Revista Aspas

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A5745301A

R$ 10,00

EDIÇÃO 01

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ANTROPOLOGIA HISTÓRIAS DAS RUAS PSICOLOGIA PROJETOS DO BEM DADOS DA RUA

LUIZ PERFIL

O SANFONEIRO DA RUA DOS PINHEIROS


SUBAM AS CORTINAS

Uma revista da família Ocas

AS VOZES

DOS NÃO OUVIDOS Estar em situação de rua é muito mais do que apenas viver nas calçadas e pedir esmolas. É muito mais do que ser um simples número, uma estatística, no senso demográfico dessa cidade caótica. Estar em situação de rua é ser humano e ter medo - é sobreviver um dia de cada vez, sem saber o que vai acontecer no dia seguinte. É ter uma história, vir de algum lugar, ter sonhos e metas, ter alguém que te ama. A revistas ASPAS” veio com o objetivo de trazer à tona a verdadeira narrativa dessas pessoas, colocando-as com protagonismo em um patamar de seres humanos - tão “gente” quanto qualquer um de nós. Queremos mostrar a face oculta de cada indivíduo, aquilo que torna cada um deles um ser único: seu passado, seus talentos, seus medos, seu íntimo. Quebrando, assim, a barreira de preconceito tão fortemente reforçada por todos nós, pela nossa tão conveniente ignorância. Cada edição traz o foco para uma pessoa específica, na matéria de capa, mostrando um pouco da sua história e do seu dia-a-dia. Porém, trazemos também um pouco sobre várias outras personalidades, variando a cada edição, para que possamos conhecer melhor a infinita diversidade de pessoas que se encontram nessa situação - e, quem sabe, gerar uma oportunidade para cada uma delas?

Além disso, abordamos outras questões das ruas a partir da perspectiva de profissionais das áreas de psicologia e antropologia, com o objetivo de gerar reflexões em nossos leitores, para que possamos romper de vez com esse tabú. Por fim, seguindo essa linha de gerar protagonismo àqueles que são considerados invisíveis, destinamos todos os nossos lucros da venda de cada exemplar aos nossos queridos vendedores - homens e mulheres em situação de vulnerabilidade social -, para que possam, pouco a pouco e de maneira autônoma, se recolocar tanto na sociedade quanto no mercado de trabalho. Dessa forma, geramos uma ponta de esperança em todos aqueles que buscam sair dessa fase de suas vidas e colaboramos para que eles o façam com o próprio esforço - de modo que passem a ver a vida com novos olhos (e sejam vistos assim, também).

Em parceria com Istituto Europeo di Design

Designers: Gabriela Rocha, Gabrieli Godoy, Gustavo Nieri, Juliana Alencar, Nathalia Sartarello e Rita Egydio. Professor orientador: Fábio Silveira

www.aspas.com.br @revista.aspas Revista ASPAS” Ltda. edição número 01. Redação e correspondência: Rua Maranhão 617, Sala 11.

Somos recortes, somos ouvidos, somos vozes. Somos as histórias dos não ouvidos. Somos ASPAS”.

Texto por Gabrieli Godoy e Juliana Alencar

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SUBAM AS CORTINAS

Uma revista da família Ocas

AS VOZES

DOS NÃO OUVIDOS Estar em situação de rua é muito mais do que apenas viver nas calçadas e pedir esmolas. É muito mais do que ser um simples número, uma estatística, no senso demográfico dessa cidade caótica. Estar em situação de rua é ser humano e ter medo - é sobreviver um dia de cada vez, sem saber o que vai acontecer no dia seguinte. É ter uma história, vir de algum lugar, ter sonhos e metas, ter alguém que te ama. A revistas ASPAS” veio com o objetivo de trazer à tona a verdadeira narrativa dessas pessoas, colocando-as com protagonismo em um patamar de seres humanos - tão “gente” quanto qualquer um de nós. Queremos mostrar a face oculta de cada indivíduo, aquilo que torna cada um deles um ser único: seu passado, seus talentos, seus medos, seu íntimo. Quebrando, assim, a barreira de preconceito tão fortemente reforçada por todos nós, pela nossa tão conveniente ignorância. Cada edição traz o foco para uma pessoa específica, na matéria de capa, mostrando um pouco da sua história e do seu dia-a-dia. Porém, trazemos também um pouco sobre várias outras personalidades, variando a cada edição, para que possamos conhecer melhor a infinita diversidade de pessoas que se encontram nessa situação - e, quem sabe, gerar uma oportunidade para cada uma delas?

Além disso, abordamos outras questões das ruas a partir da perspectiva de profissionais das áreas de psicologia e antropologia, com o objetivo de gerar reflexões em nossos leitores, para que possamos romper de vez com esse tabú. Por fim, seguindo essa linha de gerar protagonismo àqueles que são considerados invisíveis, destinamos todos os nossos lucros da venda de cada exemplar aos nossos queridos vendedores - homens e mulheres em situação de vulnerabilidade social -, para que possam, pouco a pouco e de maneira autônoma, se recolocar tanto na sociedade quanto no mercado de trabalho. Dessa forma, geramos uma ponta de esperança em todos aqueles que buscam sair dessa fase de suas vidas e colaboramos para que eles o façam com o próprio esforço - de modo que passem a ver a vida com novos olhos (e sejam vistos assim, também).

Em parceria com Istituto Europeo di Design

Designers: Gabriela Rocha, Gabrieli Godoy, Gustavo Nieri, Juliana Alencar, Nathalia Sartarello e Rita Egydio. Professor orientador: Fábio Silveira

www.aspas.com.br @revista.aspas Revista ASPAS” Ltda. edição número 01. Redação e correspondência: Rua Maranhão 617, Sala 11.

Somos recortes, somos ouvidos, somos vozes. Somos as histórias dos não ouvidos. Somos ASPAS”.

Texto por Gabrieli Godoy e Juliana Alencar

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ED I Ç ÃO # 1

EM CARTAZ

PÁGINA

LUIZ

PÁGINA DO OUTRO LADO DA ÓTICA

06

Entrevista com o antropólogo Rodrigo Vilalba, a fim de entender um pouco mais sobre o processo histórico que levou as pessoas a irem morar nas ruas.

DADOS DA RUA

O número de pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo aumentou - 60% superior ao identificado no censo de 2015, onde foram identificados 15,9 mil pessoas.

O SANFONEIRO Conheça um pouco sobre a história do Sanfoneiro da Rua dos Pinheiros e um pouco sobre sua mente e trajetória.

“A gente precisa de música na nossa vida.”

Conheça a história de oito pessoas incríveis e entenda a vida nas ruas.

PÁGINA

22

A SOLIDÃO DAS RUAS A psicóloga Fernanda Silva compartilha um pouco do universo por dentro das mentes de pessoas em situação de rua.

PÁGINA CADA VOZ TRAZ MIL HISTÓRIAS

Pessoas comuns, como todos nós. Cada uma delas carregando seu passado nas costas, anseando por dividir sua história com qualquer um que queira escutál-las.

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PÁGINA 24

PÁGINA

26

PROJETOS DO BEM

“Fazer o bem sem ver a quem”. Os projetos listados nesta seção foram especiamente selecionados, pois precisam de todo o nosso apoio.

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ED I Ç ÃO # 1

EM CARTAZ

PÁGINA

LUIZ

PÁGINA DO OUTRO LADO DA ÓTICA

06

Entrevista com o antropólogo Rodrigo Vilalba, a fim de entender um pouco mais sobre o processo histórico que levou as pessoas a irem morar nas ruas.

DADOS DA RUA

O número de pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo aumentou - 60% superior ao identificado no censo de 2015, onde foram identificados 15,9 mil pessoas.

O SANFONEIRO Conheça um pouco sobre a história do Sanfoneiro da Rua dos Pinheiros e um pouco sobre sua mente e trajetória.

“A gente precisa de música na nossa vida.”

Conheça a história de oito pessoas incríveis e entenda a vida nas ruas.

PÁGINA

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A SOLIDÃO DAS RUAS A psicóloga Fernanda Silva compartilha um pouco do universo por dentro das mentes de pessoas em situação de rua.

PÁGINA CADA VOZ TRAZ MIL HISTÓRIAS

Pessoas comuns, como todos nós. Cada uma delas carregando seu passado nas costas, anseando por dividir sua história com qualquer um que queira escutál-las.

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PROJETOS DO BEM

“Fazer o bem sem ver a quem”. Os projetos listados nesta seção foram especiamente selecionados, pois precisam de todo o nosso apoio.

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DESCONTRUIR de mobilizações da população de rua. Por fim, trata-se de indicar apontamentos sobre como a prática de viver na e da rua, entendida por muito tempo como “contraventora”, se transforma em objeto de políticas públicas a partir da mobilização coletiva para o reconhecimento de suas especificidades. A pessoa que está na rua justifica sua atitude apresentando as dificuldades de sua vida como argumento explicativo de seu ato, por vezes confrontando as pessoas que não estão mais na rua, pois, supostamente, elas não estariam mais vivendo sob as mesmas dificuldades. Esta distinção é particularmente curiosa se considerada a fragilidade sob a qual vivem as pessoas que “tiveram trajetórias de rua”, pois elas vivem em espaços provisórios, cedidos pelo empregador, ou vivem circunstancialmente na casa da

A exclusão é uma consequência da história pessoa com quem se relaciona no momento, por vezes sem emprego ou com emprego provisório. Dentre as pessoas que estão no movimento e também em situação de rua, uma questão sempre apresentada são as dificuldades de estar organizado no movimento. Pois, sobreviver na rua demanda tanto o conhecimento dos seus meios quanto a presença em espaços de atendimento e auxílio. Esta questão nos leva a outra distinção, que distingue, dentre as pessoas que estão na rua, aqueles que são usuários e não usuários dos equipamentos sócio-assistenciais. Esta distinção versa sobre o fato de que nem todas as pessoas que

estão na rua se utilizam destes serviços. Certa vez, Samuel um dos coordenadores nacionais do MNPR, ao falar sobre a importância e os limites das entidades que atendem a população de rua afirmou: “Olha, tem um monte de gente na rua que se não fosse pelas ONGs e as instituições, elas morreriam. Mas tem um monte de gente que vive sem elas também.” Leonildo, ao falar de sua própria experiência na rua, revelou que “Quando eu tava na rua, sabia o mocó bom pra ficar, conseguia as coisas pra comer, mangueava, tem um monte de gente na rua que pode passar qualquer coisa na FAS, mas ele não sai de lá.”

Design Gabriela Rocha e Gustavo Nieri Texto Tomás Henrique de Azevedo Gomes Melo

DO OUTRO LADO

DA ÓTICA Entrevistamos Rodrigo Vilalba, antropólogo que atua há mais de 20 anos no ramo das ciências sociais e design, para entender um pouco sobre o processo histórico de como as pessoas foram parar nas ruas.

6

MUITO JÁ FOI DITO sobre a constituição histórica do fenômeno que hoje nos referimos por população em situação de rua, o que torna sua própria definição tema de debates e controvérsias. A última década foi particularmente favorável ao reconhecimento da existência do processo que leva um contingente cada vez maior de pessoas a viver em situação de rua. Neste contexto são elaborados diversos esforços para instigar o estabelecimento da população em situação de rua enquanto

sujeitos de direitos organizados em torno de suas próprias demandas. Tradicionalmente entendidos como inaptos para a organização política, passam a elaborar suas próprias reivindicações, de modo a obter reconhecimento como um segmento que necessita ser atendido segundo as especificidades deste modo de vida. A partir da pesquisa etnográfica iniciada em 2009, na cidade de Curitiba, PR, a proposta tem enfoque particular em eventos recentes e na memória de agentes envolvidos com a rede

RODRIGO VILALBA

Foto na Av. Paulista, janeiro de 2020, por Fulaninho de Tal

Nascido em 1975 e completando 26 anos como professor em 2020, Rodrigo Vilalba é formado em Comunicação Social e Doutor em Comunicação e Letras. Leciona e orienta TCCs no IED-SP. Umbandista, ayahuasqueiro e ultramaratonista. Contra todos os tipos de opressão.

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DESCONTRUIR de mobilizações da população de rua. Por fim, trata-se de indicar apontamentos sobre como a prática de viver na e da rua, entendida por muito tempo como “contraventora”, se transforma em objeto de políticas públicas a partir da mobilização coletiva para o reconhecimento de suas especificidades. A pessoa que está na rua justifica sua atitude apresentando as dificuldades de sua vida como argumento explicativo de seu ato, por vezes confrontando as pessoas que não estão mais na rua, pois, supostamente, elas não estariam mais vivendo sob as mesmas dificuldades. Esta distinção é particularmente curiosa se considerada a fragilidade sob a qual vivem as pessoas que “tiveram trajetórias de rua”, pois elas vivem em espaços provisórios, cedidos pelo empregador, ou vivem circunstancialmente na casa da

A exclusão é uma consequência da história pessoa com quem se relaciona no momento, por vezes sem emprego ou com emprego provisório. Dentre as pessoas que estão no movimento e também em situação de rua, uma questão sempre apresentada são as dificuldades de estar organizado no movimento. Pois, sobreviver na rua demanda tanto o conhecimento dos seus meios quanto a presença em espaços de atendimento e auxílio. Esta questão nos leva a outra distinção, que distingue, dentre as pessoas que estão na rua, aqueles que são usuários e não usuários dos equipamentos sócio-assistenciais. Esta distinção versa sobre o fato de que nem todas as pessoas que

estão na rua se utilizam destes serviços. Certa vez, Samuel um dos coordenadores nacionais do MNPR, ao falar sobre a importância e os limites das entidades que atendem a população de rua afirmou: “Olha, tem um monte de gente na rua que se não fosse pelas ONGs e as instituições, elas morreriam. Mas tem um monte de gente que vive sem elas também.” Leonildo, ao falar de sua própria experiência na rua, revelou que “Quando eu tava na rua, sabia o mocó bom pra ficar, conseguia as coisas pra comer, mangueava, tem um monte de gente na rua que pode passar qualquer coisa na FAS, mas ele não sai de lá.”

Design Gabriela Rocha e Gustavo Nieri Texto Tomás Henrique de Azevedo Gomes Melo

DO OUTRO LADO

DA ÓTICA Entrevistamos Rodrigo Vilalba, antropólogo que atua há mais de 20 anos no ramo das ciências sociais e design, para entender um pouco sobre o processo histórico de como as pessoas foram parar nas ruas.

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MUITO JÁ FOI DITO sobre a constituição histórica do fenômeno que hoje nos referimos por população em situação de rua, o que torna sua própria definição tema de debates e controvérsias. A última década foi particularmente favorável ao reconhecimento da existência do processo que leva um contingente cada vez maior de pessoas a viver em situação de rua. Neste contexto são elaborados diversos esforços para instigar o estabelecimento da população em situação de rua enquanto

sujeitos de direitos organizados em torno de suas próprias demandas. Tradicionalmente entendidos como inaptos para a organização política, passam a elaborar suas próprias reivindicações, de modo a obter reconhecimento como um segmento que necessita ser atendido segundo as especificidades deste modo de vida. A partir da pesquisa etnográfica iniciada em 2009, na cidade de Curitiba, PR, a proposta tem enfoque particular em eventos recentes e na memória de agentes envolvidos com a rede

RODRIGO VILALBA

Foto na Av. Paulista, janeiro de 2020, por Fulaninho de Tal

Nascido em 1975 e completando 26 anos como professor em 2020, Rodrigo Vilalba é formado em Comunicação Social e Doutor em Comunicação e Letras. Leciona e orienta TCCs no IED-SP. Umbandista, ayahuasqueiro e ultramaratonista. Contra todos os tipos de opressão.

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ABRE ASPAS

CADA VOZ TRAZ MIL . HISTÓRIAS Cozinheiros, artistas, advogados. Pessoas comuns, como todos nós. Cada uma delas carregando seu passado nas costas, anseando por dividir sua história com qualquer um que queira escutál-las. Design Juliana Alencar, Gabrieli Godoy e Gabriela Rocha Texto Rita Egydio e SP invisível

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ABRE ASPAS

CADA VOZ TRAZ MIL . HISTÓRIAS Cozinheiros, artistas, advogados. Pessoas comuns, como todos nós. Cada uma delas carregando seu passado nas costas, anseando por dividir sua história com qualquer um que queira escutál-las. Design Juliana Alencar, Gabrieli Godoy e Gabriela Rocha Texto Rita Egydio e SP invisível

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ABRE ASPAS

ELIZANGELA 44 ANOS

“SER MULHER NA RUA é complicado. Meu nome é Elizangela Moreira, sou natural de Campinas e tenho 44 anos. Estou há 1 ano e 8 meses em situação de rua. O maior motivo para estar nessa situação foram percas…percas familiares, materiais e profissionais. Eu vim para São Paulo caçar um emprego, acreditei que aqui seria melhor para mim, mas, cheguei quase na época da pandemia, portanto, estava MUITO difícil arranjar um emprego. Quando cheguei, procurei por serviços, mas não consegui, certo tempo depois vim parar nas ruas, pois não conseguia pagar uma habitação, fui roubada, levaram inclusive os meus documentos. Arranjei/cheguei a ir em umas entrevistas, mas não tinha documento e nem telefone. Aqui em São Paulo trabalhei somente na área da limpeza nos terminais. Também é complicado sem dinheiro para ir nas entrevistas. Já trabalhei 10 anos como despachante de auto-escola, porém o tempo foi passando, eu não me adaptei as novas tecnologias e acabei ficando para trás. Depois fui trabalhar na cozinha, aprendi a fazer comida árabe, comida brasileira, industrial e trabalhei bastante com comida japonesa. Tenho uns 18 anos de experiência na cozinha. Meu sonho é conquistar uma casa para trazer meus familiares, meu netinho, poder ajuda-los da forma que eles merecem. Não é fácil, mas não é impossível. A gente nunca sabe o dia de amanhã. Mas, aqui não tem como eu trazer eles, eles não merecem me ver nessa situação. Aqui na rua tem muitas pessoas sábias, muita história e muito talento. Esses dias fiquei fazendo contas de matemática, contas que muita gente não sabe fazer, e aprendendo inglês com um amigo que mora junto nas calçadas.”

Tenho uns 18 anos de experiência na cozinha. 10

SIDINHA COM S

61 ANOS

“MEU NOME É Sidinha com S, nasci em Promissão em um município do estado de São Paulo. Hoje vivo em Ribeirão Pires, meu maior sonho é arrumar minha casa que foi derrubada pelas fortes chuvas de março.” Para uns, isso pode ser o fim, mas Sidinha continua na luta diariamente para se estabilizar de novo e reconstruir seu lar. Seu alto astral continua presente e isso não há chuva que derrube. Tem gente que o sorriso e o olhar diz tudo, Sidinha é um ser assim. Sorriso de canto a canto, um olhar profundo e sincero. Um dia ganhou diversas gravatas e fez do limão uma limonada, aprendeu a costurar sozinha, criou um vestido todo a partir de gravatas. Seus acessórios também foram produzidos a mão por si, anéis de colher e brincos de arames. Mulher guerreira e forte, Sidinha espalha seu charme e alegria pela Avenida Paulista, onde vai todo dia em busca de alguma oportunidade para se estabilizar de novo.

Anéis feitos a partir de colheres, pela própria Sidinha

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ABRE ASPAS

ELIZANGELA 44 ANOS

“SER MULHER NA RUA é complicado. Meu nome é Elizangela Moreira, sou natural de Campinas e tenho 44 anos. Estou há 1 ano e 8 meses em situação de rua. O maior motivo para estar nessa situação foram percas…percas familiares, materiais e profissionais. Eu vim para São Paulo caçar um emprego, acreditei que aqui seria melhor para mim, mas, cheguei quase na época da pandemia, portanto, estava MUITO difícil arranjar um emprego. Quando cheguei, procurei por serviços, mas não consegui, certo tempo depois vim parar nas ruas, pois não conseguia pagar uma habitação, fui roubada, levaram inclusive os meus documentos. Arranjei/cheguei a ir em umas entrevistas, mas não tinha documento e nem telefone. Aqui em São Paulo trabalhei somente na área da limpeza nos terminais. Também é complicado sem dinheiro para ir nas entrevistas. Já trabalhei 10 anos como despachante de auto-escola, porém o tempo foi passando, eu não me adaptei as novas tecnologias e acabei ficando para trás. Depois fui trabalhar na cozinha, aprendi a fazer comida árabe, comida brasileira, industrial e trabalhei bastante com comida japonesa. Tenho uns 18 anos de experiência na cozinha. Meu sonho é conquistar uma casa para trazer meus familiares, meu netinho, poder ajuda-los da forma que eles merecem. Não é fácil, mas não é impossível. A gente nunca sabe o dia de amanhã. Mas, aqui não tem como eu trazer eles, eles não merecem me ver nessa situação. Aqui na rua tem muitas pessoas sábias, muita história e muito talento. Esses dias fiquei fazendo contas de matemática, contas que muita gente não sabe fazer, e aprendendo inglês com um amigo que mora junto nas calçadas.”

Tenho uns 18 anos de experiência na cozinha. 10

SIDINHA COM S

61 ANOS

“MEU NOME É Sidinha com S, nasci em Promissão em um município do estado de São Paulo. Hoje vivo em Ribeirão Pires, meu maior sonho é arrumar minha casa que foi derrubada pelas fortes chuvas de março.” Para uns, isso pode ser o fim, mas Sidinha continua na luta diariamente para se estabilizar de novo e reconstruir seu lar. Seu alto astral continua presente e isso não há chuva que derrube. Tem gente que o sorriso e o olhar diz tudo, Sidinha é um ser assim. Sorriso de canto a canto, um olhar profundo e sincero. Um dia ganhou diversas gravatas e fez do limão uma limonada, aprendeu a costurar sozinha, criou um vestido todo a partir de gravatas. Seus acessórios também foram produzidos a mão por si, anéis de colher e brincos de arames. Mulher guerreira e forte, Sidinha espalha seu charme e alegria pela Avenida Paulista, onde vai todo dia em busca de alguma oportunidade para se estabilizar de novo.

Anéis feitos a partir de colheres, pela própria Sidinha

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ABRE ASPAS

RICARDO, O POETA 53 ANOS

LUCAS VICENTE

27 ANOS

“EU VIVO DESDE menor pelas ruas. Desde pequeno vendia doces no farol para conseguir um dinheiro. Faz tempo que estou na rua. Gosto de alegrar as pessoas no farol, fazer alguma graça e arrancar um sorriso. Meu nome é Lucas Vicente de Moraes Natalino, tenho 27 anos e nasci em São Paulo. Minha família está no bairro da Penha, zona leste. A vida foi muito sofrida para mim, nós éramos em 11 irmãos. 7 irmãos foram adotados e hoje vivem na Itália. Já vivi bastante em abrigo também.

12

Conheci o crack com 15 anos, mas não era viciado ainda, as vezes dormia na rua e as vezes ia para casa. Quando menor, era meio revoltado, tirei uma FEBEM por causa de um assalto que cometi a uma joalheria, na fuga tomei 2 tiros da polícia. Quando saí da FEBEM, fui trabalhar em um açougue, certo tempo depois, já maior de idade, acabei voltando para o mundo do crime, cometi um assalto e fui condenado a cumprir 5 anos de cadeia. Foram tempos difíceis, 5 anos é muito tempo perdido,

paguei muito veneno. Em setembro, fiz 2 anos na rua, me arrependo de tudo que eu fiz. Hoje sei dar valor para minha liberdade. Falta eu dar um passo para frente, mas meu passado não foi bom e as pessoas tem preconceito. Não tive ninguém para me incentivar e falar o que é certo e errado. Quando parei para pensar já era tarde, já tinha feito as burrices. Mas nunca é tarde para recomeçar.”

RICARDO VEIO PARA São Paulo e trabalhava abordando pequenos grupos para espalhar sua poesia. Apenas com um caderno na mão e mochila nas costas; “Por que é o seguinte quando a gente vem pra rua e faz arte de rua a gente sempre pensa em ganhar um dinheiro, mas tem dias que nao entra nada, tem dias que fica 4 - 5 dias sem entrar nada. Se eu tivesse como motivação somente o dinheiro, eu ja nao estaria ai fazia tempo. Agora o retorno em relação aos amigos, não tem preço. Eu deixei uma vida pra trás para morar na esquina da paulista, não quero dinheiro, só quero o reconhecimento do meu trabalho. Eu vejo o impacto da arte de rua, para as pessoas que estão em situação de rua, de uma forma muito positiva. É uma forma que essas pessoas que são tão carente de oportunidades, arte e entretenimento se libertam e interagem, é quando eles sorriem, dentro de uma vida tão sofrida e esse é o melhor momento para interagir com eles” Após o retorno positivo de seu mangueio poético Ricardo Garcia, mais conhecido como Poeta da Paulista, se instalou

numa “ilha” que fica num cruzamento da Av.Paulista próximo ao MASP e fez de lá sua morada, nomeando-a de Ilha da Poesia. Na Ilha da Poesia, Garcia que com seus poucos recursos, dividia o pouco que tinha com quem ali aportava. Ricardo distribuía a quem aportasse na sua ilha um acalento e uma esperança. Um exemplo de como a poesia podia ser vivida com dignidade e coragem. Foi dessa Ilha linda que nasceu o livro “Da Ilha da Poesia”, um encontro existencial de náufragos que se reconheceram nesse pedacinho de chão da Avenida Paulista, mas também uma linda metáfora sobre a possibilidade de se viver. O livro é testemunha deste encontro, deste diálogo, e desta afinidade poética marginal entre dois poetas (Ricardo Garcia &

Giovani Miguez) que por caminhos distintos e necessidades peculiares, compartilhavam de sonhos e inquietações que se tocavam. Ricardo habita a Ilha da Poesia, um centro cultural orgânico, por ele fundado,e corajosamente defendido. Miguez, sem nunca ter tocado ali, vivia a experiência poética, o desejo de habitá-la e por ela sentiu-se abrigado.

“Não quero dinheiro, só quero o reconhecimento do meu trabalho.” 13


ABRE ASPAS

RICARDO, O POETA 53 ANOS

LUCAS VICENTE

27 ANOS

“EU VIVO DESDE menor pelas ruas. Desde pequeno vendia doces no farol para conseguir um dinheiro. Faz tempo que estou na rua. Gosto de alegrar as pessoas no farol, fazer alguma graça e arrancar um sorriso. Meu nome é Lucas Vicente de Moraes Natalino, tenho 27 anos e nasci em São Paulo. Minha família está no bairro da Penha, zona leste. A vida foi muito sofrida para mim, nós éramos em 11 irmãos. 7 irmãos foram adotados e hoje vivem na Itália. Já vivi bastante em abrigo também.

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Conheci o crack com 15 anos, mas não era viciado ainda, as vezes dormia na rua e as vezes ia para casa. Quando menor, era meio revoltado, tirei uma FEBEM por causa de um assalto que cometi a uma joalheria, na fuga tomei 2 tiros da polícia. Quando saí da FEBEM, fui trabalhar em um açougue, certo tempo depois, já maior de idade, acabei voltando para o mundo do crime, cometi um assalto e fui condenado a cumprir 5 anos de cadeia. Foram tempos difíceis, 5 anos é muito tempo perdido,

paguei muito veneno. Em setembro, fiz 2 anos na rua, me arrependo de tudo que eu fiz. Hoje sei dar valor para minha liberdade. Falta eu dar um passo para frente, mas meu passado não foi bom e as pessoas tem preconceito. Não tive ninguém para me incentivar e falar o que é certo e errado. Quando parei para pensar já era tarde, já tinha feito as burrices. Mas nunca é tarde para recomeçar.”

RICARDO VEIO PARA São Paulo e trabalhava abordando pequenos grupos para espalhar sua poesia. Apenas com um caderno na mão e mochila nas costas; “Por que é o seguinte quando a gente vem pra rua e faz arte de rua a gente sempre pensa em ganhar um dinheiro, mas tem dias que nao entra nada, tem dias que fica 4 - 5 dias sem entrar nada. Se eu tivesse como motivação somente o dinheiro, eu ja nao estaria ai fazia tempo. Agora o retorno em relação aos amigos, não tem preço. Eu deixei uma vida pra trás para morar na esquina da paulista, não quero dinheiro, só quero o reconhecimento do meu trabalho. Eu vejo o impacto da arte de rua, para as pessoas que estão em situação de rua, de uma forma muito positiva. É uma forma que essas pessoas que são tão carente de oportunidades, arte e entretenimento se libertam e interagem, é quando eles sorriem, dentro de uma vida tão sofrida e esse é o melhor momento para interagir com eles” Após o retorno positivo de seu mangueio poético Ricardo Garcia, mais conhecido como Poeta da Paulista, se instalou

numa “ilha” que fica num cruzamento da Av.Paulista próximo ao MASP e fez de lá sua morada, nomeando-a de Ilha da Poesia. Na Ilha da Poesia, Garcia que com seus poucos recursos, dividia o pouco que tinha com quem ali aportava. Ricardo distribuía a quem aportasse na sua ilha um acalento e uma esperança. Um exemplo de como a poesia podia ser vivida com dignidade e coragem. Foi dessa Ilha linda que nasceu o livro “Da Ilha da Poesia”, um encontro existencial de náufragos que se reconheceram nesse pedacinho de chão da Avenida Paulista, mas também uma linda metáfora sobre a possibilidade de se viver. O livro é testemunha deste encontro, deste diálogo, e desta afinidade poética marginal entre dois poetas (Ricardo Garcia &

Giovani Miguez) que por caminhos distintos e necessidades peculiares, compartilhavam de sonhos e inquietações que se tocavam. Ricardo habita a Ilha da Poesia, um centro cultural orgânico, por ele fundado,e corajosamente defendido. Miguez, sem nunca ter tocado ali, vivia a experiência poética, o desejo de habitá-la e por ela sentiu-se abrigado.

“Não quero dinheiro, só quero o reconhecimento do meu trabalho.” 13


ABRE ASPAS

JOSINALDO 42 ANOS

“MEU NOME É Josinaldo. Eu sou do Morro da Formiga, mas não tô mais lá. Tenho 42 anos, fiquei 19 anos preso. Antigamente eu matava, roubava e destruía, entendeu? Tirei cadeia e tô há dois anos na rua. Hoje em dia eu vendo livro, porque eu não vou mais roubar e nem matar ninguém. Tudo isso começou quando eu via o pessoal da boca com roupa nova. Eu queria ser que nem eles. Hoje eu tô na rua e penso em ter uma vida melhor. A minha família é Deus, porque meus parentes eu não sei nem por onde andam. Minha mãe morreu quando eu estava na cadeia, e meu pai eu nunca conheci. Quando eu saí de lá, conheci uma garota que tinha Síndrome de Down. Ela me olhou e começou a chorar, pediu à mãe pra me dar um

abraço. Aí eu dei um abraço nela e ela me deu um livro do Machado de Assis. Hoje eu vendo livro. Tudo que eu li naquele livro eu tô botando em prática. Hoje eu falo que no dia em que eu ficar rico vou tirar todo mundo da rua e botar pra trabalhar. Esse é meu sonho. Eu era assim porque no mundo do crime nós ganha respeito e poder. Mas, na periferia, nós é humilhado e esculachado, a sociedade não olha pra nós. Eu tinha ódio de quem tinha preconceito, mas hoje em dia nem esquento, pode me chamar de preto, favelado. Aprendi muita coisa, tanto na cadeia quanto na leitura. Eu gosto de ler. A vida é um ensinamento. Se você não aprender em casa, a vida te ensina. Às vezes, vejo o pessoal passando aqui com cara de nojo, mas não tô nem aí pra eles. Um policial veio pra mim e disse ‘você não sabe nem ler’. E eu disse ‘vem cá, dentro do Estatuto Penal, onde tá escrito que você pode humilhar uma pessoa?’. Ele falou que nenhum, e eu disse que ele precisa saber falar. Eu leio livros, ele não. Disse pra ele aprender a ser policial e a abordar uma pessoa. Não é só chegar com uma arma na cintura querendo esculachar. Esse é meu exemplo de vida.”

“Hoje eu falo que no dia em que eu ficar rico vou tirar todo mundo da rua e botar pra trabalhar.”

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MARIA

65 ANOS

“MESMO SEM CASA e sem família, eu sou feliz. Você tem que ser o que você é, nada mais. Eu sou feliz, eu sou isso. Meu nome é Maria, tenho 65 anos. Aqui na rua eu aprendi a viver, sou uma eterna aprendiz. Gosto de ver as belezas das ruas, pessoas diferentes... Tenho um passado gostoso, sabe? Pena que não tenho mais família, acho que se eu tivesse pelo menos a minha mãe, eu não estaria nessa. Eu só tento lembrar coisas boas, não quero colocar a culpa em ninguém. Faço uns biquinho por aí. Paga pouco, mas é uma coisa assim que eu me sinto bem, me dá dignidade. Ando de cabeça erguida e coração aberto. Eu tenho tanto amor aqui dentro. O amor pra mim é tudo. Sabe o que eu gosto de fazer? Eu gosto muito de ler, tava lendo Chico Xavier. Adoro música, sem ser esses negócio de funk, eu gosto de tudo que é música. Eu gosto muito de visitar os asilos. Vou lá, visito os idosos, ajudo eles. É muito legal. Os donos não me deixam dormir lá porque eu ainda estou lúcida, já tentei de tudo que é jeito. Meu sonho é poder ter minha casinha e continuar ajudando os outros.”

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ABRE ASPAS

JOSINALDO 42 ANOS

“MEU NOME É Josinaldo. Eu sou do Morro da Formiga, mas não tô mais lá. Tenho 42 anos, fiquei 19 anos preso. Antigamente eu matava, roubava e destruía, entendeu? Tirei cadeia e tô há dois anos na rua. Hoje em dia eu vendo livro, porque eu não vou mais roubar e nem matar ninguém. Tudo isso começou quando eu via o pessoal da boca com roupa nova. Eu queria ser que nem eles. Hoje eu tô na rua e penso em ter uma vida melhor. A minha família é Deus, porque meus parentes eu não sei nem por onde andam. Minha mãe morreu quando eu estava na cadeia, e meu pai eu nunca conheci. Quando eu saí de lá, conheci uma garota que tinha Síndrome de Down. Ela me olhou e começou a chorar, pediu à mãe pra me dar um

abraço. Aí eu dei um abraço nela e ela me deu um livro do Machado de Assis. Hoje eu vendo livro. Tudo que eu li naquele livro eu tô botando em prática. Hoje eu falo que no dia em que eu ficar rico vou tirar todo mundo da rua e botar pra trabalhar. Esse é meu sonho. Eu era assim porque no mundo do crime nós ganha respeito e poder. Mas, na periferia, nós é humilhado e esculachado, a sociedade não olha pra nós. Eu tinha ódio de quem tinha preconceito, mas hoje em dia nem esquento, pode me chamar de preto, favelado. Aprendi muita coisa, tanto na cadeia quanto na leitura. Eu gosto de ler. A vida é um ensinamento. Se você não aprender em casa, a vida te ensina. Às vezes, vejo o pessoal passando aqui com cara de nojo, mas não tô nem aí pra eles. Um policial veio pra mim e disse ‘você não sabe nem ler’. E eu disse ‘vem cá, dentro do Estatuto Penal, onde tá escrito que você pode humilhar uma pessoa?’. Ele falou que nenhum, e eu disse que ele precisa saber falar. Eu leio livros, ele não. Disse pra ele aprender a ser policial e a abordar uma pessoa. Não é só chegar com uma arma na cintura querendo esculachar. Esse é meu exemplo de vida.”

“Hoje eu falo que no dia em que eu ficar rico vou tirar todo mundo da rua e botar pra trabalhar.”

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MARIA

65 ANOS

“MESMO SEM CASA e sem família, eu sou feliz. Você tem que ser o que você é, nada mais. Eu sou feliz, eu sou isso. Meu nome é Maria, tenho 65 anos. Aqui na rua eu aprendi a viver, sou uma eterna aprendiz. Gosto de ver as belezas das ruas, pessoas diferentes... Tenho um passado gostoso, sabe? Pena que não tenho mais família, acho que se eu tivesse pelo menos a minha mãe, eu não estaria nessa. Eu só tento lembrar coisas boas, não quero colocar a culpa em ninguém. Faço uns biquinho por aí. Paga pouco, mas é uma coisa assim que eu me sinto bem, me dá dignidade. Ando de cabeça erguida e coração aberto. Eu tenho tanto amor aqui dentro. O amor pra mim é tudo. Sabe o que eu gosto de fazer? Eu gosto muito de ler, tava lendo Chico Xavier. Adoro música, sem ser esses negócio de funk, eu gosto de tudo que é música. Eu gosto muito de visitar os asilos. Vou lá, visito os idosos, ajudo eles. É muito legal. Os donos não me deixam dormir lá porque eu ainda estou lúcida, já tentei de tudo que é jeito. Meu sonho é poder ter minha casinha e continuar ajudando os outros.”

SIGA NOSSAS REDES SOCIAIS PARA CONHECER MAIS HISTÓRIAS

15


CAPA

LU IZ Design Gabriela Rocha e Gustavo Nieri Texto Gustavo Nieri

O SANFONEIRO

Eu tenho pensamento positivo, mas creio que dá sempre pra melhorar, né?

Conheça um pouco sobre a história do Sanfoneiro da Rua dos Pinheiros e um pouco sobre sua mente e trajetória.

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CAPA

LU IZ Design Gabriela Rocha e Gustavo Nieri Texto Gustavo Nieri

O SANFONEIRO

Eu tenho pensamento positivo, mas creio que dá sempre pra melhorar, né?

Conheça um pouco sobre a história do Sanfoneiro da Rua dos Pinheiros e um pouco sobre sua mente e trajetória.

17


CAPA

PARA QUEM PASSA pela estação de metrô Fradique Coutinho, pode ter a chance de ser encantado com o som de uma alegre música, tocada por ele, o Sanfoneiro da Rua dos Pinheiros. Luiz Tomaz dos Santos tem sessenta e quatro anos (meia quatro, como ele reitera), e nasceu no sul de Minas Gerais. Luiz é um tímido senhor, mas com muita história para contar sobre seus longos anos de vida. Aos três anos de idade, mudou-se para o Paraná, de lá foi para Campo Grande, no Mato Grosso do Sul e depois para Rondônia, onde ficou por 40 anos.

Luiz encantando pedestres e motoristas que passam pela Rua dos Pinheiros com seu energético som de sua pequena, mas potente sanfona.

18

Luiz veio para São Paulo há algum tempo em busca de exames e tratamento de saúde, ou melhor, para a memória, como ele nos disse. O Sanfoneiro é um dos milhares de habitantes brasileiros que deixam a sua terra, migrando para uma outra parte do país em busca de maior qualidade de vida, oportunidades, tratamentos e uma vida um pouco melhor. Infelizmente, como tantos, Luiz foi uma das pessoas que acabou em situação de rua, sem ter renda fixa ou lugar próprio para morar. Hoje em dia ele e sua sanfona, passam a parte da manhã na frente da lotérica da Rua

A fala é bonita, mas a gente precisa de música também, né?

dos Pinheiros, que fica de encontro com a esquina da Fradique Coutinho, no bairro de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo. Durante a noite ele dorme em um albergue, não tão longe da onde passa os dias, tentando conseguir algum dinheiro, para seus tratamentos de saúde. Viver em um albergue não é fácil, ele conta. “Tem funcionário que tem que trabalhar como se fosse três, quatro”, ele diz que tem muita gente no albergue e poucos funcionários, tornando todo o processo, muitas vezes conturbado, “é um pouco difícil, mas eu gosto. Eu gosto porque a gente adquire mais experiência, a gente adquire mais paciência”. Luiz também conta que se sente mais seguro nos albergues e que tenta sempre se colocar no lugar dos funcionários que lá trabalham, “eles precisam zelar pelo bem estar deles, né? Fisicamente e mentalmente, né?”. Depois de

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CAPA

PARA QUEM PASSA pela estação de metrô Fradique Coutinho, pode ter a chance de ser encantado com o som de uma alegre música, tocada por ele, o Sanfoneiro da Rua dos Pinheiros. Luiz Tomaz dos Santos tem sessenta e quatro anos (meia quatro, como ele reitera), e nasceu no sul de Minas Gerais. Luiz é um tímido senhor, mas com muita história para contar sobre seus longos anos de vida. Aos três anos de idade, mudou-se para o Paraná, de lá foi para Campo Grande, no Mato Grosso do Sul e depois para Rondônia, onde ficou por 40 anos.

Luiz encantando pedestres e motoristas que passam pela Rua dos Pinheiros com seu energético som de sua pequena, mas potente sanfona.

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Luiz veio para São Paulo há algum tempo em busca de exames e tratamento de saúde, ou melhor, para a memória, como ele nos disse. O Sanfoneiro é um dos milhares de habitantes brasileiros que deixam a sua terra, migrando para uma outra parte do país em busca de maior qualidade de vida, oportunidades, tratamentos e uma vida um pouco melhor. Infelizmente, como tantos, Luiz foi uma das pessoas que acabou em situação de rua, sem ter renda fixa ou lugar próprio para morar. Hoje em dia ele e sua sanfona, passam a parte da manhã na frente da lotérica da Rua

A fala é bonita, mas a gente precisa de música também, né?

dos Pinheiros, que fica de encontro com a esquina da Fradique Coutinho, no bairro de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo. Durante a noite ele dorme em um albergue, não tão longe da onde passa os dias, tentando conseguir algum dinheiro, para seus tratamentos de saúde. Viver em um albergue não é fácil, ele conta. “Tem funcionário que tem que trabalhar como se fosse três, quatro”, ele diz que tem muita gente no albergue e poucos funcionários, tornando todo o processo, muitas vezes conturbado, “é um pouco difícil, mas eu gosto. Eu gosto porque a gente adquire mais experiência, a gente adquire mais paciência”. Luiz também conta que se sente mais seguro nos albergues e que tenta sempre se colocar no lugar dos funcionários que lá trabalham, “eles precisam zelar pelo bem estar deles, né? Fisicamente e mentalmente, né?”. Depois de

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CAPA falar sobre os albergues, Luiz cansou um pouco de conversar, “a fala é bonita, mas a gente precisa de música também, né?” O sanfoneiro nos agraciou com alguns números de música acompanhados por dança, um verdadeiro espetáculo Luiz Tomaz aprendeu a tocar a sanfona depois de velho, quando tinha por volta de quarenta e cinco anos de idade, lá em Rondonia, antes de vir para São Paulo. É aposentado e escolheu uma sanfona um pouco menor, principalmente pelo transporte, peso e valor

delas. Aprendemos que há uma grande variedade de sanfonas, com vários estilos, materiais e especificações diferentes. “Eu tive vontade porque a música, ela tanto alegra homem, mulher, criança e também alegra as árvores, né? Alegra as criações”. Luiz busca sempre passar alegria para quem ele vê, mesmo com todas as dificuldades do dia-adia, ele se sente bem tocando safona, assim como com algum trabalho, benfeitoria. Uma genuína contribuição para tornar o mundo mais feliz, mais

O profundo olhar de Luiz, o Sanfoneiro.

verde, de forma com que busca sempre fazer a sua parte para algo melhor, pois senão, como ele diz, “a natureza vai exigir de mim, né?” Completamente otimista, porém não contentado com isso, ele crê que pode melhorar mais ainda. Luiz é um homem místico e curioso também, ele acredita que sim, tem que sempre agradecer a deus pelas coisas, mas que é bom pedir também; pedir pra ser uma pessoa melhor, que gosta mais das coisas, pra não magoar os outros. Crê em espíritos e que se eu magoar você, ou você me magoar, não foi porque quis, mas foi um espírito mal que o fez. Ele diz que dá pra melhorar os espíritos também, nutrindo e produzindo alimento na terra, plantando coisas boas em cada um de nossos jardins. Luiz pausa um pouco durante a conversa, reflete e pensa sobre as noites. Sobre o que gosta de ler antes de dormir, como a Bíblia, Dicionário e livros de outras histórias. Ele diz que conhece tantas palavrass bonitas também por causa da ajuda do Supremo, das criaturas invisíveis, e que ajudam ele e o jeito que ele pensa, para o bem da humanidade. Luiz crê nessa força invisível, que é a força que ajuda todas as espécies de pessoas boas, todos os graus delas. Luiz com um olhar profundo, resume e conta mais de sua história, mas novamente, com uma música da sanfona.

A gente fala assim “não tenho mais coisa pra pedir pra Deus, eu preciso mais agradecer!”, tá certo, agradecer tá certo, mas a gente sempre tem coisa pra pedir pra Deus né? Pode pedir pra Deus pra gente ser uma pessoa que define mais as coisas, que gosta mais das coisas, pra gente não magoar os outros.

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CAPA falar sobre os albergues, Luiz cansou um pouco de conversar, “a fala é bonita, mas a gente precisa de música também, né?” O sanfoneiro nos agraciou com alguns números de música acompanhados por dança, um verdadeiro espetáculo Luiz Tomaz aprendeu a tocar a sanfona depois de velho, quando tinha por volta de quarenta e cinco anos de idade, lá em Rondonia, antes de vir para São Paulo. É aposentado e escolheu uma sanfona um pouco menor, principalmente pelo transporte, peso e valor

delas. Aprendemos que há uma grande variedade de sanfonas, com vários estilos, materiais e especificações diferentes. “Eu tive vontade porque a música, ela tanto alegra homem, mulher, criança e também alegra as árvores, né? Alegra as criações”. Luiz busca sempre passar alegria para quem ele vê, mesmo com todas as dificuldades do dia-adia, ele se sente bem tocando safona, assim como com algum trabalho, benfeitoria. Uma genuína contribuição para tornar o mundo mais feliz, mais

O profundo olhar de Luiz, o Sanfoneiro.

verde, de forma com que busca sempre fazer a sua parte para algo melhor, pois senão, como ele diz, “a natureza vai exigir de mim, né?” Completamente otimista, porém não contentado com isso, ele crê que pode melhorar mais ainda. Luiz é um homem místico e curioso também, ele acredita que sim, tem que sempre agradecer a deus pelas coisas, mas que é bom pedir também; pedir pra ser uma pessoa melhor, que gosta mais das coisas, pra não magoar os outros. Crê em espíritos e que se eu magoar você, ou você me magoar, não foi porque quis, mas foi um espírito mal que o fez. Ele diz que dá pra melhorar os espíritos também, nutrindo e produzindo alimento na terra, plantando coisas boas em cada um de nossos jardins. Luiz pausa um pouco durante a conversa, reflete e pensa sobre as noites. Sobre o que gosta de ler antes de dormir, como a Bíblia, Dicionário e livros de outras histórias. Ele diz que conhece tantas palavrass bonitas também por causa da ajuda do Supremo, das criaturas invisíveis, e que ajudam ele e o jeito que ele pensa, para o bem da humanidade. Luiz crê nessa força invisível, que é a força que ajuda todas as espécies de pessoas boas, todos os graus delas. Luiz com um olhar profundo, resume e conta mais de sua história, mas novamente, com uma música da sanfona.

A gente fala assim “não tenho mais coisa pra pedir pra Deus, eu preciso mais agradecer!”, tá certo, agradecer tá certo, mas a gente sempre tem coisa pra pedir pra Deus né? Pode pedir pra Deus pra gente ser uma pessoa que define mais as coisas, que gosta mais das coisas, pra gente não magoar os outros.

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NA PELE DO CORDEIRO

A SOLIDÃO

DAS RUAS

A psicóloga Fernanda Silva compartilha um pouco do universo por dentro das mentes de pessoas em situação de rua, quebrando o mito de que quem está nas ruas não quer sair delas. Design Juliana Alencar e Gabrieli Godoy Texto Jorge Garcia de Holanda

22

A

A AMPLA PRODUÇÃO de pesquisas sociológicas e antropológicas sobre populações de rua permite revelar o rico cenário de relações que estas pessoas estabelecem com uma série de atores que circulam no meio urbano: outros moradores de rua, domiciliados, transeuntes, turistas, policiais, vendedores ambulantes, comerciantes, participantes de grupos de caridade, prostitutas, artistas de rua, funcionários de instituições voltadas à população de rua, entre outros. A lista se expande e se complexifica na medida em que se revelam diferenças internas a cada um desses grupos de atores. Além destes, podemos identificar uma série de actantes não humanos que também deixam rastros e efeitos nas ações de moradores de rua: alimentos, dinheiro, materiais recicláveis, chuva, animais de rua, roupas, colchões, árvores, marquises e muitos outros. Somam-se a eles as infraestruturas estabelecidas e em processo de estabilização que conformam, visível ou invisivelmente, as maneiras como muitos desses atores circulam no espaço da cidade. Considero importante destacar essa profusão de atores com os quais moradores de rua se conectam porque eles, em larga medida, dizem respeito

às próprias formas como essas pessoas constroem seus modos de habitar a rua. Em suma, trata-se de rastrear como o universo de relações estabelecidas nas ruas, em suas diferentes formas – seja por associação, conflito, utilidade ou outras formas de construir relação –, participa da produção desses sujeitos e é também por eles produzido. As próprias formas de nomeação da população de rua, concomitantemente à sua constituição como questão social, se constituem a partir de efeitos de diversos agentes, discursos e instituições. Assim, viver na rua é também viver da rua, no sentido de que ela, enquanto espaço material e simbólico, apresenta conjuntos de possibilidades de sociabilidade, de obtenção de recursos e de manipulação de materiais. Portanto, se há a implicação de uma série de atores e processos sobre o morador de rua, este também é agente produtor de um modo de vida específico. A territorialização que pratica constitui-se enquanto modo próprio de ocupar o espaço público e construir nele tecnologias materiais de produção da vida cotidiana e “territórios temporários” (Kasper, 2006, p. 125, 214). Magni aponta que mesmo as pessoas que mantém na rua uma vida mais solitária tendem “a agrupar-se por períodos de tempos variáveis – seja vinculando-se por laços de afinidade, seja por laços familiares”. Em sentido semelhante, Lemões mostra o estabelecimento entre moradores de rua de redes sociofamiliares calcadas na partilha de bens e solidariedade.

FERNANDA SILVA Psicóloga formada pela USP. Trabalha como assistente social no Centro de Assistência Social do Semeador (CASS). Fernanda trabalha majoritariamente com a recolocação de pessoas em vulnerabilidade social na sociedade, do ponto de vista psicológico.

78%

Da população em situação de rua na cidade de São Paulo diz ter medo de perambular sozinha pelas ruas - de maneira que sempre acabam formando grupos. 23


NA PELE DO CORDEIRO

A SOLIDÃO

DAS RUAS

A psicóloga Fernanda Silva compartilha um pouco do universo por dentro das mentes de pessoas em situação de rua, quebrando o mito de que quem está nas ruas não quer sair delas. Design Juliana Alencar e Gabrieli Godoy Texto Jorge Garcia de Holanda

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A

A AMPLA PRODUÇÃO de pesquisas sociológicas e antropológicas sobre populações de rua permite revelar o rico cenário de relações que estas pessoas estabelecem com uma série de atores que circulam no meio urbano: outros moradores de rua, domiciliados, transeuntes, turistas, policiais, vendedores ambulantes, comerciantes, participantes de grupos de caridade, prostitutas, artistas de rua, funcionários de instituições voltadas à população de rua, entre outros. A lista se expande e se complexifica na medida em que se revelam diferenças internas a cada um desses grupos de atores. Além destes, podemos identificar uma série de actantes não humanos que também deixam rastros e efeitos nas ações de moradores de rua: alimentos, dinheiro, materiais recicláveis, chuva, animais de rua, roupas, colchões, árvores, marquises e muitos outros. Somam-se a eles as infraestruturas estabelecidas e em processo de estabilização que conformam, visível ou invisivelmente, as maneiras como muitos desses atores circulam no espaço da cidade. Considero importante destacar essa profusão de atores com os quais moradores de rua se conectam porque eles, em larga medida, dizem respeito

às próprias formas como essas pessoas constroem seus modos de habitar a rua. Em suma, trata-se de rastrear como o universo de relações estabelecidas nas ruas, em suas diferentes formas – seja por associação, conflito, utilidade ou outras formas de construir relação –, participa da produção desses sujeitos e é também por eles produzido. As próprias formas de nomeação da população de rua, concomitantemente à sua constituição como questão social, se constituem a partir de efeitos de diversos agentes, discursos e instituições. Assim, viver na rua é também viver da rua, no sentido de que ela, enquanto espaço material e simbólico, apresenta conjuntos de possibilidades de sociabilidade, de obtenção de recursos e de manipulação de materiais. Portanto, se há a implicação de uma série de atores e processos sobre o morador de rua, este também é agente produtor de um modo de vida específico. A territorialização que pratica constitui-se enquanto modo próprio de ocupar o espaço público e construir nele tecnologias materiais de produção da vida cotidiana e “territórios temporários” (Kasper, 2006, p. 125, 214). Magni aponta que mesmo as pessoas que mantém na rua uma vida mais solitária tendem “a agrupar-se por períodos de tempos variáveis – seja vinculando-se por laços de afinidade, seja por laços familiares”. Em sentido semelhante, Lemões mostra o estabelecimento entre moradores de rua de redes sociofamiliares calcadas na partilha de bens e solidariedade.

FERNANDA SILVA Psicóloga formada pela USP. Trabalha como assistente social no Centro de Assistência Social do Semeador (CASS). Fernanda trabalha majoritariamente com a recolocação de pessoas em vulnerabilidade social na sociedade, do ponto de vista psicológico.

78%

Da população em situação de rua na cidade de São Paulo diz ter medo de perambular sozinha pelas ruas - de maneira que sempre acabam formando grupos. 23


DADOS DA RUA

NAS RUAS DE SP O número de pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo aumentou - 60% superior ao identificado no censo de 2015, onde foram identificados 15,9 mil pessoas.

Infográfico: Juliana Alencar e Gabrieli Godoy

85% da população em situação de rua é composta por

46,6%

67%

5%

29%

24

2011

2015

2019

80% 20%

Conseguem ao menos uma refeição/dia.

1 a 4 anos

1,2%

94%

0,6%

3% 2%

8,7%

5 a 14 anos

Problemas com álcool ou drogas

24 a 34 anos

Perda de emprego

35 a 44 anos

Desavenças com a família

45 a 54 anos 55 a 64 anos Mais de 65 anos

Ficam sem comer, eventualmente.

ACESSO A BENEFÍCIOS

IDADES MAIS EXPOSTAS À VIOLÊNCIA NAS RUAS Menos de 1 ano

Outros 2009

Não sabem escrever.

PARDO OU NEGRO

1%

15 a 24 anos

2000

Sabem ler e escrever.

se autodeclara como

MOTIVOS DE ESTAREM NA RUA

30%

6.587

9%

OBTENÇÃO DE ALIMENTOS

dessas pessoas tem de 31 a 49 anos de idade

24.344

5.013

17%

Assinam apenas o próprio nome.

NÚMERO DE PESSOAS NAS RUAS, EM SÃO PAULO, AO LONGO DOS ANOS

7.335

74%

HOMENS

36%

6.765

TAXA DE ALFABETIZAÇÃO

38,1% 21,9% 14,7% 7% 4,4%

Não recebem benefícios sociais. Recebem apenas aposentadoria. Recebem Bolsa Família. Recebem BPC

3,5%

Fontes: “Brasil registra mais de 17 mil casos de violência contra moradores de rua em 3 anos”, G1 SP; Censo Pop Rua; ANDES-SN; Prefeitura de SP.

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DADOS DA RUA

NAS RUAS DE SP O número de pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo aumentou - 60% superior ao identificado no censo de 2015, onde foram identificados 15,9 mil pessoas.

Infográfico: Juliana Alencar e Gabrieli Godoy

85% da população em situação de rua é composta por

46,6%

67%

5%

29%

24

2011

2015

2019

80% 20%

Conseguem ao menos uma refeição/dia.

1 a 4 anos

1,2%

94%

0,6%

3% 2%

8,7%

5 a 14 anos

Problemas com álcool ou drogas

24 a 34 anos

Perda de emprego

35 a 44 anos

Desavenças com a família

45 a 54 anos 55 a 64 anos Mais de 65 anos

Ficam sem comer, eventualmente.

ACESSO A BENEFÍCIOS

IDADES MAIS EXPOSTAS À VIOLÊNCIA NAS RUAS Menos de 1 ano

Outros 2009

Não sabem escrever.

PARDO OU NEGRO

1%

15 a 24 anos

2000

Sabem ler e escrever.

se autodeclara como

MOTIVOS DE ESTAREM NA RUA

30%

6.587

9%

OBTENÇÃO DE ALIMENTOS

dessas pessoas tem de 31 a 49 anos de idade

24.344

5.013

17%

Assinam apenas o próprio nome.

NÚMERO DE PESSOAS NAS RUAS, EM SÃO PAULO, AO LONGO DOS ANOS

7.335

74%

HOMENS

36%

6.765

TAXA DE ALFABETIZAÇÃO

38,1% 21,9% 14,7% 7% 4,4%

Não recebem benefícios sociais. Recebem apenas aposentadoria. Recebem Bolsa Família. Recebem BPC

3,5%

Fontes: “Brasil registra mais de 17 mil casos de violência contra moradores de rua em 3 anos”, G1 SP; Censo Pop Rua; ANDES-SN; Prefeitura de SP.

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PROJETE-SE

01. SP INVISÍVEL

Design Juliana Alencar e Gabrieli Godoy Texto falso da internet

PROJETOS DO BEM É aquela coisa: “fazer o bem sem ver a quem”. Os projetos listados nesta seção foram especiamente selecionados, pois precisam de todo o nosso apoio - quanto mais, melhor!

26

ESTAR À BEIRA DA sociedade e em estado de vulnerabilidade traz incontáveis problemas e dificuldades para as pessoas que vivenciam este mal. Atendimento de saúde física, mental e emocional, nutrição, higiene, moradia, emprego são alguns dos desafios enfrentados por essas pessoas. Entender o lugar que estamos, nossos privilégios e nossas oportunidades é essencial para a criação, aplicação e execução de projetos e formas de ajudar as pessoas a terem uma vida mais digna. Para essa edição, separamos alguns projetos espalhados pela cidade de São Paulo, contando um pouco sobre suas atuações, como ajudar e contribuir, e principalmente, para disseminar a mensagem, para que mais pessoas entrem em contato, façam parte e engajem da forma que puderem.

O SP INVISÍVEL começou em 2014 após uma exposição que mobilizou um grupo de adolescentes da Igreja Batista da Água Branca para fotografarem tudo que era invisível na cidade de São Paulo. Após o evento, André Soler e Vinícius Lima que participaram desse dia pensaram, “invisível não é a pessoa que está ali, mas a sua história. E se nós contássemos essas histórias?” – E foi a partir daí que o projeto nasceu. Nele, foram contadas diversas histórias. Algumas pessoas nunca mais foram reencontradas, outras voltaram para as suas casas, arrumaram empregos, mas o mais legal

é a mudança de olhar que essas histórias geram em quem está lendo. Depois de um tempo, chegaram à conclusão que mesmo contando histórias, era necessário incentivar mais essa conexão entre as realidades. Então, iniciaram projetos e ações para mobilizar voluntários a ajudar as pessoas em situação de rua, criando, assim, ambientes para que os invisíveis da cidade pudessem ser ajudados. Hoje, o SP Invisível é um movimento de conscientização através de histórias e ações em São Paulo que quer humanizar os olhares de toda população para que a cidade seja mais humana.

A gente queria mostrar que tem muito mais por trás de pedir esmolas.

Ação voluntária do SP Invisível durante a pandemia em SP.

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PROJETE-SE

01. SP INVISÍVEL

Design Juliana Alencar e Gabrieli Godoy Texto falso da internet

PROJETOS DO BEM É aquela coisa: “fazer o bem sem ver a quem”. Os projetos listados nesta seção foram especiamente selecionados, pois precisam de todo o nosso apoio - quanto mais, melhor!

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ESTAR À BEIRA DA sociedade e em estado de vulnerabilidade traz incontáveis problemas e dificuldades para as pessoas que vivenciam este mal. Atendimento de saúde física, mental e emocional, nutrição, higiene, moradia, emprego são alguns dos desafios enfrentados por essas pessoas. Entender o lugar que estamos, nossos privilégios e nossas oportunidades é essencial para a criação, aplicação e execução de projetos e formas de ajudar as pessoas a terem uma vida mais digna. Para essa edição, separamos alguns projetos espalhados pela cidade de São Paulo, contando um pouco sobre suas atuações, como ajudar e contribuir, e principalmente, para disseminar a mensagem, para que mais pessoas entrem em contato, façam parte e engajem da forma que puderem.

O SP INVISÍVEL começou em 2014 após uma exposição que mobilizou um grupo de adolescentes da Igreja Batista da Água Branca para fotografarem tudo que era invisível na cidade de São Paulo. Após o evento, André Soler e Vinícius Lima que participaram desse dia pensaram, “invisível não é a pessoa que está ali, mas a sua história. E se nós contássemos essas histórias?” – E foi a partir daí que o projeto nasceu. Nele, foram contadas diversas histórias. Algumas pessoas nunca mais foram reencontradas, outras voltaram para as suas casas, arrumaram empregos, mas o mais legal

é a mudança de olhar que essas histórias geram em quem está lendo. Depois de um tempo, chegaram à conclusão que mesmo contando histórias, era necessário incentivar mais essa conexão entre as realidades. Então, iniciaram projetos e ações para mobilizar voluntários a ajudar as pessoas em situação de rua, criando, assim, ambientes para que os invisíveis da cidade pudessem ser ajudados. Hoje, o SP Invisível é um movimento de conscientização através de histórias e ações em São Paulo que quer humanizar os olhares de toda população para que a cidade seja mais humana.

A gente queria mostrar que tem muito mais por trás de pedir esmolas.

Ação voluntária do SP Invisível durante a pandemia em SP.

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PROJETE-SE

03. BRAÇOS DO BEM

Voluntários lendo e brincando com os filhos dos assistidos, no CASS.

02. CASS

Todo mundo precisa de uma mão estendida pra ajudar a se levantar. Sem julgamentos.

28

EM 1989, COM A fundação do centro espírita O Semeador, um grupo de estudiosos procurava proporcionar assistência aos moradores de Santana de Parnaíba que necessitavam de apoio material e/ ou espiritual. Em 2002, com o objetivo de aumentar essa atuação no campo de promoção humana e social da família, foi adquirido um terreno na Rua Alagoas, na região da Fazendinha, em Santana de Parnaíba, para a construção de um prédio para abrigar o Centro de Assistência Social Marília Forjaz Alvarenga (CASS). Com a ajuda de inúmeros voluntários, o CASS foi construído em uma estrutura de aproximadamente 1.600 m2 de área útil, dedicada exclusiva-

mente à prestação de serviços à população da região, por meio de funcionários próprios e voluntários em várias áreas de atuação. Atualmente o CASS oferece atendimento à crianças, adolescentes e famílias em situação de vulnerabilidade social e econômica, oferecendo desde assistência à gestante, recém-nascidos (puericultura), auxílio escolar às crianças assistidas pela instituição, alfabetização de adultos, atendimento odontológico, psicológico, serviços advocatícios, e cursos de capacitação profissional. O objetivo do CASS não é fazer caridade, mas sim estender uma mão amiga para que todos tenham a oportunidade de se erguer por si próprios.

O GRUPO BRAÇOS do Bem é formado apenas por amigos, não tendo nenhum fim lucrativo, nem vínculos empresariais ou religiosos. Tendo sua divulgação apenas no boca-a-boca, em rodas de amigos e entre famílias, eles contam somente com pequenas doações, para as 100 refeições semanais que são entregues no Glicério no centro de SP. As entregas são realizadas há 3 anos, com um kit que contém água, uma quentinha, um docinho e cobertores para aquecer durante o inverno. Uma vez por semana, o grupo reúne alguns voluntários para cozinhar, preparar e distribuir esses combos pela noite de São Paulo. Não tendo nenhum apoio financeiro além das doações, eles contam com essa divulgação para continuar funcionando.

A gente faz o que a gente ama e não esperamos nada em troca. Simples assim.

Os amigos da Braços do Bem reunidos para a entrega das marmitas

APOIE TAMBÉM... ANJOS DA NOITE

PROJETO RUAS

o Núcleo Assistencial Anjos da Noite realiza o trabalho desde 1989. Diversas pessoas que voluntariamente doam, além do seu tempo, alimentos, roupas e principalmente amor. Uma simples refeição, um agasalho e uma palavra amiga são as fundamentais para possibilitar a reintegração social.

Orientamos voluntários a pensarem em atividades semanais, para serem realizadas conjuntamente à população em situação de rua de seu bairro. Todas as terças de noite eles levam dinâmicas diferentes envolvendo saúde, arte, cultura e tecnologia. Sempre no mesmo local e horário.

www.anjosdanoite.org.br @anjosdanoite.ong

www.projetoruas.org.br @projetoruas

Aqui você encontra outros projetos bacanas para apoiar. Venha fazer parte dessa corrente!

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PROJETE-SE

03. BRAÇOS DO BEM

Voluntários lendo e brincando com os filhos dos assistidos, no CASS.

02. CASS

Todo mundo precisa de uma mão estendida pra ajudar a se levantar. Sem julgamentos.

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EM 1989, COM A fundação do centro espírita O Semeador, um grupo de estudiosos procurava proporcionar assistência aos moradores de Santana de Parnaíba que necessitavam de apoio material e/ ou espiritual. Em 2002, com o objetivo de aumentar essa atuação no campo de promoção humana e social da família, foi adquirido um terreno na Rua Alagoas, na região da Fazendinha, em Santana de Parnaíba, para a construção de um prédio para abrigar o Centro de Assistência Social Marília Forjaz Alvarenga (CASS). Com a ajuda de inúmeros voluntários, o CASS foi construído em uma estrutura de aproximadamente 1.600 m2 de área útil, dedicada exclusiva-

mente à prestação de serviços à população da região, por meio de funcionários próprios e voluntários em várias áreas de atuação. Atualmente o CASS oferece atendimento à crianças, adolescentes e famílias em situação de vulnerabilidade social e econômica, oferecendo desde assistência à gestante, recém-nascidos (puericultura), auxílio escolar às crianças assistidas pela instituição, alfabetização de adultos, atendimento odontológico, psicológico, serviços advocatícios, e cursos de capacitação profissional. O objetivo do CASS não é fazer caridade, mas sim estender uma mão amiga para que todos tenham a oportunidade de se erguer por si próprios.

O GRUPO BRAÇOS do Bem é formado apenas por amigos, não tendo nenhum fim lucrativo, nem vínculos empresariais ou religiosos. Tendo sua divulgação apenas no boca-a-boca, em rodas de amigos e entre famílias, eles contam somente com pequenas doações, para as 100 refeições semanais que são entregues no Glicério no centro de SP. As entregas são realizadas há 3 anos, com um kit que contém água, uma quentinha, um docinho e cobertores para aquecer durante o inverno. Uma vez por semana, o grupo reúne alguns voluntários para cozinhar, preparar e distribuir esses combos pela noite de São Paulo. Não tendo nenhum apoio financeiro além das doações, eles contam com essa divulgação para continuar funcionando.

A gente faz o que a gente ama e não esperamos nada em troca. Simples assim.

Os amigos da Braços do Bem reunidos para a entrega das marmitas

APOIE TAMBÉM... ANJOS DA NOITE

PROJETO RUAS

o Núcleo Assistencial Anjos da Noite realiza o trabalho desde 1989. Diversas pessoas que voluntariamente doam, além do seu tempo, alimentos, roupas e principalmente amor. Uma simples refeição, um agasalho e uma palavra amiga são as fundamentais para possibilitar a reintegração social.

Orientamos voluntários a pensarem em atividades semanais, para serem realizadas conjuntamente à população em situação de rua de seu bairro. Todas as terças de noite eles levam dinâmicas diferentes envolvendo saúde, arte, cultura e tecnologia. Sempre no mesmo local e horário.

www.anjosdanoite.org.br @anjosdanoite.ong

www.projetoruas.org.br @projetoruas

Aqui você encontra outros projetos bacanas para apoiar. Venha fazer parte dessa corrente!

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FECHA ASPAS

TRÁ

GICO

EN RE DO

Paciência trabalhada No dia a dia Que estamos trancados Em nós mesmos Isolamento calculado Somente desejando Sair melhorando Nesse trágico enredo

Design Gabrieli Godoy Texto Ricardo Garcia, o poeta da Paulista

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FECHA ASPAS

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