SÃO BORJA EDIÇÃO 7 DEZEMBRO/2019
SUMÁRIO
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É preciso falar sobre o Bullying Áreas de Humanas e Sociais: A relevância dos cursos e pesquisas para São Borja A busca por atendimento médico A cultura da carne em São Borja: da criação do gado ao consumo do produto
EXPEDIDENTE Edição: Professora Dra. Vivian Belochio Diagramação: Cristiano Ritzel Produção: Daniel Campos, Mayara Rodrigues, Melani Fertonani, Milena Vançan eYasmin Ialuny Componente Curricular: Produção Multiplataforma em Jornalismo II Vetores: Internet
M A T I Z
Foto: Melani Fertonani
É preciso falar sobre Bullying Relatos de superação e orientações profissionais para lidar com este fenômeno que é considerado um dos indicadores para os males do século XXI
Por:
Melani Fertonani e Mayara Rodrigues
Entrar no âmbito escolar é uma das principais dificuldades para as crianças, pois a escola apresenta um mundo novo e proporciona momentos para socializar. Mas imagina ter que estudar em um país onde você não entende a língua principal e a cultura é totalmente diferente da que você foi criado? Esse foi o meu caso. O tema desta matéria é bullying e o primeiro caso contado nela é a minha própria experiência. Eu, Melani Fertonani, estudante de Jornalismo, passei por momentos difíceis na infância e vou entrar nessa discussão no espaço desta produção jornalística. Com apenas 9 anos, natural de Santa Fé, Argentina, vim morar no Brasil. Eu não entendia absolutamente nada do idioma. Na escola, os professores tentaram me ajudar. Para eles, eu era uma aluna que precisava estudar
e aprender a língua portuguesa, mas, para meus colegas, eu era uma menina que falava tudo errado e tinha vindo de um país ruim. Assim, começou minha turbulenta vida escolar. Durante três anos, eu vivenciei o que se chama de xenofobia praticada com bullying. Trata-se de antipatia e preconceito com pessoas que vêm de fora do país. Todos os dias, meus colegas de sala de aula tinham um motivo para implicar comigo e fazer piadas: era o meu estilo, ou o meu sotaque estrangeiro. As agressões que eu vivenciei não foram somente verbais, mas físicas. Puxavam meu cabelo, me empurravam nas escadas e estragavam meus materiais escolares. Eu era constantemente abordada por colegas que pensavam que meu jeito de falar era errado e que, por eu não ser brasileira, não deveria morar no Brasil.
Um dos sintomas apresentados durante a convivência com bullying é o isolamento
Toda essa convivência resultou em medo de ir para a escola, medo até de me comunicar com as pessoas. Sendo assim, precisei procurar ajuda, com aulas extra para aprender o idioma rápido. Eu desejava falar o português sem sotaque, para não ser mais motivo de chacota na sala de aula. Por aproximadamente dois anos, eu não tive amizades no ambiente escolar e nem fora. “Eu não conseguia me comunicar e muito menos entender. Somente sabia escrever”. Para uma criança, não ter amizades na escola é como viver uma vida solitária. A única pessoa que eu realmente confiava era minha mãe e era ela que me fazia companhia durante os intervalos, por telefone, pois ela estava trabalhando. Esse foi o meu caso. É notável a necessidade de trabalhar, desde os anos iniciais, a importância da socialização e não permitir que casos de bullying sejam praticados. A escola é a segunda casa das crianças e não é certo um aluno viver em um ambiente onde se sente oprimido por suas diferenças. Diversos sentimentos são desenvolvidos nos primeiros anos da vida escolar. É na escola que a criança desbrava caminhos rumo à socialização e à aceitação de quem ela é. É no início da convivência escolar que os primeiros contornos da personalidade humana vão sendo desenhados, para formar o ser pensante e questionador. Entretanto, em algumas caminhadas, há extensas e árduas barreiras. Essas não somente necessitam ser superadas, mas nem deveriam existir. Na infância, um grupo costuma renomear o indivíduo por alguma característica física, para fim de ser aceito. Se o indivíduo aceita sua alcunha, torna-se o apelido, a referência
que o identifica até o término daquele ciclo, ou além. Se o indivíduo se ofende e não aceita, é dever dos demais abandonar a alcunha e tratá-lo pelo nome do cartório. Isso é respeito, um dos pilares fundamentais para a ampla aprendizagem durante o desenvolvimento infantil, mas há os casos em que a ofensa não é um limite a ser respeitado e o apelido maldoso se mantém, magoando a cada dia o indivíduo que o carrega. Essa é umas das faces sutis de um mal enraizado na sociedade, um revés nos primeiros anos de escola, atualmente conhecido como bullying. O professor formado em Ciências Humanas da Universidade Federal do Pampa, Ewerton Ferreira, responsável pela realização das oficinas do programa “Fala Sério”, que debate a prática de bullying relacionado aos padrões de gênero com alunos do Ensino fundamental e médio da Rede Pública de ensino, esclarece que faltam pesquisas sobre a prática. Conforme elas vão avançando, principalmente no campo da psicologia, os esclarecimentos surgem e diferem a prática da brincadeira ao limite da violência. “A linha de limite entre a brincadeira ou não é quando a vítima percebe. Uma brincadeira é eu fazer uma brincadeira contigo e tu dares risada. A partir do momento em que não tem a risada do outro e pode gerar um constrangimento entre vítima e agressor, já é considerado prática de bullying. Se ocorrer várias vezes, caso aconteça apenas uma vez, reforço que é uma forma de discriminação por preconceito”.
Quem passou na pele O universitário Wallas, de 24 anos, relata sua história. Tudo começou quando tinha 5 anos. “Eu era uma criança que não seguia os padrões denominados para a masculinidade e, por conta disso, meus colegas criaram muitos apelidos. Essas brincadeiras de mau gosto desencadearam em mim um instinto agressivo e, para me defender das ofensas, eu brigava com meu colegas. O que mais me incomodava é que, mesmo eu reclamando na secretaria da escola, isso nunca parava. Me falavam para não dar importância e ignorar. Isso se estendeu durante o ensino fundamental, mas, no ensino médio, as coisas pioraram. Eu parei de falar na sala, comecei a ter vergonha da minha voz, quando a professora fazia a chamada ela precisava me procurar pela sala porque eu falava muito baixinho, por medo de como sairia o som da minha voz. Isso foi muito triste para mim, porque eu parei de fazer amizades, eu tinha medo do que elas iam pensar de mim e criava muitas paranoias na minha cabeça. Durante o ensino médio, eu mudei de cidade e, na nova escola, uma menina implicava muito comigo, me chamava de bichinha e gay. Eu já estava cansado disso, de ter que vivenciar essas atitudes todos os dias sem ajuda da escola. Então, um dia, decidi tomar uma atitude e realizei uma denúncia no disque 100, que é um serviço considerado como pronto socorro dos direitos humanos. Isso gerou uma grande repercussão na minha escola. De repente, fui chamado pela direção para esclarecer tudo. Somente assim, consegui solucionar esse problema. Depois desse acontecimento, foi desenvol-
vido um projeto para evitar mais casos de bullying na escola, mas o que eu sofria não parou. Hoje, eu entendo que eu não deveria ter me importado tanto com isso, pois tenho poucas lembranças alegres devido a esses momentos. Até hoje, eu tenho algumas dificuldades de me relacionar com as pessoas, porque sou um pouco tímido, mas eu tento superar. Acredito que as consultas com a psicóloga me ajudaram a ver que o que tinha de errado eram as atitudes das pessoas e não as minhas”. Não precisam existir motivações claras para julgar o outro inferior, a vítima precisa somente estar no ambiente errado, com pessoas que não agem de maneira correta. A vaidade e competição para ser o melhor em todos os aspectos escolares, como é comum nos dias atuais, interfere nessas atitudes. Para estudante que sofreu bullying e não quis se identificar, os que não demonstram habilidades avançadas para seu período escolar, ou ambição de se destacar, são alvos fáceis. “Às vezes, eu sempre acabo me sentindo inferior aos meus colegas. Mesmo na faculdade, eu me acho inferior aos meus colegas e, até hoje, isso reflete nos meus relacionamentos, porque eu ainda me fecho para certos grupos e não mantenho contato de amizade com outros colegas. Mas eu também gosto assim”.
Foto: Mayara Rodrigues
Bullying no ambiente escolar: Identificar e orientar O bullying não é algo normal. Muitos o segurança, além de outros achados, como praticam, mas não sabem o mal que pode ansiedade, baixa auto estima, rejeição, baifazer para uma pessoa. Bullying é um conxa aceitação do grupo ou poucos amigos. junto de comportamentos agressivos pratiO agressor sempre tende a ser mais forte cados por pessoas que, muitas vezes, carque seu alvo, apresenta características diregam problemas pessoais. Normalmente, ferenciadas dos demais e, principalmente, começa com agressões verbais, mas forteé popular no grupo de amigos. Portanto, mente ofensivas. procura atingir pessoas que facilmente irão A prática do bullying é uma forma de sofrer. se sobressair agressivamente sobre outra Dessa maneira, é preciso observar as repessoa, apontando suas características ações que cada criança apresenta e ajudar como desvantagem. Nos primeiros anos a resolver seus sentimentos. Segundo a escolares, os professores e psicóloga Flávia Leão, “a crianorientadores exercem o papel ça que pratica bullying está “Me partia o code mediadores na identificacarregada de sofrimento e preção e orientação da criança ou ração ver meu cisa reconhecê-los para poder do grupo que pratica o ato. A tratá-los”. orientadora pedagógica Cris- filho, lindo, inteO acompanhamento das atitina Andrade destaca a imporligente e muito tudes apresentadas começa em tância para a escola, nos pricasa. A família precisa ajudar a querido, viver meiros anos, para orientação criança em suas dificuldades e dos alunos, vítimas ou agresdúvidas, para tornar seus meencerrado em sores, pois os relacionamendos e fraquezas fáceis de supetos escolares são reflexos da um quarto, pois rar. A criança que não é tratada vida em casa. “Muitas dessas criar fortes barreiras na não tinha amigos pode crianças, que os professores sua vida e impossibilitar o deentregavam na direção, comepara brincar...” senvolvimento de experiências çamos a conversar com elas adultas. e vimos que a vida pregressa O apoio familiar é importandeles é de muito sofrimento, muita luta, de te para criar um sentimento de afeto. Ao se vontades que não podem se realizar”, consentir acolhida pelos familiares, a criança ta. se dispõe a melhorar e facilita o diálogo. Os alvos costumam ser os mais fracos Assim, é possível tratar o problema, pois, fisicamente ou emocionalmente. Tendem a para iniciar o trabalho de ajuda, é preciso apresentar atitudes negativas diante dos trabalhar em equipe, família e profissional atos violentos, seja pela não reação, seja de psicologia. Para a mãe Marcela Pereira pelo isolamento, ou por reações que deuma de suas maiores dificuldades foi ajudar monstram fragilidade, imaturidade ou ino filho a sair da depressão causada pelo
O bullying causa o sentimento de solidão, o isolando dos demais
sofrimento com bullying. “Me partia o coração ver meu filho, lindo, inteligente e muito querido, viver encerrado em um quarto, pois não tinha amigos para brincar. Eu cheguei um dia em casa e decidi pôr um ponto final nessa história. Eu pensei que isso ia durar pouco tempo e me arrependo de não ter procurado ajuda antes. Acredito que foi essencial minha participação no tratamento, porque tinha muitas coisas que ele só contava para mim”, relata. O problema, muitas vezes, não se resolve, porque não adianta acontecer somente o acompanhamento psicológico se o meio em que a criança vive continua o mesmo. É normal ter sentimentos tristes, mas não é normal utilizá-los para machucar o pró-
ximo. Muitos pais enxergam as atitudes das crianças como algo normal, e pensam que é besteira quando seus filhos falam estar sofrendo bullying, por isso é necessário que todos tenham entendimento de que se trata este ato e como precisa ser tratado. E não importa o quão doloroso esteja esse fardo, compartilhe ele com um profissional habilitado para amenizar o dano causado pelo bullying, que não é uma doença, mas há tratamento para que ele não evolua e torna se algo maior e muito mais grave. A equipe da agência i4 produziu uma série especial de podcasts abordando como tema a Educação Infantil. Você pode ficar por dentro do assunto, clicando aqui.
Foto: Muriel Pinto
Áreas de Humanas e Sociais: a relevância dos cursos e das pesquisas para São Borja Por:
Daniel Campos
que, segundo o governo, foi aplicado sobre gastos não obrigatórios, como água, luz, terceirizados e equipamentos, incluiu, em muitas universidades, a parte de pesquisas. Mas, segundo o Ministério da Educação, a verba poderá ser desbloqueada no segundo semestre, caso a economia melhore e a arrecadação de impostos cresça. O coordenador acadêmico e professor adjunto da Unipampa, Muriel Pinto, revela que este contingenciamento, “infelizmente, irá afetar inúmeras pesquisas em universidades e os institutos”. Segundo ele, é inevitável que essa área de estudos em cursos de Humanas e Sociais não tenha reajustes, já que existem setores nessas instituições que precisam com urgência do repasse, para manter as instalações em pleno funcionamento.
Câmara de Vereadores de São Borja ficou lotada para acompanhar a histórica sessão que discutiu os trâmites para instalação do Sítio Arqueológico na cidade
Unipampa: as pesquisas em torno das carências e identidades de São Borja
Foto: Hamilton Lima
Há cerca de 13 anos, os projetos de pesquisa realizados por professores e alunos da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e do Instituto Federal Farroupilha (IFFar), em diversos cursos, vêm beneficiando as comunidades onde essas organizações públicas de ensino se instalaram. É o caso de São Borja, onde os estudos científicos nas áreas de humanas e sociais vão além do conhecimento alcançado pelos acadêmicos, gerando, inclusive, importantes descobertas e pesquisas inéditas para a cidade. A valorização em torno das instituições federais de ensino entrou em discussão a partir de abril deste ano, depois de o Governo Federal anunciar o contingenciamento de R$ 1,7 bilhões dos gastos de 63 universidades e de 38 institutos. O corte,
Universidade criada há 13 anos vem desenvolvendo inúmeros projetos de pesquisa voltados para o município
Cinco anos atrás, a Universidade Federal do Pampa possuía três projetos de pesquisa em São Borja. Hoje, em 2019, esse número passa de 20. Isso se deve, em muito, pelos importantes temas que começaram a ser identificados como identitários, necessários e relevantes para o município. Atualmente, as principais áreas trabalhadas nas pesquisas no campus São Borja estão voltadas a temáticas de políticas públicas, comunicação e indústria criativa, comunicação política, estudos de cultura, fronteira e humanidade, empreendedorismo e gênero. Dentre esses assuntos desenvolvidos, destacam-se as pesquisas em cultura, fronteira e humanidade. O município de São Borja é detentor de uma história secular e está geograficamente localizado em uma das regiões mais importantes da América do Sul. Esses fatores são a matéria prima para inúmeras
pesquisas dentro dos cursos de Ciências Humanas, Ciência Política e Serviço Social. Em 2018, os estudos nessa área foram primordiais em um projeto inédito para a comunidade são-borjense. A partir de pesquisas e trabalhos realizados pelos professores da Unipampa, em particular o docente Muriel Pinto, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o centro da cidade de São Borja como um Sítio Arqueológico, após uma tratativa que se arrastava há anos na região. Segundo Pinto, esse reconhecimento histórico teve grande participação da universidade. “Os diversos estudos de fronteira e humanidade realizados pelos grupos de pesquisa da Unipampa angariaram informações preciosas, que, mais tarde, foram fundamentais para que o Iphan percebesse que os vestígios do período jesuítico ainda estavam presentes em São Borja”, revela.
gaúcha contribuem com estudos científicos e trabalhos práticos
IFFar: Pesquisas inéditas criadas por graduações inovadoras
Foto: Carolina Silveira
Cursos inéditos para a Fronteira Oeste
como prosseguir com uma observação e investigação”, afirma. A importância da pesquisa está altamente ligada ao ensino, uma vez que um precisa do outro para existir, conforme explica a membro do departamento de pesquisa do IFFar, Laiane Flores. “Não se pode fazer ensino sem pesquisa. Toda a gestão do conhecimento parte da descoberta que é feita dentro da pesquisa”, frisa. Para cada curso ofertado no Instituto Federal Farroupilha, há pelo menos um projeto de pesquisa sendo desenvolvido. Destacam-se os projetos “A Divisão Sexual do Trabalho na Cozinha Profissional em São Borja” e a “Transformação de Resíduos Orgânicos no IFFar-São Borja”. Ambos são do curso de Gastronomia e visam expandir conhecimentos para além das salas de aula, pesquisando, investigando, analisando e mostrando resultados, em busca de melhorar tanto o curso, quanto a profissão, através da pesquisa. Além disso, atividades de divulgação dos
projetos dentro do Instituto são feitas para os alunos durante todo o semestre, como um informativo do que está sendo desenvolvido, tanto na área da pesquisa quanto da extensão. Utiliza-se cartazes que explicam quais são os projetos aprovados e organiza-se seminários internos, apresentando as pesquisas em desenvolvimento e os resultados atingidos. No entanto, outros projetos são divulgados de forma mais ampla para a comunidade. É o caso da pesquisa “Territórios Negros Na Fronteira Oeste”, que perdurou de 2017 a 2018. Nela, foi desenvolvido, após intensos estudos, um documentário, em parceria com a Unipampa, intitulado “Quilombo Rincão dos Fernandes”. O processo de divulgação foi realizado, inclusive, em veículos de comunicação de outras cidades da região. O documentário, para Laiane Flores, conseguiu demonstrar a dimensão do que é trabalhado no âmbito acadêmico e que é aplicado à realidade da comunidade.
mos inseguros no mercado de trabalho...”
Documentário amplamente divulgado mostrou uma realidade desconhecida de um pequeno povoado da região
Foto: IFFar São Borja
O Instituto Federal Farroupilha de São interior de Jaguari, será muito prejudicado, Borja possui 28 projetos de pesquisa ca- pois os bolsistas não terão os recursos nedastrados, contando com cerca de nove cessários na pesquisa e o deslocamento bolsistas remunerados e 15 bolsistas vo- até lá será quase inviável”, afirma. luntários. Conta, ainda, conta com mais A aluna Luciana Silva, que é bolsisdois editais que estão abertos para cadas- ta há dois anos no curso de Gastronomia, tramento de novos projetos. Porém, com o comenta sua experiência como pesquisacontingenciamento dos recursos do Go- dora. “Tudo o que aprendemos durante a verno Federal para a educação, a institui- produção científica é o que iremos pôr em ção está revendo novos projetos. prática depois, no mercado de trabalho. Para a coordenadora do Departa- Então, além de contribuir com a comunimento de Pesquisa do IFFar, Priscyla Ham- dade de São Borja e região, a pesquisa é merl, esses cortes podem importante para a nossa experi“Se não fosse a afetar os estudos que vão ência nesse sentido”, elucida. “Se além dos portões da instinão fosse a pesquisa, talvez, fipesquisa, tuição. “Um de nossos procaríamos inseguros no mercado jetos, que é na 4ª Colônia, talvez, ficaría- de trabalho, sem uma noção de
Os cursos de humanas e sociais e sua importância para São Borja o campo das Ciências Humanas. Nele, trabalha-se diretamente as ligações entre os seres humanos, a história, as crenças e o espaço em que vivem. A Unipampa é a única que oferta cursos da área, sendo eles Ciências Humanas, Ciência Política e Geografia EAD. Segundo o coordenador do curso de Licenciatura em Ciências Humanas, Edson Paniágua, a contribuição dos cursos dessa área para comunidade são-borjense é significativa, visto que a cidade é privilegiada quando se fala em cultura, geografia e história. “A oferta dos cursos de Humanas em São Borja representou um marco significativo para a cidade, pois, finalmente, começou-se a pesquisar assuntos ligados ao período jesuítico, influência política e rio Uruguai, que antes, eram escassos aqui”, comenta.
Fotos: São Borja do Alto
As instituições públicas de ensino superior presentes em São Borja oferecem, atualmente, 14 cursos gratuitos à comunidade, na sua grande maioria graduações das áreas de Ciências Sociais Aplicadas e Humanas. A Universidade Federal do Pampa dispõe de oito cursos, o Instituto Federal Farroupilha cinco e a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul oferta um. A presença dessas possibilidades de formação superior na cidade, muitas vezes questionadas pela sua relevância na sociedade, contribuem, além da área de pesquisas, no incremento econômico de diversos setores. As Ciências Sociais Aplicadas, área de mais da metade dos cursos ofertados em São Borja, tem como princípio básico o estudo sobre os interesses e as necessidades do ser humano e das sociedades. Para o coordenador acadêmico da Unipampa, Muriel Pinto, esse campo de estudo “desempenha um importante papel no desenvolvimento dos municípios, pois trabalha com as organizações que o ser humano usufrui diariamente, como os meios de comunicação e os órgãos legisladores e assistenciais”, afirma. Ele complementa: “se não fosse essa área, o homem não teria informação de qualidade e não teria direitos assegurados por leis.” Os cursos das Ciências Sociais Aplicadas, disponíveis em São Borja atualmente, são Direito, Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Relações Públicas e Serviço Social (na Unipampa), Gastronomia e Gestão de Turismo (no IFFar) e Gestão Ambiental (na Uergs). Para a coordenadora do Curso de Gestão de Turismo, Eliane Martins Coelho, a presença dessa graduação no município mostra-se de real relevância para fomentar e melhorar o turismo local. “São Borja é uma cidade com um grande potencial turístico, e os estudantes do curso aproveitam isso para realizar novas experiências nos museus e entidades ligadas à cultura, gerando novidades e melhorando aos poucos o turismo daqui”, considera Eliane. Outra área de graduação existente na cidade, que, a propósito, possui os cursos mais bem avaliados, segundo o Ministério da Educação, é
Estágios supervisionados como oportunidades de trocas
Instalações da Unipampa, IFFar e Uergs demonstram a qualidade do ensino ofertado pelas instituições
Os cursos das áreas de Sociais Aplicadas e Humanas, como já visto, abrem um leque de oportunidades de atuação junto à comunidade são-borjense, através de pesquisas acadêmicas e projetos de extensão. Entretanto, essas não são as únicas formas de cooperação entre as universidades e o município. Os estágios supervisionados são outra contribuição que gera resultados relevantes. É o caso do envolvimento de estudantes e professores em entidades importantes de São Borja, como as assistenciais. A Unipampa possui uma parceria de estágios consolidada com a Secretaria Municipal de Assistência Social, oportunizando a troca de experiências e conhecimentos entre os acadêmicos do curso de Serviço Social e profissionais já formados na área. A coordenadora do curso de Serviço Social, Jaqueline Quadrado, enfatiza que a maioria dos estudantes desenvolvem seus estágios obrigatórios supervisionados em órgãos como os Conselhos Tutelares e Centros de Referências em Assistência Social (CRAS). Para ela, “nesses locais, os acadêmicos colocam em prática as pesquisas de referência que a Universidade desenvolve. No nosso caso, [são] voltados à proteção de crianças e adolescentes, sem falar na contribuição de mão de obra nos bairros periféricos para a Secretaria de Assistência Social”, salienta. Os cursos de Comunicação da Unipampa também geram resultados interessantes para a empresas e entidade na cidade. Para o coordenador do curso de Jornalismo, Leandro Comassetto, os estágios nessa área vêm beneficiando há anos a comunidade local. “Algumas pessoas podem não perceber, mas veículos de comunicação, principalmente as rádios, se inovaram, assim como a parte publicitária de empresas dos mais diversos setores, motivada, em grande parte, pela participação dos estudantes de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas durante os estágios”.
Contribuição econômica Além da relevância e contribuição dos cursos que as instituições públicas de ensino superior oferecem em São Borja, o impacto econômico que eles causam na cidade é significativo. Dados da Coordenação Administrativa do campus local mostram que, se a Unipampa fosse uma empresa, apenas para efeito de comparação, ela seria a quinta maior de São Borja, em números absolutos de arrecadação ao município. Em 2019, entre os 1.043 alunos regulares e de mestrados da Unipampa e dos 1.000 do IFFar, cerca de 900 são oriundos de outros locais do Brasil. Segundo estudos realizados pela Coordenação Acadêmica da Unipampa São Borja, em média, cada um desses estudantes gasta, por mês, levando em conta despesas com água, aluguél, internet e luz, cerca de R$ 500,00. Anualmente, a soma de todos esses valores, gerados por estudantes que vieram de fora, chega à casa dos R$ 5 milhões.
Como será que o contingenciamento do governo federal pode afetar as estruturas do IFFar e da Unipampa? No Facebook da i4 você confere um vídeo bem explicativo sobre o assunto.
Hospital Municipal Ivan Goulart realiza, em média, 150 atendimentos emergenciais e de urgência, por dia.
A busca por atendimento médico Os obstáculos para obter atendimento de saúde público e de qualidade na cidade de São Borja Por:
Milena Vançan
No Brasil, a saúde pública conta com o SisSão Borja, existem grandes dificuldades, como tema Único de Saúde (SUS). Tal sistema deve as filas de especialistas e exames e a falta de dar cobertura para todos os brasileiros. De recursos para concluir a obra da Unidade de acordo com informações do site do MinisPronto Atendimento (UPA), que pode ser contério da Saúde, mais de 70% da população ferida nesta matéria. brasileira conta unicamente com o SUS Isso A falta de Unidade Terapia Intensiva Neosignifica que menos da metade da população natal (UTI Neonatal) também é um problema. tem acesso a planos de saúde ou De acordo com a chefe de en“Esperei sete fermagem do Hospital Municipal algum tipo de convênio. Esse sistema, que serve de modelo para Goulart, Micheli Chiquim, a meses para Ivan outros países, vêm enfrentando instalação de uma UTI Neonatal, alguns desafios, como deficiência fazer o exame. conforme a Portaria nº 930, de 10 na estrutura física, falta de dispomaio de 2012, prevê diretrizes Quando me de nibilidade de equipamentos, mepara o atendimento integral e hudicamentos ou materiais e a ca- chamaram para manizado ao recém-nascido grarência de recursos humanos. Em ve e os critérios de classificação e
fazer, fizeram o exame errado...”
habilitação de leitos de Unidade Neonatal no âmbito do SUS, possui como requisito 1000 de nascidos vivos por mês e São Borja não alcança esse número, impossibilitando a implementação, já que os custos seriam muito altos para a sua manutenção. Além do Hospital Municipal Ivan Goulart, São Borja conta com treze estruturas de Estratégia e Saúde da Família (ESF), que, segundo a Secretaria Municipal da Saúde, atendem 22 consultas por dia. Ao todo, são 5.800 consultas mensais, o que gera uma longa fila de espera de pacientes à procura de atendimento médico especializado. O aposentado Augusto Túlio do Nascimento, 63 anos, é um dos prejudicados “Eu fui fazer uma consulta e a médica me mandou fazer um exame. Esperei sete meses para fazer o exame. Quando me chamaram para fazer, fizeram o exame errado, fizeram endoscopia e só fiquei sabendo quando eu levei para a doutora e ela disse que não era esse exame que ela havia pedido”. O aposentado não sabe quando será possível realizar o exame correto, o que gera preocupação, já que ele está na fila para um exame ortopédico há meses, sem previsão para realizá-lo. O caso de Nascimento, infelizmente, não é o única ocorrência que demonstra o descaso e a superlotação dos locais de saúde pública na cidade. Pacientes com doenças crônicas também são afetados pela falta de atendimento especializado público gratuito. A dona de casa Neiva Garcia Lopes, 54 anos, ficou na espera para realizar uma biópsia (procedimento cirúrgico para a retirada e análise de tecidos e células) durante dois anos. “Quando surgiu o problema no meu fígado, a doutora fez um pedido da biópsia e, daí, eu tentei fazer. Tentei de todas as formas e não conseguia, fiz o pedido para a Secretaria da Saúde, me mandavam de um lado para o outro e nada de conseguir fazer a biópsia. Fui encaminhada para outro médico, que solicitou a biópsia também. Daí, eu já estava com dois pedidos de biópsia para fazer”. Há cinco anos, ela realiza tratamento contra a hepatite, em Porto Alegre.
Augusto Túlio do Nascimento, 63 anos, espera que seu próximo exame seja realizado daqui a sete meses
Neiva Garcia Lopes, 54 anos, reclama sobre a dura viagem, até Porto Alegre, para realizar seu tratamento
Como as opções de atendimento médico são limitadas na cidade, a população são-borjense acaba buscando outras possibilidades de suprir e auxiliar a demanda de pacientes. A Liga Feminina de Combate ao Câncer, criada em julho de 1977, é uma das organizações voluntárias que mais recebe e ampara pacientes com câncer. Hoje, a cidade não fornece tratamento de oncologia gratuito, através do SUS. Por isso, a Liga encaminha esses pacientes a outras cidades, como Uruguaiana, Ijuí, Santo Ângelo e Porto Alegre. A presidente da Liga, Cássia Santos Pereira, destaca que a entidade atende em torno de 70 pacientes em situação de carência. Estes não podem arcar com os custos de um tratamento particular, ou pagar um convênio. O auxílio social também integra as ações da Liga. “O que é que podemos auxiliar a pessoa carente que tem tratamento? Medicamentos, a pessoa tendo uma receita atualizada do médico, a gente não pode medicar, nós não temos nenhum médico voluntário aqui. Então, nós só podemos comprar o remédio se a receita for válida. Fraldas, alimentação, porque muitas pessoas usam aquela sonda nasoenteral e é bem caro o leite que que vem preparado sabe, vem da prefeitura. Tem como conseguir pelo governo, mas demora, às vezes, 30 dias para começar a vir, para fazer toda a papelada, então... A Liga, nesse período, auxilia com a compra desse leite, cestas básicas”, relata Cássia.
Falta de tratamento leva pacientes a hospitais de outras cidades
Uma das maiores dificuldades encontradas pelos pacientes que realizam tratamento fora de São Borja é a logística envolvida, como transporte, alimentação, estadia na cidade onde realizam as consultas médicas. Para o barbeiro Júlio César, de 70 anos, que realizou transplante de fígado e, por isso, precisa de tratamento e acompanhamento especializado o maior problema, hoje, é ter que se locomover mais de 500 quilômetros, em uma viagem de quase 10 horas. Ele realiza o tratamento há 4 anos, na Santa Casa de M i s e r i c ó rdia, em Porto Alegre “No meu caso, o que mais dificulta é o transporte [oferecido pelo município]. Ele não oferece banheiro e, para quem tem problemas urinários, que precisa usar o banheiro, para quem tem dificuldade de urinar, é um problema. A distância também é um problema. Agride muito a pessoa que tem problema de saúde”. A Prefeitura Municipal de São Borja oferece transporte gratuito para pacientes que realizam tratamento médico em outras cidades. As viagens são feitas com veículos da Secretaria da Saúde, que atendem
dentro e fora do município. Atualmente a frota possui 32 veículos cadastrados, mas de acordo com o Assessor Administrativo Central de Veículos, Denilson da Cruz, nem todos funcionam ou fazem viagens fora da cidade: “Entre esses 32 veículos dentro da Secretaria, nem todos viajam para fora do município, pois nessa conta entra as Ambulâncias SAMU, vans e micro-ônibus, que atendem, outros carros que não têm mais condições de uso, pelo excesso da idade, excesso de velocidade, mau uso. Então para viagem nós temos 16 carros em uso”. Segundo a Prefeitura, são realizadas entre cinco a 12 viagens por dia, atendendo mensalmente, em média, 1800 pacientes cobertos pelo SUS.
Você sabe como o funcionamento da Unidade de Pronto Atendimento ajudaria na saúde em São Borja? Saiba sobre o assunto no vídeo na página da i4. Júlio César, 70 anos, realiza tratamento médico em Porto Alegre, dependendo do transporte oferecido pela Prefeitura há quatro anos
Fotos: Milena Vançan
Falta de atendimento para pacientes crônicos
Transporte disponibilizado pela Prefeitura Parte interna do transporte disponibilizado pela Prefeitura Municipal de São Borja
para pacientes que realizam tratamento médico fora da cidade
A cultura da carne em São Borja: da criação do gado ao consumo do produto Por:
Yasmin Ialuny
São Borja, interior do Rio Grande do Sul e fronteira com a Argentina, é um município histórico considerado o primeiro lugar visitado pelos jesuítas, o primeiro dos Sete Povos das Missões. No local, habitaram índios com costumes bem específicos e que, ainda hoje, cultivam. Um desses hábitos pertence também à cultura tradicional gaúcha: o churrasco. Seja na semana farroupilha, com fogueira de chão nos Centros Tradicionalistas Gaúchos (CTGs), ou no churrasco de família aos domingos, nos almoços comuns, a carne assada no espeto ou na brasa da churrasqueira é um item frequentemente presente nas refeições dos cidadãos de São Borja. Assim como o chimarrão e a roupa tradicional gaúcha, a prática de assar a carne, o churrasco, é um item cultural do Rio Grande do Sul. Segundo o sociólogo e professor Cesar Beras, os itens culturais fazem parte do conjunto de símbolos que
constroem a sensação de pertencimento coletivo. “Equivale a um conceito de valor, e, logo, aquilo que significamos como fundamental e que expressa em si nossa identidade”. Podemos exemplificar assim, quando ao voltar de uma viagem ao sul do Brasil, espera-se que tenha comido bastante churrasco, pois estes itens culturais não são apenas da categoria da autoidentificação, mas do reconhecimento e identificação do outro. O que, atualmente, é um prato típico estadual, começou apenas pela praticidade das longas viagens dos tropeiros uruguaios. Esses homens viajavam Brasil adentro (começando pelo sul), com centenas de bois e vacas. Então, a maior praticidade em relação à bagagem de alimentos era ter como opção de principal refeição o próprio animal que transportavam. Assim, um grupo responsável pelas refeições ia com alguns animais na frente de restante dos tropeiros, para abater e preparar o que todos iriam comer.
Aprendizado de gerações Na casa do funcionário público Leandro Santos de Deus, por exemplo, o churrasco é confirmado todo domingo pelo menos, pois é o “dia oficial do churrasco”. Segundo ele, é bem comum reunir as pessoas queridas para assar uma carne, seja com a família em volta da mesa aos domingos, com os colegas do futebol e do truco ou nas fazendas fora da zona urbana da cidade. Criado “para fora”, como chamam as pessoas que vivem na zona rural, ele conhece bem o ciclo da carne: desde a criação até a chegada ao prato. Foi com o pai, Antônio Cléber de Deus, que Leandro aprendeu a escolher o animal para abate, a limpar e preparar a carne para que, em algumas horas, se torne uma refeição com um cheiro que pode fazer muitos esquecerem o processo até ali. Também foi o pai de Leandro que o ensinou a fazer o churrasco que faz há mais de
16 anos como membro do Centro de Tradições Gaúchas Boitatá, onde, durante a semana farroupilha, ele e uma equipe, assam mais de 400kg de carne, (entre linguiça, galeto, ovino e bovino), nas quatro noites de jantar-baile. Enquanto isso, o acadêmico de Ciências Humanas da Universidade Federal do Pampa - Campus São Borja, Victor Amadeu, que é paulista e foi criado no meio urbano, se encantou pela costelinha do churrasco gaúcho através dos amigos que fez na Unipampa. Segundo ele, as principais diferenças entre o churrasco paulista e o gaúcho é que, em São Paulo, a carne é assada já cortada em pedaços, como bife, e não a peça inteira no espeto, como no Rio Grande do Sul. “Aqui, as pessoas assam carne durante a semana, como na quarta-feira à noite e, lá, é bem difícil a gente fazer churrasco nos dias que não seja sábado, domingo ou feriado”.
Fiscalização Essa frequência no consumo da carne é percebida também nos mercados e açougues locais. Em uma unidade de rede de supermercados em São Borja, os produtos do setor do açougue são enviados de Santa Maria, três vezes na semana, aumentando o pedido conforme a demanda. Segundo o açougueiro Airton Lima, que trabalha há 17 anos na unidade, o final do mês é o período de maior compra. As partes que as pessoas mais pedem são as partes dianteiras bovinas (peito, agulha e paleta) por serem as mais baratas e ainda macias. Já em um pequeno açougue, chegam 2 mil quilos de carnes divididos em duas vezes na semana ao longo do mês, além de outras carnes, como ovinos, por exemplo. Porém,
independente do estabelecimento onde a carne seja vendida, ambos os responsáveis pelo recebimento indicam os mesmos procedimentos de avaliação da qualidade do produto: coloração (quanto mais avermelhada, mais fresca está a peça), odor e temperatura (podendo estar em no máximo 6 graus). Com extensão territorial de mais de 3 mil quilômetros quadrados, sendo a maior parte área rural, e uma forte demanda agropecuária e agrícola, o consumo de carne se faz ainda mais presente na vida dos são-borjenses ao conviverem, desde o início da vida, com a relação do animal criado e abatido para consumo, o animal carneado, como os próprios dizem.
Apesar dessa alta proximidade com o gado e a carne através do tradicionalismo, a carne em São Borja é importada de empresas de fora da cidade. Isso diminui o estímulo ao pequeno empresário Nilton Nicole, proprietário do único abatedouro e frigorífico da cidade. Ele comenta que empresas maiores possuem tributos menores em relação à atividade exercida e que, por conta da diminuição nas suas vendas de carne, precisou diminuir a quantidade de funcionários da empresa. “O espaço tem
capacidade para abater até 40 animais por dia e nós estamos abatendo 15 por semana. É muito baixo. Então, agora, prefiro usar o lugar para terceirizar o serviço: cobro R$ 100,00 por cabeça”. O abatedouro de Nilton possuía a certificação estadual para exportação (CISPOA) do seu produto, mas, por descumprimento de alguns requisitos, como temperatura, por exemplo, perdeu este selo e, hoje, só pode vender dentro dos limites da cidade de São Borja, dentro do município.
Abigeato Segundo a Lei nº 13.330, de Agosto de 2016, o crime de abigeato é caracterizado pelo furto de animais domesticados (para criação ou produção). A lei foi sancionada para categorização e construção de estatísticas, numa tentativa de encontrar maneiras de diminuir o número de ocorrências e agravar a pena do crime. Ao condenado pelo crime de abigeato, a pena é de 2 a 5 anos de reclusão e multa. Em cidades com características agropecuárias como São Borja, o crime de abigeato se intensifica, pela quantidade de animais criados para produção e abate (como vacas, bois, galinhas e porcos) e a distância desses locais de criação do perímetro urbano. O delegado da Polícia Civil, Marcos Vianna, responsável pela área são-
-borjense, acredita que a prática criminosa é motivada pelo alto índice de desemprego e desigualdade social. “As pessoas que cometem o crime de abigeato fazem por que não têm emprego e quem compra essa carne ilegal é porque é muito mais barato do que a carne legal, vendida nos mercados”. Ainda de acordo com o delegado Vianna, este crime é o segundo em ocorrências na cidade. em primeiro lugar, é o furto (de aparelho celular). [passo a passo do que fazer em caso de abate/furto do seu animal] Mas, apesar das cinco ocorrências registradas em abril deste ano na delegacia, acredita-se que a incidência seja bem maior, mas os proprietários não denunciam.
O não registro do boletim de ocorrência, o alto conhecimento da área rural e do uso do Rio Uruguai, a falta de denúncias por parte da comunidade próxima ao local do crime e articulação dos que cometem esse tipo de delito com os clientes da carne ilegal são fatores, segundo a Polícia Civil, que tornam o crime difícil de reprimir. Essa repressão, antes, era feita também pela chamada Patrulha Rural, carros da Brigada Militar que faziam a vigilância da grande extensão que é a área rural de São
Borja. Porém, há alguns anos, essa atividade está inativa na cidade. Enquanto isso, a Secretaria de Desenvolvimento Rural promove, ao menos uma vez no mês, as barreiras de trânsito nas entradas/saídas da zona urbana. Segundo a diretora do Serviço de Inspeção Municipal, Taís Fiorin, o setor, em parceria com a Polícia Rodoviária, atua na tentativa de impedir a comercialização generalizada desse produto ilegal. Para a comercializar a carne, é necessá-
rio cumprir requisitos não só de conservação, mas abate e transporte, por motivos de saúde aos que vão consumir a carne posteriormente. Dessa forma, o Departamento de Defesa Agropecuária (RS) atua junto aos proprietários dos animais, de maneira que acompanha o crescimento do rebanho, incentiva a vacinação e fiscaliza as condições do local de criação, conservação e abate. Há uma série de doenças que é possível contrair a partir da ingestão de carne
de origem duvidosa, seja propriamente oriunda do abigeato ou de má condições de tratamento. Entre essas enfermidades: Hidatidose, Fascíola, Cisticercose, tuberculose e outras. Você está ciente sobre a possível mudança do código de conduta da cidade, proposta pela Secretaria de Planejamento, Fazenda e pelos fiscais de posturas de São Borja? Saiba sobre o assunto no vídeo na página da i4.