Healthcare Management 40ª Edição

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EDITORIAL

Tragédia anunciada

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Aedes aegypti. Esse é o nome do maior inimigo da Saúde brasileira atualmente. O mosquito chegou a ser erradicado, no começo do século passado, graças às medidas sanitárias implementadas por Oswaldo Cruz. Contudo, essas políticas públicas foram deixadas de lado pelos nossos governantes e não sofreram nenhuma atualização com o passar do tempo. Foi o que bastou para o mosquito voltar a ser protagonista na Saúde. Desde então, campanhas do governo imploram para que a população faça a sua parte: não deixar água parada. Acontece que agora o mosquito transmite doenças até então desconhecidas em nosso país. Chikungunya e zika tornaram-se os novos pesadelos dos brasileiros. Este último teve sua primeira circulação confirmada pelo Ministério da Saúde em 15 de maio de 2015, contudo especialistas já suspeitavam da doença no ano anterior, quando foi detectada uma “dengue atípica” na região do Nordeste. Também foi de lá que médicos e pesquisadores suspeitaram da relação Zika com a microcefalia.

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Edmilson Jr. Caparelli

Todo este caos exige ações rápidas, o que não estamos muito acostumados a ver aqui no Brasil. Ainda que nossos laboratórios corram atrás de uma vacina, essa solução estará disponível daqui a três anos, como prevê o Diretor do Instituto Butantan, Jorge Kalil. Tenho que concordar com o Ministro da Saúde, Marcelo Castro, quando disse que “estamos perdendo feio a batalha” contra o Aedes aegypti. Mas também não posso concordar quando ele disse “torcer” para que as mulheres fossem infectadas pelo zika antes do período fértil. Zika, dengue, chikungunya e outros que estão por vir tem causas não apenas em nossa educação, mas também na falta de saneamento básico e má infraestrutura do país. As ações adotadas por Oswaldo Cruz deram certo naquela época e agora temos que renovar, inovar e descobrir novas metodologias para resolver este problema. Seja qual for a alternativa encontrada, ela não está na doença, mas na Saúde da população.

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NESTA EDIÇÃO

Janeiro - fevereiro Capas da edição:

A 40ª da Healthcare Management traz, pela primeira vez, duas capas em uma mesma edição. Uma com Paulo Chaphcap, novo CEO do Sírio-Libanês, e outra com José Ribamar Branco, Fundador e Diretor Executivo do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente.

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Código de Cores A HealthCare Management organiza suas editorias pelo código de cores abaixo:

Líderes e Práticas Sustentabilidade Health-IT Mercado Gente e Gestão Ideias e Tendências Estratégia Health Innovation

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Dispositivos Médicos Implantáveis Uma extensa e complexa cadeia de suprimento

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2016 Especialistas falam sobre perspectivas para este ano e os desafios que estão por vir

Construindo lideranças Mohamed Parrini à frente do Hospital Moinhos de Vento “A nossa proposta é simples: ser um hospital melhor a cada dia”

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Líderes da Saúde 2015 Uma homenagem àqueles que mais se destacaram na comunidade da Saúde

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Disseminação do sequenciamento genômico Hospital Alemão Oswaldo Cruz e Coimbra Genomics em busca da medicina personalizada

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A força do diálogo Solange Mendes, nova presidente da FenaSaúde, diz que a aproximação com o consumidor, governo e entidades será pauta crucial em seu mandato

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Avaliação do desempenho Sírio-Libanês traz importantes resultados com nova solução para avaliar corpo clínico

Articulistas:

22 Avi Zins

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30 Carlos Goulart

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Márcia Mariani

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Nubia Viana

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72 Evaristo Araújo


Dossiê

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Paulo Chapchap, novo CEO do Hospital Sírio-Libanês “Não existe contingência diante da crise que nos faça abrir mão de um grande investimento em qualidade e segurança para o paciente.”

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Medicina no Afeganistão Como médicos lutam para levar o mínimo de assistência a um país mergulhado em violentos conflitos

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Saúde pública e suas alternativas Hospital Municipal de Araucária e sua experiência sob uma gestão compartilhada

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saúde

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pontuando a gestão

Waldomiro Pazin, novo presidente da FBAH, fala sobre suas principais metas em seu mandato

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Segurança do Paciente

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Engajamento, o calcanhar de Aquiles

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O selo da Qualidade e Segurança

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Desafios da Saúde Em seu novo livro, Claudio Lottenberg fala sobre tecnologia, financiamento e compromisso com a transparência

Perfil

Diretor Geral do Hospital de Câncer de Barretos, Henrique Prata, e sua luta por uma sociedade mais justa, com acesso democrático à saúde e ao tratamento oncológico..

86 PONTO FINAL Metade dos médicos é reprovada pelo CREMESP


Confira mais vídeos no Saúde Online TV http://goo.gl/j3zuWh

Setor de produtos para saúde encolhe 7,6% no ano Depois de crescer em torno de dois dígitos durante uma década, o setor de produtos para saúde começa a sentir os efeitos da crise econômica. De janeiro a outubro de 2015, o índice de consumo aparente apresentou uma queda de 7,6% em relação a igual período do ano anterior. A estimativa é que o faturamento do setor fique ao redor de U$ 10 bilhões. Os dados de desempenho, levantados pela consultoria econômica Websetorial para a ABIMED – Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde foram apresentados no Encontro Anual da entidade.

Confira no Saúde Online TV http://goo.gl/eXghBR

Paulo Henrique Fraccaro fala sobre novo projeto “Prioridade BR” do INPI No dia 19 de janeiro, aqueles que buscam patentes com agilidade e pretendem investir no exterior receberam boas notícias. O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) lançou o projeto “Prioridade BR”, oficializado pela Resolução nº 153/2015, que tem como objetivo incentivar a introdução de produtos inovadores do Brasil no mercado mundial. Em entrevista, o Superintendente Executivo da ABIMO, Paulo Henrique Fraccaro, falou sobre os benefícios desse novo projeto e sobre os empasses do atual sistema de patentes no país.

Confira matéria na íntegra Saúdeonline.net http://goo.gl/73R8gs

Está aberta a votação para os “100 Mais Influentes da Saúde” de 2016 A quarta edição do prêmio “100 Mais Influentes da Saúde” já está com data marcada. O evento será no dia 20 de maio, às 18h, no último dia da HOSPITALAR Feira+Fórum, maior evento do setor da América Latina. A comunidade da Saúde poderá participar elegendo os nomes que mais se destacaram no último ano. No total, são 20 categorias com cinco nomes eleitos pelo público em cada uma delas. As votações já estão abertas e podem ser feitas pelo site. Basta indicar o nome do profissional para concorrer à premiação em cada uma das categorias disponíveis. Link de Votação: votacao.100maisinfluentesdasaude.com.br/

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Palavra da editora

Mudanças que transformam

Carla de Paula Pinto, Editora da Revista Healthcare Management

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No ano passado, em uma viagem aos Estados Unidos, tive a oportunidade de conhecer uma estudante de Medicina do Afeganistão. Nosso encontro foi muito rápido, mas, graças à tecnologia, nosso contato tornou-se quase que diário desde então. A futura médica se chama Khatira Zaheen Faiz e ela me apresentou para o CEO do Amiri Medical Complex, Mirwais Amiri. São eles que contam nesta edição da revista Healthcare Management o enorme desafio de praticar Medicina em um país mergulhado em um completo caos. Amiri fala sobre a dificuldade de obter recursos e pede

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ajuda de indústrias, entes governamentais e outras instituições para conseguir manter seu hospital. As próximas páginas traz também uma entrevista com o novo CEO do Hospital Sírio-Libanês, Paulo Chapchap. Ele nos recebeu em São Paulo e conversou sobre crescimento da instituição, a mudança na governança, a vinda de Fernando Andreatta Torelly para o HSL, a saída de Gonzalo Vecina Neto e o maior objetivo de sua gestão: a busca pela eficiência. O vídeo desta conversa pode ser vista no portal Saúde Online. Outra reportagem especial é o Dossiê sobre Segurança do Paciente. Especialistas falam sobre o desafio desta árdua tarefa nas instituições, o poder do engajamento do corpo clínico e a importância dos selos de qualidade. A mudança na gestão da presidência da Federação Brasileira dos Administradores Hospitalares (FBAH) também é destaque nesta edição. A partir deste ano, a entidade passa a ser comandada por Waldomiro Pazin, também Diretor-técnico do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas São Paulo (HCFMUSP). Em entrevista, Pazin fala sobre a atuação da FBAH neste ano e como a Federação contribuirá para o desenvolvimento da saúde no Brasil. Além disso, o leitor poderá conferir a íntegra do capítulo “A ética e a nova medicina”, extraído do novo livro de Claudio Lottenberg: “Saúde e Cidadania - A tecnologia a serviço do paciente e não ao contrário”. Por fim, começamos este ano trazendo uma novidade aos nossos leitores. A 40ª edição da revista Healthcare Management traz duas capas. Uma com Paulo Chachap, CEO do Sírio-Libanês, e outra com José Ribamar Branco, Fundador e Diretor Executivo do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente. Esta é a primeira vez que uma publicação do setor traz esta inovação em seu conteúdo. O que pretendemos com isso? Mudar, inovar e dialogar com toda a nossa comunidade.

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saúde

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pontuando a gestão

Nova direção Waldomiro Pazin, novo presidente da FBAH, fala seus desafios frente à entidade

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leito presidente da Federação Brasileira de Administradores Hospitalares (FBAH), em 2016, o médico e diretor técnico do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (HCFMUSP), Waldomiro Monforte Pazin, fala com exclusividade para a Healthcare Management sobre seus desafios e perspectivas frente à entidade, expansão da FBAH e ressalta a importância da formação de gestores e administradores hospitalares em todo o Brasil, principalmente em tempos de crise, quando uma boa gestão pode fazer a diferença entre manter as portas abertas ou fechá-las para sempre.

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Como você iniciou sua atuação no setor de saúde? Ainda muito jovem, trabalhei no Instituto do Coração com 19 anos, em uma hemodinâmica. Depois, fui cursar administração hospitalar, por perceber que este seria um mercado promissor. Após concluir a faculdade me pós-graduei na Fundação Getúlio Vargas e de lá pra cá venho trabalhando e me aprimorando sempre em cursos, tanto oferecidos pelo Hospital das Clínicas, como fora dele. Aos 26 anos de idade, eu assumi uma diretoria do HC e me tornei um dos diretores mais jovens da instituição. Desde então, executo o trabalho que todo administrador faz. Há oito anos, fui convidado para participar de uma reunião da Federação Brasileira dos Administradores Hospitalares (FBAH). Naquela oportunidade, Paulo Câmara e Paulo Mergulhão me convidaram para me associar à entidade. Com o passar dos anos, meu envolvimento foi aumentando cada vez mais com a participação e apoio nos congressos. Então, surgiu a oportunidade de me candidatar à presidência da FBAH.

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Como você pretende trabalhar para que a FBAH contribua para o desenvolvimento da saúde no Brasil? Uma de nossas missões é prover serviços de excelência na área de administração de saúde, que é uma de nossas maiores contribuições para o setor. Vale ressaltar que, em tempos de crise, quanto melhor a gestão de uma instituição de saúde mais preparada ela estará para enfrentar as dificuldades. Acredito que temos a obrigação de preparar melhor os nossos gestores.

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Qual a alternativa para superar as dificuldades enfrentadas pelo setor? Acredito que a saída para o desenvolvimento do setor é a inovação. Inovar é capacitar profissionais com condições de enfrentar os novos desafios que vem por aí, e, cada vez mais, trazer para perto do gestor mais funções e profissionais da área da saúde, como engenheiros clínicos, CIOs e outros profissionais vitais para a operação clínica e administrativa das instituições de saúde.

Então, para fazer gestão é preciso parcerias? Exatamente. Hoje você não pode olhar um gestor como uma figura isolada. Não tem como fazer uma gestão sem a parceria com a engenharia de manutenção ou a engenharia clínica. Como que um gestor vai investir em tecnologia, usando equipamentos mais modernos, se não tem um apoio de uma engenharia clínica? Temos que aproximar esses profissionais cada vez mais.

O Brasil passa por uma série de complicações e dificuldades políticas e econômicas. Quais as suas expectativas para 2016? Existem vários segmentos dentro do setor de saúde: público, privado, Organizações Sociais de Saúde (OSs), PPPs, etc. O Governo Federal vem investindo na saúde, um exemplo são os três milhões de profissionais empregados no país para atender às demandas de saúde da população. Esse número é consideravelmente superior a qualquer área. A saúde é um dos setores mais importantes que temos, e não pode faltar investimento. Pessoas continuarão nascendo e adoecendo, não há como deixar de investir ou investir menos nessa área. Hoje, por exemplo, temos as OSs que é uma alternativa para o governo. Em

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saúde

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pontuando a gestão

um hospital privado, a situação é uma, o modelo de gestão será um, já no público visualizamos outro tipo de gestão e nesse sentido vejo com otimismo a parceria com os privados, porque as OSs vieram para realizar uma gestão mais adequada ao setor público. No entanto, é necessário saber escolhê-las, precisa haver mais critério e o agente governamental tem que ter melhor fiscalização para não ocorrer escândalos de corrupção e má gestão, como aconteceu no Rio de Janeiro.

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Com o passar dos anos, vemos um grande movimento pela profissionalização da gestão e da capacitação de gestores. Isso aumentou nos últimos anos? Sem sobra de dúvidas. O sucesso das organizações depende, cada vez mais, das oportunidades de aprendizado de seus colaboradores. As pessoas que integram o ambiente precisam estar dispostas a se qualificarem e conforme isso ocorre percebemos que elas também se tornam multiplicadores desse conhecimento. Tratar bem as pessoas que trabalham em uma organização é fundamental para ampliar e reter talentos. Um desafio que encontramos, hoje, em qualquer organização é que, quanto mais qualificamos nossas equipes, maior será o trabalho para reter este colaborador, principalmente no setor público.

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Quais são as expectativas para o congresso da FBAH durante a Feira Hospitalar 2016? Este ano estamos com uma expectativa melhor em relação ao ano anterior. Um dos motivos é o novo formato que desenhamos para o congresso, que trará também o congresso sul-americano. Em todos os nossos seis congressos traremos palestrantes com diferentes experiências vivenciadas em países como Colômbia, Chile, Argentina, etc. Também teremos representantes da Espanha, o que nos deixa muito felizes. Nosso objetivo maior é multiplicar conhecimento e qualificar pessoas.

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No Brasil, já temos um corpo profissional qualificado? Eu acho que sim, e buscamos essa qualificação dentro e fora do Brasil. Quanto mais um hospital investir em seus gestores, no corpo clínico ou nas equipes de suporte, melhor será a operação, mais barata e eficiente. A construção dessa cadeia gera valor para o hospital, seus colaboradores e pacientes.

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A sustentabilidade deve estar inserida dentro dos conceitos de gestão de cada profissional? A sustentabilidade deve ser algo comum dentro das instituições. Durante anos esse tema foi exaustivamente debatido e inserido dentro da cultura da administração hospitalar. Mesmo assim, não cansamos de debatê-lo, e abordaremos novamente em nosso congresso durante a Feira Hospitalar 2016.

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Quais são os projetos da FBAH para 2016? Nosso primeiro projeto é andar mais pelo Brasil e fortalecer nossas sucursais. Estamos ampliando o número de escritórios pelo país e reunindo cada vez mais pessoas. Esse ano, a FBAH vai expandir sua atuação além de São Paulo. Nós temos no Espírito Santo e na Região Nordeste muitas pessoas envolvidas em nossos projetos. Além disso, Manaus, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro também serão contemplados em nossas agendas. Esse ano será bem agitado para FBAH e os próximos dois anos não serão diferentes. H

Waldomiro Monforte Pazin

Diretor técnico do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (HCFMUSP) e atual presidente da FBAH.


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Health Innovation

Dispositivos Médicos Implantáveis

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Uma extensa e complexa cadeia de suprimento

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mercado de dispositivos médicos envolve uma extensa gama de produtos e uma complexa cadeia de suprimento. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) são mais de 1,5 milhões de itens distintos, classificados em cerca de 10 mil categorias, que possuem características próprias e demandam diferentes modelos de comercialização. Estamos falando de um universo cujos padrões de comercialização sofrem influência de fatores comuns à maioria dos setores da economia brasileira – como as dimensões e variações geográficas do país, a logística de distribuição e os elevados custos financeiros. Mas estamos nos referindo também a um universo bastante específico, cuja cadeia de suprimento inclui não apenas os produtos ofertados, mas também uma série de serviços sem os quais eles repousariam sem uso nas prateleiras dos hospitais. Esses serviços são intrínsecos à cadeia de dispositivos médicos e absolutamente necessários para garantir a segurança de pacientes e a eficácia dos procedimentos médico-hospitalares. É o que ocorre com os Dispositivos Médicos Implantáveis (DMIs), como stents, marca-passos, cardiodesfibriladores, próteses e órteses. Até chegar ao paciente, estes produtos precisam ser corretamente transportados e armazenados e demandam a manutenção de grandes estoques, com diferentes tamanhos e características de produtos para atender a pessoas de distintos portes e necessidades. Além disso, ao serem comercializados, os DMIs são acompanhados de uma série de ferramentas e instrumentais, utilizados na própria cirurgia, sem os quais não poderiam ser implantados. As especificidades não param por aí. Contribui para

a complexidade deste setor o fato de que, para que se obtenham os melhores resultados possíveis, esses equipamentos e produtos de saúde dependem de uma meticulosa, competente e especializada assistência técnica pós-venda. Em geral, dispositivos médicos requerem calibração – antes e depois das cirurgias - e revisões periódicas, que são realizadas pelo fornecedor e variam de hospital para hospital, conforme as caraterísticas da mão de obra e a utilização dos aparelhos. Outro fator inerente a este mercado é a necessidade imperiosa de que os profissionais de saúde sejam treinados e muito bem capacitados para operar instrumentos, equipamentos e mais um sem número de produtos – afinal, estamos falando de perícia médica e de vidas humanas que dela dependem para serem salvas ou preservadas. Some-se a essa equação um fato bastante corriqueiro quando se trata de dispositivos médicos. Seja por características próprias do produto ou pelo uso que lhe é dado, existe um grande número de dispositivos e aparelhos que são entregues em consignação aos estabelecimentos de saúde. A razão é simples: muitas vezes, a equipe médica só pode decidir qual é a melhor opção para um determinado paciente no momento da cirurgia. Para que possa fazer a escolha mais adequada, os profissionais precisam ter à mão, no campo cirúrgico, várias opções de produtos com diferentes modelos, tamanhos ou materiais. E, o que acontece com os produtos que ficaram à disposição do hospital mas não foram utilizados? Obviamente, precisarão ser reesterilizados e reembalados – mais serviços agregados à cadeia e que também requerem especialização.

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Health Innovation

Tabela ilustrativa de fornecimento itens / serviços prestados na cadeia de DMI

A Tabela SIMPRO, em vigor no país, mantém em cadastro 34 mil itens de dispositivos médicos que, na maioria, não são estocáveis. Produtos não estocáveis são sinônimos de suprimentos que requerem um sistema complexo e flexível de logística para garantir sua disponibilidade, além de acordos diferentes de manejo de inventário entre fornecedores, distribuidores e hospitais. Outra característica do setor de dispositivos médicos é a falta de similaridade entre os produtos. Embora possuam a mesma finalidade, podem ter concepções, tecnologia, especialização de componentes, materiais e funcionalidades distintas. Estes fatores dificultam, muitas vezes, uma fiel comparação de preços, a me-

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nos que todas as especificidades e serviços agregados também sejam levados em consideração e pesados na balança. Diferentemente do que ocorre com medicamentos, adquiridos pelo consumidor final, as aquisições no mercado de produtos para saúde são feitas entre pessoas jurídicas (negócio a negócio), o que também dá margem a diferentes modelos de comercialização. Vale lembrar que, em Saúde, atuam dois entes distintos no Brasil: o setor pùblico e o privado, cada um com modelos próprios de aquisição, incorporação e remuneração. Vamos aos detalhes: o setor privado dispõe de uma estrutura de compras especializada e profissional. As


redes hospitalares têm autonomia e alto poder de negociação e, mais recentemente, têm se organizado em grupos de compras centralizadas. Planos de saúde também negociam grandes volumes de compras diretas para suas redes próprias e conveniadas, impulsionados pelo seu crescimento nos últimos anos. Além disso, negociam valores de reembolso de procedimentos com sua rede credenciada. Já o sistema de aquisições no setor público ocorre por meio de licitações, com foco no menor preço, ou por meio de leilões reversos ou eletrônicos que asseguram a transparência e preços compatíveis com o poder de compra do Estado. A incorporação das tecnologias também é diferente nos sistemas público e privado. No primeiro caso, a decisão fica a cargo da CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia e, no segundo, da ANS – Agência Nacional de Saùde Suplementar. Essas decisões variam em termos de produtos que serão ofertados aos pacientes, velocidade de incorporação e preços que serão praticados. Tecnologias médicas são essenciais ao diagnóstico, tratamento e reabilitação e desempenham papel crucial para a saúde dos indivíduos e da sociedade como um todo. Graças às suas constantes inovações, têm contribuído para melhorar a acurácia e qualidade dos processos diagnòsticos, possibilitando também tratamentos mais precisos, seguros e eficazes. O aumento da eficiência dos cuidados em saúde, em todos os níveis, permite tratar mais pacientes em menores intervalos de tempo. Além dos benefícios clínicos, as tecnologias médicas oferecem benefícios sociais, reduzindo perdas por absenteísmo e aposentadoria precoce. Entretanto, a falta de uma compreensão mais profunda sobre as relações entre preços e benefícios das inovações tecnològicas impede um debate adequado e necessário sobre o tema. A complexidade do setor requer seu entendimento por todos os atores da cadeia de suprimento, de maneira que qualquer regulamentação de monitoramento econômico ou de mercado que eventualmente venha a ser desenvolvida proporcione a real transparência que o setor tanto deseja e necessita. Os dispositivos médicos representam cerca de 3,47%

de todas as despesas de saúde no Brasil, incluindo equipamentos para laboratòrios e reagentes para diagnósticos in vitro. A visibilidade e transparência sobre os gastos em cada etapa da cadeia (por exemplo, no caso dos implantes) são necessárias e obrigatórias. Além de coibir eventuais fraudes e desvios éticos, são fundamentais para a sustentabilidade do sistema de saúde. Os preços cumulativos formados ao longo da cadeia de suprimento deste setor precisam ser compreendidos, reconhecidos e associados a serviços que verdadeiramente agregam valor ao processo. Só com este amplo conhecimento da cadeia como um todo é que será possível validá-los. O desalinhamento do sistema de remuneração na cadeia de suprimento do setor de saúde é fator preocupante e precisa ser debatido nacionalmente para que possam ocorrer progressos efetivos. Se a complexidade da cadeia não for bem compreendida e controlada pode levar, inclusive, a um uso irracional das tecnologias médicas - a indicação excessiva de exames e procedimentos, seja por desejo de maior segurança de diagnóstico, seja por razões escusas -comprometendo a sustentabilidade do sistema de saúde. Porém, é muito importante que o combate às fraudes e a correção de desvios éticos não contaminem as decisões referentes a serviços que são legítimos e necessários aos procedimentos, supridos, na maioria dos casos, pela cadeia de distribuidores. Desvios éticos devem ser investigados e punidos por legislação e regulação específicas. Onde a legislação é falha, deve ser complementada, de modo a trazer tranquilidade à população e confiança nas instituições e seus profissionais. A criação e implementação de mecanismos de auto-regulamentação da indústria, de leis anticorrupção e de outras regulações que venham trazer transparência à população e ao governo são mais do que necessárias, são fundamentais. Sò a transparência poderá contribuir para a construção de um novo sistema de remuneração, tão necessário ao setor. E para que possamos desenhar uma visão estratégica para o sistema de saúde que queremos para o Brasil e, sobretudo, como torná-lo e mantê-lo sustentável. H

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Artigo de

Avi Zins

* Colaborou Thiago Julio Avi Zins

Head of Healthcare Segment da Neoris do Brasil.

O futuro dos sistemas RIS e PACS

O que pode acontecer?

O

que um engenheiro eletrônico com carreira em tecnologia da informação tem em comum com um médico radiologista? Ambos foram se encontrar no mundo da saúde e, mais precisamente, em um assunto altamente polêmico que é o futuro dos sistemas RIS e PACS. A ideia deste artigo não é a de polemizar ainda mais o assunto, e sim tentar trazer uma luz no que se pode esperar destes ambientes. Nos últimos anos, temos observado o alto grau de maturidade em que as tecnologias presentes no departamento de radiologia chegaram. Pioneira na adoção de sistemas clínicos e de trabalho na rotina da especialidade, a radiologia, hoje, é uma importante referência técnica e de gestão para departamentos que começam a se digitalizar. Em geral, contamos com uma sólida base de dados (o arquivo do PACS), que armazenam não somente imagens, mas dados do paciente e dos exames, de forma padronizada e estruturada. Somos pioneiros na adoção de padrões de interoperabilidade (DICOM, HL7, IHE), o que nos garante uma consistente e segura comunicação com nossas modalidades. Também, muitas vezes, temos boa parte do nosso processo de trabalho dentro de sistemas (agendamento, listas de trabalho, leitura de estudos, confecção de laudos, distribuição de resultados e faturamento), o que nos confere agilidade e vantagem competitiva. A partir daí, passamos a usar dados obtidos nesses diversos sistemas para análises de negócios, me-

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lhoria de processos e controle de qualidade. Realmente, uma bonita e respeitada trajetória de informática médica. Mas, para onde vamos? Quais serão os próximos drives de mudança, os próximos paradigmas a serem quebrados dentro da lógica da arquitetura RIS/PACS? Uma boa reflexão foi escrita por Don Dennison, ex-presidente da SIIM, publicada em 2014 pelo Journal of Digital Imaging: PACS in 2018: An Autopsy. Neste interessante artigo, o autor faz o exercício de imaginar a morte deste sistema em cinco anos, e tenta descrever o cenário em que isso ocorreria. De forma sucinta e didática, Dennison aborda as principais mudanças conceituais no modelo do sistema radiológico e aponta quais novas tecnologias e desenhos de arquitetura “ameaçam” a lógica atual do RIS/PACS. Basicamente, a tese desenvolvida é de que o modelo especializado da radiologia, com robustos sistemas dedicados, arquivos próprios e infraestrutura exclusiva, passa a perder valor diante da perspectiva atual de hospitais digitais, com sistemas integrados e maior fluxo da informação na sua forma digital. Essa estrutura, “em silos”, como chamamos em informática clínica, contempla múltiplos locais de informação dentro de um mesmo hospital ou sistema de saúde, cada um com sua própria estrutura e lógica de arquitetura, gerando sistemas cada vez mais especializados e pesados, a radiologia com seu arquivo, a patologia, o laboratório, os setores de contas, etc. Assim,


temos grandes geradores de dados, que muitas vezes não se comunicam entre si, e sem uma lógica central agregadora. É possível entender os motivos históricos desta fragmentação, comum nas especialidades que se informatizaram nos anos 70-90. Mas, apesar de funcionarem bem “internamente”, estes sistemas se mostram deficientes ao se passar para uma lógica mais moderna, integrativa e holística. Talvez faça mais sentido, por exemplo, armazenarmos os exames em um repositório central do hospital, que também possa armazenar outros tipos de arquivo não-DICOM provenientes de outros setores do hospital. Talvez nossa forma de lidar com os agendamentos e worklists mudem com a chegada dos CPOEs, sistemas de entrada de pedidos de exame. Talvez a nossa forma de receber e devolver informações clínicas dos pacientes mude com a adoção cada vez maior de prontuários eletrônicos. Talvez a nossa forma atual de entregar os resultados seja insuficiente diante de uma geração de médicos que vai manipular as próprias imagens e interagir com os exames de maneira mais similar ao radiologista. Interessante artigo no “European Journal of Radiology” de 2011 mostra o PACS como um sistema que irá concentrar as imagens multimídia de saúde em uma integração vertical, conforme citado acima, ou seja, através das várias especialidades médicas e não só na radiologia e, ao mesmo tempo, com um alcance horizontal no sentido em que estas imagens estejam disponíveis nos hospitais, nas clínicas, nos consultórios médicos e até móveis nas mãos dos pacientes e médicos. O mesmo documento cita o PACS como uma ferramenta que irá trazer uma forte conexão em termos de Telemedicina ou Teleradiologia e ir até o nível de permitir análises e detecções mais profundas de problemas chegando inclusive a usar inteligência artificial aplicada (Future Healthcare Technology Institute) indo de imagens 3D, 4D e até 5D e hologramas, e podendo usar o conceito de CAD (Computer Aided Detection

ou Computer Aided Diagnostics) Imaginar como será nosso sistema no futuro é no fundo tentar desvendar o futuro da própria especialidade. Para isso, além de analisarmos o cenário atual e perspectivas tecnológicas, se torna mais importante explorarmos qual é o verdadeiro valor da radiologia no cuidado moderno. Complementos Com o advento da Internet das Coisas (que, no mundo de saúde, gosto de chamar de Internet of Bodies), acreditamos que, cada vez mais, os equipamentos que fazem os exames de imagem vão reduzir de tamanho e estarão cada vez mais ao alcance dos pacientes (falando de futuro, é claro, sem saber realmente de quando isso ocorrerá) em formatos móveis e de formas que o paciente poderá executar a maioria dos exames diagnósticos necessários (isso já ocorre com exames de análises clínicas). Consequentemente, a mudança tende a ser dramática nestes softwares que vão ter que ser cada vez mais abertos (não proprietários), mais interoperáveis e, acima de tudo, ter segurança e disponibilidade em altíssimo nível. Vamos ver um ínterim de tempo em que teremos o mRIS e o mPACS (Mobile) operando com os equipamentos móveis e cada vez mais ligados na rede. Possivelmente, os atuais sistemas de RIS e PACS estarão mais integrados aos sistemas de gestão clínica-hospitalar, quebrando as barreiras existentes entre estes ambientes no mercado de saúde. Enfim, continuando as conjecturas, o que pode vir de novo será sempre muito bem vindo! H * Thiago Julio - Radiologista Intervencionista, pós-graduado em Informática em Saúde, Coordenador Médico de Tecnologia e Inovação no Hospital Sírio Libanês, Cofundador e Diretor do IHE Brasil, Medical Officer na Healfies.

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Mercado estratégia

Especialistas falam sobre perspectivas para este ano e os desafios que estão por vir

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O Brasil está adoecido economicamente e os seus principais sintomas são redução forte no PIB, disparada da inflação, desemprego em alta e a valorização do dólar. De acordo com o FMI, a economia do país recuará 3,5% em 2016, resultando em uma baixa de 2,5 pontos percentuais em relação ao relatório anterior. No setor da saúde, a preocupação não é diferente: mais de 500 mil brasileiros deixaram de ter seguro de saúde, segundo dados da ANS. O crescimento das demissões no setor privado, a tabela do SUS desvalorizada, o aumento do número de usuários e as dívidas das entidades

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– que passam dos 22 milhões – são sinais de deterioração do quadro econômico deste segmento. “Acreditamos que, em 2016, enfrentaremos uma série de desafios. Mas, sem dúvida, um dos maiores será equilibrar as despesas operacionais com as nossas receitas líquidas. Os primeiros levantamentos do desempenho dos hospitais privados em

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2015 demonstram uma defasagem significativa. As nossas receitas líquidas, no ano passado, foram 1,8% inferiores em relação a 2014, ao passo que as despesas sofreram um aumento de 8,3%”, analisa Francisco Balestrin, Presidente do Conselho de Administração da Anahp e Presidente eleito da Associação Mundial de Hospitais (IHF).


O Professor e Coordenador Geral dos programas de MBA do Insper, Silvio Laban, acredita que os ajustes nas contas públicas podem gerar ainda mais inflação, criando assim um efeito cascata. “Com a inflação temos efeitos em todas as atividades econômicas, principalmente nas taxas de emprego. Estamos em um círculo vicioso, tornando difícil imaginar uma perspectiva em curto prazo”, ressalta. O sistema de saúde brasileiro é formado por uma teia complexa que abrange universidades, centros de pesquisa, indústrias, prestadores de serviço, empresas de tecnologia, operadoras de planos de saúde e outras atividades de amparo à população. Mesmo neste momento de dificuldade, a demanda desses atores continuará crescendo e os gastos continuarão aumentando. Silvio Laban considera que no cenário atual poderá haver migração de pessoas do sistema privado de saúde para o público. “Pensando no privado, existirá potencialmente uma perda de receita; e no caso do público, um aumento de demanda, isto é, queda de demanda de um lado e aumento de demanda do outro. Os clientes farão com que as empresas aprendam a lidar ainda mais com a questão dos custos”. A alta do desemprego e a crise econômica que contaminam o Brasil reduzem o número de beneficiários de planos de saúde, fenômeno que passa a sobrecarregar os postos de saúde e hospitais de rede pública, complicando a situação. “O investimento no setor da saúde é baixo, o gasto per capita soma 525 dólares no Brasil, enquanto que na Argentina são gastos 721 dólares, no Uruguai são desembolsados 2 mil dólares e no Canadá, 4 mil dólares. O Brasil investe pouco na saúde. Desejamos que o Governo pague o valor equivalente de cada tratamento, e que tenhamos um ajuste na tabela SUS”, comenta Edson Rogatti , Presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Estado de São Paulo (Fehosp). “A principal reivindicação é que a saúde pas-

Silvio Laban, Professor e Coordenador Geral dos programas de MBA do Insper

se a ser tratada com a devida importância que ela realmente tem. É difícil acreditar que um setor que representa mais de 9% do PIB do país seja tratado com tanto descaso. Nossa Saúde está sucateada, falta gestão e lideranças que de fato se preocupem com a saúde da população”, argumenta Balestrin. Por outro lado, o país nunca esteve tão barato para investir. “Se você parar para analisar o que está acontecendo com a economia, verá que, por exemplo, antes uma empresa que custava 200 milhões de dólares

custa hoje 50 milhões, e que o seu investimento de 100 milhões de dólares de três anos atrás é hoje um montante de 400 milhões”, argumenta Silvio Laban. O mercado de saúde tem peculiaridades interessantes para o investimento mesmo em momentos de crise. “Saúde é algo que todo mundo tem que cuidar, não é opcional. Então, nesse sentido, esse é um setor atrativo. Por conta da constante evolução da tecnologia, é um mercado que não morre”, finaliza Laban. H

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Gente e Gestão estratégia

Mohamed Parrini Quem é: atual Superintendente Executivo do Hospital Moinhos de Vento. Carreira: Formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Parrini é especializado em logística offshore. Também possui extensão executiva na área de Estratégia pela Harvard Business School e Mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

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Construindo lideranças

Mohamed Parrini à frente do Hospital Moinhos de Vento “A nossa proposta é simples: ser um hospital melhor a cada dia”

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O Hospital Moinhos de Vento (HMV) anunciou importantes mudanças em sua direção neste ano. Desde março, Mohamed Parrini, que até então ocupava o cargo de Superintendente de Operações e Finanças, passa a exercer também a Superintendência Executiva. Parrini acumulará ambas as superintendências até a designação de um substituto para a sua primeira função. Mohamed Parrini começou sua história no HMV em outubro de 2007, quando foi convidado para assumir a Superintendência de Operações e Finanças, durante a gestão de João Polanczyk. Na administração seguinte, a partir de 2012, houve uma nova redistribuição das áreas corporativas e de planejamento do hospital, onde o executivo pode ampliar suas responsabilidades. Nesta entrevista exclusiva, Parrini fala sobre liderança, sua experiência profissional e perspectivas para 2016. Como surgiu a oportunidade de ocupar a superintendência do HMV? O convite surgiu como resultado do trabalho desenvolvido desde a formação da equipe que ingressou na instituição, há nove anos, durante a gestão do então Superintendente

Executivo João Polanczyk. Tanto eu, como o Superintendente Fernando Andreatta Torelly, fizemos parte do grupo que chegou ao HMV com o Dr. João. Buscamos, com o Conselho de Administração, dar um novo dinamismo e uma nova profissionalização para a instituição, em que a meritocracia e a gestão por projetos passaram a ser uma pauta estratégica. Graças ao trabalho qualificado desenvolvido pela equipe de gestores selecionada, passamos de um faturamento de R$ 170 milhões para mais de R$ 600 milhões, reestruturamos o parque tecnológico da instituição, e investimos fortemente no programa de segurança do paciente. Nosso objetivo atual é darmos sequência e aprimorarmos, cada vez mais, esta estratégia. Como o atual cenário eco-

nômico vem impactando a gestão do hospital e quais serão suas propostas para superar estas adversidades? O HMV tem como atributos principais a consistência em seu planejamento e a disciplina no método de execução. Esses atributos fazem com que, apesar das dificuldades momentâneas, tenhamos governança e sustentabilidade econômica para superarmos os desafios, mantendo uma estratégia focada no longo prazo, priorizando o paciente e a melhor Medicina. Mesmo em uma época de crise, obtivemos um bom crescimento nos anos recentes. As estratégias planejadas e integradas, aliadas ao conhecimento do mercado, nos impulsionaram a trabalhar para atender necessidades específicas do nosso público-alvo. A nossa proposta é simples: ser um hospital melhor a cada dia,

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Gente e Gestão

fiel aos seus valores históricos e audacioso na busca das melhores práticas médico-assistenciais. As adversidades serão superadas com consistência no planejamento, a busca incessante pela segurança do paciente e pela valorização dos serviços médicos estruturados. Você traz um profundo conhecimento administrativo, com ricas experiências no exterior, inclusive em outros setores. Diante de sua vivência, o que a gestão na saúde pode apreender com outros segmentos a fim de trazer maior segurança, qualidade e sustentabilidade? Existe uma grande possibilidade de troca de conhecimentos e experiências entre diferentes segmentos. O meu aprendizado aqui é tão grande quanto das pessoas que me cercam. Aprendo todos os dias que o resultado é consequência de uma missão bem definida e do foco no paciente. Perante o olhar do nosso público, do corpo clínico e da sociedade, os resultados econômicos são uma consequência natural. O segmento saúde deve ter como maior objetivo de gestão a ampliação da meritocracia, o foco no resultado e desfecho clínico, e a multidisciplinariedade entre os diferentes profissionais. Na sua opinião, como o hospital constrói a sua liderança no mercado? A liderança nesse segmento é construída, principalmente, pela história e valores da instituição, pela qualidade de seu corpo clínico e equipe assistencial, pela ética corporativa, pela disciplina na execução de projetos, pela obsessão na segurança do paciente e pelo melhor desfecho clínico, muitos deles avaliados através de indicadores mensurados de forma objetiva. Nos últimos anos, temos utilizado diversas metodologias de avaliação de desfecho clínico, nos comparando a instituições de saúde de diversos países e regiões. Quais serão as estratégias que o HMV se dedi-

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Aprendo todos os dias que o resultado é consequência de uma missão bem definida e do foco no paciente” Mohamed Parrini

cará para 2016? Este ano, vamos inaugurar nosso novo Centro de Oncologia, que será referência no tratamento do câncer no Sul do país. A estratégia do HMV é baseada em ciclos. Vamos encerrar este último ciclo em 2016 e uma das primeiras ações será a definição do próximo planejamento da estratégia junto ao Conselho de Administração para a próxima fase (2017 - 2020). Como principais entregas para este e o próximo ano, além do Centro de Oncologia, também construiremos um novo prédio que ampliará nossa capacidade de internação, além de uma nova UTI. A obra, de oito andares e com área total construída de 9.300 m², oferecerá 100 leitos adicionais, divididos em unidades de Internação, Centro de Terapia Intensiva Adulto e Centro de Terapia Hematológica (especializado no tratamento de doenças onco-hematológicas). Somente nestes dois anos, se-

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rão investidos mais de R$ 200 milhões, que já estavam programados anteriormente. Fazemos isso por acreditarmos no Rio Grande do Sul e no Brasil. Como você definiria o seu modo de gestão? Eu acredito em um modelo de trabalho que seja compartilhado e aberto, baseado na ética das relações em todas as esferas, conciliando o foco em resultados com humanismo. Ética e transparência são importantes bandeiras defendidas pelo setor. Como você avalia essas causas? A ética, tanto em nosso país, como nas empresas, deve partir dos indivíduos. São os exemplos de cada um que podem e devem influenciar o desenvolvimento dos governos, das empresas, e dos setores. Não podemos admitir pequenos desvios de conduta, que é a base para a construção de uma sociedade moral e democrática.

Fernando Andreatta Torelly, que até então assumia a superintendência executiva do Moinhos de Vento, passa a trabalhar na Direção Executiva do Hospital Sírio-Libanês. Contudo, Torelly integrará o Conselho de Administração do Hospital Moinhos de Vento e continuará acompanhando a execução dos projetos estratégicos. H


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Artigo de

Carlos Goulart Carlos Goulart

Presidente Executivo da ABIMED – Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde.

Um gargalo explosivo nos portos e aeroportos do país

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este contexto desafiador que vivemos no país nestes últimos tempos, marcado ainda por uma grande insegurança em relação ao futuro próximo, aparece mais um elemento crítico que vem afetar fortemente a combalida área da Saúde. Trata-se da demora para liberação de produtos para saúde nos portos, aeroportos e fronteiras que estão sob responsabilidade da agência sanitária. Quando a Anvisa foi fundada em 1999, aproximadamente 1500 funcionários de outros ministérios foram transferidos para a agência e alocados em cerca de 80 unidades denominadas PAF (Portos, Aeroportos e Fronteiras). É de amplo conhecimento o vigoroso crescimento do Brasil, puxado também pelos bons ventos no comércio mundial, no período que antecedeu a crise dos tempos atuais. Foram anos nos quais a área da Saúde experimentou um crescimento ainda mais vigoroso devido ao fortalecimento do Real, que tornou as importações mais baratas; ao aumento do emprego, que ampliou a procura por planos privados de saúde, e ao crescimento das arrecadações de impostos, que fortaleceu as despesas na área pública. No entanto, apesar do aumento da demanda que esses fatores promoveram, triplicando o volume de importações e exportações, a força de trabalho da Anvisa seguiu caminho oposto: os funcionários dos PAFs que se aposentavam não puderam ser repostos, pelo simples fato de não

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serem concursados, criando um grande vácuo de mão de obra que hoje está se acentuando assustadoramente. Como consequência, o tempo de liberação de uma guia de importação, que tradicionalmente girava ao redor de cinco dias, tem subido sistematicamente ao longo tempo e, hoje, demora mais de 50 dias nos principais portos e aeroportos do país. As consequências negativas são sentidas por todos. Hospitais e clínicas podem ficar desabastecidas prejudicando o maior implicado, que é o paciente. A indústria passa a arcar com expressivos aumentos de gastos, como o pagamento de sobre-estadia nos portos e aeroportos, multas pelo não cumprimento de contratos com clientes, além do aumento de custos financeiros quando se veem obrigadas a ampliar estoques para contrabalançar os problemas causados pelos atrasos. Como esta demora também afeta a importação de insumos, componentes e matérias-primas para as fábricas nacionais, o efeito se torna ainda mais deletério para a economia, pois neste momento que, em tese, seria propício às exportações, o que vemos são fábricas reduzindo drasticamente sua produção ou até mesmo fechando temporariamente as portas por falta de insumos. O fato é de amplo conhecimento das autoridades e há tempos a Anvisa, juntamente com os segmentos envolvidos, vem buscando alternativas de solução. Algumas já estão sendo longamente


discutidas, como a melhora do claudicante sistema de tecnologia de informação, implantação do portal único e melhor integração com os sistemas da receita federal. Outras, como as forças-tarefas adotadas recentemente, têm apresentado resultados satisfatórios, mas são medidas paliativas para apagar incêndio, soluções de curtíssimo prazo e focadas em poucos aeroportos. Os segmentos afetados têm se reunido periodicamente em busca de soluções permanentes, envolvendo inclusive as esferas políticas. Entre as diversas medidas propostas, duas se mostram fundamentais como pilares para solução de longo prazo. Uma delas é a implantação de um sistema de agilização das licenças de importação/exportação com base no critério de

análise de risco fundamentado no histórico das empresas. Essa medida já foi implantada com sucesso na esfera da Receita Federal sob a denominação de Linha Azul. Outra medida que pode ser adotada imediatamente: há um projeto de lei que prevê o aumento do quadro de servidores na esfera federal, com destinação de 180 vagas para a Anvisa. Este projeto, já aprovado na Câmara, foi para o Senado no final do ano passado e aguarda votação sob o número PLC 99/15. Estes dois itens sintetizam o foco da discussão de todos envolvidos, incluindo a própria vigilância sanitária. É a única alternativa, fora da esfera judicial, para vencer este perverso gargalo que afeta a indústria, os pacientes e a saúde de toda a população. H

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Líderes e Práticas mercado

Líderes da Saúde 2015 Uma homenagem àqueles que mais se destacaram na comunidade da Saúde

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O Grupo Mídia realizou, em São Paulo, a noite de premiação do Líderes da Saúde 2015. A terceira edição do prêmio homenageou empresas, instituições de ensino e saúde, operadoras, indústrias, entre outros players do mercado que mais se destacaram no último ano. “Gestores, executivos e empresários não apenas provaram que sabem lidar com as dificuldades, mas também que sabem inovar diante desta crise que assola o país. Nesta noite, passaram por este palco aqueles que foram, neste último ano, exemplos de liderança, de confiança e credibilidade para todo o setor”, afirma Edmilson Jr. Caparelli, Presidente do Grupo Mídia. Os ganhadores foram eleitos pelo Conselho do Grupo Mídia, composto pelas revistas Healthcare Management, HealthARQ, Health-IT e portal Saúde Online. Foram 23 categorias que 32

abrangem desde a arquitetura e infraestrutura, até saúde suplementar, associação, indústrias e instituição de ensino. Cada categoria trouxe 3 eleitos homenageados igualmente, não havendo ranking entre eles. O Grupo Mídia também reservou um espaço na cerimônia para o seu homenageado especial. Neste ano, o escolhido foi Hospital Albert Einstein, que completou 60 anos em 2015. A homenagem foi por toda a sua excelência e importância da instituição não apenas no Brasil, como também em toda a América Latina.

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1º Prêmio ABIMED de Inovação Transformacional Na mesma noite de cerimônia de premiação do Líderes da Saúde 2015 também aconteceu o 1º Prêmio ABIMED de Inovação Transformacional. Foram premiadas três empresas que se destacaram por colocar no mercado inovações que contribuíram para a ampliação do acesso da população à saúde, a melhoria do padrão de cuidados médicos e a sustentabilidade econômica do sistema de saúde. Os ganhadores foram eleitos


por uma Comissão Julgadora formada por Dirceu Barbano, ex-diretor presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária); Giovanni Guido Cerri, presidente do Conselho Diretor do Instituto de Radiologia do HCFM/USP e ex-Secretário de Estado da Saúde de São Paulo; Gonzalo Vecina Neto, ex-superintendente corporativo do Hospital Sírio Libanês, e Aurimar Pinto, Diretor Executivo de Relação Institucionais da ABIMED. Na categoria “Ampliação do acesso da população à saúde” o vencedor foi o projeto “Implementação de tecnologias inovadoras para telerradiologia: estudo de caso no Governo do Estado do Amazonas”, apresentado pela empresa carioca Diagnext.com. A empresa desenvolveu uma solução para transmissão remota de exames radiológicos – como mamografia e Raio X –no Estado do Amazonas, que enfrenta inúmeras dificuldades logísticas de atendimento médico e de telecomunicações devido às barreiras geográficas. Já na categoria “Melhoria do padrão de cuidados médicos” ganhou o projeto “O transporte de vacinas saiu da era do gelo: um novo conceito para transporte e conservação de produtos”, da empresa gaúcha Biotecno. A empresa desenvolveu uma câmara de conservação portátil, sem uso de gelo, para transporte de órgãos para transplante, vacinas e produtos biológicos como bolsas de sangue, materiais de laboratório e medicamentos. A câmara é uma alternativa para as caixas térmicas com gelo reciclável tradicionais, que garantem a efetividade e segurança do produto por um período de tempo bastante curto, provocando grandes perdas. E na categoria “Sustentabilidade do Sistema de Saúde” o projeto vencedor foi “Intelitive®: Uma Aplicação Prática de Inovação baseada em Sustentabilidade em Sistema de Saúde”, da empresa Astus Medical, de São Paulo. Genuinamente brasileira e de pequeno porte, a empresa desenvolveu um equipamento de videolaparoscopia com tecnologia e mão de obra totalmente nacionais – o primeiro do mercado brasileiro com esta característica. H

Momentos Líderes da Saúde 2015

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Líderes e Práticas

Momentos Líderes da Saúde 2015

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Artigo de

Márcia Mariani

O pequeno grande vilão

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cotidiano sempre nos ensina muito sobre todos os aspectos de nossa vida, por exemplo: nos dias atuais estamos reforçando aquele aprendizado absorvido desde nossa tenra infância: “tamanho não é documento”. Nós, brasileiros, temos perdido vários pontos na batalha contra um simples mosquito que tem conseguido repercussão nacional e internacional em jornais, revistas e documentários. Mobilizam-se profissionais e pesquisadores de um país inteiro, muda-se o planejamento de vida de muitos casais e ainda há a interferência na economia devido ao consumo de repelentes que está subindo vertiginosamente. Tudo isso em função de um ser minúsculo que até “ontem” era insignificante para a humanidade, que quase ninguém, além dos cientistas, sabiam seu nome científico. Aedes aegypti e os vírus que podem ser “guardados” em seu ínfimo corpo! Muitos de nós tememos grandes coisas, porque as consideramos letais para nossa vida. Um tsunami, um furação, uma erupção vulcânica ou ainda a queda de um asteroide são alguns exemplos, porém, nem percebemos que muitas coisas igualmente letais podem ser pequenas, muito pequenas, invisíveis a olho nu. Historicamente, já passamos por esta lição. John Snow, o grande pesquisador da Cólera, enfrentou muitas lutas por afirmar que a água, aparentemente limpa, estava contaminada. Bem podemos até citar a ficção científica como o filme “Guerra dos Mundos”, que mostra o poder dos pequeninos. Isso porque no filme os poderes dos extraterrestres que dominavam o mundo foram vencidos, ou melhor, foram aniquilados por uma bactéria. Quando falamos em aquecimento global pensamos, muitas vezes, nas consequências como furações, enchentes, catástrofes clássicas que também renderam grandes filmes. Mas, por vezes, não en-

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Márcia Mariani Administradora, pósgraduada em meio ambiente e liderança. Diretora da SIAServiço de Inteligência Ambiental

tendemos que as mudanças climáticas irão favorecer os insetos que são seres de grande adaptabilidade evolucional. A elevação da temperatura ou da umidade são perfeitos para sua reprodução. Insetos que poderão trazer de volta doenças erradicadas há muito pela humanidade, ou até vírus ainda desconhecidos que poderão causar epidemias ou até pandemias. O poder de multiplicação destes artrópodes é imenso. A natureza os dotou de vida curta e muita fertilidade. Essas ameaças de saúde pública geradas pelo mosquito Aedes aegypti devem nos fazer refletir para onde estamos indo. Nós, seres humanos, somos apenas parte de uma engrenagem que pode ser corrompida por milhões de pequenas criaturas famintas por hospedeiros. Caro leitor, para protegermos e conservarmos nossa saúde precisamos ver a vida como um gigantesco sistema que ela é. Precisamos abrir nossas mentes e aprender mais sobre causa e efeito dentro da ecologia, ciência que pode ser traduzida como estudo de nossa casa. Sim, leitor, a solução começa com o conhecimento sobre a “nossa casa”. Fazendo uma analogia com a Liderança, podemos dizer que grandes líderes passam mais de 50% de seu tempo liderando a si mesmos. Podemos ser nosso melhor amigo ou nosso pior inimigo. Ainda como parte da solução, como dizem os chineses, precisamos esvaziar um pouco a xícara de chá para caber mais líquido dentro dela, provérbio simples, mas intenso, ensinando que precisamos expandir nossas mentes para caber mais conhecimento. Simples assim: mais conhecimento gera maior conscientização que, por sua vez, gera mudanças de comportamento que favorecerão a plenitude de vida. H


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Health-IT

ideias e tendências

Disseminação do sequenciamento genômico Hospital Alemão Oswaldo Cruz e Coimbra Genomics em busca da medicina personalizada


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Não é de hoje que o Hospital Alemão Oswaldo Cruz vem desenvolvendo sua área de inovação digital e telemedicina. A parceria com a alemã Syte Institute vem potencializando esse ramo na instituição, referência em todo o país. Há cerca de 1 ano, a Styte apresentou ao HAOC o Grupo Coimbra Genomics, empresa portuguesa de medicina personalizada, proprietária da plataforma de software ELSIE®. Começava, então, os primeiros passos de uma promissora parceria. “Nessa primeira conversa, vimos uma convergência de interesses e estratégias tanto do ponto de vista de prover para médicos e pessoas o acesso a serviços diferenciados, como também nas estratégias em inovação na saúde”, lembra Jefferson Gomes Fernandes, Superintendente de Ensino e Pesquisa do HAOC. A solução permite que médicos consultem o genoma dos seus pacientes através de “perguntas genômicas” padronizadas, no contexto de consultas médicas normais. O sistema, armazenado na “nuvem”, fornece ao médico relatórios fáceis de ler e interpretar, contendo informação validada, relevante para decisões clínicas precisas e individualizadas sobre prescrição de terapias, diagnóstico e prognóstico. Trata-se da primeira solução simples, altamente escalável e completamente segura para fazer medicina personalizada. Agora, o HAOC juntamente com o Preventicum Institute for Individualized Medicine (Essen, Alemanha), o Rambam Medical Center (Haifa, Israel), o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra – CHUC (Portugal), a Ruppiner Kliniken (Região Berlim-Brandenburgo, Alemanha) participam de um estudo piloto para os testes finais antes do lançamento comercial da plataforma, previsto para o final deste ano. “Estamos fazendo uma série de ajustes antes de colocar esta solução no mercado. Esta avaliação está sendo feita no mundo todo para que o projeto seja lançado simultaneamente na Europa e Brasil”, explica.

Jefferson G. Fernandes, Superintendente de Educação e Ciências do HAOC

A disseminação deste serviço, por ora, será custeado pelos próprios pacientes e ainda não há previsão de preço. “Não sabemos quanto isso irá custar para o paciente. Contudo, lembrando que em 2001 esse sequenciamento custava milhões de dólares e no ano passado estava menos que mil dólares, vejo que com o tempo essa tecnologia será acessível a muitos.” Questionado se estamos próximo da cura do câncer com a medicina personalizada, Fernandes afirma que este é um importante passo, mas que ainda temos um longo caminho que necessita de investimentos em pesquisas. “Países investem trilhões de dólares em armas nucleares e arma-

mentos. Se metade disso foi investido em pesquisa já estaríamos em outro estágio.” Segurança Após o cadastramento no ELSIE®, o paciente e seu médico poderão acessá-lo para obter a informação solicitada. O sistema é desenvolvido para manter total sigilo das informações, pois existem duas chaves físicas, uma para o paciente e outra para o médico, evitando assim que sua carga genética seja analisada sem autorização prévia, uma vez que o sistema só funciona com ambas as chaves inseridas simultaneamente. H

Confira o Podcast no saudeonline.net http://goo.gl/7fhf0F

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Ideias e Tendências sustentabilidade

A força

do diálogo Solange Mendes, nova presidente da FenaSaúde, diz que a aproximação com o consumidor, governo e entidades será pauta crucial em seu mandato

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Solange Beatriz Palheiro Mendes é a nova presidente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde). Desde 2010, a executiva ocupava a diretoria-executiva da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNseg). Seu mandato na FenaSaúde estenderá até 2019. Solange Mendes almeja intensificar os esforços de conscientização sobre o bom uso dos recursos disponíveis para a saúde, orientando os consumidores sobre como aproveitar e fazer o melhor uso do seguro ou plano, segundo suas necessidades. “Em 2016, a FenaSaúde dará continuidade ao trabalho que já vem sendo desenvolvido por Marcio Coriolano. Projetos como o Fórum da Saúde Suplementar e temas como a sustentabilidade do setor e a segurança regulatória continuarão na pauta. Adequação dos custos, uso consciente dos serviços e racionalidade na incorporação de novas tecnologias também são importantes desafios. Além disso, a aproximação com o consumidor será uma pauta crucial”, afirma. A executiva toma posse em um momento

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de retração da atividade econômica no Brasil, com o setor de Saúde Suplementar apresentando, nos últimos meses, sinal de significativa desaceleração. “O momento atual requer atenção especial, com a contínua oferta de serviços de qualidade para retenção dos consumidores, e reforça a necessidade de gestão eficiente dos custos.” OPME Os desafio da Saúde Suplementar impõem a todos os entes – operadoras de planos de saúde, prestadores de serviços, órgãos reguladores, governo e beneficiários – o debate sobre temas cruciais para a sustentabilidade econômica e social do setor. Temas como o papel do seg-

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mento privado e seus contornos legais, segurança jurídica e regulatória, adequação dos custos, uso consciente dos serviços pelos beneficiários e racionalidade na incorporação de novas tecnologias são questões que obrigam todos a pensar sobre o futuro dos seguros e planos de saúde. Um fato ressaltado por Solange Mendes diz respeito às Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPME), itens que têm forte impacto nos custos médicos. Em 2015, as OPME foram objeto de Comissões Parlamentares de Inquérito instauradas para investigar a “Máfia das Próteses”. A Portaria Interministerial nº 38 (Ministérios da Saúde, Justiça e Fazenda) criou, então, o Grupo Técnico Interministerial (GTI) com o objetivo de propor me-


Temas como o papel do segmento privado e seus contornos legais, segurança jurídica e regulatória, adequação dos custos, uso consciente dos serviços pelos beneficiários e racionalidade na incorporação de novas tecnologias são questões que obrigam todos a pensar sobre o futuro dos seguros e planos de saúde. plantáveis. “Acreditamos que o aperfeiçoamento das relações de consumo é uma forma de desenvolvimento do mercado, com uma comunicação clara para satisfação do consumidor cidadão e a demonstração da relevância dos serviços prestados pelas operadoras de planos privados de assistência à saúde.” Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde

didas para a reestruturação e ampliação da transparência do processo de produção, importação, aquisição, distribuição, utilização, tributação, avaliação e incorporação tecnológica, regulação de preços, aprimoramento da regulação clínica e de acesso dos dispositivos médicos em território nacional. A FenaSaúde tem alertado as autoridades acerca do tema e integra o Grupo de Trabalho Externo (GTE) de OPME, constituído por recomendação do GTI para realizar, no âmbito da ANS e ANVISA, o acompanhamento e o gerenciamento da implementação do conjunto de propostas definidas no Relatório Final do GTI-OPME, visando à indução de melhores práticas no mercado de dispositivos médicos im-

Judicialização “O consumidor sempre terá o direito de questionar judicialmente algo com que não concorda. Entretanto, vivemos, hoje, o processo de judicialização da saúde que provoca prejuízos a todos, inclusive ao próprio sistema mantido pelos beneficiários”, pontua Solange Mendes. Conforme a executiva, na maioria das decisões liminares, os juízes sentenciam olhando apenas pelo ângulo social, desconsiderando a validade dos contratos, a Lei 9.656/98 – que rege os planos – e a própria regulação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que

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Ideias e Tendências

determina a cobertura obrigatória (Rol de Procedimentos). “Dessa forma, dão ganho de causa em primeira instância, presumindo que o cidadão tem aquele direito e deixando para as operadoras a única alternativa de recorrer da decisão.” Exemplos clássicos dessa situação são os contratos antigos que, por decisão de muitos consumidores, não são adaptados à Lei 9.656, e também as regras para demitidos e aposentados que, apesar da ampla regulação, nem sempre são consideradas nas decisões. “O efeito da judicialização é a elitização do acesso aos serviços de saúde, quando concede privilégios extraordinários àqueles que têm condições de recorrer à Justiça para reclamar coberturas que escolheram excluir de seus planos ou aos que requerem direitos não previstos em lei. Não há como esse prejuízo não ser repassado aos demais beneficiários que são, junto com empresas contratantes, os únicos financiadores dos planos de saúde.” Para Solange Mendes, os planos não podem oferecer a integralidade que o setor público se propõe. “Se até o SUS tem limites para a incorporação, por que o setor privado deve cobrir tudo, inclusive o que não está no Rol ou nos contratos?”

Regulação Em princípio, a regulação deve se ater a minimizar problemas conhecidos como falhas de mercado. No setor de Saúde Suplementar, como a assimetria de informações é muito intensa, cabe uma regulação que corrija essas situações. Contudo, para Solange Mendes, ir além dessa necessidade pode causar mais danos do que benefícios. “Cria-se espaço para as chamadas falhas regulatórias que acentuam ainda mais distorções no setor. O peso da regulação não 42

“O líder precisa estar aberto ao diálogo e ouvir os mais diversos pontos de vista para tomar decisões de forma mais assertiva possível. Na FenaSaúde, manterei contato com todos os entes da cadeia de Saúde Suplementar e da sociedade em prol do desenvolvimento do setor.” Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da FenaSaúde

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pode se tornar desproporcional e inibir a iniciativa privada. Defendemos que a regulação seja criteriosa e, sempre que possível, venha acompanhada de estudos técnicos que a justifiquem, a conhecida Análise de Impacto Regulatório. Esta é uma recomendação internacional, inclusive”, salienta. Ainda de acordo com a presidente da FenaSaúde, o Brasil tem a tradição em regulamentar excessivamente, criando burocracias desnecessárias. “É tempo de repensar esse modelo que ao Estado cabe regular tudo, e ao setor privado, apenas cumprir. Esse expediente tem se mostrado falho em diversos setores. Basta observar o que aconteceu com o segmento dos planos individuais”, conclui.

Trajetória Solange Mendes já atuou como diretora de Normas e Habilitação das Operadoras da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), entre 2000 e 2004; diretora de Saúde da Federação Nacional de Empresas de Seguros Privados e Capitalização (Fenaseg), entre 2004 e 2006; e foi secretária-geral, diretora e superintendente substituta da Superintendência de Seguros Privados (Susep), de 1995 a 2000. Também integrou a equipe da FenaSaúde como diretora-Executiva da entidade. H


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Artigo de

Nubia Viana

O que esperarmos para as tendências de 2016

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niciando o ano, vale a pena lembrarmos aquilo foi colocado como tendência para o ano de 2015 e o que vem “de novo” para o ano de 2016. Sem sombra de dúvida, assuntos da pauta do ano passado continuam e ganham cada vez mais força para as tendências do ano de 2016: • Big Data • Aplicativos móveis • Internet das coisas Entende-se que estes elementos não só serão ferramentas importantes no processo de tomada de decisão de todos aqueles envolvidos com o sistema de saúde, mas também mudarão a forma de relacionamento entre os diversos agentes.

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Nubia Viana

Especialista de TI para Saúde

Também vale salientar que as organizações de Saúde já precisam ter um grau de maturidade de Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC) para iniciar um planejamento na adoção desses novos conceitos. Infelizmente, sabemos que as nossas organizações ainda não estão nesse patamar. Considerando algumas estimativas e premissas, uma vez que não temos estatísticas ou instrumentos de medição que possam corroborar esses dados, vamos considerar o gráfico abaixo com relação ao grau de maturidade que elas precisam atingir para considerar as tecnologias que são tendências:


Do ponto de vista de distribuição com relação ao processo de informatização, podemos inferir a se-

guinte distribuição entre esferas pública e privada, levando em consideração o universo dos hospitais:

Não é possível medir ainda o grau de maturidade entre as diversas organizações hospitalares. Porém, pelos números, notamos que os hospitais de grande porte, tanto na esfera pública, como na privada, representam um percentual importante no processo de informatização. No caso dos privados, isto fica mais evidente, uma vez que a maioria dos hospitais não atua em rede ou não está subordinada a uma única administração, diferente da área pública, em que a administração se divide em federal, estadual e municipal, formando assim redes de assistência. A mensagem principal é que alguns degraus terão que ser percorridos por estas instituições para iniciar o planejamento com relação

a estas novas tendências, bem como do ponto de vista dos fornecedores, qual o mercado existente real para este tipo de incorporação de novas tecnologias. Voltando a questão das tendências para este ano, o comportamento já pode ser notado no dia a dia da nova geração de usuários que é diretamente influenciada por este aporte tecnológico: • Troca de mensagens via WhatsApp • Reuniões não presenciais (Skype, Webex, ou qualquer outro meio de conferência) • Arquivos gravados na Nuvem • Acessibilidade via dispositivos móveis • Número crescente de transações feitas através da internet HEALTHCARE Management | edição 40 | healthcaremanagement.com.br

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Artigo de

Nubia Viana

Big Data Modelos ou conceitos como o Big Data trarão avanços e novas formas de pensar e, consequentemente, definição de novos tratamentos, busca de novas drogas, redimensionamento da rede de saúde com foco na real demanda. Podemos entender que os principais beneficiários serão os centros de pesquisa, com olhar em um futuro mais próximo; organizações governamentais como Ministério da Saúde, onde a visão geral da população poderá auxiliar o mesmo a definir e adequar mais rapidamente as políticas e programas; secretarias de saúde, olhando e buscando equilibrar a oferta de serviços com a demanda. Mas por que não organizações de saúde independentes, onde o microuniverso também pode tirar vantagens desses modelos? Obviamente, pontos já discutidos em artigos anteriores são pauta constante e permanente de discussão e preocupação e que andam junto com a inovação: privacidade, segurança dos dados e confidencialidade. O fato é: as organizações de Saúde (sejam provedores, associações, prestadores, entre outros) estão, de fato, envolvidas ou, mais uma vez, vamos “correr atrás do prejuízo”? A tecnologia e seus avanços não só não param, como cada vez mais estão acelerados e andando a passos largos. Então, é necessária uma organização rápida e eficaz por parte das ações regulatórias também. Aplicativos móveis Outro ponto que trará mudanças é na forma como os pacientes (ou consumidores de saúde) irão interagir como este volume de informações disponível. O conceito de consumerismo será fortalecido e os pacientes se tornarão agentes ativos neste contexto. O avanço em aplicativos móveis diminuirão as barreiras de distância bem como de comu-

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nicação. Isto afetará a forma como os pacientes se relacionarão com aqueles os quais eles normalmente se comunicam. Afetará a relação médico-paciente, hospital-paciente, laboratório-paciente. Não só na busca de informação mais rápida, mas possivelmente na forma de receber também: consultas a distância, acompanhamento de seu histórico de saúde, monitoramento do seu estado de saúde. Voltando ao conceito de consumerismo, sendo agente central nesse processo, os pacientes serão mais questionadores e, assim, mais responsáveis sob os serviços que estão recebendo e utilizando, conceito este que se alinha (“patient empowerment”). Desta forma, os demais atores neste sistema passarão a enxergar novas oportunidades de como prover serviços diferenciados (e por que não personalizados?) para este novo tipo de consumidor. É óbvio que efeitos colaterais surgirão ou se tornarão cada vez mais necessários como consequência disso: demandas crescentes de interoperabilidade, segurança e atualizações de infraestrutura constantes serão pauta permanente nas discussões orçamentárias dos CIOs. Como equalizar esta balança: pacientes enviando seus dados de saúde, sejam através de dispositivos móveis ou através dos “wearables devices”, com tecnologias distintas, padrões não claramente definidos ou mesmo falta de padrões? Novamente, acompanhar estes avanços e paralelamente definir estes padrões terão que compor obrigatoriamente a discussão da parte regulatória. Internet das Coisas Todos os pontos discutidos anteriormente fazem parte do conceito da Internet das Coisas (“Internet of Things – IoT”). Tudo e todos de alguma forma conectados.


Por que não monitorar pacientes diabéticos a distância, por que não ser alertado de alterações importantes na pressão arterial, por que não detectar comportamentos não esperados de saúde de uma população de risco? Parece utopia, mas não é. Todos estes avanços precisam ser vistos como benéficos não somente da perspectiva do paciente, mas também daqueles que são responsáveis por prover o serviço. O processo de saúde necessita ser revisado sob estas novas perspectivas de prestação de serviços. Ter acesso mais rápido e, assim, ser mais eficiente na tomada de decisão pode não somente ser agente importante na otimização de recursos, e, desta forma, na redução de custos, mas também ser elemento importante para evitar erros e/ou desperdícios. A Internet das Coisas fortalecerá o conceito também de Telemedicina. Mais uma vez, as relações entre paciente e demais atores do

sistema de Saúde mudarão. A necessidade de adequação da forma como formamos nossos profissionais de Saúde são formados e treinados também precisará muda para atuar neste novo modelo de prestação de cuidados. “Pensar fora da caixa”. Jargão antigo, mas sempre atual quando passamos por processos de mudança. Pensando no futuro agora Volumes crescentes de dados. Incorporações de novas tecnologias. Novas tecnologias surgindo em intervalos de tempo cada vez menores. Isto torna temas como interoperabilidade, privacidade, segurança, infraestruturas robustas, armazenamento e compartilhamento de informações, padrões críticos e necessários para discussão mais profunda e rápida. Ficam estes pontos como necessários nas pautas daqueles que tomarão as decisões do que, como, quanto e quando investir. H

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Segurança do Paciente Um dos grandes desafios no sistema de saúde no Brasil e no mundo é oferecer uma assistência segura, de alta qualidade e com baixo custo. Então, por onde começar?

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Nos últimos 30 anos, a medicina desenvolveu um amplo conhecimento, incorporou novas tecnologias e a população passou a ter mais acesso ao sistema de saúde. O conhecimento científico desenvolvido nesse período registra mais 750.000 artigos científicos publicados por ano, além de avanços tecnológicos no diagnóstico e tratamento. Ainda assim, o sistema de saúde continua operando com baixo grau de confiabilidade, e o paciente sofre danos que poderiam ser prevenidos ou mitigados. São problemas relacionados a eventos adversos com medicamentos, injúria em cirurgias, óbitos preveníveis, queda, úlcera de pressão, erro de identificação, entre outros Em 1999, quando foi publicado o livro “Errar é humano”, do Instituto de Medicina dos Estados Unidos, relatava-se que, a cada ano, morriam 98.000 pessoas devido a incidente com dano prevenível. Em 2013, um novo estudo mostrou um cenário ainda mais desanimador, elevando este número para 440.000. Esses incidentes têm como principal raiz o desconhecimento da realidade, pois, uma vez que não são mensurados os eventos, torna-se impossível aprender com o erro cometido. A solução passa pelo CEO, que lidera uma transformação na sua instituição, criando, assim, uma cultura de segurança. Com isso é possível mensurar e diminuir os erros e, consequentemente, trazer melhores resultados econômicos e financeiros. “A mudança passa necessariamente pela assistência tendo como foco o paciente, e não a agenda do staff ou a agenda financeira do sistema. Desta forma, os recursos serão melhores utilizados e haverá uma redução significativa do desperdício”, explica José Ribamar Branco, Fundador e Diretor Executivo do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP). Lucas Zambon, Diretor científico do IBSP, também pontua a necessidade de mudar a cultu-

ra assistencial, colocando a segurança como fator principal da atividade dos profissionais envolvidos. “Também é preciso buscar formas de remuneração que favoreçam os melhores resultados (pay-for-performance, pay-for-value), e não apenas a entrega de produtos como é o modelo atual (fee-for-service).” A alta direção da instituição precisa abraçar estas mudanças e, de fato, gerenciar a assistência dentro desse novo mindset. “Se a gestão não estiver focada nesses itens, o processo de qualidade assistencial será, na melhor das hipóteses, algo superficial e sem consistência de longo prazo”, ressalta Zambon.

Lucas Zambon, Diretor científico do IBSP

Dados A prevenção de tromboembolismo venoso (TEV) é considerada pela Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ) como a prática de segurança número um. Neste caso, há um grande gap na profilaxia TEV entre a prática baseada nas melhores evidências e atual prática no mundo real, em que há uma enorme oportunidade de melhoria. Estudos internacionais recentes mostram que menos de 39,5% e 58,9% dos pacientes clínicos e cirúrgico, respectivamente, estavam recebendo a profilaxia adequada para tromboembolismo venoso. “Quando um paciente com câncer não faz a profilaxia correta da TEV e seu quadro evolui isso gera um aumento de US$ 20.000 por episódio”, pontua Branco.

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Dossiê

Engajamento, o calcanhar de Aquiles 50

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O engajamento dos médicos na formulação, implantação e manutenção das políticas de melhoria da qualidade é fundamental neste contexto de segurança nas instituições. “Trata-se de um fator crítico de sucesso. Evidências mostram como esta cultura interfere na melhoria da assistência e da qualidade, nos menores custos e na maior eficiência. Conseguir um engajamento verdadeiro dos médicos, entretanto, permanece um desafio para os hospitais”, afirma Branco. Incorporar uma visão sistêmica é outra mudança que deve ser feita. Branco considera que, embora a segurança no hospital permaneça como uma meta importante, o paciente recebe mais assistência fora do hospital, em ambulatório, centro de diagnóstico, atendimento domiciliar, casa de repouso, entre outros locais. A atuação mútua de uma equipe multidisciplinar é imprescindível para que a segurança se torne tangível nas organizações de saúde.

José Ribamar Branco, Fundador e Diretor Executivo do IBSP

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Dossiê

É necessário mudar paradigmas baseados no empoderamento e integração de todos os profissionais envolvidos no cuidado, valorizando assim toda força de trabalho. “Precisamos rever este atual panorama de segmentação da assistência tornando-a centralizada no paciente como principal prioridade de resultado”, salienta Karina Pires Pecora, Fundadora e Diretora de Operações do IBSP. Maria Manuela Alves dos Santos, Superintendente do CBA, ressalta ainda que há um porcentual muito pequeno de profissionais que compreendem, de fato, o que é ser um paciente. “Há dois fatores que temos que analisar neste sentido: a capacitação de pessoas e a liderança.” 52

Por outro lado, o paciente e seus familiares também necessitam ser ativamente engajados em todos os níveis da assistência. “O paciente tem que estar ciente do que vai acontecer com ele, de quais as formas e as diversas opiniões que possa ter sobre o seu tratamento, a sua doença e o seu cuidado. São ações difíceis de serem alcançadas devido a nossa cultura, mas é uma questão de capacitação das pessoas e boa liderança”, conclui Maria Manuela. Cada profissional com seu papel na assistência, um processo de tomada de decisão multiprofissional e o empoderamento desses profissionais são grandes mudanças de paradigma do modelo assistencial.

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Paciente como centro Infelizmente, é impossível assumir que existe risco zero em uma instituição de saúde. O que existe são as melhores condições que permitem um ambiente seguro e um processo assistencial focado em qualidade. Isso só é possível se o enfoque das instituições de saúde se voltar para a segurança do paciente, para efetividade, eficiência e racionalização de recursos. Mais uma vez, é necessário que a alta gestão lidere esse processo. “Precisamos alinhar as instituições aos pacientes, mas, notavelmente, em nosso país, fazemos o inverso, criamos um sistema em que o serviço é desenhado para atender uma demanda política e, sobretudo, financeira”, considera Karina Pires Pecora, Fundadora e Diretora de Operações do IBSP.


O selo da Qualidade e Segurança

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A Qualidade e a incorporação dos protocolos de segurança tornaram-se parte da estrutura de gestão de segurança do paciente. É a forma de sistematizar as ações e as boas práticas, contribuindo, assim, para a redução e mitigação de incidentes. “As certificações trouxeram uma nova cultura para o sistema de saúde. Contudo, este movimento ainda é incipiente no Brasil. Temos menos de 10% das instituições certificadas, enquanto que no Canadá este número é de 94%”, afirma José Ribamar Branco, Fundador e Diretor Executivo do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente -IBSP. Maria Manuela Alves dos Santos, Superintendente do CBA, ressalta que a partir do momento que se inicia a implantação de atividades e políticas de qualidade, paralelamente há também um crescimento nas notificações de erros. “Se analisarmos os Estados Unidos, por exemplo, que têm grandes conhecimentos sobre acreditações e selos de qualidade há mais tempo que nós, eles continuam sofrendo com eventos adversos. Isso faz parte do homem. Nós erramos. O que é preciso saber é o porquê do erro. Temos que usar essa falha para melhorar.” É possível afirmar, segundo a Superintendente, que as instituições hospitalares acreditadas registram um crescimento e amadurecimento em seus processos. “O hospital é acreditado pela primeira vez. Quando a instituição passa pelo processo pela segunda vez, o gestor tem que melhorar o que não estava bom e assim sucessivamente. Ou seja, na medida em que as instituições se reacreditam, os profissionais têm que acompanhar esse padrão de qualidade e introduzir dentro de sua atividade a melhor forma de usar todas as políticas, os procedimentos e os indicadores que foram embutidos dentro da gestão dessa unidade.” Essa melhora reflete, consequentemente, na saúde financeira. “Vemos que essas instituições praticamente dobraram as suas capacidades. Ninguém aumenta o seu espaço e contrata pessoas se não está melhorando. Isso é uma evidência clara.” H 54

Foto: Fernando Meireles

Dossiê

Maria Manuela dos Santos Superintendente do CBA

Núcleo de Segurança A RDC 36 da Anvisa, que institui ações para a segurança do paciente em serviços de saúde, traz, entre suas ações, o núcleo de segurança do paciente (NSP) a fim de promover e apoiar a implementação de ações voltadas à segurança do paciente. Contudo, para a Superintendente do CBA, esta medida não resolve por si só o problema nas instituições de saúde. “Já tivemos muitas experiências de quando se faz uma resolução. O diretor faz uma nomeação oficial de um grupo de pessoas, tanto para infecção, como para qualidade, e isso não serve de nada. Essa questão não se muda por decreto. A mudança está na educação e no trabalho em equipe.” A executiva acredita que chegaremos a um determinado momento que não será necessário ter um núcleo de segurança, nem assessoria ou departamento de qualidade. “Isso será um elemento incorporado por todos os profissionais. Todos terão que trabalhar com a Qualidade.”

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Líderes e Práticas estratégia

Avaliação do desempenho Sírio-Libanês traz importantes resultados com nova solução para avaliar corpo clínico

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Desde 2007, o Hospital Sírio-Libanês (HSL) realiza a avaliação de desempenho individual do médico. Este procedimento vem evoluindo de forma incremental na instituição, sendo incluídos e modificados novos parâmetros para melhor análise da performance do corpo clínico. Durante todos esses anos, esse processo era feito de forma manual, ou seja, apresentava-se uma carta confidencial ao médico com os indicadores recentes a seus pacientes, como a média de permanência segundo os capítulos do CID, adesão a protocolos, preenchimento de prontuário, infecção em cirurgia limpa, entre outros. “Estes dados eram apresentados de forma confidencial e comparativo aos colegas da mesma especialidade, média institucional e alguns dados de benchmarking com os hospitais da Anahp”, lembra Antônio Eduardo Antonietto Júnior, Gerente de Relacionamento Corpo Clínico. Visando cumprir os requisitos da Joint Comission International (JCI), a instituição buscou, no ano passado, uma solução que aprimorasse essa avaliação do desempenho do corpo clínico. Implantou-se, então, o GPS.2iM, ferramenta eletrônica que oferece aos médicos via internet, pelo Portal Médico do hospital, o acesso a sua avaliação. Os médicos que fogem da meta podem ser

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convocados a um diálogo com a equipe de qualidade do HSL. “A avaliação trouxe um impacto positivo na Média de Permanência (MP) dos pacientes internados. O hospital diminuiu a MP de 8 para 5,7 dias. A adesão aos protocolos institucionais também evoluiu de uma adesão de menos de 40% para 80% em média”, explica Antonietto Júnior. A nova ferramenta proporciona ao médico o acompanhamento online de sua avaliação durante todo o ano. “Anteriormente, o médico ficava conhecendo seu desempenho somente quando se iniciava o ciclo de avaliação. Agora, o hospital consegue trabalhar os processos de melhoria de forma mais proativa, antecipando desempenhos não satisfatórios”, salienta Sandra Cristine, Gerente de Qualidade do HSL. O principal objetivo e


Sandra Cristine, Gerente de Qualidade do HSL

desafio imposto foi de estar com o modelo de avaliação de desempenho pronto para submeter a JCI em março de 2016. Isso foi atingido e a ferramenta já está 100% implantada. Hoje, os gestores têm a solução disponível para as seguintes entregas: divulgação ao corpo clínico, monitoramento e interação com os médicos avaliados, incremento de indicadores de desempenho, alinhamento com o DRG. Segundo César Luiz Abicalaffe, CEO da 2iM, a solução, além de atender as demandas da JCI no que diz respeito ao monitoramento e avaliação do corpo clínico, também proporciona a avaliação de desempenho das diferentes equipes e profissionais do corpo clínico e uma análise criteriosa da evolução deste desempenho pelo próprio avaliado e pelos gestores. “É possível criar diferentes programas de avaliação para equipes de enfermagem, residentes, outros profissionais da assistência, unidades de internação, dentre outros.” A ferramenta faz parte de um modelo de avaliação de desempenho em saúde baseado em evidências, sendo extremamente versátil, uma vez que permite agrupar indicadores de

desempenho nas dimensões que a acreditadora demandar. Conforme explica Abicalaffe, o modelo padrão traz quatro principais dimensões: estrutura, eficiência, efetividade e experiência do paciente. No entanto, é possível disponibilizar agrupamentos diferentes, utilizando conceitos das dimensões transversais, como Segurança. “Um mesmo indicador de eficiência pode ser considerado também um indicador de Segurança. Além disso, é possível criar novos agrupamentos como as exigidas pela JCI.” Para tanto, a ferramenta sofreu um significativo ajuste, no ano passado, quanto à intervenção do gestor durante a avaliação do desempenho de um determinado profissional e o monitoramento do desempenho após esta intervenção. A intervenção surtiu efeito na melhoria dos indicadores de desempenho do avaliado.

Avaliação construtiva Uma das formas de persuasão dos membros do corpo clínico do HSL foi a implantação da Comissão de Credenciamento Médico, sendo esta responsável pela validação dos critérios de avaliação e pela análise dos resultados individuais. Esta comissão, composta por membros do Corpo Clínico, participa do processo evolutivo dos médicos para a participação e adesão à motivação da avaliação. “Estamos conseguindo convencer os

o GPS.2iM proporciona ao médico o acompanhamento online de sua avaliação durante todo o ano colegas que se trata de uma forma de aprimoramento e não de classificação ou punição quando os indicadores não são atingidos. O hospital coloca-se como partícipe na construção dos planos de ação de melhoria e como facilitador do trabalho do médico”, explica Sandra Cristine. Abicalaffe ressalta também que a solução já possui uma série de artifícios para o engajamento do médico, como e-mails disparados no momento que o Scorecard mensal está disponível, informação aos gestores dos médicos que acessam a ferramenta, utilização da solução como uma ferramenta de relacionamento com o corpo clínico, enviando informações importantes não apenas sobre seus indicadores, mas sobre a sua produção, comparações e evoluções ao longo do tempo. “A solução permite avaliar anualmente o desempenho e com isso informar o hospital sobre a criação de programas de fidelidade com os médicos, de incentivos e modelos de pagamento por performance.”

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Líderes e Práticas

César Luiz Abicalaffe, CEO da 2iM.

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Expectativas A 2iM foi graduada da Incubadora do TECPAR, no Paraná, no final de 2015. Com quatro anos de mercado, já possui números expressivos motivados, atendendo cerca de com 20% dos hospitais da ANAHP, além de Unimeds. Atualmente, são mais de 60 programas implementados ou em implantação e mais de 30 mil médicos avaliados com a solução. “A nossa expectativa é dobrar o número de clientes neste ano e ampliar os projetos na área pública”, afirma Abicalaffe. Atualmente, a Solução já avalia mais de 70 equipes de Saúde da Família no SUS e duas AMEs, ligadas ao governo do Estado de São Paulo, já estão em implantação para avaliar todos os médicos contratados. H

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Anteriormente, o médico ficava conhecendo seu desempenho somente quando se iniciava o ciclo de avaliação. Agora, o hospital consegue trabalhar os processos de melhoria de forma mais proativa, antecipando desempenhos não satisfatórios. ” Sandra Cristine


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Líderes e Práticas mercado gente e gestão

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Paulo Chapchap, novo CEO do Hospital Sírio-Libanês “Não existe contingência diante da crise que nos faça abrir mão de um grande investimento em qualidade e segurança para o paciente.”

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A entrevista estava marcada para às 17h. Alguns minutos antes, a equipe do Saúde Online e da revista Healthcare Management arrumava os equipamentos para gravação e organizava melhor o cenário, o melhor ângulo. Exatamente às 17h, Paulo Chapchap, novo CEO do Hospital Sírio-Libanês, entrou na sala. O executivo nos recebeu com muita simpatia e atenção. Logo no começo, já foi dirigindo a nossa equipe: “Pode sentar ali. Você está confortável?”. Pontualmente, começamos a gravar no horário combinado. Sabíamos que aquele tempo era disputado por muitos e que o dia do executivo estava longe de acabar. Logo em seguida, outras pessoas o esperava para mais uma reunião. Chapchap mostra pleno domínio e confiança de suas novas tarefas. Também faz questão de demonstrar sua admiração por seu antecessor, Gonzalo Vecina Neto. “Gonzalo é um excelente pensador da área da saúde. Na minha opinião, o maior pensador no Brasil e com maior capacidade de formação de políticas para a saúde pública e também uma grande experiência na saúde suplementar.” Durante oito anos, o HSL foi dirigido a quatro mãos. Gonzalo Vecina Neto, na superintendência coorporativa, e Paulo Chapchap, na superintendência de estratégia coorporativa, cuidando de estratégia, ensino e pesquisa e da gestão do corpo clínico. No dia 1 de fevereiro deste ano, o HSL anunciou oficialmente uma grande mudança em sua

gestão. Agora, a instituição passa a ser comandada exclusivamente por Chapchap. A mudança da governança tem o objetivo de implementar uma nova fase em que a responsabilidade de frente ao Conselho fosse única. “Foi por isso que o Conselho me pediu para assumir essa tarefa.” Outra novidade que o HSL traz este ano é a vinda de Fernando Andreatta Torelly para o cargo de Diretor Executivo. Segundo Chapchap, uma das exigências do Conselho de Administração foi a indicação de um nome para fazer a parte de operações. “Eu conheço o Fernando Torelly há algum tempo. Nós compartilhamos cargos no conselho da ANAHP. Durante três anos tivemos reuniões mensais e durante esta convivência nós percebemos que tínhamos um perfil complementar. Então, sugeri ao Conselho de Administração o nome dele. O Conselho fez uma apreciação de seu currículo, de suas competências e resolveu vali-

dar o seu nome para o cargo de Diretor Executivo da instituição.” O CEO afirma que toda esta mudança não aconteceu devido à conjuntura política e econômica que o país vive. “Em 2015, nós apresentamos um resultado muito bom, mesmo diante de um cenário crítico. Tivemos um aumento de 15% na receita, superando o resultado esperado.” As prioridades para os próximos anos são o trabalho contínuo pela busca de eficiência, e enfatizar, ainda mais, a segurança e qualidade do atendimento ao paciente. “Sempre buscamos a eficiência, de forma que a contenção de custo e despesas permita recebermos pacientes que por ventura não tinham antes condição de vir ao Hospital Sírio-Libanês. É o ganho de eficiência que vai abrir mais as portas para segmentos da população brasileira, garantindo a demanda de ocupação de todo o nosso projeto de expansão.” Quanto à qualidade e segu-

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Líderes e Práticas

rança, só no ano passado o HSL obteve cinco novas certificações. Já em 2016, instituição conseguiu o selo Diamond da Acreditação Canadá. “Não existe contingência diante da crise que nós faça abrir mão de um grande investimento em qualidade e segurança para o paciente. Isso é primordial para a instituição.” O pagamento por performance é outra estratégia que o HSL vem se dedicando e que segundo os grupos de diagnósticos, DRG, é possível codificar os atendimentos e procedimentos. “A única forma de conhecer a performance de um hospital é conseguir compará-la aos melhores padrões internacionais. Nós já começamos a fazer essa codificação e estamos fazendo com que 100% dos pacientes sejam agrupados através dessa metodologia.”

Médico x Gestor A história de Paulo Chapchap no HSL tem duas vertentes: a assistencial e a gestão. A primeira começou em 1976, quando o executivo ainda estava no quinto ano do curso de Medicina e fez um estágio na unidade de terapia intensiva. Este período só foi interrompido durante dois anos, quando Chapchap foi morar fora do Brasil, em 1986 e 1987, visando buscar uma complementação à sua formação em transplantes de fígado. “Eu havia feito residência de cirurgia geral por dois anos, residência de cirurgia pediátrica por três anos e fui contratado pela faculdade de medicina da Universidade de São Paulo, onde eu tinha estudado, para continuar a minha carreira acadêmica. E essa carreira foi então continuada fora do Brasil em dois anos na Universidade Pittsburgh, que era o maior centro de transplantes daquela época.” Quando voltou, Chapchap retornou sua prática assistencial no Hospital Sírio-Libanês. Já o começo de sua carreira na gestão começou no centro de estudos e pesquisas como diretor científico. Logo depois, Chapchap assumiu a presidência do centro por duas ges62

tões. “Eram cargos sob eleição do corpo clínico e no término de meu segundo mandato nós profissionalizamos a gestão e criamos um Instituto de Ensino e Pesquisa.” A carreira de gestor continuou como membro da Comissão Médica, uma assessoria da

Em 2015, nós apresentamos um resultado muito bom, mesmo diante de um cenário crítico. Tivemos um aumento de 15% na receita, superando o resultado esperado.” Paulo Chapchap

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diretoria médica do hospital. Com o tempo, essa Comissão foi substituída por um Conselho de Administração e Paulo Chapchap foi convidado para integrá-lo. “Depois de três anos no Conselho, assumi a superintendência de estratégia coorporativa e, então, dividi a gestão do com o Gonzalo Vacina Neto. Durante oito anos, nós fizemos essa gestão conjunta até que o Gonzalo saiu e o conselho me convidou para a Diretoria Geral do hospital.” Chapchap acredita que sua atuação na Medicina e na Gestão não apenas é possível, como complementar. “Na medida em que você exerce a sua profissão em uma instituição que você faz a gestão, você funciona como um avaliador de qualidade de todos os processos. Então, ao fazer transplante de fígado com doadores vivos, que é a minha área de interesse, eu testo a UTI de adultos, a UTI pediátrica, o banco de sangue, o laboratório, o serviço de imagens, enfim, todos os


serviços do hospital, sem perder a sensibilidade para a necessidade do paciente.” Para Chapchap, o gestor que está muito afastado da clínica tende a decidir mais de acordo com os parâmetros e metas da gestão. “Isso pode afastá-lo da gestão assistencial e das necessidades do paciente. Acredito que essas atividades são complementares. Hoje, eu dedico cerca de 20% do meu tempo à assistência. Tenho uma equipe excelente que pode fazer toda a complementação desse tempo. Os outros 80% são dedicados à gestão e para isso também conto com ótimos profissionais. Obviamente, eu não faço tudo sozinho.”

A saúde tem remédio? “Claro que sim!” Essa foi a resposta de Chapchap ao ser questionado sobre a saúde no Brasil. Para ele, o setor sofre com dois macroproblemas: o financiamento e a falta de gestão. “Às vezes me pergunto qual desses problemas é o pior? Nesse caso não tem pior, porque se eu não resolver os dois, não tem remédio.” O CEO defende um amplo debate sobre este assunto, com visão para o futuro, e não apenas lamentar o que foi feito no passado e não deu certo. “Precisamos nos desprender do passado porque aquelas soluções não servem para os desafios que temos agora. As pessoas têm que ter esse desprendimento de mudar as ideias, com uma discussão franca e aberta no que é melhor para a população brasileira.” Sobre um modelo ideal de gestão, Chapchap aposta na parceria entre público e privado. Hoje, o Sírio-Libanês é responsável pela gestão de instituições como no Hospital Infantil Menino Jesus, em São Paulo; e no Hospital Geral do Grajaú e o Regional de Jundiaí. “Acreditamos que esse é o melhor modelo de prestação de serviços públicos para a população brasileira, em que o Governo faz a parte de formulação e de regulação e nós fazemos a parte de prestação de serviços.”

Perfil Paulo Chapchap é médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Entre 1986 e 1987 foi bolsista de investigação e professor assistente visitante do departamento de transplante de fígado da Universidade de Pittsburgh (EUA). Doutor em clínica cirúrgica pela Universidade de São Paulo, foi membro do Conselho da Sociedade Internacional de Transplante Hepático, de 2007 a 2011. Também é pró-reitor de cursos de pós-graduação stricto sensu, presidente do Conselho de Ensino e Pesquisa do Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa e membro do Conselho de Administração da Associação Nacional dos Hospitais Privado (Anahp). H

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Líderes e Práticas estratégia

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Medicina no Afeganistão Como médicos lutam para levar o mínimo de assistência a um país mergulhado em violentos conflitos

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Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), mais de 1 milhão de pessoas cruzaram as fronteiras, por terra ou por mar, de países do Oriente Médio para chegar a Europa. Este número representa 365% de crescimento em relação a 2014, isto é, o número de imigrantes e refugiados que chegaram a Europa mais do que quadruplicou em um ano. Contudo, este índice pode ser ainda maior visto que muitos países têm dificuldade de registrar todas as pessoas que chegam. Síria é a origem da maioria dos refugiados, seguido por Afeganistão e Iraque. Imagine a dificuldade de gerir um hospital diante de tamanho caos e desordem que encontram estes países. É justamente sobre esse desafio que a revista Healthcare Management traz, nas próximas páginas, uma entrevista exclusiva com médicos do Amiri Medical Complex (AMC) do Afeganistão. Eles contam as dificuldades de fazer medicina por lá, os riscos que estão submetidos e a difícil tarefa de oferecer o mínimo de atendimento para os pacientes.

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Líderes e Práticas

Inauguração do Amiri Medical Complex

Amiri Medical Complex, uma vitória no Afeganistão A ideia de construir o Amiri Medical Complex nasceu em 2005, quando Mirwais Amiri, CEO do hospital, estava na Índia fazendo uma especialização em cardiologia. “Lá vi muitos afegãos procurando por atendimentos básicos em cardiologia. Percebi que nós deveríamos ter um centro dessa especialização no Afeganistão.” Então, em 2006, Mirwais Amiri, com todo o suporte de seu pai, o engenheiro Abdul Manan Amiri, iniciou as atividades do centro de diagnósticos do coração com a ajuda do Instituto de Pesquisa e Coração da Índia, onde havia feito sua especialização. Finalmente, em 2015 iniciaram as atividades do complexo. “O AMC é a evolução do nosso anti66

go centro de diagnóstico.” O Amiri Medical Complex localiza-se em Kabul, capital do Afeganistão. Foi inaugurado oficialmente no dia 11 de abril de 2015 pelo ex-presidente Hamid Karzai. Hoje, o hospital possui cerca de 75 leitos e, por dia, são realizadas uma média de 120 consultas. São 180 colaboradores, entre expatriados e nativos. Mirwais Amiri afirma que o hospital não recebe nenhum suporte financeiro, nem do gover-

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no, nem de outras organizações internacionais. “Não recebemos materiais, bens de consumo médico de qualquer empresa, governo ou outras entidades. Andamos com as nossas próprias pernas.” Essa falta de ajuda impõe para a gestão um enorme desafio quanto à sustentabilidade da instituição. O hospital sofre constantemente com o baixo estoque de diversos materiais e não raro é preciso adiar cirurgias e outros


Mirwais Amiri, CEO do AMC

procedimentos. “Ainda temos que encaminhar o paciente para outros países locais, onde o custo torna-se ainda maior.” Buscando justamente um fôlego na gestão, o diretor vem pedindo para governo e organizações internacionais algum suporte para que seja possível oferecer serviços com qualidade e também melhorar a infraestrutura do hospital. Entre suas reivindicações estão o fornecimento de energia sem custos ou subsídios para tanto, além de isenção de taxas na compra de equipamentos médicos. “O hospital deveria ter maior suporte financeiro, principalmente em tempos de crises como a guerra que vivemos. Nesse momento, todos nós devemos cuidar do complexo hospitalar. É realmente muito difícil gerir um hospital em meio a tantos conflitos internos, mas não podemos fugir de nossa responsabilidade.” Todo este ambiente conturbado acaba repelindo importantes investimentos em todos os setores do país, inclusive na saúde. “Vejo que grandes companhias como Philips, Siemens, Toshiba, entre

outras têm medo de abrir filiais por aqui. Fazemos nossas negociações com essas empresas por meio de outros países, o que encarece ainda mais.” Justamente pela falta de dinheiro, o AMC, atualmente, não vem investindo em inovações tecnológicas, nem em pesquisas médicas. “Isso requer um fundo extra, o que não está disponível no momento.” Além dos negócios, o caos socioeconômico também reflete no staff do hospital. Isso porque, segundo o executivo, a maioria dos colaboradores é estrangeira e é muito difícil mantê-los diante de tanta vulnerabilidade. “Quando eles saem do país isso acaba interferindo diretamente na qualidade de nossa organização.”

O AMC, assim como acontece em todo país, sofre com a falta de profissionais especializados, enfermeiros treinados, paramédicos e engenheiros biomédicos. “Falta de mão de obra qualificada é algo que afeta todo o Afeganistão, em todos os setores da economia no geral. Na saúde temos que contratar esses profissionais de países vizinhos como o Paquistão e Índia, o que acarreta em mais gastos para a gestão.” Para tentar suprir essa falta de profissionais qualificados, o AMC realiza uma parceria com Fortis Escorts Heart Institute, da Índia. Assim, muitos profissionais são enviados para lá com o objetivo de trazer novos conhecimentos de medicina.

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Líderes e Práticas

ex-presidente Hamid Karzai e Mirwais Amiri, CEO do AMC

Um dia, chegaremos lá... Inicialmente, o AMC oferecia apenas atendimentos básicos em cardiologia. Agora, o hospital oferece atenções em: cardiologia não evasiva, cirurgias cardíacas para adultos e crianças, cirurgia laparoscópica, pneumologia, odontologia, gastroenterologia, pediatria, otorrinolaringologia, nefrologia incluindo diálise, e medicina de família. “A maior parte dos casos atendidos são aqueles com problemas cardíacos, hemorragia gastrointestinal, doenças pneumológicas, renais, emergências diabéticas e cirrose hepática”, explica Mirwais Amiri. Aos poucos, o AMC vem conseguindo realizar importantes ações. Há dois meses, por exemplo, o hospital comemorou as 100 cirurgias cardíacas e os 400 procedimentos de cateterismo cardíaco realizados. O sistema de saúde do Afeganistão, segundo Amiri, melhorou nos últimos 13 anos. Ele lembra que não havia sequer instalações básicas de saúde nas grandes cidades. Agora, há um pouco dessa infraestrutura até em áreas remotas. Além disso, houve a construção de alguns hospitais de especialidades, tanto públicos como privados, que já estão prestando serviços. “Antes, essas assistências não eram disponibilizadas para a população. Atendimentos básicos eram encaminhados para o Paquistão e Índia.” 68

Um alvo errado Os problemas Tuberculose, poliomielite, sarampo, malária são algumas das doenças mais comuns no país. Na capital, e em outros centros maiores, as doenças respiratórias respondem pela maioria dos casos atendidos, seguidos por ataques cardíacos e diabetes.

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Sobre momentos de conflito, Amiri recorda quando o hospital do Médicos Sem Fronteiras (MSF) foi atingido por forças norte-americanas, na cidade de Kundoz, Afeganistão, em novembro do ano passado. “Independentemente dos lados que envolvem uma guerra, hospitais e outros centros de saúde não devem ser um alvo. O que aconteceu em Kundoz não deve se repetir.” Naquela ocasião, forças militares dos Estados Unidos atingiram o hospital que foi confundido por um edifício controlado pelo Taliban, que também se localizava naquela região. Ainda sob ataque, o MSF avisou as forças que se tratava de um hospital, e não de um centro do Taliban. Mesmo assim o bombardeiro continuou por mais de 17 minutos. A ação desastrosa resultou na morte de 30 pessoas, entre pacientes e funcionários, e 37 feridos.


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Líderes e Práticas

Uma mulher médica no Afeganistão “Meu maior sonho é ver meu país em paz, desenvolvido e livre de domínios de grupos terroristas.” Este é o desejo de Khatira Zaheen Faiz, uma jovem de 24 anos, estudante de medicina no Afeganistão. Sua decisão por ser médica a acompanha desde a infância, quando ainda estava na escola primária. “É um grande prazer poder ajudar as pessoas, diminuir sua dor e melhorar suas condições de saúde.” Para seguir seu caminho, Khatira contou com o total apoio de sua família, especialmente de seu pai, o seu herói como ela mesma faz questão de ressaltar. “Meus pais me apoiam financeira-

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mente e sempre me encorajaram a seguir esta carreira. O que eu tenho hoje é graças as suas preces e apoio”, conta. Khatira, que está no primeiro ano de residência no hospital do público Ali Abad, também se dedica a cursos fora do país. No AMC, a médica trabalha no setor de cardiologia. “Pretendo atuar na área de cardiologista intervencionista.” Segundo a estudante, as universidades de medicina do

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Afeganistão estão formando muitos médicos principalmente em áreas como clínica geral, saúde pública e enfermagem. Lá, tanto universidades públicas, como as privadas, estão conseguindo oferecer o mínimo de infraestrutura para a educação. As faculdades públicas são de graça, mas as privadas têm diferentes custos, conforme os cursos. “O preço vai de 5.000 AFN (moeda Afegane) a


ex-presidente Hamid Karzai durante a inauguração do AMC

50.000 AFN por semestre. Os cursos nas instituições públicas duram 14 semestres, já nas particulares o tempo é de 10 a 12 semestres.” Para se ter uma ideia do valor desse investimento, segundo o Banco Central do Afeganistão, no final de fevereiro de 2016 1 AFN correspondia a US$ 68. Não é apenas o alto custo o obstáculo na educação. A guerra vem destruindo a cultura e infraestrutura de todos os setores do país. Nestas situações, ser médico, aqui, é um grande desafio. Sofremos com a falta de segurança. Precisamos ter uma mente tranquila durante o trabalho, o que, infelizmente, não é possível. E esse risco e medo aumentam ainda mais em mulheres.” Outros problemas que a futura médica en-

contra em seu dia a dia é a falta de equipamentos de diagnósticos e a escassez de tecnologia de ponta. “Não temos uma indústria farmacêutica de alta qualidade aqui. O que nos resta é importar esses

medicamentos de outros países que, muitas vezes, também não têm produtos de qualidade, não respondendo às nossas necessidades.” Conheça mais sobre o AMC no site amc.com.af. H

Meu maior sonho é ver meu país em paz, desenvolvido e livre de domínios de grupos terroristas” Khatira Zaheen Faiz, estudante de Medicina

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Artigo de

Evaristo Araújo Evaristo Araújo Diretor-administrativo da Abec Saúde (Associação Brasileira das Empresas Certificadas em Saúde)

Lei altera taxas de vigilância santiária e empresas poderão ter ressarcimento

C

omo já amplamente debatido, em setembro de 2015, as empresas reguladas da área da saúde foram vitimadas pelo ilegal aumento perpetrado pela Portaria Interministerial nº 701 que simplesmente triplicou o valor das Taxas de Fiscalização de Vigilância Sanitária no mercado regulado da saúde, em flagrante violação aos princípios constitucionais pátrios. As associações do setor ingressaram com ações coletivas, realizaram audiências na ANVISA, Ministério da Saúde e Congresso Nacional, a fim de apontar o absurdo de tal situação que impactava diretamente nas atividades de todos do setor. Em dezembro de 2015, três meses após a Portaria, foi publicada a Lei 13.202/15 que determinou que o valor das atualizações não poderiam exceder à variação do índice oficial de inflação apurado no período desde a sua última correção, em periodicidade não inferior a um ano – não 15 anos como justificava a ANVISA - e limitando em 50% do valor total de recomposição referente à aplicação do índice oficial desde a instituição do reajuste das Taxas de Fiscalização de Vigilância Sanitária anteriormente aplicada. Na prática, os valores que constam atualmente no sistema de peticionamento eletrônico da Anvisa deverão ser atualizados, reduzindo-se para a limitação legal conforme determina a lei e as empresas que arcaram com os valores majorados poderão ter a diferença restituída. Porém, ao contrário da aplicação dos valores

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majorados que ocorreu de forma quase que automática, para que a ANVISA realize a atualização dos valores em seu sistema de peticionamento eletrônico será necessário aguardar uma nova Portaria a ser publicada em conjunto pelo Ministério da Saúde e da Fazenda, ficando as empresas submetidas aos abusivos valores atualmente vigentes. Assim, recomenda-se que as empresas que não tenham prazos em andamento que aguardem a retificação dos valores no sistema, via nova Portaria, para o peticionar e solicitar as restituições de eventuais valores pagos a maior. Para aquelas empresas que tenham prazos em andamento e não podem aguardar para peticionar, restariam duas alternativas: arcar com os valores majorados e, posteriormente, ingressar com os pedidos de restituição perante a ANVISA, ou buscar o auxílio do Poder Judiciário, propondo ação judicial com pedido liminar para que o juízo determine à ANVISA a imediata aplicação da Lei 13.202/15, emitindo guias com os valores adequados à norma legal. Ainda que seja um alento ao mercado a edição da Lei 13.202/15, todos os fatos decorrentes da Portaria 701/15 são lamentáveis e geram um cenário de ilegalidade e insegurança jurídica que desestimula novos investimentos em inovação e desenvolvimento de negócios e produtos, bem como expõem o desgoverno e a incapacidade de planejamento de nossas autoridades que penalizam o setor regulado e toda a sociedade de maneira grave e arbitrária. H


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Estratégia

sustentabilidade

Saúde pública e suas alternativas

Hospital Municipal de Araucária e sua experiência sob uma gestão compartilhada

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Diante das incertezas no cenário político e econômico previstas para 2016, estados e municípios vêm buscando alternativas para viabilizar recursos e garantir o acesso da população à saúde. Uma das ferramentas utilizadas pelas esferas públicas para sanar o déficit no setor é a gestão compartilhada de serviços públicos de saúde através de Organizações Sociais de Saúde (OSS), que desde a sua criação vem ganhando reconhecimento, apresentando bons resultados. Entre os diversos casos bem-sucedidos desse modelo de gestão está o do Hospital Municipal de Araucária, interior do Paraná, onde a prefeitura da cidade firmou parceria com o Instituto Nacional de Desenvolvimento Social e Humano (INDSH). Firmado em novembro de 2014, o objetivo dessa gestão compartilhada entre a Secretaria Municipal de Saúde e o Instituto é melhorar a qualidade dos serviços prestados à população. “Quando um ente político entrega nas mãos de particulares a gestão de um hospital público, ele não está ‘privatizando’, mas sim profissionalizando sua gestão, procurando agregar qualidade ao atendimento prestado aos usuários”, acrescenta a Diretora-executiva do Hospital Municipal de Araucária, Lilian Kaiber Buse. Além do modelo de OSS, o hospital também possui um Conselho de Administração com integrantes do INDSH, Secretaria Municipal de Saúde e representantes dos usuários, que compartilham informações e dados para tomada de decisão, visando sempre o melhor para a população. Entre as metas apresentadas no contrato de prestação de serviços da OSS estão o número de atendimentos, internações, entre outros. Em 2015, por exemplo, foram realizados mais de 156 mil atendimentos, sendo 5.849 inter-

Lilian Kaiber Buse, Diretora-executiva do Hospital Municipal de Araucária

Quando um ente político entrega nas mãos de particulares a gestão de um hospital público, ele não está ‘privatizando’, mas sim profissionalizando sua gestão” Lilian Kaiber Buse

nações, 1.842 partos, 2.079 cirurgias, 19.687 atendimentos de urgência ou emergência, 9.296 consultas ambulatoriais e 117.298 exames diagnósticos. “Já no aspecto qualitativo, o principal indicador que demonstra a efetividade do trabalho é a satisfação dos usuários, que teve cerca de 90% de aprovação”, completa Lilian. Para a executiva, os 18 meses sob esta gestão compartilhada trouxe grande satisfação nos trabalhos. “A direção do hospital adotou uma postura estratégica que visa uma administração sólida e pautada em valores que permitam a sustentabilidade econômico-financeira do hospital.

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Estratégia

“Desde quando inauguramos o hospital, em 2008, sempre entendi que a melhor forma de gerenciar essa entidade seria por meio de uma Organização Social de Saúde” Olizandro José Ferreira, prefeito de Araucária (PR)

Também buscamos nortear a gestão em pilares como eficiência na gestão, humanização do atendimento e segurança do paciente.” A unidade de saúde também recebe o suporte da sede administrativa do INDSH que busca compartilhar o conhecimento e experiência adquiridos administrando outras instituições pelo Brasil. De acordo com o prefeito de Araucária (PMDB-PR), Olizandro José Ferreira, o município se difere dos demais por investir 22% de seu orçamento na área da saúde. “Temos aqui um dos mais modernos hospitais da região sul, 21 unidades de saúde, duas unidades de pronto atendimento, uma oferta de 176 tipos de medicamentos diferentes para a população 76

e uma proporção de cerca de um médico para cada 352 habitantes, número superior ao recomendado pela OMS.” Entre os desafios enfrentados pelo município estão o constante aumento nos gastos com saúde e a escassez de recursos destinados pelos governos Estadual e Federal. “Na minha visão, as OSS oferecem uma maior agilidade na administração, assim como permitem tomadas de decisões menos burocráticas e melhor gestão dos recursos.”

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Ainda de acordo com o prefeito, a gestão compartilhada, realizada por meio do conselho administrativo do hospital, vem apresentando resultados muito satisfatórios e atendendo as expectativas esperadas pelo município. “Desde quando inauguramos o hospital, em 2008, sempre entendi que a melhor forma de gerenciar essa entidade seria por meio de OSS e, hoje, felizmente, temos recebido um ótimo feedback dos usuários do serviço”, finaliza Ferreira. H


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Ideias e Tendências líderes e práticas

Desafios da Saúde Em seu novo livro, Claudio Lottenberg fala sobre tecnologia, financiamento e compromisso com a transparência No final do ano passado, Claudio Lottenberg, Presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, lançou o livro “Saúde e Cidadania - A tecnologia a serviço do paciente e não ao contrário”. O livro traz luz sobre diversos temas, como a emergência da tecnologia disruptiva, o financiamento da saúde, as oportunidades de um novo mercado, entre outros. Nas próximas páginas, a revista Healthcare Management traz um dos capítulos da obra: A ética e a nova medicina.

O Autor Claudio Lottenberg é médico graduado pela Escola Paulista de Medicina, com mestrado e doutorado em Oftalmologia. Também é professor co-orientador do curso de Pós-Graduação em Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo. Autor de 12 trabalhos médicos oftalmológicos e coautor de 4 livros oftalmológicos. É autor do livro “A Saúde Brasileira pode dar Certo” pela editora Atheneu. Já atuou como Secretário Municipal de Saúde do município de São Paulo durante a gestão José Serra. Em 2009, recebeu a Medalha Moacyr Álvaro, mais importante láurea outorgada na área de oftalmologia em toda a América Latina. Pela revista Healthcare Management, foi eleito entre os “100 Mais Influentes da Saúde” nos anos de 2013,2014 e 2015. É presidente do Hospital Israelita Albert Einstein desde dezembro de 2001. 78

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A ética e a nova medicina

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A incorporação tecnológica deve ser precedida pelo debate da ética. A ética pressupõe, no contexto do sociólogo e economista alemão Max Weber (1864-1920), a presença do próximo como marca de referência divisória. Na saúde, o próximo é o paciente. A ele devemos concentrar todos e os melhores esforços e dentro dessa raiz é que nasce a avaliação das diversas incorporações tecnológicas. Ela ganha dimensão maior frente à necessidade de combater a integração tecnológica onerosa e acrítica e também a má conduta em busca de lucro, como cobranças indevidas na colocação de próteses ou o chamado rebate (quando um profissional da saúde aceita pagamento para encaminhar o paciente a outro médico ou serviço). Práticas desse gênero não são exatamente uma novidade e deram ensejo a leis como Anti-Kickback, de 1972, que proibiu a oferta de qualquer valor ou recompensa pelo encaminhamento de pacientes a outros médicos. Posteriormente, uma nova regra, conhecida como Stark Law, de 1992, elevou ainda mais o grau de vigilância vetando aos médicos o referenciamento de pacientes aos serviços Medicare e Medicaid se houver vínculo familiar ou relação financeira com a entidade. O termo “referência” é definido por essa lei de forma mais ampla do que simplesmente recomendar um fornecedor de serviços de saúde a um paciente. Ela veta ao médico pedir ou criar um plano de cuidados que inclua a indicação dos serviços que

Por Claudio Lottenberg

prestarão a assistência prevista, como centros de análises clínicas. Em 2013, essa mecânica legal ficou mais conhecida internacionalmente pela notoriedade dada ao caso de um cardiologista do Estado de New Jersey que foi condenado à prisão por ter recebido dinheiro pela indicação de paciente. Como se vê, a preocupação americana não é de hoje. Com o crescimento do mercado de saúde e a expansão das corporações farmacêuticas, muitas delas sediadas nos EUA, o País vem mantendo um debate e uma vigilância vigorosos sobre as condutas éticas. Nesse escopo, mais leis foram criadas nos últimos anos para impor limites às interferências da indústria nas práticas da saúde e às extrapolações dos médicos. Um dos principais alvos dessas leis foi regrar o relacionamento dos médicos com a indústria. Pesquisa feita em 2007 mostrou que nada menos do que 83% dos médicos em atividade nos EUA haviam recebido pre-

sentes da indústria farmacêutica. Um número menor, mas ainda bem significativo (28%), cultivava laços mais fortes: tinha prestado serviços e recebido pagamento por trabalhos como consultores ou pesquisadores. O mesmo estudo mostrou que 60% dos médicos que haviam reportado relação com a indústria participavam de atividades educacionais, enquanto 40% estavam engajados em grupos de trabalho para a formulação de orientações médicas (as chamadas guidelines, usadas por médicos de todo o mundo para orientar o tratamento dos pacientes). Outro trabalho, publicado em 2013 pela revista científica New England Journal of Medicine (NEJM), revelou que 60% dos urologistas e gastroenterologistas entrevistados no estado de Massachusetts para esse estudo haviam recebido “incentivos” da indústria. Na cardiologia, o percentual chegou a 45%. Neste estudo, os pesquisadores classificaram, como incentivo, toda sorte de troca monetária, o que vai

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Ideias e Tendências

desde doações de caridade feitas pela indústria até ações de marketing, participação em conferências, recursos para pesquisa, alimentação, educação e treinamento e até pagamentos em dinheiro mesmo. Na verdade, este último item representou a maior parte dos tais “incentivos”. Um simples olhar é suficiente para identificar áreas nas quais há influência direta ou indireta da indústria na prática médica. No entanto, existe uma capilaridade muito mais fina e sensível nessas relações. Dados de 2001 já revelavam, por exemplo, que mais da metade dos recursos disponíveis para o desenvolvimento de pesquisas médicas é originária de laboratórios farmacêuticos. É absolutamente pertinente que a indústria invista no desenvolvimento de fármacos e contribua para o avanço da ciência. Assim como é também inevitável não se preocupar com os efeitos indesejados de uma realidade na qual os estudos são predominantemente custeados pela indústria. As autoridades de saúde dos Estados Unidos viram-se diante de uma série de questionamentos éticos. Por exemplo, como garantir que estudos socialmente relevantes e desinteressantes financeiramente fossem também financiados? E quais seriam os mecanismos para evitar que profissionais da saúde não sucumbissem às pressões das indústrias no exercício das suas atividades? E qual a melhor maneira de zelar para que os lançamentos contemplem os interesses da sociedade e não sejam pautados apenas pelo lucro do segmento? Em face desses dilemas e dos dados que mostravam a vulnerabilidade dos médicos, foi criada uma lei pioneira. O chamado Sunshine Act – em inglês, sunshine significa raio de sol – veio para lançar luz sobre as relações entre indústria e médicos, garantindo à sociedade que partes importantes dessas negociações não ficassem mais restritas aos bastidores. A decisão faz parte do Affordable Care Act, de 2010 (também chamado de Obamacare, em alusão 80

ao presidente dos EUA, Barack Obama). O Affordable Care Act promoveu uma reforma profunda nas leis relacionadas aos cuidados médicos nos Estados Unidos visando dar mais protagonismo aos pacientes do sistema de saúde americano. No bojo dessa reforma, uma das questões mais destacadas foi exatamente a resolução das situações de conflito entre o interesse privado (de médicos e empresas) e o público. O que o Sunshine Act determina é que as companhias desse segmento (sejam produtoras de medicamentos, fabricantes de equipamentos ou dispositivos médicos) declarem todo e qualquer valor acima de US$ 10 pagos a médicos ou a hospitais universitários. São estabelecidos três tipos diferentes de relações envolvendo esses atores: o primeiro engloba os pagamentos diretos realizados aos médicos – como almoços ou viagens pagos pela indústria. O segundo abarca a participação comercial de médicos nessas companhias como sócios ou na condição de donos dessas empresas. Por último, o pagamento realizado a médicos por sua participação em pesquisas financiadas pela indústria. A obrigatoriedade em desvelar essas informações começou a valer em agosto de 2013. O primeiro prazo para a entrega dos dados (referentes a 2013) foi março de 2014 e a primeira divulgação das informações coletadas foi feita

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no dia 30 de setembro de 2014. De acordo com a organização jornalística ProPublica, que realiza consecutivos trabalhos investigativos sobre os números disponibilizados, até o momento há dados de 17 companhias, as quais, em termos de divisão do mercado, representam aproximadamente metade do setor farmacêutico. O montante declarado foi de US$ 4 bilhões, abrangendo 1.360 hospitais universitários e 546 mil profissionais de saúde, entre médicos,dentistas e osteopatas. O Sunshine Act é um marco decisivo. Além de tornar a informação pública, ele a fez também acessível com a criação da página Open Payment (“Pagamentos Abertos”, em tradução livre). Ali, os pacientes podem consultar se o seu médico mantém alguma relação com a indústria e, em caso positivo, qual é a relação mantida e quais foram os benefícios recebidos. Aos médicos, é garantido o direito de divulgar seus vínculos e gratificações vindos da indústria antes que ela o faça. O conceito que embasa a medida é colocar uma espécie de raio X sobre as formas de financiamento existentes entre indústria, médicos e hospitais, tornando mais fácil para a sociedade exercer seu poder de controle social sobre os casos em que há abusos ou conflitos de interesse. O fato de ser uma lei também criou uma base de dados mais


abrangente e consistente do que a que havia até então no País. Isso porque, mesmo antes do Sunshine Act, alguns estados americanos (como Massachusetts e Minnesota) já coletavam e publicavam dados sobre as relações entre indústria e médicos. Da mesma forma, algumas das principais companhias farmacêuticas já eram obrigadas a declarar parte de suas informações devido a acordos com o governo referentes a abusos passados. Nenhuma dessas ações, porém, foi capaz de criar uma base de dados tão potente quanto a oriunda do Sunshine Act. Ainda que a medida seja muito recente para se fazer uma análise aprofundada de seus impactos, é possível antever uma relação mais transparente entre indústria e médicos para o futuro. Não é de interesse das companhias ganhar má reputação com o público em geral, assim como não o pretendem os profissionais de saúde. Além disso, a medida americana tem servido de exemplo para que outros países comecem a pensar em regulações semelhantes. França, Portugal, Dinamarca e Eslováquia são algumas das nações que vêm discutindo leis para tornar obrigatória a divulgação de dados sobre pagamentos a médicos realizados pela indústria. No Brasil, não temos ainda uma ferramenta tão poderosa quanto o Sunshine Act, mas desde 2012 um acordo assinado pelo Conselho Federal de Medicina e pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma) criou limites para evitar a sobreposição entre interesses pessoais ou de mercado e o bem-estar do paciente. Por exemplo, com o acordo, o pagamento de diárias durante congressos ou seminários passou a ser restrito ao próprio profissional.

Antes, acompanhantes ou familiares podiam ser incluídos. Brindes oferecidos pela indústria farmacêutica também passaram a ter um valor máximo (um terço do salário mínimo) e devem ter relação direta com a prática médica. É ainda um passo pequeno, mas já se pode dizer que é um começo na caminhada para criar maior transparência na relação entre a indústria, os médicos e a sociedade. Nossa lição de casa é clara: devemos aprimorar nossos mecanismos para tornar transparentes as relações entre os profissionais da saúde, os fornecedores de serviços e a indústria. É cada vez mais imprescindível que as informações sobre os vínculos existentes estejam ao alcance da sociedade. De preferência, a um clique. Isso não significa uma ruptura entre a comunidade médica e assistencial com a indústria, mas um reposicionamento de limites, de compromisso com a transparência. A integração entre a indústria e a comunidade médica é muito importante tanto na escolha como na aplicabilidade prática, mas deve ser feita na certeza do benefício e no valor junto ao paciente. H

Serviço Nome do livro: Saúde e Cidadania - A tecnologia a serviço do paciente e não ao contrário Autor: Claudio Lottenberg Editora: Editora Atheneu (www.atheneu.com.br) Número de páginas: 120

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Perfil

“É inadmissível testemunharmos tamanha injustiça social” À frente de uma das mais respeitadas instituições de saúde do Brasil, o Diretor Geral do Hospital de Câncer de Barretos, Henrique Prata, fala sobre sua luta por uma sociedade mais justa, com acesso democrático à saúde e ao tratamento oncológico e sua experiência como gestor. Além de sua história, o executivo apresenta seu ponto de vista sobre o atual cenário político e econômico pelo qual passamos e seus desafios para manter a sustentabilidade de seu hospital.

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Mais que uma crise política ou econômica, vivemos uma... Crise moral. Estamos naquele momento que todo mundo está saturado, que ninguém aguenta mais esperar por mudanças. Chegamos ao fundo do poço, tanto economicamente, quanto moralmente. Testemunhamos o poder público direcionando inadequadamente a verba da saúde e esses montantes sendo jogados fora. Não é possível, em um país como o Brasil, uma das maiores economias do mundo, não priorizarmos o direito de acesso à saúde de forma digna, principalmente para o cidadão mais velho, que passou sua vida inteira contribuindo para isso. As pessoas que se tratam pelo SUS neste país não recebem o medicamento que merecem, não recebem o respeito do profissional que vai tratá-los, até porque este profissional está revoltado pela miséria que pagam a ele que ainda chamam de salário. O país vive um momento de reflexão... E devemos lembrar que muitos políticos demagogos já falaram demais e não fizeram nada. Temos que avaliar melhor as pessoas, os processos e ver que ser bonitinho e bom de palanque não basta para resolver nossos problemas. Eu enxergo poucas pessoas nesse país em que acredito que possam mudar. Todos nós precisamos refletir e pensar dez vezes antes de dar um voto para um alguém. Um brasileiro que me inspira e me representa na política é... José Serra. Não sei se ele será candidato, mas o único homem que eu acho que tem competência para resolver esse país é ele. Serra é um homem que admiro desde quando foi ministro, quando foi governador, porque nele sobra competência, tem uma postura muito técnica e ética.

Sobre a presidente Dilma Rousseff acredito que ela... Seja bem-intencionada, mas, como todas as pessoas que estão no poder, ela também se curvou para algumas coisas que a fazem perder o crédito. Algo que já fiz publicamente e volto a repetir, por exemplo, é uma denúncia pública sobre as leis do PRONON (Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica), que era um projeto do vice-presidente José Alencar. Ela fez essa lei em favor do acesso ao tratamento do câncer, mas, ao invés de dar o benefício só para os hospitais que cuidam de pobres, ela deu também a renúncia para hospitais ricos. Essa lei foi assinada antes de 2013, pelo então ministro da saúde, Arthur Chioro, dando direitos também para os hospitais privados. O Governo não tem condições de abrir mão de dinheiro para fazer capacitação e pesquisa, nem dinheiro para pagar o soro para um paciente, como é que vai abrir mão de uma renúncia fiscal de um bilhão de reais da área de saúde? Um bilhão de reais foi o valor dispensado dos cofres em 2014 para dar para cinco hospitais fazerem pesquisas e realizar capacitação. Essas instituições são algumas das maiores e mais rentáveis do Brasil. É inadmissível testemunharmos tamanha injustiça social... Em que um governo parece se

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Perfil

recusar a incentivar o investimento em instituições que visam ampliar o acesso ao tratamento oncológico no Brasil. A ampliação dessa lei para as instituições privadas gerou uma fuga de capital das instituições filantrópicas. Tenho a oportunidade, nessa entrevista, de dizer que essa denúncia já foi feita publicamente na Comissão de Saúde e estou lutando com todas as forças que tenho para acabar com essa desigualdade e injustiça social que o país vive. Minha responsabilidade, como brasileiro, é dar um basta nisso. Já estamos sentido os efeitos da crise econômica... Muito significativamente. Em 2014, tínhamos cerca de 300 empresas que contribuíam em renúncia fiscal, totalizando aproximadamente R$ 100 milhões para a instituição. Em 2015, foram 400 empresas que doaram cerca de R$ 50 mil cada. Vimos que muitas empresas já diminuíram mais de 50% de seus lucros e contribuições, e muitas vão ficar no prejuízo em 2016. Além disso, tenho quatro mil colaborados no Hospital de Câncer de Barretos e terei que dar 10% de aumento, sendo que faz 12 anos que não recebo um reajuste na tabela SUS, e, para piorar ainda mais, esse ano teremos metade de arrecadação em relação ao ano passado, o que deverá gerar um gigantesco déficit em nossas contas. Em 2016, teremos que trabalhar o dobro...

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E abrir mais frentes de trabalho e campanhas. A minha única alternativa é conversar com a sociedade, dizendo que cada um tem que ajudar para que nossos irmãos não pereçam diante das dificuldades que foram impostas pela crise econômica. Esse é um ponto que eu defendo em minha filosofia de vida. Se eu achasse que o governo era responsável pela saúde, eu não teria assumido a gestão que assumi. Se eu achasse que o governo sabe o que tem que fazer, eu também não estaria fazendo o que faço. Então, eu jogo para

a sociedade: “Olha, eu sei o que é certo, me ajudem porque eu tenho que seguir esse caminho custe o que custar, porque nós estamos fazendo isso para aquelas pessoas que não tem nem o que comer”. O Hospital de Câncer de Barretos recebe pacientes de 27 estados, atendemos pacientes de mais de dois mil municípios, são pessoas que vêm de lugares que não tem nada. Então, que toda a sociedade tenha consciência de dividir um pouco, pois se esperarmos o governo tomar uma providência estaremos perdidos. H

Se eu achasse que o governo era responsável pela saúde, eu não teria assumido a gestão que assumi. Se eu achasse que o governo sabe o que tem que fazer, eu também não estaria fazendo o que faço” Henrique Prata,

Diretor Geral do Hospital de Câncer de Barretos

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PONTO

FINAL

Metade dos médicos é reprovada pelo Cremesp

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O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) divulgou dados nada animadores quanto à formação de nossos médicos. Quase a metade dos recém-formados em escolas de medicina do estado de São Paulo foi reprovada no exame feito em 18 de outubro de 2015. Dos 2.726 de egressos que fizeram as provas, 1.312 (48,13%) não alcançaram a nota mínima, ou seja, não acertaram 60% das 120 questões de múltipla escolha. O restante, 51,87%, acertou mais de 60% das questões. O estado de São Paulo possui 45 escolas médicas em atividade, das quais 30 foram avaliadas. As demais ainda não formaram suas primeiras turmas. Entre os egressos das escolas públicas, a reprovação foi de 26,4% e, entre os cursos privados, esse índice superou 58%. 86

O alto índice de reprovação é ainda maior quando se analisa as questões exigidas na prova. “A maior dificuldade desse grupo foi na clínica médica, que é a base para quem pretende ser especialista e continuar se aperfeiçoando. São questões simples a que o recém-formado deveria responder e não conseguiu”, afirma o presidente do Cremesp e coordenador do exame, Bráulio Luna Filho. Ainda que o recém-formado tenha péssimo desempenho no exame, ele recebe a carteira de médico e pode atuar, por-

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que não há lei que o impeça de entrar na prática médica. Contudo, algumas instituições adotam a classificação no exame do Cremesp como referência para a prova de residência médica. Entre essas instituições estão as Faculdades de Medicina da USP, Unifesp, Hospital Sírio-Libanês e Albert Einstein. Este quadro mostra a necessidade de repensar a formação de médicos. O estudo da Medicina está sendo tratado como mercadoria. A abertura indiscriminada de faculdades prova isso. H



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