Revista
www.keyboard.art.br
Keyboard ANO 2 :: 2014 :: nº 15 ::
:: Seu canal de comunicação com a boa música!
Pianistas de cinema mudo: Nem tudo eram flores nessa extinta profissão!
Wanda Jackson: A face feminina do Rock in Roll!
ESPECIAL: As novidades da EXPOMUSIC 2014!
Halloween: Tradição, símbolos e, é claro, músicas!
Sala São Paulo: Piano dedicado à música brasileira, com FÁBIO CARAMURU e MARCO BERNARDO
Mês de aniversário de CHIQUINHA GONZAGA: Uma vida ao som da transgressão!
Guilherme
Arantes
‘ ‘
É tocando que existo para o mundo!
:
Brasil
Índice
06
SUAS COMPRAS: Cds, DVDs e Livros
42 36
FESTIVAL MIMO 2014: Egberto Gismonti e Jaques Morelenbaum
22
08
MATÉRIA DE CAPA: Guilherme Arantes
EVENTO: Sala São Paulo apresenta: Fábio Caramuru e Marco Bernardo
38
DICA TÉCNICA: Parte 6, por Mateus Schanoski
24 MEMÓRIA: O outro lado da extinta profissão dos pianistas de cinema mudo
40
PIONEIRISMO: Wanda Jackson, a rainha do Rock!
30 POR DENTRO: Beethoven, só existiu um!
44
ESPECIAL: As novidades da Expomusic 2014 !
48 PONTO DE ENCONTRO: Por Luiz Bersou
50
56
60
HOMENAGEM: Chiquinha Gonzaga
CULTURA: Halloween: Tradição, símbolos e, é claro, músicas!
FALANDO SOBRE NOSSA MÚSICA: parte 14, por Heloísa Fagundes
Expediente
Revista
Outubro/2014
Keyboard Brasil
Revista Keyboard Brasil é uma publicação mensal digital gratuita da Keyboard Editora Musical. Diretor e Editor executivo: maestro Marcelo D. Fagundes / Chefe de Redação e Design: Heloísa C. G. Fagundes Caricaturas: André Luíz Silva Santos Fotos: N. Jardim / Marketing e Publicidade: Keyboard Editora Musical Correspondências / envio de material: Rua Rangel Pestana, 1044 - centro - Jundiaí / S.P. CEP: 13.201-000 Central de Atendimento da Revista Keyboard Brasil: contato@keyboard.art.br As matérias desta edição podem ser utilizadas em outras mídias ou veículos desde que citada a fonte. Matérias assinadas não expressam obrigatoriamente a opinião da Keyboard Editora Musical. www.keyboard.art.br
Editora Musical
04 / Revista Keyboard Brasil
´ Cicero Ricardo de Oliveira , da
cidade de São Paulo, foi o sorteado desse mês. O músico ganhou um songbook do Stevie Wonder!
Cícero Ricardo de Oliveira é pianista popular há mais de 20 anos. Formado na antiga ULM, de 2000 a 2004 (atual EMESP), estudou com grandes instrumentistas como Célia Carmona e Júlio Cesar Figueiredo. Freelancer em inúmeras bandas de diversos estilos, tocou música Gospel por um bom tempo em diversas igrejas. Há 12 anos realiza trabalhos no segmento cerimonial e casamentos. Busca novas participações, elaborando transcrições e edição de arranjos de músicas não habituais, sempre investindo em equipamentos top de linha. Suas influêcias principais são Keith Jarrett, Lyle Mays, Vangelis, Amilton Godoy e Cesar Camargo Mariano (claro!), dentre outras.
R! O GANHADO
Editorial Heloísa C. G. Fagundes - Publisher
Gostaria de agradecer a todos e-mails e comentários via facebook referentes a grande repercussão da Revista Keyboard Brasil do mês passado. Também gostaria de agradecer em nome de todos pelo reconhecimento de nosso trabalho sentido na Expomusic 2014. Ficamos honrados e muito felizes. Isso nos impulsiona a fazer mais e melhor! E não se esqueçam: continuem fazendo seus comentários, acessando os vídeos, compartilhando e curtindo através de nossa rede social. Ou, se preferirem, enviem seus e-mails para contato@keyboard.art.br. Sua opinião é mais do que importante. Ela nos move! É o nosso combustível e nosso termômetro! Excelente leitura e fiquem com Deus!
Espaço do Leitor
contato@keyboard.art.br
Grande repercussão a Revista keyboard Brasil de setembro, capa com Takao Shirahata! Opa, BAIXANDO JÁ.... sou fã do Takao Shirahata. Esse homem tem um coração imenso e merece todo nosso respeito, obrigado por compartilhar amigos da Revista Keyboard. Sidinho Leal Tecladista, via facebook. Show! O que é bom deve ser publicado. Parabéns Takao. Verônica Voss, via facebook. Não poderia ser melhor escolhida a capa! Parabéns amigo Takao. Conquistado por mérito. Parabéns a keyboard pela escolha acertiva e pela revista! Márcio Buzelin, via facebook. É muito bom ver o Takao como destaque numa revista tão conceituada. Só posso desejar muito mais sucesso!!!! Abraços! Aparecida Takahashi, via facebook. Parabéns Takao e parabéns ao meu mestre maestro Marcelo Dantas Fagundes. Rodrigo Brunheroto, via facebook. Desejo saber quanto fica para fazer a assinatura da revista. José Ramos Silva Pereira, por e-mail. (Prezado José, nossa publicação é digital e gratuita. Basta baixá-la e imprimi-la em seu computador. Abraços!) Leio a Revista Keyboard Brasil desde o início. E está cada vez melhor. Parabéns!! Márcia Rattmann de Godoy, via facebook.
Meu caro Marcelo, Não tenho palavras para agradecer esta incrível homenagem! Muitíssimo obrigado!!! Realmente muitas águas rolaram desde 1991, ano da fundação da Roland Brasil e mesmo antes, quando éramos a Foresight, a distribuidora da Roland no Brasil. E 10 anos como CEO, que completo agora em 2 de dezembro… parece até que foi ontem! Eu sou mesmo de olhar mais para frente, mas quando alguém como você resolve escrever um pouco da nossa história recente, fico muito feliz e acima de tudo muito agradecido, pois é bom olhar de vez em quando para o espelho retrovisor e ver que já andamos um bocadinho…E o melhor de tudo, é que na caminhada mais pessoas vão se juntando a nós e animando esta nossa viagem, que temos a música como o nosso ideal de vida! Os textos, a edição das fotos e a pesquisa ficaram realmente muito bons! Parabéns e muito obrigado a você e a equipe pelo belo trabalho - e presente! Deixo aqui um pequeno presente musical - uma de minhas composições - que se chama Esperança, este sentimento tão importante que nos dá forças e coragem de seguir e realizar os nossos sonhos e ideais. Um grande abraço!!! Takao Shirahata, por e-mail. Clique aqui e ouça Esperança, de Takao Shirahata.
Revista Keyboard Brasil / 05
Suas Compras Decidindo patrocinar o lançamento de seu próprio livro, a 89 FM - uma das principais emissoras paulistanas dedicadas ao Rock do Brasil - revisa o passado numa tentativa de resgatar o interesse por um gênero musical que está em xeque no País, dada a perda contínua de interesse de um público difuso e pouco disposto a ouvir coisa nova e buscar informação. Ricardo Alexandre, jornalista, pesquisador e escritor, autor do ótimo e já recomendado pela Revista Keyboard Brasil, “Dias de Luta”, entre outros livros, assumiu a tarefa de vasculhar os arquivos fotográficos e sonoros da emissora e contar a sua história com seu texto preciso e objetivo, mas também elegante. O livro “89 FM: A História da Rádio Rock do Brasil” é um mergulho profundo nos 28 anos de história da principal rádio alternativa do Brasil. Suas origens, suas lendas, seus tropeços e, pela primeira vez, detalhes sobre a volta ao dial, em dezembro de 2012. Tudo contado por quem esteve lá: locutores, técnicos, programadores e coordenadores. O projeto de financiamento coletivo tem um objetivo muito simples: colocar o seu nome ao lado da Luka, Tatola, Kid Vinil, Angus Young, Chorão, Bruce Dickinson, Ramones e tantos outros, para sempre, na história definitiva da Rádio Rock do Brasil.
06 / Revista Keyboard Brasil
Guilherme Arantes ganha jovialidade na bem-sucedida busca da pegada dos tempos modernos com a sonoridade única da virada dos 70 para os 80, ao apresentar o CD Condição Humana (Sobre o tempo) – 26º título de sua discografia solo na cena do Pop brasileiro. O álbum, produto do investimento do cantor e compositor paulista em seu estúdio Coaxo do Sapo, com produção do próprio artista juntamente com Gabriel Martini e Pedro Arantes, traz a participação do coro de vozes da atual cena indie paulista - Adriano Cintra, Bruna Caram, Curumim, Laura Lavieri, Mariana Aydar, Thiago Pethit, Tiê, Tulipa Ruiz, entre outros. Um CD de “pegada” atual, à altura de sua importância na história do Pop nacional.
Ao enfocar um período pouco analisado da evolução da música brasileira o livro Pavões Misteriosos merece especial atenção. Escrito pelo jornalista André Barcinski, o livro contextualiza a relevância de cantores e bandas surgidos no Brasil nos anos 1970, com uma narrativa dinâmica e de maneira fácil para leigos, humanizando artistas populares que às vezes são tidos como bregas, mas que no período em que surgiram foram fundamentais para o desenvolvimento da discoteca e da indústria fonográfica do País ao abrir caminho para a geração de bandas como Legião Urbana, RPM, Ultraje a Rigor e Titãs.
Revista Keyboard Brasil / 07
Matéria de Capa VOLTADO PARA A TENDÊNCIA POP ROMÂNTICO QUE CONQUISTOU AS RÁDIOS E TEVE ENORME ÊXITO, ESPECIALMENTE NOS ANOS 80, O PAULISTA GUILHERME ARANTES POSSUI UMA CARREIRA DE CAUSAR INVEJA NOS ARTISTAS BRASILEIROS DOS TEMPOS ATUAIS. MATEUS SCHANOSKI, COLABORADOR DA REVISTA KEYBOARD BRASIL, REALIZOU UMA ENTREVISTA EXCLUSIVA COM O MÚSICO, QUE FALA DE SUA CARREIRA E SEUS PROJETOS. Texto: Heloísa C. G. Fagundes Entrevista: Mateus Schanoski
Guilherme
Arantes
No alto de seus 61 anos, continua sendo um rapaz cheio de charme! 08 / Revista Keyboard Brasil
Completando 40 anos de carreira, com inúmeros grandes sucessos, o cantor, compositor e pianista Guilherme Arantes tornou-se um músico mais do que respeitado. Porém, não foi sempre assim. Na década de 80, o músico sofreu com críticas por parte da imprensa, sendo considerado brega ao mostrar um lado doce e romântico em suas composições, destoando do Pop Rock da época.
Fotos: Divulgação
´ Trajetoria “A música sempre soou dentro de minha cabeça, como se houvesse um radinho ali sempre ligado”. É assim que Guilherme Arantes fala sobre sua paixão: a música. Já tocava cavaquinho e bandolim aos seis anos de idade, quando fora encaminhado por seus pais, Dr. Gelson – médicocirurgião e Dona Hebe – bibliotecária e tradutora, para estudar piano. “Meus pais compraram um Kastner de armário, muito bom por sinal, fabricado pela Pianofatura Paulista, com máquina alemã, o que seria mais tarde chamado de Fritz Dobbert”, diz o músico. Constantemente antenado com as novidades, Dr. Gelson teve um papel determinante na formação musical do filho, tocando seu violão brasileiro, numa linguagem do regional tradicional, com sambas, sambas-canção e chorinhos. “Também foi ele quem sempre levou discos para casa, da Bossa Nova aos Beatles” – complementa o músico. Na adolescência, Guilherme Arantes frequentava programas de música como O Fino da Bossa e Jovem Guarda. Antes de estrear sua carreira solo e inspirado pelos festivais de música, montou o conjunto Polissonante com colegas de escola e, mais tarde, o grupo Moto Perpétuo, de rock progressivo. Dois anos depois, em 1976, estreou sua carreira solo lançando seu primeiro grande hit: “Meu Mundo e Nada Mais” com o álbum homônimo – o primeiro de muitos sucessos. E não parou mais. Em seu mais recente trabalho “Condição Humana” lançado pela Coaxo do Sapo, seu selo fonográfico, Guilherme Arantes buscou resgatar a velha sonoridade vintage, com músicos da novo cenário musical. Acertou em cheio! Leia, a seguir, uma entrevista exclusiva para a Revista Keyboard Brasil, realizada pelo colaborador Mateus Schanoski. Revista Keyboard Brasil / 09
E n t r e v i s t a
Muito mais do que um hitmaker de novelas, Guilherme Arantes é autor de inúmeros sucessos que falam de amor de uma forma simples e sincera.
Revista Keyboard Brasil: Vamos falar da sua infância. Seu Pai, Doutor Gelson, médicocirurgião, era um bom violonista e amante da Música. E seu primeiro instrumento não foi o piano. Conte como foi sua infância e suas aulas de piano. Guilherme Arantes: Papai tocava muito bem violão “de ouvido”, um autodidata, com sua herança musical da família Lima Verde, (da minha avó paterna) do Crato, Ceará... Tocava Garoto, Dilermando Reis, etc.. E, também era um audiófilo. Comprava discos clássicos de sinfonias de Brahms e Bethoven, adorava Tchaikowski, Chopin e samba – principalmente paulista – de Adoniran e Paulo Vanzolini (que era amigo e colega – Vanzolini trabalhava no Instituto Biológico)... Mais tarde, Dr. Gelson trouxe para casa várias novidades, como o “Chega de Saudade”, de João Gilberto, uma coleção de LPs da Elenco, com Tamba Trio, Zimbo Trio, Edu Lobo, Baden, Os Cariocas, MPB 4 e Quarteto em Cy. Também foi um representante da geração do “Hi-FI”, quando chegaram os primeiros fonógrafos estéreo, uma sensação na época. Ele via que eu tinha gosto pela música, e “tirava de ouvido” músicas do rádio, como Ray Charles, Cely Campello, os Ventures... Então, comprou um piano Kastner, da Pianofatura Paulista, um bom instrumento, com máquina 10 / Revista Keyboard Brasil
Guilherme Arantes sobre o pai, doutor Gelson: ‘‘papai era autodidata, tocava muito bem violão ‘de ouvido’!’’
importada e me colocou nas aulas particulares com a querida professora, lá em Santo Amaro (SP) Dona Joanita. Eu era muito rebelde com a teoria musical, tinha preguiça, ainda mais porque tirava de ouvido as ‘‘Inverções a Duas Vozes’’ de Bach, só ouvindo os discos de cravo (harpsichord) de Wanda Landowska. Haendel, Couperin, Rameau, Scarlatti, tudo de ouvido... O fato é que eu não avancei muito além disso na infância. Mais tarde, tive mais dois professores esforçados, o Hélio e o Gorga, que não conseguiram muito me disciplinar além do “virtuoso” Hanon, que era um saco total... Isso contrariava meu pai, porque ele queria ter um concertista na família e, eu gostava mesmo, era do conforto da música popular. Mas eu fazia os exercícios porque me permitiam ter uma técnica mínima para tocar Bossa Nova, Soul Music, Jovem Guarda, Rock e os progressivos que estourariam mais adiante... Durante anos, eu era sempre escalado nos natais, nas festas, para tocar piano na casa espetacular da Rua Suécia (no Jardim Europa), da minha tia Jandyra do Amaral, um Petrof de cauda, um luxo... Então, todos os parentes – paternos e maternos – já me enxergavam
como “o artista” da família (isso é sempre muito importante na consolidação de uma auto-imagem de artista)... Para mim, esse ambiente familiar foi decisivo. Eu me enxergava artista desde os 5 anos. “Silêncio que o Guilherme vai tocar para nós....” E a 'primaiada' ficava babando... Era incrível eu saber tudo que tocava no rádio...Gratificação imediata! Revista Keyboard Brasil: Seu Tio, Cyro Arantes, trabalhava na TV Record nos anos 60, e você teve a oportunidade de ver surgir todos os grandes nomes da MPB. Conte-nos como foi. Guilherme Arantes: Tio Cyro era um viajante incansável, Revista Keyboard Brasil / 11
estava sempre delirando com suas histórias “lá no sertão...” “Coisa de louco...”, tomava o seu ‘uisquinho’ com papai e fumava, saborosamente, na sala... Era muito engraçado. O seu filho do meio, meu primo Luiz Augusto, tocava um violão espetacular... A música estava mesmo nas veias dos Lima Verde, contagiando os Arantes... Realmente, ele trabalhou um tempo na velha TV Record, dos Machado de Carvalho, junto ao empresário Marcos Lázaro e tinha acesso a convites para a linha de shows da Record, como O Fino da Bossa, Esta noite se Improvisa, Jovem Guarda, Ronnie Von, o famoso Show do dia 7 e os Troféus Roquete Pinto... E eu fui várias vezes ao auditório. Vi surgir Chico, Roberto, Gil, Caetano e isso foi um privilégio... Imagine só, ver Chico Buarque surgindo, tímido, a Elis novinha, genial, Jair Rodrigues, Simonal... Mais tarde, um canal importante para mim foi conhecer o meu primo Solano Ribeiro, um famoso produtor musical, que realizou os Festivais da Record e depois os FICs da Globo. Através dele é que conheci Rogério Duprat (um maestro fundamental que me deu muita força), e toda a geração da contracultura, no finzinho dos anos 60 e início dos 70... Revista Keyboard Brasil: Seu primeiro disco foi gravado com a banda Moto Perpétuo. Conte-nos como foi a Banda e o processo de composição e gravação desse primeiro disco. Guilherme Arantes: O embrião do Moto Perpétuo nasceu quando conheci o Diógenes Burani, um dos maiores gênios da música com quem tive o privilégio de 12 / Revista Keyboard Brasil
conviver. Convivi diariamente e, muito profundamente, com ele e com o baixista Rodolfo Grani Jr., ambos egressos do legendário grupo O Bando. Minhas possibilidades na música explodiram na companhia desses visionários. Eram meus ídolos, tudo o que eu gostaria de me tornar – eu tinha 17 anos e só pensava em música. Tocava (bem) todos os progressivos, ELP, Genesis, Yes, Pink Floyd, Jethro Tull, Gil, Milton, Egberto, Taiguara... Por essa época, esses amigos me convidaram para tocar na banda do Jorge Mautner, com Nelson Jacobina e Tico Terpins. Foi minha estreia em palco. Toquei no Teatro Ruth Escobar, no 13 de Maio (atual Café Piu Piu) e ali, naquelas ruas do Bexiga e Morro dos Ingleses – foi o berçário da minha vida de criador. Tinha uma casa de músicos, do Edu Viola e Tadeu Passarelli, dois outros gênios, onde eu ia sempre aprender música de gente grande. Dois anos depois, eu já estava na FAU-USP tentando cursar Arquitetura, e frequentava a casa de grandes amigos da faculdade, o Bicalho e o Rui, também artífices de poemas e tertúlias musicais na sua casa na Praça Panamericana... O Bicalho é irmão da Maria Rita Kehl, eram todos irmãos muito geniais e talentosos...Outro amigo importante foi o Bruno Padovano, que me apresentou à atriz Bibi Vogel, que me incentivou e fez vários poemas para eu musicar... Através dela, conheci o Guto Graça Mello, numa gravação no estúdio Hawaí, no Rio, um contato que seria muito importante para meu futuro posterior... Nessa época, conheci o Cláudio Lucci, meu colega de turma, que era um virtuose e professor de violão, tocava cello e gostava das mesmas
coisas que eu, especialmente de progressivos italianos, como Le Orme e Premiata Forneria Marconi. Conversamos os três, eu, Diógenes e Cláudio, e estava iniciada a banda... Por amizade de Diógenes, veio o Gerson Tatini, um bizarro baixista “monstro” e, através dele, veio o Egydio Conde, outro monstro, na guitarra. Era uma banda de gênios, todos muito virtuoses, criativos e temperamentais. A gente se adorava, o Moto foi e será uma paixão para toda a vida. Através do Moracy do Val – um jornalista/empresário que havia estourado com os Secos e Molhados, abriram-se as portas da Continental, do querido Byington, um selo lançador dos progressivos, na época. Fizemos o disco na Sonima (na Av. Rio Branco), em 8 canais, com a produção do sempre brilhante “Peninha” Smith. O Moto Perpétuo é um marco indestrutível do melhor Rock criativamente brasileiro, em todos os tempos. Tinha uma mistura de Clube da Esquina com Gil, com Caetano, com os óbvios maneirismos virtuosísticos exagerados de todos os progressivos internacionais, mas com muita personalidade e excepcional qualidade. Muito incompreendida, especialmente pelas suas qualidades (muitos anos à frente, numa realidade de um país eternamente obtuso). A banda viveu muitas dificuldades, a maioria até persistiu com a ideia, Cláudio, Diógenes e Gerson fariam um novo trabalho com o nome de São Quixote, mas eu acabei desistindo do caminho roqueiro convencional, e, descaradamente “traindo a causa” do rock, come-
cei a sonhar mais objetivamente com o meu sonho de criança: o
auditório, a TV, e passei por um inferno pessoal nesse período, completamente perdido, buscando algum caminho. Só que as circunstâncias daquele ano de 75 eram muito favoráveis para mim, mais do que eu poderia imaginar... RKB: Em 75, você lançou seu primeiro single “Meu Mundo e Nada Mais”. Fale sobre essa composição e como ela estourou e virou trilha de novela. GA: Em 75, estava largando a Faculdade, entre várias crises pessoais, sendo literalRevista Keyboard Brasil / 13
mente expulso de casa pelo meu pai, intolerante e impaciente com meu “talento” muito questionável... Então, num esforço desesperado, gravei uma fita no estúdio Pauta (na Major Quedinho, lá na Bela Vista, em São Paulo), um estúdio de um canal, do saudoso Luiz Arruda Botelho. Luiz se tornaria um ídolo para mim, uma pessoa boníssima, um incentivador. Com ele, trabalhava o Seu Joaquim, um técnico de manutenção incrível, que me ensinaria tudo sobre soldas, cabos e estúdios. A fita que eu gravei era só piano e voz. Ponto. Era só o Guilherme e suas baladas. Mais nada! Nada de baterias, guitarras, progressivos. Nada! Era descarnada a minha verdade. Gravei nessa fita de rolo, 7,5 polegadas, o que eu tinha: “Meu Mundo e Nada Mais” (de 1969) e várias outras (“Antes de Chuva Chegar”, “Águas Passadas”, “Pégaso Azul”, “Descer a Serra”, “A cidade e a Neblina”). Tirei várias cópias e deixei uma em cada gravadora da época: na Continental, na RCA, na Philips, na RGE e na Som Livre (filial da Rua Augusta, perto da Estados Unidos). Fui me sentar na “fila dos calouros”. Ali, só havia pessoas humildes e candidatos pobres a cantor-brega. Nin14 / Revista Keyboard Brasil
guém mais queria ser artista: anos de repressão. Na época, eram moda as gravações em inglês, era um período péssimo da ditadura e da censura. Mas eu fazia as baladas em português, influenciado pela poética mineira do Clube da Esquina. Dois meses depois, fui chamado para gravar, no Estúdio Gazeta, com produção do Otávio Augusto Cardoso, um bom arranjador, também... O Otavinho, conhecido popularmente como Pete Dunaway, foi fundamental na minha carreira. Possivelmente, junto com Guto Graça Mello e Marcos Maynard, é a ele quem mais eu “devo”, se é que a gente “deve” alguma coisa... Mas eu reconheço como essencial toda uma geração de outros produtores e profissionais da indústria, como João Araújo, Midani, Liminha, Mazolla, Guti, Max Pierre, Maluly, Tomas Muñoz. E fui muito respeitado por todos eles. Sempre. Tratado a pão-de-ló. Não posso reclamar de nada, foi uma vida de fartura de recursos e investimentos. Hoje, para mim, há uma enorme gratidão porque tudo deu certo... RKB: Em 1980, Elis Regina te pediu uma música. Conte-nos sobre essa época com
a Elis e Cesar Camargo Mariano. GA: Um dia, numa tarde modorrenta, no segundo semestre de 1980, o telefone da minha casa, na Vila Mariana, tocou... Era Elis. Fiquei pasmo! Ouvi dela um monte de elogios e um pedido de músicas para um novo disco. Elis, entre tantas coisas, era muito humilde, sabia ser simples, quando queria. Uma operária, uma trabalhadora nata. Fui correndo para o Rio, para a Odeon, onde ela escolhia repertório, junto com Mayrton Bahia, o produtor. De cara, eles gostaram de “Só Deus é quem sabe”, um bolero que eu havia composto para Roberto Carlos, mas que estava “guardado na gaveta”... Eu falei para Elis: “Vou fazer um hit pra você. Você precisa mesmo é de um hit pra estourar na FM. Chega de muito 'papo cabeça'. Vamos à luta. Eu vou pra São Paulo e volto em, no máximo, 5 dias com um hit pra você”. Nessa ida para o Rio, num jantar com a banda e equipe, no Bar Lagoa, dei boas gargalhadas com Elis,
embaralhando ditos populares: “quem tem amigo cachorro quer sarna pra se coçar”, “água mole em pedra dura mais vale que dois voando”... Vi que ela estava nesse “mood do absurdês” fascinada com o meu talento e em me conhecer. Se identificava muito comigo, espiritualmente. Quando cheguei em casa, com a “missão improvável” de estourar Elis no rádio, missão que eu mesmo me coloquei como um desafio, vi que era uma oportunidade imperdível, o tal “cavalo da sorte que passa selado na cara da gente” – ou você monta e vai, ou fica com receio e não vai. Lembrei da Elis acrobata vocal de “Upa! Neguinho” e mandei ver num Funk com letra “em absurdês”. A música, não só caiu nas graças de Elis e Cesar, como estaria em primeiro lugar, um bólido, em 15 dias após a magistral gravação com aquela “bandaça”: Cesar Camargo Mariano, Nathan Marques, Dudu Portes, e especialmente o baixista Pedrão Baldanza, que Revista Keyboard Brasil / 15
junto com sua esposa Marisa Fossa fizeram o espetacular arranjo vocal. Classifico César como um gênio, um arranjador virtuose, que fez com que brilhassem minhas duas canções naquele disco da Elis, em 1980... Eu o reverencio muito, porque foi o grande responsável pela minha sorte como compositor, na minha “missão improvável” de atender às necessidades de uma diva de porte mundial, como a Elis. Esse feito, de
cantar a bola e ir lá fazer o gol, tendo dado certo como deu, foi o grande divisor de águas da minha história. Antes e depois. Daí é que vem a “lenda do hitmaker”... RKB: Fale sobre o Festival de 1981, da Música “Planeta Água” e da Gang 90, com a música, “Perdidos na Selva”. GA: No final de 80, com o estouro de Elis, eu era “o cara”... Eu havia encontrado minha sonoridade clássica, influência de Billy Joel, com o Yamaha CP70B e o flanger Mutron, comprados em 79, em New York. Estava compondo freneticamente, era o ano de Christopher Cross, o estilo estava favorável e eu já tinha “Deixa Chover”, “O Melhor vai Começar”, toda uma safra nova de músicas “ensolaradas” e alegres, dançantes. Era, finalmente, o Pop. Então, Nelson Motta me convidou para fazer a direção musical de uma banda experimental de um poeta e jornalista que eu conhecia da praia Ipanema, do famoso Posto 9, Farme de Amoedo. Os anos 80 estavam entrando... Júlio era representante de uma geração maravilhosa e criativa de agitadores culturais. Achei o máximo, e ensaiei a banda no meu estudiozinho na 16 / Revista Keyboard Brasil
Rua Caramurú, na Saúde, com Gigante Brazyl, Wander Taffo, Celsão do Made... A casinha de ensaios virou um point efervescente, com outros amigos, Okky de Souza, Tavinho Paes, e eu estava num turbilhão de ideias... Fiz o refrão e formatei a canção semipronta de Júlio, “Perdidos na Selva” que virou um “hit” instantâneo. Na gravação, como ninguém ali cantava de verdade, sobressai muito a minha voz no coro... Fiz o piano, uns moogs e mixamos no Nosso Estúdio, com Marcus Vinícius, o Marquinhos, como engenheiro na mesa Harrison... As Absurdettes eram uma jogada à parte, com May East, a Denise “Lonita Renaux” Barroso, a Luiza, que viria a ser minha nova companheira. Foi uma fervura a tal de Gang 90. Por essa época, lancei “Deixa Chover”, que entrou na novela das 8 de Rede Globo “Baila Comigo” - tema da Betty Faria – e foi um estouro que confirmou a minha fase após o estouro de Elis. Vieram, então, as inscrições para o festival da Globo. A Gang 90 entrou de cara. Nesse mesmo festival (MPB Shell 81) eu havia inscrito “Planeta Água”, e ali conheci o Augusto Cesar Vanucci, diretor de uma Executiva da Tv Globo. Vanucci se tornaria um fã poderoso para os meus passos seguintes, em relação à televisão. “Planeta Água” dominou a cena e acabei o ano de 81 como um “number one”, imbatível... Em 82, eu lançaria “Lance Legal”, “O Melhor vai Começar”, e a fase prosseguiria: havia
descoberto realmente o caminho das pedras... RKB: Fale sobre as trilhas para os musicais infantis:
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´ [...] Nunca houve uma musica ~ influente (e copiinfantil tao ada) igual a essa. A introdu~ por exemplo, seria copiada cao, descaradamente na abertura do ‘xou da Xuxa’. A palavra “bala~o’’ virou produto!
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GA: Em 82, haveria a comemoração dos 100 anos de Monteiro Lobato, com o especial Pirlimpimpim. Guto Graça Mello e Vanucci me convidaram para fazer um tema, que viria a ser “Lindo Balão Azul”. As pessoas confundem, mas quem colocou a palavra “balão” no mercado infantil fui eu. Uma porção de espertalhões e enganadores vieram depois. Quando fiz “Lindo Balão Azul”, sintetizei, numa música, vários elementos: viver no “mundo da lua”, o fato da Terra ser um planeta lindo, um balão azul, único. O Balão também fazia referência a um filme, “Meu Balãozinho Vermelho”, um símbolo da infância para toda a nossa geração... Nuca houve uma música infantil tão influente (e copiada) igual a essa. A introdução, por exemplo, seria copiada descaradamente na abertura do ‘Xou da Xuxa’. A palavra “balão” virou produto. “Lindo balão Azul” influenciaria até Gonzaguinha a fazer o “Lindo Lago do Amor”... Mas o sucesso é isso mesmo. Eu voltaria à cena infantil com a parceria “Brincar de Viver”, com o músico e compositor Jon Lucien que, na época, estava no Brasil. Estourou, então, na voz de Maria Bethânia, uma emoção imensa para mim... Em 84, eu faria ainda toda a trilha de Pirlimpimpim 2, com o grande poeta paranaense, Paulo Leminski.
– Guilherme Arantes
Sem a menor modéstia, e até já conversei com Boninho a respeito, penso mesmo que sou o maior especialista em criação infantil para TV do país. Um dia vamos voltar a esse mercado. RKB: Você fez, também, trilhas para o cinema nacional. Como foi e quais eram esses filmes? GA: Foi, principalmente, a trilha sonora de “Garota Dourada”, um filme de Antônio Calmon e Fábio Barretto, com a (gênia) Andrea Beltrão no papel principal, na sua estreia em Revista Keyboard Brasil / 17
cinema. Eu, Marina e Ritchie até aparecemos cantando, um momento belo, inesquecível, com uma textura de película que nos transforma em legendários. Fiz as parcerias com Nelson Motta e daí solidificou-se uma grande amizade, com muitos sucessos para a posteridade... RKB: Como foi compor músicas instrumentais? GA: Foi uma necessidade, porque tenho sempre uma infinidade de temas fervilhando na cabeça e nem sempre é para se letrar... Considero o “Piano Solos” um disco sublime. Muito da minha verdade está ali... Aliás, a minha verdade está NAS MÃOS. É tocando que o Guilherme existe para o mundo. Me tire o piano e eu simplesmente não existo mais, não faço mais o mesmo sentido no mundo... RKB: Sempre lançou muitas músicas que se tornaram trilhas de novelas. Como era naquela época? Era por sorte como você mesmo diz? GA: As novelas tiveram um período muito favorável para mim, dei mesmo muita sorte de ter as pessoas que tinham na produção musical da TV... RKB: Conte como foram os anos de 85 para frente, quando mudou para o Rio de Janeiro. GA: O Rio era um desafio antigo, eu sabia que um dia teria que “cariocar”, o que é muito mais do que ter um “sotaque carregado nos esses e nos erres”... É amar o Rio. E eu adoro o Rio, sempre amei profundamente aquela cidade, as pessoas, o espírito boa-praça, Zona Norte, 18 / Revista Keyboard Brasil
Zona Sul. O Rio era, é e sempre será um encanto! E o Rio aprendeu a me adorar também, com todo o meu sotaque paulista... Também adotei o Rio. Fiz homenagem com Nelsinho em “Coisas do Brasil”, fiz “Cheia de Charme” em homenagem à mulher carioca, charmosa, feminina, displicentemente chique... Fiz uma outra, “Voo (São Conrado)” , uma das músicas mais inspiradas que compus. Eu tinha um contrato com a CBS, atual Sony, que era um “tudo ou nada” para mim: tinha que emplacar de vez. Engatar a segunda marcha na carreira, me tornar um nome nacional... Estourar no Canecão... Então, me mudei com a família para a Rua Francisco Otaviano, do lado do Forte de Copacabana. Foi um lugar muito inspirador para mim. Também fui produzir dois discos na Califórnia , com o Ronnie Foster. Os anos 80 foram muito férteis. Na Califórnia, conheci e gravei com músicos maravilhosos, além do próprio Ronnie, como Vinnie Colaiuta, Jimmy Johnson, Larry Williams, Alex Acuña, David Samborn... Conheci, anos mais tarde, e pude estudar “vocal coach” com o Seth Riggs, professor de Michael Jackson e de 80% dos grandes astros da R&B americana... Aprendi a amar muito a Califórnia, porque foi um lugar que me acolheu também. Os anos 90 foram mais “londrinos”, fui várias vezes para o Reino Unido, e dei uma “inglesada” no meu som... RKB: Ao longo da sua carreira, você gravou 30 álbuns. Hoje, tirando o excelente “Condição Humana”, qual é o disco mais especial para você e por quê? GA: O meu primeiro disco, de estreia,
obviamente, me remete às origens, quando tudo começou. É um disco muito verdadeiro, muito recheado de sentimentos genuínos. Da minha angústia: a angústia é a minha marca mais desconcertante. Hoje, olhando do alto e, francamente, acho que para mim não há mais o que dar errado. Todos os discos fazem parte – alguns, mais misteriosos e ocultos – de um conjunto, em que o grande, o maior sucesso, é a credibilidade musical. RKB: Por que resolveu montar o selo, gravadora e estúdio Coaxo do Sapo? Fale sobre esse projeto. GA: Basicamente, era para ser só um estúdio, conjugado com uma pousada, num lugar paradisíaco... Mas acabou envolvendo toda uma cadeia de produção e, ainda estamos na implantação, com muita calma, determinação e aprendizado, sempre. Acho que a música voltará para o colo dos que a amam. Os amantes da verdadeira música é quem serão os donos do negócio, no futuro. Estamos indo para a feira WOMEX, em Santiago de Compostela, expor num estande a minha ideia. Quando falo “estamos” é que tem o Pedro Arantes diretamente envolvido, e temos uma parceria com o Gabriel Martini, nas produções... O estúdio tem atendido a várias produções do Alê Siqueira, como a Filarmônica de Pasárgada, as Ganhadeiras de Itapoã, a Mariana de Moraes, a Luciana Oliveira e, também, a produção do Buguinha, com O Quadro... Anteriormente, passaram por lá, entre produções próprias ou parceiradas, a Heather Davi, Adrian Sherwood, o Sérgio Passos, o Nectar Brasil, o Cabrazen, o Círculo, e várias outras
bandas contemporâneas da Bahia. RKB: Seu selo viabilizou melhor o “Condição Humana”? Você acha que conseguiria tudo o que conquistou com esse disco em outra gravadora? GA: Estou numa fase de carreira em que já é mandatório eu me perguntar: qual é exatamente o conceito de “sucesso” que estamos buscando... Porque eu já tive várias modalidades de sucesso... Nem sempre a modalidade comercial (ganhar dinheiro) é a mais adequada ou desejada, almejada... Para mim, ainda estava faltando aquela “coroação” de conceito, de prestígio... Porque nos anos 70 eu estava no Bolinha, no Chacrinha, no Sílvio Santos, e era leitor do Pasquim, queria
tanto ser “considerado” pela 'inteligentizia', e era simplesmente execrado, ignorado como um ser desprezível... Mas tocava no rádio, sem parar. Acho que há um tempo para tudo. RKB: Fale sobre o processo de composição e produção do disco. Quem produziu? Quem participou e os músicos que gravaram. Quanto tempo levou? GA: Foi fulminante, coisa de três meses. Reuni a minha banda e pedi ajuda para sugestões, uma dinâmica bem grupal, com especiais, propostas de formato, etc... Mas já sabia exatamente que eu precisava de um disco geracional, com sonoridade definida, no eletro-acústico. Luis Carlini na guitarra, fazendo par com o outro guitarrista, Alexandre Blanc, o Willie Verdaguer no baixo e o Gabriel Martini na bateria, e produzindo, junto comigo e com Revista Keyboard Brasil / 19
liberdade musical. Você acha que essa originalidade foi conquistada só com esse disco? Ou você sempre buscou isso? GA: Acho uma conquista incrível. A originalidade se manteve porque, mesmo trabalhando com produtores e gravadoras no passado, eu sempre estava vendendo um “pacote fechado”: músicas, letras, arranjos, piano, vocais, estéticas, tudo empacotado. Às vezes, foi complicado vender tudo isso para eles toparem mas, em muitos casos, deu certo. Em outros casos, não deu muito certo, mas o mundo é mesmo assim, um mundo de desperdício... Muitos discos foram marcados para o sacrifício devido a um excesso de personalidade.
o Pedro. Curto e grosso. Disco de Rock e de baladas, com Folk, Reggae, só gêneros nobres que eu sei fazer. Mão de pedreiro nos pianos honky tonky de Rock, mãos de veludo nas texturas de cravo, nas delicadezas. RKB: Seu método de composição mudou muito dos anos 70 para cá? GA: Nada, é igualzinho. Não sei fazer de outra forma. RKB: Condição Humana tem uma sonoridade que realmente mostra todas as suas influências e sua 20 / Revista Keyboard Brasil
RKB: Desde do início, você sempre usou teclados e equipamentos TOP. Você sempre teve essa preocupação e acompanhou todas as mudanças da indústria, analógicos, digitais, emuladores, etc. Conte-nos como foram essas mudanças e como você se adaptou. GA: Sim. Passei pelos grandes ciclos da música moderna: anos 70: eletroacústico; anos 80: eletrônico analógico; anos 80-90: midi/digital/ sampler/ automatizado; anos 90-2000: workstation; em 2010: retorno ao vintage e ao acústico... Realmente foi trabalhoso, mas prazeroso acompanhar tudo isso... O bom é que não só eu durei para ver tudo isso acontecer, mas ser um museólogo, um colecionador amador – no melhor sentido da palavra – os equipamentos estão todos aqui, inteiros, perfeitos e prontos para serem saboreados. RKB: No “Condição Humana” você volta a usar teclados vintages. Conte-nos quais equipamentos você usou neste disco. Você já usou ou usa algum VSTI? PlugIns? Se não, por que? Se sim, quais você usou?
GA: Usei os pianos: Steinway B (½ cauda, americano), Yamaha U1 (um upright poderoso), O Fender Rhodes Mark I, o Rhodes Mark V, o Wurlitzer, Clavinet D6 Hohnner, Minimoog, Voyetra 8, Arturia Origin, o Hammond C3 com leslie 122, e o cravo Zuckermann Double Flemish Harpsichord, que foi uma sensação.... A nossa bateria é excelente, uma Odery custom Fassino, com um set de pratos Zidjian Serie K completa... Temos um cabinet de contrabaixo com falante de 24 polegadas!!! No mais, foram Porticos da Rupert Neve, Universal Audio, Summit, Grace Designs, Demeter Bass pré, Manley, TL Electronics, e uma cartela de mics bem variada... O predileto, claro, é o VMA, da Brauner. RKB: O que você está ouvindo de artista do novo cenário? E quais artistas você sempre ouve? Para você, qual é o melhor disco que existe atualmente e por que? Qual compositor e tecladista você mais admira? GA: Já falei que gosto muito do Jeneci, do Silva, que são discípulos de peso. Falar da Vanessa da Matta, da Céu, da Tulipa, da Tiê, da Mariana Aidar, do Adriano Cintra, da Bruna Caram, da Luciana Oliveira, da Marietta, da Lurdez da Luz, da Flora Mattos, é obrigatório. Gosto muito da Sia Furler, da Lorde, alguns jovens de hoje que têm muita personalidade. Infelizmente, no Brasil, há um movimento social preponderante, que afasta a classe média culta e urbana da cena midiática, toda voltada para os gêneros de apreciação da maioria. Mas gosto muito das cenas do Reggae/ dub e do Rap – tenho uma irresistibilidade
à cultura negra. Nem tudo está perdido. Só a “grande mídia” – essa, precisa de uma reforma. RKB: A Tour “Condição Humana” está a todo o vapor. Como estão sendo todos esses shows pelo Brasil? GA: Estamos num hiato de copa, de eleições, etc. Então, este ano está complicado. RKB: Quais são seus planos futuros? Pensa em fazer um novo disco num futuro não muito distante? GA: Vamos fazer um DVD monstroduplo, no ano que vem, com orquestra sinfônica e a banda. Muitos convidados! Não perdem por esperar! RKB: Deixe aqui uma dica para os tecladistas/leitores da Revista Keyboard Brasil: GA: Eu diria que o estilo de “piano brasileiro” é um dos mais importantes do mundo. Então, vamos dar o devido valor a quem de direito : Viva Tom Jobim, Johnny Alf, João Donato, Egberto Gismonti, Wagner Tiso, Marcos Valle, Ivan Lins, Taiguara, Hermeto, Arrigo, Ed Motta, Flavio Venturini, Andre Mehmari, Benjamin Taubkin, Jose Miguel Wisnik, Vitor Araujo, enfim... E desculpem se não me lembrei de vários... Não vamos deixar essa peteca cair! RKB: Obrigado pela entrevista e sucesso sempre! GA: Um abraço! Saiba sobre seu novo trabalho ‘‘Condição Humana’’ na página 7. Saiba mais sobre o músico clicando: Revista Keyboard Brasil / 21
Evento
Situada no centro da cidade de São Paulo, vizinha da Pinacoteca do Estado e do Museu de Arte Sacra, a Sala São Paulo – uma das mais importantes casas de concertos e eventos do País e tombada como patrimônio histórico pelo Condephaat – foi inaugurada em 9 de julho 1999 com a apresentação da sinfonia A Ressurreição, de Gustav Mahler, pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP). O prédio, marcado pela sobriedade dos ornamentos e detalhes ao estilo Luís XVI, foi projetado por Christiano Stockler das Neves em 1925. Atualmente abriga a sede da OSESP.
22 / Revista Keyboard Brasil
Fachada da Sala São Paulo por Tuca Vieira
apresenta :
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Foto: Divulgação
oncertos ma inais Brasil em dois pianos com Fábio Caramuru e Marco Bernardo INAUGURANDO A SEÇÃO ERUDITA NA REVISTA KEYBOARD BRASIL, FÁBIO CARAMURU E MARCO BERNARDO - UMA DUPLA DE PIANISTAS GENIAIS EM ÚNICA APRESENTAÇÃO NA SALA SÃO PAULO. ASSISTAM AO VÍDEO E PREPAREM-SE! É DIA 12 DE OUTUBRO ÀS 11:00 HORAS. Carol Dantas O concerto Brasil em dois pia-
nos é dedicado à música popular brasileira. Nele, os pianistas Fábio Caramuru e Marco Bernardo mostram suas maiores especialidades, alternando-se em solos e duos de piano, na interpretação de grandes sucessos. Solando, Caramuru interpreta Tom Jobim, e Marco, Radamés Gna ali. A dois pianos, os músicos realizam arranjos inéditos de Marco Bernardo para músicas de Jobim e Gna ali, além de César Camargo Mariano, Vinícius de Moraes, Gilberto Gil, Egberto Gismonti e Rita Lee.
A Série Concertos Matinais oferecida pela Sala São Paulo é
uma programação que prima pela qualidade, além de ser uma belíssima oportunidade de ouvir boa música em um ambiente que reúne a sofisticação e o charme que só o centro ‘‘velho’’ da cidade de São Paulo possui. E o melhor: tudo isso sem gastar um centavo. ~ Informacoes
Ingressos disponíveis na bilheteria do 1º subsolo da Sala São Paulo. Onde: Praça Júlio Prestes, nº 16 São Paulo-SP - Telefone: (11) 3223-3966. * Programação sujeita a alterações. Revista Keyboard Brasil / 23
Memória
o outroladoda extint sodos aprofisã
Fotos: Divulgação
pianistas de cinema mudo
24 / Revista Keyboard Brasil
Apresentação da Berklee Orchestra de Cinema Mudo (BSFO) em 2013, no Bra le Theater do Harvard Square, em Cambridge.
NO CINEMA MUDO, A INTRODUÇÃO DA MÚSICA FOI FUNDAMENTAL. ALÉM DE REDUZIR O RUÍDO DOS PROJETORES, O RECURSO SIMULAVA UMA ATMOSFERA MAIS REAL À CENA REPRESENTADA. POR ISSO, NA ÉPOCA DO CINEMA MUDO, OS FILMES ERAM A MAIOR FONTE DE E M P R E G O PA R A M Ú S I C O S INSTRUMENTAIS. ATÉ HOJE BUSCAM ROMANTIZAR A PROFISSÃO DESSES MÚSICOS SEM IMAGINAR AS CONDIÇÕES EM QUE OS MESMOS TRABALHAVAM. HOJE, A REVISTA KEYBOARD BRASIL ESCLARECE PARA VOCÊ. Heloísa C. G. Fagundes
Os filmes nasceram mudos. Essa falta de comunicação verbal logo revelou-se problemática, já que as salas eram lugares estranhos e escuros para os espectadores que, sentados em fileiras, assistiam apenas imagens. Recursos como legendas, movimentos de câmera e enquadramentos tornaram-se insuficientes. A música
viria quebrar esta situação, até certo ponto, tenebrosa. Imagine a diferença entre uma sala de exibição de cinema e uma de teatro nos anos 1920: claras, orquestradas, coloridas, sofisticadas. As salas de teatro eram completas! Ao criar uma ambientação sonora ao vivo, surgiram profissionais que tocavam piano ou órgão, enquanto o filme era apresentado nas salas de exibição. Desta maneira, intensificavase uma atmosfera mais real à cena, criando uma profundidade visual envolvente para o que era projetado, além de reduzir o ruído (alto e incômodo) dos projetores que ficavam na própria sala de exibição.
Tempos depois, várias exibições já contavam com o acompanhamento de grandes orquestras. Entretanto, para preencher a lacuna entre um solista de piano simples e uma orquestra maior, foram projetados órgãos próprios para o cinema. Esses órgãos tinham uma ampla gama de efeitos especiais; órgãos como a famosa Mighty Wurli er poderiam simular alguns sons orquestrais juntamente com uma série de Revista Keyboard Brasil / 25
(1) A primeira exibição de um filme para o público foi promovida por August e Louis Lumiére. Os irmãos Lumière produziram um grande número de curta-metragens documentais com êxito, com diversos elementos em movimento. (2) O evento aconteceu em Paris, no Grand Café do Boulevard dês Capucines, em 28 de dezembro de 1895. Pela primeira vez, um piano era tocado enquanto acompanhava as cenas, onde o valor do ingresso era equivalente a 50 centavos. (3 e 4) As projeções dos filmes mudos eram acompanhadas por música ambiente, executada por orquestras ou por um pianista.
efeitos de percussão, como tambores graves e címbalos e efeitos de som, variando de galope de cavalos a trovões. Com isso, muitos espectadores iam aos cinemas mudos não para assistirem ao filme, mas para apreciar a melodia tocada.
muito pouco por um trabalho exaustivo: tocava até nove horas por dia, sem descanso. Se quisesse a ajuda de
outro pianista, o músico deveria pagar do próprio bolso. Um pouco
complicado dado o valor de seu salário. E, em alguns cinemas, os próprios Além da baixa remuneração, músicos faziam parte do show muitos pianistas eram Abaixo e no detalhe: famoso sendo utilizados de colocados numa órgão Mighty Wurli er e sua forma impressioincômoda posição: ampla gama de efeitos especiais. nante por seus ematrapalhavam a vipresários. são do público. AlEssa roguns irritados, atiramantização da vam avelãs, castanhas, profissão esconde, laranjas ou bolas de contudo, as condições papel. Também havia em que os mesmos os que não gostavam trabalhavam. da música tocada por Na Espanha, por considerá-las “monóexemplo, nos anos de 1914 tonas”. Então, ouviae 1922, surgiram artigos se a raiva verbal de que traziam, à tona, a situalguns espectadores ação dos pianistas nas descontrolados. salas de cinema daquele país. Em outro artigo, citam-se três tipos Em um deles, publicado em 1914, desse profissional: os entusiasmados Tio Juan e Jaime Colomer queixam-se das (como o jovem que está terminando seus condições desumanas do tipo de trabalho: estudos), os desiludidos (como o velho, um pianista de cinema mudo recebia que simplesmente encerrava sua carreira) 26 / Revista Keyboard Brasil
(5) Em alguns países, como o Japão, além da música ao vivo, existia também o benshi, um narrador que fornecia – ao vivo – comentários e vozes para os personagens. O benshi tornou-se um elemento central no filme japonês fornecendo, também, a tradução para os filmes estrangeiros. Sua popularidade nos filmes mudos persistiu até os anos 1930. (6) As primeiras partituras completas surgiram em 1908. Um dos compositores da época foi o francês Camille Saint-Saëns que compôs Lê Film d'Art para L'Assassinat du Duc de Guise.
e os indiferentes (aqueles que não encontravam outro serviço a não ser o de pianista de cinema mudo e, por isso, estavam ali apenas para cumprir com o que sabiam fazer). Entretanto, em meados da década
de 1930, o interesse desperto pelos produtores de cinema tornou a relação música/ imagem mais íntima e a utilização de recursos de gravação, introduziu a tecnologia devastando a profissão de pianista de cinema mudo.
* smil e de charleschaplin Transcrição: Maestro Marcelo Fagundes
* Smile é uma canção composta por Charlie Chaplin originalmente em 1936, para seu filme Tempos Modernos. Revista Keyboard Brasil / 27
Por Dentro
!
Beethoven, so´ existiu um
30 / Revista Keyboard Brasil
Immortal Beloved ou Minha Amada Imortal: filme biográfico britânico e estadunidense de 1994 que traça a história do compositor alemão Ludwig van Beethoven. Dirigido por Bernard Rose e estrelado por Gary Oldman, Jeroen Krabbé, Isabella Rossellini e Valeria Golino.
UMA PERDA AUDITIVA É CAPAZ DE DESTRUIR A CARREIRA DE UM MÚSICO PARA SEMPRE. PORÉM, HÁ RARAS EXCEÇÕES, COMO BEETHOVEN, É CLARO. CONTUDO ELAS PODEM E DEVEM SER EVITADAS. BASTAM ATITUDES SIMPLES. * Raquel Malara Dell Acqua
Ao saber que sou fonoaudióloga e que atuo especificamente com Saúde do
Músico, logo surge o tema ‘‘audição’’ e muitos músicos me dizem assim: ‘‘Eu tenho uma pequena perda auditiva nos agudos, mas é muito pequena e o profissional que fez o exame me disse que essa perda não vai me atrapalhar, e realmente não sinto nenhuma dificuldade para tocar’’. Ok. De certa forma está certo. Porém, vamos pensar um pouco sobre isso fazendo uma analogia. Digamos que você acabou de se mudar para uma casa nova. Tudo nela está perfeito e lindo. No entanto, depois da primeira temporada de chuva, aparece uma ‘‘manchinha’’ de bolor no teto da sua sala. Ela é bem pequena, mal dá para ver. Não atrapalha em nada, e, portanto, ela pode ficar ali sem que você tenha de fazer nada. Está certo? Não, não está certo! A ‘‘manchinha’’ de bolor no teto da casa nova sinaliza que a quantidade de água a que a casa está exposta é maior do que ela pode suportar, e isso certamente tem um
motivo: pode ser uma telha quebrada, uma canaleta entupida, etc. Se você não tomar uma providência, essa mancha vai crescer até causar um prejuízo bastante importante para o seu bolso. Para que isso não aconteça, você terá de resolver o problema, antes que seja tarde demais.
Bom, nessa breve comparação, a casa é o seu corpo e a ‘‘manchinha’’ no teto é a pequena perda auditiva nos agudos. Ter uma perda auditiva, por menor que seja, nas frequências agudas, significa que você está deixando entrar som demais em seu ouvido, e essa entrada de som demais já fez um pequeno estrago. Se o problema não for resolvido, piorará cada vez mais.
A diferença entre as duas situações é que, ao contrário de uma infiltração, uma perda auditiva causada por exposição prolongada e repetida a sons de alta intensidade, não pode ser resolvida nunca mais!
Revista Keyboard Brasil / 31
Foto: Arquivo pessoal
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[.. ] Uma perda auditiva e´ capaz de destruir a carreira de um ´ musico para sempre pois, dependendo do grau de severidade, pode vir a ~ para alguns dificultar a percepcao tons e timbres, afetando o equili´brio entre os instrumentos.
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– Raquel Malara Dell’Acqua, fonoaudióloga, pesquisadora, professora, escritora, palestrante, cantora e contadora de histórias.
Existe um nível de tolerância estabelecido depois de muitas pesquisas sobre a exposição a níveis de pressão sonora. Segundo a
tabela do Ministério do Trabalho ao lado, podemos ficar até 8 horas por dia expostos até 85dB de intensidade sem arriscar nossa audição. A medida que a quantidade de som aumenta em dBs, o tempo tem que diminuir para não lesar irreversivelmente nossa audição. Pesquisas apontam que o ensaio de uma banda de Frevo e/ou Maracatu, pode atingir até 32 / Revista Keyboard Brasil
117 ou 119dBs de intensidade sonora (Andrade e Russo, 2002), claro que esse ensaio não dura 8 horas. Entretanto, nessa intensidade, o permitido é apenas 5 minutos e, certamente, o ensaio dura muito mais do que isso! Outro estudo feito com bandas de Rock (Andrade e Russo, 2002) aponta quase 100 dB de intensidade. Nesse volume, a tabela permite cerca de 1 hora. Será que o ensaio termina em 1 hora? Essa pequena perda auditiva nos agudos aponta que você está se expondo a altos níveis de pressão sonora - mais do que seus
ouvidos podem suportar e sem se danificar - MAS se você não cuidar do problema, essa perda vai aumentar e deixar de ser insignificante.
Para justificar minha preocupação com relação ao problema, sugiro que você tampe seus ouvidos com plugs ou fones de pressão e tente tocar seu instrumento com o volume do amplificador na metade. Será que dá? Ou, então, tente tocar seu instrumento com a banda toda junta, mas sem seu retorno. Será que dá?
TABELA: Espectro dos níveis de audição.
Perder a audição é como ter um tampão no ouvido que não sai nunca mais ou nunca mais ter retorno para tocar, entende? Uma perda auditiva é capaz de destruir a carreira de um músico para sempre, pois dependendo do grau de severidade, pode vir a dificultar a percepção para alguns tons e timbres, afetando o equilíbrio entre os instrumentos. O mais importante e interessante nisso é que as perdas auditivas
podem ser evitadas com atitudes simples e com a conscientização. Hoje em dia, qualquer pessoa tem um celular com tecnologia andróide. Nesse celular, existe um decibelímetro, que é um instrumento de medir quantidade de som. Na hora do seu estudo individual, abra o aplicativo e posicione o celular bem perto do seu ouvido para que ele possa medir o volume sonoro que está chegando até você. Peça para alguém segurar por 10 minutos e toque seu instrumento durante esse tempo. Anote as variações de volume que ocorrerem, ache uma média e compare com a tabela para saber se você está arriscando sua audição ou se está seguro. Repita o exercício no ensaio com a banda toda, posicionando o celular da mesma forma. Marque o mesmo tempo e peça para alguém anotar as variações. Depois, com a média encontrada, compare com a tabela e tire suas próprias conclusões.
No destaque, o decibelímetro - aplicativo para celular que mede o volume sonoro do ambiente em que sua banda está tocando.
Caso sua exposição esteja em zona de risco, ou seja, maior do que o limite de tolerância, utilize estratégias para diminuir a reverberação no local como, por exemplo: diminua a potência dos amplificadores, retornos e PAs, pelo menos para as horas de ensaio e, se possível, utilize protetores auriculares de filtro linear. Você precisa conseguir diminuir a quantidade de som até que ela seja suficientemente baixa para que seus ouvidos suportem a quantidade de horas do seu ensaio. Para ficar mais claro: se você ensaia 3 horas seguidas, sua intensidade sonora não pode ultrapassar a intensidade de 92 dBs conforme indicado na tabela. Se você está ultrapassando, tem que procurar estratégias para diminuir esse volume e, depois de aplicá-las, fazer nova medição até verificar que alcançou os limites possíveis, ou estará comprometendo drasticamente sua saúde auditiva – refletindo diretamente em sua performance musical e no seu sustento ($$), afinal
Beethoven, até hoje, só existiu um. Revista Keyboard Brasil / 33
Brincadeiras a parte, o tema é bastante sério, concordam? Devemos ainda considerar que essa forma de medir não é a mais exata, nem tampouco científica, mas já dá para evidenciar a presença do risco e a necessidade de modificações na rotina de ensaios para que sua carreira não seja prejudicada. E, talvez, você se pergunte: ‘‘E se a perda não for só nos agudos?’’. As perdas auditivas
exclusivas nos agudos indicam que sua causa seja a exposição repetida a altos níveis de intensidade sonora por tempo prolongado. Quando a perda atinge também frequências medias e/ou graves, precisamos de uma investigação maior do caso mas, certamente, há outros componentes que não são a exposição às altas intensidades. Suas causas podem variar, desde uma herança genética, até uma sequela de doenças como, sarampo ou infecções repetidas de ouvido. Enfim, essa perda tem outra origem, mas pode aumentar quando somada à exposição prolongada e repetida às altas intensidades, e também pode variar com a suscetibilidade individual. Isso explica a diferença de alguns músicos apresentarem perdas auditivas mais graves do que outros, num tempo de exposição semelhante e tocando o mesmo tipo de música (Samelli e Schochat, 2000). Para encerrar, dá para ser um grande músico tocando muito e a vida inteira sem ter problemas auditivos. Basta, apenas, um olhar atento e a utilização contínua de algumas estratégias.
* Raquel Malara Dell Acqua é uma das autoras do livro Saúde para Músicos, da Keyboard Editora.
34 / Revista Keyboard Brasil
Foto: Tiago Calazans
Festival
Fotos: Divulgação
Egberto Gismonti, no piano e Jaques Morelenbaum, no violoncelo em apresentação na Igreja da Sé, em Olinda (Pernambuco), através do Festival MIMO 2014.
Precisão e flerte entre o
POPULAR
e o
ERUDITO
DOIS GÊNIOS BRASILEIROS DA MÚSICA SE ENCONTRARAM EM OLINDA NO FESTIVAL MIMO 2014! Júnior Rodrigues Sob a proteção de São Francisco de Assis, dois gênios da música se apresentaram na Igreja barroca da Sé, em Olinda (Pernambuco). Ao piano, Egberto 36 / Revista Keyboard Brasil
Gismonti, compositor, pianista e guitarrista e, tocando violoncelo, o arranjador Jaques Morelenbaum. Amigos e parceiros na música, puderam
proporcionar um momento extremamente especial ao público que ali estava. De um lado, a figura exuberante de Egberto Gismonti, músico excepcional que estudou em Paris com Nadia Boulanger, realizou parcerias com a aristocracia do Jazz contemporâneo como Jan Garbarek e Charlie Haden, inventou interpretações loucas para a Bachania Brasileira nº 5, de Heitor Villa-Lobos e passou alguns meses na reserva indígena do Xingu, na Amazônia. Do outro, Jaques Morelenbaum, homem de longas parcerias musicais: tocou por dez anos com Antônio Carlos Jobim (até sua morte em 1994) e cinco com Gismonti, antes de se juntar à tribo de Caetano Veloso. É o seu trabalho com o último que o fez ser reconhecido além das fronteiras brasileiras, especialmente com os arranjos magníficos criados por ele para o álbum de Caetano Veloso, intitulado Fina Estampa, de 1994, onde a canção Coucourroucoucou Paloma, regravada por Caetano foi inserida no filme Fale com Ela (2002), de Pedro Almodóvar.
Ouça Caetano Veloso cantando Cucurrucucu Paloma (Hable Con Ella), inserida no filme de Almodóvar.
Ouça Egberto Gismonti em Trenzinho do Caipira, de Heitor Villa-Lobos.
Amigos de longa data, a dupla tomou todas as providências para que tudo saísse perfeito. Misturas divertidas e ritmos indígenas flertavam constantemente com os estilos popular e erudito. Ao final da apresentação, o reconhecimento: mais uma vez foram aplaudidos de pé, dentro e fora da igreja.
Revista Keyboard Brasil / 37
Dica Técnica
- aula 6
O uso do Pitch Bend e Modulation
* Mateus Schanoski
O teclado consegue fazer efeitos iguais aos instrumentos de cordas e sopros, o Bend e o Vibrato. Pitch Bend: Modula a nota para cima ou para baixo. Esse controle possui uma mola que faz e desfaz o efeito automaticamente. Também é possível editar quantos intervalos esse Bend pode alcançar em semitons, chegando até uma oitava. Mas para essa aula, deixaremos como regulado de fábrica, 2 semitons, e educar nosso ouvido para controlar o 1 semitom. Modulation: controla a velocidade do efeito do vibrato, modulação da nota. Quanto mais modulation, mais rápido será o vibrato. Este controle não possui mola para retornar ao normal. Esses 2 controles, em alguns modelos, podem ser endereçáveis. Ou seja, eles podem controlar outros parâmetros, dependendo do modelo do teclado como filtro, envelope, Rotary Speaker, etc...mas este será um tópico para outra aula. Normalmente, todos os teclados já vêm com esses controles sobre os efeitos de Bend e Vibrato. 38 / Revista Keyboard Brasil
Isso é possível graças a 2 controles que ficam ao lado esquerdo do seu teclado. Em alguns modelos é um Joystick (alavanca), que faz a nota subir, quando você movimenta para a direita, ou a nota descer, quando movimentado para a esquerda. O efeito de vibrato é controlado quando você coloca essa alavanca para cima. No Joystick, o modulation também possui uma mola. Outros modelos mais comuns possuem 2 rodas, uma para cada controle. Ambas são controladas para cima e para baixo. E, por último, existe um modelo que possui uma alavanca de madeira com encaixe para o dedo indicar, que controla o Bend, e uma roda confeccionada em pedra, para o modulation. Particularmente, prefiro os modelos que usam 2 rodas, pois são mais confortáveis e de fácil controle. Assista
ao víde
o:
Fotos: Acervo pessoal
Veja no exemplo 1, a representação gráfica destes efeitos. No primeiro exercício, usaremos o Pitch Bend, subindo 1 tom. No segundo exercício, Pitch Bend para baixo. Repare que o tempo de Bend, deve durar a figura de duração onde ele está grafado. Comece treinando Bends de 1 tom até ter total controle sob esse efeito. Por último, o vibrato pode ser usado sempre em notas longas com pouca quantidade, ou seja, não empurre a roda ou alavanca até seu extremo, um movimento bem curto já é o suficiente. Comece estudando usando um timbre de Lead Synth monofônico. Todos esses exercícios devem ser estudados nas escalas apresentadas nas aulas anteriores. Bons estudos e divirta-se.
* Mateus Schanoski é graduado em Piano Erudito (Conservatório Bandeirantes), Piano Popular (CLAM e ULM), Teclado e Tecnologia (IT&T). É tecladista, pianista, organista, sideman, arranjador, produtor musical, professor e colaborador da Revista Keyboard Brasil.
CONTATOS:
Revista Keyboard Brasil / 39
Pioneirismo
Wanda Jackson f
A ace feminina do
ROCK
in
ROLL
ESSE ANO, O ROCK'N'ROLL COMPLETOU 60 ANOS. MUITAS SÃO AS HISTÓRIAS CONTADAS SOBRE ESSE ESTILO MUSICAL E SUAS FIGURAS MASCULINAS. MAS HOUVE UMA MULHER DE “NÍVEL A” NESSA PRIMEIRA GERAÇÃO ROQUEIRA. SEU NOME? WANDA JACKSON, A RAINHA DO ROCK'N' ROLL E DO ROCKABILLY (E, POR UM BREVE PERÍODO, NAMORADA DE ELVIS PRESLEY NOS ANOS 1950). José Cunha 40 / Revista Keyboard Brasil
Os primeiros tempos do rock'n'roll eram quase um “Clube do Bolinha”. Os
inocentes). Invocada, cantando rocks rápidos e ferozes, não se parecia em nada com a adolescente que cantava músicas Country. Wanda
homens foram as figuras que entraram para a história, de Elvis Presley a Chuck Berry, de Jerry Lee Lewis a Li le Richard e tantos outros. Nesse meio, totalmente masculino, surgiu Wanda Jackson uma mulher de atitude durona e, ao mesmo tempo, feminina. Nascida em 20 de Outubro de 1937, no estado de Oklahoma (EUA), Wanda Lavonne Jackson iniciou sua carreira ainda na adolescência, quando chamou a atenção do cantor country Hank Thompson, que a incentivou a gravar com sua banda, os Brazos Valley Boys. Em 1956, Wanda namorava o astro Elvis Presley, que a incentivou a deixar o Country para gravar Rock'n'Roll e Rockabilly.
estava à frente de seu tempo. A partir da segunda metade dos anos 60, em decorrência à Beatlemania, o Rockabilly começou a perder força. Nessa mesma época, Wanda converteu-se ao Cristianismo, passando a gravar álbuns Gospel, alternando baladas Country e música religiosa – suas duas paixões. Em 1963, o álbum Two Sides of Wanda, que reunia música Country e Rockabilly, incluindo a famosa canção de Jerry Lee Lewis, Whole Lo a Shakin' Goin' On, rendeu-lhe um prêmio Grammy de melhor performance e vocal country feminino. Por insistir em lançar álbuns religiosos foi dispensada pela gravadora Capitol, em 1973. Contudo, continuou lançando discos e fazendo shows, até voltar aos poucos a gravar Rock,
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absurdamente contagiantes até mesmo para os padrões da época, Wanda foi a pioneira ao empunhar sua guitarra nos palcos antes de as mulheres receberem permissão para ir além do vocal (nessa época, a maioria esmagadora das cantoras Pop ainda era comportadinha e se dedicava a baladas românticas e
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Pianista e guitarrista de primeira, Wanda se tornou a rainha do Rock no fim dos anos 50, revolucionando um mercado marcado pelo machismo. Arrasando em canções
~ Uma das maiores emocoes de minha vida foi dividir o palco com Little Richard enquanto Tina Turner fazia os vocais de apoio. E renascer, depois de algum tempo, com o grande Jack White! – Wanda Jackson
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como em seu álbum de 1984, Rock'n'Roll Away Your Blues. Em 1995, Wanda gravou Rockabilly Filly, e fez a sua primeira turnê pelos Estados Unidos desde a década de 1970. Em 2000, foi lançada a ótima coletânea Queen of Rockabilly, com trinta faixas que englobam seu período mais fértil. O resultado foi um apanhado maravilhoso que demonstrou todo o poder da soberana do Rock. Em 2001, participou do Rockabilly Festival, em Tennessee, com Narvel Felts e Bill Haley e seus Cometas. Em 2002, Wanda
Wanda Jackson, pioneira do Rock in Roll, regravou a música Let's Have a Party, que fez sucesso na voz de Elvis, seu namorado nos anos 50.
entrou para a lista “The 40 Greatest Women of Coutry Music” (as 40 maiores mulheres da música Country). Seus últimos registros em estúdio foram os discos Heart Trouble, de 2003, que traz a participação de Elvis Costello e da banda The Cramps; e um tributo I Remember. Em 2008, Wanda participou do London Rock'n'Roll Festival ao lado de Jerry Lee Lewis. Em 2009, Wanda Jackson foi
Fotos: Divulgação
introduzida ao Rock'n'Roll Hall of Fame em sua 24° edição, na categoria
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Primeiras Influências. Porém, como o Metallica foi introduzido nesta mesma noite, a mídia que cobriu o evento quase nem reparou na homenagem feita para ela. Também está no Rockabilly Hall of Fame. Em 2010, participou do SXSW Music Festival, em Austin, Texas. E, em 2011, lançou o sensacional álbum The Party Ain't Over produzido por, nada menos, que Jack White. Aos 77 anos, sua majestade, a rainha do Rock'n'Roll e do Rockabilly está viva e na ativa.
Fotos: Div
ulgação
Especial
O paraíso das
TECLAS
A REVISTA KEYBOARD BRASIL MOSTRA, A SEGUIR, AS NOVIDADES E LANÇAMENTOS EM INSTRUMENTOS E EQUIPAMENTOS RELACIONADOS AO MUNDO DAS TECLAS APRESENTADOS NA MAIOR FEIRA DE ÁUDIO, ILUMINAÇÃO E INSTRUMENTOS MUSICAIS DA AMÉRICA LATINA – A EXPOMUSIC.
Da Redação 44 / Revista Keyboard Brasil
Revista Keyboard Brasil / 45
E que venha 2015 com muito mais novidades! AtĂŠ lĂĄ galera!
46 / Revista Keyboard Brasil
Ponto de Encontro... da Música, Arte, Beleza, Educação, Cultura, Rigor, Prazer e Negócios
Cena do filme Sonho de uma noite de verão (A Midsummer night´s dream), de 1999.
O EVENTO ARTÍSTICO: Que exemplo de tipo de união e capacidade de resolução de problemas pode nos proporcionar? A EXEMPLO DO QUE ACONTECE NO MUNDO DOS ESPETÁCULOS – CONVERGÊNCIA DE INTERESSES, ATENDIMENTO DE NECESSIDADES, VISÃO DE PROGRESSOS E MELHORIAS – POR QUE NÃO TORNARMOS O FATOR POLÍTICA UM EVENTO MAIS PRAZEROSO REALIZANDO REUNIÕES PARA DISCUTIR PROPOSTAS, OBJETIVOS E PROGRAMAS DE TRABALHO EM BENEFÍCIO DE NÓS MESMOS? * Luiz Bersou Quando vamos ao cinema, teatro ou a um evento musical, raramente vamos sozinhos. Temos sempre neces-
sidade de nos agregar a um grupo, pois a experiência a ser vivida tem a característica grupal. Existe sempre a necessidade desse compartilhamento. Perguntas corriqueiras de um para o outro: “– Você gostou?” “– O que mais o sensibilizou?” “– O que há a comentar?” O tema de referência do que 48 / Revista Keyboard Brasil
foi visto é sempre o fator de convergência dos interesses e manifestações. O que há a caracterizar aqui: há um evento, ele tem uma proposta, chama a atenção, a população responde indo ao evento. Há, então, um saldo de experiências que geram suas histórias. Esse saldo, em geral, está ligado à qualidade de uma experiência, um estado de satisfação, de felicidade. Algumas vezes tem a característica de estar ligado a uma condição de
postas e programas de trabalho em benefício daquela coletividade que estava ali presente. A exemplo do que acontece no mundo dos espetáculos, temos aqui uma experiência grupal. Convergência de interesses, atendimento de necessidades, uma visão de progressos e melhorias. Dessa experiência, um sentimento de dever cumprido. Ou, pelo menos, tentativa de. Há, aqui, uma comparação a ser feita. O fator de atração do evento artístico e o fator de atração do evento político. Um com uma visão prazerosa, outro em um contexto de luta por ideias e objetivos. Aí a pergunta: Qual evento pode vir a ser mais
prazeroso? Estamos, no momento atual, vivendo um processo eleitoral. Tive a oportunidade de estudar diversas propostas de programas de ação de diferentes partidos. O que mais nos chama a atenção é que geralmente se trata de um amontoado de frases
nossa vida gregária, mais um evento social de importância. Com um pouco de organização, esses eventos podem ser tão prazerosos como os eventos artísticos. Cada um de nós pode contribuir para esse sucesso. Donos de cinemas, teatros e quadras esportivas podem colaborar oferecendo os espaços para as reuniões. Faz sentido?
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[.. ] Criar um evento ^ de importancia poli´tica faz sentido?
– Luiz Bersou
* Atualmente dirigindo a BCA Consultoria, Luiz Bersou possui formação em engenharia naval, marketing e finanças. É escritor, palestrante, autor de teses, além de ser pianista e esportista. Participa ativamente em inúmeros projetos de engenharia, finanças, recuperação de empresas, lançamento de produtos no mercado, implantação de tecnologias e marcas no Brasil e no exterior.
Foto: Acervo Pessoal
Foto: Divulgação
cutia candidatos. Discutia-se quais deveriam ser as propos-
de efeito, um ajuntamento de ideias sem uma coluna vertebral que as sustente adequadamente. Decorre que nesses textos há, em geral, a apresentação de um conteúdo ideológico, sempre incompleto, e sem as conexões necessárias para a sua realização prática. Tudo isso porque raramente são devidamente trabalhados. Assim, constatamos algo comum com a famosa história de Sonho de uma noite de verão: sonhar sem nenhum compromisso com a proposta, com a realização. Por isso, uma sugestão: chamar os políticos que elegemos e exigir deles a prática de discussão permanente de programas de trabalho. Criar, em
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realização. Quando morava na Itália, vivi uma experiência nova: em um momento de inverno, muito frio, comecei a notar que igrejas e quadras esportivas estavam bem movimentadas à noite. Investigando as razões, descobri que se tratava de reuniões de partidos políticos. O mais interessante é que se tratava de reuniões para discutir objetivos e programas desses partidos, como algo necessário e não vinculado a um processo eleitoral. Não se dis-
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Homenagem
Chiquinha Gonzaga
(17 de outubro de 1847 ‒ 28 de fevereiro de 1935)
UMA VIDA AO SOM DA TRANSGRESSÃO SEM DINHEIRO PARA ROUPAS OU CHAPÉUS, FRANCISCA EDWIGES DE LIMA NEVES GONZAGA OU, SIMPLESMENTE, CHIQUINHA GONZAGA, ERA CONSTANTEMENTE VAIADA NAS R U A S . M U L ATA , D E S C A S A D A , FEMINISTA, ABOLICIONISTA E MOVIDA À PAIXÃO, CHIQUINHA DESAFIOU E TRANSGREDIU MUITOS COSTUMES MACHISTAS NA ÉPOCA EM QUE VIVEU. PORÉM, É ATUALMENTE TIDA COMO UMA DAS MAIORES COMPOSITORAS E INSTRUMENTISTAS DA MÚSICA BRASILEIRA (SUA OBRA TEM MAIS DE 2000 COMPOSIÇÕES!). ESSA MULHER OUSADA, QUE SACUDIU O RIO DE JANEIRO NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX COM SUA MÚSICA, FARIA 167 ANOS ESSE MÊS. POR ISSO, A REVISTA KEYBOARD BRASIL PRESTA UMA BELA HOMENAGEM EM COMEMORAÇÃO AO SEU ANIVERSÁRIO, ATRAVÉS DO EXCELENTE TEXTO DE NOSSA NOVA COLABORADORA: MARINA RIBEIRO. *Marina Ribeiro 50 / Revista Keyboard Brasil
Há algum tempo, uma propaganda usou o Funk Lek-lek para anunciar um carro. Isto foi considerado uma afronta à erudição da indústria da comunicação no Brasil. Onde já se viu? Um ritmo da periferia, das camadas mais baixas da população, misturado com um produto nobre e destinado à elite! Na verdade, já se viu. Chiquinha Gonzaga
levou o Corta Jaca ao Palácio do Catete há, aproximadamente, 100 anos. Pelas mãos de Nair de Teffé, a então, primeira dama do país. Não menos revoltada ficou a sociedade da época e, Rui Barbosa foi aos jornais: “Aqueles que deveriam dar ao país o exemplo das maneiras mais distintas (...) elevaram o Corta Jaca à altura de uma instituição social. O Corta Jaca é a mais baixa, a mais chula e a mais grosseira de todas as danças selvagens. A irmã gêmea do Batuque, do Cateretê e do Samba.” E Chiquinha? Levou uma orquestra de 100 violões ao teatro. O violão, um instrumento de bêbados e boêmios. E, ainda cantou: ‘‘Ó Abre Alas, que eu quero passar...’’. Essa mulata era uma
mulher ousada e pioneira. Uma das primeiras a sustentar-se com seu trabalho, primeira a compor para o teatro, a fundadora de nossa música popular, a criadora das marchinhas de carnaval, a primeira maestrina... Ela própria representava os dois segmentos da sociedade da época: a fidalguia do pai, José Basileu Gonzaga, general do Exército Imperial Brasileiro, e a negritude plebeia de sua mãe, Rosa Maria Neves de Lima. E, assim, Chiquinha levou essa mistura para a música fundindo o 'culto' ao 'inculto'. O casamento, arranjado (1) Chiquinha Gonzaga com um ano pelo pai nos seus 16 anos, de idade no colo de sua mãe. (2) Anúncio de Chiquinha Gonzaga durou até que o marido impôs oferecendo aulas particulares no a condição: a música ou eu. jornal A Gazeta de Notícias, de 12 de janeiro de 1880. (3) Notícia do A resposta inesperada: “Pois, “Escândalo no Catete”, música de Chiquinha Gonzaga executada senhor meu marido, eu não en- por Nair de Teffé, no jornal A Rua, tendo a vida sem harmonia”. de 7 de novembro de 1914. Revista Keyboard Brasil / 51
Descasada e declarada morta pela família, com três filhos para alimentar, Chiquinha Gonzaga passou a dar aulas e trabalhar nas lojas de música, demonstrando partituras ao piano. O filho mais velho costumava acompanhá-la tocando cavaquinho por alguns trocados. No segundo casamento teve mais uma filha. Contudo, não suportando as traições do companheiro, mais uma vez, seguiu sozinha.
O piano era um instrumento que carregava uma forte simbologia no Rio de Janeiro do século XIX. Um piano na sala conferia, ao seu dono, o status de nobreza, poder, cultura e boa linhagem familiar. Os investimentos na educação das meninas eram direcionados para prepará-las para a arte da sedução: aulas de boas maneiras, canto, piano, bordados e tudo mais o quanto fosse necessário para garantir a conquista de um bom marido. Era a forma de garantir o funcionamento da economia e a adequada transmissão dos bens. As músicas nas salas e recitais familiares eram importadas da Europa. Nos bares, porém, as influências eram outras. Os ritmos dos negros mestiços, de compassos marcados, nas gafieiras, cinema e no teatro de revista, mas não permitidos nos salões, eram executados pelos “pianeiros”. E, por estes ritmos se encantou Chiquinha. A convite de Antônio Callado integrou, como pianista, o Choro Carioca passando a tocar em festas e a frequentar o ambiente artístico. Não demorou muito sua estreia como compositora com a polca Atraente. Esse sucesso colocou Chiquinha entre os compositores de destaque e suas partituras foram final(4) Chiquinha Gonzaga: mulher ousada para sua época. (5) Conmente editadas com o retrato trato de composições de suas músicas. (6) Foto datada de 1933, da compositora, a bico de no palco do Teatro Recreio (RJ), pena, na capa. Para que? Isto após o ensaio geral da opereta Juriti, de Viriato Corrêa. Ladeando e mais algumas quadrilhas a notável compositora estão Vicente que a cidade andava repetinCelestino, Gilda de Abreu e o autor da peça, Viriato Corrêa. do deixou a família Gonzaga 52 / Revista Keyboard Brasil
Fotos: Divulgação
A última foto da maestrina, pianista e compositora, aos 85 anos, no dia de seu aniversário.
indignada. E, promovendo a queima das partituras, proibiram-na de ver a filha Maria. Sem dinheiro para roupas (as que vestia ela mesma costurava), nem para os chapéus – mesmo sendo imposição da época as mulheres andarem com a cabeça coberta – Chiquinha usava um laço e, por isso, era constantemente vaiada nas
ruas por outras mulheres . Ao surgir o teatro de revista surgiu, também, a oportunidade de compor para as peças. Assim, compôs para Viagem ao Parnaso, de Arthur Azevedo. Porém, quando entregou seu trabalho, o agente de Arthur foi categórico: “sua música é muito bonita, mas tem que usar um pseudônimo em francês e nome de homem”. Naquela época, uma mulher não poderia escrever para o teatro. Sendo assim, Chiquinha juntou suas partituras e se retirou. Dois anos mais tarde, Chi-
quinha musicou A Corte na Roça, um grande sucesso que a fez requisitada por todos os autores teatrais. Na abertura da segunda peça que musicou, ao reger a Banda da Polícia Militar e a orquestra da companhia teatral, criou-se uma questão gramatical:
jornais da manhã seguinte não sabiam como chamar uma mulher que regia orquestras. Não havia substantivo feminino para a palavra maestro! Mas, como manter tal gênio e paixão distantes de causas que podem apaixonar? Envolveu-se no movimento abolicionista e, de casa em casa, vendia partituras, juntando fundos para a Confederação Libertadora alforriar escravos. Envolveu-se na defesa da causa republicana. Também foi uma das criadoras da SBAT*, para garantir que os autores recebessem os direitos autorais, que acabavam por
* A Sociedade Brasileira de Autores Teatrais - SBAT foi fundada em 1917, por iniciativa de autores de teatro, escritores e compositores, liderados por Chiquinha Gonzaga. É uma sociedade de utilidade pública sem fins lucrativos que arrecada e distribui direitos autorais de seus associados. Sua missão é zelar pelo cumprimento dos direitos do autor, difundir a dramaturgia e estimular a atividade autoral realizando plenamente sua vocação de centro cultural da dramaturgia no país. Revista Keyboard Brasil / 53
ficar nas mãos das grandes editoras. Chiquinha compôs a primeira marcha rancho para O Cordão Rosa de Ouro: Ó Abre Alas. E musicou para o teatro de revista a opereta Forrobodó, um grande sucesso na época e que vem sendo remontada até hoje. Depois do sucesso profissional, encontrou o amor. Mas não poderia ser qualquer amor. Teria de transgredir, novamente. E, aos 52 anos de idade, Chiquinha encontrou Joãozinho, um rapaz de apenas 16 anos, seu companheiro até o
final da vida. Mudou-se com ele para Portugal e, quando voltaram ao Brasil, o apresentava como filho.
De tudo o que define Chiquinha Gonzaga, paixão é a palavra mais poderosa. Apaixonar-se pela vida, pelas causas, pelos ideais. Manter esta paixão viva e vivê-la até o fim. FONTES: Sites de Chiquinha Gonzaga, Almanaque da Folha e Livres Pensadores. Alguns artigos, em particular: Donato, Sasso, Fortunatti e Lira.
¹ATRAENTE de CHIQUINHA GONZAGA
Foto: Acervo Pessoal
Acervo digital Chiquinha Gonzaga Editoração: Douglas Passoni / Revisão e Cifras: Alexandre Dias
¹ Composição de 1877, nascida da improvisação em roda de choro na casa do compositor Henrique Alves de Mesquita e que tornou-se um clássico da música instrumental brasileira. Atraente foi gravada por inúmeros músicos, dentre eles: Altamiro Carrilho, Eudóxia de Barros, Marcus Viana e Pixinguinha, além de orquestras e bandas. Ganhou letra de Hermínio Bello de Carvalho, em registros feitos por Leci Brandão, Olívia Hime e Edson Cordeiro. Obtenha a transcrição completa acessando: http://www.chiquinhagonzaga.com/acervo/?musica=atraente&1711 * Marina Ribeiro é profissional de marketing, atua em comunicação digital e ecommerce. Mantém uma loja virtual de roupas infantis e escreve por prazer. Geminiana, seu maior desafio é manter o foco. 54 / Revista Keyboard Brasil
Cultura
Halloween Tradição, símbolos e, é claro, músicas!
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NO DIA 31 DE OUTUBRO COMEMORA-SE O HALLOWEEN, MAIS CONHECIDO NO BRASIL COMO O “DIA DAS BRUXAS”. QUE TAL CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE ESSA DATA ASSOMBROSA? ALÉM DAS CURIOSIDADES, A REVISTA KEYBOARD BRASIL PREPAROU UMA PEQUENA SELEÇÃO MUSICAL DE ASSUSTAR! Carol Dantas O Halloween é uma tradição praticada há mais de 3 mil anos e iniciada pelos povos celtas. Essa comemoração, mais comum nos países anglo-saxônicos, em especial nos Estados Unidos, é celebrada na noite de 31 de outubro. A palavra “Halloween“ foi adaptada ao longo do tempo, por conta do Dia de todos os Santos, que em inglês significa ''All Hallows Eve'', cuja abreviação se tornou Halloween. A prática de se fantasiar nessa data se deu pela crença dos povos celtas a qual afirmavam que, na noite do dia 31 de outubro, o véu que cobre o mundo astral e a Terra deixava de existir exatamente à meia noite. Para se protegerem dos espíritos ruins (já que neste momento eles teriam mais facilidade de fazer "travessuras" com os seres da Terra), se cobriam com peles de bichos e máscaras de deuses. No Brasil, o Dia das Bruxas se infiltrou em nossas comemorações de forma tímida. Apesar de sua pequena influência, pode ser visto em escolas, clubes, casas noturnas e shoppings de Revista Keyboard Brasil / 57
Lançado em 1983, “Thriller” é um clipe que revolucionou a história da música. O sucesso criado por Michael Jackson foi tanto, que é constantemente eleito por inúmeras revistas especializadas em música, como o melhor vídeoclipe de todos os tempos.
várias cidades. Porém, muitos nacionalistas questionam a influência do imperialismo cultural americano à vinda do Halloween, criticando a posição dos brasileiros em importar a cultura americana, já que nosso país tem grande diversidade folclórica que não é aproveitada e muito menos comemorada. Desse modo, alguns brasileiros
localizados em São Luiz do Paraitinga, cidade paulista, decretaram o dia 31 de outubro como o dia oficial do Saci Pererê – em protesto à inclusão do Halloween. Composta em 1989, pela banda americana de Punk Rock, Ramones, ‘‘Pet Sematary’’ foi originalmente escrita para o filme - de mesmo nome - de Stephen King. Na época de lançamento, tornou-se um dos maiores hits executados nas rádios.
A canção ‘‘Sympathy for the Devil’’, da banda britânica de Rock, The Rolling Stones, foi lançada como a faixa de abertura de seu sétimo álbum de 1968. Escrita por Mick Jagger e creditado por Jagger e Richards, a música foi classificada em 32ª posição pela Revista Rolling Stone na lista das 500 melhores canções de todos os tempos. Segundo algumas fontes, a música seria inspirada em uma visita de Jagger a um centro de candomblé na Bahia. Mas foi Keith Richards quem sugeriu o ritmo, que lembra um samba.
Gostosuras ou travessuras?
A prática de oferecer doces no Halloween é mais presente na América do Norte, na qual as crianças batem de porta em porta e dizem: ‘‘- Gostosuras ou Travessuras?’’. Também tem origem no povo celta.
Jack - the Lantern
Símbolo típico do Halloween, a abó‘‘Tocata e Fuga em Ré Menor’’, composta por Johann Sebastian Bach, entre 1703 e 1707 é uma música, no mínimo, misteriosa. Não se sabe o porquê da associação dessa peça para órgão - um instrumento utilizado em igrejas cristãs - a filmes e desenhos de mistério ou terror, como o ‘‘Fantasma da Ópera’’. Seja como for, não existe outra peça para órgão mais conhecida como essa. 58 / Revista Keyboard Brasil
bora iluminada por uma vela em seu interior é feita com o objetivo de pedir as boas vindas dessa data e desse novo ciclo que se inicia na vida de todos.
*TOCATA e FUGA em RĂŠ menor
BWV 565 Johann Sebastian Bach
* Adquira a partitura completa contato@keyboard.art.br Revista Keyboard Brasil / 59
Falando sobre nossa Música
´ Musica Brasileira Dos primordios ate os dias atuais ´
- Parte 14
Heloísa C. G. Fagundes
Fotos: Divulgação
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Jovem Guarda A Jovem Guarda foi um movimento cultural brasileiro, surgido em meados da década de 1960, que mesclava música, comportamento e moda. Sua principal influência era o Rock and Roll do final da década de 1950 e início dos 1960, genuinamente produzido no exterior, embora no Brasil seus músicos tenham adotado uma temática mais romântica e ingênua do que a música internacional. Por essa inspiração, tornou-se o primeiro movimento musical no país, que pôs a música brasileira em sintonia com o fenômeno internacional do Rock da época, 60 / Revista Keyboard Brasil
catalisado especialmente pelo Rock de Elvis Presley e dos Beatles.
A Jovem Guarda tornou-se um fenômeno midiático que arrastou multidões, e que também foi designado como iê-iê-iê, em alusão direta à musica dos já mencionados Beatles. Por essa razão, culminou com o surgimento, em 1965, de um programa televisivo exibido pela TV Record, em São Paulo e apresentado por Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa. Em apenas três meses, o programa atingiu audiência de 3 milhões de pessoas, apenas em São
Paulo e seus ídolos passaram a ditar moda entre os jovens. Além do trio, destacaram-se artistas como: Ronnie Von, Eduardo Araújo, Wanderley Cardoso, Rosemary, Sérgio Reis, Tim Maia, Jerry Adriani, Tony Campello, Martinha, Lafaye e, Vanusa, Antônio Marcos, além de bandas como Golden Boys, Renato e Seus Blue Caps, Leno e Lílian, Os Incríveis e The Fevers. A partir de 1967, com o surgimento do Tropicalismo, a atração televisiva começou a perder força, tendo seu fim em junho de 1968.
(1 e 2) A Jovem Guarda ditou moda entre os jovens e tornou-se um fenômeno midiático, originando o programa de televisão do mesmo nome, apresentado pelo trio: Roberto e Erasmo Carlos e Wanderléa. (3) Jorge Benjor, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Os Mutantes de Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias. (4) Em 1967, Caetano Veloso subiu ao palco do III Festival da Record vaiado, mas ao terminar Alegria, Alegria, saiu ovacionado.
Tropicália ‘‘A Tropicália foi o avesso da Bossa Nova’’. Assim o compositor e cantor Caetano Veloso definiu o movimento que revolucionou o status quo da música popular brasileira. O tropicalismo
inovou em possibilitar um sincretismo entre vários estilos musicais como o Rock, a Bossa Nova, o Baião, o Samba, o Bolero, entre outros. Surgido no Brasil, no final da década de 1960, seu marco inicial foi o Festival de Música Popular realizado em 1967, pela TV Record.
As letras das músicas possuíam um tom poético, elaborando críticas sociais e
abordando temas do cotidiano de uma forma inovadora e criativa. Seus principais expoentes foram Caetano Veloso, Gilberto Gil, Os Mutantes, Torquato Neto, Tom Zé, Jorge Bem, Gal Gosta, Baby Consuelo, Pepeu Gomes e Maria Bethânia. No início de 1967, esses artistas sentiam-se sufocados pelo elitismo e pelos preconceitos de cunho nacionalista que dominavam o ambiente da chamada M P B . Depois de várias discussões concluíram que, para arejar a cena musical do país, a saída seria aproximar de novo a música brasileira dos jovens, que se mostravam cada vez mais interessados no Pop e no Rock dos
Beatles, ou mesmo no iê-iêiê que Roberto Carlos e outros ídolos brasileiros exibiam no programa de TV Jovem Guarda. Argumentando que a música brasileira precisava se tornar mais ‘‘universal’’, Gil e Caetano tentaram conquistar adesões de outros compositores de sua geração, como Dori Caymmi, Edu Lobo, Chico Buarque de Hollanda, Paulinho da Viola e Sérgio Ricardo. Porém, a reação desses colegas mostrou que, se aderissem mesmo ao estilo, tentando romper a hegemonia das canções de protesto e da MPB politizada da época, os futuros tropicalistas teriam que seguir sozinhos. Consideradas como marcos oficiais do novo movimento, as canções Revista Keyboard Brasil / 61
(5) Os Mutantes foi uma banda brasileira de rock psicodélico formada durante o Tropicalismo no ano de 1966, em São Paulo, por Arnaldo Baptista, Rita Lee e Sérgio Dias. Também participaram do grupo Liminha e Dinho Leme.
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Alegria, Alegria (de Caetano) e Domingo no Parque (de Gil) chegaram ao público já provocando muita polêmica no III Festival da Música Popular Brasileira da T V Record, em 1967. As guitarras elétricas da banda argentina Beat Boys, que acompanhou Caetano, e a atitude roqueira dos Mutantes, que dividiram o palco com Gil, foram rece-
62 / Revista Keyboard Brasil
bidas com vaias e insultos pela chamada linha dura do movimento estudantil. Para aqueles universitários, a guitarra elétrica e o Rock eram símbolos do imperialismo norte-americano e, portanto, deviam ser rechaçados do universo da música popular brasileira. No entanto, não só o júri do festival, mas grande parte do público aprovou a
nova tendência. Conclusão: a canção de Gil saiu como vice-campeã do festival (onde a música Ponteio, de Edu Lobo e Capinam, foi a vencedora). E, embora tenha terminado como quarta colocada, Alegria, Alegria tornou-se um sucesso instantâneo nas rádios de todo o país. (Continua na próxima Revista Keyboard Brasil...)
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