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Introdução

“Será exagerado acreditar que o homem possa estar desen volvendo novas sensibilidades e uma relação mais estreita com a natureza?”, pergunta H. P. Blavatsky ao leitor no prefácio do primeiro volume de Ísis sem Véu. Ela reservou mais de 1.200 páginas, em sua pesquisa, para dar resposta a essa e outras perguntas relacionadas aos “mistérios da ciência e teologia antigas e modernas”. Reuniu diversas autoridades de prestígio que atestaram eloquentemente a existência de uma visão de mundo venerável e universal; os mitos e lendas da humanidade foram esquadrinhados; a ciência de sua época foi comparada com as descobertas da Antiguidade, numa tentativa de “auxiliar o estudioso a entender os princípios vi tais que subjazem aos conceitos filosóficos do mundo antigo” – con ceitos que quando da publicação do livro, em 1877, estavam esquecidos no Ocidente e, até certo ponto, devido à influência da obra, ressurgiram na cultura contemporânea.

O primeiro e o segundo volumes de Ísis sem Véu, intitulados Ciência, tratam da capacidade dos antigos, com base em suas visões da humanidade e do universo, de antecipar a ciência moderna, enquanto

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o terceiro e o quarto, dedicados à Teologia, estudam o advento do cristianismo e a subsequente supressão de grupos rivais como as Escolas de Mistério. Ali, a discussão sobre os gnósticos estava muito à frente de seu tempo e se baseava, em parte, nos contatos com os descendentes de antigos grupos cristãos, como os drusos, durante as viagens que ela fez à Palestina e ao Egito.

A obra, em si, é um notável esforço para quem começara a escrever em inglês apenas três anos antes e, segundo ela própria admitiu, nunca frequentara a escola nem estudara nenhum ramo da ciência. A despeito disso, as críticas na época da publicação reconheceram que o livro devia ser considerado um trabalho extremamente erudito e não apenas uma curiosidade literária. A resposta do público foi igualmente entusiástica: dois meses depois de seu aparecimento, em setembro de 1877, uma segunda impressão se fez necessária e a obra nunca deixou de ser editada desde então.

Blavatsky se inspirou num vasto leque de escritores, dos autores clássicos, especialmente Platão e os neoplatônicos (talvez por influência de seu editor, prof. Alexander Wilder), a Darwin, Huxley e Max Müller. Apresentou aos leitores ingleses diversos escritores europeus, inclusive o mago francês Éliphas Lévi. Que tivesse suas próprias fontes, é evidente a partir do testemunho ocular de seu colega Henry S. Olcott: “Sua pena voava sobre a página quando, de súbito, ela se interrompia, olhava para o espaço com os olhos vagos do clarividente, apurava a visão como para enxergar algo invisível no ar à sua frente e começava a copiar no papel o que enxergava. Finda a transcrição, os olhos reassumiam a expressão natural e ela continuava escrevendo até ser de novo interrompida da mesma maneira”. (Mais detalhes sobre a redação de Ísis sem Véu são fornecidos no primeiro volume de Old Diary Leaves, de H. S. Olcott, em meu próprio Dawning of the Theosophical Movement e na introdução da edição de Ísis de Boris Zirkoff.)

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Mas o grande volume de material apresentado para explicar seu caso às vezes sufocava o tema. Havia, além disso, longas digressões sobre assuntos candentes da época, como a discussão das numerosas teorias sugeridas para explicar o fenômeno do espiritismo, que se espalhara pela Europa e a América nos anos de 1850 e 1860. A mente fértil de Blavatsky parecia ter captado cada fragmento de evidência e antecipado todo argumento possível. O resultado é que Ísis sem Véu sobrevive como um dos antigos e negligenciados santuários descritos no livro: relíquia para admirar, não para explorar.

Se a estrutura pudesse ser escoimada de material estranho, que maravilhas não seriam trazidas à luz! A presente edição resumida foi empreendida na esperança de tornar Ísis sem Véu mais acessível. Não é tarefa fácil remover mais de três quartos da obra de um autor. Entretanto, depois que longas citações de outros autores, explicações frequentes dos nomes das várias divindades e comentários repetidos foram eliminados, uma linha de continuidade emergiu com impressionante clareza em meio ao labirinto de palavras, iluminando os conceitos básicos que Blavatsky tentava explicar.

A autora estava, sem dúvida, ciente dos defeitos de seu livro e pretendia oferecer uma nova edição de Ísis. A Doutrina Secreta, sua segunda obra, foi inicialmente apresentada como “uma nova versão de Ísis sem Véu”. Sua morte precoce a 8 de maio de 1891, com a idade de 59 anos, excluiu essa possibilidade. A presente tentativa talvez não seja bem o que a autora desejasse, mas revela a estrutura básica da obra. Nada foi acrescentado ou modificado, embora muita coisa tenha sido tirada. (Eliminei tanto material dos Capítulos III e IV de Ciência, que trata das teorias novecentistas sobre mesas giratórias e fenômenos similares, que eles foram fundidos.) Os trechos entre parênteses nas obras citadas podem ser considerados de H. P. Blavatsky. A grafia dos termos sânscritos e outros foi padronizada; as obras citadas em notas de rodapé seguem o estilo atual.

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Encerrando o capítulo introdutório do primeiro volume, a autora explicava assim o objetivo de sua obra: “Não pretendo impor ao público minhas visões e teorias pessoais; a obra também não alimenta pretensões a trabalho científico, com a finalidade de revolucionar alguma área de pensamento. Trata-se, antes, de um breve resumo das religiões, filosofias e tradições universais da humanidade, bem como de sua exegese no espírito daquelas doutrinas secretas, das quais nenhuma – em virtude do preconceito e da intolerância – alcançou o cristianismo em sua forma íntegra, capaz de garantir um julgamento justo”.

Michael Gomes Editor

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