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Sensação de insegurança em São Borja Medo de sair sozinho à noite, deixar o celular em casa e evitar ruas escuras são reflexos da naturalização dos assaltos na cidade. Leia mais na página 2

Veja também

Os riscos da prática esportiva autônoma Página 9

Nas redes das reclamações Página 25 1

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Aumento do número de assaltos em São Borja em pauta

Por Paulo Santhias e Vitor Kellner Baixa luminosidade das ruas, como a Riachuelo, colaboram para os assaltos em São Borja. Foto: Paulo Santhias

Andar sozinho pelas ruas à noite é pedir para ser assaltado, como falam os moradores da cidade. Todos os dias é possível verificar, no rádio, a informação de um novo roubo. A história é basicamente a mesma. Horário policial, o Programa Atualidades, da Rádio Fronteira FM, do dia 4 de abril, informa: “alguém que andava sozinho pela Rua Riachuelo teve seu aparelho celular furtado por um ciclista, que fugiu em direção ao Paraboi”. Segundo o delegado de Polícia Civil de São Borja, Marcos Ramos Vianna, o crime de roubo de celular a pedestre é o mais comum na cidade, devido à facili2

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dade da troca dos aparelhos por drogas. Normalmente acontecem à noite, mas há relatos de roubos durante o dia. A baixa movimentação de veículos nas ruas e a falta de iluminação facilitam os crimes. Insegurança prevalece A sensação na cidade é uma mistura de medo e impunidade. Quem foi vítima de assalto, normalmente, prefere não comentar. Exemplo disso é o número de contatos realizados pela reportagem com uma comerciante local para realizar uma entrevista, sem sucesso. Após a segunda .

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Mtz tentativa, ela sugeriu à equipe a procura por outra pessoa. Essas sensações não são exclusivas de São Borja. Estão presentes em todo o país, conforme o advogado criminal, Iberê Teixeira. “Em partes, a sensação de medo foi devido ao estatuto do desarmamento, promovido pelo Governo Federal em 2004, pois como cidadão não pode ter posse de arma, os bandidos sabem que encontrarão a vítima desarmada. Sem o perigo de a vítima reagir ao assalto, os meliantes, que conseguem armas por vias ilegais, praticam os crimes como rotina”, afirma o advogado.

ela é elitista. A gente, que visita presídios, em questão profissional, a maioria absoluta dos presos são [negros], são pardos e são pobres. Porque eles não têm grandes recursos econômicos para contratar bons advogados, para fazer recursos, para discutir no STF [Supremo Tribunal Federal], a questão deles, por falta de recursos financeiros para pagar bons advogados. Morre em primeiro ou segundo grau, no máximo. E os ricos não, os ricos vão ao STF e o STF não julga”, complementa o advogado criminal.

Desigualdade social é a principal causa

De acordo com o sociólogo Zygmunt Bauman, um dos tipos de insegurança, que leva a outros tipos de temor, é a ontológica. Segundo Bauman, a experimentação diária de exclusão leva a um posicionamento de medo perante o mundo, Keller que, por consequLara ência, faz com que essa parte excluída da população se envolva em disputas individuais pela sobrevivência. Uma das formas de resolver a onda de insegurança, segundo o professor da Universidade Federal do Pampa, doutor em Sociologia César Beras, é “enfrentar os nós críticos sociais da violência: falta de acesso à educação, falta de acesso ao SUS, falta de emprego, miséria e etc.. Para ele, “a violência não é uma degeneração individual, mas uma relação social de uma população pobre e excluída”. Quando se fala a respeito do efeito da pu-

É preciso reparar os erros sociais

“É uma sensação de impotência, não tem o que fazer na hora. Vai reagir e tomar um tiro? Não, tu deixa levar.”

“A raiz disso está no sistema de concentração de rendas, no sistema capitalista, que concentra rendas na mão de uma minoria. Porque tu sabes que o ser humano não nasceu para ser criminoso, ele não nasce pra ser criminoso. O ser humano nasce para ser feliz. Ele se transforma em criminoso pela ação do sistema. Um sistema que não dá moradia, um sistema que não dá emprego, um sistema que não dá saúde, um sistema que não dá educação, um sistema que não dá vestuário, um sistema que não dá alimentação para a juventude. Qual é a perspectiva dessa juventude? Não tem nenhuma perspectiva, a não ser, digamos assim, cooptado pelo crime, pelas organizações criminosas”, declara Teixeira à equipe da i4. “A justiça brasileira, historicamente, 3

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Mtz O advogado criminal, Iberê Teixeira, também é escritor. Teixeira é autor do livro “Os crimes de São Borja”, que conta a história de crimes famosos da cidade. Além de outros livros sobre sobre o município. Foto: Vitor Kellner

nição dos criminosos, Beras ressalta que uma das etapas mais importantes é a ressocialização, assim como as alternativas preventivas de ingresso na criminalidade.

lidade de vida com a prática de uma atividade física, ao invés da defesa pessoal. O professor explica que ensina o caratê como uma filosofia, como na tradição japonesa, enquanto em outros locais a arte Reagir não é a saída marcial é um esporte. Na parte de competição, trata mais das questões de golTeixeira adverte que o melhor é não pes para vencer a luta. Já pela tradição reagir a um assalto. Após sofrer o furto, a japonesa, contam os movimentos tradipessoa deve denunciar aos órgãos res- cionais dos oponentes. ponsáveis. Em São Borja, o registro de ocorrência pode ser feito na 1ª Delegacia Relato de um assaltado da Polícia. “Ir atrás jamais, até porque o ladrão está preparado para te matar, mas O estudante de Publicidade e Protu não estás preparado para matar o la- paganda da Universidade Federal do drão”, ressalta Teixeira. Pampa, Unipampa, Keller Lara, foi vítima O professor de caratê, Augusto Ma- de assalto. Ele denunciou o roubo. O laranhão, também faz coro ao discurso de drão foi encontrado pela polícia e condenão reagir. Segundo ele, não é recomen- nado pela justiça. “É uma sensação de dado nem para praticantes de artes mar- impotência, não tem o que fazer na hora. ciais, porque é muito rápido. É difícil sa- Vai reagir e tomar um tiro? Não, tu deixa ber o nível de consciência do ladrão, que levar”, relata Lara. pode estar com alguma arma de fogo. Apesar de tudo, o celular nunca foi “Reagir só em um momento extrema- encontrado. Na noite do assalto, em oumente necessário para salvar a sua vida tubro de 2016, só havia uma viatura da ou a de um familiar”, reitera Maranhão. Brigada Militar para fazer a patrulha da Na cidade, a procura por artes mar- cidade, devido aos cortes de gastos do ciais é basicamente para melhorar a qua- governo do estado, situação que perdura 4

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Mtz Não reagir aos assaltos é unanimidade entre os enstrevistados Augusto Maranhão

Iberê Teixeira

professor de caratê

advogado criminal

Foto: Paulo Santhias

Keller Lara estudante

Foto: Vitor Kellner

Marcos Ramos Vianna delegado

Foto: Vitor Kellner

até hoje, em São Borja. Contraste com as vezes em que o ladrão é descoberto e preso pela polícia, mas no dia seguinte liberado. Apesar de parecer estranho para quem é leigo faz par te da normalidade do sistema penal do Brasil. O sistema brasileiro tem recursos e garantias que valem tanto para o cidadão quanto para o bandido. Antes de uma condenação definitiva em juízo, todos são considerados inocentes. É o que garante a Constituição de 1988, lei máxima do país. O advogado criminalista, Iberê Teixeira, explica que os recursos e o direito de defesa são necessários para evitar 5

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Foto: Ricardo Godoy

que um inocente seja preso por um crime que não cometeu. “Então, este sistema garantidor é que leva a polícia a prender e o juiz a soltar. O leigo fica perplexo com isso, mas é o nosso sistema.”, afirma. Tempo de espera, um teste de paciência Para solucionar um crime considerado pequeno, como um furto de celular, é necessário cerca de dois anos, conforme Teixeira. Depois de a vítima denunciar o furto na delegacia é preciso aguardar a investigação da polícia, a montagem do inquérito, a prestação depoimento, ouvir as .

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Mtz testemunhas; quando encontrar o autor ocorrem em função do vício das pessoindiciará e ele responderá ao processo. as em conseguir a droga. “Elas têm que Quando o assaltante é preso, o de- achar alguma maneira de conseguir valolegado tem 30 dias para mandar o inqué- res para trocar pela substância”. rito ao Fórum. Tanto o promotor quanto “Os crimes se avolumam de forma juiz não têm prazo para realizar seus tra- geométrica, de dois para quatro, de quabalhos, mas geralmente não ultrapassam tro para oito e os recursos da seguran30 dias. ça pública, de maneira aritmética, de um Primeiro, o promotor faz a denúncia, para dois, de dois para três. Então, quandepois o juiz marca a audiência. Então, o do o recurso para a segurança pública réu recebe o aviso de que está indicia- está em seis, a criminalidade já está em do por aquele 60”, explica o advogado. crime e tem Enquanto meprazo de 10 a didas preventivas não 15 dias para são iniciadas é preciconstituir adso seguir pelo caminho vogado. Detradicional: o boletim de pois desse ocorrência. Segundo tempo, o juiz o delegado, é preciso marca a audique o registro seja feito Iberê Teixeira ência, de acordo o mais rápido possível. com sua agenda, para ouvir as “Quanto mais cedo a potestemunhas, que são, normalmente, os lícia tomar conhecimento do fato, mais fápoliciais que atenderam a ocorrência. Se cil fica de identificar o autor e tentar tirar ele não comparecer naquele dia por estar ele de circulação”, afirma Viana. em outro compromisso, é marcada uma Entretanto, apesar do grande núnova audiência. mero de registos, a maior parte dos obApós o depoimento das testemu- jetos não é recuperada. A melhor medida nhas, o réu é ouvido, o processo vai para continua a ser a prevenção. Evitar sair as alegações finais e o juiz dá sentença. nos horários de maior possibilidade de Quem for derrotado (defesa ou promotor) assalto, das 22h à uma da manhã. Ruas recorre e, leva-se, em média, um ano. escuras e andar sozinho, facilita a atuação dos assaltantes. Vício: o sustento do roubo Procurada pela equipe da i4 Plataforma de Noticias, a Procuradoria de JusEm janeiro de 2016, foram três rou- tiça Criminal de São Borja informou que bos de celulares registrados pela polícia. não poderia gravar entrevista, no períoEm 2017, segundo a delegacia de Polícia do de apuração da reportagem, durante Civil de São Borja, o número dobrou, po- a segunda quinzena do mês de abril. Até rém, a causa é a mesma: drogas. Confor- o fechamento desta edição, a equipe não me o delegado Marcos Viana, o assaltos recebeu novas informações.

“Então, quando o recurso para a segurança pública está em seis, a criminalidade já está em 60”,

No site da i4 Plataforma de Notícias, você encontra mais informações sobre a importância de realizar o boletim de ocorrência, B.O. Leia em: http://zip.net/bstKzn 6

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Mtz Legislação e Funcionamento As leis que regem o sistema penal brasileiro são elaboradas pelo Congresso Nacional. No Brasil, ele é formado pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados. Logo, 81 senadores e 513 deputados federais elaboram e fiscalizam as aplicações das leis no país. Os senadores representam as unidades da federação, os 26 estados e o Distrito Federal, e os deputados são a representatividade do povo. Como essas duas categorias são cargos eletivos, eleitos pelo voto popular, o sistema penal é produto da sociedade. Dentro desta hierarquia, os juízes analisam, interpretam as leis e julgam os casos; os delegados e policiais cumprem as ordens de prisão ou liberação dos acusados. Aos advogados cabe defender os direitos dos réus (acusados) a partir das leis do sistema penal. Segundo esse sistema, todo réu tem direito a advogado. Caso o acusado não tenha condições de pagar pelos serviços e o município não possua um defensor público, passa ao governo a obrigação do custeio de um profissional. O Supremo Tribunal Federal (STF) é a última instância da justiça brasileira. Como lá são apenas 11 ministros para analisar casos de todo o país, a maioria dos processos demoram. Durante este tempo, por não ter sido condenado em juízo definitivo, é possível que o réu aguarde o julgamento em liberdade. ________________________________

Saiba

O Momento i4 conversou sobre a violência na cidade. Foram dois boletins dedicados ao tema. Uma enquete nas ruas ouviu a opinião dos são-borjenses. Confira os depoimentos em: https:// soundcloud.com/user-936066116/ sao-borjenses-falam-sobre-a-violencia O outro boletim traz dicas de como se prevenir contra o aumento dos assaltos na cidade. Ouça: https:// soundcloud.com/user-936066116/ violencia-urbana-em-sao-borja Um post no Facebook da i4 Plataforma de Notícias explica em que casos os boletins de ocorrência podem ser realizados pela web. Veja: http://zip.net/bstKF5

As informações a respeito do funcionamento e dos ritos da legislação brasileira foram explicadas pelo advogado criminal, Iberê Teixeira.

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ATIVIDADES, ESPORTES e EXERCICIOS FISICOS OS RISCOS E OS IMPACTOS DA PRÁTICA AUTONOMA E INDEVIDA A motivação e a autonomia pessoal são considerados pontos relevantes dentro das práticas esportivas. 12,5% da população já deixou de praticar esportes devido a iniciativas sem orientação médica, resultando em lesões parciais ou definitivas ou com sobrecarga de suas limitações.

Produção, apuração, layout e diagramação Karine Bianchin Todas as imagens e vetores foram retirados do site Depositphotos, link - https://br.depositphotos.com/home.html


Mtz ATÉ ONDE EU POSSO IR? É uma dorzinha aqui, outra ali. É las atividades movimenta uma parte da o pescoço que dói, a coluna que trava, população que quer estar em forma, ou até mesmo o joelho que endurece. seja ela com a balança ou correndo A indisposição toma conta e dificul- atrás do equilíbrio mental e psíquico. ta ainda mais a motivação em seguir Conforme o cardiologista Rogério praticando algum esporte ou atividade dos Santos, as práticas de exercícios física. “Na hora, eu pensei que fosse e atividades esportivas são benéficas apenas uma torção. Fui para casa e para o ser humano, pois quando a estentei corrigir, mas não trutura física se desenera nada do que eu penvolve, hormônios como 12,5% que sava”, diz Salomão Dua endorfina (substância dizem gostar da arte. Diariamente, são produzida no organismo queixas e atitudes como que gera prazer, neutraprática, mas que essas que alguns proliza o corpo e a mente tiveram de fissionais da saúde ene alivia a dor) são libecontram em seus con- parar por problemas rados, o que tranquiliza, sultórios. A autonomia apetece e traz felicidade saúde, a maioria estabelecida por muitas de, renova o indivíduo. pessoas pode provocar Embora exista um desenvolvidos sérios danos. Mas, afigrande movimento produrante as nal, o que leva a tantos vocado pelos amantes atividades. desconfortos? do esporte, outra parceNo Brasil, 54,1% la da população preocuda população pratica pa, pois 45,9% são deatividade física ou algum esporte, se- clarados sedentários. Muitos alegam gundo dados do Diagnóstico Nacional não ter tempo, devido a tarefas como do Esporte, desenvolvido pelo Minis- trabalho/estudo, outros por não entério do Esporte. A ideia de colocar contrarem resultados satisfatórios ao o corpo em movimento vai além dos benefícios nervosos e musculares. 41,4% diz que o foco é a qualidade de vida e o bem-estar. Outros 37,8% acreditam na melhoria do desempenho físico, enquanto que apenas 8,9% remetem essa prática ao âmbito profissionale por indicações médicas. A diversida de encontrada na busca pe


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praticarem. Alguns atribuem ao cansaço, à preguiça e à desmotivação, mas o mais preocupante são os 12,5% que dizem gostar da prática, mas que tiveram de parar por problemas de saúde, a maio preocupa, pois 45,9% são declarados sedentários. Muitos alegam não ter tempo, devido a tarefas como trabalho/estudo, outros por não encontrarem resultados satisfatórios ao praticarem. Alguns atribuem ao cansaço, à preguiça e à desmotivação, mas o mais preocupante são os 12,5% que dizem gostar da prática, mas que tiveram de parar por problemas de saúde, a maioria desenvolvidos durante as atividades. Agora sim, está explicado o porque de tantas queixas e reclamações nos consultóriOS médicos. A vilã disso tudo é a prática inadequada dos esportes e atividades físicas.

ATENÇÃO! É HORA DE CUIDAR DA SAÚDE Para aprender qualquer modalidade, seja ela de dança ou esportiva, desenvolver um exercício, ou até mesmo começar uma dieta, é muito fácil. Com os avanços da tecnologia e facilidade de acesso, os dispositivos móveis como smartphones se tornaram aliados dos esportistas. Basta apenas um clique e motivação que o “expert” da atividade física nasce dentro de você e é aqui que está o maior perigo. O professor e preparador físico, Rodrigo Miranda, diz que, com a proximidade da informação, muitas pessoas têm acesso a recomendações sobre diversas formas de treina-

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Mtz mento nas diferentes mídias, o que as leva ao engano de achar que estão em plenas condições de realizarem aquela atividade. Mas o que muitos não percebem é que cada um tem um biótipo. Um exercício que é bom para um indivíduo, para outra pessoa já não é adequado. Ele reforça que o maior erro dessas pessoas é pular etapas do processo de iniciação, pois, na avaliação inicial, se detectam muitos problemas, tais como hipertensão arterial e algumas patologias. Segundo o cardiologista Santos, as lesões mais comuns em iniciantes são as ósseo musculares, relacionadas a torções, rompimento de tendões e ligamentos, ou as famosas distensões musculares. Ainda diz que isso ocorre devido à negligência que muitos cometem antes e depois da prática esportiva. “O nosso corpo está programado a fazer o que ele é acostumado e, quando saímos da estagnação, ele tem que ser condicionado antes do impacto”, explica. O ideal seria desenvolver um aquecimento

prévio antes do exercício e um alongamento estendido ao final. É desse jeito que o corpo se prepara e relaxa, em vez de ficar sobre tensão.

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Mtz A relação entre rotina de vida, corpo, atividades esportivas e os riscos da prática de forma inapropriada. Dois casos diferentes e opostas. Um esportista, treinado e com o condicionamento físico de atleta. Uma jovem acima do peso, sedentária, frente a frente com a autonomia e o despreparo.

ALÉM DOS LIMITES DO CORPO as os iniciantes nem sem- com instruções na escola e quartel, o pre estão direcionados ao que motivou a sua persistência. Prescaminho das lesões. Muitos tes a se tornar um maratonista, no seesportistas, ícones fitness, gundo semestre de 2016, Duarte sofreu acabam se lesionando por uma lesão grave, que comprometeu o exigirem demais de seu futuro. Nas parseu corpo e ultrapastidas de futebol sua “No primeiro momento, sarem os limites esfunção sempre foi o tabelecidos. tu pensas que não foi tão gol, defender. Jogar O servina linha não fazia grave, tu já estás acostudor público Salomão mais parte de suas Duarte, esportista mado com lesões, mas, ao partidas, o seu coramador, vê nas mo- mesmo tempo, teme, pois po já estava condidalidades de corrida cionado a realizar o estalo foi tão forte, que aqueles movimene futebol uma complementação de sua tos, pois os efeitos aí tu pensas em tudo o rotina. Para ele, prada corrida permitiam que tu podes fazer e o que ticar essas atividaque aquele espades faz parte de sua ço entre as goleiras não podes. vida e se tornou um fosse seu limite. hábito que ele não Mas em uma consegue deixar de lado. Com uma ausência de alguns jogadores, foi dehistória repleta de disputas, desde sua safiado a enfrentar duas modalidaadolescência carrega a paixão pelo es- des diferentes do seu habitual – joporte e diz que a sua inserção não con- gar em uma quadra society, ou seja, tou com acompanhamentos médicos, de grama sintética, e atuar na linha. muito menos profissional. Ele contava Duarte comenta que, na hora, pensou


duas vezes Para ele, foi o fim antes de do sonho de ser entrar na maratonista e quadra. Ele sabia de também a última seu condiparticipação em cionamenpartidas de to. Já estava sentindo futebol. a sua coxa, devido aos treinos para a maratona. Então, ele fez a escolha que comprometeu as suas atividades: entrou em quadra. Foi dominando a bola que ele escutou um estalo tão forte e tão alto que, na hora, o fez parar. “No primeiro momento, tu pensas que não foi tão grave, tu já estás costumado com lesões, mas, ao mesmo tempo, teme, pois o estalo foi tão forte, que aí tu pensas em tudo o que tu podes fazer e o que não podes. Nesse momento tu pensas: o que eu vou fazer? Sabendo o processo de tratamento de lesões, te remetes às orientações médicas para recuperação, os medicamentos adequados. Até a primeira instância, tu já sabes o que vais fazer, começas a tratar, mas passam dois, três dias e não melhora, o susto é grande”. Rompimento do ligamento cruzado, rompimento parcial do ligamento colateral interno, edema ósseo, infecção femoral e infecção na musculatura da coxa foram os resultados daquela partida de futebol, que deveria ter sido apenas uma diversão. Para ele, foi o fim

do sonho de ser maratonista e também a última participação em partidas de futebol. Além dos problemas físicos, o psicológico é o mais preocupante, pois trabalha diretamente com a autoestima de um atleta. O cardiologista Santos diz que a prática esportiva, através da adrenalina e da endorfina, melhora o condicionamento físico, mas, acima de tudo, ativa o cérebro, proporcionando uma melhora na vida da pessoa. “Psicologicamente é muito ruim, te desestrutura. Depois do diagnóstico, tu vês que aquilo que tu achavas em ser forte o bastante é mentira e o quanto o teu corpo é sensível, mesmo estando muito bem treinado”. Como indicação médica, Duarte encontrou no ciclismo uma válvula de escape. No início, era somente para reconstruir a lesão, mas depois, com oconhecimento aprofundado, encontrou na modalidade um recomeço. Hoje, com o tratamento intensivo, pedalar se tornou sua mais nova paixão. Além de ser benéfico ao organismo, estimula a regeneração muscular, o que possibilitou que ele pudesse dar os primeiros passos em uma corrida novamente. O caso do Duarte é apenas mais um dentre milhares, dá dimensão ao problema relatado, que ocorre todos os dias. Ele aconselha que, mesmo repetitivo, o essencial é procurar um médico especialista e realizar uma série de exames e avaliações para saber até quando o seu corpo aguenta os impactos.


Salomão Duarte, após receber premiação em corrida.

No início, era somente para reconstruir a lesão, mas depois, com o conhecimento aprofundado, encontrou na modalidade um recomeço. Hoje, com o tratamento intensivo, pedalar se tornou sua mais nova paixão.

Duarte se preparando para uma competição de ciclismo


Mtz ENTRE O ESTÍMULO E O IMPULSO

atividades que auxiliou na perda de peso – a zumba. Foi entre colocar uma legging, um tênis e abrir o notebook que, em 30 minutos diários, divididos em blocos e pausas, ela começou ali mesmo, na sala de casa. Na hora, ela não pensou em mais inha 121 quilos, aos 19. “Eu nada. Apenas deixou a motivação tonem imaginava que estava tão mar conta. O que ela não pensou é nos pesada. Sabia que estava gor- riscos que essa atividade poderia ocada, mas com 121 quilos? Nem sionar. Segundo o cardiologista Rogépensar”, conta a estudante, Denise Kul- rio dos Santos, a pessoa que possui mann Velasques. Vaidotendência e/ou é acisa, nunca deixou que ma do peso, ao praticar “121 quilos, aos 19. sua autoestima ficasse uma atividade pode conEu nem imaginaabalada. Mesmo com tribuir para o desenvolsuas medidas, o estilo va que estava tão vimento de uma doença próprio e a permanência cardiovascular, assim pesada. Sabia que na moda sempre estivecomo desencadear uma ram presentes. Embora estava gorda, mas hipertensão arterial, ou não se importasse com até mesmo sofrer um com 121 quilos? as aparências, Denise acidente vascular cereNem pensar” percebeu que seu peso bral (AVC), ou qualquer estava passando dos liagravante, como a isDenise Kulmann mites. Em um dia qualquemia hemorrágica. quer, como ela mesmo Por sorte, o seu orgadiz, ao perceber a disposição de seu nismo se comportou bem e, nos seis companheiro em chegar do trabalho e meses que se sucederam, nenhuma ainda assim cuidar do corpo, decidiu lesão a acompanhou. Além dessas atimudar sua vida e as suas medidas. vidades em casa, decidiu, também, coAmante do esporte, Denise prati- mer controladamente e traçar sua prócava boxe há três anos e sempre amou pria dieta. estar ativa. E foi no dia 10.10.2016, No primeiro mês reunindo boxe, que o seu processo de emagrecimento zumba e dieta, ela perdeu 6 quilos. mudou completamente a sua rotina. No A emoção em observar os resultados momento em que o namorado, após foi maior que a culpa e os questionaum dia inteiro de trabalho, sair de casa mentos sobre o porque de ter transe ir malhar, ela se abriu para uma das formado o corpo naquelas dimensões.


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Mtz O processo de transformou em satisfação. Denise conta que não procurou a ajuda de profissionais anteriormente porque sentia vergonha. Vergonha por não conseguir caminhar, vergonha de realizar os exercícios e ser criticada, ou até mesmo julgada por estar naquelas condições e os motivos que atribuiriam as suas medidas. Através desses resultados que, ao fechar os primeiros 30 dias de sua nova vida, ela decidiu procurar ajuda. A reeducação alimentar serviu para evitar o efeito sanfona, que é ganhar e perder peso constantemente. Para ser mais eficaz, ela decidiu abrir mão da autonomia e passou a procurar auxílio médico e de profissionais capacitados. Nutricionista, reingresso no box, musculação uma vez na semana e muita caminhada foram os desafiosdo segundo mês de emagrecimento.Após muito esforço,

Para ele, foi o fim

conseguiu do sonho de ser perder mais 10 quilos no maratonista e segundo mês. Até agora, em também a última 60 dias, foparticipação em ram16 quilos, partidas de co m eç a n d o futebol. sozinha e expandindo suas atividades para o auxílio profissional. “Quando os resultados foram aparecendo, as fotos sendo comparadas, é muita alegria, melhor sensação do mundo. Eu só queria acordar e ir para a academia, o corpo tão maravilhoso que já ia se adaptando à alimentação, aos treinos e eu só queria cuidar dele, oferecer alimentos saudáveis. O corpo é minha casa, onde eu moro. Tudo que estava ao meu alcance e todo o meu esforço: eu daria o meu melhor, digo e repito. Após um mês se passar, só temos a querer mais e


Mtz mais, pois os resultados vêm e, com eles, o vício de malhar e cuidar cada vez mais”. Hoje, Denise está com a autoestima nas alturas. Como ela descreve, sua vida é outra. Condicionamento físico, respiração, pressão arterial, organismo saudável, disposição, são alguns dos benefícios que ela conquistou ao eliminar 43 quilos. Levando uma vida fit,

busca divulgar sua experiência através de um blog pessoal: @emagrecendocomadehh. No espaço, ela relata sua rotina diária, buscando motivação para seguir

em busca do seu ideal, além de incentivar outras pessoas a se sentirem capazes de emagrecer, principalmente com a ajuda de profissionais responsáveis.


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O LADO POSITIVO DAS ATIVIDADES Quem pensa que o esporte ou os exercícios são os vilões está enganado. Pesquisas comprovam que a atividade física, além de melhorar o condicionamento físico, neutraliza as funções cerebrais, melhora a circulação sanguínea, os batimentos cardíacos e ajuda a prolongar a vida. Mas para isso tudo ser eficaz e fazer sentido, é necessário muita cautela e uma série de cuidados. Para iniciantes, é necessária a avaliação de um profissional, através da qual sejam atestadas e definidas as condições do corpo. Detalhes importantes, como pressão arterial e teste de condicionamento, ajudam a perceber problemas mais sérios. Para o doutor Rogério, os exercícios e esportes são fundamentais, principalmente para as pessoas acima dos 45 anos. fisioterapeuta ou médico, deve existir e o

mesmo conhecer as limitações do praticante, assim como saber sua ficha clínica. “Você quer evitar a dor, dê um medicamento, mas se você que tirar a dor, dê uma atividade física”, complementa. Além do acompanhamento direto, outras medidas importantes devem ser atribuídas às práticas corretas. Usar roupas leves e confortáveis, que não limitem movimentos, tênis com amortecedor adequado, que não cause impactos, estar bem alimentado e hidratado são alguns itens essenciais para um bom desenvolvimento, conforme o instrutor Rodrigo Miranda recomenda. É seguindo essas dicas, buscando orientação adequada e não deixando a autonomia sobressair o seu limite que os resultados aparecerão, sendo a longo ou curto prazo.


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Durante a atividade física, o nosso corpo se ativa. Ondas cerebrais são emitidas, fazendo com que os órgãos e todo o sistema respiratório e cardiovascular aja, fazendo com que a circulação sanguínea percorre pelas veias e demais partes do corpo. Devido a todo esse trabalho, alguns cuidados são indispensáveis antes de praticar qualquer atividade, seja ela uma simples caminhada ou até uma partida esportiva, independente se volei, futebol, basquete, entre outras. O organismo necessita estar muito bem preparado, aquecido e alongado para não sofrer impactos que possam causar problemas sérios. A pratica inapropriada não causa somente lesões físicas. Um dos problemas mais comuns e sérios desenvolvidos, são os cardiovasculares. Entre os mais comuns estão as arritmias cardíacas (quando os batimentos stão

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ATÉ ONDE O CORAÇÃO ACOMPANHA O CORPO


acelerados demais, ou muito devagar e também descompassados, o que pode levar a um ataquer cardíaco), hipertensão arterial (quando a pressão sanguínea, sobe demais e pode ocasionar um infarto), infarto (ocorre quando há obstrução arterial), e os acidentes vasculares cerebrais - AVC (quando há obstrução ou rompimento de uma das artérias ou vasos que levam o sangue ao cérebro, e essas não funcionam direito, fragilizando a circulação sanguínea, ver número 1 e 2 no coração). Segundo o Cardiologista Rogério dos Santos, ára evitar estes casos graves, é necessário fazer uma avaliação, procurar realizar exames de condicionamento físico ou esteira (onde o paciênte é colocado sobre teste de resistência física). Se exercitar é bom, mas cuidar do coração é o fundamental para que tudo ocorra de forma correta. Alimentação saudável, exercícios regulares e evitar gorduras é o principal.


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A C A D E M I A

D A S A Ú D E

OS PONTOS POSITIVOS E NEGATIVOS Quando observados os índices de abandono da prática esportiva, 1,4% justifica o sedentarismo à falta de recursos financeiros. Desculpa ou não, hoje, várias práticas alternativas e gratuitas estão à disposição do público. Uma delas é a caminhada. 15 minutos diários, segundo o doutor Santos, já ativa e melhora a circulação sanguínea, ativa as funções cerebrais e trabalha o condicionamento físico. Outras alternativa gratuita são as academias da saúde, conhecidas como academias ao ar livre. Elas são um compilado de vários aparelhos de ginástica, diferenciados dos convencionais de academias, onde para levantar peso, basta a pessoa trabalhar com o próprio corpo. Uma das características marcantes destes espaços são as cores vibrantes. É amarelo com vermelho, azul com verde, azul com amarelo, enfim, o objetivo é chamar a atenção da comunidade local para essa oportunidade que está acessível a quem quiser utilizar. O programa Academia da Saúde foi implantado, no Brasil, no ano de 2011, sob a regência do Ministério da Saúde. Após pesquisa, segundo os dados da Cartilha da Academia da Saúde, o projeto foi definido como alternativa para minimizar os índices de adoecimento


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e mortalidade por doenças crônicas e também pelo crescimento desordenado da obesidade e casos de peso excessivo. Subsidiado por duas portarias nacionais, engloba a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) e a Política Nacional de Promoção de Saúde (PNPS). Em parceria com o Sistema Único de Saúde e as Estratégias de Saúde da Família, o projeto busca promover, além das práticas corporais e atividades físicas/esportivas, o acompanhamento nutricional, com alimentação saudável, hábitos de vida saudáveis, além de promover a saúde, prevenindo doenças crônicas que não são transmissíveis. Para consolidar a instalação efetiva no município, a prefeitura e o órgão competente responsável devem solicitar o pedido dos equipamentos e, para aprovação final, é obrigatório que, no quadro de funcionários, exista um profissional responsável por fiscalizar e prestar serviços de manutenção. Na cidade de São Borja, conforme a secretária de Turismo, Cultura e Eventos, Carolina Aquino, o funcionário responsável está visitando as academias locais, preenchendo um laudo de conservação, que conta com dados como a usabilidade, frequência, resistência dos materiais e estrutura. A Secretaria não possui uma posição, ainda, sobre o estado atual dos aparelhos da academia da saúde, mas em breve

deverá tomar medidas quanto a isso. As academias apresentam os dois lados. Um é o do custo benefício, proporcionando atividade física e esporte a quem não tem renda suficiente, disponibilizando um funcionário de educação física para desenvolver atividades dentro das ESF’s. Outro é a ideia de que a sua estrutura compromete o desempenho corporal e a estrutura física do corpo, através do desenvolvimento de atividades incorretas, com aparelhos assimétricos, sem instruções de um profissional, motivando a prática inadequada de exercícios e atividades esportivas. Algumas pessoas, acreditam que para se exercitar, basta se deslocar até uma unidade dessas academias e fazer a série descrita em uma placa auto-explicativa. Porém, é necessário o acompanhamento, a valiação junto a um profissional e o desenvolvimento da ficha para acompanhamento dentro de uma ESF. Alguns especilistas na área de educação física dizem que a estrutura das academias ao ar livre não é comprometedora, o que é eficaz para o exercício gerar resultaodos, é como ele é executado. Miranda, como professor, acredita que isso seja apenas uma observação de fora, pois a instalação dessas academias, além de motivar contra o sedentarismo, é uma excelente prática, se bem instruída, de exercícios físicos.


Todas as imagens foram retirados do google imagens, marcadas para a reutilização.

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Cultura deve ser pauta dentro e fora da sala de aula Jornal Folha de São Borja

Por Valnir Peralta e Rosana Ruviaro Da grandeza dos palcos à simplicidade de um quarto, de um programa de televisão com grande público a uma rua vazia. As manifestações culturais estão intrincadas ao dia a dia do ser humano. Elas, ainda que não percebamos, fazem parte do universo tão diversificado da cultura. Pensar a cultura remete, em primeira instância, à ideia de determinados valores representativos à existênciade grupos e comunidades com características particulares, desenvolvidas mediante experiências e práticas peculiares e em contextos específicos. A partir disso, inspira manifestações culturais, as quais são observáveis em peças de teatro, na música, costura, dança, pintura, escultura, composições em geral, artesanato, artes plásticas etc. Sob outra ótica, isto é, se for designada a partir de sua essência na língua portuguesa, a cultura, substantivo feminino, é o

Carroça Literária em plena atividade no de 2015. Esta foto foi publicada no Jornal Folha de São Borja na edição de 25 de março, daquele ano, no Caderno In Folha.

cultivo de célula ou tecidos vivos em uma solução contendo nutrientes adequados e em condições propícias à sobrevivência, segundo o dicionário. Tanto na perspectiva relacional, pensada através da construção social, quanto na perspectiva substancialista, vista a partir da essência, paira sobre o termo cultura aspectos relacionados à existência, vida e pertencimento. A cultura, enxergada para além dos muros da manifestação cultural, influencia o modo de pensar e agir dos

Sair do ‘beabá’ do conteúdo ajuda a resgatar o comprometimento e o comportamento dentro da sala de aula. É necessário que os alunos aprendam de outras formas. Daiane Felício

seres humanos. A maneira como se direcionam uns aos outros, a rotina dentro de casa, como, por exemplo, os atos de tomar café da manhã e escovar os dentes, a visão ideológica, o consumo de informações, os hábitos no mercado de trabalho e a forma de se vestir são alguns exemplos da cultura presente no dia a dia. Esta, desenvolvida através da construção social, ou seja, mediante elaboração de valores, normas, necessidades e interesses de uma parcela da sociedade. Essa estruturação de certos itens referentes à caracterização cultural configura elementos que têm influência na vida de qualquer ser humano, independente da raça, etnia, gênero, classe social ou faixa etária.


Mtz Tendo em vista que não são fatores existenciais que determinam a apropriação de temas referentes à cultura, mas sim subjetivos, faz-se necessária uma discussão em torno do consumo de manifestações culturais em âmbito escolar. Pressupondo que o desenvolvimento biológico e cognitivo de uma criança depende da tríade família-escola-sociedade, trazemos à luz, nesta matéria, o debate acerca de como o desenvolvimento da cultura no ambiente escolar pode influenciar crianças que participam de projetos que promovem esse tema. Além disso, será abordado o papel que a escola tem quanto à promoção e execução, extra ou intra-classe, de assuntos pertinentes à cultura. O município de São Borja, no interior do Rio Grande do Sul, é um dos mais antigos do estado, com 334 anos. Além da carga histórica, por pertencer a um dos sete povos das missões, a cidade é tradicionalmente conhecida como a “Terra dos Presidentes”, pois foi no mesmo solo que nasceram Getúlio Vargas e João Goulart (Jango). Em meio a essa realidade, São Borja se adequa às mais diversas adaptações culturais, seja pela história, política, cultura missioneira, tradicionalista, gaúcha, fronteiriça, entre outras. Nesta questão, as escolas têm papel primordial de transmitir a história 25

A escola, assim como a família, tem um papel preponderante no desenvolvimento cognitivo das crianças. Denise Mariano da Rocha Santos

da cidade e de temas referentes à cultura brasileira em geral, uma vez que as tradições existem, mas, se não forem apresentadas e desenvolvidas, não surtem os efeitos pretendidos por cada instituição de ensino. Dados do IDEB No último senso do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) feito em São Borja, em 2015, alguns índices chamam atenção sobre o aprendizado dos alunos. Das 20 escolas avaliadas, nove estão em situação de alerta, três merecem atenção, três devem manter o que vem sendo desenvolvido e em cinco não houve registro de dados. A partir desses números, é perceptível a dissonância que existe entre escolas bem e mal avaliadas pela pesquisa. Em um primeiro momento, ver os índices negativos quanto ao desenvolvimento escolar dos alunos de São Borja remete ao aprendizado dentro da sala de aula. Na contramão dessa consta-

tação, a diretora da Escola Estadual de Ensino Fundamental Ivaí, Daiane Felício, executora do projeto “Carroça Literária”, atenta sobre a importância de atividades extraclasse para o desenvolvimento cognitivo dos estudantes. “Sair do ‘beabá’ do conteúdo ajuda a resgatar o comprometimento e o comportamento dentro da sala de aula. É necessário que os alunos aprendam de outras formas”, comenta. Na mesma linha de pensamento, a psicóloga do Centro de Atendimentos Múltiplos (CAM), Denise Mariano da Rocha Santos, afirma que esse desenvolvimento não se dá somente mediante conhecimentos didáticos. “É também através da relação interpessoal que se estabelece entre os professores e os alunos (...) que a aquisição do conhecimento [é] facilitada ou dificultada. A escola, assim como a família, tem um papel preponderante no desenvolvimento cognitivo das crianças, cada um com sua responsabilidade”, afirma.

No site da i4 Plataforma de Notícias, você encontra mais informações sobre o andamento dos projetos culturais em São Borja. Os projetos estão afetadas pela crise financeira da prefeitura http://zip.net/bgtLgW .

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Cultura não é prioridade no município No “aprender de outras formas”, comentado por Daiane, estão elencadas as atividades culturais desenvolvidas por meio de projetos que vão além das quatro paredes da sala de aula. Na atual gestão pública de São Borja, houve uma aproximação entre as secretarias da Cultura e Educação, que pretendem desenvolver de maneira mais recorrente a questão cultural dentro das escolas. Dentre os temas que serão trabalhados, tanto em escolas municipais quanto estaduais, a música, literatura, teatro e a tradição gaúcha serão protagonistas. Outros projetos, como, por exemplo, Conectando São Borja, Carroça Literária, Leitura na Escola e Poesia Fora da Estante, já são desenvolvidos de maneira periódica e, segundo Daiane, dependem quase unicamente do empenho dos professores para que aconteçam, uma vez que

Valnir Peralta

Centro de Formação Tereza Verzeri onde Ariane Machado começou aos seis anos de idade como aluno e hoje é coordenadora pedagógica

a promoção da cultura parece não ser prioridade da gestão. De acordo com a educadora, as escolas do interior são as mais prejudicadas, visto que, quando feitos, os projetos que têm por intuito promover a cultura acontecem no centro da cidade e, tendo em vista que não há apoio financeiro para transporte, muitas escolas deixam de participar, como é o caso do Ivaí, onde Daiane trabalha, que fica a 12km da cidade. Com essa realidade, é possível perceber que a propagação da cultura, não apenas nas

escolas, mas em todos os ambientes, enfrenta dificuldades que vão além do interesse público. A falta de apoio financeiro e a monopolização das atividades acabam construindo barreiras quanto ao acesso a essas informações. Em meio ao que foi apresentado, cabe às próprias escolas desenvolverem planos para que a cultura chegue aos alunos, sem necessariamente ficar à mercê de incentivo externo e do poder público. Para que os projetos surtam os efeitos pretendidos pelos educadores, que são

O que me motiva é pensar que as crianças olham para mim e pensam: olha, a professora Ariane começou no Centro, igual a mim, desde pequenininha. Ela aprendeu as mesmas coisas que eu estou aprendendo agora. Ariane Machado dos Santos 26

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Mtz os principais promotores da cultura nas escolas, é necessário conhecer o aluno que deles participa e saber as variáveis que podem influenciar em sua vida na fase adulta. Exemplo de desenvolvimento pedagógico e pessoal com o auxílio de projetos extra-classe é de Ariane Machado dos Santos, 21 anos, que começou a estudar no Centro de Formação Tereza Verzeri ao seis anos de idade. Hoje, é coordenadora pedagógica da instituição. Para a educadora, trabalhar com o que se tem prazer é a maior satisfação existente. “O que me motiva principalmente a estar aqui no Centro é pensar que eles, as crianças, olham para mim e pensam: olha, a professora Ariane começou no Centro, igual a mim, desde pequenininha. Ela aprendeu as mesmas coisas que eu estou aprendendo agora’”. Para Ariane, a história e a aproximação que ela tem com o Centro, mesmo depois de formada, podem servir de exemplo e inspiração para as outras crianças. “Dizer para eles que, como eu consegui chegar onde cheguei, eles também podem. O meu trabalho é o que mais me motiva”, comenta satisfeita.

Inserção da cultura como estratégias pedagógicas Arquivo pessoal

Professora Daiane Felício, à direita, do Projeto Carroça Literária, recebendo a entrega de livros que foram arrecadados no ano passado, pelo Museu Ergológico da Estância

A absorção do que é entre esses dois pólos. “Ainapresentado nas escolas da existe muito de a escola e o impacto que projetos trabalhar com a família e a podem producomunidade só O aluno pode quando a coisa zir nas crianças envolvidas tem não vai bem. ser ruim em relação direta Isso é um asmatemática, com as caracpecto cultural, mas ele vai ser que está ainterísticas individuais de cada bom em outra da muito arraipessoa, como a gado à nossa coisa. Cabe faixa etária e o maneira de ver ao professor contexto social a escola”, resobservar e no qual ela está salta. inserida. Na viO interesse detectar essas são da psicóloem conhecer o habilidades. ga Denise, todo aluno e, a partir Daiane Felício trabalho desende atividades volvido com as que vão além crianças em âmbito escolar das didáticas, aproximá-lo deve ir ao encontro de an- da escola, é uma estratégia seios da comunidade para pedagógica de ensino que que haja uma aproximação auxilia na aprendizagem 27

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Mtz do estudante. “Cada comunidade tem a sua realidade, a sua cultura, os seus valores e é preciso que, se a escola está inserida naquele meio, conheça e possa trabalhar de maneira coletiva”, completa. Para que o aluno realmente absorva o que lhe foi passado e ensinado, algumas estratégias pedagógicas podem ser desenvolvidas com mais eficácia. Como comenta a psicóloga Denise, um meio para que o estudante se aproxime ainda mais do que é apresentado é inserir a cultura em boa parte das disciplinas, não apenas nas artísticas. “Em português pode-se trabalhar a poesia, a literatura de uma maneira mais aprofundada. Em história, geografia, todas ligadas às humanas, pode-se trabalhar essa parte da cultura artística. Não precisa ter uma disciplina específica

É também através da relação interpessoal que se estabelece entre os professores e os alunos, que faz com que a aquisição do conhecimento seja facilitada ou dificultada. Denise Mariano da Rocha Santos para isso”, sugere. Ariane, em sua perspectiva, também acredita que deveria haver mais incentivo por parte da escola. “Nada impede que o professor de história, geografia, ensine sobre a nossa cultura. Nada impede que em uma aula de educação física o educador incentive aquelas meninas ou meninos que gostam de dançar a aprenderem uma música”, exemplifica. “Acho que a escola junto com os professores, devem pensar métodos de abordar mais a cultura artística, despertar nos alunos

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as habilidades que cada um tem”, completa Ariane. Identificar aptidões das crianças, sejam elas sob qualquer vertente, configura um fator determinante no desenvolvimento e exploração da cultura, de um modo geral, no âmbito escolar. Segundo Daiane, todo aluno tem um talento que pode ser potencializado. “Ele pode ser ruim em matemática, mas ele vai ser bom em outra coisa. Cabe ao professor observar e detectar essas habilidades, por isso a importância desses projetos”, destaca a educadora. Ao salientar a importância de projetos que objetivam o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, Daiane dá um exemplo do quanto a atividade extra classe pode influenciar no aprimoramento do aprendizado: “Ele – o aluno – aprende mais a pensar, a raciocinar. Um exemplo: no futebol ele tem que raciocinar uma jogada e isso pode auxiliar


Mtz depois na matemática. Por isso que a gente frisa, lá na escola, no Pré 1 e Pré 2, a importância de trabalhar a parte motora das crianças. Essas crianças não escrevem, não pintam, mas trabalham motorocidade, que é o que vai resolver a parte cognitiva lá nos anos finais do ensino fundamental”, argumentou. Ariane participou de oficinas de dança e outros projetos ofertados pela escola enquanto era discente, que, segundo ela, tiveram 100% de importância em seu interesse pela cultura. “Eu sempre fui tímida, mas eu sempre gostei de fazer muitas coisas. A partir do momento que eu optei por fazer dança gaúcha, virei prenda. Em seguida fiz oficina de teatro e balé. Como estas oficinas exigem da criança habilidades de falar ao público, postura, coordenação, elas despertaram e desenvolveram em mim formas de expressão que eu não possuía”, comenta a coordenadora. Além disso, Ariane destaca a importância de estar presente no ambiente escolar para angariar incentivo a práticas culturais. “Se eu não estivesse aqui, estaria na minha casa sem desenvolver e descobrir as habilidades que tenho hoje”, completa.

Individualidade no aprendizado Tanto no que se refere a perspectivas didáticas quanto ao aprendizado cultural do aluno, é necessário que o tempo de cada criança seja respeitado para que então essas habilidades possam ser desenvolvidas. Segundo Daiane, a absorção de informações varia de acordo com a idade, pois cada criança tem uma fase de aprendizado e, durante esse percurso, não se deve pular etapas. Denise, sob uma afirmação científica quanto ao processo de aprendizado, comenta que cada faixa etária tem suas especificidades. “De acordo com a maturação neuro-psicosocial da criança, na parte neurológica, psicológica e na área da sociabilidade, a criança em determinados momentos é capaz de desempenhar algumas atividades. O importante é que não se tente acelerar isso exigindo dela mais do que pode ser feito naquele momento, nem deixar de exigir o que ela pode fazer, ou seja, não subestimar”, salienta a profissional da saúde. Em meio à realidade política e econômica na qual São Borja está inserida, o trabalho da cultura, seja dentro ou fora da escola, enfrenta dificuldades para seu desenvolvimento. De acordo com o que as três entrevistadas argumentam, cabe à escola e, principalmente, aos professores dar incentivo da cultura para os alunos. Uma vez que esta é uma área perpendicular à vida do ser humano, que o acompanha em todas as faixas etárias, as habilidades de cada indivíduo, bem como as limitações, devem ser respeitadas e exploradas para que haja engajamento com o que é proposto.

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Professora responsável: Vivian Belochio

Edição: Vivian Belochio Repórteres: Karine Bianchin, Paulo Santhias, Rosana Ruviaro, Valnir Peralta Fernandes e Vitor Kellner. Imagens: Paulo Santhias, Vitor Kellner, internet, Folha de São Borja, arquivo pessoal e Valnir Peralta Fernandes. Projeto gráfico: Karine Bianchin Diagramação: Karine Bianchin, Valnir Peralta Fernandes e Vitor Kellner Finalização: Vitor Kellner Primeira edição de 2017 do Jornal Matiz produzido da componente curricular de Produção Multiplataforma II. Elaborada por alunos do sétimo semestre do curso de jornalimo da Universidade Federal do Pampa, Unipampa - campus São Borja. Junho de 2017

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O Jornal Matiz, que você acabou de ler, é uma produção experimental do curso de jornalismo da Universidade Federal do Pampa.

nas redes sociais

As reportagens da edição foram apuradas por estudantes durante a compornente curricular de Produção Multiplatafoma II do semestre 2017/1.

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