento como correção radiométrica. Por fim, técnicas de processamento de imagens baseadas em segmentação de superpixels e aprendizado de máquinas estão sendo utilizadas para a detecção e quantificação de doenças, com capacidade de diferenciação de doenças formando um complexo nas folhas. Para isso, há uma considerável gama de recursos computacionais disponíveis, incluindo softwares gratuitos como Matlab e R, alguns cujo processamento pode ser C feito na nuvem.

Anderson Rodrigo da Silva, Instituto Federal Goiano/Campus Urutaí Mario Eugenio Galvani Filho, Instituto Federal Goiano/Campus Urutaí FMC

Silva e Galvani Filho abordam uso de imagens digitais na identificação de doenças

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Capa

Fungicidas A ao alvo

Cláudia Vieira Godoy

A cada safra crescem os problemas com a incidência de mancha-alvo nas lavouras de soja no Brasil, com perdas de até 40% em cultivares suscetíveis. Monitorar a sensibilidade do fungo à aplicação de fungicidas e manejar resistência são ações fundamentais para a manutenção da produtividade e a preservação da eficiência de controle

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ocorrência de doenças na cultura da soja vem mudando nos últimos anos em razão das alterações no sistema produtivo. Embora a ferrugem-asiática ganhe destaque por ser a doença mais severa e por ocorrer na maioria das regiões produtoras, medidas de manejo como o vazio sanitário e a concentração das semeaduras no início da época recomendada com cultivares precoces têm feito com que a incidência dessa doença ocorra cada vez mais tarde nas regiões e lavouras, sendo um problema principalmente no final do ciclo ou nas semeaduras mais tardias pelo aumento do inóculo. A ferrugem-asiática, por sua severidade, quando presente na lavoura, causa a desfolha precoce, sendo difícil observar outras doenças foliares pela competição pelo tecido foliar. No entanto, cada vez mais, nas semeaduras logo após o final do vazio sanitário, outras doenças foliares têm predominado nas lavouras até o aparecimento da ferrugem-asiática. Destaca-se a mancha-alvo, causada pelo fungo Corynespora cassiicola. A incidência dessa doença tem aumentado nas últimas safras. Embora a maioria dos programas de melhoramento não faça seleção para resistência a C. cassiicola, existe diferença de reação entre as cultivares. Perdas de até 40% podem ser observadas em cultivares suscetíveis. Outro fator que tem contribuído com a presença dessa doença no campo é a menor sensibilidade/ resistência do fungo aos fungicidas mais comumente utilizados na cultura da soja. Os sintomas da mancha-alvo nas folhas começam por pontuações pardas, com halo amarelado, evoluindo para manchas circulares, de coloração castanho-clara a castanho-escura. Normalmente, as manchas apresentam uma pontuação no centro e anéis concêntricos de coloração mais escura, advindo daí o nome de mancha-alvo. Dependendo da reação da cultivar, as lesões podem atingir até 2cm de diâmetro ou permanecer pequenas (1mm a 3mm), mas em maior número. Também podem ocorrer manchas nos pecíolos, hastes, nervuras das folhas e vagens, sendo muitas vezes confundidas com antracnose. Cultivares suscetíveis podem sofrer desfolha precoce. Algumas cultivares apresentam boa tolerância à desfolha e a presença da doença só é notada nas folhas inferiores. Além da soja, o fungo C. cassiicola infecta



Tabela 1 - Severidade da mancha-alvo (SEV), porcentagem de controle em relação à testemunha sem fungicida (%C), produtividade (PROD) e porcentagem de redução de produtividade (%RP) em relação ao tratamento com a maior produtividade, para os diferentes tratamentos. Média de 15 experimentos para severidade e 13 experimentos para produtividade. Safra 2019/2020 Tratamento: Ingrediente ativo (i.a.) 1. testemunha 2. bixafen + protioconazol + trifloxistrobina1 3. fluxapiroxade + protioconazol2,5 4. azoxistrobina + tebuconazol + mancozebe3,5 5. azoxistrobina + protioconazol + mancozebe3,5 6. protioconazol + fluindapir4,5

Dose g i.a. ha-1 62,5 + 87,5 + 75 60 + 84 94 + 112 + 1194 75 + 75 + 1050 84 + 84

SEV (%) 43 A 10,2 D 9,4 D 14,7 B 9,3 D 11,7 C

%C 76 78 66 78 73

PROD (kg ha-1) 3.498 C 4.167 AB 4.087 AB 4.071 B 4.229 A 4.110 AB

%RP 17,3 1,5 3,4 3,7 2,8

Médias seguidas de mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey (p≤0,05).1Adicionado Áureo 0,25% v/v; 2Adicionado Assist 0,5 l ha-1; 3Adicionado Strides 0,25% v/v; 4Adicionado Lanzar 0,30%; 5Registro Especial Temporário (RET III).

mais de 400 espécies de plantas, que incluem importantes culturas utilizadas na rotação ou sucessão, como algodão e crotalária, além de diversas plantas daninhas. O fungo pode colonizar uma ampla gama de resíduos no solo e sobreviver em restos de cultura e sementes infectadas. Conhecer a reação da cultivar à mancha-alvo é importante na definição do programa de manejo com fungicidas. Nem todo fungicida apresenta boa eficiência no controle do fungo C. cassiicola. Desde a safra 2011/2012, experimentos em rede vêm sendo realizados, em diferentes regiões produtoras, para a comparação da eficiência de fungicidas registrados e em fase de registro para o controle da mancha-alvo na cultura da soja. O objetivo

dos experimentos em rede é a avaliação da eficiência de controle no alvo biológico. Para isso são utilizadas aplicações sequenciais de fungicidas. No entanto, isso não constitui uma recomendação de controle. As informações devem ser utilizadas dentro de um sistema de manejo, considerando a incidência de outras doenças e priorizando sempre a rotação de fungicidas com diferentes modos de ação para atrasar o aparecimento de resistência dos fungos aos fungicidas. Na safra 2019/2020 foram realizados 20 experimentos por 15 instituições de pesquisa, em estações experimentais no Mato Grosso do Sul, no

Mato Grosso, em Goiás, em Tocantins e na Bahia, onde a doença tem sido mais severa. Foram avaliados cinco fungicidas, além da testemunha sem tratamento (Tabela 1). O fungicida utilizado no tratamento 2 apresenta registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para o controle da mancha-alvo em soja e os fungicidas dos tratamentos 3 a 6 apresentam Registro Especial Temporário III (RET III). As aplicações iniciaram-se no pré-fechamento das linhas de semeadura (45-50 dias após a germinação), repetidas com intervalos de 14 dias, totalizando três a quatro aplicações. Em todos os experimentos foram utilizadas cultivares consideradas suscetíveis à mancha-alvo, com base em observações a campo. As áreas para instalação dos experimentos foram semeadas no início da época recomendada, para reduzir a probabilidade de incidência da ferrugem-asiática. Na análise conjunta dos experimentos foram utilizados 15 locais para severidade e 13 para produtividade (Tabela 1). As menores severidades e as maiores porcentagens de controle foram observadas nos tratamentos com fluxapiroxade + protioconazol (T3 - 78%), azoxistrobina + protioconazol + manco-

Fotos Cláudia Vieira Godoy

Figura 1 - Porcentagem de controle da mancha-alvo nos experimentos cooperativos nas safras: 2011/2012 (6 experimentos), 2012/2013 (8 experimentos), 2013/2014 (13 experimentos), 2014/2015 (15 experimentos), 2015/2016 (8 experimentos), 2016/2017 (15 experimentos), 2017/2018 (16 experimentos), 2018/2019 (19 experimentos), 2019/2020 (15 experimentos) em diferentes regiões produtoras no Brasil. tfz+ptz - trifloxistrobina + protioconazol; pyr+epz+fluxa - piraclostrobina + epoxiconazole + fluxapirozade; pyr+flux - piraclostrobina + fluxapiroxade; bixaf+ptz+tfz bixafen + protioconazol + trifloxistrobina; fluxa+oxi de cobre – fluxapiroxade + oxicloreto de cobre . Fonte: Circulares Técnicas 94, 100, 104, 112, 120, 130, 139 e 149, Embrapa Soja.

Folha de soja atacada pelo fungo Corynespora cassiicola

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zebe (T5- 78%) e bixafen + protioconazol + trifloxistrobina (T2 – 76%), seguido de protioconazol + fluindapir (T6 – 73%) (Tabela 1). As maiores produtividades foram observadas para os tratamentos com azoxistrobina + protioconazol + mancozebe (T5 – 4.229kg ha-1), bixafen + protioconazol + trifloxistrobina (T2 – 4.167kg ha-1), protioconazol + fluindapir (T6 – 4.110kg ha-1) e fluxapiroxade + protioconazol (T3 – 4.087kg ha-1) (Tabela 1). A média da redução de produtividade da testemunha sem fungicida em relação à maior produtividade (T5) foi de 17,3%. Como nos anos anteriores dos experimentos em rede, fungicidas contendo protioconazol têm mostrado as melhores eficiências de controle para mancha-alvo, assim como produtos contendo fluxapiroxade. Os fungicidas multissítios, como mancozebe, também ajudam no controle da mancha-alvo, sendo importantes principalmente nas regiões onde tem sido relatada menor sensibilidade do fungo a fungicidas sítio-específicos. Os resultados de produtos registrados, sítio-específicos e multissítios, em avaliações das safras anteriores, podem ser consultados nas circulares técnicas disponíveis em: https://www. embrapa.br/soja/publicacoes. Relatos de resistência do fungo C. cassiicola a fungicidas vêm aumentando. A baixa eficiência de controle da doença com carbendazim (metil benzimidazol carbamato) vem sendo observada nos ensaios em rede desde 2011/12 (Figura 1). Os fungicidas comerciais desse grupo atuam inibindo a montagem dos microtúbulos do fuso durante a divisão nuclear ligando-se à proteína β-tubulina. Populações resistentes podem apresentar mutações na proteína β-tubulina. As mutações de ponto E198A e F200Y no gene da β-tubulina, que conferem resistência completa, foram encontradas em isolados de C. cassiicola obtidos de folhas de soja de plantas coletadas no Mato Grosso, no Paraná e no Mato Grosso do Sul (Mello, 2009), o que pode explicar a baixa eficiência desse fungicida. A mutação G143A, que confere resistência completa a fungicidas ini22

bidores de quinona externa (estrobilurinas), foi detectada em número significativo de amostras no Brasil em 2015 e 2016 em isolados de C. cassiicola no Mato Grosso, no Mato Grosso do Sul e no Paraná (Frac, 2019). Em 2017/2018 isolados com as mutações sdhB-H278Y e sdhC-N75S que conferem menor sensibilidade do fungo a fungicidas inibidores da succinato desidrogenase (carboxamidas) foram relatados pelo Comitê de Ação a Resistência a Fungicidas (Frac), principalmente em áreas de soja em sucessão com algodão. Os relatos de resistência reforçam a necessidade da adoção de estratégias antirresistência, como limitar o número de aplicações de carboxamidas a duas aplicações por ciclo da cultura da soja, e adoção de todas as estratégias no manejo da doença, como a utilização de cultivares resistentes/tolerantes, o tratamento de sementes e a rotação/ sucessão de culturas com milho e/ou outras espécies de gramíneas. Conhecer a reação da cultivar à mancha-alvo é o primeiro passo na definição de um programa de manejo com fungicidas. Muitas cultivares apresentam boa tolerância/resistência a essa doença e não necessitam de controle e para aquelas que precisam, é necessário a escolha do fungicida adequado, uma vez que nem todos apresentam boa eficiência. C

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Cláudia Vieira Godoy, Maurício Conrado Meyer e Ivani de Oliveira N. Lopes, Embrapa Soja Carlos Mitinori Utiamada, Tagro Tecnologia Agropecuária Hercules Diniz Campos, UniRV/ Campos Pesquisa Agrícola Alfredo R. Dias, Fundação Chapadão José Nunes Junior e Cláudia Barbosa Pimenta, CTPA/ Emater – GO Diego Sichocki e Luís Antônio de Sousa Lima, Meta Consultoria Agrícola Eder Novaes Moreira, Fitolab Pesquisa e Desenvolvimento Agrícola Tiago F. Konageski e Fabíola T. Konageski, Rural Técnica Experimentos Agronômicos Ltda. José Fernando J. Grigolli, Fundação MS Luana M. de R. Belufi, Fundação Rio Verde Luís Henrique Carregal, Agro Carregal Pesquisa e Proteção de Plantas Eireli Marcio Goussain Júnior, Assist Consultoria Moab Diany Dias, Universidade Federal do Tocantins Mônica Cagnin Martins, Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa Mônica A. Müller e Josiclea H. Arruda, Fundação MT Valtemir J. Carlin, Agrodinâmica Pesquisa e Consultoria Agropecuária

Sintoma da mancha-alvo nas nervuras de folhas de soja



Soja

Custos e benefícios

Cultivo de soja convencional ganha espaço impulsionado por fatores como oferta de programas de financiamento e bonificações no momento da venda, em um cenário caracterizado por mercado consumidor exigente, uso exaustivo de uma mesma tecnologia e consequente aumento das dificuldades no manejo de plantas daninhas resistentes a glifosato

N

o ano de 1995, nos Estados Unidos da América, por meio da inserção do gene cp4-epsps da bactéria Agrobacterium sp., originou-se o que se denomina atualmente como soja resistente ao glifosato, soja Raundup Rea-

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dy ou simplesmente soja RR. Por volta dos anos 2000, a soja RR chegou de forma ilegal (saca branca) ao Brasil, principalmente via fronteiras com a Argentina e o Paraguai. Rapidamente caiu no gosto do produtor e a pressão por sua regularização aumentou.

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Argumentava-se neste período que o controle de plantas daninhas era beneficiado, e espécies que apresentavam grandes dificuldades de controle, como leiteiro (Euphorbia heterophylla), picão-preto (Bidens pilosa) e corda-de-viola (Ipomoea spp.),


Fotos Emerson Trogello

eram facilmente controlados com a utilização do glifosato em pós-emergência da cultura e da planta daninha. Finalmente, no ano de 2005, a soja RR é legalizada quanto à sua comercialização e semeadura no Brasil, e atualmente o País é detentor do recorde de maior área plantada do mundo, com 34,86 milhões de hectares, superando os Estados Unidos, que apresentam área de 34,09 milhões de hectares. No começo, o produtor ganhava janela de controle, pois era difícil a planta daninha escapar quanto ao estádio de controle, uma vez que o herbicida glifosato tem ação sistêmica e não seletiva. Ainda, resultava em menor custo de produção, pois o herbicida glifosato apresenta baixo custo por área e propicia menor entrada de maquinários e maior capacidade operacional no momento da colheita. Logo depois, outras culturas tiveram sua genética modificada para conferirem a tolerância ao inibidor da EPSPs glifosato, como o milho, o algodão e a canola. Desta forma, há atualmente em algumas áreas a sucessão de culturas que apresentam em sua genética a tolerância ao mesmo mecanismo de ação de controle de plantas daninhas. Na região Centro-Oeste, por exemplo, convencionou-se realizar a sucessão soja RR/milho RR ano após ano, o que gerou dependência do uso do herbicida glifosato. Esta dependência e a simplificação do sistema de controle de daninhas certamente não culminariam em resultados positivos. É preciso sempre lembrar que, os organismos vivos, sejam plantas daninhas, insetos ou fungos/bactérias/ vírus, apresentam variabilidade e podem apresentar em suas populações, indivíduos que sejam naturalmente resistentes a determinado mecanismo de ação de controle. Logo, o foco quase único e exclusivo do controle de plantas daninhas com glifosato acarretou na seleção de algumas espécies resistentes, como azevém (Lolium multiflorum), buva (Conyza spp.), capim-amargoso (Digitaria insularis) e, mais recentemente, em março de 2019, comunicado da Embrapa identificou a resistência presente em indivíduos de leiteiro (Euphorfia heterophylla). Esta última apresenta importância ímpar, pois

Aspectos como custo de produção devem ser comparados e considerados em ambos os cultivos

é de difícil controle por herbicidas e demonstra, agora, biótipos com resistência cruzada aos mecanismos de ação ALS e Protox, além dos inibidores da EPSPs. Seu controle assim fica dificultado a campo e as opções de mecanismos de ação de herbicidas que a controlam, estão cada vez mais escassas. Fica claro que, com a continuada dependência do uso de glifosato, as plantas resistentes aumentarão em espécies e em quantidade de indivíduos, logo, o produtor poderá optar por aumentar a dose de glifosato, maior que aquelas recomendadas em bula que controlam em primeiro momento. Dessa forma, agrava-se o problema. Outra alternativa é aliar o uso do glifosato com outros mecanismos de ação presentes. Devido a ainda eficiência e ao baixo custo, o uso de glifosato vai continuar nas lavouras. Neste contexto, herbicidas que tinham sido drasticamente “excluídos” do sistema produtivo de soja, retornam à composição de manejo, para o controle de indivíduos resistentes. De modo geral, tem-se observado a utilização de herbicidas pré-emergentes (diclosulam, sulfentrazone etc.), além da associação do glifosato com latifolicidas (2,4-D etc.) ou graminicidas (cletodim, fluazifop-P-butil etc.), bem como a associação do glifosato com herbicidas seletivos à soja (clorimuron, imazethapyr etc.). Estas associações e usos variam conforme a flora presente e resistente em cada área. Além do uso de diferentes mecanismos de ação, a estratégia de manejo deve ser modificada. Claro exemplo é o controle de buva em soja RR. O melhor manejo desta daninha consiste em seu controle em estádios iniciais no período de entressafra. É pouco recomendado o

A produtividade do grão é levemente menor no caso da soja convencional

manejo da buva na pós-emergência da soja, devido às poucas opções de herbicidas que podem ser utilizadas (Tabela 1) e ao estádio de desenvolvimento da planta daninha. Da mesma forma, o melhor manejo de capim-amargoso se faz em estádios iniciais, antes do processo de “entouceiramento”. Após este processo, pode ser necessário conciliar manejo mecânico (roçagem) com a utilização de herbicidas graminicidas na pós-brotação. Fica óbvio que a incorporação de mecanismos de ação e estratégias de manejo pode encarecer o sistema produtivo. O custo de controle em áreas com capim-amargoso resistente ao glifosato em estádio de desenvolvimento avançado pode aumentar em 290% e se houver infestação simultânea de buva, o valor pode ser 403% maior. O capim-amargoso, por exemplo, apresenta dificuldades de controle com graminicidas (fenoxaprop e haloxyfop) e seu controle tardio pode demandar aplicações sequenciais que envolvem uma primeira aplicação com herbicidas sistêmicos (exemplo: glifosato e graminicidas)

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Fotos Emerson Trogello

e aplicações sequenciais com herbicidas de contato (glufosinato de amônio e paraquate). Diante disto, a soja convencional está em expansão devido às comparações entre o lucro de produção nas áreas agrícolas. A soja convencional está sendo bonificada em média R$ 7,76 por saca, devido principalmente ao mercado consumidor, com alta demanda por produto livre de transgenia. Desta forma, apesar dos custos de produção serem relativamente mais altos, os valores de venda também são mais valorizados. Cabe ressaltar, ainda, que a produção da soja convencional possui programas de financiamento, o que ajuda a tornar a produção mais rentável. Já com relação ao custo total de implantação da cultura da soja observa-se para a safra 2020/21 um valor estimado em R$ 3.990,60 e R$ 4.102,84 por hectare (Tabela 2), respectivamente para a soja transgênica e a soja convencional (Imea, 2020). Exemplo vantajoso é demostrado na Tabela 3, onde os lucros são obtidos pelo cálculo da simulação da colheita, sendo que, para a safra 2019/2020 espera-se uma produtividade média de 52,1 sacas por hectare. Os lucros da soja convencional foram estimados em R$ 757,30 e da soja transgênica em R$ 677,14 por hectare. Apesar das despesas da soja convencional serem maiores (Tabela 2) e sua produtividade ser levemente menor (Imea, 2020), o pagamento da bonificação sobre o grão no valor médio de R$ 7,76 por saca, torna a sua lucratividade por hectare maior. A soja RR foi desenvolvida para resistir ao herbicida glifosato, reduzir o número de aplicações de herbicidas durante o ciclo da cultura, facilitar o manejo e reduzir os custos. Sua utilização sucessiva, no entanto, selecionou espécies resistentes e atualmente seu uso único como medida de controle já não é eficiente, logo, o produtor deve optar por outros mecanismos de ação, o que tende a encarecer o manejo. Observa-se, assim, que a soja RR gera ganhos de manejo somente nos primeiros anos, pois o uso contínuo do glifosato predispõe o desenvolvimento de plantas daninhas resistentes. E, a partir do quarto ano, a lavoura transgênica exige o mesmo trato cultural das variedades convencionais ou quantidades até maiores de herbicidas. Observa-se, ainda, pressões pelo mercado consumidor e importador, que estimulam as bonificações do produto convencional em momento de venda. Pode-se chegar, assim, a rentabilidades de até 10,6% maior (Tabela 3), quando da utilização de soja convencional. É claro que o glifosato irá continuar a ser peça-chave no sistema produtivo das mais variadas culturas, mas é hora de colocar na ponta do lápis a viabilidade do uso exclusivo de cultivares que apresentem resistência a C esse herbicida.

Produtor deve avaliar com cuidado se uso exclusivo de cultivares resistentes a herbicida é vantajoso

Tabela 1 - Alternativas de herbicidas de controle químico para uso em buva resistente ao glifosato Mecanismo de ação

Grupo químico Ingrediente ativo --- Controle no inverno --Inibidor da ALS (Acetolactato sintase) Sulfoniluréia Iodosulfurom-metílico Metsulfuron-metílico Mimetizador de auxinas Ácido ariloxialcanóico 2,4D --- Na dessecação pré-semeadura --Inibidores do Fotossistema I Bipiridílios Paraquate Dicloreto de paraquate + Diuron Inibidores da Glutamina sintase Homoalanina substituída Amônio-glufosinato Mimetizador de auxinas Ácido ariloxialcanóico 2,4D --- Na pré-emergência da soja --Inibidor da ALS (Acetolactato sintase) Triazolopirimidina Diclosulam Inibidor de Protox Triazolona Sulfentrazona (Protoporfirinogênio oxidase) Ftalimidas Flumioxazin Fonte: https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/56677/1/folder-2011-buva.pdf

Tabela 2 - Custo de produção da safra e componentes em relação ao custo de produção da cultura da soja (transgênica e convencional), na região do Mato Grosso, para a safra 2020/21 Componente do custo Custo variável Despesas de custeio da lavoura Operação com máquinas/implementos Mão de obra Semente de soja Corretivo de solo Macronutriente Micronutriente Fungicida Herbicida Outros custos variáveis Seguro agrícola Despesas financeiras Custo total

Soja transgênica1 (R$ ha) 3.070,61 2.280,69 111,73 118,12 305,75 66,13 755,93 35,92 288,80 173,78 614,52 14,69 175,41 3.990,60

Soja convencional2 (R$ ha) 3.204,05 2.370,90 136,19 129,16 227,98 53,60 750,53 24,85 278,76 184,29 642,20 14,39 190,96 4.102,84

1Produtividade média 60,62 sc/ha; 2Produtividade média 57,34 sc/ha; Dólar mensal: R$ 4,1403. Fonte: Imea 2020

Tabela 3 - Estimativas de lucros com a consideração dos dois sistemas de produção

Emerson Trogello, UFV Giovana Cândida Marques, Lucas Luis Faustino e Ana Caroline de Araújo, Instituto Federal Goiano

Produtividade média (sc/ha) Preço da soja (R$/saca)3 Preço total (R$) Bonificação (R$ 7,76/saca) Preço total + bonificação (R$) Custo de produção de soja/ha (R$) Preço total menos o custo de produção (Lucro)

Covencional1 57,34 77,00 4.415,18 444,96 4.860,14 4.102,84 757,30

Transgênica2 60,62 77,00 4.667,74 4.667,74 3.990,60 677,14

Produtividade média 57,34 sc ha-1. 2Produtividade média 60,62 sc ha-1. 3Rio Verde/GO (Comigo). Atualizado em: 17/03/2020

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Soja Fernando Adegas

Leiteiro resistente A importância cada vez maior do manejo integrado de plantas daninhas em um cenário em que Euphorbia heterophylla se soma aos problemas de resistência ao herbicida glifosato no Brasil. Perdas por dia de convivência podem chegar a 5,1kg/ha na cultura da soja

O

manejo integrado de plantas daninhas (MIPD) pode ser definido pela seleção e a integração de métodos de controle e envolve um conjunto de critérios para a sua utilização, para que os resultados sejam favoráveis do ponto de vista agronômico, econômico, ecológico e social. Nesse contexto é fundamental a eficácia na seleção e no uso dos métodos de controle, observando a importância de cada um no planejamento de manejo a ser adotado na propriedade. Os principais métodos à disposição dos agricultores são preventivo (cuidados na aquisição de sementes, limpeza de

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Plantas resistentes à aplicação de glifosato (esquerda) e suscetíveis ao herbicida (direita)

máquinas e equipamentos, controle em beiras de estrada e carreadores etc.), cultural (rotação de culturas, cobertura de solo, manejo da cultura etc.), mecânico (capinas de repasse, roçada etc.) e químico (rotação e diversificação de herbicidas). Em relação ao controle químico, mais especificamente no sistema de produção de grãos, um assunto ganha cada vez mais importância: o aumento de casos de resistência de plantas daninhas a herbicidas. Resistência é a capacidade das plantas daninhas de sobreviverem à aplicação de um herbicida, a que essa mesma população era suscetível. Trata-se de uma ocorrência natural, devido à evolução e à adaptação das espécies às mudanças do ambiente e ao uso de práticas agrícolas, principalmente a aplicação continuada de um mesmo herbicida, ou de herbicidas com o mesmo mecanismo de ação. Essa situação tem ocorrido com o herbicida glifosato nas áreas de produção de grãos, especialmente no sistema soja/milho, nas quais se utiliza quase exclusivamente o glifosato no controle químico das infestantes. Tal prática tem resultado em forte pressão de seleção de biótipos resistentes ao herbicida. No Brasil, já foi relatada a resistência a nove espécies daninhas (Heap, 2020): o caruru-palmeri (Amaranthus palmeri), o caruru-gigante (Amaranthus hibrydus), o capim-branco (Chloris elata), a três espécies de buva (Conyza bonariensis, Conyza canadenses e Conyza sumatrensis), o capim-amargoso (Digitaria insularis), o capim pé-de-galinha (Eleusine indica) e o azevém (Lolium multiflorum). Recentemente foi relatada suspeita de resistência ao glifosato de uma nova espécie, Euphorbia heterophylla, na região do Vale do Ivaí, no estado do Paraná. Essa espécie, popularmente conhecida como leiteiro, leiteira ou amendoim-bravo, é originária de regiões tropicais, sendo encontrada principalmente em países da América Latina e no Sul dos Estados Unidos. Trata-se de uma herbácea anual, com capacidade de completar até quatro ciclos por ano, podendo atingir até 1,5m de altura. Apre-

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senta folhas relativamente grandes, com até 10cm de comprimento, distribuídas alternadamente no caule. Essa espécie se reproduz exclusivamente por sementes, podendo produzir até três mil sementes por planta (Wilson, 1981). Dentre as principais características que destacam essa espécie como planta daninha estão o elevado índice de área foliar e a capacidade de elongação dos caules, fazendo com que a planta seja excelente competidora por luz (Willard et al, 1994). A temperatura ideal para a germinação das sementes varia entre 25°C e 35°C e a presença de luz não é necessária para que a germinação ocorra (Suda e Giorgini, 2000). As sementes são relativamente grandes, entre 2mm e 4mm, o que permite a germinação mesmo em maiores profundidades no solo, assim como na presença de palha, característica do sistema de plantio direto. A presença de leiteiro competindo com a soja pode ocasionar perdas de 5,1kg/ha por dia de convivência, sendo o período crítico para o início de controle estimado para os 17 dias após a semeadura (Meschede et al, 2002). Estudos mais antigos já demonstraram que, caso nenhuma medida de controle seja realizada, as perdas de produtividade para a soja podem chegar a 47% (Chemale e Fleck, 1982). A variabilidade genética encontrada em populações de E. heterophylla é considerada elevada em comparação com outras plantas daninhas (Frigo et al, 2009). Isso significa que, plantas em uma mesma área apresentam características genéticas muito diferentes, fator que favorece a adaptação da espécie em diferentes sistemas agrícolas e, sobretudo, aumenta as chances de seleção de biótipos resistentes a herbicidas. No passado, notadamente antes da introdução da soja geneticamente modificada para resistência ao herbicida glifosato, essa planta daninha era considerada uma das principais infestantes da cultura da soja, para não dizer a de mais difícil controle pelos sojicultores. Isso ocorria, pois além das especificidades da espécie, a partir da década de


Fotos Fernando Adegas

1990 foram selecionadas populações resistentes ao grupo de herbicidas do principal mecanismo de ação utilizado na época, os inibidores da acetolactato sintase (ALS), o que tornou o controle dessa planta daninha ainda mais difícil e complicado para os sojicultores brasileiros (Gazziero et al, 1998). Com o início do cultivo da soja resistente ao glifosato no País, o controle das populações de E. heterophylla foi muito facilitado, pois esse herbicida passou a ser aplicado duas a três vezes na pós-emergência da cultura. Essa situação também ocorreu na propriedade onde surgiu o relato de escape de controle de leiteiro ao glifosato, na região do Vale do Ivaí, Paraná, desde a safra 2008/2009. A partir da safra 2017/2018 o produtor observou a sobrevivência de algumas plantas dessa espécie após as aplicações de glifosato, nas doses recomendadas. Na safra 2018/2019, a equipe técnica da Cocari - Cooperativa Agropecuária e Industrial, responsável pela assistência técnica a esse agricultor, comunicou a equipe de plantas daninhas da Embrapa Soja sobre a situação, sendo iniciado a partir de então um trabalho para avaliação do caso, seguindo o protocolo para relato de casos de resistência de plantas daninhas a herbicidas, proposto pelo

Comitê de Resistência da Sociedade Brasileira da Ciência das Plantas e do Comitê de Ação a Resistência de Herbicidas do Brasil (HRAC-BR). Primeiramente foi realizada nova aplicação de glifosato na área suspeita, com a dose e a tecnologia de aplicação recomendadas, sendo que as plantas de E. heterophylla novamente não foram controladas pelo glifosato. Na sequência, sementes dos biótipos sobreviventes no campo foram coletadas e levadas para a Embrapa Soja, em Londrina, Paraná, onde foi realizado o primeiro experimento em casa de vegetação, no esquema de dose resposta ao herbicida glifosato. Posteriormente, um segundo experimento foi realizado com as sementes das plantas sobreviventes desse experimento inicial (geração F2), e um terceiro estudo com as sementes coletadas do segundo experimento (geração F3), sempre comparando a população suspeita com uma população suscetível ao glifosato, cujas doses estudadas do herbicida foram (g e.a./ha): 0, 130, 270, 570, 720, 1.080 (padrão), 1.440, 2.160, 4.320, 8.640, 17.280, aplicadas no estádio de quatro folhas verdadeiras. Os resultados confirmaram a suspeita de que a população é resistente ao glifosato. O fator de resistência foi de 4,74 para a dose de controle de 50% da população suspeita em relação à suscetível (DL50) e de 3,30 para a redução da biomassa da população suspeita em relação à suscetível (GR50). Além do trabalho de constatação da resistência, foram realizados estudos sobre alternativas de manejo dessa espécie, tanto em casa de vegetação quanto no campo. Também foram discutidas com a gerência técnica da Cocari, responsável pela assistência técnica da área e parceira nos trabalhos, as ações de monitoramento, mitigação e manejo desse novo caso, de forma a manter esse problema de resistência restrito a essa única área, evitando, portanto, a disseminação. Complementarmente,

estudos sobre a identificação do mecanismo de resistência, estão sendo realizados em ação conjunta com a Universidade Estadual de Maringá e a Colorado State University. A constatação desse novo caso de resistência reforça a certeza de que, em qualquer sistema de produção agropecuária, a prevenção e a solução do problema devem ser sempre baseadas nos conceitos básicos do manejo integrado de planC tas daninhas. Fernando Storniolo Adegas Dionísio Luiz Pisa Gazziero Embrapa Soja Rubem Silvério de Oliveira Júnior Universidade Estadual de Maringá Rafael Romero Mendes Universidade Estadual de Maringá Luciano Junior Rodrigues Cooperativa Agropecuária e Agroindustrial (Cocari)

Daninha apresenta folhas relativamente grandes, distribuídas alternadamente no caule

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Soja

Ponto sensível

D

Dirceu Gassen

O percevejo-marrom é uma praga com alto potencial de danos na cultura da soja, capaz de provocar prejuízos tanto em produtividade como em qualidade de grãos ao inserir seu estilete bucal nas estruturas reprodutivas. Por isso os estádios reprodutivos R4 e R5 são os mais suscetíveis ao ataque e requerem muita atenção e ações de controle por parte dos produtores

os insetos-praga constantemente encontrados na soja, os percevejos fitófagos da família Pentatomidae são considerados os principais causadores de danos econômicos na cultura. Esse grupo de insetos começa sua multiplicação no final do período vegetativo da soja, sendo mais prejudiciais na fase inicial de formação das vagens, embora possam causar danos até a fase final de maturação dos grãos. Dentre as espécies de percevejos que atacam a cultura da soja, destaca-se o percevejo-marrom, Euschistus heros (Hemiptera: Pentatomidae), por ser a espécie mais abundante na região do Cerrado brasileiro. O principal prejuízo do ataque do adulto, bem como das ninfas grandes de E. heros, se dá através da inserção de seu estilete bucal nas estruturas reprodutivas da soja, causando perdas significativas na produção e na qualidade dos grãos ou sementes produzidos, podendo reduzir em até 30% a produtividade da cultura. O controle de percevejos na soja é, frequentemente, realizado através da aplicações de inseticidas químicos na fase reprodutiva da soja, sendo esse controle recomendado a partir do estádio R3, quando forem encontrados dois insetos por metro linear nas fileiras de soja destinadas à produção de grãos e um percevejo por metro de fileira de plantas em lavouras de sementes. Conduziu-se uma pesquisa na Embrapa Agropecuária Oeste que teve como objetivo avaliar o potencial de dano de seis níveis populacionais de adultos de E. heros na cultura da soja, em quatro estádios fenológicos da cultura, sendo este efeito avaliado considerando-se o rendimento e a qualidade dos grãos ou sementes produzidos.

DANOS EM DIFERENTES ESTÁGIOS DA SOJA

Os experimentos foram realizados em condições de campo na área experimental da Embrapa Agropecuária Oeste, município de Dourados, Mato Grosso do Sul (22º16'30"S, 54º49'00"W, 408m), durante a safra 2014/2015. Para tanto utilizou-se a cultivar de soja Brasmax Potência RR que apresenta crescimento do tipo indeterminado, sendo a semeadura e a condução da cultura realizadas segun30

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Crébio José Ávila

do as recomendações para o cultivo da soja na região. Quando as plantas de soja atingiram o estádio V8, constituído por oito trifólios completamente desenvolvidos, as unidades experimentais (parcelas) foram demarcadas na área experimental. Cada parcela foi composta de duas fileiras de soja com 1m de comprimento cada, abrangendo 20 plantas, onde foram instaladas as gaiolas confeccionadas com estruturas de PVC (1m de comprimento por 0,90m de largura e 1,2m de altura), cobertas com tecido do tipo “tule” (Figura 1). No interior de cada gaiola foram realizadas as infestações com diferentes densidades populacionais do percevejo adulto de E. heros (0, 2, 4, 6, 8 e 10 percevejos/gaiola) em quatro diferentes estádios fenológicos da cultura (V8, R2, R4 e R5). Cada tratamento (densidades populacionais do percevejo) contou com quatro repetições conduzidas no delineamento de blocos ao acaso. Diariamente as gaiolas eram inspecionadas para o monitoramento dos percevejos, e quando os insetos eventualmente morriam, era feita reposição. Para facilitar o monitoramento e a visualização dos percevejos, colocou-se na superfície do solo abrangido pelas gaiolas, areia de coloração branca. As infestações foram mantidas durante o período de 14 dias e, ao final, as gaiolas foram retiradas e as plantas de soja pulverizadas com inseticida químico para a eliminação dos insetos presentes no interior das gaiolas, sendo esta operação também repetida semanalmente até a completa maturação dos grãos da cultura. Colheu-se a soja proveniente da área abrangida pelas gaiolas, sendo os grãos trilhados, pesados e determinado o rendimento de grãos/ha em cada tratamento. Para o diagnóstico da qualidade dos grãos produzidos, realizou-se o teste de tetrazólio nas sementes de soja colhidas apenas nos tratamentos em que houve infestação nos estádios R4 e R5 da cultura, seguindo o protocolo de França Neto et al (1998). Os dados de rendimento de grãos foram submetidos a análise de regressão ao nível de 5% de significância. Já os parâmetros de qualidade das sementes

Figura 1 - Detalhes das gaiolas confeccionadas a partir de conexões de PVC, cobertas com tecido “tule” e instaladas nas parcelas da área experimental do ensaio de danos do E. heros na cultura da soja. Dourados, MS

obtidas pelo teste de tetrazólio foram submetidos à análise de variância e, quando constatados efeitos significativos de tratamento, as médias dos tratamentos foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

RESULTADOS OBTIDOS

Não foi constatada significância na análise de regressão entre as densidades populacionais de percevejos infestadas nas gaiolas e o rendimento de grãos/ ha para os experimentos instalados nos estádios vegetativo V8 e reprodutivo R2 da soja (Figura 2). Todavia, o aumento da densidade populacional de E. heros nas plantas de soja presentes nas gaiolas afetou negativamente o rendimento de grãos quando os ensaios foram conduzidos nos estádios R4 e R5 da cultura (Figura 2). Verificou-se também que a porcentagem de germinação e de vigor das sementes de soja não foi afetada pelas diferentes densidades populacionais do percevejo quando a infestação foi realizada nos estádios tanto R4 quanto R5 (Tabela 1). No entanto, a porcentagem de sementes com danos (picadas) causados pelo percevejo (1 a 8) foi significativamente influenciada em todas as densidades do percevejo testadas quando comparado ao tratamento testemunha (sem infestação) para os ensaios conduzidos nos estádios fenológicos R4 e R5, sem que diferisse entre as densidades avaliadas do percevejo (Tabela 1). Da mesma forma, as taxas de sementes que

apresentavam picadas e as inviabilizadas pelo percevejo (6 a 8) foram também significativamente elevadas para todas as densidades populacionais de percevejos estudadas nos ensaios conduzidos em R4 e R5, quando comparado ao tratamento sem infestação (Tabela 1). A não significância entre densidade populacional de percevejos e o rendimento de grãos de soja/ha é algo bem documentado para os representantes de percevejos da família Pentatomidae, quando os ensaios são instalados no estágio vegetativo da soja ou até mesmo nos estádios R1 e R2. No entanto, esse fato pode ser agravado quando as densidades populacionais de E. heros estiverem associadas ao estágio fenológico crítico da cultura, ou seja, naquele estágio em que as plantas de soja estão mais suscetíveis aos danos ocasionados pelos percevejos, que é o início das fases de enchimento dos grãos na cultura (R5.1). Scopel et al (2016) também constataram que uma densidade do percevejo-marrom de 12 percevejos/m2, na fase vegetativa da soja (V6), não afetou o rendimento de grãos da cultura. Da mesma forma, Corrêa-Ferreira (2005) verificou que populações de E. heros e de Piezodorus guildinii (Westwood, 1837) com até oito percevejos/planta de soja também não apresentaram diferenças no rendimento de grãos quando as infestações ocorreram entre o final do período vegetativo (V9) ou no estádio de florescimento pleno da soja (R2), como também foi observado na presente pesquisa. Entretanto, a diminuição no rendimento de grãos de soja é possível, quando a infestação de percevejos E. heros ocorre a partir do estádio R4. Scopel et al (2016) verificaram que infestações com apenas 0,5 percevejo/m2 no início

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Figura 2 - Rendimento de grãos de soja (kg/ha) em função de níveis de infestação de percevejos adultos de E. heros em diferentes estádios de desenvolvimento (V8, R2, R4 e R5) na cultura da soja. Dourados, MS

do estádio de desenvolvimento de grãos (R5.1) é suficiente para causar redução significativa do rendimento de grãos, à semelhança do observado neste trabalho para as infestações realizadas nos estádios R4 e R5, embora com maiores densidades do percevejo. A porcentagem de sementes que apresentaram danos pelos adultos de E. heros foi significativamente influenciada em todas as

diferentes densidades utilizadas do percevejo nas gaiolas quando comparado ao tratamento testemunha (sem infestação). As taxas de sementes picadas ou consideradas inviabilizadas pelos percevejos (6 a 8) foram também significativamente elevadas para todas as densidades populacionais de percevejos testadas nos ensaios conduzidos em R4 e R5, quando

Tabela 1 - Germinação e vigor (%) de sementes de soja, sementes com injúrias (1 a 8) e inviáveis pelos percevejos (6 a 8), segundo o teste de Tetrazólico¹, quando as plantas de soja foram submetidas a diferentes níveis populacionais de adultos de Euschistus heros nos estádios fenológicos R4 e R5 da cultura. Dourados, MS Estádio R4 Estádio R5 Número de percevejos/gaiola Germinação (%) Vigor (%) 1 a 8 (%) 6 a 8 (%) Germinação (%) Vigor (%) 1 a 8 (%) 6 a 8 (%) 89,2ns 0 81,7ns 0,0 b 00,0 b 89,2ns 81,7ns 0,0 b 00,0 b 90,2 2 85,0 3,7 a 21,3 a 90,2 85,0 3,7 a 21,3 a 90,7 4 86,7 3,0 a 20,3 a 90,7 86,7 3,0 a 20,3 a 92,0 6 88,0 3,7 a 23,2 a 92,0 88,0 3,7 a 23,2 a 89,7 8 85,7 5,0 a 27,2 a 89,7 85,7 5,0 a 27,2 a 89,7 10 84,5 5,0 a 23,5 a 89,7 84,5 5,0 a 23,5 a 7,9 Cv(%) 8,0 54,7 22,5 7,9 8,0 54,7 22,5 Médias seguidas de mesma letra na coluna não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. ns Não significativo pelo teste F (p < 0,05) ¹Metodologia empregada segundo França-Neto (1998)

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comparado ao tratamento sem infestação (testemunha). Com base nos resultados obtidos nesta pesquisa pode-se inferir que medidas de controle do percevejo E. heros na soja são desnecessárias na fase vegetativa e até mesmo no seu pleno florescimento (R2), mesmo que essa praga esteja ocorrendo em altas densidades populacionais nestes estádios de desenvolvimento da cultura. No entanto, os estádios reprodutivos R4 e R5, evidenciaram que são suscetíveis ao ataque de E. heros e, desta forma, requer atenção e ações de controle por parte dos produtores, para a prevenção da redução de produtividade e da qualidade dos grãos C de soja produzidos.

Crébio José Ávila, Embrapa Agropecuária Oeste Paulo Henrique R. Fernandes e Ivana Fernandes da Silva, Universidade Federal da Grande Dourados



Informe Paulo Sergio dos Santos Phytus Club

Cultivar

Aplicação eficiente Adjuvante condicionador de calda combinado com ponta de pulverização correta ajuda a melhorar o depósito e a cobertura das gotas da mistura de fungicida e inseticida no terço inferior das plantas na cultura da soja

A

mistura em tanque de fungicidas curativos e protetores com inseticidas e adjuvantes é uma prática comum e essencial na cultura da soja devido à redução dos custos

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e ao aumento da eficiência no manejo de pragas e doenças. Para melhorar o controle realizado pelos defensivos, é necessário que estes estejam distribuídos de maneira uniforme e em quantidade

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adequada em todo o dossel da planta. A adição de Nutrol Max à calda de pulverização promove mudanças na qualidade da aplicação (deposição e cobertura) por alterar as propriedades físico-químicas da calda e, consequentemente, aumentar o espalhamento e a interação que os defensivos terão com a superfície foliar. Nutrol Max é um óleo metilado premium multifuncional sem tempo de ruptura, composto por éster metílico de óleos vegetais associado a repelente de inseto. É um concentrado emulsionável de óleos refinados biodegradáveis, podendo substituir outros óleos emulsionáveis em água, como os vegetais e minerais. Apresenta alta solubilidade e compatibilidade com defensivos e suas misturas, como as novas biotecnologias (Dicamba). Não causa fitotoxicidade e efeito lupa, sendo eficiente em baixa dose. Nesse contexto, o objetivo do trabalho foi avaliar o depósito e a cobertura das gotas da mistura de fungicida e inseticida com e sem adição


Figura 1 - Depósito e cobertura com diferentes pontas de pulverização sem e com Nutrol Max

de Nutrol Max aplicada com pontas de pulverização de jato plano simples, cone cheio e cone vazio.

METODOLOGIA

A pesquisa foi conduzida pela equipe do laboratório do Núcleo de Investigação em Tecnologia de Aplicação e Máquinas Agrícolas (Nitec) da Universidade Estadual do Norte do Paraná (Uenp), em Bandeirantes, Paraná. O ensaio foi realizado a campo, composto por seis parcelas de 10m de largura x 10m de comprimento, espaçadas em 5m entre si. Os tratamentos seguiram o esquema fatorial 2 x 3, duas caldas pulverizadas por três modelos de pontas de pulverização. As caldas utilizadas foram compostas pela mistura do fungicida trifloxistrobina, 150g/L + protioconazol, 175g/L na dose 0,4L/ha com o inseticida tiametoxam, 141g/L + lambda-cialotrina, 106g/L na dose de 0,35L/ha com e sem adição de Nutrol Max a 0,1%, v/v. No preparo das misturas foi adicionado marcador azul brilhante na concentração de 6g/L. As pontas utilizadas foram de jato plano simples AXI 11002 (400kPa), jato cone cheio JFC 8002 (700kPa), ambas gerando gotas finas, e jato cone vazio ATR 2.0 (700kPa), gotas muito finas. O espaçamento entre pontas utilizado foi de 0,5m. Para a ponta AXI11002, a pulverização foi realizada na velocidade de 11km/h com altura de barra 0,5m do ponto mais alto da lavoura. Para as pontas JFC 8002 e ATR 2.0, a velocidade de aplicação foi de 14,5km/h, enquanto a altura da barra foi 0,75m. A taxa

de aplicação foi de 100L/ha, para todas as pulverizações. Durante a realização do ensaio, a temperatura foi de 27oC±1,0, umidade relativa do ar de 32±2% e velocidade do vento de 9,45km/h±1,2 com predominância do vento na direção SW. Foram coletados folíolos em 20 pontos amostrais para cada tratamento. Para a análise de depósito foi utilizada a técnica de espectrofotometria e para a análise de cobertura, foi utilizado software de análises de imagens (WinDias).

RESULTADOS

Na Figura 1 estão apresentados os resultados de depósito (a) e cobertura (b) no estrato inferior das plantas, e na Figura 2 a distribuição espacial das gotas no alvo em função dos modelos de pontas de pulverização sem e com Nutrol Max.

CONSIDERAÇÕES

A eficiência da aplicação, entre outras coisas, depende da calda de pulverização e da ponta utilizada. O aumento da qualidade da calda proporcionado pelo Nutrol Max combinado com a ponta ATR 2.0 (gotas muito finas) foi a associação que mais aumentou o depósito e a cobertura no terço inferior das plantas, em comparação com a mistura C isolada dos defensivos. Antônio A. C. Tavares, João V. Oliveira, José G. C. Theodoro, Waldyr A. B. Cunha, Adenilson S. Silva, Matheus P. Ronqui e Rone B. Oliveira, Univ. Estadual do Norte do Paraná (Uenp)

Figura 2 - Distribuição espacial das gotas no alvo em função dos modelos de pontas de pulverização sem e com Nutrol Max

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Trigo

Monitorar e manejar O ano de 2019 foi bastante favorável à ocorrência de pulgões e transmissão de vírus como o nanismo-amarelo na cultura do trigo. A importância destas epidemias tem levado a iniciativas para facilitar o monitoramento e a tomada de decisão de manejo desses afídeos. Esforços incluem o uso da Tecnologia de Informação

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Fotos Douglas Lau

m 2019, na época de implantação da cultura de trigo, havia questionamentos se seria um ano favorável à ocorrência de afídeos e de vírus transmitidos. Em um cenário de temperaturas acima da média em abril, maio e junho, suspeitava-se de maiores probabilidades de que nesta safra ocorressem problemas associados com pulgões em trigo e uma das perguntas era como manejá-los. A temperatura é um dos principais fatores que regulam o desenvolvimento e reprodução dos insetos. Quanto mais próximo de temperaturas entre 18°C e 25°C, maiores são as taxas de desenvolvimento e de reprodução de afídeos (pulgões) de cereais de inverno. Por outro lado, chuva é prejudicial aos insetos. O mês de abril apresentava precipitações próximas à média histórica, no entanto, maio foi marcado por volume acima da média. Assim, até aquele momento temperatura e precipitação estavam se contrapondo. Até abril, as populações de pulgões eram moderadas, mas em maio ocorreu redução significativa. Historicamente, devido ao declínio de temperatura do outono para o inverno (meses de junho e julho) a população de afídeos se reduz. Para a região do Planalto Médio um ponto crítico para determinar a importância das epidemias de nanismo-amarelo na safra de trigo é o momento e a intensidade do pico de afídeos ainda durante o inverno. Quanto mais cedo e quanto maior forem as populações, maior a incidência da virose e maiores os danos associados ao nanismo-amarelo. Assim, após os primeiros 20 a 30 dias da emergência do trigo é fundamental o monitoramento e aplicação de inseticidas caso seja atingido o nível de 10% de plantas com pulgões. Em 2019 a retomada no crescimento das populações ocorreu mais cedo que o registrado na última década. Além disso, o crescimento populacional foi intenso atingindo o maior pico não-outonal da última década. Os motivos para esse intenso crescimento são discutíveis. O inverno mais seco pode ter contribuído. Junho, julho, agosto e setembro foram marcados por precipitações bem abaixo da média normal histórica (apenas 261,7 mm acumulados neste período esse ano, contra 680,9 mm da normal histórica). Além disso, as mais baixas populações de inimigos naturais (sobretudo de parasitoides) pode

ter sido incapaz de conter o rápido crescimento das populações de afídeos em um ambiente favorável. Associado a esse crescimento populacional verificou-se uma elevada incidência de nanismo-amarelo. Em parcelas sem inseticidas a incidência média chegou a 28% de plantas com sintomas (variando de acordo com a suscetibilidade do material genético). A estratégia de manejo mais eficiente, que mais se aproximou do tratamento com aplicação semanal de inseticidas, combinou a aplicação em parte aérea e o trata-

Populações de afídeos em armadilhas em Coxilha, RS no período de janeiro de 2017 a outubro de 2019. (Fonte TrapSystem: http://gpca.passofundo.ifsul.edu.br/traps/system.php)

Comparativo das populações de afídeos na região do Planalto Médio do Rio Grande do Sul durante a safra de trigo para as safras de 2011 a 2019. (Fonte TrapSystem: http://gpca.passofundo.ifsul.edu.br/traps/system.php)

Sintomas de nanismo-amarelo causado por Barley yellow dwarf virus e transmitido por pulgões em trigo Mês Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro

Temperatura °C Média 2019 Normal 19,2 17,6 16,5 15,2 15,8 12,9 12,3 13,3 13,6 13,9 16,4 15,7

Precipitação (mm) Normal Total 2019 99,7 107,1 114,3 245 133,6 28,8 161,8 112,8 187,8 64,3 197,7 55,8

Fonte Embrapa Trigo - Embrapa Trigo. Laboratório de Agrometeorologia. Informações Meteorológicas. Disponível em http://www.cnpt.embrapa.br/pesquisa/agromet/ app/principal/relatorioMet.php?ano=2019&mes=08>. Acesso em 17 out. 2019.

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Sintomas de nanismo-amarelo causado por Barley yellow dwarf virus (BYDV-PAV) em trigo. À esquerda plantas sem o vírus. À direita plantas inoculadas com o vírus com evidente redução de estatura

Detalhes dos sintomas de nanismo-amarelo causado por Barley yellow dwarf virus (BYDV-PAV) em espigas de trigo. À esquerda planta sem o vírus. À direita planta inoculada com o vírus. Além do típico sintoma de amarelecimento das folhas que ocorre no sentido do ápice para a base da folha, há redução do tamanho das espigas

mento de sementes (incidência média de 5%), seguido de aplicação apenas em parte aérea (8%) e tratamento de sementes (18%). Em 2019, nessa região, o tratamento de sementes (TS) contribuiu para o manejo, com redução média de 10% de incidência da virose, mas não foi suficiente, pois o crescimento das populações ocorreu fortemente em agosto, quando a ação do TS já estava reduzida. Os danos associados a virose são variados e dependem da genética. O sintoma normalmente visualizado pelos produtores e técnicos é o amarelecimento das folhas no sentido ápice para a base. Mas a virose tem seus efeitos muito antes de ser visualizada

por esse amarelecimento. Ao ser introduzido no sistema vascular da planta durante o ato alimentar dos afídeos, o vírus promove a degeneração das células do floema. Um dos primeiros sintomas é a redução do crescimento das raízes devido à dificuldade de translocação de fotoassimilados para esse órgão. Com as raízes menos desenvolvidas todo o crescimento da planta e capacidade de resistir a estresses bióticos e abióticos é comprometida. As plantas têm redução de crescimento de toda a massa da parte aérea. No espigamento, são evidentes a diminuição no tamanho das espigas e também esterilidade basal e apical que muitas vezes podem lembrar ou-

Plataforma integrada para monitoramento, simulação e tomada de decisão no manejo de epidemias causadas por vírus transmitidos por insetos TrapSystem: plataforma que armazena, organiza e permite visualizar os dados de monitoramento de insetos. Desenvolvido em parceria com o IFSul Passo Fundo. Endereço: http://gpca.passofundo.ifsul.edu.br/traps/system.php AphidCV: software que automatiza a contagem, classificação e morfometria de afídeos. Desenvolvido em parceria com a Universidade de Passo Fundo. https://www.upf.br/noticia/ pesquisadores-trabalham-em-nova-versao-de-software-para-contagem-e-classificacao-de-pulgoes ABISM: modelo se simulação de populações de insetos. Desenvolvido em parceria com IFSul Passo Fundo e Universidade de Passo Fundo. http://200.132.58.15:6538/ABISM/

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tros tipos de injúrias. Um sintoma de final de ciclo associado a infecção é o escurecimento das espigas, fenômeno conhecido como “espiga chocolate”. A espiga chocolate foi muito comum no Planalto Médio em 2019 e, geralmente, técnicos e produtores confundem o diagnóstico desse fenômeno. A severidade dos sintomas é variável de acordo com o material. A infecção viral em início de ciclo compromete, em média, de 40% a 50% do potencial produtivo das plantas de trigo infectadas. Em parcelas de campo, a média de rendimentos em 2019 para o manejo adequado do nanismo-amarelo (tratamento de sementes + aplicação em parte área quando atingido 10% de plantas com pulgões) rendeu 71 sacas por hectare. Em contraposição, na testemunha sem inseticidas o rendimento foi de 48 sacas/hectare.

INICIATIVAS PARA MONITORAMENTO E MANEJO DE AFÍDEOS

A Rede de Monitoramento de Pragas em Cereais de Inverno é uma ação coordenada pela Embrapa Trigo, criada em 2015 junto com parceiros nos estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Minas Gerais e Mato Grosso. O objetivo é monitorar, por meio de armadilhas e experimentos de campo, populações de insetos pragas, relacionando os níveis populacionais ao dano econômico causado para estabelecer sistemas de alerta para a tomada de decisão do manejo da lavoura. O alvo do trabalho é o monitoramento de afídeos, insetos conhecidos popularmente como pulgões, que podem causar danos diretos e indiretos ao trigo. Quando se alimentam das plantas, os afídeos transmitem o Barley yellow dwar virus, vírus que causa o nanismo-amarelo em vários cereais de inverno. Em média, plantas de trigo infectadas pelo vírus no início de seu desenvolvimento podem ter o rendimento de grãos comprometido entre 40% e 50%. Como o nome indica, a planta infectada sofre nanismo, redução do crescimento, tem o sistema vascular degenerado e amarelecimento das folhas, o que prejudica a fotossínte-


Tabela 1 - Cultivares de trigo, nota média da avaliação visual da reação, produção de grãos de plantas não inoculadas (NI) e inoculadas (I) com BYDV-PAV (agente causal do nanismo-amarelo) e porcentagem de dano. Embrapa Trigo, Passo Fundo, 2018 Cultivar CD 1705 CD 1303 TBIO Sinuelo ORS Vintecinco LG Supra BR 35 (TT)(4) BRS Timbaúva (TT)(4) LG Fortaleza BRS Belajoia TBIO Sossego LG Oro LG Cromo BRS 327 ORS 1402 Inova FPS Certero BRS Marcante BRS Reponte TBIO Noble TBIO Sintonia TBIO Alpaca ORS 1405 ORS Madre Perola Ametista Esporão TBIO Iguaçu Embrapa 16 (TI)(4) TBIO Sonic BR 14 (TI)(4) FPS Amplitude TBIO Toruk ORS 1403 ORS 1401 TBIO Audaz Média

Nota(1) 2,6 3,0 3,6 3,4 3,7 2,7 3,4 3,6 2,9 3,6 3,3 3,4 3,6 4,2 3,4 3,4 3,9 3,4 4,2 3,9 4,7 4,1 3,6 4,5 3,9 4,2 4,8 4,8 5 4,4 4,9 4,6 4,7 5 3,9

NI (g/vaso)(2) 38,2 38,9 33,3 42,4 31,8 31,8 31,9 35,1 33,9 38,4 36,1 35,4 40,8 43,1 35,2 44,2 38,2 43,4 30,5 33,7 39,5 37,7 37,3 32,9 41,0 41,3 38,3 40,4 30,8 41,4 39,1 38,9 41,2 39,8 37,5

I (g/vaso)(2) 31,8 31,9 27,1 33,7 24,4 24,4 24,1 26,3 25,0 26,6 24,4 23,8 26,6 27,3 21,7 27,2 23,2 25,8 17,6 19,4 22,5 20,5 19,5 15,6 18,5 18,5 15,2 15,5 11,6 14,4 13,4 13,1 10,4 5,0 21,3

Dano %(3) 16,8 18,0 18,5 20,6 23,0 23,2 24,5 25,0 26,5 30,6 32,5 33,0 34,9 36,7 38,3 38,5 39,3 40,5 42,4 42,4 43,1 45,8 47,6 52,5 54,8 55,2 60,4 61,7 62,5 65,3 65,8 66,3 74,8 87,5 42,6

Nota - redução visual na estatura e na massa da parte aérea, comparando-se plantas inoculadas com não inoculadas. Cores das células para Nota: < 2 (verde escuro); ≥ 2 e < 3 (verde claro); ≥ 3 e < 4 (amarelo); ≥ 4 e < 5 (laranja); e 5 (vermelho); 2NI - produção de grãos (g/vaso) para “plantas não inoculadas”; I - produção de grãos (g/vaso) para “plantas inoculadas”. Cores das células para NI e I: verde (maior que a média +1 desvio padrão); amarelo (entre a média e ±1 desvio padrão); vermelho (menor que a média -1 desvio padrão). 3Dano % = (NI - I)/(NI)*100. Cores das células para Dano: verde (menor que a média -1 desvio padrão); amarelo (entre a média e ±1 desvio padrão); vermelho (maior que média +1 desvio padrão); 4TT = testemunha tolerante; TI = testemunha intolerante. 1

se e a produção de grãos. O controle biológico e o controle químico dos afídeos e a resistência genética (ao vetor e ao vírus) são estratégias de manejo dessa virose.

USO DA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO

A necessidade de desenvolver uma ferramenta para registrar todas as informações coletadas na rede experimental aproximou os pesquisadores da área de Tecnologia da Informação (TI) dos pesquisadores da área agronômica e biológica (entomologistas e virologistas). Assim, no âmbito do projeto Plataforma integrada para monitoramento, simulação e tomada de decisão no manejo de epidemias causadas por vírus transmitidos por insetos foram desenvolvidos três softwares para apoio tanto na criação da base de dados quanto no suporte à tomada de decisão de controle de praC gas nas lavouras.

Efeito do manejo com inseticidas na incidência (%) de nanismo-amarelo (em verde) e no rendimento (sacas/hectare) de trigo. TT – tratamento com aplicação semanal de inseticidas. TS – tratamento de sementes. PA – aplicação de inseticidas em parte área. TS+PA – tratamento de sementes e aplicação de inseticidas em parte área. SI – sem inseticidas.

Douglas Lau, José Maurício Cunha Fernandes e Alberto Luiz Marsaro Júnior, Embrapa Trigo Alexandre Tagliari Lazzaretti, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense Paulo Roberto Valle da Silva Pereira, Embrapa Florestas Roberto Wiest, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense Rafael Rieder, Universidade de Passo Fundo Marcus Vinicius Sampaio, Universidade Federal de Uberlândia Alfred Stoetzer e Marielli Ruzick, Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária Cinei Teresinha Riffel, Sociedade Educacional Três de Maio Elderson Ruthes e William Iordi do Anjos, Fundação ABC Janine Palma, Cooperativa Central Gaúcha Ayres de Oliveira Menezes Júnior, Universidade Estadual de Londrina Luiza Rodrigues Redaelli e Simone Mundstock, Universidade Federal do Rio Grande do Sul Carlos Diego Ribeiro Dos Santos, UFRGS Juliana Pivato, PIBIC/CNPq - Embrapa Trigo Monique D’Agostini e José Roberto Salvadori, Universidade de Passo Fundo Patrícia Sobral Silva, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Mato Grosso Paulo Eduardo Branco Paiva, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecn. do Triângulo Mineiro www.revistacultivar.com.br • Junho 2020

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Trigo

Destinação diversificada Além de ganhos técnicos na cobertura do solo e favorecimento do manejo de daninhas, pragas e doenças, o cultivo do trigo necessita garantir renda aos produtores. Por isso é preciso estar atento às oportunidades de negócios em setores como os de exportação, ração animal e produção de biscoitos

A

triticultura, especialmente no Sul do Brasil, é uma atividade consolidada e fundamental para a sustentabilidade dos sistemas de produção de grãos ou que integram a lavoura com a pecuária. Apesar de a soja ser a principal cultura econômica nessa região, o trigo e outras culturas de inverno representam parceria importante para a composição de sistemas diversificados. Algumas vezes os impactos diretos do trigo não são reconhecidos, pois as margens de ganho econômico são menores que as da soja e em alguns casos podem ser negativas. Entretanto, deve-se computar os ganhos técni-

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cos proporcionados pelo trigo, que vão desde a produção de palhada e adequada cobertura do solo, contribuindo para a redução da erosão e a melhoria da sua qualidade, passando pelo auxílio no combate a plantas daninhas de difícil controle, até a quebra do ciclo de pragas e doenças. Além dos ganhos técnicos, existem, atualmente, oportunidades de negócio que podem proporcionar maior liquidez e/ou rentabilidade à triticultura, aumentando a possibilidade da cultura do trigo agregar valor aos sistemas de produção em que está inserida (Figura 1). Para entender essas oportunidades, é importante a análise


Fotos João Leonardo Pires

de alguns fatores como a oferta de tecnologias para a diversificação de modelos de produção e de negócios com trigo; as ofertas ambientais/ riscos climáticos inerentes a cada região produtora; as demandas prioritárias dos mercados internos e externos e as relações entre potencial produtivo, facilidade em obter a qualidade tecnológica demandada, custo de produção e receita obtida. Há oferta de cultivares e práticas de manejo específicas que possibilitam a produção de trigo para diferentes finalidades (Figura 1): uso em duplo propósito – DP (produção de forragem e grãos); produção de trigo com diferentes classes comerciais (melhorador, pão, doméstico, básico e outros usos); com características especiais como trigo branqueador e para produção de biscoitos; uso em modelos destinados à exportação (com prioridade para a Ásia e a África); e emprego na composição de rações para suínos e aves. No que se refere a cultivares, a Embrapa tem materiais que podem

Nabo emergindo na cultura do trigo

Atualmente há oportunidades de negócio que podem proporcionar maior liquidez e/ou rentabilidade ao produtor

ser utilizados para diferentes fins. Por exemplo, BRS Tarumã e BRS Pastoreio, para pastejo e grãos; BRS Reponte, para exportação/ração; BRS Marcante, da Classe Pão; BRS 327, para produção de farinha branqueadora; BRS 374, para produção de biscoitos; e BRS Belajoia, para rentabilidade/menor custo de produção. As condições ambientais e de uso de tecnologia da principal re-

gião produtora do País também devem ser consideradas, pois impõem dificuldades ou maior probabilidade de produção em relação ao potencial produtivo e à qualidade tecnológica. Por exemplo, no Norte do Paraná, é esperada, na maioria das safras, a obtenção de trigos das classes Melhorador e Pão. Por sua vez, no Rio Grande do Sul isso pode ser mais raro, apesar dos avanços

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Fotos João Leonardo Pires

Figura 1 - Oportunidades para diversificação da produção e de modelos de negócio disponíveis para trigo no Brasil. *ILP = integração lavoura e pecuária

É possível produzir trigo para diferentes finalidades

tecnológicos que ocorreram nas últimas décadas e que aumentaram essa probabilidade. Portanto, produtores de cada uma dessas regiões já partem, no planejamento de suas lavouras, de um histórico mais ou menos favorável à obtenção de trigos com determinadas especificações tecnológicas e, consequentemente, com diferentes oportunidades como modelo de negócios. Entendendo essas realidades distintas (e hoje há muito conhecimento sobre isso), é possível escolher a(s) opção(ões) com maior chance de sucesso para cada caso. A demanda da indústria de trigo nacional é maior por trigos da classe Pão e podem buscar esse produto tanto de triticultores brasileiros quanto de outros países, com destaque para a Argentina. O problema é que, em muitas situações, afirma-se que o produto nacional não atingiu o padrão demandado pela indústria nacional e não há outra forma de comercialização, havendo a sua desvalorização. A exportação e o atendimento de outras demandas internas, portanto, surgem como alternativas para comercialização, se não para maior rentabilidade, pelo menos servindo para melhorar a liquidez. Um exemplo dessas possibilidades são sistemas destinados à exportação. Alguns países, especialmente da Ásia e da África, demandam trigo com qualidade tecnológica compatível com as possibilidades de produção (com maior segurança) de algumas regiões do Sul do Brasil, em especial do Rio Grande do Sul e parte de Santa Catarina e Paraná. Por três anos, a Embrapa, a Federação das Cooperativas do Rio Grande do Sul e algumas cooperativas gaúchas desenvolveram estudos de validação de um sistema de produção com foco na exportação. Esse sistema está fundamentado no uso de cultivares com elevado potencial produtivo, menor custo de produção possível com a melhor tecnologia e obtenção de qualidade tecnológica compatível com a demanda dos países-alvo. O trabalho,

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realizado por meio de Unidades de Validação, conduzidas pelos participantes em diferentes realidades de produção representativas da região produtora do Rio Grande do Sul, apresentou resultados promissores. A comparação de sistemas para exportação com o sistema de manejo utilizado pela maior parte dos produtores em cada local proporcionou ganhos de rentabilidade na maioria dos casos (Figura 2) com a produção de trigo compatível com as características desejadas pelos países importadores (mais baseada em porcentagem de proteína do que em força de glúten). Essa questão parece contraditória, exportar trigo, sendo o Brasil um dos principais países importadores. Mas é importante entender o contexto. A produção no Brasil está distante dos principais centros consumidores e o transporte encarece o produto. A indústria nacional não absorve toda a produção de trigo, especialmente no Rio Grande do Sul. E, assim, esse excedente de produção (com potencial para aumento de área e produção) precisa de outras formas de escoamento/uso. É necessário mudar o conceito há muito tempo pensado para o trigo nacional, que tinha foco em garantir a autossuficiência

Pires e Caierão demonstram possibilidades de diversificação e agregação de valor


do País, para uma produção voltada aos mercados nacional e internacional, que busque contribuir para a viabilidade técnica e econômica das propriedades onde o trigo está inserido, desligando da triticultura brasileira o foco exclusivo do abastecimento interno. Outra oportunidade interessante é absorver parte da produção na própria região. Santa Catarina e Rio Grande do Sul são grandes produtores de suínos e aves e a redução da produção de milho nesses estados tem criado a oportunidade para o uso de outras fontes na composição de rações. Alguns estudos têm demonstrado que o trigo, do ponto de vista nutricional, é compatível com as necessidades nutricionais desses animais. Também, contribui a favor dessa oportunidade o fato de as características de qualidade desse tipo de trigo serem mais facilmente obtidas mesmo com a variabilidade climática inerente ao Sul do Brasil. Como principal indicador de qualidade exigido pode-se citar o teor de proteína nos grãos (como referência, o valor de 12% como limite inferior). Da mesma forma que o uso para exportação, essa alternativa está baseada no emprego de cultivares com elevado potencial de rendimento e com baixo custo de produção. Diferentes iniciativas de cooperativas, principalmente em Santa Catarina, têm surgido nos últimos anos, em associação com indústrias de proteína animal e o governo estadual, incentivando a semeadura de trigo/triticale para essa finalidade. O mercado de trigos para produção de biscoitos representa em torno de 15% a 20% no Brasil. Trata-se de um segmento do mercado de farinhas no País com exigência de características de qualidade tecnológica específicas. Muitas cooperativas recebem os grãos desses materiais com diferencial adicional de preço. Trigos das classes Pão e Melhorador representam o maior percentual da demanda nacional do cereal

e podem ter maior liquidez e/ou bonificação. Atualmente, cultivares indicadas para cultivo apresentam combinações variadas do perfil de panificação com diferentes atributos agronômicos, sejam eles alto potencial de rendimento de grãos, tipo de planta diferenciado, associação com tolerância/resistência a diferentes estresses bióticos e abióticos. Obviamente, devido às condições climáticas da região Sul do Brasil, especialmente Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Sul do Paraná, o perfil de qualidade tecnológica de algumas cultivares nem sempre atinge o padrão dessas classes. Trigos branqueadores representam um nicho de mercado altamente valorizado e com grande liquidez. Por definição são enquadradas nesse grupo cultivares em que a cor da farinha é tão branca que é capaz de ser misturada em mesclas com outros lotes de trigo para branqueá-los, com objetivo de atendimento das demandas do mercado consumidor. Muitas cooperativas têm valorizado a produção dessas culti-

vares com precificação adicional de 20% em relação a uma cultivar não branqueadora. Trigos DP representam uma excelente alternativa para composição do sistema de produção e de economia em regiões características de produção leiteira e, principalmente, em pequenas propriedades. A Embrapa foi pioneira no desenvolvimento dessa tecnologia, iniciando pesquisas há mais de 30 anos. Cultivares de trigo DP podem ser semeadas de 30 dias a 40 dias antes das cultivares de ciclo normal. Essa possibilidade faz com que o vazio outonal seja preenchido logo após a colheita da cultura de verão, protegendo o solo e ofertando pasto ao animal em período de baixa oferta. As cultivares DP podem ser pastejadas e, após, com manejo adequado, ser destinadas para a produção de grãos. Trigos DP podem ser utilizaC dos, também, para silagem. João Leonardo F. Pires Eduardo Caierão Pesquisadores da Embrapa Trigo

Figura 2 - Receita líquida de trigo (R$/ha) em sistemas de manejo local x exportação em diferentes municípios do RS nas safras 2016, 2017 e 2018. Embrapa Trigo/Fecoagro RS, 2020

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Coluna Agronegócios

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Não desperdiçarás!

uponho não cometer heresia se imaginar que, se hoje Moisés recebesse as Tábuas da Lei, o XI mandamento seria “Não desperdiçarás”. Isto vale para qualquer aspecto da nossa vida sobre a face da Terra e é um dos pilares do desenvolvimento sustentável. E inclui a alimentação. Há seis anos escrevi, neste mesmo espaço, que a Society for Mechanical Engineers do Reino Unido concluíra um profundo estudo, apontando perda de alimentos variável entre 30% e 50%, ao longo das cadeias de produção agrícola, da lavoura à mesa do consumidor, totalizando de 1,2 a duas gigatoneladas (Gt) de alimentos (https:// www.imeche.org/policy-and-press/reports/detail/global-food-waste-not-want-not). Consideremos a população atual do mundo, estimada em 7,8 bilhões de habitantes. De acordo com a FAO, existem estimados 800 milhões de cidadãos que passam fome no mundo. Imaginemos que, adicionalmente, o equivalente a 50% desse contingente tenha algum grau de restrição alimentar, abarcando 1,2 bilhão de pessoas. Restariam 6,6 bilhões bem alimentadas. Apenas para efeito de cálculo, imaginemos que esse agrupamento seja um proxy das perdas ao longo da cadeia. Perdas médias de 40% permitiriam alimentar 2,6 bilhões de pessoas adicionais. Suficiente para aplacar a fome no mundo, mesmo considerando que a ONU estima um aumento de 50% no agrupamento de pessoas que passarão fome, ao fim da pandemia de Covid-19.

EVITANDO PERDAS

O desenvolvimento tecnológico tem permitido reduzir, progressivamente, as perdas dentro da porteira. O que precisamos é de ampla adoção destas tecnologias. Isso inclui desde ganhos de produtividade por uso racional de fatores de produção, passando por correto manejo das culturas, medidas fitossanitárias e processos de colheita. Os desafios se tornam maiores quando percorremos a cadeia da porteira à mesa. Inicia-se com problemas logísticos de processamento, armazenagem e transporte antes dos pontos de distribuição e venda; prossegue com o desperdício nos hubs de abastecimento, atacado ou varejo; e atinge seu clímax no ponto de consumo, tanto em restaurantes quanto em residências, onde as perdas se intensificam por problemas de compra excessiva, deficiências de armazenagem, vencimento da validade ou restos de alimentos na mesa, que vão para o lixo.

O TRABALHO PIONEIRO

Brasil e União Europeia possuem projetos próprios e autônomos para combater desperdícios e, há três anos, juntaram forças para ações comuns. Tudo se iniciou em 2017, quando o tema foi enquadrado como prioritário no âmbito dos “Diálogos UE-Brasil”. A Embrapa tem liderado as ações, em conjunto com parceiros, envolvendo dois projetos de cooperação. O primeiro foi encerrado em fevereiro de 2020, abarcando intercâmbio de conhecimento e experiências entre Brasil, Dinamarca, Holanda, França e Inglaterra. As ações envolveram visitas para conhecimento de iniciativas e estudos, seminários internacionais e uma ampla pesquisa sobre desperdício de alimentos nas famílias brasileiras, em parceria da Embrapa com a Fundação Getúlio Vargas. A conclusão da pesquisa apontou que a família brasileira desperdiça, em média, 128kg de alimentos por ano. Os pesquisadores con-

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cluíram que “reduzir o desperdício no final da cadeia agroalimentar é um processo de mudança cultural que demanda ações contínuas de educação, posto que o desperdício nas famílias é um hábito enraizado na cultura de consumo latina. Para conseguir impactos positivos, é necessário educar os jovens e capacitar os professores, que são importantes agentes no processo de mudança cultural”. O relatório final pode ser encontrado em http://www.sectordialogues.org/.

EDUCAR PARA UM FUTURO MAIS SUSTENTÁVEL

Em função das conclusões do estudo anterior, foi aprovado novo projeto com o título “Educar Para um Futuro Mais Sustentável”, ainda sob a égide dos Diálogos UE-Brasil. Em 2019, a iniciativa da UE “Semanas de Diplomacia Climática” se concentrou em atividades para jovens, público fundamental a ser educado para a construção de um futuro mais sustentável. O projeto também está alinhado com o plano de ação de Economia Circular da Comissão Europeia, lançado em março de 2020 (European Green Deal), dirigido ao uso sustentável dos recursos naturais e na luta contra as mudanças climáticas. Coerentemente, o foco do novo projeto foi assestado nos jovens, estudantes, e seus professores. Por meio da educação e do desenvolvimento de atividades extracurriculares, que incentivem os jovens a compreender mais sobre como o alimento é produzido, se ambiciona formar uma nova geração mais consciente sobre o impacto dos hábitos alimentares no meio ambiente, sobre o acesso irrestrito à alimentação, bem informada sobre a importância da pesquisa agropecuária em nossas vidas. Compõem o projeto uma edição da revista Turma da Mônica (Comer sem desperdiçar) para o público mais jovem, em cooperação com o Instituto Mauricio de Sousa; e o Manual do Educador (#SemDesperdício), dirigido aos professores, em cooperação com o WWF Brasil. As revistas estão sendo distribuídas para os centros de pesquisa da Embrapa que desenvolvem atividades no programa Embrapa & Escola, voltado a apresentar a jovens estudantes os impactos positivos da pesquisa agropecuária na vida dos cidadãos e refletir sobre as interfaces da ciência e da tecnologia com o setor agrícola e o meio ambiente. O guia didático traz contribuições para educação de jovens (de 11 a 17 anos), e pode ser utilizado em sala de aula, pelo educador, ou em espaços apropriados para realização das atividades. O conteúdo busca conscientizar os estudantes sobre toda a problemática em torno das questões ligadas aos resíduos que geramos, com ênfase no desperdício de alimentos. Vivências e jogos interativos são propostos como ferramentas pedagógicas para que os estudantes possam concretizar e trazer para suas próprias realidades problemas aparentemente distantes e hipotéticos. São iniciativas meritórias, que se somam a todos os esforços realizados por produtores e demais elos das cadeias de valor em busca do desenvolvimento sustentável do agronegócio brasileiro e na busca de uma sociedade em que a iniquidade da fome seja apenas uma C nódoa do passado.

Decio Luiz Gazzoni O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja


Coluna Mercado Agrícola

Brasil bate recorde de exportação do agronegócio em 2020

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té o final da primeira quinzena de maio houve mais de 50 milhões de toneladas do complexo soja embarcadas, o que representa mais de 42% da safra, frente a 32% do mesmo período do ano passado. A expectativa é de ultrapassar 90 milhões

MILHO

O Brasil deve fechar a colheita da safrinha na faixa de 75 milhões de toneladas, enquanto a Conab estimava números um pouco acima. O país perdeu aproximadamente dez milhões de toneladas frente ao potencial produtivo do início da temporada. A seca atingiu forte as lavouras do Paraná, sendo que somente nesse estado foram mais de cinco milhões de toneladas perdidas. Houve perdas no Mato Grosso do Sul e também em Goiás, ambos pelo clima irregular. O Brasil pode alcançar 100 milhões de toneladas, entre a primeira e a terceira colheita, como apontou a Conab, somados os números da produção de algumas regiões do Nordeste, cuja produção chega mais tarde. Deve haver oferta muito maior que a demanda, porque o consumo tende a ficar ao redor de 65 milhões de toneladas. Há dúvidas sobre o setor do etanol do milho, se irá consumir o que estava previsto (mais de seis milhões de toneladas) ou irá ficar na faixa de quatro milhões de toneladas, devido à pandemia, que derrubou o consumo de combustíveis. A saída de boa parte do milho

de toneladas entre soja, farelo e óleo até o final do ano. Produtores e comerciantes estão aproveitando os excelentes preços praticados para seguir negociando. Outro segmento que segue forte é o de carnes, com novos recordes.

será a exportação, que em maio registrava níveis entre R$ 47,00 e R$ 50,00 a saca nos portos, com poucos vendedores em atividade. O produtor deve ficar atento porque os portos giram em cima do valor do dólar e a moeda norte-americana está muito valorizada no Brasil. Ninguém garante que continuará nos patamares atuais no segundo semestre, quando o país irá embarcar o milho.

SOJA

O mercado da Soja do Brasil nunca havia negociado uma safra tão rapidamente como em 2020. Mesmo com recorde histórico de safra de 120 milhões de toneladas, os negócios já avançaram forte e até o final da primeira quinzena de maio já havia cerca de 85% desta produção negociada e 42% embarcada na exportação. A safra nova também tem gerado boas alternativas de fechamentos e é importante para os produtores fecharem negócios para garantir os custos, porque o dólar está muito valorizado e ninguém garante que vai seguir assim até a colheita da nova safra. Assim, as cotações atuais podem ser as me-

lhores do novo ano. É importante acompanhar e garantir lucros.

ARROZ

O mercado do arroz está com a colheita fechada, com números bons em produtividade. Mas a safra de 10,8 milhões de toneladas ficou abaixo da demanda, que deve passar fácil de 11 milhões de toneladas. Além disso, há grandes exportações sendo realizadas e que vêm dando fôlego interno às cotações. Os valores praticados no porto gaúcho de Rio Grande estão próximos de R$ 70,00 a saca, ditando as regras do mercado do Rio Grande do Sul, que em maio girava entre R$ 61,00 e R$ 66,00 a saca paga aos produtores. São cotações recordes em plena safra ou final de colheita, fato inédito para o setor que alcança lucros pela primeira vez depois de vários anos C carregando prejuízos.

Vlamir Brandalizze Twitter@brandalizzecons www.brandalizzeconsulting.com.br Instagram BrandalizzeConsulting ou Vlamir Brandalizze

Curtas e boas TRIGO - O mercado do trigo registra safra em plantio e crescimento, com indicativos de que possa avançar em até 10% e com isso potencial de colheita acima de seis milhões de toneladas. Mesmo assim, a produção será muito menor que o consumo, estimado em 11 milhões de toneladas. Assim, a importação seguirá como regra, na faixa de R$ 1.300,00 por tonelada. Cenário favorável aos produtores, que observam indicativos internos entre R$ 1.050,00 e R$ 1.200,00. Patamares devem seguir firmes e beneficiar o setor, que vinha sofrendo há vários anos. EUA - Os produtores plantaram praticamente a safra toda dentro do período ideal, com aproximadamente 33,8 milhões de hectares de soja e outros 39,2 milhões de hectares de milho. O clima neste começo de temporada tem sido favorável. Este fator já está absorvido pelo mercado. Espera-se safra de 110 milhões de toneladas a 112 milhões de toneladas de soja e mais de 385 milhões de toneladas de milho. CHINA - A China recomendou às empresas de alimentos do país que formem estoques neste ano para que não ocorra aperto no abastecimento, como sofreu em março, quando em plena pandemia registrava os menores estoques desde 2013, com riscos de desabas-

tecimento. Assim, a política é comprar mais porque os grãos estão baratos em dólar e esta é a hora de formar estoques. Somente em soja devem importar mais de 95 milhões de toneladas. A demanda interna de alimentos saudáveis deve disparar e o setor de suínos já funciona plenamente, com expectativa de produzir perto de 60 milhões de toneladas de carne nestes próximos 12 meses, o que gerará recorde de consumo de ração. ARGENTINA - A safra dos argentinos avançou e a colheita se encaminha para o final, restando ainda parte da produção do milho nos campos. O país ainda apresenta ritmo lento de negócios, com reclamações da dificuldade de exportar entre o final de abril e metade de maio devido ao baixo nível do Rio Paraná e no caso local do Rio da Prata, que escoam a safra. Assim, somente navios de pequeno calado podiam carregar. A produção da soja local segue estimada em 49,5 milhões de toneladas e o milho projetado em 50 milhões de toneladas. Dentro de um quadro de normalidade e esperando exportar mais no segundo semestre. Os produtores ainda estão brigando com o governo para reduzir a taxa de retenciones (imposto sobre as exportações) que se encontra em 33%. www.revistacultivar.com.br • Junho 2020

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Coluna ANPII

Promotores de crescimento Bactérias promotoras de crescimento vegetal se firmam como a nova fronteira dos inoculantes

D

urante muitos anos a pesquisa para emprego agrí- marães et al, 2018). cola da microbiologia do solo se restringiu quase Ao se entender, embora ainda de forma parcial, a presenque exclusivamente ao uso de bactérias fixadoras ça e a comunicação ativa entre os micro-organismos do solo do nitrogênio. Estas pesquisas, como já registrado em ar- com as plantas, começa-se a abrir um caminho sem volta, em tigos anteriores, levou a um dos grandes sucessos da agri- forma de um amplo leque, com inúmeras conexões entre baccultura. Em especial na cultura da soja, qual seja o cultivo téria, plantas, nutrientes, mecanismos de crescimento e de da leguminosa com praticamente zero de fertilizantes nitro- defesa das plantas contra fatores bióticos e abióticos. Muitas genados, trazendo substanciais ganhos para a rentabilidade vezes procura-se, nas pesquisas, identificar o principal papel do agricultor, do país e da sociedade como um todo, pelos de uma bactéria ou fungo no desenvolvimento de uma planganhos ambientais que o uso destas bactérias traz para a ta. Mas quanto mais se estuda, mais o leque se amplia, pois sustentabilidade. as funções são múltiplas, com profundas interações entre as Já no início do século 21, o uso de bactérias fixadoras do bactérias em si e a planta. Uma bactéria pode exercer preponnitrogênio, no caso o Azospirillum, foi estendido às gramíne- derantemente uma função, como produção de um hormônio, as, iniciando um novo ciclo no emprego de micro-organismos em uma determinada fase da planta, e, posteriormente, em na agricultura. outra fase, passar a exercer uma funMas ainda era pouco. Se pensarmos ção de antagonismo a um patógeno ou nos bilhões de micro-organismos que enaté de indução de resistência, instruvolvem as raízes de uma planta, e raciomentalizando a planta para resistir ou cinarmos que estes seres não estão ali tolerar em agente patogênico. Estudando-se por estarem, sem uma função, sem uma Estudando-se o microbioma do sointeração entre si e com as raízes, vemos lo, cada vez mais o micro passa a ser o microbioma que há um enorme campo para estudos macro, seja pelo número de microdo solo, cada não apenas teóricos, do conhecimento -organismos, como pela importânvez mais o pelo conhecimento, mas sim na aplicação cia que representa no ambiente de agronômica das informações auferidas por produção agrícola. Cremos que dois micro passa a estudos e pesquisas. fatores tornarão a pesquisa e a atiser macro, seja Ao se verificar que o papel do Azospividade agrícolas fundamentalmente rillum não se limitava a fixar nitrogênio, mas diferentes daqui para a frente: o uso pelo número de que a produção de hormônios vegetais, em das tecnologias de informática e de microrganismos, especial o ácido indol acético (AIA), exercia comunicação na agricultura e a aborcomo pela um papel preponderante no desenvolvidagem da microbiologia do solo em mento das plantas, juntaram-se estes dados uma visão holística, integrada com importância com outros já conhecidos, de bactérias dos todas as demais práticas agrícolas que que representa gêneros Bacillus e Pseudomonas na solubitanto têm contribuído para o aumento lização de fósforo e também na produção da produtividade. no ambiente de hormônios vegetais, e um novo capítuAs empresas associadas à Associade produção lo se abriu: o das bactérias promotoras de ção Nacional dos Produtores e Imporcrescimento vegetal, conhecidas em inglês tadores de Inoculantes (ANPII) estão agrícola como Plant Growth Promotion Bacteria desenvolvendo projetos de pesquisa (PGPR) ou, em português, como Bactérias junto com universidades para criar Promotoras do Crescimento Vegetal (BPCV). produtos com micro-organismos pro“Bactérias promotoras de crescimento motores de crescimento, sendo que já vegetal (BPCV) ou bactérias promotoras de crescimento de produzem inoculantes com esta finalidade. plantas, incluem micro-organismos de vida livre, que formam Muitas novidades surgirão nos próximos anos, trazendo C relações simbióticas específicas com plantas, endófitos bacmais produtividade e rentabilidade para o agricultor. terianos que podem colonizar alguns ou uma grande parte dos tecidos de uma planta, e cianobactérias” (Glick, 2012, Solon Araújo, in: Bactérias Promotoras de Crescimento Vegetal: da FBN à Consultor da ANPII regulação hormonal, possibilitando novas aplicações – Gui-

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