#1 julho 2012 distribuição gratuita
CIBORGUES
SOCIAIS exoesqueletos, filtros biônicos, encubadoras salvando vidas e sistemas de captação de água no nordeste do Brasil, a nova realidade mundial proporcionada pelo design
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ENTREVISTA Renata Mendes, diretora adjunta da Associação Mundaréu fala sobre design social pág. 16 NO PAPEL incríveis projetos sociais que ainda não tiveram uma oportunidade para sair do papel pág. 18 julho 2012 |
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Mergulhe na transformação
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Projetando novos horizontes O mundo moderno torna o ser humano mais egoísta a cada dia, os indivíduos cada vez mais agem como se não fizessem parte de um todo. Um todo que possui muitos problemas a serem resolvidos. A intensão da revista de.sig.nio é fazer com que as pessoas possam se conscientizar do poder transformador que tem em mãos e para tanto escolhemos como foco o design, que tem um enorme potencial de transformação social que é desconhecido pela maioria das pessoas, inclusive próprios designers. Acrescentamos que a maioria dos problemas aqui apresentados foram e devem ser tratados com muita delicadeza, devem ser estudados a fundo e com grande proximidade para assim buscar uma coerente solução. Vale lembrar que qualquer designer, seja ele ou ela estudante ou atuante, de produto, gráfico, web ou outros, todos nós temos esse poder transformador em mãos. Basta olhar ao redor com sensibilidade. Aproveite e transforme! Peu Ishio e Isabela Jordani
de.sig.nio Equipe
Direção e Edição de arte, conceituação da marca e criação:
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Isabela Jordani
Peu Ishio
Orientação:
Apoio:
Istituto Europeu di Design
Agradecimentos Especiais: Lucas Massimo, Renata Mentes, equipe Lifesaver e equipe Trip transformadores.
Conteúdo
Revista De.sig.nio 1ª edição • julho de 2012 Capa: divulgação
No papel Incríveis projetos transformadores criados por universitários prontos para sair do papel.
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Projeto “Soft Cover “ de um grupo de Dortmund University of Applied Science and Arts, Alemanhã
Etnográfico Um ensaio sobre design social e seu alcance atual. Infográfico O aumento do alcance da água potável no Brasil Capa Os projetos prêmiados pela de.sig.nio desse mês de Junho. Perfil Renata Mendez fala sobre design social
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convertendo necessidade em demanda. O design centrado no ser humano como transformador social.
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design social é uma ferramenta de comunicação e inovação que tem como foco transformar situações de desigualdade social utilizando o pensamento metódico do design para oferecer recursos que gerem oportunidades de desenvolvimento e resgatem a cidadania e a dignidade dos indivíduos.
HCD, inovação e sensibilidade
Esse viés do design é chamado de “Human Centered Design” e recebe este nome por representar um processo que começa pelo estudo das pessoas para as quais se pretende criar uma solução. O processo do HCD começa por examinar as necessidades, desejos e comportamentos das pessoas cujas vidas se quer influenciar. A partir disso é possível transformar dados em ideias implementáveis e aumentar a eficácia na criação de novas soluções que incluem produtos, serviços, ambientes, organizações e modos de interação. O HCD pensa em soluções para combater o frio de quem vive na rua, maneiras alternativas de construir habitações, conviver de modo sustentável com a seca, criar meios para desenvolver regiões sem grande potencial industrial ou agrícola, salvar bebês recém-nascidos e coisas desse gênero. Para tal é preciso considerar três fatores: o quão desejada é essa solução, o que é possível técnica e organizacionalmente e se é viável financeiramente, formando assim os três pilares do HCD (desejo, praticabilidade e viabilidade). O design centrado no ser humano como área de atuação possui cada vez mais força. Atualmente existem muitos pro-
fissionais sensíveis, competentes e comprometidos e o assunto também conta com a atenção de empresas investidoras, governo e várias organizações. É notável que cada vez mais as pessoas estão interessadas em criar um trabalho bom para elas mesmas e para o mundo, que além de oferecer grande espaço para essa expertise, necessita muito dela. No plano comercial, uma empresa contemporânea não precisa ter como único objetivo o lucro, ela pode ser lucrativa e também colaborar com a inclusão social e melhoria da qualidade de vida das classes sociais mais carentes. O HCD também vem para atender uma demanda de problemas socioeconômicos que o capitalismo tradicional criou e não conseguiu resolver. Os negócios sociais propõem aplicar o modelo eficiente de gestão das empresas para gerar o maior impacto social positivo possível. O design possui um poder de inovação indiscutível. Além de estar na área da criatividade dispõe de subsídios que viabilizam a resolução de grandes problemas sociais a partir do estudo aprofundado dos mesmos. Não há mais espaço para incrementação, ela se tornou insustentável. Deixar de fazer questão de ser dono das coisas e assumir uma postura de usuário, se preocupar com o mundo em que vive e quão confortáveis as pessoas a seu redor estão são sem dúvidas funções do consumidor/cidadão atual. Mas utilizar as características projetuais intrínsecas ao design e tirar vantagem delas para construir um mundo melhor, resolver grandes problemas sociais... Estas sim são funções do designer engajado e preocupado com sua sociedade.
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Flávio Canto, homenageado em 2011 pelo Trip Transformadores, é um dos fundadores do Instituto Reação, que desde 2003 promove a cidadania por meio do esporte em quatro comunidades carentes da cidade do Rio de Janeiro, ensinando uma ética baseada em disciplina, humildade, aperfeiçoamento pessoal e respeito pelo outro.
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PATROCÍNIO
APOIO
“Dando aulas como voluntário na Rocinha, percebi que o judô era uma ferramenta muito grande de transformação. O esporte é uma escola de valores e eles vão sendo carregados para a vida.” Não existe fórmula secreta para começar uma transformação. O Trip Transformadores conta histórias de pessoas que se dedicam a tornar o mundo melhor para todos. Conheça e inspire-se: www.trip.com.br/transformadores
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de sig na dos
Projetos utilizam o pensamento sistemรกtico do design para solucionar grandes problemas sociais.
devolvendo a esperança
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Exoesqueleto criado pela Berkley Bionics para auxiliar cadeirantes a retomar o movimento das pernas.
EXOESQUELETO FAZ PARAPLÉGICOS VOLTAREM A ANDAR
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ma nova prótese biônica que funciona como um exoesqueleto, levou Amanda Boxtel, usuária de cadeira de rodas desde 1992, a voltar a andar com as próprias pernas. Aos 18 anos, ela ficou paralisada da cintura para baixo depois de sofrer um acidente. A empresa fabricante do eLEGS, Berkeley Bionics, planeja começar os testes clínicos em poucos meses. O aparelho possui inteligência artificial e têm vantagens em relação a outras próteses disponíveis no mercado. Para vestir o equipamento, é preciso conectar travas, velcros e apoios de ombros. Funciona a bateria e responde aos movimentos do usuário através de sensores espalhados por toda a prótese.
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Realidade ROBÓTICA Diferentemente de outros exoesqueletos, o eLEGS não se destina a fortalecer soldados. Este é projetado especificamente como um dispositivo de reabilitação para restabelecer a função da marcha em pessoas que sofreram lesão na medula. Os sensores do eLEGS informam sobre a posição das pernas, retransmitindo os dados para a unidade de controle, que determina a forma de dobrar as articulações e, por sua vez, o pé. E as baterias
de lítio e cobalto permitem que a vestimenta possa funcionar sem um fio ligado a uma estação, o que dá grande autonomia ao usuário. O eLEGS não é o único exoesqueleto robótico destinado a restabelecer a marcha em paraplégicos. O ReWalk, da Argo Medical Technologies, em Haifa, Israel, usa um projeto semelhante, com uma mochila conectada a suportes e motores elétricos ligados às pernas. Numa demonstração nos Estados Unidos, alguns voluntários, entre eles Amanda Boxtel, foram capazes de se locomover com o eLEGS sem grandes dificuldades. John Fogelin, diretor de engenharia da Berkeley Bionics, explicou em entrevista à revista “New Scientist” que a empresa está trabalhando maneiras de tornar o design mais elegante, usando baterias menores e suportes mais finos. Um dos objetivos é que os exoesqueletos possam ser colocados por baixo de uma roupa comum. A empresa planeja iniciar testes em clínicas de reabilitação com um maior número de cadeirantes já no início de 2011. E, apesar de não ter divulgado o valor do equipamento, o fabricante estima que custo, no início, será similar ao de uma cadeira de rodas topo de linha, que no mercado sai a pelo menos US$100 mil.
ACABANDO COM A SEDE LIFESAVER BOTTLE TRANSFORMA ÁGUA CONTAMINADA EM POTÁVEL
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abemos que a água é o elemento mais importante para a manutenção da vida. Foi pensando nisso que Michael Pritchard inventou uma garrafa com impressionante capacidade de filtragem: a Lifesaver Bottle. A Lifesaver é uma garrafa purificadora de água que pode ser usada em situações extremas. Seu sistema avançado remove bactérias, vírus, cistos, parasitas, fungos e outros agentes patogênicos sem usar químicos de sabor desagradável. Para usar basta desatarraxar o fundo e encher de água, iniciando a filtragem por meio de bomba manual acoplada. A garrafa d’ água Lifesaver já ganhou prêmios internacionais e é apresentada em diversas matérias como milagrosa e salvadora de vidas. O criador da Lifesaver, Michael Pritchard, diz ter desenvolvido a garrafa depois de presenciar terríveis mortes de pessoas e diversos problemas de saúde causados pela falta de água potável nas situações de emergência após a tragédia natural do tsunami, em 2004, e do furacão Katrina, em 2005. Ao reduzir o processo de filtragem para que coubesse em uma garrafa, Pritchard fez com que fosse possivel que apenas a entrega de um lote de garrafas fosse necessário para mudar completamente o panorama de sobrevivência de pessoas em áreas drasticamente castigadas pela seca (tendo de beber de fontes imundas, barrentas e distantes) ou inundações (com água contaminada). A garrafa LIFESAVER possui também a uma tecnologia chamada FAILSAFE. Em termos simples isto significa que quando o cartucho expira, ele se bloqueia, evitando que o usuário beba água contaminada. É apenas trocar o cartucho e continuar usando.
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Soldados utilizando a Lifesaver Bottle para matar a sede durante o treinamento em meio ao deserto.
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ABRAÇANDO QUEM PRECISA
INCUBADORA PORTÁTIL SALVA A VIDA DE BEBÊS NA ÍNDIA
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statisticamente, 20 milhões de bebês prematuros nascem por ano em todo o mundo. Desses, quatro milhões morrem, entre outros fatores, por não conseguirem controlar a temperatura do corpo. Além do risco de morte, os bebês prematuros que não são mantidos aquecidos podem desenvolver vários problemas de saúde ao longo de toda a sua vida, como diabetes e doenças cardíacas. O motivo é que no primeiro mês de vida do bebê sua única função é crescer. Se estiver lutando contra hipotermia, seus órgãos não poderão se desenvolver normalmente. PRATICIDADE E EFETIVIDADE Para resolver a questão, o mais adequado é manter esses bebês em incubadoras. O problema é que esses equipamentos precisam de eletricidade e custam cerca de R$ 40. 000, tornando-os impraticáveis para grande parte da população rural e em países em desenvolvimento. Alternativas caseiras, como colocar garrafas de água quente ao redor dos bebês ou mantê-los sob lâmpadas de alta voltagem são aplicadas por pais em todo o mundo, mesmo muito ineficientes e extremamente perigosas. Após presenciar a morte de um recém-nascido
indiano que não pôde ser levado até um hospital próximo, Jane Chen e sua equipe decidiram fazer algo. Perceberam que era necessária uma solução local, algo que funcionasse sem eletricidade, que fosse simples o suficiente para uma mãe ou uma parteira usar. Precisavam de algo portátil, que pudesse ser esterilizado e reutilizado em múltiplos bebês e claro, com o menor custo possível. Eles então desenvolveram uma espécie de “saco de dormir para bebês”, impermeável e sem costuras. A magia está na bolsa de cera. Este é material adaptável, é parecido com uma pasta com um ponto de derretimento equivalente a temperatura humana, 37 graus Celsius. É possível derreter a cera com água quente e quando derretida é capaz de manter a temperatura constante por um período de quatro a seis horas, depois é só aquecer novamente. O produto foi lançado na Índia em 2010 e custa aproximadamente R$ 50,00 – 0,1% do valor de uma incubadora tradicional. Durante os próximos cinco anos espera-se salvar as vidas de quase um milhão de bebês. Inovações como esta representam uma nova tendência para a tecnologia futura: simples, localizada. Soluções baratas com a capacidade de causar enorme e relevante impacto social.
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© 1 BERKLEY BIONICS 2 LIFESAVER SYSTEM LTD 3 ISABELA JORDANI 4 PEU ISHIO
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Familiares nordestinos orgulhosos da cisterna que ajudaram a construir.
CONVIVENDO COM A SECA CISTERNAS RESOLVEM O PROBLEMA DE SEDE NO NORDESTE
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Programa 1 Milhão de Cisternas Rurais (P1MC) pretende construir uma cisterna – espécie de poço que coleta água da chuva – para cada casa do semi-árido nordestino. As conseqüências disso? Acabar de uma vez com a falta de água para beber no sertão. Reduzir drasticamente a mortalidade infantil. Combater o analfabetismo, aumentar a renda, organizar as comunidades. Enfraquecer o coronelismo, frear o êxodo rural, diminuir a desigualdade entre homens e mulheres, difundir o respeito pela natureza. Em suma: mudar de repente e para sempre uma verdade que parecia tão antiga e imutável quanto o sertão: a de que não há água suficiente no Nordeste. NO PROBLEMA ESTÁ A SOLUCÃO Há água, sim. Chove todo ano no semi-árido. Mesmo na pior das secas, a quantidade anual de chuva não fica abaixo de 200 milímetros. É pouco. Mas é suficiente para dar água de qualidade para uma família de cinco pessoas beber por um ano. Basta coletar essa água antes que ela suma no chão. E o jeito mais simples é instalando calhas dos dois lados do telhado para conduzi-la para um reservatório de concreto – a cisterna –, onde ela ficará protegida dos parasitas e da evaporação. A água que se acumula lá dá para uma família beber e cozinhar por um ano. Nos anos de seca, ela deve ser usada apenas para se para beber. Simples assim. Simples, mas revolucionário. A idéia é que é possível conviver com a seca em vez de combatê-la, desde que se entenda o que é a caatinga e que se tire dela os recursos de que a população necessita. Por isso, o programa foi escolhido o melhor projeto
desenvolvido por ONG na categoria Água do Prêmio Super Ecologia. Uma das mudanças é que ninguém mais terá que sair andando sob o sol do sertão até o açude mais próximo. Açudes são baixadas onde se acumula a água da chuva – se é que dá para chamar de água aquele líquido barrento e cheio de vermes que milhões de sertanejos bebem todos os dias. Outra mudança que as cisternas operam é política. Tradicionalmente, a posse da água é dos poderosos. Cabe aos políticos mandar caminhões-pipa quando a sede aperta. Assim, caminhões-pipa são trocados por votos nas eleições. Comunidades que dão poucos votos a quem chega no poder ficam sem água. O P1MC também incentiva a organização comunitária com os cursos de dois dias dirigidos a todo mundo que ganha uma cisterna. Os moradores aprendem a lidar com a cisterna – mantê-la tampada, tirar as calhas e lavá-las na época da seca, descartar a primeira chuva do ano para deixar limpar o telhado, tratar a água com cloro etc. As cisternas são feitas com placas pré-moldadas de cimento. Foi o modelo mais barato que o programa encontrou – algo como 700 reais, incluídos os 100 do pedreiro. O incrível é que o projeto não surgiu em nenhum gabinete com ar-condicionado, foi desenvolvido por um agricultor, a partir do know-how de quem convive com a seca. Essa, aliás, é uma das vantagens do programa. Não se trata de propor soluções de fora para dentro. O P1MC dá uma nova e real dimensão ao conceito de “projeto ambiental” – não se trata simplesmente de proteger a natureza do homem, mas sim de ensinar o homem a conviver com a natureza.
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RENATA MENDES
Designer e diretora executiva adjunta da Associação Mundaréu dá entrevista exclusiva sobre design social.
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O que é design social? No meu entendimento, toda ação de design é social, já que tem a ver com projetar soluções para a melhoria de vida. Mas o termo design social tem sido usado para nomear as ações que criam impacto social, que pretendem melhorar a vida de pessoas de baixa ou nenhuma renda, ou ainda que pretendem melhorar as condições básicas de vida (saúde, educação, trabalho, cultura). Por que é importante? Porque o design pode ser uma ferramenta de transformação social, de geração de cidadania. Isso reflete diretamente no investimento que fazemos na melhoria da nossa sociedade. É claramente bom pra todo mundo. Por que é a área que você decidiu trabalhar? Porque vivo incomodada. Outro dia ouvi uma pessoa falar “Se não está bom pra todo mundo, não está bom pra ninguém”. Eu realmente acredito que pequenas e inteligentes ações fazem grandes diferenças e fazem a vida de alguém melhor, inclusive a minha. Pequenas ações conectadas, encadeadas, mudam o mundo pra melhor. Porque não trabalhar pra isso, se isso me mobiliza? Acre-
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dito no meu potencial de agente transformadora e tenho prazer em fazer isso. Na sua opinião, como está atualmente essa área? Crescente. Tem muito profissional sensível, competente e comprometido trabalhando na área. O assunto também está com a atenção de empresas investidoras, governo e organizações. Como você enxerga os designers perante esse tema? Acho o desenvolvimento da área fundamental. Vejo muita gente se formando interessada em criar um trabalho que seja bom pra si mesmo e para o mundo. Qual o papel do design na transformação social? O design é ferramenta de transformação social. Está no campo da criatividade, da inovação, conecta-se ao mercado, ao cenário global ou local, cria metodologias de construção de soluções para os mais diversos desafios, pode mobilizar e estimular as pessoas, utiliza recursos sensoriais, lida com o campo imaginário e com o que é real e concreto, enfim, tem a abrangência e a abertura criativa necessárias para se pensar o novo. Para se repensar inclusive.
Como fazer designers perceberem seu poder transformador?
Existem inúmeros casos inovadores da aplicabilidade do design. Pesquisar referências acho um bom caminho para descobrir o que está acontecendo no mundo nesse sentido e descobrir seu próprio potencial, a relevância que o assunto tem na sua vida. Como você percebeu que tinha esse poder? Sendo curiosa e topando desafios. Eu trabalhava numa indústria de plásticos quando recebi o convite de um amigo para ingressar num projeto na Paraíba de revitalização do artesanato tradicional. Eu não conhecia aquele universo, mas estava curiosa pra conhecer o que tinha aquele lugar, o que sabiam aquelas pessoas. Não entrei para ensinar, mas pra somar experiências. É aí que um olhar curioso entra. Ajudo a redescobrir o que as pessoas não reparam, de tanto que faz parte da rotina delas, ou talentos que nem sabem que possuem. Eu nunca conseguiria descobrir essas coisas se chegasse com uma receita pronta para ser ensinada. Meu trabalho depende do desabrochar das pessoas, porque o potencial delas é minha matéria-prima. Peço licença pra entrar nesse universo © 1 RENATA MENDES
Eu tenho é um modo de planejar as coisas, que começa por conhecer bem o lugar e as pessoas onde vou atuar.
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Detalhe da Rede de Arte da Ilha Guarujá - experimento de tricô com corda.
de pessoas que eu não conheço e quero muito saber as histórias que elas tem pra contar. Isso estabelece a relação de parceria, baseada sempre na ação conjunta de quem está indo realizar o trabalho e de quem (supostamente) receberá o resultado do trabalho. Todos viram atores das ações e autores dos resultados. Existe real espaço para o design social atualmente? Existe espaço e necessidade. Aliás, estou vendo muita gente sendo empreendedora, construindo seu próprio espaço, criando negócios sociais, por exemplo. Organizações não governamentais e as áreas de sustentabilidade das empresas também buscam essa expertise. Quando percebeu que seu trabalho valia a pena ser feito? Quando vi seu efeito na vida de pessoas beneficiárias dos projetos. Vi que ações de design podem ser apropriadas, adaptadas, multiplicadas. Isso é um caminho da sustentabilidade dos resultados. Onde entra a questão estética no design social? Qual sua importância? Entra em poder gerar beleza, seja para o que o mercado se interessa em consuhttp://www.mundareu.org.br
mir, seja para dar mais alegria pra quem vê. Nesse sentido, o cuidado estético é tão importante quando aplicado à uma linha de produtos artesanais para que valorize a identidade de onde são feitos, crie diferencial de mercado e os torne comercialmente viáveis; quanto colorir as paredes das casas de uma favela, por exemplo. Achar bonito também desperta as pessoas para sentir orgulho, para cuidar do que é dela. Você TERIA uma fórmula para resolução de problemas? Não tenho fórmula não. Alguém tem? Eu tenho é um modo de planejar as coisas, que começa por conhecer bem o lugar e as pessoas onde vou atuar. Isso inclui pesquisas à distância e de campo e muuuuuita conversa. Descobrindo as riquezas materiais e imateriais do lugar, o saber, a necessidade e o desejo das pessoas que vou trabalhar, ou seja, o porque de eu estar ali é que resolvo o como fazer e o que resultará. Claro que todos os projetos tem de antemão um objetivo de onde quero chegar e um esqueleto metodológico com metas e ações mais ou menos previstas. Mas como disse antes, nenhum trabalho social que se preze é feito com uma mão só. É via de mão dupla, é participativo. Porque no fim das
contas importa que as ações de design provoquem transformações na vida das pessoas. Se essas pessoas não forem parte do processo, não se envolverem, não acharem importante, o efeito acaba quando o designer vai embora. Quais são suas maiores referências na área? Tenho muitas e coleciono novas a cada dia. Mas quero citar duas: - no recorte do trabalho artesanal, gosto muito do Laboratório Piracema de Design, um coletivo de profissionais multidisciplinares incríveis, que já estão há vários anos trabalhando na área. - para os processos inovadores de criação de soluções, minha referência é o escritório global de design Ideo, que criou metodologia própria de atuação nomeada Human-centered design.
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Papel No
Projetos gráficos incríveis desenvolvidos por estudantes todos construídos em universidades que não tiveram oportunidade de sair do papel.
MÃOZINHA o projeto mãozinha consiste em uma rede social de colaboração de ideias e ajuda voluntária para diversos tipos de problema. O usuário poderia pedir ou oferecer ajuda em um sistema organizado por categorias (ideias, aptidão, social e carona) facilitando o processo de busca por pessoas disponíveis a prestar auxílio. Coletivo Mãozinha Istituto Europeu di Design São Paulo Brasil
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COLMEIA URBANA O Coletivo Colméia Urbana faz parte do slow movement e divulga Excepro odit, officiet voluptae sequia des eate suntium quunto bla voluptatur simus maioneces mi, te vento que ide dolupta sum eroressi to velesti ntiatur? Modit, volestia volupti coraepe dolesto repero iditis ent ad mo molupta que prorero des mos exerum sam estiae nestia veliquamusci bearunt oreperrum dolo et, sendites aboriae volestrum es sum necus, utemporro doluptaquae seque quia suntus, te prepudi conseque volorporerum volorun. Coletivo Colméia Urbana Istituto Europeu di Design São Paulo Brasil Tem aborepelesti dolupturi destiur, accupturio voleste
Soft Cover O objetivo da Soft Cover é combinar a arte de quiltmaking tradicional e a moderna tecnologia da informática, com o efeito de observar a realidade social, através da reflexão de marcas, classes, guerra e política. O assunto foi digitalmente ilustrado e, em seguida, impresso em algodão. Em seguida, os painéis de tecido foram costurados juntos, as peças individuais foram apliques à mão, e reajustada com velo. A colcha autobiográfica exibe as notícias diárias que ocorrem no momento da sua criação. Katrin Rodegast Dortmund University of Applied Science and Arts Alemanha
clicking creates change O design navegador olha para as questões sociais que afetam a sudeste de Ohio. A missão da equipe do Projeto C é ir além de simplesmente compartilhar as histórias de pessoas que residem no sudeste de Ohio, mas para criar um desejo de mudança social. A equipe está usando suas habilidades em multimídia para educar a comunidade sobre as organizações que estão disponíveis e lutar activamente contra as questões sociais como a insegurança alimentar, pobreza e baixos índices de alta escola de graduação. Projeto C Ohio University Estados Unidos
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WE ARE STORIED We Are Storied é um projeto de design gráfico que, em 2009, recolheu as experiências de alunos, professores e funcionários do campus da Universidade de Washington, em St. Louis, de forma anônima e as recontou em forma visual através do design gráfico. O objetivo é trazer à tona problemas de falta de moradia, aceitação social, violência no campus, preconceito sexual, etc. vividos pela comunidade estudantil.
Andrea Nichols e Cambrie Nelson Washington University Estados Unidos
MNOGOOBRAZIE
O governo da pequena cidade de Kazanlak, Bulgária, construiu um muro com o intuito de frear o crescente fluxo imigratório de italianos à cidade. Um coletivo de estudantes de diversas escolas e faculdades retrucou: um mural de 55 metros de comprimento foi pintado na construção, como fruto da interação, diálogo e das histórias compartilhadas entre os estudantes. O projeto converteu um símbolo de segregação em um de diversidade. Mnogoobrazie National High School of Plastic Arts and Design Bulgária
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Contate os coletivos! Você pode contatar os grupos com possíveis repercussões para seus projetos. Mãozinha: maozinha@ied.com Colméia Urbana: colmeiaurbana@ied.com Projeto C: www.clickingcreateschange.com We Are Storied: www.wearestoried.org Mnogoobrazie: www.mnogoobrazie.org
acesso À água potável NO BRASIL porcentagem de pessoas que possuem acesso à água potável no Brasil.
população RURAL
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população urbana
1990
89% 2010
96% 2010
população nacional 1990 Pode-se perceber uma melhora considerável na distribuição de água no Brasil nos últimos 10 anos. Alguns dos projetos apresentados aqui contribuem e muito para o aumento desses números, mas ainda não chegamos no 100%. Falta muito trabalho árduo e estudos direcionados para resolvermos juntos esse problema nacional.
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fonte: http://www.unicef.org | Progress on Drinking Water and Sanitation 2012 update
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movimentocyan.com.br
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