ECHO

Page 1

Ideias inovadoras no mundo da música

ano 1 # 1 :: dezembro de 2012 :: www.echo.com.br

R$ 12,90 Editora:

CRIOLO Criolo fala sobre sua música e sociedade.

PEROLA NEGRA

MV BILL

Conheça a tragetória do rapper MV Bill e sua participação na fundação da CUFA.

A escola de samba Pérola Negra e sua contribuição para a comunidade da Vila Madalena.

Juice Rap News + Movimento Mangue Beat + Boom Festival e sustentabilidade música para ler :: echo | 1


2 | echo :: mĂşsica para ler


EDITO RIAL Hey there! Olá caro leitor! A revista ECHO tem como propostra trazer ao seu conhecimento idéias inovadoras, projetos e pessoas que vêm contribuindo para transformações sociais mundo afora por meio da música. Nessa primeira edição da revista trazemos uma entrevista com o cantor Criolo, falando sobre sua carreira, fama e sociedade e também teremos uma matéria sobre o rapper MV Bill, que além de ter grande teor crítico e político em suas músicas também é bastante comprometido com projetos sociais, sendo o mais importante deles a CUFA (Central Única das Favelas) que atua em todo o Brasil. Esperamos que gostem! Boa Leiura!

EXPEDIENTE REDAÇÃO redaçãoecho@echo.com.br Diretor de Redação Ricardo Alexandre Redator chefe Lino Bocchini lino@echo. com.br Editora Lia Hama Repórter Excepcional Arthur Veríssimo Repórter Especial Bruno Tortura Nogueira Repórteres Caio Ferretti e Millos Kaiser Estagiário de redação Raymundo Calumby

DESIGN arte@echo.com.br Diretora de Arte Suzanne Santana Editora de Arte Suzanne Mendes Projeto Gráfico Suzanne Rollemberg

música para ler :: echo | 3


SUMÁRIO Se liga! MV Bill e a Central Única das Favelas.

pág. 10

Novas As últimas novidades no mundo da música.

pág. 5

Entrevista Criolo fala sobre sua carreirae projetos sociais.

pág. 14

Social Conheça a escola de samba Pérola Negra.

pág. 10

Outras Novas Fone de ouvido feito de madeira. pág. 7 Case para Iphone é produzido a partir de plantas. pág. 7 Movimento Mangue Beat e a trasformação social. 4 | echo :: música para ler

pág. 8

Edição Número 1 Ano 2012


Novas Ideias inovadoras no mundo da música.

Balada sustentável de Nova Yorque vai abrir as portas em São Paulo A Greenhouse, casa noturna eco-friendly de Nova York, irá aterrissar em São Paulo pelas mãos de Arthur Briquet, dono do Gallery, e de outros empresários que estão deixando a sociedade da Pink Elephant. A balada ainda está em fase de projeto, mas o local já foi definido: será vizinho do Gallery, nos Jardins. A Greenhouse americana é toda decorada com material reciclado (e reciclável) e recebeu o selo da United States Green Buildings Council pelo design e construção ambientalmente conscientes. Já imaginou poder produzir energia enquanto se move em uma pista de dança? Com a Sustainable Dance Floor, mais uma invenção dos designers holandeses do Studio Roosergaard, é possível. Eles criaram uma pista da dança sustentável, que produz eletricidade conforme as pessoas dançam. música para ler :: echo | 5


NOVAS | ECOLOGIA

Boom Festival mistura música, arte e sustentabilidade O Boom Festival é um festival bienal de cultura visionária realizado em Portugal durante a lua cheia de Agosto. Iniciou-se em 1997 enquanto evento musical, mas evoluiu ao longo das suas edições para uma celebração da cultura alternativa. O Boom é hoje um festival multidisciplinar, transgeracional e intercultural. É um acontecimento multidisciplinar pois cruza diversas correntes artísticas, como pintura, escultura, land art, instalações interactivas, música, video arte, galeria de artes plásticas ou graffiti. As propostas artísticas são complementadas por um vasto cartaz de conferências, workshops, tertúlias e apresentações de temas como metodologias de ciência alternativa, exobiologia, cultura visionária, culturas ancestrais, espiritualidade, gnosticismo, antropologia, psicologia da consciência, paganismo ou inteligência emocional. Em 2004, o Boom começou a desenvolver projectos para se tornar totalmente auto-sustentável, de forma a não contaminar a natureza e educar para a consciência ecológica. Nestas práticas incluemse o desenvolvimento de casas de banho que não usam químicos; o tratamento das águas do festival através de biotecnologias; a utilização de energias solar e eólica; a reciclagem; a organização do espaço do Boom segundo os princípios da Permacultura: e o fornecimento gratuito de kits de limpeza ao participantes (cinzeiros de bolso e sacos de lixo). 6 | echo :: música para ler

As propostas artísticas são complementadas por um vasto cartaz de conferências, workshops, tertúlias e apresentações de temas como metodologias de ciência alternativa, exobiologia, cultura visionária, culturas ancestrais, espiritualidade, gnosticismo, antropologia, psicologia da consciência, paganismo ou inteligência emocional. Em 2004, o Boom começou a desenvolver projectos para se tornar totalmente auto-sustentável, de forma a não contaminar a natureza e educar para a consciência ecológica. Nestas práticas incluem-se o desenvolvimento de casas de banho que não usam químicos; o tratamento das águas do festival através de biotecnologias; a utilização de energias solar e eólica; a reciclagem; a organização do espaço do Boom segundo os princípios da Permacultura gratuito. Acima o poster de divulgação do evento.


Rapidinhas Calça inovadora gera energia para escutar músicas

Pista de dança suntentável Acima a pista de dança que gera energia.

Já imaginou poder produzir energia enquanto se move em uma pista de dança? Com a Sustainable Dance Floor, mais uma invenção dos designers holandeses do Studio Roosergaard, é possível. Eles criaram uma pista da dança sustentável, que produz eletricidade conforme as pessoas dançam. Samus, que nestem inciatiisti unto ium faccabo. Itaqui offic torit volupta intis ut dis ipiet, consequatin essum none apienihicius possi faccaborem ipsam disimaioria corepta niendig nienda dolore, anti ut omnis alibus, vel molupta tatum, qui ullectio bea pe sit audaeseque.

Fone de ouvido feito de madeira

Além de ecológica a embalagem é linda.

Estes fones feitos pela Thinksound além de sustentáveis, tem som dinâmico e um design muito bonito. São 5 modelos produzidos manualmente. Iniciou-se o projeto com a idéia de trabalhar um fone de ouvido com uma pegada sustentável. Evoluindo para um fone de ouvido em madeira onde seu timbre e sua acústica são incomparáveis. Além de todas as partes como também embalagem são de materiais recicláveis ou de fontes renováveis. É um lindo projeto.

A designer Inesa Malafej criou um conceito de uma calça que gera energia para um MP3 Player quando nos movimentamos. para andar, correr ou dançar.

Música com sons da natureza e diversos instrumentos e objetos Conheça o trabalho do músico Diego Stocco que faz sons com os mais diversos objetos. Ele faz música com elementos da natureza como cocos, casca de laranja, arroz entre outros. Só acessar o site: www.diegostocco.bandcamp.com

Case para iPhone é produzido a partir de plantas Existem inúmeros modelos de cases para proteger seu iPhone ou iPhone Touch. Mas se você está buscando uma opção mais sustentável, chegou a Bioserie. Esses cases são feitos de plástico biológico, criado a partir de plantas.

Balada sustentável de NY abre portas em São Paulo Existem inúmeros modelos de cases para proteger seu iPhone ou iPhone Touch. Mas se você está buscando uma opção mais sustentável, chegou a Bioserie. Esses cases são feitos de plástico biológico.

música para ler :: echo | 7


NOVAS | SOCIAL

MOVIMENTO MANGUE BEAT Emergência! Um choque rápido ou o Recife morre de infarto! Não é preciso ser médico para saber que a maneira mais simples de parar o coração de um sujeito é obstruindo as suas veias. O modo mais rápido, também, de infartar e esvaziar a alma de uma cidade como o Recife é matar os seus rios e aterrar os seus estuários. O que fazer para não afundar na depressão crônica que paralisa os cidadãos? Como devolver o ânimo, deslobotomizar e recarregar as baterias da cidade? Simples! Basta injetar um pouco de energia na lama e estimular o que ainda resta de fertilidade nas veias do Recife. Em meados de 91, começou a ser gerado e articulado em vários pontos da cidade um núcleo de pesquisa e produção de idéias pop. O objetivo era engendrar um *circuito energético*, capaz de conectar as boas vibrações dos mangues com a rede mundial de circulação de conceitos pop. Imagem símbolo: uma antena parabólica.

Acima Chico Science e Nação Zumbí.

Juice Rap News Juice Rap News, um projeto criado por Hugo Farrat (apresentador) e Nanni Giordano (Editor) que fazem programas sobre assuntos atuais transformando notícias em análises sócio-poética/ humorada na levada do RAP. 8 | echo :: música para ler

Uma troca justa Um jovem músico recebeu um convite para estudar no melhor conservatório do mundo da sua área que fica na Suiça. Ele faz uma proposta bonita, justa. O jovem músico troca a nossa ajuda para financiar seus estudos por oficinas em escolas públicas do Brasil onde vai compartilhar o que aprender. Justo. Simples. Bonito. Até parece roteiro de filme. Mas pra história acontecer de verdade temos que ajudar.

O músico Diogo Rodrigues.


mĂşsica para ler :: echo | 9


SE LIGA! | MV BILL

MV BIL Alex Pereira Barbosa, mais conhecido como MV Bill é um rapper e escritor brasileiro e também um dos fundadores da CUFA (Central única das favelas).

Por Todos Nós Foto Autor Desconhecido

10 | echo :: música para ler


L

A

lém da carreira de rapper e escritor, MV Bill também participou de outros projetos. O mais conhecido deles é como ativista social, quando criou junto com Celso Athayde e Nega Gizza em 1999 a Central Única das Favelas (CUFA), que está distribuída em todos os estados do Brasil. Acompanhado a CUFA, veio o Prêmio Hutúz, considerado o maior da América Latina e que teve dez edições entre 2000 e 2009. O Prêmio Hutúz faz parte de um festival que sempre teve sua abertura em 4 de novembro, o Dia da Favela, e contava com shows, batalhas de MCs, exposição de pinturas, oficinas e outras atividades. Além disso, a CUFA organiza outros projetos, como competições desportivas, de dança e grafite, rádios comunitárias e exibição de filmes. Um dos primeiros projetos de MV Bill foi a participação na criação do PPPOMAR.

música para ler :: echo | 11


SE LIGA! | MV BILL Alex Pereira Barbosa (Rio de Janeiro, 3 de janeiro de 1974) mais conhecido pelo nome artístico MV Bill, é um rapper e escritor brasileiro. Iniciou a carreira na música em 1988 quando começou a escrever sambas-enredo para seu pai, sendo que em 1993 fez sua primeira participação em um disco oficial. Seu primeiro álbum foi lançado em 1999 sob o título de Traficando Informação, que contou com a faixa “Soldado do Morro”, que fez MV Bill ser acusado de apologia ao crime. Três anos depois, gravou o segundo trabalho, chamado Declaração de Guerra, com participações de artistas como Charlie Brown Jr. e Nega Gizza. Sua discografia ainda abrange outros dois álbuns, Falcão, O Bagulho é Doido, de 2006, e Causa e Efeito, de 2010. Ainda, lançou um disco de vídeo em 2009, intitulado Despacho Urbano. Paralelamente à carreira de rapper, MV Bill lançou em 2005, junto com Celso Athayde, o livro Cabeça de Porco. No ano seguinte, Falcão - Meninos do Tráfico, disponibilizado em livro e DVD, que tornou-se conhecido nacionalmente após exibição no programa Fantástico, da Rede Globo. O documentário conta a história de dezessete jovens que se envolveram com o tráfico de drogas, onde somente um sobreviveu. Durante as filmagens, Bill chegou a ser detido e preso por policiais. Uma sequência desse material foi lançada em 2007, sob o nome Falcão - Mulheres e o Tráfico. MV Bill também atua como ativista social, tendo criado junto com Celso Athayde a organização nãogovernamental Central Única das Favelas (CUFA), presente em todos os estados do Brasil. Acompanhada da CUFA, veio o Festival Hutúz e consequentemente o Prêmio Hutúz, que enquanto existiu, foi considerado o maior do gênero na América Latina. Em 2009 participou das filmagens do filme Sonhos Roubados e, no ano seguinte, passou a integrar o elenco da 18ª temporada da telenovela Malhação, exibida pela Rede Globo, como o persongem Antônio. Apresenta o programa Aglomerado na TV Brasil, o programa A Voz das Periferias na 94,1FM do Rio de Janeiro e O Som das

Cufa na Favela do Sapo.

12 | echo :: música para ler

Durante as filmagens, Bill chegou a ser detido e preso por policiais.


O QUE OS MORADORES DAS FAVELAS CARIOCAS ACHAM SOBRE SUAS CONDIÇÕES DE VIDA

na 94,9 FM do Rio. Em 1998, MV Bill lançou o disco CDD Mandando Fechado, pela gravadora Zâmbia Fonográfica, com músicas que contam a realidade do bairro em que mora, mas com o nome das pessoas alterados para preservar as respectivas identidades.Um ano depois, este álbum foi remasterizado com a adição de três novas faixas e relançado pela Natasha Records com o título Traficando Informação. O disco, que contou com a produção de Ice Blue, integrante dos Racionais MC’s, teve a participação especial de KL Jay, DJ Will, PMC e sua irmã Kmila CDD. As três faixas inéditas são “De Homem pra Homem”, “Sem Esquecer as Favelas” e “Soldado do Morro”. Ainda em 1999, MV Bill lançou seu primeiro videoclipe, “Traficando Informação”, através da Conspiração Filmes. Participou do Free Jazz Festival como um dos únicos artistas de rap, onde polemizou ao apresentar-se com uma arma na cintura, que mais tarde afirmou ser de brinquedo. Uma das suas mais famosas atitudes está o fato de só dar entrevistas na Cidade de Deus. Ficou ainda mais conhecido em 2000, ao estrelar uma campanha publicitária de televisão contra o vandalismo em telefones públicos.Em 2000, foi indicado ao Video Music Brasil com a canção “A Noite”, mas acabou sendo derrotado por “ Us Mano e as Mina”, de Xis. Em dezembro de 2000, o rapper lançou o videoclipe de “Soldado do Morro”, onde também retrata o trabalho dos traficantes no bairro. Foi acusado de apologia ao crime por usar um fuzil em todo o videoclipe e recebeu represálias negativas de algumas personalidades da música. Em contraponto, Caetano Veloso, Djavan e Gilberto Gil se posicionaram a favor de MV. O videoclipe foi premiado no Prêmio Hutúz - o maior do gênero na América Latina - como “Melhor Videoclipe do Ano” e no tradicional Video Music Brasil 2001, da MTV, como “Melhor Videoclipe de Rap”. No ano seguinte, lançou seu segundo álbum oficial, através da Natasha Records e da BMG, chamado Declaração de Guerra, que basicamente trata sobre os mesmos assuntos de Traficando Informação. Conforme explicado pelo artista, a declaração de guerra é em favor dos excluídos e contra o preconceito ao negro.

36

57 %

%

Acreditam ter rendimentos iguais aos outros habitantes do Rio de Janeiro.

3

%

Acham que quem vive na favela ganha menos que outros habitantes do Rio de Janeiro.

Acham que o morador da favela é miserável.

Índice em favelas

46 % 42 %

Dizem viver em condição social inferior aos moradores do asfalto.

10 %

Acreditam que se encontram em péssimas condições de vida.

Fonte: IBPS

Acreditam que vivem na mesma condição social de moradores do asfalto.

música para ler :: echo | 13


ENTREVISTA | CRIOLO www

todo mundo tem Autor do disco mais elogiado do ano, incensado pela crítica e por uma devota massa de fãs, indicado a cinco prêmios no VMB, shows abarrotados. Entrevista Bruno Torturra Nogueira Foto Daryan Dornelles

14 | echo :: música para ler


C

uriosamente, o disco é fruto de tudo, menos dessa tal falta de amor em SP. Sem gravadora, orçamento superreduzido, Criolo virou apenas o talento ao redor do qual gravitou muita gente que... amou o projeto. E estava a fim de ajudar sem esperar muito em troca. Cabral convidou Ganjaman para coproduzir a bolacha. Músico experiente, rodado no mainstream e no underground, Ganja entendeu logo o que tinha na mão. “Eu faria na boa um disco tradicional de rap. Mas quando ele cantou umas músicas vi que era um material rico pra cacete. Que tinha espaço ali para arranjos de banda mesmo.” Ganja hospedou o cantor em sua casa, e trabalharam duro. Alistaram alguns dos melhores músicos de São Paulo. O único selo que acompanha o disco independente é o da Matilha Cultural, um coletivo de São Paulo do qual Cabral faz parte e que reúne artistas e ativistas em torno de diferentes causas. Entre elas, apoiar a gravação do que muita gente está chamando de melhor disco do ano. Sem verba de divulgação, com uma assessoria de imprensa voluntária, foi na rede que as primeiras faixas de Nó na orelha correram como rastilho de pólvora. Você canta desde os 13 anos. São mais de 20 anos de carreira, um nome consolidado no rap nacional. Mas com o lançamento do Nó na orelha seu som chegou para muito mais gente. É estranho esse sucesso “súbito”? Quando eu comecei com 12, 13 anos de idade, não pensei que alguém fosse me escutar. Eu sempre fiz tudo por amor ao rap e por uma vontade muito grande de contribuir. Eu cantava porque tinha necessidade de expressar uma dor que eu sentia, e ela perdura até hoje. Mas é totalmente diferente de

uma pessoa que entrou nessa pra fazer sucesso. Tanto que, até pouco tempo antes do disco, eu me questionei se deveria continuar subindo no palco. Se minha construção de texto, de ideias, ainda iria evoluir. Se não tinha outras formas de contribuir. Porque o MC no palco é só a ponta de um iceberg. Foi nessa época de questionamento que nasceu o Nó na orelha. De um registro de um cara que iria deixar os palcos. Como assim? Legal seria eu não sentir essa dor no peito. Eu faço música porque eu tô desesperado! Porque eu não me ponho à parte. Eu sou povo, sou do Grajaú. Tenho orgulho das pessoas que lutam por lá. Vou fazer 36 anos e vejo o quanto o mundo ainda está sofrido. Então só paro se alguém me matar. Porque eu sinto essa urgência de conversar com as pessoas. E eu acho que a música abre um diálogo. De certa forma, você não se sente só. Tem gente me escutando porque eu tô há 20 anos nessa. Não precisa glamorizar, inventar que estou fazendo sucesso agora. Não é uma questão de glamour. mas quando esse diálogo ganha escala Deixa de ser tão pessoal. Por um lado sim. Mas a mensagem passa e a gente cria uma ponte. Porque está todo mundo passando fome. Essa é a verdade. Estamos todos morrendo de fome. Seja de feijão com farinha, seja de amor. Por isso essa atenção toda, essas coisas que vêm acontecendo. Mais do que nunca hoje a arte é uma coisa buscada, valorizada. Porque o lúdico, a magia da comunicação, isso supre uma fome das pessoas. Mas a exposição, foto no jornal, jornalistas te chamando de gênio... Você não considera esse movimento meio perigoso? Quando te elogiam demais você acaba arrumando inimigo sem saber. Peço desculpa a todos. Mas eu não estou em

busca de elogios. Só faço música com o coração. Se um dia fizer outro disco vai ser com a mesma intensidade, com o mesmo amor que eu fiz esse. O que as pessoas falarem eu vou respeitar, é a opinião delas. Mas também não posso reclamar de uma pessoa que tá me mandando uma energia positiva. O irmão fez um elogio pra mim, ele tá emocionado, se identificou, muito obrigado! Receber um elogio, com tanta gente maravilhosa que tem feito música no Brasil, já é muita coisa. Mas você sente seu ego sendo testado por conta disso? O ego é o que mata o homem... Se cair nessa eu danço, porque a expectativa é do outro, então você vai sempre decepcionar. Se eu sou uma pessoa especial? Pro seu Cleon e pra dona Vilani, eu sou especial, porque sou filho deles. Mas quando subo no palco, as pessoas cantando junto, eu sei que cada um tem uma história e que poderia gastar seu tempo com qualquer outra coisa. Mas eles estão ali. Com essa vontade de estar junto. Então seria muita burrice achar que isso é por minha causa apenas. É uma multidão que faz tudo isso acontecer. Cream cheese? No temaki? É uma analogia bobinha. Meteram cream cheese no temaki, sabe o que isso significa? Que toda arte milenar que envolve esse prato, toda a cultura, a história dessas pessoas... não importa. Só se importam em vender a parada. É só para fazer dinheiro sem lembrar que existem outras prioridades. Quais são essas prioridades? O ser humano é a última coisa com que as pessoas se preocupam. Carros, celular, roupas sofisticadas. Isso tudo não é para os seres humanos, é pra alguém consumir e gerar grana, pra quem tem grana continuar com grana. Os seres humanos são meros detalhes nessa esteira.

música para ler :: echo | 15


SOCIAL | PÉROLA

Porta bandeira e público.

16 | echo :: música para ler


Texto Suzanne Rollemberg | Fotos Iasmim Bianchi

S

amba, além de ser uma grande paixão nacional sempre foi uma grande paixão minha e nem pensei duas vezes quando surgiu a oportunidade de fazer uma pesquisa de campo a respeito! A ideia veio quando contei a uma amiga que estava fazendo uma revista sobre música, e que a revista teria uma pegada mais engajada, mostrando a música como elemento transformador da sociedade. Minha amiga é passista da escola de samba da Vila Madalena, o “Pérola Negra” e comentou que talvez fosse legal fazer uma matéria sobre a escola, já que escolas de samba de um modo geral são compostas por pessoas de comunidades carentes e têm um valor muito grande para essas comunidades. Achei a ideia genial e marquei de ir com ela para um de seus ensaios no domingo, o primeiro que fui, foi no dia 16 de setembro. Mas antes de contar um pouco sobre a minha experiência lá no Pérola Negra, gostaria de falar um pouco sobre a história da escola. O Grêmio Recreativo Escola de Samba Pérola Negra é uma escola de samba do bairro de Vila Madalena, zona oeste da cidade de São Paulo, fundada em agosto de 1973 da união de sambistas do Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos da Vila Madalena e Bloco Boca das Bruxas. Existem duas versões que explicam o nome da escola, a primeira é que por ser a pérola negra uma jóia rara, os fundadores gostaram de fazer a alusão de “A jóia Rara do Samba”, já a segunda versão é que um dos fundadores viu uma garrafa da cerveja Pérola Negra e gostou do nome. Seu primeiro desfile no Carnaval Paulistano foi em 1974 com o tema enredo “Piolim, Alegria Circo História”, nesse ano foi campeã do Grupo III. Depois desse ótimo começo, em 1975 O Pérola levou ao público o enredo “A São Paulo de Adoniran” e foi campeã do Grupo II. Em 1976 com o enredo “Portinari, Pintor do Povo” é novamente campeã, ganhando bastante prestígio e passando a fazer parte da elite do Carnaval Paulistano. Assim como em várias escolas de samba tiveram vários momentos de alegria, mas também de tristeza, porém sem perder a paixão pelo samba! Que é bem lembrada na letra do seu hino; composto pelo poeta Pasquale Nigro, compositor e um dos idealizadores da escola. Também morador da comunidade da Vila Madalena e ainda ativo nos assuntos da escola. “Comunidade, impõe respeito, trazendo no peito essa jóia rara...A Vila é meu grande amor, a Madalena meu viver, Pérola Negra para sempre hei de ser!” O Pérola Negra parte para sua décima sétima participação no grupo especial. Esteve pela primeira vez em 76, quando ficou ininterruptamente até 81. Nesse ano o enredo será “O alto da compadecida”.

música para ler :: echo | 17


SOCIAL | PÉROLA Bateria do Pérola Negra.

Primeiro Ensaio Eu nunca tinha ido a nenhum ensaio de escola de samba, então nem fazia ideia de como era. Quando cheguei, vi algo totalmente diferente do que eu tinha imaginado, achei que o ensaio seria em algum espaço tipo uma quadra esportiva com arquibancadas para que outras pessoas pudessem assistir, mas não, era em um espaço tipo um galpão e todos nós ficávamos misturados no mesmo lugar, pessoas da bateria, passistas, visitantes e etc. Eles cobravam R$ 5,00 de entrada, e qualquer pessoa pode ir lá assistir e inclusive ,em certo momento, pode participar do ensaio. Depois percebi que quando está perto do fim do ensaio eles abrem as portas para que as pessoas entrem de graça. Todo o funcionamento da escola está nas mãos das pessoas da comunidade da Vila Madalena, eles que cobram ingressos na entrada dos ensaios, cuidam da segurança, limpeza, venda de bebidas e até a costura das fantasias para o desfile no carnaval. Achei curioso que o público é bastante diversificado, você encontra famílias com crianças pequenas, adolescentes, idosos, pessoas de classe mais alta e outras mais humildes, turistas ... O som da bateria é contagiante e o ambiente muito descontraído, com gente de todos os tipos no mesmo clima de alegria, não tem como ficar parado! Com apenas alguns minutos naquele lugar me peguei cantando o samba enredo com a maior facilidade do mundo, de alguma forma a música entra em você. Uma das coisas que também achei legal, é que uma das principais passistas da escola é uma transexual. Conversei com algumas pessoas e consegui falar brevemente com o presidente da escola, que foi extremamente simpático

18 | echo :: música para ler

e peguei seu telefone para tentar marcar uma entrevista. O ensaio terminou por volta das 22:30 h, e eu nem tinha percebido o tempo passar. Durante a semana tentei ligar várias vezes para o presidente do pérola, pois queria uma entrevista para que ele me contasse como surgiu a escola, como era seu funcionamento e como ela contribuía para a comunidade da Vila Madalena, mas ele estava ocupado.

Segundo Ensaio Quando estava indo para o segundo ensaio no dia 23 de setembro, ainda estava com a intenção de entrevistar o presidente do Pérola. Mas pela segunda vez minhas tentativas foram frustradas. WWNo final das contas, nessa segunda visita só consegui tirar mais algumas fotos, só que dessa vez levei uma amiga que é fotógrafa para dar uma forcinha e me contentei em aproveitar o show. Assim como no outro ensaio, este acabou por volta das 22 h. Apesar da diversão, voltei pra casa um tanto quanto frustrada, porque queria ter entrado em contanto com alguém responsável pela organização da escola para saber como tudo funcionava lá dentro. Depois de muito pensar a respeito cheguei à conclusão que nem precisaria falar diretamente com o presidente para tentar entender o que acontecia dentro da escola , seria ainda mais interessante entrevistar as pessoas que participavam do ensaio, e dessa forma visualizar vários pontos de vista. E isso ficou ainda mais claro quando fui ao ensaio no domingo seguinte, no dia dia 30 de setembro.


Comunidade impoe respeito, trazendo no peito, essa joia rara... A vila e meu grande amor, a Madalena meu viver, Perola Negra para sempre hei de ser.

Acima o logotipo do PĂŠrola e Ă direita a rainha de bateria.

mĂşsica para ler :: echo | 19


SOCIAL | PÉROLA Terceiro ensaio Mais uma vez achei divertido, mas nessa terceira vez já não tinha mais tanta novidade...Inclusive as pessoas eram as mesmas, com poucas exceções. Daí comecei a pensar, o que atraia tanto aquelas pessoas pra que elas fossem todos os finais de semana, sem falta! Por que ao meu ver, era interessante ir uma vez ou outra, mas ir sempre já começava a ser enjoativo. Percebi que existia algo nelas, que não existia em mim. Então puxei assunto com uma das passistas que estava perto de mim e lhe perguntei como ela tinha disposição para ir ensaiar todos os domingos, e ela me respondeu de um jeito muito simples: “Ah mas isso aqui pra mim não é obrigação! Na verdade, é o único dia da semana que eu realmente consigo relaxar e deixar todos os meus problemas pra trás! Quando estou dançando é como se eu tirasse todo o peso de dentro de mim, é uma terapia.”. Passei a fazer a mesma pergunta à pessoas que ficavam próximas a mim durante o ensaio, e as respostas, apesar de terem contextos diferentes da vida de cada um, eram razoavelmente parecidas. Para todas aquelas pessoas que frequentavam os ensaios aos domingos, tudo aquilo era uma terapia, uma válvula de escape da sua rotina. E outra coisa que achei muito interessante também, é que uma outra passista com quem conversei comentou que antes de entrar para o pérola, já tinha ido a ensaios de outras escolas de samba no Rio de Janeiro, e que em algumas dessas escolas existia uma espécie de segregação e nem todo mundo podia participar. Por exemplo, pelo fato de não ser uma mulata “volumosa”, e nem fazer parte da comunidade que compunha a escola de samba, não permitiram que essa moça fosse passista da escola. Já quando foi para o Pérola tentar ser passista, não existiu nenhum tipo de limitação, a única habilidade necessária era saber sambar. Refleti muito a respeito depois daquela visita, percebi que a escola de samba tinha um valor sentimental muito maior para aquelas pessoas do que eu imaginava e era justamente isso que as fazia ir todos os domingos. O ensaio do Pérola é a terapia, é o ambiente em que não importa se você é gay, hétero, rico, pobre, negro, branco ou amarelo, todo mundo está lá com o mesmo propósito que é se divertir. Como diz o samba de exaltação da escola “ Venha, você verá que vale a pena, chega na Vila Madalena, e ver o povo sambar, feliz, feliz…”.

A rainha do Pérola e a sua bateria.

20 | echo :: música para ler


Venha, voce vai ver que vale a pena, chega na Vila Madalena, e ver o povo sambar feliz, feliz... mĂşsica para ler :: echo | 21


22 | echo :: mĂşsica para ler


mĂşsica para ler :: echo | 23


24 | echo :: mĂşsica para ler


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.