Revista conecthos 9

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9 REVISTA DO HOSPITAL DONA HELENA

OS BENEFÍCIOS DA MEDITAÇÃO

Prática terapêutica milenar agora faz parte da tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) e é indicada por médicos como alternativa complementar aos tratamentos

NOVOS ESPAÇOS PARA ATENDIMENTO 6 É preciso ser feliz o tempo todo? 8 FAZER NADA PODE SER MUITO BOM 12 Mitos e verdades sobre a cirurgia bariátrica 18 COMO A NATUREZA AFETA NOSSA SAÚDE? 22 Meditação é terapia alternativa 26 DIÁLOGOS BIOÉTICOS 32 A importância dos cursos de gestão da qualidade 40 ELEIÇÕES DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE BIOÉTICA 44



Nesta edição Accredited by Joint Commission InternationalTM

Associação Beneficente Evangélica de Joinville/Hospital Dona Helena Rua Blumenau, 123 Centro – Joinville/SC CEP 89204-205 (47) 3451-3333 www.donahelena.com.br Revista Conecthos é um projeto do IDHEP – Instituto Dona Helena de Ensino e Pesquisa – Núcleo Editorial ISSN: 2358-8217 Circulação: maio de 2018 Coordenação geral: Carlos José Serapião Conselho editorial: Ana Ribas Diefenthaeler, Antonio Sérgio Ferreira Baptista, Gizele Leivas Editores associados: Bruno Rodolfo Schlemper Jr., Christian Ribas, Maria José Varela, Fernando Hellmann, Nelma Baldin, Euler Westphal, Wladimir Kümmer, Paulo Henrique Condeixa de França, José Carlos Abellán (Espanha), José Luis Fernández Fernández (Espanha) Jornalista responsável: Guilherme Diefenthaeler (reg. prof. 6207/RS) Produção: Mercado de Comunicação Edição: Guilherme Diefenthaeler Reportagem: Karoline Lopes, Marcela Güther, Ana Ribas Diefenthaeler e Guilherme Diefenthaeler Diagramação: Fábio Abreu Fotografia: Peninha Machado e banco de imagens Impressão: Tipotil Indústria Gráfica Tiragem: 2 mil exemplares Redação: contato@mercadode comunicacao.com.br Realização Associação Beneficente Evangélica de Joinville/Hospital Dona Helena Apoio Sociedade Brasileira de Bioética/Regional Santa Catarina Os artigos publicados correspondem à opinião de seus autores, não expressando o pensamento da direção do hospital. Todas as informações são de responsabilidade dos autores. Direitos reservados. Proibida a reprodução integral ou parcial.

Ater-se ao momento presente. Encontrar autoconhecimento e serenidade. Embora os objetivos da meditação pareçam algo remoto, considerando o ritmo acelerado do mundo em que vivemos, é fato que sua prática vem ganhando cada vez mais adeptos. Até mesmo no âmbito corporativo, a meditação é utilizada para reduzir níveis de ansiedade e estresse, criar laços entre as equipes, ajustar o foco do trabalho e, consequentemente, melhorar a produtividade. A importância da atividade foi reconhecida pelo Ministério da Saúde, que, no ano passado, incluiu a meditação na tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), na categoria “ações de promoção e prevenção à saúde”. Na reportagem principal desta edição, a Conecthos apresenta os benefícios da prática e como torná-la um hábito.

4 Nossa palavra 6 Novidades na instituição 8 A ditadura da felicidade 12 Ócio criativo 18 Cirurgia bariátrica 22 Os benefício do contato com a natureza 26 Prática terapêutica milenar 32 Diálogos e reflexões 40 Entrevista: Maria Manuela Pinto Carneiro Alves dos Santos

44 O espaço da SBB/SC


Nossa palavra

Mais vida em nossos anos! Carlos José Serapião

Coordenador do Instituto Dona Helena de Ensino e Pesquisa (IDHEP)

S

im! Podemos fazer muita coisa por nós mesmos. Nós somos os responsáveis, em primeiro plano, por nosso destino e no sentido que podemos dar pessoalmente à nossa vida. Para entender como podemos ser originais e até mesmo singulares, necessitamos não somente conhecer as influências científicas e tecnológicas que atuam em nossa vida, como também os valores que aceitem a diversidade, a solidariedade, a generosidade, o altruísmo a empatia e muitos outros, associados à vontade de fazer o bem em nosso entorno. Os conhecidos fenômenos epigenéticos são capazes de influenciar o patrimônio genético do indivíduo, e se apresentam distribuídos em múltiplos grupos, entre os quais: a nutrição equilibrada, exercícios físicos, redução do stress, a busca do prazer e da harmonia na sua rede humana, social e familiar, o prazer de empreender e criar etc. As modernas sociedades são influenciadas por esses mecanismos físicos, biológicos, antropológicos e sociais que atuam sobre sua gestão e planejamento. As decisões coletivas resultantes das avaliações coletivas dos cidadãos, deveriam constituir um apoio científico para os

seus líderes na evolução de seu trabalho, através da equidade na distribuição dos saberes e das riquezas, preservando por outro lado as culturas e as liberdades em sua diversidade. Já se comenta que estas “práticas epigenéticas” quotidianas e fáceis de aplicar, teriam impacto em nossa saúde e responderiam por uma boa e longa vida. Uma vida longa, ou seja, os centenários, as pessoas que ultrapassam seus noventa anos, não são indivíduos extraordinários, fora do comum ou sobreviventes. Eles, provavelmente, possuem segredos particulares, cada qual desenvolvendo uma pequena receita de bem-estar que contribui para sua felicidade pessoal. Claro, tudo resulta de uma genética que lhe é favorável, seguida de um comportamento, ambiente e alimentação que lhe confere uma resistência frente ao tempo que passa, com menor risco para as enfermidades ligadas à idade. Muitos conheceram guerras, eventos pessoais e familiares difíceis. Desenvolvem uma capacidade de resistir aos fatos superior à média e possuem uma resiliência considerada excelente. Em suma, querem continuar a viver e se adaptam aos acontecimentos e condições, no avançar do tempo. Convido os nossos leitores para apreciar algumas dessas condições e propostas que são discutidas nesse número, que nos conduzem a meditar frente ao pleno conceito de saúde, como um estado que corresponde a muito mais do que a ausência de doença (OMS).


Divulgação


Institucional

Novos ambulatórios

No primeiro bimestre deste ano, o Hospital Dona Helena inaugurou novos ambulatórios de especialidades clínicas do Centro Clínico. Distribuídas no sétimo e no décimo andar, ao total, são 12 novas especialidades atendidas: nefrologia, dermatologia, pneumologia, pediatria, clínica médica, endocrinologia, cardiologia, cirurgia bucomaxilofacial, cirurgia geral, angiologia e cirurgia vascular, cirurgia pediátrica e cuidados paliativos. Patrícia Chaves, coordenadora dos ambulatórios, explica que o objetivo é prestar atendimento integrado aos pacientes, nas mais diversas especialidades. Além de proporcionar agilidade e conforto, já que a instituição também coloca à disposição todos os exames complementares, em um só lugar, com qualidade e segurança garantidas por certificação internacional. Os ambulatórios de angiologia e cirurgia vascular, cirurgia bucomaxilofacial, cirurgia geral e cirurgia pediátrica estão instalados no décimo andar, junto com os já existentes ambulatório de curativos, Centro de Diagnóstico Ortopédico (CDO), consultório de genética, serviço de ergometria, serviço de neurofisiologia e serviço de neurologia. No sétimo andar, inaugurado para abrigar os novos serviços, encontram-se o ambulatório de cardiologia, clínica médica, cuidados paliativos, dermatologia, endocrinologia, nefrologia, pediatria e pneumologia. Com a reestruturação, o Núcleo de Atendimento Integrado à Mulher (Naim) também passa a realizar o atendimento no sétimo andar, para melhor acolher as pacientes.

Hospirrisos conta com novos voluntários A nova turma de voluntários do Hospirrisos – Agentes da Alegria já foi selecionada. O projeto é uma iniciativa do HDH, em parceria com o Studio Escola de Atores. Coordenado pelo Programa de Humanização há 12 anos, tem como objetivo levar alegria para pacientes, acompanhantes e funcionários, contribuindo para o atendimento humanizado na instituição. Cerca de 40 pessoas foram selecionadas para participar da atividade voluntária em 2018.

HDH lança informativo digital

Já faz parte do dia a dia a expansão dos meios digitais para acesso à informação. Segundo o IBGE, 63,6% dos lares brasileiros têm acesso à internet. Em 94,8% destes, os celulares são usados para se conectar à rede. Com a possibilidade de receber as notícias na palma da mão, a forma de produzir conteúdo também é alterada. Nessa perspectiva, o Hospital Dona Helena dá mais um passo no rumo da inovação. A partir de abril, todos que se inscreverem no site do hospital passarão a receber o informativo “DH Notícias” por e-mail. “Nosso objetivo é estreitar os laços para um melhor relacionamento. Vamos continuar divulgando informações relevantes sobre a instituição e sobre a área da saúde, de maneira geral”, explica Gizele Leivas, coordenadora de marketing. Em sua versão física, o jornal contou com 147 edições lançadas bimestralmente. De acordo com Gizele, o envio da versão digital será mensal: “O material poderá ser acessado por meio de computadores, smartphones e tablets”. Para receber as informações do HDH em primeira mão, basta cadastrar seu e-mail no site www.donahelena.com.br.


Conquistas No final de 2017, o Hospital Dona Helena recebeu homenagens e indicações que reconhecem o trabalho que a instituição tem realizado ao longo de sua jornada centenária. O HDH foi apontado, na pesquisa Ibope Inteligência, em parceria com o grupo RICTV, como hospital de preferência e maior afinidade no Norte catarinense. Também recebeu o reconhecimento da Philips, pela parceria de 20 anos de utilização da ferramenta Tasy. Já no Congresso Nacional de Hospitais Privados, a instituição foi homenageada por sua trajetória.

Resultados positivos na satisfação institucional A Pesquisa de Satisfação Institucional, realizada no final de 2017, apontou que 97,7% dos clientes do Hospital Dona Helena estão satisfeitos com os serviços prestados. Para o levantamento, foram entrevistadas 1.142 pessoas nas dependências do HDH e por telefone. “É fundamental conhecer a percepção de quem é atendido no hospital e apontar estratégias para melhorias contínuas. Esse resultado positivo é a soma de esforços de todas as nossas equipes”, aponta Andrea Jankowski (foto ao lado), coordenadora de atendimento. Promovida desde 2013, a pesquisa conta com cinco perguntas fechadas e uma aberta para comentários. No comparativo anual, quando questionados “de 1 a 5, qual nota você daria para o atendimento no Hospital Dona Helena?”, a média passou de 4,4 (2014) para 4,68 (2017), considerando 5 a nota máxima. “Apesar do aumento da pontuação, estamos atentos aos nossos processos para melhor oferecer os nossos serviços”, ressalta. Uma novidade importante em 2017 foi a avaliação do Net Promoter Score (NPS). O indicador reflete o quanto os clientes são promotores ou detratores de uma marca. Andrea explica que a pontuação do NSP

Cortesia, segurança, objetividade

varia entre -100 e 100. A média geral do Hospital Dona Helena foi de 80,4 pontos: “O Dona Helena está em uma zona de excelência, sinalizando que as atividades no hospital geraram experiências positivas para os clientes. Muitos deles são defensores da nossa marca”, observa Andrea.

Outras conclusões da Pesquisa de Satisfação Institucional • Para 98,2% dos entrevistados, os funcionários do hospital realizaram seu trabalho com cortesia, respeitando e acolhendo as suas necessidades individuais. • 97,2% dos entrevistados se sentiram seguros em relação ao atendimento prestado. • 97,3% responderam que os serviços do hospital atenderam às suas necessidades. • 98,1% anotaram que as informações/orientações repassadas durante o atendimento foram fornecidas de forma clara e objetiva.


Bem-estar

Solidão ou ditadura da felicidade?

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Reino Unido nomeou, no início deste ano, o primeiro “Ministério da Solidão”. O objetivo da iniciativa é discutir políticas públicas para lidar com esse tema de significativo impacto social. A responsável pelo grupo de trabalho será a ministra do Esporte e Sociedade Civil, Tracey Crouch. O governo britânico também se propôs a coletar dados e informações que ajudem a “medir” a solidão, além de ajuda financeira para entidades que combatam o problema. Em 2017, um relatório apontou que mais de 9 milhões de pessoas (15% da população do Reino Unido) se sentem sozinhas com frequência ou sempre. Em um mundo tão globalizado, onde é possível conectar milhares de pessoas ao mesmo tempo, em qualquer lugar, quais as razões que nos levam a esse sentimento? A socióloga Valdete Daufemback explica que a solidão independe da quantidade de pessoas à sua volta – e as aparentes ligações via internet também não significariam ter companhia. “A solidão é um estado de espírito, muito particular, individual. Nas últimas décadas, o que mudou foi a maneira de lidar com os sentimentos. O estado de tristeza sempre existiu. No passado, estar consigo mesmo, viver em silêncio, era tido como virtude”, ressalta. A psicóloga Marciane Pereira Santos, professora universitária e coordenadora do curso de psicologia da Universidade de Joinville (Univille), lembra que não há faixa etária ou sexo, nem fator biopsicossocial definido para o sentimento, que pode estar vinculado a fatores da existência humana singular. “Jean-Paul Sartre, com o existencialismo, traz a questão da responsabilidade que cada indivíduo possui sobre sua existência, sem delegar sucesso ou fracasso a outras pessoas, acontecimentos ou coisas externas. Solidão pode trazer empoderamento para o homem, que supera a angústia da individualidade, responsabilizando-se por suas felicidades”, sublinha a psicóloga. Marciane frisa que somos seres sociais: a constituição, en-

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quanto ser humano, é tecida por meio de relações com outros indivíduos, que vão produzindo simbologias. As relações se tornam mais complexas à medida que se cresce, e exigem competências interpessoais como empatia, comunicação, flexibilidade e resiliência. “Experimentar o sentimento de solidão é inerente


O sentimento de solidão é inerente ao homem. Deve-se observar quando vira doença, manifestando sintomas como falta de apetite, mudanças no sono, humor e comportamento

ao homem. Evitá-lo é torná-lo mais frágil. O homem é social e individual, e esses fatores vão estar sempre em polaridades que configuram o jeito de ser de cada um”, aponta. No entanto, argumenta Valdete, pela possibilidade de se comunicar e se conectar virtualmente com o mundo em tempo real, exige-se que a pessoa interaja continuamente, caso contrário, corre o risco de ficar fora das “oportunidades de trabalho, das relações, das festas”. Segundo a socióloga, o sentimento de

pertencimento ampliou os horizontes, do círculo familiar, da igreja, da escola, para o espaço desconhecido, de pessoas desconhecidas, numa relação virtual, na qual se cultiva o imaginário do “perfeito”, criado superficialmente. “Nessa dimensão de mundo perfeito, não há espaço para tristezas. Há uma ditadura da felicidade. A pessoa triste pode ser qualificada como depressiva e, como não interage intensamente, sofre uma pressão social”, observa. O imediatismo, a contaminação das relações interpessoais pela ideologia do consumismo e o uso de recursos digitais trouxeram um novo modelo de relações. O individualismo passou a ser mais visível após a Segunda Guerra Mundial, com o desenvolvimento da produção e o consumo de massa. Passou-se a associar a qualidade de vida com o poder de consumo, com a individualização dos pertences e bens. Com as motivações sensoriais produzidas pela internet, as pessoas se sentem na obrigação de “entrar na roda viva de produzir, consumir e descartar numa velocidade constante”, o que cria um ilusório poder de escolha. “O mercado da moda, dos produtos de consumo, foi pensado para desenvolver vitrines com possibilidades individualizadas. Nessa esfera, com tanta diversidade de escolhas para se tornar único, exclusivo, as relações pessoais e sociais foram abaladas pelas diferenças e impressões marcadas pelo consumo, pelo descarte do antigo em detrimento do novo”, contextualiza Valdete. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman definiu a sociedade atual como “líquida” devido às novas formas da vida moderna. Ele entendia que a vulnerabilidade e fluidez as mantêm incapazes de

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continuar com a mesma identidade por muito tempo, o que reforçaria o estado temporário das relações sociais. Nesse ambiente, os relacionamentos tenderiam a ser menos frequentes e duradouros. “O valor da novidade, como disse Bauman, move as interações sociais. Portanto, aquele que não acompanha o mundo das novidades, das preferências, será descartado, desprezado, considerado perdedor. Por isso, tantos se desesperam diante do desemprego, da vaga que não conquistaram, da pessoa que não lhes deu importância”, aponta Valdete. Segundo Marciane, as conexões virtuais promovem um modelo peculiar de relação, por meio do qual os usuários permanecem em zona de conforto e podem se manter em uma identidade idealizada e estabelecer vínculos na forma que desejam. “Porém, há uma frouxidão nessas relações: da mesma maneira que se vincula, desvincula-se. Elas não contribuem da mesma maneira que as estabelecidas face a face na construção do ‘self’. No mundo virtual, não há solidão, mas relações frágeis.”

Quando vira doença

A socióloga aponta que, na atualidade, a solidão não é mais aceita, sendo tida como um mal, quase uma doença. “Para qualquer tristeza, tomamos remédios. A indústria farmacêutica não desnaturalizou a dor, o sofrimento, a solidão. Não que devamos sofrer. Mas, por qualquer desconforto, há uma receita para apresentar na farmácia. Assim, o poder da resiliência enfraquece ao terceirizar o humor, o estado de espírito, as relações sociais”, ressalta Valdete, sustentando

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que o poder da resiliência não consegue acompanhar a velocidade das mudanças com que a pessoa é submetida. “Aí sim o aspecto da solidão vira doença, pela exaustão de energias. Diante da ditadura da beleza, da felicidade, da concorrência profissional, de parecer ser para agradar o maior número de amizades, reais ou virtuais, sem tempo para si, sem direito de ficar só para não ser qualificada como antissocial, a pessoa se esgota emocionalmente e organicamente”, aponta. “Ninguém consegue ser feliz o tempo todo. Seria loucura. Para ter momentos felizes, é preciso ter momentos não felizes. E isso o consumismo conseguiu exemplarmente dar conta com a rápida desvalorização das mercadorias e reposição de novas para que os consumidores encontrassem alívio de suas frustrações na aquisição daquilo que o mercado aconselha necessário.” Segundo estudo do Laboratório de Neurociência Social da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, a solidão pode tornar os seres humanos menos empáticos. Uma análise do comportamento de 229 americanos ao longo de uma década foi realizada, acompanhando a forma como se sentiam e agiam em relação à solidão e ao egoísmo. Os participantes que se sentiram mais sozinhos demonstraram uma tendência a se colocar em primeiro lugar no ano seguinte, ao passo que aqueles que colocaram a si mesmos em primeiro lugar ficaram mais solitários no ano seguinte. Nos Estados Unidos, mais de 40% dos adultos americanos dizem se sentir sozinhos, de acordo a Aarp, associação americana dedicada ao bem-estar de aposentados.


“Há uma grande possibilidade de as doenças crônicas e a solidão estarem conectadas” Laene Boldt, terapeuta ocupacional do Hospital Dona Helena

Reflexos na terceira idade

Atenção especial ao idoso envolve saúde física e emocional

A psicóloga Marciane recomenda observar se uma pessoa prefere se isolar, tem perda de apetite, mudança no sono, diminuição ou aumento da energia vital, oscilações de humor e comportamentos diferentes de seu hábito. “Esses indicadores devem ser analisados com cuidado, pois podem configurar traços de depressão ou outro transtorno mental”, avisa a psicóloga. Julianne Holt-Lunstad, professora de psicologia e neurociência da Universidade de Brigham Young, nos Estados Unidos, concluiu, em um trabalho que se tornou referência na área, que a solidão faz tão mal para a saúde quanto fumar 15 cigarros por dia ou ser alcoólatra.

Levantamento da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/São Paulo (SBGG/SP), em parceria com a Bayer, apontou, em 2017, que a solidão é o maior temor do idoso brasileiro, presente em 29% dos entrevistados. O que preocupa, pois, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2050, nada menos que 66 milhões de brasileiros ficarão acima dos 60 anos – cerca de um terço da população. A solidão é mais percebida no idoso por ser uma das fases da vida com diversos tipos de perdas: das pessoas que o cercavam ao longo da vida, da agilidade, dos reflexos, de uma memória recente mais ativa, da utilidade e rendimento na sociedade. Além de haver familiares que não incluem a atenção ao idoso em sua rotina. “Muitas vezes não houve um preparo no redirecionamento dos objetivos após a aposentadoria, formando um idoso ocioso”, observa Laene Boldt, terapeuta ocupacional do Hospital Dona Helena. Há 13 anos, ela atende aos internados do hospital, em sua maioria pacientes geriátricos. O exílio social pode incorrer em consequências graves na mente e no corpo do idoso, de modo a interferir no sistema imunológico, deixando o organismo vulnerável ao aumento no risco de doenças cerebrovasculares, cardíacas, pulmonares, entre outras. “Há uma grande possibilidade de as doenças crônicas e a solidão estarem conectadas. Caso não seja identificada a tempo, poderá afetar sua saúde mental e física, evoluindo para doenças crônicas de difícil tratamento”, alerta a terapeuta ocupacional. Laene reitera que é preciso combatê-la, tomando atitudes como “permitir a aproximação das pessoas, fazer novos amigos, passear, conversar, frequentar grupos que tenham afinidades, deixar de viver somente com os pensamentos no passado, mas permitir novas possibilidades, voltando-se para o presente e para o futuro”. “A chave da saúde mental e física é manter-se ativo, independente e com autonomia nas suas atividades do cotidiano, para uma excelente qualidade de vida.” A profissional reforça: se o idoso revelar sentimentos negativos, deve procurar ajuda de psicólogo ou psicoterapeuta. E, caso esse sentimento venha associado à perda da vontade, falta de apetite e tristeza, será importante consultar um médico psiquiatra para investigar se representa o início de uma depressão. Para identificação precoce de alterações na saúde, é importante o acompanhamento com geriatra.

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Vida

O tempo que não é dinheiro

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ão troquemos nosso tempo por dinheiro. Andar na contramão de todos os sistemas econômicos desde a Revolução Industrial é caminhar com firmeza e segurança no rumo de uma vida com maior satisfação pessoal e realização profissional. É não desperdiçar tempo com dinheiro. Fazer do trabalho, do aprendizado e do prazer, momentos únicos. Em um único momento. É o viés proposto pelo sociólogo italiano Domenico de Masi, autor de livros sobre o tema e que cunhou a expressão “ócio criativo”. O sociólogo, crítico contundente do modelo econômico centrado na idolatria ao trabalho, tem estreita relação com o Brasil, país que admira e que visitou incontáveis vezes, e também com Joinville, onde esteve em 2003 para participar do congresso Expogestão. Seu livro mais recente, lançado em 2017, “Alfabeto da Sociedade Desorientada – Para Entender Nosso Tempo”, cita a escola de balé Bolshoi como relevante fator de integração social e elevação cultural. Ele, que gosta de dizer que o Brasil não é o melhor dos mundos possíveis, mas o melhor dos mundos existentes, ficou internacionalmente conhecido por suas propostas quase utópicas baseadas na simultaneidade entre trabalho, estudo e lazer – um ambiente corporativo ideal, em que as pessoas são educadas para privilegiar a satisfação de suas necessidades pessoais, como a introspecção, a ludicidade, a convivência, a amizade e, claro, o amor. “Com trabalho, estudo e diversão, construiremos nossa identidade, não mais pelo que temos, mas por meio do que sabemos”, defende De Masi, para quem o ato de trabalhar não deve mais gerar valor apenas para as organizações – mas deve atender prioritariamente às necessidades do indivíduo. Hoje, esse valor não se restringiria ao poder, à propriedade e aos recursos financeiros, pelo contrário: precisa estar virtualmente voltado à capacidade de inovação, à criatividade e geração de conhecimento.

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Comumente, pessoas que se dedicam a atividades de que gostam afirmam que não sentem o tempo passar quando trabalham. Nem mesmo a famigerada segunda-feira gera qualquer sensação de ansiedade – trabalhar naquilo que amamos traz satisfação e alegria. Ou, como ensina De Masi: “Aquele que é mestre na arte de viver faz pouca distinção entre o seu trabalho e o tempo livre. Almeja, simplesmente, a excelência em qualquer coisa que faça, deixando aos demais a tarefa de decidir se está trabalhando ou se divertindo”. As novas gerações já podem se orgulhar de dispor de um espectro profissional bem mais amplo para decidir o rumo de suas carreiras. Por tabela, isso pressupõe uma possibilidade maior de escolher algo de que realmente se goste. O trabalho chamado intelectual se sobrepõe à atividade predominantemente braçal – e isso estabelece novos padrões


“O ócio criativo é fundamental para poder trabalhar” Leandro Karnal, historiador e palestrante

de relacionamento entre a empresa e seus profissionais. “O ócio criativo é a capacidade de eu me entregar a uma música, a uma atividade lúdica, a um filme, a uma peça de teatro, uma situação afetiva em família, e dali extrair ideias, pensar e me entregar a uma criação que pressupõe maior estabilidade, inclusive emocional. O ócio criativo é fundamental para trabalhar”, reflete o historiador e palestrante brasileiro Leandro Karnal, que defende a necessidade de o profissional refletir continuamente sobre suas rotinas de trabalho. “Estamos cada vez mais workhacolics ou worklovers, imersos em atividades que exigem nossa atenção imediata, prática, cronológica. Isso nos torna menos produtivos. É preciso o ócio criativo no sentido da capacidade de pensar, ter ideias, estabelecer estratégias e dar passos seguintes, o que é diferente de viver imerso nesse oceano de ações cotidianas.”

O ambiente é a chave “Ainda falta muito para que a maioria das empresas se conscientize da necessidade de oferecer a seus trabalhadores um ambiente plenamente sadio”, pondera Carlos Rosa, gestor da consultoria internacional Lee Hecht Harrison (LHH) em Santa Catarina. Ao identificar-se como adepto de uma política organizacional que privilegie a humanização do trabalho, ele entende que um lugar onde a pessoa se sinta bem, valorizada e com liberdade para se expressar naturalmente oferece um impulso para a interação e a criatividade. “Com menos formalidade, menos regras, nenhum tipo de assédio moral, poderemos, sim, ter equipes de trabalho bem mais produtivas”, reforça. O consultor lamenta que, ainda hoje, tantas empresas percorram o caminho inverso. O que tem sido dor de cabeça para os gestores – a chamada revolução digital – não deve ser vista como inimiga, redutora de produtividade. “Ao contrário, se bem utilizados, os recursos digitais são aliados do trabalho”, reflete, explicando que as redes sociais e os vários intercomunicadores podem ser preciosas ferramentas para as

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O sociólogo italiano Domenico de Masi cunhou a expressão “ócio criativo” funções laborais. “Afinal, estamos a um toque da interação com colegas ou pesquisadores de outras instituições, a um clique de importantes e quase instantâneas respostas para aquele problema difícil”, pontua. Cabe às corporações disponibilizar para seus funcionários ambientes de trabalho que facilitem e promovam a liberdade de expressão e a criatividade. “Em uma das vezes em que Domenico de Masi esteve no Brasil, tive a oportunidade de jantar e conversar demoradamente com ele. E hoje posso dizer que sigo pensando um pouco diferente daquela realidade que ele retrata, quando mencionava, por exemplo, que a equipe de seu escritório, na Itália, ao se sentir cansada, podia descer para tomar café ou ir ao cinema – e, depois, voltar e seguir trabalhando. Penso que isso poderia valer para empresas pequenas, com equipes pequenas. Seria difícil gerenciar algo assim nas grandes corporações.” Ao insistir na necessidade de a empresa oferecer um clima agradável, Carlos Rosa é ainda mais específico: “Não me refiro à mesa de pebolim, de sinuca, à rede para a pessoa descansar. Falo da necessidade de a companhia apresentar a seus funcionários um clima amistoso, agregador, que respeite as pessoas e suas idiossincrasias, um lugar aonde todos gostem de ir”. O consultor lembra que esse tipo de espaço é algo construído de cima para baixo. Vai daí que os CEOs, diretores e chefes têm de dar o exemplo de autoridade sem autoritarismo, de atitude colaboracionista, de gestão transparente. Precisam ficar no passado situações como a do chefe que chega às 14 horas, vê dois funcionários conversando no

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corredor, chama o líder deles e não hesita em dar uma bronca. “Um ambiente de trabalho não pode ser inóspito, escuro, sombrio – literal e metaforicamente falando”, acrescenta, Rosa, para quem o clima deve espelhar a cara das novas gerações que lá estão. Um local opressivo é, antes de tudo, pouco inspirador. Desmotiva e desestimula a criatividade e, por consequência, a produtividade. “Antes de tudo, um ambiente informal nas relações – e não nos resultados. Um modelo sério, proposto para ser produto de uma liderança que é seguida, conquistada, jamais imposta.” É papel desse líder identificar, nas equipes, o jeito mais produtivo de cada um. “Há quem tenha que dormir 20 minutos depois do almoço, para ser mais criativo. Há quem necessite de movimento, para pensar, aqueles que não conseguem usar bem o cérebro parados ao redor de uma mesa. Se tenho alguém que precisa parar às 4 da tarde para tomar um café e comer uma fatia de bolo, aí sim, pode valer a pena investir nisso, porque a pessoa terá melhor desempenho”, exemplifica, recomendando flexibilidade com responsabilidade.


“As pessoas não conseguem mais ficar sem fazer nada porque isso provoca um enorme sentimento de culpa” Marcelo Bohrer, criador do Clube do Nadismo

Empresas e climas O consultor Carlos Rosa observa que, nos distintos tipos e segmentos de empresas, há variadas formas de oferecer um meio profissional que seja propício ao bem-estar, à criatividade e à produtividade. Em um hospital, por exemplo, dadas as características de ser um lugar para onde vão pessoas com fragilidades, é ainda mais importante que o ambiente seja humanizado. Porque não apenas os pacientes, como também as equipes de atendimento em saúde demandam esse clima de acolhimento e serenidade. “Vamos pensar em médicos e enfermeiros intensivistas, por exemplo. É ali que a questão do ambiente de trabalho ganha maior relevância porque o profissional atua quase permanentemente sob alta pressão – e a pressão da ausência da saúde, que é muito forte”, pondera o consultor. Propiciar um espaço mais gostoso nas relações é essencial. Todo mundo gosta de ser bem tratado pelo chefe e pelo diretor,

Marcelo Bohrer, publicitário, criou o Clube do Nadismo após sofrer um colapso físico e mental todos adoram um lugar em que se tem liberdade de sair para tomar um cafezinho com o colega – e este será um tempo em que os dois vão falar de trabalho, de melhorias, de aperfeiçoamento, trocar ideias sobre o próprio desempenho. “Escritórios de modelo antigo, em que as pessoas se sentam de costas umas às outras, supõem uma rotina chata para as pessoas, que acabam atuando estritamente voltadas ao que o trabalho prediz, sem tomar iniciativas para melhorá-lo. É um convite à mediocridade.”

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Nada a fazer O publicitário gaúcho Marcelo Bohrer, dono de invejável e premiada carreira na área de criação em moda e publicidade, em meados dos anos 2000 sofreu com a Síndrome de Burnout – o colapso físico e mental causado pelo estresse. A parada obrigatória o levou a investigar melhor o mundo acelerado e quase desconexo à sua volta e buscar alternativas de aprimorar sua qualidade de vida. E ele percebeu o que, até hoje, muita gente não se deu conta: não fazer absolutamente nada não é crime. Ao contrário, é uma maneira de se desligar das pressões diárias. “Nosso movimento propõe uma importante transformação cultural: a consciência de que fazer nada não é perder tempo, mas uma forma muito valiosa de aproveitá-lo”, afirma o designer, que criou o Clube do Nadismo em 2006. “Assim, literalmente sem fazer nada, aprendemos a desacelerar e vivemos melhor.” Vivendo em Munique, Alemanha, desde 2014, Bohrer levou à Europa o movimento que, até então, frequentava os parques verde-amarelos e, majoritariamente, os da capital gaúcha. Embora tenha realizado alguns eventos em Londres e Nova York, era na sua Porto Alegre que Marcelo

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investia suas energias “nadistas”, no início do movimento. O Clube do Nadismo, que já conta com mais de 7 mil associados no Brasil e um número ainda não inteiramente dimensionado em diversos países, não propõe muitas regras: basta um parque tranquilo, um colchonete e disposição para “fazer nada” por pelo menos uma hora. O único segredo é tentar se desconectar de tudo. “As pessoas não conseguem mais ficar sem fazer nada porque isso provoca um enorme sentimento de culpa”, assinalou Marcelo, em entrevista à Revista Piauí. “A sociedade nos obriga a estar sempre em atividade, ligados, conectados. Ficar sem fazer nada é praticamente um pecado.” Pois a palavra culpa não faz mais parte do léxico do publicitário. Ao contrário, para ele, desprender-se de todos esses sentimentos pesados é o que torna a pessoa disposta e produtiva. Seu livro “Nadismo – uma Revolução Sem Fazer Nada”, lançado em 2008, fez enorme sucesso e recebeu uma versão em inglês, no ano seguinte. E, recentemente, mais do que aprovação popular, a proposta do publi-


Ao lado, registro de um dos encontros do Clube do Nadismo, que reúne os integrantes para “fazer nada” por pelo menos uma hora. Na foto abaixo, Carlos Rosa, gestor da LHH

citário ganhou consistência científica: o neurocientista norte americano Andrew Smart, da Universidade de Nova York, lançou a obra intitulada “Autopilot: The Art and Science of Doing Nothing” (Piloto Automático: A Arte e a Ciência de Não Fazer Nada), na qual revela que o cérebro possui algumas regiões que estão mais ativas quando em repouso. Ou seja, ao não fazer absolutamente nada, o cérebro estabelece conexões que só são possíveis naquele momento de inação. Vale dizer, o ato de não agir, por si só, é uma ferramenta que nos ajuda a pensar melhor, ter mais agilidade mental e, sobretudo, qualidade de vida.

“Um ambiente de trabalho não pode ser inóspito, escuro, sombrio – literal e metaforicamente falando” Carlos Rosa, gestor da consultoria internacional Lee Hecht Harrison

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Saúde

Riscos e benefícios da cirurgia bariátrica

Havia outras sete pessoas na sala de reunião – uma sessão de orientações para cirurgia bariátrica. Dois caras gordos, uma mulher ligeiramente acima do peso com seu marido magro, duas pessoas de jaleco e uma mulher grande. Enquanto observava à minha volta, fiz o que as pessoas gordas tendem a fazer quando estão perto de mais pessoas gordas – eu comparei o meu tamanho ao deles. Eu era maior do que cinco pessoas, menor do que duas. Pelo menos foi o que eu disse a mim mesma. Por 270 dólares, eu passei boa parte do meu dia ouvindo sobre os benefícios de ter a anatomia drasticamente reduzida para perder peso. Segundo os médicos, essa era ‘a única terapia eficaz para a obesidade’. Eles eram médicos. Supostamente deviam saber o que era melhor pra mim. Eu queria acreditar neles. (...) Era um cenário de boas e más notícias. As más: nossa vida e nosso corpo jamais seriam os mesmos. As boas: seríamos magros. Perderíamos 75% do excesso de peso ao longo do primeiro ano. Ficaríamos quase normais.” No livro “Fome – Uma Autobiografia do (meu) Corpo”, a autora americana Roxane Gay relata sua luta pessoal para entender e aceitar o próprio corpo. Vítima de violência sexual aos 12 anos, Roxane passou a comer compulsivamente para afastar os homens de si, como ela explica em outro trecho da obra: “Mesmo sendo tão jovem, eu compreendia que ser gorda era ser indesejável para os homens, ter o desprezo deles”. Como pontua a autora, a relação peso x beleza é uma construção antiga. Seja na mídia, no cinema, na música ou na indústria dos cosméticos, o padrão imposto à sociedade reforça o estereótipo de que pessoas bonitas e bem-sucedidas são magras e sem imperfeições corporais. Essas imposições não refletem a realidade. De acordo com

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o Ministério da Saúde, no Brasil, o índice de obesos entre pessoas acima dos 18 anos chega a 18%, o que corresponde a mais de 37 milhões de brasileiros. No mundo, estima-se que há 700 milhões de obesos, como revelou um estudo global conduzido pelo Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde da Universidade de Washington, nos Estados Unidos. Doença crônica metabólica, a obesidade é apontada pela Organização Mundial da Saúde como um dos maiores problemas de saúde pública do mundo. “A doença é caracterizada pelo excesso de gordura. A origem da obesidade é complexa e multifatorial, resultando da interação de genes, ambiente, estilo de vida e fatores emocionais”, explica Gislaine Engelmann, nutricionista clínica do Hospital Dona Helena. Segundo a nutricionista, os aspectos genéticos desempenham papel importante no aumento de peso, porém são os ambientais e de estilo de vida que favorecem o surgimento da obesidade: “Várias fases da vida podem influenciar, como a fase intrauterina, o peso de nascimento, a amamentação, o desenvolvimento da infância e a fase puberal. O ganho de peso excessivo durante a gestação e a falta de perda de peso após


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Atividade física e acompanhamento nutricional auxiliam na manutenção do peso após a realização da cirurgia o parto são importantes indicadores da obesidade em longo prazo. Especificamente, a obesidade materna e o diabetes gestacional podem promover as mesmas condições nas gerações seguintes”, ressalta. O histórico familiar também contribui para o risco de obesidade. Quando nenhum dos pais é obeso, por exemplo, a margem fica em 9%. Se um dos progenitores tem sobrepeso ou obesidade, o número sobe para 50%. Se os dois são, chega a 80%. “O paciente com essa carga genética, no início da vida, precisa tomar medidas de controle, como atividades físicas e cuidado com a alimentação”, destaca Gislaine. Na prática, a obesidade se soma como um fator a mais para o desenvolvimento de doenças crônicas e incapacitantes. As consequências para a saúde vão desde condições que afetam a qualidade de vida, tais como a osteoartrite, dificuldades respiratórias, problemas musculoesqueléticos, problemas de pele e infertilidade, até as mais graves, como doença coronariana, diabetes tipo 2, hipertensão arterial e certos tipos de câncer.

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Para evitá-las, é necessário fazer acompanhamento médico e nutricional: “As consultas com o nutricionista têm como objetivo identificar o que está favorecendo o ganho excessivo de peso e, com base nessas informações, determinar mudanças de hábitos alimentares. Essas mudanças devem ser realizadas de forma gradativa, sempre em acordo com o paciente. Durante todo o tratamento, é indispensável o acompanhamento com uma equipe multidisciplinar e, principalmente, um psicólogo”. Quanto o tratamento não apresenta resultados, o último recurso é recorrer à cirurgia bariátrica. O médico Felipe Koleski, cirurgião bariátrico e atual presidente do capítulo de Santa Catarina da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), explica que o procedimento é autorizado quando a obesidade está estabelecida há cinco anos: “O paciente deve apresentar o Índice de Massa Corporal acima de 35 e comprovar a tentativa de tratamento clínico sem resultados de, no mínimo, dois anos. Pessoas com limitação intelectual significativa, sem suporte familiar adequado, com transtornos psiquiátricos não controlados – incluindo uso contínuo de álcool ou drogas ilícitas – ou doenças genéticas não podem fazer a cirurgia”. De acordo com um levantamento realizado pela SBCBM, exatas 100.512 pessoas fizeram a cirurgia bariátrica no Brasil, em 2016. O número supera em cerca de 7 mil procedimentos as 93,5 mil cirurgias realizadas no ano anterior. Para o presidente da Sociedade, Caetano Marchesini, o aumento pode estar relacionado ao incremento da obesidade no Brasil e com as novas regras do Conselho Federal de Medicina para autorização do


“O paciente precisa ter noção de que jamais receberá alta. Ele fará o acompanhamento médico eternamente” Felipe Koleski, cirurgião bariátrico procedimento: o órgão ampliou de seis para 21 o número de doenças associadas à obesidade que podem levar à indicação dessa cirurgia. “A obesidade já é tratada como o mal do século por especialistas no mundo todo e a cirurgia bariátrica contribui para o controle ou remissão de diversas doenças associadas a ela”, enfatiza Marchesini. O médico Felipe Koleski informa que, no Brasil, existem dois tipos de cirurgia bariátrica: restritivas e disabsortivas. “As restritivas diminuem a quantidade de alimentos que o estômago é capaz de receber e induzem a sensação de saciedade precoce. Já as disabsortivas alteram drasticamente a absorção dos alimentos no intestino delgado, mas não o tamanho do estômago. São conhecidas como cirurgias de by-pass intestinal ou de desvio intestinal”, esclarece. Segundo ele, ambas têm a mesma efetividade na manutenção da perda de peso, mas a “by-pass” é mais indicada para pacientes portadores de diabetes, colesterol alto e triglicerídeo: “A escolha do procedimento é feita pelo cirurgião, que analisa o paciente e o quadro clínico”. Assim que a decisão pela cirurgia bariátrica é tomada, o paciente deve passar por uma série de exames, como endoscopia digestiva, ultrassom abdominal e exames laboratoriais. Além de se consultar com alguns profissionais obrigatórios: cirurgião, cardiologista, psiquiatra, psicólogo e nutricionista. Nessa fase, também é exigido o preenchimento do consentimento informado, no qual o paciente reconhece estar ciente sobre os benefícios e riscos da cirurgia. “O preparo pré-operatório

otimiza a segurança e os resultados. Pedimos ao paciente que se esforce para perder um pouco de peso antes da cirurgia, pois alguns quilos a menos podem oferecer melhores condições à anestesia geral e à operação”, observa Felipe. O processo pós-cirúrgico é tão complicado quanto a preparação. O período de internação para recuperação é de 48 horas e a pessoa pode voltar às atividades rotineiras em 15 dias: “O paciente precisa ter noção de que jamais receberá alta. Ele fará o acompanhamento médico eternamente”. A nutricionista Gislaine frisa que, após a operação, os cuidados alimentares devem ser redobrados, especialmente durante o período da dieta líquida. Segundo ela, o profissional que acompanha o paciente deve prevenir carências nutricionais que podem surgir. “É comum os pacientes apresentarem síndrome de dumping, que consiste na passagem rápida de alimentos do estômago para o intestino delgado, de alimentos com alta concentração de gordura e açúcar. Além disso, alguns pacientes podem desenvolver intolerância à lactose, assim como a dificuldade no consumo de alguns alimentos como pão, arroz, embutidos e alimentos com açúcares”, afirma. Também é preciso educar os pacientes sobre as quantidades a ser consumidas, para que não haja novos ganhos de peso com o passar do tempo, como recomenda o médico Felipe: “Eles acabam descuidando da alimentação. Por isso, o acompanhamento da equipe é tão importante. A cirurgia é o pontapé inicial. Caso não usem adequadamente a ferramenta, podem voltar ao peso – processo conhecido na área médica como recidiva da obesidade”.

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Crianças do CEI Espaço da Criança, de Joinville, colhem as frutas e verduras plantadas na instituição

Natureza

Seja o seu próprio jardim

J

á ganhou aval científico a compreensão de que estar em contato com a natureza pode aumentar a expectativa de vida, melhorar a saúde e evitar doenças. É isso que afirma um estudo realizado pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. A pesquisa aponta que mulheres moradoras de áreas com bastante vegetação têm 34% menos chances de morrer por doenças respiratórias e 13% menos riscos de mortalidade por câncer. De forma geral, a taxa de letalidade diminui em 12%. O estudo analisou informações médicas sobre mais de 100 mil mulheres, entre 2000 e 2008. O índice de mortalidade foi comparado com o nível de vegetação ao redor das casas. Outros fatores, como idade, padrão socioeconômico, tabagismo e etnia, também foram considerados. Peter James, pesquisador associado de Harvard, resume as conclusões: “Ficamos surpresos ao observar que, com o aumento de exposição às verduras, a mortalidade se reduziu”. De acordo com os responsáveis pelo experimento, a descoberta deve incentivar o planejamento urbano a incorporar maior espaço para as plantas. Mas não é preciso esperar pelos órgãos públicos para se ter contato com o verde. Em casa ou apartamento, quando a pessoa gosta de plantas, ela cultiva nem que seja em um vasinho. E é nessa atividade cotidiana que se estabelece uma rotina de cuidados e atenção, como afirma Kethe de Oliveira Souza, psicóloga do Hospital Dona Helena: “As relações fazem parte da existência humana. Sendo a natureza algo que nos rodeia o tempo todo, acredito que são diversos os benefícios, como a possibilidade de reflexão durante uma caminhada em parques, praia ou até mesmo nas vias urbanas”. Os resultados, de acordo com ela, vão depender de cada indivíduo. “A atividade proporcionará diferentes sensações e benefícios. Se possibilitarmos isso desde cedo, já na infância, a disciplina e a responsabilidade podem ser acentuadas”, observa. No CEI Espaço

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da Criança, localizado no bairro Adhemar Garcia, em Joinville, esses valores são estimulados desde o berçário. E as atividades já foram reconhecidas pelo Concurso de Jardim, promovido pela Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult), em parceria com a Secretaria do Meio Ambiente (Sema). O CEI ficou em primeiro lugar no ano passado, na categoria Jardim Escolar. “O movimento começou com uma oficina em que as famílias plantaram girassóis em nosso pátio. Como ficou muito bonito, tentamos a sorte e nos inscrevemos”, explica Neide Novais Brant, diretora do CEI. O Concurso de Jardim é uma tradicional atração da Festa das Flores e homenageia os mais belos espaços residenciais, escolares, públicos e comerciais do município. “Com o resultado, ganhamos uma roçadeira, um kit de ferramentas de jardinagem, troféu e certificado. Deixamos os materiais expostos e os alunos puderam tirar fotos com as famílias que participaram”, conta. Com 440 crianças matriculadas, divididas em 20 turmas, a unidade trabalha diariamente questões como o plantio de flores e alimentos. O CEI é uma das instituições participantes do projeto Escola e Flor, promovido pelo Núcleo de Educação Ambiental (Neam) da Secretaria de Educação. Com a colaboração da Agremiação Joinvilense de Amadores de Orquídeas (Ajao), das empresas Agrícola da Ilha e Flora Neitzel, as escolas recebem mudas de flores ornamentais, lírios (hemerocallis) e orquídeas, além de suporte técnico para formação com educadores. “Hoje, com quintais de brita, não costumamos mais ter em casa um canteiro florido com joaninhas, abelhas, borboletas e beija-flores. Aqui, geramos essa aprendizagem de que um organismo precisa do outro e todos fazem parte da natureza”, observa a diretora.


O exemplo que vem da terra Em outra região de Joinville, situado no bairro Comasa, o CEI Espinheiros se propôs a trabalhar junto aos alunos a relação com o manguezal que cerca a instituição, buscando aproximar a comunidade desse ambiente. “Estamos em uma área que passou pelo processo de urbanização e aterro, após a instalação de famílias no entorno do mangue. Hoje, contamos com uma vasta área de preservação permanente”, destaca a diretora Maria Eli Rabethge dos Santos. Após a participação no Prêmio Embraco de Ecologia – iniciativa da empresa joinvilense voltada a capacitar escolas para atividades socioambientais –, o CEI construiu o chamado Barco Observatório: “A proposta surgiu da necessidade de ampliar a relação das crianças com o

ecossistema do manguezal. No percurso para conhecer melhor a comunidade, entender seu passado e pensar em ações sustentáveis, descobrimos o quão significativa é, para as famílias, a atividade de pesca. Para muitas, uma tradição e fonte de renda. ” Neide Brant, diretora do CEI Espaço da Criança, ratifica a importância do contato com a natureza para a garotada: “Temos quatro hortas pedagógicas, além do jardim. No início de cada ano, as turmas escolhem os espaços e o que será plantado. As professoras podem envolver as disciplinas com as atividades na horta. A natureza, em si, é viva e motiva a criança a aprender”. Exemplo disso, reforça a diretora, se dá quando as professoras propõem um paralelo do cuidado que é preciso dedicar às plantas com aquele que é devido aos colegas. Ela observa que sentimentos como felicidade e frustração são trabalhados na sala de aula. “Quando a criança vê que a planta ficou bonita, florida, é uma ‘emoção feliz’. Mas também vai trabalhar com decepção, porque pode plantar a flor e não nascer, ou nascer e morrer”, pondera. De acordo com a diretora, as crianças conseguem concretizar sentimentos abstratos em relação à natureza em simples

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atos como mexer nas pedras e pisar em folhas secas. Isso tudo fica ainda mais evidente para quem mora em edifícios e tem pouca oportunidade de estabelecer esse tipo de contato. “As crianças de hoje estão muito focadas em aparatos tecnológicos. Aqui elas se deparam com folhas, flores, cores e cheiros. Há crianças que acreditam que não é possível ter horta em apartamento, por exemplo. E as professoras apresentam algumas alternativas, como floreiras e vasos”, frisa. Todos os anos, mais de 100 novas crianças são matriculadas no CEI. Algumas começam já no berçário a pôr as mãos na terra. “Elas até provam. Por isso temos cuidado com algumas plantas que liberam toxinas”, esclarece Neide. O reflexo dessa entusiasmada aproximação é percebido na hora da colheita da horta. Crianças que não comiam determinados alimentos passam a apreciá-los, por ter ajudado a plantá-los: “Eles vão até a cozinheira sorrindo com a bacia cheia de coisas que plantaram. E comem com uma vontade ainda maior”. Tanto a horta quanto o jardim são mantidos com adubo orgânico, sem agrotóxicos. A alface e o tomate cereja, por exemplo, são colhidos pelas próprias crianças e logo consumidos. “Quando a proposta da horta e do jardim chegaram, pensamos que as crianças iriam arrancar ou pisar nas plantas. Tivemos umas experiências frustradas no meio do caminho, mas elas já se acostumaram com os espaços”, conta. “Tentamos resgatar alguns valores com eles. Ressaltamos que as flores precisam de cuidado, respeito e dedicação. Valores que o próprio homem deixou de lado. Você traz a pessoa para a convivência em um grande grupo e ela não respeita o outro,

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FOTO: DANIEL MACHADO

não sabe dialogar”, frisa a diretora. “Nosso foco são as relações. Se nossos alunos tiverem uma boa base de relacionamento, o conhecimento será adquirido naturalmente”, defende Neide.

“Procuramos resgatar valores com as crianças, ressaltando, por exemplo, a importância do cuidado, respeito e dedicação” Neide Brant, diretora do CEI Espaço da Criança, de Joinville


À esquerda, os alunos do CEI Espinheiros se divertem no Barco Observatório. Acima, os integrantes da Fitorama posam com os terrários

Transformando cuidado em negócio Quem mora em apartamento sabe que encontrar espaços para cultivar uma horta pode ser difícil. Uma alternativa econômica, fácil de viabilizar e que deixa o ambiente charmoso são os chamados terrários. Em Joinville, há empresas especializadas na construção desses minijardins. “Quando estávamos montando nossa casa, sentimos a necessidade de plantas diferentes, algo prático que não precisasse de muita manutenção, fosse bonito e com a nossa personalidade. Fizemos alguns terrários e percebemos a oportunidade de desenvolver um negócio”, explica Luiz Fernando Nunes, fundador da Fitorama. Práticos, bonitos e resistentes, os minijardins são perfeitos para quem tem pouco tempo para dedicar às plantas e não abre mão do convívio com a natureza. “Vivemos em uma época de redução de danos ao ecossistema e diminuição dos espaços residenciais. Os terrários surgem como alternativa por serem de tamanho reduzido e ‘ecofriendly’, já que utilizamos vidros e garrafas recicladas”, conta Cleber Leite, parceiro de Luiz na empreitada. Os dois observam que, se colocados em lugar apropriado, os jardins podem ficar anos sem receber água. “Sem dúvida, o contato com a natureza é essencial para a saúde física e mental. Amamos as plantas e os animais, temos um gato e uma horta em casa, onde plantamos temperos, morangos e um pé de pitanga. Quando estamos lidando com as plantas, esquecemos os problemas, é relaxante. Também gostamos de sentar, olhando para a horta, e apreciar seu desenvolvimento”, revela Cleber.

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Meditação

Os benefícios de uma prática terapêutica milenar

A

o destrinchar a palavra “meditação”, criamos uma frase: “Me dita a ação”. Exatamente o que deve ser questionado ao praticá-la. “Quando a mente se acalma, é só fazer a pergunta ao nosso guru ou deus interno que ele tem todas as respostas”, indica Dircelene Pscheidt, psicóloga há 15 anos e instrutora de yoga desde 2011. Voltada à concentração mental, a meditação é uma das práticas que, recentemente, passaram a fazer parte da tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), na categoria “ações de promoção e prevenção à saúde”. De acordo com Felipe Reis, neurologista do Serviço de Neurologia do Hospital Dona Helena, a ciência vem evoluindo muito na última década sobre o estudo dos efeitos das chamadas “terapias de relaxamento” ou “reação ao relaxamento”. “Essa reação, contraposta pela ‘reação ao estresse’, pode ser alcançada de várias formas, que incluem meditação, yoga ou mesmo pela oração”, explica, apontando que o conhecimento disponível sobre o tema é, em geral, animador, apesar de apontar a falta de estudos robustos sobre efeitos a longo prazo. “Por outro lado, já existem indícios de que a meditação pode prevenir atrofia e degeneração cerebral difusa ao longo dos anos de prática, e de que esses efeitos sobre os circuitos cerebrais e sobre a plasticidade neuronal podem ocorrer nas primeiras sessões, resultando possivelmente em melhora da ansiedade, sintomas depressivos, relacionamento interpessoal, produtividade no trabalho, raciocínio lógico e atenção, manejo da dor, controle do peso e qualidade do sono, além da disposição física”, observa o neurologista. Segundo a instrutora Dircelene, meditar é “treinar a mente para estar no momento presente”. “A maior parte do tempo, a gente não está. O estado ‘normal’ das pessoas é meio robótico e automático, às vezes parecendo um zumbi”, sublinha. Mais conhecida como Dibi, ela é instrutora do grupo de meditação da

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As terapias de relaxamento podem auxiliar como coadjuvantes no tratamento de várias doenças, como depressão, ansiedade, estresse póstraumático e dores crônicas

Câmara de Vereadores de Joinville, que se encontra semanalmente, às terças-feiras, a partir das 13h, para uma prática de 15 minutos. O projeto foi encabeçado pelo setor de comunicação da Câmara. A turma é formada, em média, por dez pessoas que trabalham no local. “Na maioria das vezes, conseguimos respirar com mais qualidade e acalmar o fluxo mental. O que mais se fala é sobre o sentimento de paz que o momento proporciona”, aponta. Dibi é proprietária, junto com o marido, da Yoga na Terra Pura – Saúde Integral, onde ministra aulas de yoga até para


“A meditação envolve um processo de aceitação. É deixar que os pensamentos venham à sua mente, mas que você não dê importância a eles” Jorge Luiz Hoffmann, da Sãdhana

gestantes. Segundo ela, essencialmente, o objetivo principal do yoga é preparar o corpo e a mente para meditar. “O yoga fortalece o corpo, principalmente a coluna, para ficar sempre ereta, fluir bem a energia, e treina a mente para diminuir o fluxo mental”, explica. “Acaba se transformando num diluidor de tensões do corpo”, afirma Jorge Luiz Hoffmann, que, junto com a esposa Lucinaide, criou a Sãdhana em 2012, para oferecer aulas de yoga e terapias como meditação. “A meditação envolve um processo de aceitação. É você deixar que os pensamentos venham à sua mente, mas que você não dê importância para eles, deixando-os passar”, descreve Jorge. Dibi também é adepta dessa linha de pensamento: “A ideia é observar, como se você se colocasse fora de si e se assistisse em uma tela. O desafio é não embarcar no pensamento, só deixar passar, como um trem. Não entrar em um vagão e ir junto com ele”, esclarece. De acordo com Jorge, meditar pode levar ao esvaziamento da mente, ao “estado búdico”, fato que ocorre com os mestres da prática, que dedicam suas vidas para encontrar “um estado de pureza mental”. Porém, para os iniciantes, é “quase impossível” esse esvaziamento, o que faz com que muitas pessoas desistam. “Aprendemos a perceber os pensamentos, não alimentá-los, e nos acostumamos a soltá-los. Descobrimos, assim, que não

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À direita, Dircelene Pscheidt, psicóloga e instrutora de yoga desde 2011. Na outra página, o casal Rafaela Machado Schmitz, analista de projetos, e Jonatha Moreno Schmitz, analista de sistemas, integrantes do Capítulo Rosacruz Joinville

precisamos seguir os pensamentos e, muito menos, nos fixar neles”, frisa Rafael Longo, engenheiro civil, professor de matemática e instrutor de meditação no Centro de Estudos Budistas Bodisatva (CEBB), praticante há seis anos. No CEEB, ele adota uma linha de meditação denominada “Shamantha”, palavra em sânscrito que pode ser traduzida como “calmo permanecer”. “Existe um roteiro sugerido no qual percorremos 21 itens que envolvem outros tipos de meditação. Seguimos uma linha definida pelo nosso professor, Lama Padma Samten, que foi ordenado por Chagdud Tulku Rinpoche, grande mestre da escola Nyingma do Budismo tibetano”, esclarece o instrutor. Já a terapeuta holística Sindy Moraes Casteli não segue uma linha específica nos grupos de meditação empresarial que ministra: ela emprega as técnicas que considera “importantes e possíveis de transformação”. A proposta da meditação empresarial visa reduzir a ansiedade e estresse, criar laços entre a equipe, aumentar o foco do trabalho e, consequentemente, a produtividade. “É uma meditação para trazer alta performance nos negócios. O objetivo é buscar o controle interno, a paz interior, por meio de práticas de poder pessoal e de equilíbrio emocional. Isso vai se refletir em bem-estar e em ganhos para a empresa”, explica a profissional. Existem mais de 500 tipos de meditação (hindu, zen budista, zazen, transcendental, cristã etc.) e diversas técnicas para chegar ao que, basicamente, todas buscam: autoconhecimento e serenidade. Jorge, da Sãdhana, aponta que há diversas técnicas para entrar em um estado meditativo: “Ler, ouvir música, cozinhar, tocar um instrumento...”. (Na página 36, leia artigo sobre uma dessas práticas conduzida com idosos na Associação Beneficente Evangélica de Joinville – Abej.)

Um resgate ao Antigo Egito Marínea Maria Fediuk é mestre do Capítulo Rosacruz Joinville, afiliado à Antiga e Mística Ordem Ro-

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sae Crucis, popularmente conhecida como Amorc, uma organização internacional de caráter místicofilosófico que tem por missão despertar o potencial interior do ser humano, auxiliando-o em seu desenvolvimento, em espírito de fraternidade, e respeitando a liberdade individual. “A Amorc visa perpetuar os conhecimentos dos iniciados das Escolas de Mistério do Antigo Egito e promover a evolução da humanidade por meio do aperfeiçoamento das potencialidades de cada um. Ajudamos as pessoas no autoconhecimento, na busca do aprimoramento dos talentos de forma harmoniosa, para alcançar saúde, felicidade e paz”, explica Marínea. Dentro do Capítulo Rosacruz, há atividades abertas para a comunidade, incluindo momentos de meditação, às terças-feiras, às 19h. “Esse tipo de meditação, baseada nos conhecimentos das Escolas de Mistério do Antigo Egito, difere da oriental, até por causa da postura adotada. As pessoas ficam sentadas, de forma ereta, com as mãos nas coxas, uma posição tranquila”, destaca Marínea. Primeiro, trabalha-se na percepção da respiração, depois o grupo escuta os chamados sons vocálicos, conhecimento que auxilia na harmonização e no relaxamento do corpo. Só então é que se medita e os participantes são guiados para pensamentos de paz, amor e serenidade. “Normalmente, terminamos com a leitura de um texto sobre a Rosacruz, sobre algum conceito dentro da ordem, de paz, coletividade, bondade ou gentileza, por exemplo.”


cios que pude perceber foi o controle ou ausência das crises de asma. Desde que aprendi a respirar, nunca mais precisei usar a bombinha”, revela. Jonatha dificilmente fica nervoso por qualquer motivo. “As pessoas no trabalho brincam que não conseguem me imaginar bravo. Antes eu me irritava com algumas coisas e, mesmo não transparecendo, esse comportamento acabava me fazendo mal”, analisa. Marínea, mestre do Capítulo Rosacruz Joinville e há 22 anos membro da Amorc, ressalta que os frequentadores da ordem praticam meditação constantemente. “A meditação me permite o olhar para eu mesma, serenar da minha mente e domínio sobre os meus pensamentos. Hoje, consigo escolher o que quero alimentar na minha mente. Tenho maior autonomia e assertividade em relação aos pensamentos e sentimentos.”

Rafaela Machado Schmitz, analista de projetos, e Jonatha Moreno Schmitz, analista de sistemas, conheceram a Ordem Rosacruz há cinco anos, e desde então meditam com frequência: cerca de duas horas semanais dedicadas à prática. O casal costuma comparecer aos encontros semanais e geralmente medita todos os dias na cama, pouco antes de dormir. “Tento praticar em casa sempre que me sinto carregado devido às tarefas do dia a dia, isso me ajuda a diminuir o ritmo e a direcionar a atenção ao que precisa ser feito”, observa Jonatha. Para ele, é como se tivesse acabado de acordar de uma boa noite de sono: “A sensação é de relaxamento profundo, de recarregar as energias, e percebo, principalmente, uma diminuição muito grande no estresse”. Rafaela enxerga a meditação como exercício: quanto mais se pratica, mais fácil se consegue relaxar e, consequentemente, usufruir dos seus benefícios. “Plenitude, serenidade tomam o lugar do comportamento de estresse”, aponta. “Quando você presta atenção no ritmo, desenvolve um processo de autoconhecimento. De corpo, mente e espírito. Um dos principais benefí-

Benefícios da prática

Depois que começou a meditar, Rafael, da CEEB, ficou mais calmo, paciente, menos ciumento – e, segundo seu filho, “menos chato”. “Eu era hipertenso, tomava remédio todo dia. Não preciso mais do remédio”, revela. Dibi também se vê como uma pessoa totalmente diferente. “Meditação não tem nada a ver com religião, mas desperta a espiritualidade. No sentido de querer estar bem e olhar para o outro com mais amor e querer que o outro também esteja melhor. Até no meu escritório, como psicóloga, vejo o quanto me ajuda, porque tenho uma intenção verdadeira e genuína de querer que o outro fique melhor. Quando medito, sinto como se o dia se encaixasse como uma luva na minha mão.”

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“Terapias de relaxamento podem auxiliar como coadjuvantes no tratamento de várias doenças” Felipe Reis, neurologista do Serviço de Neurologia do Hospital Dona Helena

Em vista dos múltiplos benefícios demonstrados até agora nos estudos publicados, Felipe, neurologista do Dona Helena, entende que as terapias de relaxamento podem auxiliar como coadjuvantes no tratamento de várias doenças, como depressão, ansiedade, estresse pós-traumático, transtornos alimentares e obesidade, adicção a álcool e outras drogas, doenças auto-imunes, dores crônicas, distúrbios da atenção e da concentração, insônia, assim como na reabilitação de AVC e traumatismo craniano. Estudo publicado na Psychosomatic Medicine aponta que a meditação reduz em cerca de 50% a utilização de serviços médicos. A American Heart Association recomenda a prática para reduzir até 48% os acidentes vasculares cerebrais (AVCs) ou o risco de enfarte agudo do miocárdio. O neurologista recomenda a meditação como terapia alternativa complementar, principalmente quando não se tem uma resposta otimizada com as terapias ditas tradicionais. “Nessas situações, o yoga, a meditação, a acupuntura, o Reiki, a oração, a religiosidade, a homeopatia e terapias integrativas podem ser um auxílio a mais. Cada um responde de uma forma particular a essas abordagens, motivo pelo qual há uma grande dificuldade de os estudos provarem um benefício inquestionável.” O médico observa que os melhores e mais recentes estudos disponíveis mostram uma associação significativa entre meditação e uma pequena melhora da dor crônica. Segundo Marínea, da Rosacruz, as pessoas que participam das meditações com mais frequência relatam que se sentem mais tranquilas. Chegam agitadas e preocupadas, e no período de meditação conseguem sair do mal-estar. Segundo ela, aqueles que persistem e meditam com frequência, notam uma melhora na qualidade de vida e nos relacionamentos. “Os pensamentos ficam mais claros, há um maior equilíbrio no humor e em como se lida com as emoções”, complementa. “À medida que fazemos meditação e conseguimos colocar o ser nesse equilíbrio e harmonia, ajudamos o sistema orgânico a funcionar melhor”, explica. O aspecto espiritual, observa, é a ponta final do ganho da meditação: “Antes disso, o praticante vai ter um ganho em nível orgânico da saúde, uma capacidade maior de equilíbrio emocional, perceber a vida com mais clareza e amorosidade”.

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Como tornar um hábito Coloque como prioridade e conheça seus limites O primeiro passo é o acolhimento, “sabendo que não se aprende a meditar de uma hora para outra, é um processo”, ressalta a terapeuta holística Sindy. Rafael, do CEEB, diz que o principal ponto para tornar a meditação um hábito é dar vazão aos motivos pelos quais se está meditando. “Lembrar, por exemplo, da quantidade imensa de vezes em que fui arrastado por pensamentos e emoções e não tive como relaxar. Lembrar da quantidade de pessoas que, meditando, conseguiram superar a raiva, a carência, a inveja, o apego, o orgulho”, explica. Tenha autodisciplina e seja persistente Para Dibi, é preciso disciplina. “Você pode começar com um minuto. Achou tranquilo, passa para três ou cinco.” A ideia é que seja no mínimo um minuto por dia. O horário mais indicado é pela manhã, antes de começar tudo e após a higiene básica. Para tornar um hábito, Marínea diz que é importante praticar diariamente. “O primeiro passo para chegar à meditação plena é o desejo. O segundo, a persistência”, ressalta. Eleja um lugar para meditar “Para começar a meditar, é preciso encontrar um lugar em que a pessoa possa se sentir em paz. É um link poderosíssimo”, indica Jorge, mencionando que a contemplação também é uma forma de meditação. “Se você não está na natureza, pode trazer a natureza


Estudos recentes disponíveis atestam uma associação entre meditação e melhora da dor crônica

para si. Pode colocar um vaso com uma flor ou planta em casa, acender uma vela ou um incenso... Muitas coisas favorecem a criação desse espaço”, aponta. Para ele, a meditação tem que estar ligada a um fator lúdico e ser uma atividade que desperte prazer. Faça alongamento e aprenda a respirar corretamente “No yoga, o ideal é primeiro fazer a prática física, liberar hormônios que causam bem-estar, soltar o corpo, aquecer, alongar. Fazer um alongamento, uma soltura das articulações básicas antes de meditar”, indica Dibi. “Não precisa sentar com a postura tradicional, com as pernas encostadas no chão, porque isso requer preparo, abertura de quadril, fortalecimento de coluna, se não a pessoa não aguenta. Pode-se sentar numa cadeira, com os pés no chão, ou no chão com as pernas esticadas. Sempre com a coluna reta – é na coluna que corre o nosso maior fluxo de energia”, ensina. O foco do iniciante é corrigir a respiração. “Não percebemos como respiramos mal. Se você tiver oportunidade de observar um bebê respirando, é isso: parece um sapo, a barriga se expande e a respiração é bem grande”, exemplifica a instrutora. Tenha orientação profissional O neurologista Felipe Reis ressalta que a meditação bem-feita exige regularidade e orientação profissional. “As meditações guiadas ocorrem quando a pessoa está iniciando, para que entenda o que fazer durante a prática. À medida que isso fica claro, é melhor não depender de alguém guiando a meditação. Aí podemos meditar em silêncio, sozinhos ou em grupo”, comenta Rafael. “O guia ajuda a aprender a meditar em casa, no trabalho, com a fa-

mília, em qualquer momento da vida, antes de dormir, depois de acordar, enfim, passa a ser um ritual, como acordar e escovar os dentes”, completa Sindy. Faça parte de um grupo Ter pessoas que meditam há mais tempo como parceiros é um dos caminhos. “Mais do que ter instrutor, vejo a importância de você estar em grupo, a energia e força de um grupo. É meio mágico. Ouvir a experiência do outro fortalece”, observa Dibi. “A meditação em grupo cria um campo poderoso”, observa Jorge. Use a tecnologia a seu favor Rafaela, da Amorc, lembra que há aplicativos de celular que auxiliam como guia para quem deseja meditar em casa. Alguns exemplos são os apps Medite.se, Headspace e Insight Timer, que oferecem módulos iniciais e avançados para os meditantes, com áudios, podcasts e vídeos para facilitar o aprendizado. Tenha outros hábitos saudáveis Mudar o estilo de vida e adotar outros hábitos saudáveis também ajuda. Sindy aponta que algumas pessoas notam mudanças desde o primeiro momento de meditação e outras, pela rotina adotada, acabam tendo que ter mais prática para observar os benefícios. “É necessário manter um hábito, assim como a mudança de alimentação e busca por uma qualidade de vida melhor. Não adianta adotar apenas um evento, é preciso um processo interno de transformação.”

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Diálogos

Ética preventiva

Atividade física

Pág. 33

Facioli Rosa

Carlos José Serapião

Ansiedade

Kethe de Oliveira Souza

Daniel Figueiredo

Pág. 37

Pág. 35

Atividades manuais

Adriana Krüger Pág. 34

Qualidade de vida na terceira idade Fabiana Domeciano Pág. 36

Microbiota intestinal

Gislaine Engelmann Pág. 38

Vacinação Paula Cristina

Gern Mendivil

Entrevista

Pág. 39

Maria Manuela Pinto Carneiro Alves dos Santos Pág. 40

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Carlos José Serapião Coordenador do Instituto Dona Helena de Ensino

“Ética e qualidade formam partes indissociáveis no exercício dos profissionais”

e Pesquisa (IDHEP)

Razões para uma ética preventiva

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termo ética preventiva, usado pela primeira vez na literatura mundial em 1993 (*), foi criado para descrever “a reflexão crítica sobre os fatores institucionais que influenciam os cuidados com os pacientes”. Desde então, tem sido adotado em uma variedade de contextos que enfatizam todo um pensamento ético e representa um componente fundamental na condução para a mais alta qualidade das ações relacionadas com a atenção à saúde. Assim, ética e qualidade formam partes indissociáveis no exercício dos profissionais atuantes nas instituições de saúde. O foco central da ética preventiva é reduzir as variações indesejáveis, ao mesmo tempo que implementar a qualidade ética (eticidade) dentro de uma instituição, por meio de mecanismos e processos capazes de mensurar essa implementação; identificando, priorizando e abordando os eventuais desvios éticos de maneira sistêmica e relevante. Considerado nesse nível de sistemas e processos, um desvio na qualidade ética bem poderia ser reconhecido como a diferença entre aquilo que é feito (uma prática ética corrente) “versus” aquilo que deveria ser feito (melhores práticas éticas). Estas últimas entendidas como práticas ideais, estabelecidas com base em padrões larga-

mente aceitos, normas, ou ações que atendam às expectativas da instituição e seus componentes humanos. Entre as iniciativas capazes de justificar a implantação da cultura de ética preventiva nas instituições de saúde, podem ser citadas: 1. É necessária, uma vez que as consultas éticas que se situam em nível organizacional são, quase sempre, reativas ao acontecimento e se relacionam com um dilema específico. As iniciativas de abordar de maneira sistêmica os obstáculos apresentados à melhor prática ética permitiriam desenvolver um procedimento proativo. 2. É fortemente influenciada pelos processos e sistemas estabelecidos, os quais devem refletir a preocupação de torná-la reflexiva e inevitável. 3. Há crescente propósito de que as práticas éticas nos cuidados em saúde possam ser operacionalizadas, medidas e continuamente implementadas. A qualidade da ética é intrincada com a qualidade dos cuidados em saúde. Entretanto, frequentemente, a ética é minimizada quando das ações ou decisões realizadas pelos profissionais de saúde, administrativos e outros membros dos quadros de colaboradores, permitindo o surgimento de falhas na qualidade ética da instituição. A ética preventiva oferece um método inovador e instrumentos para implementar essa qualidade pela identificação das causas que levam as melhores práticas a estar distantes das práticas correntes, criando estratégias capazes de aproximá-las, identificando, priorizando e abordando-as de modo sistêmico. Embora existam virtualmente ilimitadas fontes de potenciais dilemas éticos dentro das instituições, as comissões ou grupos organizados de consultas éticas, devem continuar sendo um instrumento importante na sua identificação para a subsequente abordagem por intermédio dos processos de aprimoramento ético. Tendo sido reconhecida há quase duas décadas, a ética preventiva permanece ainda carente, sendo indispensável desenvolvê-la em nível conceitual e prático, integrando-a ao dia a dia operacional das instituições de saúde. * Forrow L, Arnold RM, Parker LS. Preventive ethics: Expanding the horizons of clinical ethics. Clin Ethics. 1993 4(4):287-94

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Adriana Krüger

Psicóloga, especialista em psicologia clínica, terapeuta em EMDR

Benefícios das atividades manuais para a saúde mental

O

homem moderno vive num estado reduzido de energia. Parece que perdeu sua espontaneidade e sua capacidade de sentir e de se expressar criativamente. Ao adoecer, seu foco passa a ser a negação ou a medicalização, deixando de buscar outras possibilidades, como a psicoterapia, que vai ajudá-lo a tratar o que gera seu sintoma, e os recursos terapêuticos – por exemplo, as atividades manuais, que podem auxiliá-lo em seu processo de recuperação. As atividades manuais, que não são “uma terapia” e sim um recurso terapêutico, podem ser consideradas um instrumento que busca viabilizar a expressão, a espontaneidade e o conhecimento das potencialidades e das limitações da pessoa que a pratica, enfatizando o seu bem-estar e a sua autoimagem. Muitas vezes, as doenças podem gerar uma significativa redução no desempenho físico e na habilidade motora, diminuindo a capacidade de concentração, reação e coordenação, podendo gerar a apatia, o isolamento social, rebaixamento da autoimagem, insegurança, redução da motivação e solidão. Falar das atividades manuais é falar da arte que permite ao ser humano liberar seus sentimentos e emoções, aumen-

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“O trabalho manual não é apenas um dispositivo para lidar com o estresse, para evitar o tédio ou economizar dinheiro”

tando a qualidade afetiva das relações interpessoais, pela melhora da comunicação, fortalecimento da autoimagem e redescoberta de potenciais criativos. Sair do conhecido, da rotina, é de suma importância para o indivíduo, doente ou não, e as atividades manuais podem ser um dos recursos para isso, pois, além de reduzirem o estresse e aumentarem a capacidade criativa, auxiliam o nosso cérebro, podendo reduzir o risco de comprometimento cognitivo leve. Na prática, os cinco sentidos são aguçados e as habilidades motoras são fortalecidas, especialmente nas mãos. Atividades manuais podem ser utilizadas com diversos públicos, infantil, adolescente, adultos e idosos. Com as crianças por exemplo, a utilização de argila, areia, água, tinta, estórias, gravuras, possibilita um espaço à expressão livre de suas fantasias e sentimentos, favorecendo-as a sair de sua solidão, experimentar seu potencial, na realização simbólica de seus desejos e na redução da ansiedade. Já no caso dos idosos, as atividades manuais fortalecem a autoimagem, por meio da concretização dos trabalhos, bem como a socialização, minimizando eventuais impactos decorrentes do envelhecimento e permitindo surgir habilidades artísticas e seu aprimoramento. É importante salientar que o trabalho manual não é apenas um dispositivo para lidar com o estresse, para evitar o tédio, ou para economizar dinheiro, mas nos ajuda a nos sentir melhor e a agir de forma mais assertiva no cotidiano. Resumindo, as atividades manuais nos beneficiam porque propiciam satisfação e relaxamento, nos predispõem a ter pensamentos e atitudes mais positivas, representam um desafio mental e conduzem à resolução de problemas, ampliam as conexões sociais, auxiliam na concentração, promovem o desenvolvimento da coordenação, percepção espacial e habilidades motoras finas, incentivam a imaginação e a criatividade, protegem a memória, propiciam o desenvolvimento de uma nova habilidade e servem como recurso terapêutico no tratamento para depressão ou estresse. Para se ter uma boa saúde mental, nem sempre os recursos são complexos ou onerosos. A vida não é feita somente de trabalho e metas. É preciso considerar que somos pessoas, que temos um corpo, emoções e que, se não cuidarmos também dessas áreas, podemos adoecer.


Daniel Figueiredo Facioli Rosa Ortopedista, especialista em cirurgia do joelho e trauma, pós-graduando em medicina esportiva

A atividade física regular e o exame pré-participação

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abemos da importância da atividade física na prevenção e tratamento de doenças variadas. Tem suma importância no tratamento da hipertensão, obesidade, diabetes, infarto, AVC , fibromialgia, artrites, reumatismos, distúrbios hormonais, depressão e até mesmo nos distúrbios do sono. Estudos científicos concluíram que a prática regular reduziu ou até retirou a necessidade do uso de medicações em hipertensos e diabéticos. Doenças ortopédicas como tendinites, lombalgias, hérnias de disco e artrose têm como tratamento fundamental a prática regular do fortalecimento muscular e alongamentos para tratamento das crises dolorosas incapacitantes previnem a evolução da doença. É evidente a maior propagação do esporte. Novas modalidades, como crossfit, MMA, corridas de rua ou montanha e provas de endurance, têm sido atrativos para a população. Observamos também muitos programas voltados para o bem-estar e saúde sendo veiculados. E tudo isso acaba sendo um grande estímulo para a atividade física. Cresce o acesso aos esportes que até então eram praticados apenas por atletas profissionais e que começam a ser

“O médico do esporte avalia o paciente para que ele não tenha riscos de doenças, lesões, infarto e até mesmo morte súbita”

praticados por amadores, pessoas normais, que têm seus trabalhos, rotinas e responsabilidades e que se envolvem em maratonas, provas longas de endurance, corridas de montanha e aventura, triathlon, fisioculturismo competitivo, escaladas em ambiente com extremos de condições climáticas etc. A questão central é até que ponto a atividade física pode ser benéfica para a saúde. Podemos praticar qualquer esporte? Todos trazem benefícios? Todo paciente que deseja iniciar uma atividade física regular, ou o paciente que já é atleta mas procura aumento na performance, deve procurar um médico para o chamado exame pré-participação. Por meio desse exame, podemos avaliar a atual condição física do paciente e decidir qual tipo e intensidade de atividade física é benéfica sem colocar risco à saúde. São utilizados exames específicos, conforme o objetivo do paciente, que varia desde a manutenção da saúde, tratamento de doença, ou competição. Tais exames são os laboratoriais (hemograma, glicemia, triglicérides, colesterol, exames hormonais etc.) e avaliação cardiopulmonar (eletrocardiograma, teste ergométrico, ergoespirometria etc.). Essa avaliação permite classificar o que é considerado leve, moderado ou intenso para o paciente. O médico especialista em esporte, médico do esporte, avalia o paciente e individualiza a prática esportiva para que ele tenha o maior benefício e não represente riscos de doenças, lesões, infarto e até mesmo morte súbita. Além de atuar na melhora da performance de quem busca evolução nos resultados pessoais ou no atleta profissional. A atuação multidisciplinar com o educador físico e nutricionista também é fundamental para a prática segura da atividade física. Não tenha dúvidas de que a prática da atividade física regular é sempre benéfica. E para qualquer pessoa, mesmo com limitações e doenças prévias. Mas a atividade sem orientação pode, sim, ser prejudicial. Portanto, o recado é: a atividade física deve ser adaptada à situação atual de cada paciente e devemos realizar exames pré-participação, além de buscar a orientação do educador físico para não colocar o paciente em riscos. Em resumo, pratique a atividade física, mas com segurança.

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Fabiana Domeciano Terapeuta ocupacional

Relaxamento e qualidade de vida na terceira idade

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Centro de Convivência do Idoso (CCI) da Associação Beneficente Evangélica de Joinville (Abej) promove atividades voltadas para a terceira idade pensando na qualidade de vida dos frequentadores. Um dos serviços prestados é a terapia ocupacional, que desenvolve atividades voltadas para a prevenção e manutenção da saúde física, mental, emocional, espiritual e social. A terapia ocupacional atua basicamente em formato de oficinas. Uma delas é a oficina de memória, que abrange diversos tipos de exercícios: jogos educativos, artes com materiais de reciclagem, horticultura com plantação e colheita de hortaliças e verduras e a oficina de artes meditativas, que incluem trabalhos manuais com pintura e confecção de mandalas, estas realizadas em graduações diferentes. Um trabalho resultante dessa oficina foi a confecção de 100 mandalas de fios para a comemoração do centenário do Hospital Dona Helena, em 2016. Atualmente, o projeto Arte Meditativa está direcionado ao trabalho de consciência corporal e relaxamento. Essa oficina tem como propósito aprimorar a capacidade do idoso de autopercepção – algo distante da realidade de muitos quando mais jovens. Contam

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“Estas práticas, em conjunto, promovem no idoso uma escuta qualificada e consciente do corpo físico e suas emoções”

eles que, antigamente, não se falava sobre qualidade de vida, não eram ensinados a envelhecer com saúde. A existência era voltada apenas a trabalhar e levar sustento para casa, as obrigações sempre em primeiro lugar. Hoje, a busca por qualidade de vida nessa fase está crescendo, pois desejam aproveitar o tempo da melhor forma. Pensando sobre o assunto qualidade de vida e sobre os aspectos que envolvem o envelhecimento ativo, criaram-se as oficinas de relaxamento com o foco em conduzi-los a um estado de consciência de si. A automassagem é um caminho para a consciência corporal de processo intenso, no qual se utiliza o tato e a sensibilidade para se autoperceber. O toque em si mesmo costuma ocorrer mais na hora de realizar a atividade de vida diária que é tomar banho, na qual alguns incluem esse contato ao passar o creme corporal para cuidados da pele – e esse movimento é contrário, é um toque terapêutico suave, às vezes profundo, que mantém a percepção ativa em si mesmo, percebendo as dores físicas e emocionais, sentindo as texturas dessa pele e suas marcas, promovendo um relaxamento das tensões musculares. Por intermédio da respiração e dos exercícios de Pranayamas (respiração usada na prática do yoga, respiração coronária, kapalabhati e respiração alternada) é possível atingir níveis mais profundos de relaxamento, visto que o corpo já está relaxado. Esses exercícios se baseiam em controlar o ritmo respiratório, proporcionando maior capacidade pulmonar e, assim, promovendo maior oxigenação cerebral e desacelerando a frequência cardíaca, dependendo da prática respiratória. Após a percepção corporal e o controle da respiração, são conduzidos a relaxamentos mentais (visualizações) com ênfase em criatividade, perdão, limpeza mental, ativação da vontade e da alegria, entre outros, proporcionando aprofundamento do estado de relaxamento. Todas essas práticas realizadas em conjunto promovem no idoso uma escuta qualificada e consciente do corpo físico e suas emoções, resultando na melhora da autoestima. Vale enfatizar ainda que as técnicas são utilizadas com base na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Governo.


Kethe de Oliveira Souza Psicóloga clínica, especialista em psicologia hospitalar e da saúde

Os perigos da ansiedade para a saúde mental

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ato de se manter saudável psiquicamente pode não parecer algo simples nos tempos atuais. A busca pelo ter, as relações de competitividade e as dificuldades para lidar com as frustrações nos levam a um desequilíbrio, gerando adoecimento e sofrimento psíquico. Surge assim uma ambivalência de sentimentos que podem provocar desgaste emocional, gerando adoecimento causador de sofrimento emocional. A ansiedade é um sentimento humano considerado normal, que ajuda o sujeito seguir adiante com seus projetos, impulsionando-o. Sem a presença desse sentimento, em doses apropriadas a cada pessoa, seguir em frente não seria fácil, podendo levar ao marasmo ou a um desgaste gigantesco. Situações diversas podem contribuir para o desenvolvimento de doenças físicas ou psíquicas, Tanto a ansiedade quanto outros sentimentos podem, sim, causar adoecimento. Para isso, leva-se em conta a intensidade desses sentimentos e os recursos emocionais do sujeito – consideramos aqui os recursos como a forma que a pessoa vai enfrentar a situação geradora do quadro ansioso. A ansiedade se torna prejudicial quando sua intensidade começa a interferir no desempenho da pessoa em suas

“A ansiedade torna-se prejudicial quando sua intensidade começa a interferir no desempenho da pessoa em suas atividades”

atividades. As manifestações são caracterizadas por sintomas físicos e psíquicos, podendo surgir de forma abrupta ou de modo constante. Como as manifestações psíquicas são subjetivas, muitas vezes não são identificadas sozinhas, mas acompanhadas pelas manifestações físicas que levam muitas pessoas a procurar atendimento nas emergências de hospitais – principalmente por sentirem dor no peito e dificuldade para respirar, levando-as a expressar outros sentimentos paralelos, entre eles, o medo de morrer. Se, como se sabe, “saúde mental é um termo utilizado para descrever um nível de qualidade de vida cognitiva ou emocional, ou ainda a ausência de uma doença mental”, esta pode ser caracterizada não apenas pela ausência de uma doença, mas está relacionada à forma como o sujeito reage às exigências da vida e ao modo como harmoniza seus desejos, capacidades, ambições e emoções. Assim, a ansiedade fora do considerado normal interfere na saúde das pessoas. Lembre-se que todas as pessoas podem apresentar, em qualquer momento da vida, sinais de sofrimento psíquico que podem exacerbar a presença de alguns sentimentos; por isso, o autoconhecimento, a perseverança e a resiliência são recursos necessários para manutenção de um equilíbrio da saúde mental. Para manter-se em equilíbrio e possibilitar a saúde mental, temos diversas sugestões mencionadas por profissionais da saúde, que costumam falar sobre os benefícios de realizar atividades físicas de forma regular, alimentação balanceada, qualidade de sono, terapias para relaxar, entre outras. Não quero deixar de pontuar a psicoterapia, que pode possibilitar o sujeito a identificar seus recursos de enfrentamento e a forma de vivenciar as situações causadoras de sofrimento, como é o caso da ansiedade. Lembro que o sofrimento, a frustração e a busca pela realização fazem parte da vida. Dessa forma, não passaremos por ela sem a presença de sentimentos que nos tirem de uma certa zona de conforto – o que muda é a forma que cada pessoa passará por essas circunstâncias, de acordo com sua história pessoal e os recursos emocionais disponíveis para esse enfrentamento.

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Gislaine Engelmann Nutricionista clínica do Hospital Dona Helena

Relação entre a microbiota intestinal e alimentação saudável

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actérias que habitam o trato gastrointestinal são reconhecidas como constituintes de um órgão funcionalmente ativo, chamado microbiota intestinal. No intestino grosso, onde a microbiota é mais numerosa e diversificada, há o predomínio da microbiota probiótica, composta por bactérias com ações benéficas para o organismo (bifidobactérias e bacilos). Encontramos também a microbiota patogênica, com potencial nocivo. O equilíbrio entre a microbiota probiótica e a patogênica é crucial para a saúde humana, e, quando há aumento na proliferação de bactérias patogênicas, temos um quadro de disbiose intestinal. A microbiota intestinal desempenha um papel de regulação fisiológica das funções metabólicas. A saúde do intestino tem influência no sistema nervoso central, uma vez que nossa microbiota intestinal é capaz de estimular sinais cerebrais relacionados à modulação de neurotransmissores, funções imunológicas e hormonais, associados à fisiopatologia da ansiedade e do estresse. Tais sintomas podem ser atenuados com estratégias nutricionais voltadas para a melhora da composição da microbiota intestinal. A imunoglobulina A (IgA) é o anticorpo mais importante para a mucosa intestinal, por mediar reações de tole-

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“A saúde do intestino tem grande influência no sistema nervoso central. Nossa microbiota intestinal é capaz de estimular sinais cerebrais” rância. Entretanto, o quadro inflamatório da disbiose intestinal predispõe à redução da transcrição dessa imunoglobulina, interferindo na integridade e saúde da mucosa intestinal. Existem evidências de que a microbiota intestinal está intimamente ligada ao risco de obesidade. Segundo uma meta-análise publicada pelo Nutrition Research, estudos em humanos e animais mostram que a microbiota intestinal é um dos determinantes para a obesidade. A microbiota intestinal difere entre indivíduos magros e obesos e, nestes últimos, pode induzir uma inflamação de baixo grau, perpetuando a obesidade e predispondo a morbidades associadas. A obesidade e os distúrbios metabólicos relacionados são caracterizados por alterações específicas na composição e função da microbiota do intestino humano, de acordo com recente estudo publicado pela Nutrition Today, pode alterar o balanço energético, prejudicando a utilização de energia a partir da dieta e influenciando genes que regulam o dispêndio e o armazenamento de energia. Imprescindível estimular o crescimento e a reprodução de bifidobactérias e lactobacilos. Esse estímulo deverá ocorrer pela alimentação, com o consumo de fibras solúveis, insolúveis, amido resistente e oligossacarídeos, que, ingeridos, serão fermentados no intestino grosso, estimulando o crescimento das espécies saudáveis, causando alterações significativas na composição da microbiota intestinal, pelo aumento do número de probióticos e pela redução no número de bactérias potencialmente patogênicas. Além disso, com a fermentação desses componentes alimentares pelas bactérias probióticas, há a produção local de ácidos graxos de cadeia curta, que atuam na regulação do metabolismo de lipídios e glicose no fígado, e ainda fornecem energia às células intestinais. Fibras solúveis, insolúveis, amido resistente e oligossacarídios estão naturalmente presentes em alimentos de origem vegetal, como cebola, alho, tomate, banana, aveia, mel, talos, folhas e sementes de diversos vegetais. Além do consumo desses alimentos, deve-se evitar açúcares, gorduras e alimentos industrializados por aumentarem a permeabilidade intestinal e contribuírem para a absorção de substâncias nocivas. Associado ao consumo dos alimentos citados, pode-se avaliar a necessidade de tratamento com a utilização de cepas probióticas específicas, que deverá ser acompanhado por nutricionista.


Paula Cristina Gern Mendivil Infectologista do Hospital Dona Helena

A importância da vacinação em todas as idades

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maioria das doenças prevenidas por vacina é transmitida pelo contato com objetos contaminados ou quando o doente espirra, tosse ou fala, pois expele pequenas gotículas que contêm os agentes infecciosos. Assim, se um indivíduo é infectado, pode transmitir a doença para outros não imunizados. A prevenção de doenças por meio de vacinas se dá, de modo geral, pela administração de vírus ou bactérias inativos que estimulam a reação do sistema imunológico ao ser introduzidos no organismo humano, promovendo a produção de anticorpos que evitam a ocorrência de doenças provocadas por esses microrganismos. Graças à vacinação, houve uma queda drástica na incidência de doenças que costumavam matar milhares de pessoas todos os anos até a metade do século passado – como coqueluche, sarampo, poliomielite e rubéola. Mas, mesmo estando sob controle hoje em dia, elas podem rapidamente voltar a se tornar epidemias caso as pessoas parem de se vacinar. Em 1776, há mais de 200 anos, foi produzida a primeira vacina, contra o vírus da varíola – hoje erradicado. Naquela época, o médico britânico Edward Jenner elaborou as vacinas a partir de lesões em vacas e, hoje em dia, por meio de avan-

“Quem não se vacina não coloca apenas a própria saúde em risco, mas também a de seus familiares e outras pessoas com quem tem contato” ços tecnológicos na medicina, existem vacinas para diversas doenças como gripe, hepatite, febre amarela, sarampo, tuberculose, rubéola, difteria, tétano, coqueluche, meningite, poliomielite, diarreia por rotavírus, caxumba e pneumonia causada por pneumococos, entre muitas outras recentes, como HPV, herpes zoster e dengue, e outras que estão em processo de estudo, como Zika. Cada idade da vida tem as indicações de vacinação, desde o bebê prematuro até o idoso, sendo importante conversar com seu médico pediatra, clínico infectologista, pneumologista e geriatra. Quem não se vacina não coloca apenas a própria saúde em risco, mas também a de seus familiares e outras pessoas com quem tem contato, além de contribuir para aumentar a circulação de doenças. Tomar vacinas é a melhor maneira de se proteger de uma variedade de doenças graves e de suas complicações, que podem levar à morte. Vale lembrar, na época de frio, a vacinação contra gripe. Para a vacinação contra a gripe H1N1, há duas vacinas disponíveis, a trivalente e a tetravalente ou quadrivalente. De acordo com as recomendações da Sociedade Brasileira de Imunização, para as crianças com mais de 9 anos e adultos, uma dose anual é suficiente para conferir a proteção desejada. Para crianças de 6 meses a 9 anos de idade, são recomendadas duas doses na primeira vez em que forem vacinadas, a chamada primovacinação e, posteriormente, uma dose anual. Outros pacientes são recomendados para vacinação contra a gripe: os grupos mais vulneráveis para infecção pelo vírus, assim, além de indivíduos com 60 anos ou mais, serão vacinadas as crianças na faixa etária de 6 meses a menores de 5 anos de idade (4 anos, 11 meses e 29 dias), as gestantes, as puérperas (até 45 dias após o parto), os trabalhadores de saúde, adolescentes e jovens de 12 a 21 anos, sob medidas socioeducativas, a população privada de liberdade e os funcionários do sistema prisional, povos indígenas e grupos portadores de doenças crônicas não transmissíveis e outras condições clínicas especiais.

“Graças à vacinação, houve uma queda drástica na incidência de doenças” 39


Maria Manuela Pinto Carneiro Alves dos Santos Superintendente do Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA)

ENTREVISTA A alavanca da gestão da qualidade nos serviços de saúde

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édica com especialização em Saúde Pública, Administração Pública e Acreditação, além de mestre em Avaliação, a portuguesa Maria Manuela Pinto Carneiro Alves dos Santos é a superintendente do Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), onde atua desde 1998. Nesta entrevista à Revista Conecthos, ela avalia o impacto positivo da busca sistemática pela correta gestão da qualidade nos serviços e instituições brasileiras de saúde. Desde quando a correta gestão da qualidade profissional e de serviços de saúde se tornou pauta relevante, no meio profissional e nas instituições brasileiras? Sempre foi, mas anteriormente não se tinha a devida compreensão dos conceitos de qualidade e segurança para o cuidado com o paciente como temos hoje. De uns 15 anos para cá, esse tema começou a ser recorrente na gestão das instituições de saúde. Um fato que contribuiu para sua disseminação foi a escassez de recursos, que fez as instituições buscarem mais eficiência. Com isso, houve maior investimento em formação profissional.

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Além da questão dos recursos, decorrente do agravamento da crise econômica no Brasil, a sra. percebe alguma outra alavanca para essa busca de maior eficiência? Quando há crise econômica, faltam recursos, e, com a escassez de recursos, os gestores buscam processos em que haja menos desperdício. Portanto, isso faz com que se trabalhe pela qualidade porque daí advêm ferramentas que levam a corrigir processos – e, consequentemente, desperdícios. Na área da saúda, isso é muito visível porque seus custos são elevados. E a melhoria da qualidade também se deve à segurança do cuidado, tanto de pacientes quanto de funcionários. Houve mais algum fato relevante? Em 2008, um grande evento realizado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), do Ministério da Saúde, enfocou esse assunto. E foi aí que se começou a tratar, oficialmente, das questões da acreditação. Já a partir de 2003, o CBA promovia eventos anuais sobre a mesma temática. Certamente, o Congresso Internacional de Acreditação, promovido pelo CBA em conjunto com a Joint Commission International no mesmo ano de 2003, deve ter sido o mais importante, pois se falou pela primeira vez sobre dar voz aos pacientes, sobre a importância do paciente participar do seu tratamento e nas decisões clínicas. Como a sra. avalia o fato de só no início do século 21 as institui-

“Quando há crise econômica, faltam recursos, e, com isso, os gestores buscam processos em que haja menos desperdício. Isso faz com que se trabalhe pela qualidade”


ções de saúde se deem conta disso – e criem canais para assegurar a participação do paciente em seu tratamento médico? Não seria essa uma prerrogativa óbvia do processo? Historicamente, viemos de períodos de submissão e censura, nos quais as pessoas eran cerceadas de se expressar. Não se admitia, por exemplo, questionar a conduta médica. Só em 1990, com a criação do Código de Defesa do Consumidor, essa relação começou a mudar, impulsionada ainda pelo acesso à internet. O direito do paciente, a preocupação com a gestão eficiente e com a busca por cuidados mais seguros, cresceram ao longo dos anos, no Brasil e no mundo. Na área da saúde, isso é muito visível depois da 2ª Guerra Mundial e com a filosofia da Organização Mundial da Saúde (OMS). Hoje, com a comunicação muito mais fácil entre os países e a globalização, as instituições estão buscando formas de diminuir custos e melhorar a qualidade e a segurança. Tudo isso influenciou as discussões e as pessoas começaram a verificar o quanto era tudo tão importante para as instituições. O fato de o Brasil ter um primeiro hospital acreditado pela JCI fora dos Estados Unidos – o Israelita Albert Einstein (em 1999) – também instigou outras instituições a entrar nesse processo de qualidade. E, em 2001, tivemos outras duas instituições acreditadas, o Hospital Moinhos de Vento (RS) e o Hemorio (RJ). Nesse momento, já com a parceria JCI/CBA. Como podemos historiar a evolução dessa

“As instituições estão buscando formas de diminuir custos e melhorar a qualidade e a segurança” bandeira – da excelência da gestão – no Brasil e no mundo? Nos Estados Unidos, a bandeira começou a ser buscada pelos cirurgiões, ao perceber que seu ato cirúrgico era de boa qualidade, mas não impedia que os pacientes viessem a óbito, o que os frustrava. Em 1910, o dr. Ernest Goldman começou a estudar esse fenômeno e constatou que a origem não era apenas a questão técnica, mas todo o entorno dos procedimentos cirúrgicos: as condições do hospital e do ambiente eram importantes para determinar os resultados cirúrgicos. Antes disso, na Guerra da Crimeia, a enfermeira Florence Nightingale tinha a mesma conceituação, ou seja, o ambiente provocava mais óbitos do que se pensava, principalmente pela falta de higiene. Ela começou a fazer com que todo mundo lavasse as mãos antes dos atos cirúrgicos e antes de cuidar de outro paciente. Uma medida muito séria e que dá resultados até hoje. Em 1919, é criado o Conselho Americano de Cirurgiões e, em 1927, realiza-se uma avaliação

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“Os pacientes também estão muito mais alertas em relação a seus cuidados e questionam os profissionais e as instituições sobre a segurança e qualidade na sua assistência”

de 28 hospitais universitários. A partir daí, diversas instituições se comprometem a trabalhar com padrões mínimos de qualidade. Cinco padrões precisavam ser avaliados, dois deles usados até hoje: cada paciente tem que ter um prontuário da sua história clínica e os pacientes devem ser adequadamente identificados. Depois da 2ª Guerra Mundial, muitos movimentos no mundo inteiro começam a trabalhar com qualidade, principalmente na área industrial, porque havia necessidade de os países ultrapassarem as dificuldades que enfrentaram na guerra, e, para isso, precisavam se organizar, obter gestões adequadas. Daí a qualidade passou a ter importância cada vez maior. Um relatório do professor Fletcher, no início do século 20, de avaliação dos hospitais universitários, também foi usado pelas áreas da educação e acreditação para a melhoria da qualidade em saúde. E no Brasil? Um ponto relevante foi a criação do Instituto Nacional de Previdência Social (Inamps), que tinha uma regulação e sistematização de processos, junto aos seus agentes estaduais. Não é como hoje e nem existiam mecanismos para isso, mas havia uma preocupação das instituições e dos profissionais da saúde em dar qualidade à assistência. Mas só se começa a consolidar as questões de qualidade em conjunto com a acreditação, no final de década de 1980, início dos anos 1990. Em 1994, criou-se um grupo de estudos na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), do qual participei e fui a

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secretaria executiva, para trabalhar a acreditação e os modelos que já existiam no mundo sobre acreditação. Isso foi na época em que José Carvalho de Noronha era o diretor do Instituto de Medicina Social. Nos debruçamos sobre essa temática durante quatro anos e, em 1998, criamos o Consórcio Brasileiro de Acreditação, que no ano 2000 firmou um acordo de parceria com a JCI. Afora a Região Sudeste, onde a sra. percebe avanços mais expressivos no campo da gestão da qualidade em saúde no Brasil? Nos três Estados do Sul, há uma preocupação com a qualidade já alguns anos. Em Santa Catarina, há algumas iniciativas e vejo que a mais concreta e de melhor qualidade é mesmo a do Dona Helena, que é o único hospital acreditado pela JCI no Estado. A Região Sul tem um alto nível de excelência, devido ao avançado nível de educação da sua população. No Nordeste, Bahia e Pernambuco são os mais envolvidos com a busca pela acreditação. Há outras iniciativas, no Ceará, Piauí, Maranhão e, ainda, em Minas Gerais. A região mais atrasada é o Centro-Oeste, apesar de algumas iniciativas pontuais. Como fazer a mesma preocupação chegar à esfera pública? O tema não é só da área privada. Na área pública, também há uma preocupação muito grande. E nós tivemos várias instituições públicas acreditadas pela JCI/CBA desde 2001. Mas essas instituições têm passado por uma degradação muito grande e algumas não conseguem manter o status da acreditação JCI e abandonam o processo, seja por falta de gestão ou de recursos financeiros e humanos. Os recursos humanos tiveram uma grande volatilidade não só por rotatividade como por aposentaria. E isso tem feito com que a esfera pública fique um pouco mais distante da acreditação JCI. Não quer dizer que não tenham interesse em fazer isso. É preciso entender que acreditação só existe e se faz com pessoas. A sra. identificaria algum campo ou segmento, dentre as instituições públicas, que tenha conseguido ultrapassar essa barreira e manter o status da acreditação conquistada? Temos alguns hospitais públicos que conseguiram seguir com


a acreditação e já têm várias reacreditações, como o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into) e o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp). Sempre pensamos que o esforço possa ser retomado, pois, à medida que os hospitais passam a trabalhar com mais qualidade e segurança, os recursos, mesmo que diminutos, são capazes de melhorar a qualidade. Falando em cursos de gestão da qualidade, especificamente, onde há instituições mais destacadas oferecendo esse tipo de formação no país? O CBA mantém parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC -RJ) e com a Faculdade de Educação em Ciências da Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP). Outra parceria, a mais recente, é com o Hospital Dona Helena e o Instituto Dona Helena de Ensino e pesquisa (IDHEP), em conjunto com a Associação Educacional Luterana Bom Jesus/Ielusc, onde será oferecido o MBA em Gestão da Qualidade, Ética e Equidade em Saúde. O MBA está previsto para se iniciar no segundo semestre de 2018. Com aulas mensais, terá tempo de duração de 18 meses e carga horária de 474 horas. Nele, vamos abordar os seguintes eixos de trabalho: Gestão de Serviços de Saúde, Gestão de Pessoas, Qualidade em Serviços de Saúde, Ética na Gestão de Serviços de Saúde e Equidade em Saúde. O CBA oferece cursos de especialização ou MBA para gestão da Qualidade. Nestes, podemos treinar e capacitar um número cada vez maior de pessoas e, principal-

Para Maria Manuela, a gestão da qualidade deve ter como foco o bem-estar dos pacientes e acompanhantes

mente, as lideranças. Hoje está claro que, se não tivermos lideranças capacitadas, treinadas e informadas sobre a qualidade, não alcançaremos os padrões de qualidade e segurança importantes para toda a cadeia do processo de cuidado. Como este debate da qualidade na saúde pode impactar, concretamente, a vida do paciente e, por consequência, das comunidades? Já vem impactando ao longo desses anos. O CBA já trabalha com isso há 20 anos. Hoje, temos instituições, mesmo que não seja dentro da metodologia da JCI, que estão procurando se qualificar. Os pacientes também estão muito mais alertas em relação a seus cuidados e questionam os profissionais e as instituições sobre a segurança e qualidade na sua assistência. Eles interferem muito mais e são mais responsáveis pelo seu cuidado. Outra coisa que não podemos esquecer é de que, hoje, a internet é uma faca de dois gumes. Tem seus benefícios, já que pode proporcionar mais informação ao paciente, ajudando a discernir e avaliar o que é melhor para ele, mas também é usada indevidamente, com informações não condizentes e que podem levar o paciente a um falso diagnóstico, causando alarmismo.

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Filie-se à SBB A principal missão da SBB é a de contribuir para a difusão da bioética no Brasil. Além disso, apoia profissionais e instituições nas diversas atividades relacionadas ao seu campo, como na atuação em comitês de Bioética Hospitalar, comitês de Ética em Pesquisa, na docência e na pesquisa. É também papel da SBB divulgar a produção em bioética, o que vem fazendo por intermédio dos seus congressos nacionais, meios eletrônicos de comunicação e da Revista Brasileira de Bioética (RBB). Participe! Filie-se à SBB pelo site: www.sbbioetica.org.br.

Em dia Eleições para a diretoria da SBB/SC, biênio 2018-2020

Eventos internacionais

rezados associados da SBB/SC, em julho de 2018 teremos eleição para a nova Diretoria da SBB/SC, biênio 2018-2020. O processo sucessório foi deflagrado nos termos do Estatuto. Para tanto, os associados aptos (art. 7o) poderão compor chapas para ser apresentadas à eleição. Informo que os encaminhamentos necessários encontram-se no Estatuto – Capítulo IV Da eleição (art. 30 a 34) e as duas datas importantes, conforme aprovado pela diretoria atual e comissão eleitoral, são as seguintes: (1) até 27 de junho de 2018 (período vespertino até as 17h), portanto 48 horas antes da instalação da Assembleia Geral, a nominata das chapas com a composição de seus membros e as devidas assinaturas, nos termos do Estatuto, devem ser entregues à Comissão Eleitoral na sala do 132 de Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina, no primeiro andar do Centro de Ciências da Saúde da UFSC; (2) a Assembleia Geral para a eleição das Chapas será no dia 29 de junho (sexta-feira) das 14h às 17h, na sala de reuniões do Departamento de Saúde Pública, número 132, no primeiro andar do Centro de Ciências da Saúde da UFSC, para a qual estão convidados todos os associados. Lembramos a todos da necessidade da prévia quitação com a tesouraria da SBB (Art.7º), pois no local não será possível regularizar a situação financeira. Florianópolis, 20 de fevereiro de 2018

Os interessados em participar da 13ª Conferência Mundial de Bioética, Ética Médica e Direito da Saúde (13th World Conference on Bioethics, Medical Ethics & Health Law) têm até o dia 25 de junho para submeter artigos para aprovação. O evento acontece em Jerusalém, entre os dias 27 e 29 de novembro. Mais informações: http://ethics-2018.isas.co.il. Em dezembro, Nova Deli, na Índia, receberá o 14º Congresso Mundial de Bioética – Saúde para Todos em um Mundo Desigual: Obrigações para um Mundo Bioético (14th World Congress of Bioethics. Health for all in an unequal world: obligations of global bioethics). O congresso ocorre entre os dias 4 e 7. Para mais informações, acesse: www.iab2018.org.

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Atenciosamente, Leandro Molina, presidente da Comissão Eleitoral

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Congresso Internacional Iberoamericano de Bioética Entre os dias 28 e 30 de junho, Curitiba sediará o II Congresso Internacional Ibero-Americano de Bioética e o VIII Congresso de Humanização e Bioética. Promovido pelo programa de pós-graduação em bioética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), em parceria com a Sociedade Brasileira de Bioética – Regional Paraná, os congressos terão como tema “Cuidados paliativos e direitos humanos”. Para informações, acesse: www.sbbioetica.org.br.


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Rua Blumenau, 123, Centro, Joinville/SC (47) 3451-3333 www.donahelena.com.br


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